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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA FACULDADE DE DIREITO DE CURITIBA CAIO HENRIQUE MATTOS KIJAK

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA FACULDADE DE DIREITO DE CURITIBA

CAIO HENRIQUE MATTOS KIJAK

A POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS

CURITIBA 2021

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CAIO HENRIQUE MATTOS KIJAK

A POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS

Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito, do Centro Universitário Curitiba.

Orientador: Prof. Dr. Gustavo Britta Scandelari

CURITIBA 2021

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CAIO HENRIQUE MATTOS KIJAK

A POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS

Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito do Centro Universitário Curitiba, pela Banca Examinadora formada pelos

professores:

Orientador: _________________________________ Prof. Dr. Gustavo Britta Scandelari

________________________________ Prof. Membro da Banca

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AGRADECIMENTOS

A meus pais e meu irmão, que sempre me incentivaram, apoiaram e me deram todo o suporte, antes e durante a Faculdade, para que eu pudesse desenvolver meus estudos da melhor forma possível.

A todos os professores, que de alguma forma, durante toda a minha caminhada nesses cinco anos de graduação, contribuíram para minha formação acadêmica e pessoa.

Ao meu orientador, Gustavo Britta Scandelari, que desde o primeiro momento me deu todo o respaldo necessário para a pesquisa e elaboração desse trabalho, mesmo diante de toda a situação de pandemia que enfrentamos, nunca mediu esforços para me auxiliar no que fosse necessário.

A minha namorada Ana Júlia, que em todo momento me deu todo o apoio necessário, me ouvindo falar sobre o tema, as dificuldades e desafios dessa pesquisa. Sua presença durante esses últimos 3 anos, na faculdade e na vida é essencial para minha formação e desenvolvimento na graduação, da mesma forma que me ensina todos os dias na minha formação como ser humano.

A meus amigos Guilherme, Victor, Murilo e José, por todos os momentos de estudo, discussões, aulas, provas, trabalhos, incentivos e momentos de descontração. Com certeza vocês tornaram a faculdade mais leve e um ambiente melhor.

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo dissertar e buscar entender sobre as decisões do Poder Judiciário acerca da aplicação do princípio da insignificância no crimes de tráfico de drogas. Antes de entender os motivos e razões da possibilidade ou não nas decisões, pretende-se discorrer sobre o conceito de princípios, e os princípios basilares e que deram origem à formulação doutrinária e jurisprudencial do princípio da insignificância. Passará também pela forma em que o princípio da insignificância atua como excludente da tipicidade material nos crimes de tráfico de drogas, previstos no artigo 33 da Lei n.º 11.343/2006. Serão analisadas decisões dos Tribunais de Justiça e dos Tribunais Superiores, Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, para entender os requisitos, razões e as interpretações que o princípio da insignificância leva nos Tribunais, fazendo também uma critica a forma que o Direito Penal no Brasil é aplicado de forma muito gravosa para crimes que deveriam ser, insignificantes para o sistema judiciário.

Palavras-chave: Princípios. Intervenção mínima. Insignificância. Aplicação. Jurisprudência. Drogas.

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ABSTRACT

This paper aims to dissert and seek to understand about the decisions of the Judiciary Power regarding the application of the principle of insignificance in crimes of drug trafficking. Before understanding the reasons and reasons for the possibility or not in decisions, it is intended to discuss the concept of principles, and the basic principles that gave rise to the doctrinal and jurisprudential formulation of the principle of insignificance. It will also go through the way in which the principle of insignificance acts as an exclusion of material typicality in crimes of drug trafficking, provided for in article 33 of Law No. 11.343/2006. Decisions of the Courts of Justice and the Superior Courts, the Superior Court of Justice and the Supreme Federal Court will be analyzed to understand the requirements, reasons and interpretations that the principle of insignificance takes in the courts, also making a critique of the way that Criminal Law in the Brazil is applied in a very serious way for crimes that should be, insignificant for the judicial system.

Keywords: Principles. Minimal intervention. Insignificance. Application. Jurisprudence.

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LISTA DE SIGLAS

ABJ - Associação Brasileira de Jurimetria art. - Artigo g - grama HC - Habeas Corpus inc. - inciso mg - miligrama MG - Minas Gerais

OMS - Organização Mundial da Saúde SP - São Paulo

STF - Supremo Tribunal Federal STJ - Superior Tribunal de Justiça

SVS/MS - Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde TJMG - Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais

THC - TETRA-HIDROCANABINOL

TJPR - Tribunal de Justiça do Estado do Paraná TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

TJRS - Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...8

2 CONCEITO DE PRINCÍPIOS...10

2.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE...11

2.2 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA...12

3 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA...14

3.1 ORIGEM HISTÓRICA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA...16

3.2 O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO DIREITO BRASILEIRO...19

3.3 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA COMO EXCLUDENTE DA TIPICIDADE...20

4 LEI Nº 11.343 DE 23 DE AGOSTO DE 2006 – LEI DE DROGAS...25

4.1 CONTEXTO GERAL...25

4.2 CONCEITO DE DROGAS...27

4.3 ART. 33 DA LEI Nº 11.343/2006 – CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS...28

5 ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL...33

5.1 JURISPRUDÊNCIA NOS TRIBUNAIS ESTADUAIS...33

5.2 JURISPRUDÊNCIA NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA...36

5.3 JURISPRUDÊNCIA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL...41

5.4 DIVERGÊNCIA NA INTERPRETAÇÃO E NO ENTENDIMENTO QUANTO À AMEAÇA AO BEM JURÍDICO PROTEGIDO PELO ART. 33 DA LEI 11.343/2006...48

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS...51

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1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho intitulado “A possibilidade da aplicação do princípio da insignificância nos crimes de tráfico de drogas” objetiva demonstrar como tem sido o entendimento jurisprudencial no sentido da aplicação do princípio, bem como os principais argumentos e suas controvérsias.

Nesse sentido faz-se importante analisar a origem do princípio da insignificância e toda sua construção doutrinária, desde o seu surgimento, passando pelo reconhecimento do princípio no ordenamento jurídico pátrio, até os dias atuais, onde se verifica a forma de sua aplicação, suas condições e de que forma isso impacta nas decisões judiciais e no Poder Judiciário como um todo.

Busca-se como objetivo geral identificar a forma em que o Princípio da Insignificância foi recebido pelo ordenamento jurídico brasileiro, bem como suas características como excludente da tipicidade material.

No que tange aos objetivos específicos, busca-se: a) os requisitos para a aplicação do princípio de forma geral; b); o entendimento do que é violação ao bem jurídico protegido por um tipo penal considerado abstrato; c) o entendimento majoritário e minoritário da jurisprudência quanto a aplicação do princípio da insignificância nos crimes de tipo penal abstrato; d) o entendimento majoritário e minoritário da aplicação do princípio da insignificância nos crimes previstos no art. 33 da Lei Nº 11.343/2006; e) buscar entender os principais argumentos presentes nas decisões favoráveis à aplicação, bem como as que a rejeitam a aplicação; f) o entendimento do que é violação ao bem jurídico protegido por um tipo penal considerado abstrato; g) entender os efeitos da negativa e positiva aplicação do princípio nos casos concretos.

O método a ser utilizado na elaboração desta monografia será o de pesquisa e compilação de conteúdo bibliográfico, que consiste na exposição dos conhecimentos e pensamentos de vários doutrinadores no que tange aos estudos realizados na esteira do tema aqui estudado. Ainda, será realizada pesquisa jurisprudencial nos Tribunais Estaduais de 2º grau, bem como nos Tribunais Superiores, quais sejam, o Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, buscando entender como é o

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posicionamento quando os julgadores se deparam com casos em que, na teoria, poderia se aplicar o Princípio da Insignificância.

No primeiro capítulo, o trabalho irá se debruçar na origem do princípio da insignificância, desde sua origem no Direito Romano, onde mesmo ainda sem ter essa denominação, já era aplicado pelos Pretores, explicando a evolução do princípio durante o Iluminismo e a Segunda Guerra Mundial, para assim chegar a forma e conceito a qual temos hoje, que fora formulada pelo Jurista Claus Roxin.

No segundo capítulo, será abordada a Lei de Drogas, desde a primeira publicada, a evolução do conceito de drogas para o Estado Brasileiro e a forma que o texto da Lei Nº 11.343/2006 foi formulado, como é sua complementação por meio da portaria SVS/MS n.º 344 de 12 de maio de 1988 e explicando o tipo penal de tráfico de drogas.

Por conseguinte, o terceiro capítulo trará o entendimento jurisprudencial quanto à aplicação do Princípio da Insignificância nos crimes de tráfico de Drogas, trazendo decisões de diversos Tribunais Estaduais, bem como dos Tribunais Superiores. Ainda, serão analisados os argumentos exarados nas decisões favoráveis à aplicação, bem como as desfavoráveis, a divergência doutrinária, bem como o entendimento de juristas para a política antidrogas que o Estado Brasileiro aplica como um todo, desde o dia a dia na sociedade, passando pelas delegacias até chegar aos Tribunais.

Dessa maneira, faz-se necessário entender a forma em que os princípios do direito penal são recebidos pelo nosso ordenamento jurídico, e principalmente a forma que os mesmos são aplicados nos crimes de tráfico de drogas, entendendo seus efeitos e consequências, os principais argumentos e de que forma isso afeta o sistema penal e a evolução do poder judiciário conforme a mudança da sociedade.

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2. CONCEITODEPRINCÍPIOS

O termo princípio vem para indicar um ponto de partida. Etimologicamente, vem do latim principium, que quer dizer começo, início, causa primária, preceito. No meio jurídico, não se pode distanciar-se desse conceito, de modo que o significado de princípio indica uma ordenação, que incide sobre todos os sistemas de leis e normas, servindo assim de base para a interpretação e aplicação do direito positivo1.

A nomenclatura princípios gerais do Direito qualifica esse instituto para lhe outorgar importantes papéis, além da função cognitiva: i) orientam os juristas à compreensão do ordenamento jurídico, funcionando como metanormas, seja para aplicação ou integração do Direito, ii) bem como para a criação de novas normas, daí revelando a função produtiva ou criativa no âmbito das fontes do Direito.2

Para Celso Antonio Bandeira de Mello,

Princípio é mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele; disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo.3

Enquanto alguns princípios estão previstos expressamente nos textos legislativos, outros estão implícitos dentro do ordenamento jurídico, decorrentes da interpretação doutrinária e jurisprudencial.

Portanto, os princípios atuam de diversas formas no direito, seja para a elaboração de normas, seja para sua interpretação quando as mesmas já estão em pleno vigor, não podendo esses serem afastados e negados quando da interpretação e aplicação da norma jurídica.

1 NUCCI2, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. 2 CAMILLO, C. Manual da Teoria Geral do Direito. São Paulo: Almedina, 2019. Disponível em:

<https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788584935161/>. Acesso em: 11/03/2021.

3 MELO, Celso Antonio Bandeira de. Elementos de direito administrativo. 2. ed. São Paulo: Revista dos

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Diante disso, antes de nos debruçarmos no princípio objetivo deste trabalho, devem-se ressaltar aqui alguns princípios basilares e de extrema relevância para a atuação e efetivação do direito penal em um Estado Democrático de Direito e que são usados como base pela doutrina e jurisprudência para a formação do Princípio da Insignificância.

2.1 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

O princípio da Legalidade é um dos, se não o instrumento mais importante para a proteção dos direitos individuais em um Estado democrático de Direito.

Tendo sua origem durante o Iluminismo como uma forma de limitar a atuação absolutista do Estado, foi pela primeira vez positivado nas Constituições dos Estados Americanos de Maryland e da Virgínia. Detalha o professor Juarez Cirino dos Santos:

As Constituições dos Estados americanos de Virgínia e de Maryland (1776) instituíram pela primeira vez o princípio da legalidade, depois repetido na Constituição americana (1787) e, mais tarde, como norma fundamental do Estado de Direito, foi inscrito na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789). A primeira legislação penal a incorporar o princípio da legalidade foi o Código Penal da Bavária (1813), depois a Prússia (1851) e a Alemanha (1871), generalizando-se por todas as legislações penais ocidentais sob a forma latina do nullum crimen, nulla poena sine lege, inaugurada por FEUERBACH.4 .

A expressão nullum crimen nulla poena sine lege (não há crime sem lei, não há pena sem crime) traz consigo as devidas dimensões de garantia da anterioridade e da irretroatividade da lei penal, apenas com a exceção da possibilidade da retroação em caso de lei penal mais benéfica. Diante disso, o princípio da legalidade ganhou para si novos significados e novas garantias. A de que não há crime sem lei escrita, ou seja, condutas não podem ser incriminadas pelos costumes; estrita, condutas não podem ser punidas por analogia; e certa, o tipo penal deve estar sempre definido de forma taxativa, evitando assim descrições ambíguas, imprecisas ou vagas.

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Diante dessa evolução material do princípio da legalidade, adveio a expressão

nullum crimen nulla poena sine injuria. Neste sentido “Sem causação de um mal que

representa a gravidade esperada para a incidência da pena”5.

No Estado Brasileiro, o princípio da legalidade está positivo na Carta Magna da República:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;6

Bem como também está positivo no art. 1º do Código Penal:

Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.7

Inafastável, portanto, a utilização do princípio da legalidade como base, ou mesmo utilizando da etimologia da palavra, como ponto de partida, para a interpretação e aplicação da Lei.

2.2 PRINCÍPIODAINTERVENÇÃOMÍNIMA

O Direito Penal é o ramo jurídico que interfere de forma mais bruta e incisiva na vida do cidadão, podendo restringir um dos direitos fundamentais mais importantes de todas as sociedades mundiais, o direito de liberdade. Através do Direito Penal, é possível restringir, diminuir e limitar o exercício desse direito de liberdade, o direito de ir e vir e a participação do sancionado na sociedade.

5 LOPES1, Maurício Antonio Ribeiro. Princípio da insignificância no Direito Penal. 2 ed. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2000. p. 45.

6 BRASIL2. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 03/05/2021.

7 BRASIL3. Decreto-Lei Nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em:

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Até por isso que o Direito Penal é chamado de “ultima ratio”, ou seja, deve ser a última forma utilizada para evitar a ocorrência de ilícitos, buscando outras formas dentro do ordenamento jurídico para coibir ações que possam vir a violar bens jurídicos.

Dessa forma, ensina o Guilherme de Souza Nucci:

[...] a lei penal não deve ser vista como a primeira opção (prima ratio) do legislador para compor os conflitos existentes em sociedade e que, pelo atual estágio de desenvolvimento moral e ético da humanidade, sempre estarão presentes. Há outros ramos do direito preparados a solucionar desavenças e lides surgidas na comunidade, compondo-as se maiores consequências. O direito penal é considerado a ultima ratio, isto é, a ultima cartada do sistema legislativo, quando se entende que outra solução não pode haver senão a criação da lei penal, incriminadora, impondo sanção ao infrator.8

O princípio é dirigido diretamente ao legislador que, deve buscar outras maneiras de proteger e resguardar os bens jurídicos, sopesando assim as hipóteses de criminalização de condutas, entretanto, deve ser também um dos princípios basilares aos juízes no momento da interpretação e aplicação da Lei.

Portanto, para que não aconteça um excesso estatal, só é entendível a intervenção estatal penal quando for a única medida cabível para a proteção dos bens jurídicos.

8 NUCCI1, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 13 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

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3. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Formulado por Claus Roxin, o princípio da Insignificância, tem como objetivo limitar a interpretação dos tipos penais, visando observar a efetiva lesão ao bem jurídico tutelado e protegido pelo tipo penal cominado na legislação.

Foi com o Jurista Alemão que o princípio da insignificância passou a ter um estudo e uma definição mais aprofundada em 1964, quando o princípio passou a ter a formulação doutrinária do modo que conhecemos hoje. Conforme ensina Roxin “Trata-se de um princípio de validez geral para a determinação do injusto penal”9, Roxin sempre propôs a

exclusão da tipicidade de crimes em que não causava, ou pouco causava, ofensa ao bem jurídico tutelado, no âmbito em que a punibilidade deve ser restrita ao indispensável para a proteção do bem jurídico.

Roxin entendia que:

[...] somente se podem punir as lesões de bens jurídicos e as contravenções contra fins de assistência social, se tal for indispensável para uma vida em comum ordenada. Onde bastem os meios do direito civil ou do direito publico, o direito penal deve retirar-se.10

Quando o legislador se depara com um ato que pode gerar lesão a um bem jurídico, cabe à lei definir um tipo penal, levando em conta todos os efeitos do ato do incriminado, em todos os âmbitos da sociedade. Porém, como é cediço no Código Penal Brasileiro, não existe qualquer espaço para subjetividade ou interpretação, não existe de forma positivada uma subjetivação para que seja considerado o grau de lesão que o ato teve sobre o bem jurídico ali tutelado.

Diante desse problema, surgiu na doutrina e na jurisprudência o chamado “princípio da insignificância”, que, em síntese, traz que os atos que, ainda que positivados nos tipos penais, não gerarem lesão aos bens jurídicos, não precisam ser tratados pelo judiciário, sendo chamados assim de crime insignificante, ou crime “bagatelar”.

Nesse sentido, ensina o Professor Luiz Flávio Gomes:

9 ROXIN1, Claus. Politica Criminal y sistema del derecho penal. Barcelona: Bosch, 1972. p. 53. 10 ROXIN2, Claus. Problemas Fundamentais de Direito Penal. Lisboa: Veja. p. 28.

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Conceito de infração bagatelar: infração bagatelar ou infração de bagatela ou crime insignificante expressa o significado de ninharia, de pouca relevância (ou seja: insignificante). Em outras palavras, é uma conduta ou um ataque ao bem jurídico tão irrelevante que não requer a (ou não necessita da) intervenção penal. Resulta desproporcional a intervenção penal nesse caso. O fato insignificante, destarde, deve ficar reservado para outras áreas do Direito (civil, administrativo, trabalhista, etc). Não se justifica a incidência do Direito penal (com todas as suas pesadas armas sancionatórias) sobre o fato verdadeiramente insignificante.11

Conforme já descrito, para que seja caracterizado o tipo penal, é necessário que o ato praticado tenha produzido ofensa de alguma forma sobre o bem jurídico protegido pelo mesmo, mas nem toda ação gera uma lesão. Nessa situação, tendo em vista a ofensividade e a lesividade da ação ao bem jurídico, apresenta-se a possibilidade da aplicação do princípio da insignificância, uma vez que, de forma corriqueira, temos na sociedade e no judiciário processos que decorrem de uma ação que sequer produziu efeitos ao bem jurídico, isso porque, a conduta se enquadrou perfeitamente no tipo penal, mas o bem jurídico não chegou a ser violado.

Assim ensina o Professor Cezar Roberto Bittencourt:

A tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico. Amiúde, condutas que se amoldam a determinado tipo penal, sob o ponto de vista formal, não apresentam nenhuma relevância material. Nessas circunstâncias, pode-se afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado.12

Não é diferente o entendimento de Carlos Vicos Manãs, o qual diz que o princípio funda-se:

[...] na concepção material do tipo penal, por intermédio do qual é possível alcançar, pela via judicial e sem macular a segurança jurídica do pensamento sistemático, a proposição político-criminal da necessidade de descriminalização

11 GOMES2, Luiz Flávio. Princípio da insignificância e outras excludentes de tipicidade. V. 1. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 15.

12 BITENCOURT2, Cezar Roberto. Tratado de direito penal 1: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2020.

Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788553616985/>. Acesso em: 08/04/2021.

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de condutas que, embora formalmente típicas, não atingem de forma socialmente relevante os bens jurídicos protegidos pelo Direito Penal.13

É de suma importância ressaltar que é função do poder legislativo escolher e definir quais os bens jurídicos e os critérios adotados para essa seleção, e é vedado aos intérpretes e aplicadores do direito essa função privativa, podendo resultar na violação dos princípios constitucionais da reserva legal e da independência dos poderes14.

Existem sim alguns tipos penais que, de certa forma, trazem uma quantificação e intensidade da lesão em seu texto, mas isso não quer dizer que se trata do princípio da insignificância, conforme exemplifica o professor Cezar Roberto Bittencourt:

Os delitos de lesão corporal leve, de ameaça, injúria, por exemplo, já sofreram a valoração do legislador, que, atendendo às necessidades sociais e morais históricas dominantes, determinou as consequências jurídico-penais de sua violação. Os limites do desvalor da ação, do desvalor do resultado e as sanções correspondentes já foram valorados pelo legislador. As ações que lesarem tais bens, embora menos importantes se comparados a outros bens como a vida e a liberdade sexual, são social e penalmente relevantes.15

Portanto, nesse sentido, conforme ensina Zaffaroni, “a insignificância só pode surgir à luz da função geral que dá sentido à ordem normativa e, consequentemente, a norma em particular, e que nos indica que esses pressupostos estão excluídos de seu âmbito de proibição, o que resulta impossível de se estabelecer à simples luz de sua consideração isolada”16.

3.1 ORIGEM HISTÓRICA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Desde o Direito Romano já se tem registros da existência do princípio da insignificância, e é inegável que o Direito Romano gere grande influência nos ordenamentos jurídicos atuais. Naquela época, o Pretor, como era chamado o

13 MAÑAS, Carlos Vico, O princípio da insignificância como excludente da tipicidade no direito penal. São

Paulo: Saraiva, 1994. p. 81. apud BITENCOURT2, Cezar Roberto. Tratado de direito penal 1: parte geral.

São Paulo: Saraiva, 2020. Disponível em:

<https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788553616985/>. Acesso em: 08/04/2021.

14 BITENCOURT2, 2020. Acesso em: 08/04/2021. 15 Ibid., p. 82. Acesso em: 08/04/2021.

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“magistrado” que administrava a justiça na Antiga Roma, não tinha como objeto de julgamento crimes e infrações de valor mínimo, elevando à máxima a expressão “minima non curat pretor”, ou seja, o Pretor não cuida de coisas pequenas.

Ressalta o professor Élcio Arruda que:

[...] mesmo antes da época dos pretores (356 a.C.), a Lei das XII Tábuas (451-449 a.C.) reservava a intervenção penal a violações que diretamente atentassem contra o Estado (alta traição, subtração ao serviço militar, incitação ao inimigo etc.) (1) . O direito romano distinguia entre infrações penais privadas (delicta privata) e públicas (crimina publica): aquelas, menos graves, entregues à persecução do próprio ofendido, em tribunais civis; estas, de maior intensidade, cometidas à acusação por parte de qualquer do povo, com a obrigatoriedade de o tribunal criminal emitir o veredicto condenatório ou absolutório(2). Uma diretiva clara informava o sistema: lesões de menor relevância deveriam ser equacionadas entre os próprios envolvidos, sem a ingerência do poder público.17

Entretanto, é importante ressaltar que, ainda que seja majoritária a origem do princípio da insignificância, o doutrinador Maurício Antônio Ribeiro Lopes discorda da maioria. Para ele, inexiste qualquer especificidade no princípio que justifique menor interferência do estado na esfera penal do que na civil. Segundo Ribeiro Lopes, isso se justifica porque os Romanos tinham um direito penal pouco desenvolvido, e o princípio da insignificância era bem mais frequente no direito civil. Ainda, defende que o princípio da insignificância teve sua origem sob a ótica do nullum crimen nulla poena sine lege, e a partir de transformações e evoluções, passou a limitar-se ao Direito Penal18.

Ainda que não de forma expressa, já na Declaração dos Direitos do Homem, datada de 1789, verifica-se a existência de referências ao princípio da insignificância “Art. 5º. A lei não proíbe senão as ações nocivas à sociedade. Tudo que não é vedado pela lei não pode ser obstado e ninguém pode ser constrangido a fazer o que ela não ordene.”19.

17 ARRUDA, Élcio. Insignificância: um princípio nada insignificante. Boletim IBCCRIM, São Paulo, ano 17,

n. 202. Disponível em <https://wp.ibccrim.org.br/artigos/202-setembro-2009/insignificancia-um-principio-nada-insignificante/>. Acesso em 01/10/2020.

18 LOPES2, Mauricio Antonio Ribeiro. Princípio da insignificância no direito penal: Análise à Luz da Lei

nº 9099/95 – Juizados Especiais Criminais e da Jurisprudência Atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 37-38.

19 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Declaração de direitos do homem e do cidadão - 1789. Disponível

em: <http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0- cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html>. Acesso em: 31/04/2021.

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A grande quantidade de leis penais no final do século XIX e início do século XX motivou o Jurista Alemão Franz Von Liszt a rebuscar a então antiga expressão Romana e trazer para o si o questionamento de que se não seria conveniente de rebuscar a aplicação do então vocábulo nos crimes penais com a significação minorada. “A nossa atual legislação faz da pena, como meio de luta, um emprego excessivo. Se deveria refletir se não merecia ser restaurado o antigo principio ‘minima non curat praetor’”20.

Após a Segunda Guerra Mundial, em razão do grande impacto socioeconômico que os conflitos causaram, verificou-se um expressivo aumento nos delitos patrimoniais de “pequena monta”. Portanto, renasce no Continente Europeu o então chamado de “Crime de Bagatela”, mas sempre vinculado aos crimes patrimoniais. Posteriormente, verificou-se que o crime de pequena monta, agora chamado de crime de bagatela abrangia outros tipos penais, e não somente os crimes patrimoniais.

Entretanto, foi com o Jurista Alemão Claus Roxin que o princípio da insignificância passou a ter um estudo e uma definição mais aprofundada em 1964, quando o princípio passou a ter a formulação doutrinária do modo que conhecemos hoje. Conforme ensina Roxin “Trata-se de um princípio de validez geral para a determinação do injusto penal”21,

Roxin sempre propôs a exclusão da tipicidade de crimes em que não causava, ou pouco causava, ofensa ao bem jurídico tutelado, no âmbito em que a punibilidade deve ser restrita ao indispensável para a proteção do bem jurídico.

Roxin entendia que:

[...] somente se podem punir as lesões de bens jurídicos e as contravenções contra fins de assistência social, se tal for indispensável para uma vida em comum ordenada. Onde bastem os meios do direito civil ou do direito publico, o direito penal deve retirar-se.22

O Jurista Ivan Luiz da Silva ressalta a importância de Roxin para o desenvolvimento do princípio da insignificância:

20 LISZT, Franz Von apud SANGUINÉ, Odone. Observações sobre o principio da insignificância. Fascículos da Ciências Penais, Porto Alegre, ano 3, v. 3, n. 1, p. 40, jan./mar. 1990.

21 ROXIN1, 1972. p. 53. 22 ROXIN2. p. 28.

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O recente aspecto histórico do Princípio da Insignificância é, inafastavelmente, devido a Claus Roxin, que, no ano de 1964, o formulou com base de validez geral para determinação geral do injusto, a partir de considerações sobre a máxima latina mínima non curat praetor.23

Parece ser claro que a expressão mínima non curat praetor tenha sido o axioma basilar para a formulação penal do princípio da insignificância, ainda que no Direito Romano sua aplicação tenha sido mais na esfera do Direito Civil, ou seja, nas relações privadas, com certeza foi a grande influência para a evolução do princípio na esfera penal.

Não obstante a isso, não se pode negar a influência Iluminista para firmar o princípio dentre os “novos” princípios limitadores da força do estado em face das ações que não ferem os bens jurídicos, bem como protegendo os bens jurídicos que são tutelados pelos cidadãos.

Portanto, tem-se que a Insignificância surge como um princípio jurídico no Direito Romano, recebendo teorias e aplicações penais no movimento humanitário no período do Iluminismo, chegando por fim na forma que temos hoje, formuladas pelo Jurista Alemão Claus Roxin.

3.2 O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO DIREITO BRASILEIRO

O Direito Penal quando exercido e aplicado em um Estado Democrático Direito, como nós vivemos no Brasil, deve ser balizado e aplicado sobre uma base de princípios norteadores, que sempre limitarão a intervenção punitiva do Estado. Importante frisar que os princípios têm força normativa no Estado Democrático de Direito, uma vez que são classificados como norma.

O princípio da insignificância não está expresso em qualquer dispositivo do ordenamento jurídico Brasileiro, mas mesmo assim é consagrado na doutrina e na jurisprudência como um princípio jurídico-penal implícito. Por estar fundamentada nos princípios da humanidade e da legalidade sob o viés material, o princípio da insignificância tem sua base e proteção constitucional na condição de princípio penal, conforme se aduz do Art. 5º, §2º da Constituição da República: “§ 2º Os direitos e

23 SILVA, Ivan Luiz da. Princípio da insignificância no direito penal brasileiro. Curitiba: Juruá, 2006. p.

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garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”24.

No Brasil, a primeira aparição expressa do Princípio da Insignificância foi em 1988, aplicando-se a um caso de lesão corporal:

ACIDENTE DE TRÂNSITO. LESÃO CORPORAL. INEXPRESSIVIDADE DA LESÃO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICANCIA. CRIME NÃO CONFIGURADO. SE

A LESÃO CORPORAL (PEQUENA EQUIMOSE) DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRÂNSITO E DE ABSOLUTA INSIGNIFICANCIA, COMO

RESULTA DOS ELEMENTOS DOS AUTOS - E OUTRA PROVA NÃO SERIA POSSIVEL FAZER-SE TEMPOS DEPOIS - HÁ DE IMPEDIR-SE QUE SE

INSTAURE AÇÃO PENAL QUE A NADA CHEGARIA, INUTILMENTE SOBRECARREGANDO-SE AS VARAS CRIMINAIS, GERALMENTE TÃO

ONERADAS.25

Portanto, ainda que de forma não expressa, em decorrência do entendimento de outros princípios do Direito Penal, tem-se claro que o princípio da insignificância, formulado diante do entendimento jurisprudencial e doutrinário existe dentro do ordenamento jurídico pátrio, e que deve ser observado na aplicação do direito, evitando assim que o Direito Penal deixe de ser a ultima ratio.

3.3 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA COMO EXCLUDENTE DA TIPICIDADE

A Criminalização de uma conduta é sempre definida por um processo legislativo, o qual sempre será abstrato e hipotético, das quais o legislador optará por ações ou omissões relevantes para o direito penal e que possam apresentar ofensa ou ameaça a um bem jurídico, para que assim possa puni-las.

Esses bens jurídicos podem ser afetados de diferentes formas e em diferentes graus, entretanto, esse grau não é quantificado no processo legislativo, justamente por esse ser um processo abstrato e hipotético.

24 BRASIL2. Acesso em: 03/05/2021.

25 BRASIL22. Supremo Tribunal Federal. Recurso Ordinário em Habeas Corpus n.º 66.869. Relator

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A redação do tipo penal pretende, por certo, somente incluir prejuízos graves da ordem jurídica e social, porém, não pode impedir que entrem em seu âmbito os casos leves. Para corrigir essa discrepância entre o abstrato e o concreto e para dirimir a divergência entre o conceito formal e o conceito material do delito, parece importante utilizar-se do principio da insignificância.26

E é nesse contexto que o princípio da insignificância se mostra necessário. Conforme já falado, os princípios têm força normativa no Ordenamento jurídico Brasileiro, razão pela qual, esse tem o condão de afastar a tipicidade do tipo penal cominado.

Para que seja considerado crime, são necessários três elementos, são eles: conduta típica, antijurídica e culpável. A conduta típica exige que a lei o defina como crime, a antijuridicidade requer que o ato ali tipificado seja defeso na legislação, e culpável, ser esse ato reprovável dentro do ordenamento jurídico.

Conforme ensina o professor Cezar Roberto Bittencourt:

[...] a tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico.27

Ainda, Fernando Capez define tipicidade como:

É a subsunção, justaposição, enquadramento, amoldamento ou integral correspondência de uma conduta praticada no mundo real ao modelo descritivo constante da lei (tipo legal). Para que a conduta humana seja considerada crime, é necessário que se ajuste a um tipo legal. Temos, pois, de um lado, uma conduta da vida real e, de outro, o tipo legal de crime constante da lei penal. A tipicidade consiste na correspondência entre ambos.28

O princípio da insignificância vai cuidar da tipicidade do fato. Essa tipicidade é dividida em duas partes. A primeira, tipicidade formal, trata exatamente do que traz a lei quanto a essa conduta, refere-se ao aspecto material do fato. Atos que existem concretamente no mundo dos fatos e só precisam ser descritos pela norma. São

26 LOPES1, 2000. p. 117-118.

27 BITENCOURT1, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 10. ed, vol. I. São Paulo: Saraiva,

2006. p. 26.

28 CAPEZ2, Fernando. Curso de direito penal: parte geral. V. 1 São Paulo: Saraiva, 2020. p. 272.

Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788553619184/>. Acesso em: 09/04/2021.

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elementos objetivos: o objeto do crime, o lugar, o tempo, os meios empregados, o núcleo do tipo/verbo29.

Ou seja, caso o agente pratique qualquer conduta que se enquadre no verbo, objeto, lugar e tempo descritos no time penal, estará realizando conduta típica no ponto de vista formal.

Entretanto, no contexto de um Estado Democrático de Direito no Brasil, não há o que se falar em exigir apenas a tipicidade formal, e deve-se ter a tipicidade material também.

Essa tipicidade material traz que não basta que a conduta esteja tipificada, mas deve se observar também a efetiva lesão ao bem jurídico, se realmente houve alguma violação e lesão. Dessa forma, seriam consideradas atípicas as condutas que não lesem a vida em sociedade, por serem, justamente, insignificantes. Tem-se então uma valoração no comportamento praticado pelo “criminoso”, não bastando apenas verificar sua conduta, mas mais precisamente a efetiva lesão e prejuízo causada por esse30.

Exige-se, portanto o mínimo de lesividade do comportamento humano ao ordenamento jurídico, de forma a afastar qualquer interpretação somente literal do que traz a codificação. Dessa forma entende Cezar Roberto Bittencourt:

Com efeito, a insignificância ou irrelevância não é sinônimo de pequenos crimes ou pequenas infrações, mas se refere à gravidade, extensão ou intensidade da ofensa produzida a determinado bem jurídico penalmente tutelado, independentemente de sua importância. A insignificância reside na desproporcional lesão ou ofensa produzida ao bem jurídico tutelado, com a gravidade da sanção cominada. A insignificância situa-se no abismo que separa o grau da ofensa produzida (mínima) ao bem jurídico tutelado e a gravidade da sanção que lhe é cominada. É nesse paralelismo — mínima ofensa e desproporcional punição — que deve ser valorada a necessidade, justiça e proporcionalidade de eventual punição do autor do fato.31

Nesse sentido também ensina Carlos Vico Manãs:

29Ibid.; p. 274. Acesso em: 09/04/2021.

30 MAGALHÃES, Joseli de Lima. Princípio da insignificância do direito penal. Jus Navegandi, Teresina,

ano 1, n. 1, nov. 1996. Disponível em:<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=948>. Acesso em: 03/04/2021.

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[...] o princípio da insignificância surge como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal que, de acordo com a dogmática moderna, não deve ser considerado apenas em seu aspecto formal, de subsunção da fato à norma, mas, primordialmente, em seu conteúdo material, de cunho valorativo, no sentido da sua efetiva lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma penal, o que consagra o postulado da fragmentariedade do direito penal.32

Portanto, com a ausência da tipicidade material, inexistindo qualquer ofensividade ao bem jurídico, o princípio da insignificância se vê por bem, aplicável.

Nesse mesmo sentido, entende Fernando Capez sobre o Princípio da Insignificância, que:

O direito penal não deve se preocupar com bagatelas, do mesmo modo que não podem ser admitidos tipos incriminadores que descrevam condutas incapazes de lesar o bem jurídico. A tipicidade penal exige um mínimo de lesividade do bem jurídico protegido, pois é inconcebível que o legislador tenha imaginado inserir em um tipo penal condutas totalmente inofensivas ou capazes de lesar o interesse protegido.33

Entretanto, em razão da inexistência de dispositivo explícito que o define, há de se buscar na doutrina e na Jurisprudência as definições e aplicações para o princípio. Neste sentido, o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, em seu voto no HC 98152-MG, proferiu as seguintes considerações sobre o princípio da insignificância, traçando assim alguns “requisitos” para sua aplicação, vejamos:

O sistema jurídico há de considerar a relevante circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do individuo tão somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor – por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes – não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da próprio ordem social. O princípio da insignificância qualifica-se como fator de descaracterização material da tipicidade penal. O princípio da insignificância – que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal – tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada esta na perspectiva de seu caráter material. Tal postulado – que considera necessária na

32 MAÑAS, Carlos Vico, O princípio da insignificância como excludente da tipicidade no direito penal. São

Paulo: Saraiva, 1994. p. 65. apud Ibid., p. 70. Acesso em: 08/04/2021.

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aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos valores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade de comportamento, e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada – apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Publico. O fato insignificante, porque destituído de tipicidade penal, importa em absolvição primária do réu. A aplicação do princípio da insignificância, por excluir a própria tipicidade material da conduta atribuída ao agente, importa, necessariamente, na absolvição penal do réu, eis que o fato insignificante, por ser atípico, não se reveste de relevo jurídico-penal.34

O Acórdão acima colacionado, brilhantemente relatado pelo Ministro Celso de Mello, traz alguns parâmetros e critérios que devem ser observados quando se trata da aplicação do princípio da insignificância. O Ministro ressalta que a aplicação deve ser sempre visualizada “lado a lado” com os princípios da intervenção mínima do Estado e da Fragmentariedade, também, não há como firmar a aplicação da insignificância de uma forma geral, ou seja, em todos os casos de um tipo específico, deve-se observar caso a caso, uma vez que não é possível o seu reconhecimento de forma abstrata. Por obvio, quando se fala de insignificância, pela ótica da tipicidade material, a conduta do agente deve ter mínima ofensividade e nenhuma periculosidade social decorrente desse comportamento. E por fim, que o Direito Penal não deve se preocupar com condutas que carreguem desvalor consigo aquelas que geram prejuízo mínimo, para a vítima, ou para a ordem social do Estado.

Ainda que exista esse precedente do Supremo Tribunal Federal, em que o então Ministro Celso de Mello ressaltou o princípio da Insignificância e traçou alguns parâmetros para a sua aplicação, a decisão final cabe à interpretação e subsunção da norma ao fato daquele que está julgando, seja em sede de juízo de primeiro grau, ou nos demais graus recursais. É fato que o princípio é unanimidade dentro da doutrina, ainda que existam alguns autores que possam divergir da forma que o princípio é aplicado35.

34 BRASIL20. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 98152. Relator Ministro Celso de Mello.

Julgado em 19/05/2009.

35 Carlos Frederico Pereira, Juares Tavares e Guzmán Dalbora atribuem ao princípio da insignificância ao

efeito de excludente de antijuricidade. Já Abel Cornejo atua como defensor do entendimento de que o principio da insignificância atua como causa excludente de culpabilidade. (SILVA, Ivan Luiz da. Princípio

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4. LEI Nº 11.343 DE 23 DE AGOSTO DE 2006 – LEI DE DROGAS

Promulgada em 23 de agosto de 2006, a lei de drogas veio para regular medidas de prevenção do uso indevido, estabelece crimes e penas para aquelas que infringirem seus artigos, com o objetivo de reprimir o avanço das drogas no país. Portanto, é imprescindível nesse trabalho, entender o seu contexto e o que traz em seus artigos.

4.1 CONTEXTO GERAL

A problemática das drogas é algo que abrange o Mundo inteiro. Desde os tempos antigos se tem registros de drogas, entretanto, nos tempos mais recentes a presença das drogas vem sendo cada vez mais intensa, principalmente no Brasil, onde se tem grupos de tráfico presentes em todo o território nacional.

A discussão quanto às drogas deixou de ser apenas dos governantes e passou a ser também discutido entre a população, isso porque cada vez mais o problema passou a afetar a todos da sociedade, não apenas aqueles que estão diretamente envolvidos com o entorpecente.

Hoje a discussão deixou de ser apenas no campo do Poder Executivo, sobre a efetividade da chamada “Guerra às Drogas”, incluindo assim a punição Estatal, a assistência que o Estado presta aqueles que sofrem com o vício, bem como no ramo médico, onde estudam os efeitos das drogas e as consequências de sua abstinência, bem como tratamentos para afastar o vício do usuário.

Diante de todos esses problemas, o Legislador não pode se manter inerte às alterações e problemas da sociedade, e passou a voltar às suas atenções para o combate às drogas, com medidas que passaram a ser clamadas pela sociedade civil, onde tratam o usuário apenas como bandido, e não como pessoa detentora de direitos, assim como aquelas que criticam.

Conforme ensina Andrey Borges de Mendonça e Paulo Roberto Galvão de Carvalho, o legislador contrariou os estudiosos do Direito Penal e da Criminologia:

Em alguns pontos, premido pelo clamor popular que constantemente pressionada pela efetividade da segurança publica, contrariou tendências de setores da

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doutrina penal que pregam pela insubsistência do agravamento das penas como meio de refrear as práticas criminosas. Por outro lado, acatou outras tendências, discutidas com ênfase pela comunidade médico-científica, e pareceu, aos olhos da população, estar tratando com maior leniência a questão das drogas.36

A Constituição Federal promulgada em 1988 estabelece, em seu art. 5º, inc. XLIII que:

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.37

Nesse contexto, a Carta Magna impôs de forma implícita um tratamento mais rigoroso aos crimes tratados como hediondos, ou seja, aqueles que estão catalogados no art. 1º da Lei nº 8.072/199038, e também aos crimes assemelhados aos crimes

elencados na referida legislação, ou seja, o crime de tráfico de drogas.

Foi seguindo todo este panorama que em 2002 veio a primeira grande alteração na parte legislativa do chamado “combate às drogas”. Desde 1976 estava em vigor a Lei n.º 6.368/197639, que já se fazia ultrapassada depois de tantas mudanças na sociedade

e de nada era compatível com os novos estudos científicos sobre as drogas.

Ademais, já era passado tempo da necessidade de fazer a distinção entre usuários e traficantes, uma vez que as drogas estavam cada vez mais presentes na sociedade.

No mesmo ano de 2002, o Congresso Nacional aprovou a nova lei n.º 10.409/200240, no entanto, esse diploma legislativo sofreu duras críticas da doutrina,

36 MENDONÇA, Andrey Borges de; CARVALHO, Paulo Roberto Galvão. Lei de Drogas, Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006: Comentada Artigo por Artigo. 2. ed. São Paulo: Método. 2008. p. 16.

37 BRASIL2. Acesso em: 03/05/2021.

38 BRASIL5. Lei Nº 8.072, de 25 de julho de 1990. Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art.

5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8072.htm>. Acesso em: 03/05/2021.

39 BRASIL4. Lei Nº 6.368, de 21 de outubro de 1976. Dispõe sobre medidas de prevenção e repressão ao

tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6368.htm>. Acesso em: 03/05/2021.

40 BRASIL6. Lei Nº 10.409, de 11 de janeiro de 2002. Dispõe sobre a prevenção, o tratamento, a

fiscalização, o controle e a repressão à produção, ao uso e ao tráfico ilícitos de produtos, substâncias ou drogas ilícitas que causem dependência física ou psíquica, assim elencados pelo Ministério da Saúde, e

dá outras providências. Disponível em:

(28)

sofrendo muitos vetos do então Presidente da República, tornando-se assim obsoleto para seu objetivo.

Após um longo trâmite nas casas legislativas, vetos Presidenciais e muita discussão, a lei nº 11.343/200641 foi sancionada. Ainda que com muitos problemas e

diversas falhas, é claramente superior às normativas dispostas nas Leis nº 6.368/1976 e nº 10.409/2002.

4.2 CONCEITO DE DROGAS

Diferentemente do que trazia na Lei nº 6.368/1976, em que era considerado droga como

As substâncias ou produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União.42

A nova Lei nº 11.343/2006 optou por utilizar somente o termo “drogas”, essa expressão que já era utilizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Isso porque a terminologia anterior deixaria aberta a margem para uma interpretação muito grande sobre o conceito de drogas, uma vez que é de conhecimento unanime que nem tudo aquilo que gera dependência é considerado droga.

E para fins legais, são consideradas drogas:

Art. 1º Esta Lei institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes.

Parágrafo único. Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim

11%20DE%20JANEIRO%20DE%202002.&text=Disp%C3%B5e%20sobre%20a%20preven%C3%A7%C3 %A3o%2C%20o,Sa%C3%BAde%2C%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias.>. Acesso em: 03/05/2021.

41 BRASIL7. Lei Nº 11.343, de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas

sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm>. Acesso em: 03/05/2021.

(29)

especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União.43 (Grifo nosso)

É de fácil entendimento que os artigos previstos na Lei de Drogas tratam-se de normas penais em branco. Ou seja, os tipos penais ali elencados dependem de complementação, seja por lei ou ato administrativo.

Portanto, por meio do Decreto nº 5.912 de 27 de setembro de 2006 determinou que ficasse à cargo do Ministério da Saúde publicar listas atualizadas, periodicamente, das substâncias que são consideradas drogas.

De forma delegada, ficou a cargo da Anvisa regulamentar, por meio da portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998, as substâncias que sofrem uma “fiscalização especial”, ou seja, aquelas que estão sujeitas à subsunção dos crimes previstos na Lei aqui discutida.

Ainda, o simples fato de a droga estar incluída na portaria já caracteriza o fato típico, afastando assim qualquer possibilidade de necessidade da realização de um exame pericial, sendo esse o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça.

Por outro lado, caso ocorra que a substância apreendida ou encontrada não esteja listada na Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998, ainda que possa esta gerar dependência, não poderá essa ser usada como instrumento complementador para a caracterização do tipo penal na norma em branco.

4.3 ART. 33 DA LEI 11.343/2006 – CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS

O Art. 33 da Lei de Drogas conceitua o crime de tráfico, trazendo em si 18 verbos-núcleos que caracterizam o crime de tráfico, vejamos:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:44

43 BRASIL7. Acesso em: 03/05/2021. 44 Ibid. Acesso em: 03/05/2021.

(30)

Ainda que no Art. 5, XLIII da Constituição Federal45, bem como o art. 2º da Lei dos

Crimes Hediondos46 (Lei n.º 8.072/90) tragam a expressão “tráfico ilícito de entorpecentes

e drogas afins”, a Lei nº 11.343/2006 optou por não trazer essa expressão em seu texto legislativo. Entretanto, ainda que não tenha sido usada a expressão “tráfico de drogas” no art. 33 e seguintes, o artigo 44 da Lei de Drogas traz em seu texto algumas vedações que refletem nos crimes previstos no art. 33, vejamos:

Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.47

Ora, se a própria Lei traz em seu texto as mesmas restrições previstas na lei dos crimes hediondos, se faz adequado a adequação por semelhança dos crimes citados no referido artigo acima colacionado.

Diferentemente de outros crimes nos quais o bem jurídico protegido é objetivo, como no art. 121 do Código Penal48, crime de homicídio, no qual o bem jurídico protegido

é a vida, aqui no art. 33 da Lei 11.343/200649 o bem jurídico é algo abstrato, como a

saúde pública e a saúde individual de pessoas que integram a sociedade, os cidadãos. Conforme ensina Paulo Queiroz:

[...] o tráfico é, a rigor, um crime sem vítima, porque cabe ao indivíduo (capaz), senhor que é de sua própria saúde, decidir sobre o que consumir ou não consumir.50

Ademais, o crime de tráfico de drogas, com exceção do núcleo prescrever, que exige uma qualidade especial do agente, é um crime comum, ou seja, pode ser praticado por qualquer um.

45 BRASIL2. Acesso em: 03/05/2021. 46 BRASIL5. Acesso em: 03/05/2021. 47 BRASIL7. Acesso em: 03/05/2021.

48 BRASIL1. Código Penal. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 03/05/2021.

49 BRASIL7, op. cit. Acesso em: 03/05/2021.

50 QUEIROZ, Paulo. A propósito do bem jurídico protegido no tráfico de Drogas e Afins. Disponível

em <https://www.pauloqueiroz.net/a-proposito-do-bem-juridico-protegido-no-trafico-de-droga-e-afins>. Acesso em: 03/05/2021.

(31)

O caput do Art. 33º51 não determina expressamente o que se configura como

tráfico de drogas, e sim traz no seu texto 18 núcleos que irão tipificar o crime, são eles: “Importar” que significa trazer de fora para dentro, não tendo a necessidade de chegar em seu destinatário final, o que irá consumar o crime é o momento que a droga ingressa o território nacional. “Exportar” que é o ato de enviar a droga para fora do território nacional, o qual pode acontecer que quando da consumação do referido tipo, o autor já tenha incorrido em outros tipos; bem como consuma-se o tipo quando a droga sai do território nacional. “Remeter” significa transportar a droga em território nacional, que seguindo o entendimento do STJ, não há necessidade de chegar ao seu destinatário final, uma vez que isso caracterizaria “mero exaurimento do crime”.

Na sequência, “Preparar” configura o tipo penal a combinação de duas substâncias a fim de chegar na droga, ressaltando-se que a utilização de duas drogas para chegar em uma terceira não incorre no referido tipo penal. “Produzir” consiste em criar uma nova droga, distingue-se de o núcleo “preparar”, uma vez que o mesmo exige menos criatividade para sua realização. “Fabricar” ainda que possua sentidos semelhantes aos dois tipos colacionados - preparar e produzir -, o referido núcleo necessita do emprego de aparatos e meios mecânicos industriais para a criação da droga.

Ainda, “Adquirir” consiste na aquisição da droga, seja por meio oneroso (compra) ou gratuito (doação), sendo desnecessária a consumação da transação, bastando apenas para caracterização do tipo penal o mero acordo verbal. “Vender” é a alienação onerosa mediante contraprestação, a qual não precisa necessariamente ser dinheiro. Expor à venda caracteriza-se com a exibição da droga para que seja realizada a venda onerosa do entorpecente. “Oferecer” ocorre quando é oferecido à um terceiro a droga, seja ela de forma gratuita ou onerosa. “Ter em depósito” significa manter armazenado em algum local a droga pertencente ao próprio agente da conduta e transportar fica caracterizado o núcleo do tipo quando a droga é transportada de uma localidade para a outra, sem possibilidade de uso imediato.

Por fim, “Trazer consigo” significa levar a droga de um local para o outro, com a peculiaridade da proximidade entre a proximidade entre o entorpecente e o agente.

(32)

“Ocultar” se caracteriza pela ocultação da droga, o qual se diferencia de o núcleo “ter em depósito” uma vez que o núcleo aqui exemplificado tem a real intenção de omitir a real localidade da droga. “Prescrever” significa receitar a droga para uso de outrem e ministrar é a introdução da droga no organismo de outrem. “Entregar” a consumo visa abarcar as ações não enquadradas nos outros verbos, que pressupõe a tradição da droga à terceiros. Da mesma forma que o entregar à consumo, no Fornecer é necessária à tradição da droga para terceiro, contudo na presente remete à uma atuação continuada, ocorrendo mais de uma vez.

Conforme se verifica, o tipo penal do Art. 3352 trata-se de um tipo penal misto

alternativo, ou seja, o agente pode incorrer em mais de um núcleo do tipo, mas será apenas acusado de um crime. Isso não impede que a ocorrência de mais de uma ação seja utilizada na dosimetria da pena, desde que seja observada à restrição ao bis in idem. Ou seja, qualquer um que praticar um ato, que tenha como “atitude principal” ou “secundária” qualquer um dos verbos presentes no referido artigo, responderá pelo art. 33, tráfico de drogas, com a pena cominada de reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa53.

Verifica-se, portanto, que não há qualquer parâmetro quantitativo nos artigos da Lei, nem mesmo no art. 28 do mesmo dispositivo legal, que trata dos usuários, apresentam regras para quando deve-se ser enquadrado como traficante (art. 33) ou usuário (art. 28):

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas;

II - prestação de serviços à comunidade;

III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.54

Verifica-se, portanto, que a Lei traz em si especificações e parâmetros para que não se deixe na mão do julgador a forma na qual será o agente enquadrado, se como usuário, nos termos do art. 28 ou como traficante, nos termos do art. 33.

52 BRASIL7. Acesso em: 03/05/2021.

53 BRASIL7, loc. cit. Acesso em: 03/05/2021. 54 BRASIL7, loc. cit. Acesso em: 03/05/2021.

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Com isso, podemos indagar qual seria a real intenção do legislador ao deixar de inserir no texto da lei qualquer quantificação da quantidade, seria essa uma forma de punir da mesma forma o “grande traficante” e aquele que traz consigo uma quantidade irrisória, apenas para sanar seu vício.

Temos nos Tribunais Brasileiros julgadores de todos os tipos, linhas e teorias, os mais punitivistas, que veem na pena uma forma de “ensinar” o infrator e a população de que o delito é errado, e que o Estado está ali para coibir essas atitudes. Existem também aqueles que entendem que a “pena”, ainda que carregue esse estigma, deve ser algo para reabilitar e readequar o infrator à sociedade, que entende os problemas que uma pena desproporcional pode trazer mais malefícios do que benefícios para o infrator.

Também, não se faz justo e nem correto a aplicação da norma pura e simples. No direito Brasileiro temos, além da legislação normativa, a doutrina e jurisprudência, dessa forma, faz-se necessário a análise de caso a caso para que seja entendido o contexto em que a infração foi cometida.

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5. ENTENDIMENTOJURISPRUDENCIAL

Uma das maiores fontes do Poder Judiciário são as jurisprudências, é cediço que todos os casos concretos geram interpretações diferentes. Os juristas e, nesse caso, principalmente os julgadores, estão sempre divergindo nas formas de esmiuçar o caso concreto fazendo a subsunção a um determinado tipo penal, fazendo assim que a jurisprudência seja um dos principais critérios de embasamento no julgamento de casos semelhantes.

Ainda que os julgados muitas vezes não tenham seus efeitos vinculantes, apenas pelo fato de decidir de uma forma diversa daquela que vinha sendo aplicada, surge-se os chamados precedentes, que são essenciais para que o sistema judiciário não permaneça “engessado” e estático em face das mudanças na sociedade.

Especificamente falando da matéria aqui discutida e sua possibilidade de aplicação, os Tribunais Estaduais mantêm uma linha muito semelhante de decisões, muitas vezes para facilitar o julgamento e desobstruir o judiciário.

Entretanto, fica à cargo dos Tribunais Superiores, ou seja, Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, novas decisões que possam divergir do que é firmado atualmente.

5.1 JURISPRUDÊNCIANOSTRIBUNAISESTADUAIS

Abaixo apresentamos algumas jurisprudências referentes a presente temática encontrada nos r. Tribunais Estaduais brasileiros:

APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS - DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE PORTE DE DROGA PARA CONSUMO PESSOAL - IMPOSSIBILIDADE - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - INAPLICABILIDADE. Se as provas permitirem afirmar que os entorpecentes apreendidos pertenciam ao apelante e se destinavam a terceiros, a manutenção da condenação pelo crime do artigo 33 da Lei 11.343/06 é imperiosa. Tendo em vista a natureza do

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