C O M E N T Á R I O S
À L E I D E
T O R T U R A
P o r R o n a l d o E n t r i n g e
P r o f e s s o r e C o a c h
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Comece estudando o texto da lei, ipsis litteris.
É o estudo de "Lei Seca". Pelo menos 01 (um) hora de estudos.
Não se preocupe com tempo. Quando você voltar a estudar esta lei, ficará mais fácil a assimilação. Após, estude doutrina relacionada à questões controvertidas e conceitos doutrinários. Se nesse estudo
houver um assunto relacionado à outros temas, como por exemplo, do Código de Processo Penal, faça um estudo conexo, simultaneamente.
Logo depois, estude jurisprudência.
E por último, faça muitos exercícios relacionado ao assunto, fundamental para completar o estudo.
Como dica na compra de livros, sugiro os livros de renomados autores, como por exemplo, Gabriel Habbid, Renato Brasileiro e Guilherme de Souza Nucci.
Atenção: Não se preocupe com o tempo de estudos!
DICAS DE ESTUDO
Lei n. 9.455/97
Art. 1º Constitui crime de tortura:
I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave
ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
Pena - reclusão, de dois a oito anos.
§ 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a
sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.
§ 2º Aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de um a quatro anos.
§ 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos.
§ 4º Aumenta-se a pena de um sexto até um terço: I - se o crime é cometido por agente público;
II - se o crime é cometido contra criança, gestante, deficiente e adolescente;
II – se o crime é cometido contra criança, gestante, portador de deficiência, adolescente ou maior de 60 (sessenta) anos; (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)
III - se o crime é cometido mediante sequestro
.§ 5º A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.
§ 6º O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.
§ 7º O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado.
Art. 2º O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira. Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 4º Revoga-se o art. 233 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente.
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Lei n. 9.455/97
O primeiro ponto de destaque diz respeito à previsão normativa em relação ao crime de tortura.
Em nível internacional, há Tratados Internacionais sobre Crime de Tortura que a Republica Federativa do Brasil assumiu o dever de reprimir, in verbis:
1 - Convenção Contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos e Degradantes; 2 - Convenção Interamericana para Punir e Prevenir a Tortura;
Em âmbito nacional, a Constituição da República Federativa do Brasil faz previsão em 02(dois) momentos:
O primeiro, em seu art. 5º, III, in verbis:
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Comentários à Lei de Tortura
O segundo, no inciso XLIII, do art. 5º:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
...
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento
desumano ou degradante;
XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis
de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos
como crimes hediondos, por eles respondendo os
mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se
omitirem;
Em âmbito infraconstitucional, a primeira lei que regulamentou crime de tortura foi a de n.º 8.069/1990, no seu artigo 233, in verbis, que logo depois foi revogada pela lei n.º 9.455/1997.
Art. 233. Submeter criança ou adolescente sob sua
autoridade, guarda ou vigilância a tortura:
Pena - reclusão de um a cinco anos.
§ 1º Se resultar lesão corporal grave:
Pena - reclusão de dois a oito anos.
§ 2º Se resultar lesão corporal gravíssima:
Pena - reclusão de quatro a doze anos.
§ 3º Se resultar morte:
Lei n. 9.455/97
CONCEITO
A legislação brasileira não conceituou o crime de tortura, diferentemente da Convenção Contra
Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos e Degradantes, que no seu art. 1º, prevê, in verbis:
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Comentários à Lei de Tortura
Primeiramente, a Lei de Tortura não etiquetou como um crime próprio, mas sim comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa, salvo em algumas hipóteses que serão analisados mais à frente. Agindo dessa forma, a legislação brasileira destoou do previsto em tratados internacionais, que foram seguidos por alguns países. Exemplo é o crime praticado por
seguranças ou vigilantes de estabelecimentos comerciais, após a detenção de meliante para confissão de crime praticado ou como castigo.
PARTE I
Artigo 1.
1. Para os fins desta Convenção, o termo "tortura" designa qualquer ato pelo
qual uma violenta dor ou sofrimento, físico ou mental, é infligido
intencionalmente a uma pessoa, com o fim de se obter dela ou de uma terceira
pessoa informações ou confissão; de puni-la por um ato que ela ou uma
terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar
ou coagir ela ou uma terceira pessoa; ou por qualquer razão baseada em
discriminação de qualquer espécie, quando tal dor ou sofrimento é imposto por
um funcionário público ou por outra pessoa atuando no exercício de funções
públicas, ou ainda por instigação dele ou com o seu consentimento ou
aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que
sejam consequência, inerentes ou decorrentes de sanções legítimas.
BEM JURÍDICO TUTELADO
É a dignidade da pessoa humana, sua integridade física e mental. ANÁLISE DOS TIPOS PENAIS DA LEI DE TORTURA.
Art. 1º Constitui crime de tortura:
I - constranger alguém com emprego de violência ou grave
ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da
vítima ou de terceira pessoa;
b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
c) em razão de discriminação racial ou religiosa;
Hodiernamente, sendo sujeito passivo criança ou adolescente, vítima do crime de tortura, haverá a incidência normativa da Lei n.º 9.455/1997.
Lei n. 9.455/97
ANÁLISE DO NÚCLEO DO TIPO: O comportamento do agente visa forçar alguém a fazer alguma coisa que não queira, contra a sua vontade.
SUJEITO: Tanto o sujeito ativo, quanto o sujeito passivo podem ser qualquer pessoa, não se exige qualidade especial para a pratica de crime. Não é crime próprio ou de mão-própria.
VIOLÊNCIA: é aquela que se constitui em agressão física.
GRAVE AMEAÇA é aquela que se constitui em intimidação (promessa de mal injusto, castigo), que cause um temor psicológico na vítima.
SOFRIMENTO FÍSICO OU MENTAL.
FÍSICO: é o que resulta em padecimento, dor em nível de corporal.
MENTAL: é a aflição e angústia que causa um sofrimento de ordem psicológica. OBJETO MATERIAL: é a pessoa que sofre a tortura.
OBJETO JURÍDICO: diz respeito tanto a liberdade do ser humano como, também, a sua integridade física e mental. Visa proteger a integridade corporal, a saúde física e psicológica das vítimas. Se por acaso, o crime for praticado por agente público, tutela-se Administração Pública, secundariamente. ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO: É o dolo, não existindo a forma culposa.
Os ELEMENTOS SUBJETIVOS ESPECÍFICOS DO TIPO são aqueles previstos nas alíneas “a”, “b” e “c”, do inciso I, do art. 1º, in verbis:
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Comentários à Lei de Tortura
Segundo a melhor doutrina, não se exige que a informação, declaração ou confissão tenha conteúdo de natureza criminal, motivo pelo qual este crime pode ser cometido por qualquer pessoa, e não exclusivamente por um agente público. Exemplo dito em linhas pregressas, é o caso do segurança e vigilante de estabelecimento comercial que prende o suspeito de crime e constrange-o a confessar o crime de furto praticado.
Atente-se para o fato de que se o crime de tortura for cometido para pratica de outro crime pelo TORTURADOR, haverá a incidência do PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. Por exemplo, o
torturador obriga a vítima a fornecer a senha de seu cartão bancário, caso em que responderá apenas pelo crime de extorsão.
TORTURA-PROBATÓRIA, PERSECUTÓRIA OU CONFISSÃO DA VÍTIMA.
Alínea “a”, do inciso I, do art. 1º, Lei n.º 9.455/1997.
“obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira
pessoa”;
Lei n. 9.455/97
Aqui, o dolo do agente é constranger a vítima a pratica de conduta criminosa, de forma comissiva ou omissiva, compelindo-a a matar alguém ou deixar de prestar socorro, sem risco pessoal, por exemplo. Como a lei diz: “natureza criminosa”, não se admite a tipificação no crime de tortura quando o agente visa compelir a vítima a pratica de contravenção penal. Nesse caso, haverá a incidência dos crimes de constrangimento ilegal, em concurso formal, com lesões corporais dolosas, sem olvidar da contravenção penal praticado pelo coacto, na qualidade de autor mediato, sob pena de analogia in mallan partem.
Como a vítima praticou um crime, poderá invocar em sua defesa, como exclusão de culpabilidade, COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL, na vertente INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA, nos termos do art. 22, do Código Penal.
Já o TORTURADOR responderá pelo crime de tortura, além do crime praticado pela vítima, como autor mediato, tudo na forma do art. 69, do Código Penal – CONCURSO MATERIAL.
Assim, tem-se o exemplo do torturador que tortura alguém para mentir em juízo, na qualidade de testemunha. A vítima não responde por falso testemunho. Já o torturador responde pelo crime de tortura e como autor mediante pelo crime de falso testemunho.
CLASSIFICAÇÃO: COMUM, para o sujeito ativo e passivo; FORMAL, comissivo, de dano, instantâneo, admite tentativa.
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Comentários à Lei de Tortura
Nesta hipótese, o constrangimento empregado contra a vítima tem por objetivo obrigá-la a realizar um comportamento, qualquer que seja, pelo simples fato de sua condição racial ou religiosa.
No entendimento do eminente Fernando Capez, doutrinador e Procurador de Justiça do Estado de São Paulo, assim entende, in verbis:
TORTURA-DISCRIMINATÓRIA, PRECONCEITUOSA OU TORTURA RACISMO
Art. 1º, inciso I, letra “b”, da Lei n.º 9.455/1997.
“por motivo de discriminação racial ou religiosa”.
“Em assim sendo, temos que constitui crime de tortura a ação de constranger alguém, com
o emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental, a
realizar ou deixar de realizar qualquer ação, em razão de discriminação racional ou
religiosa. Assim, não é necessário que o coator vise uma conduta específica da vítima
relacionada em lei, como sucede nas demais alíneas. Basta que a tortura seja empregada
com o fim de obter qualquer ação ou omissão da vítima, desde que seja motivada por
discriminação racional ou religiosa. É o caso, por exemplo, do indivíduo que, mediante
tortura, impede o livre exercício de um direito por um indivíduo (por exemplo, vedar a
entrada em determinado estabelecimento, proibir o exercício de culto religioso etc.), pelo
simples fato de ele ser negro, japonês etc. ou pelo fato de ele professar determinada
religião. Nesse caso, além da tortura, responderá por um dos crimes de racismo (Lei n.
7.716/89), em concurso formal imperfeito.”
“provocar ação ou omissão de natureza criminosa”
TORTURA-CRIME
Lei n. 9.455/97
Atenção maior deve ser dada a esta alínea! O legislador previu a tortura apenas pelos motivos RACIAL e RELIGIOSOSO. Assim, qualquer outra forma de tortura empregada por motivo que não seja racial ou religiosa poderá configurar crime de constrangimento ilegal e racismo, em concurso formal
imperfeito, nos termos do art. 70, segunda parte, do Código Penal.
Então, praticar tortura pelo simples fato de a pessoa (vítima) ser homossexual, não configura tortura-discriminação.
Homofobia significa aversão irreprimível, repugnância, medo, ódio, preconceito que algumas pessoas, ou grupos nutrem contra os homossexuais, lésbicas, bissexuais e transexuais, motivo pelo qual não está abrangida pela alínea “c”. A Lei de Tortura não previu a discriminação sexual.
CLASSIFICAÇÃO: COMUM, para o sujeito ativo e passivo; FORMAL, comissivo, de dano, instantâneo, admite tentativa.
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Comentários à Lei de Tortura
SUJEITOS
Sujeito Ativo: Comum Sujeito Passivo: Comum.
Trata-se de CRIME BICOMUM. MODO DE EXECUÇÃO
Com emprego de violência ou grave ameaça. CONSUMAÇÃO OCORRE
Com o sofrimento físico ou mental (psicológico). Sem ter havido SOFRIMENTO, ocorreu apenas TENTATIVA.
FINALIDADE
Com o fim de obter :
Informação. TORTURA-PROVA Ação Criminosa. TORTURA-CRIME Por motivo de:
Lei n. 9.455/97
Art. 1º, inciso II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com
emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental,
como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.
Pena - reclusão, de dois a oito anos.
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Comentários à Lei de Tortura
TORTURA-CASTIGO ou TORTURA PUNITIVA
SUJEITOS
Constranger alguém
Sujeito Ativo: Próprio. É autoridade.
Sujeito Passivo: Próprio. Quem está sob Autoridade do sujeito ativo.
Trata-se de CRIME PRÓPRIO ou BIPRÓPRIO. MODO DE EXECUÇÃO
Com emprego de violência ou grave ameaça. CONSUMAÇÃO OCORRE
Com INTENSO sofrimento físico ou mental (psicológico). Se não ocorreu INTENSO sofrimento, ficou na esfera da TENTATIVA.
FINALIDADE
TORTURA-CASTIGO
DOLO em aplicar castigo pessoal, porque fez ou deixou de fazer algo (de indisciplina ou não) ou medida de caráter preventivo, como aviso para futura indisciplina.
Lei n. 9.455/97
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Comentários à Lei de Tortura
O TORTURADOR emprega violência ou grave ameaça à vítima, causando-lhe intenso sofrimento, físico ou psicológico na vítima, como forma de castigar por algo que a vítima fez ou deixou de fazer. Deve-se buscar a causa do castigo infligido à vítima, mediante tortura, para fins de incidência deste inciso.
A pedra de toque nesse inciso é a INTENSIDADE do sofrimento provocado na vítima por conta da tortura. Se não ficar comprovado que a violência ou grave ameaça provocou na vítima INTENSO sofrimento,
restará configurado o crime de maus-tratos, previsto no art. 136, do Código Penal. A diferença, portanto, do crime de tortura e o crime de maus-tratos, art. 136, do CP, está exatamente na intensidade do sofrimento provocado na vítima.
No que diz respeito à elementar “medida de caráter preventivo”, o TORTURADOR emprega violência ou grave ameaça, causando intenso sofrimento físico ou psicológico, como aviso à vítima caso venha praticar uma indisciplina.
A vítima deve estar em condição de submissão ao agente, seja por meio de guarda, poder ou autoridade. Por GUARDA, tem-se por vigilância permanente. PODER, decorre do exercício de cargo ou função pública. E, AUTORIDADE, é o que decorre do poder familiar, tutela e curatela.
Trata-se de CRIME PRÓPRIO, tanto para o sujeito ativo ou passivo. É o que a doutrina costuma designar de CRIME BIPRÓPRIO.
EXEMPLOS:
1 - Babá que surra uma criança porque fez xixi na roupa.
2 - Enfermeira que castiga uma idosa porque fez suas necessidade fisiológica na roupa, infligindo intenso sofrimento, mediante violência ou grave ameaça.
3 - Polícia Militar parando pessoas na rua e aplicando castigo, como medida de caráter preventivo, como ocorreu, em Diadema, no ano de 1997.
CONSUMAÇÃO
Consuma-se com INTENSO SOFRIMENTO. Deve ficar comprovado, mediante perícia (VIOLÊNCIA FÍSICA) ou por meios de circunstancias objetivas externas (GRAVE AMEAÇA), que a vítima sofreu intensamente diante da violência física ou temor psicológico empregado pelo agente, sob pena de restar configurado maus-tratos ou lesão corporal.
Por conta da exigência de laudo pericial que a doutrina entende tratar-se de CRIME MATERIAL.
A tentativa ocorrerá quando, embora empregado ou na iminência do emprego dos meios necessários para causar intenso ou apenas sofrimento, estes não ocorram. É a produção do resultado, in casu, sofrimento físico ou mental, que se tem por consumado o crime.
Por exemplo, na hipótese do artigo 1º, inciso I, alínea “a”, basta ter havido a pratica de violência ou grave ameaça, visando à confissão, mesmo que esta não ocorra, mas imprescindível o sofrimento infligido, que se tem por consumado o crime. Em regra, é imprescindível que ocorra o sofrimento, ainda que o fim
visado não venha ocorrer, para fins de consumação. TENTATIVA
Assim, a tentativa ocorre, quando empregada a violência ou grave ameaça tem-se interrompida a conduta do agente por circunstancias alheias à sua vontade, antes que resulte em sofrimento à vítima. Ex.: estando a vítima já amarrada, esta não chega a receber choques ou golpes, não restando configurado o sofrimento. CLASSIFICAÇÃO: PRÓPRIO (para o sujeito ativo e passivo), MATERIAL, comissivo, de dano, instantâneo,
admite tentativa.
No estudo deste inciso, a doutrina costuma estabelecer DIFERENÇAS entre o crime de TORTURA e MAUS TRATOS.
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Comentários à Lei de Tortura
TORTURA
O DOLO do agente é o de
causar padecimento. Não tem
cunho educativo.
O que motiva o torturador é a
vontade de fazer a vítima sofrer
por sadismo, ódio,
desnecessariamente
Trata-se de CRIME DE DANO. .
MAUS-TRATOS
O DOLO do agente tem caráter
educativo. Visa repreender uma
indisciplina.
O elemento subjetivo é o animus
corrigendi ou disciplinandi.
É CRIME DE PERIGO
CONCRETO.
Consuma-se com a exposição a
perigo a vida ou a saúde, em
razão do excesso no uso dos
meios de correção ou disciplina.
Art. 1º, § 1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou
sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por
intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de
medida legal.
“Pena - reclusão, de dois a oito anos.”
SUJEITOS
Constranger alguém
Sujeito Ativo: COMUM. É autoridade OU NÃO.
Sujeito Passivo: PRÓPRIO. Quem está sob Autoridade do sujeito ativo. Trata-se de CRIME PRÓPRIO.
Trata-se de CRIME DE AÇÃO LIVRE. Qualquer comportamento ilegal, ou seja, sem previsão em lei.
MODO DE EXECUÇÃO
Não necessariamente com o emprego de violência ou grave ameaça. CONSUMAÇÃO OCORRE
Com sofrimento físico ou mental (psicológico).
Se não ocorreu SOFRIMENTO, ficou na esfera da TENTATIVA. FINALIDADE
Lei n. 9.455/97
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Comentários à Lei de Tortura
“Assim, expor uma pessoa algemada, sem que haja necessidade
do uso da algema, ou exibir presos nus apenas com o fim de
humilhá-los configura abuso de autoridade e não tortura. Em
contrapartida, saborear uma iguaria na presença de alguém
privado há dias de alimentação caracteriza tortura”.
SUJEITOS
Preliminarmente, trata-se de CRIME COMUM que só pode ser praticado por pessoa que tiver a guarda de pessoa presa ou sujeita a medida de segurança, por ação ou omissão de agente público ou não, e, a vítima, por sua vez, tem que ser pessoa que está presa
(encarcerada) ou sujeita à medida de segurança.
A conduta do agente está consubstanciada em “submeter”, sem o emprego de violência ou grave ameaça como previsto precedentemente. Quer significar subjugar, dominar, por meio de atos, comportamentos, medidas não previstas em lei. Trata-se de NORMA PENAL EM BRANCO. A título de exemplo, colocar o preso em cela escura.
O dolo do agente visa sujeitar, IMPOR, SUBJUGAR pessoa presa ou sujeita a medida de
segurança a sofrimento (não necessariamente intenso) físico ou mental, por intermédio da prática de qualquer ato sem previsão legal.
A título de exemplo, trazemos à colação exemplos de Fernando Capez, in verbis:
CONSUMAÇÃO E TENTATIVA
Consuma-se com o sofrimento físico ou mental infligido à vítima. A tentativa ocorre
quando, embora praticado qualquer ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal, não resulta em sofrimento físico ou mental à vítima.
EXEMPLO: Adolescente colocada para cumprir medida socioeducativa, de forma ilegal, em cela, juntamente com presos, vindo a sofre abuso sexual. A autoridade policial
responde pelo crime de tortura, além do crime sexual, na qualidade de garantes ou garantidores. Esse exemplo ocorreu no Estado do Pará.
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Comentários à Lei de Tortura
Art. 5º, inciso XLIII, da CR/88 - a lei considerará crimes inafiançáveis
e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico
ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos
como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os
executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;
Por conta desse equívoco legislativo, surgiu 03(três) correntes:
PRIMEIRA CORRENTE: Trata-se de uma exceção prevista em lei. É uma exceção pluralista à Teoria Monista. É a que prevalece!
SEGUNDA CORRENTE: Entende-se que esse § 2º é inconstitucional. O juiz, no momento em que prolatar sentença, tem que ignorar a pena de 1 a 4 e aplicar a pena de 2 a 8, isso porque a Lei Maior manda equiparar as consequências para o omitente. A pena a ser aplicada ao torturador e para o omitente, na condição de garantidor, deve ser mesma.
TERCEIRA CORRENTE: Trata-se, na verdade, de uma omissão culposa. Logo, em se tratando de omissão dolosa, responderá o omitente com a mesma pena do torturador, de 2 a 8 anos, como
partícipe, nos termos do art. 29, do Código Penal, cuja interpretação estaria em conformidade com a Constituição da República. Esta posição é adotada pelo Doutor Fábio Bechara.
O § 2º, do art. 1º, prevê 02(duas) espécies de crime omissivo:
1. Omissão praticada por quem tinha o dever de evitar a tortura;
2. Omissão praticada por quem tinha o dever de apurar a prática da tortura.
No primeiro caso, tem-se OMISSÃO IMPRÓPRIA. E na segunda, OMISSÃO PRÓPRIA.
Na OMISSÃO IMPRÓPRIA, tem-se a figura do garante ou do garantidor como sujeito ativo. É aquele que tem o dever de evitar a pratica do crime. Por exemplo, os pais que têm dever de evitar tortura em face dos filhos, o Delegado de Polícia que tem o dever de evitar tortura na delegacia, bem como o médico tem o dever de evitar tortura nos hospitais em face dos doentes, etc. Reparem que o sujeito ativo é o garante ou garantidor.
Há uma contradição legislativa na edição deste parágrafo com o que a Constituição da República prevê para os casos de omissão praticadas pelos garantes ou garantidores, no que concerne à sanção penal. Na Lei de Tortura, a pena aplicada para o garante ou garantidores deveria ser mesma prevista para os
mandantes e executores do crime de tortura, mas na lei de tortura a pena é inferior à prevista para o executor.
Na OMISSÃO IMPRÓPRIA, garante será punido com pena de 1 a 4 anos, enquanto ao executor do crime de tortura será punida, segundo o art. 1º, inciso I, letra “a”, por exemplo, com pena de 2 a 8 anos.
O legislador foi infeliz, pois a Constituição Federal diz que o omitente deve responder do mesmo modo que o torturador, aplicando-se a ambos a mesma pena.
§ 2º - Aquele que se omite em face dessas condutas,
quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na
pena de detenção de um a quatro anos.
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FORMA QUALIFICADA DO CRIME DE TORTURA
§ 3º - Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é
de reclusão de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a
dezesseis anos.
Trata-se de uma qualificadora de natureza preterdolosa ou preterintencional.
PERGUNTA-SE: Essa qualificadora abrange todos os crimes de tortura, inclusive os omissivos? A questão é controversa!
PRIMEIRA CORRENTE: Há doutrinadores que a referida qualificadora aplica-se também para ao
garante, na omissão imprópria, pois tinha o dever de agir e não o fez, quando podia. Tinha o dever de evitar e não evitou, devendo responde pelo resultado qualificado a título de culpa.
SEGUNDA CORRENTE: É a que prevalece, entendo esse § 3º só qualifica a tortura por ação, conduta comissiva.
CAUSAS DE AUMENTO DE PENA.
§ 4º - Aumenta-se a pena de um sexto até um terço:
I - se o crime é cometido por agente público;
II - se o crime é cometido contra criança, gestante,
portador de deficiência, adolescente ou maior de 60
(sessenta) anos;
III - se o crime é cometido mediante sequestro.
OMISSÃO PRÓPRIA
A segunda espécie de tortura-omissão é a omissão própria, aquela que o omitente tem o dever de apurar. Exemplo: Acusado, em audiência, afirma que foi torturado pela polícia civil ou militar. O promotor deve solicitar a extração de cópias e remeter para a
respectiva corregedoria, e, se não ficar provado que houve tortura, deve o promotor de justiça oferecer nova denuncia contra o acusado, por crime de denunciação caluniosa. SUJEITO ATIVO: É quem tem o dever de apurar.
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Comentários à Lei de Tortura
ATENÇÃO. Segundo o eminente doutrinador Alberto Silva Franco, sob pena de bis in idem, se o
sujeito ativo no tipo penal for agente público, como elementar do tipo, não poderá incidir a referida causa de aumento de pena, pois se estaria punido duas vezes pela mesma circunstância. Ou seja,
esta majorante não incide nos casos em que agente público já é elementar do tipo, a exemplo do art. 1º, inciso II, in verbis:
II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com
emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento
físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou
medida de caráter preventivo.
Mas segundo GUILHERME DE SOUZA NUCCI, em posição discordante, aplica-se esta causa de
aumento mesmo nessas hipóteses, pois não são praticados somente por funcionários públicos, mas sim, também, por pais, professores, médicos, etc. Então para NUCCI, não existe tipo penal exclusivo praticado por agente público na Lei de Tortura. Quando se diz “sob autoridade”, abrange pai com filho, tutor com tutelado, curador com curatelado, médico com paciente, professor com aluno, etc.
INCISO II – Por esta causa de aumento de pena, incide quando o sujeito passivo for criança até os 12 anos incompletos, segundo o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente. Em relação ao idoso,
somente no dia seguinte depois de completar 60 anos. No dia em quem o idoso completar 60 anos, não incide a majorante, mas somente no dia seguinte.
INCISO III – O inciso III aumenta a pena se a tortura é praticada mediante sequestro, bem como
“cárcere privado”, muito embora não tenha sido previsto no inciso. Isto porque o “cárcere privado” nada mais é do que o sequestro com confinamento.
EFEITOS DA CONDENAÇÃO.
§ 5º - A condenação acarretará a perda do cargo, função ou emprego
público e a interdição para seu exercício pelo dobro do prazo da pena
aplicada.
ATENÇÃO: Este efeito da condenação é automático, independentemente de motivação, diferentemente do previsto no Código Penal, art. 92, que necessita que o juiz
fundamente a perda do cargo, declinando os motivos da perda do cargo. Ademais, fica o sujeito ativo impossibilitado de exercer outro cargo público pelo dobro de tempo à qual foi aplicada na sentença condenatória transitada em julgado.
Art. 92 - São também efeitos da condenação:
I - a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo:
Parágrafo único - Os efeitos de que trata este artigo não são
automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença.
Trata-se o § 4º de uma CAUSA DE AUMENTO DE PENA.
INCISO I – Agente Público é aquele conceituado no art. 327, do Código Penal, in verbis:
Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos
penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração,
exerce cargo, emprego ou função pública.
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Comentários à Lei de Tortura
Há uma corrente doutrinária que entende que o efeito automático da condenação não se aplica à tortura-omissão.
Diversamente, há outra posição, que se aplica, inclusive, em relação à OMISSÃO IMPRÓRIA, pois tinha o dever de agir e evitar o resultado, cujo mandamento constitucional afirma que todos que
praticaram o crime de tortura devem responder por ele. Segundo Rogerio Sanches, apenas não se aplica no caso de OMISSÃO PRÓPRIA o efeito automático da demissão.
Art. 5º, inciso XLIII, da CR/88 - a lei considerará crimes
inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da
tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o
terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles
respondendo os mandantes, os executores e os que,
podendo evitá-los, se omitirem.
Pela letra da lei, tortura é insuscetível de fiança, inafiançável, portanto.
No entanto, Guilherme de Souza Nucci sustenta que o delito de tortura, apesar de ser inafiançável, é possível a concessão de liberdade provisória sem fiança, desde que não estejam presentes os
requisitos da prisão preventiva, in verbis:
Crime inafiançável: cuida-se de dispositivo
decorrente da proibição constitucional (art.
5.º, XLIII). Entretanto, falar-se em delito
inafiançável, atualmente, é inútil, pois existe a
possibilidade de se conceder a qualquer
acusado a liberdade provisória, sem fiança,
desde que não estejam presentes os
requisitos para a decretação da prisão
preventiva Ora, ser um crime inafiançável não
quer dizer nada, na prática, pois o indiciado
ou réu pode ser solto pelo juiz sem o
recolhimento de nenhuma quantia em
dinheiro, vale dizer, sem pagamento de fiança.
A Lei 9.455/97 abrandou a situação do
torturador, pois proibiu somente a concessão
de liberdade provisória com fiança. Omitiu o
que vinha disposto na Lei 8.072/90
supracitada, com relação à tortura, que
vedava também a liberdade provisória sem
fiança. Passa esta a ser cabível, portanto.
Lei n. 9.455/97
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Comentários à Lei de Tortura
EMENTA Habeas corpus substitutivo de recurso ordinário constitucional. Artigo 102, inciso II, alínea a, da Constituição Federal. Inadequação da via eleita ao caso
concreto. Precedente da Primeira Turma. Flexibilização circunscrita às hipóteses de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia. Ocorrência. Tráfico de
entorpecentes. Liberdade provisória. Vedação ex lege (art. 44 da Lei nº 11.343/06). Inadmissibilidade. Necessidade de comprovação da presença dos requisitos
previstos no art. 312 do CPP.
Condenação. Pena de 5 (cinco) anos e dez (10) meses de reclusão em regime inicial fechado. Fundamentação inidônea no caso concreto. Writ extinto por inadequação da via eleita. Ordem concedida de ofício.
....
3. A inafiançabilidade do delito de tráfico de entorpecentes, estabelecida
constitucionalmente, não significa óbice à liberdade provisória, considerado o
conflito do inciso XLIII com o LXVI (“ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”), ambos do art. 5º da CF.
4. Para manter a prisão em flagrante, deve o magistrado fazê-lo com base em
elementos concretos e individualizados aptos a demonstrar a necessidade da prisão do indivíduo, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal.
5. Na hipótese em análise, contudo, ao manter a prisão cautelar do paciente, o Juízo não apontou quais teriam sido esses elementos. 6. Habeas corpus extinto, por
inadequação da via processual eleita. Ordem concedida de ofício..
No mesmo sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO
PREVENTIVA. ART. DO 312 CPP. PERICULUM LIBERTATIS. INDICAÇÃO NECESSÁRIA. FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE. RECURSO PROVIDO.
1. A jurisprudência desta Corte Superior é remansosa no sentido de que a
determinação de segregar o réu, antes de transitada em julgado a condenação, deve efetivar-se apenas se indicada, em dados concretos dos autos, a necessidade da
cautela (periculum
libertatis), à luz do disposto no art. 312 do CPP.
2. Assim, a prisão provisória se mostra legítima e compatível com a presunção de inocência somente se adotada, em caráter excepcional, mediante decisão
suficientemente motivada. Não basta invocar, para tanto, aspectos genéricos, posto que relevantes, relativos à modalidade criminosa atribuída ao acusado ou às
expectativas sociais em relação ao Poder Judiciário, decorrentes dos elevados índices de violência urbana.
3. O juiz de primeira instância - não obstante tenha relatado minuciosamente os
indícios de autoria, bem como a materialidade do delito - apontou genericamente a presença dos vetores contidos no art. 312 do Código de Processo Penal, sem indicar motivação suficiente para justificar a necessidade de colocar o recorrente
cautelarmente privado de sua liberdade, uma vez que se limitou a afirmar
-equivocadamente, diga-se - que o delito de tráfico, "segundo [a Lei n. 8072/1990], [é] insuscetível de fiança, estando a liberdade provisória reservada a situações
excepcionalíssimas, como o caso em que não se vislumbre, desde logo, qualquer envolvimento do autuado, o que não caracteriza o caso destes autos".
Na jurisprudência, o Supremo Tribunal Federal é do mesmo entendimento, cuja ementa, abaixo, embora diz respeito ao tráfico de drogas, seus fundamentos também se aplicam à Lei de Tortura.
Lei n. 9.455/97
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§ 6º O crime de tortura é inafiançável e insuscetível de graça ou anistia.
Segundo a remansosa doutrina, “graça”, no § 6º, está em sentido amplo, englobando “graça” em
sentido estrito, e o “indulto” (perdão coletivo). Logo, é vedada a concessão tanto da graça quanto do indulto à tortura, por força do art. 5.º, XLIII, da Constituição Federal.
Assim, em sede doutrinária, Fernando Capez, in verbis:
Para uma corrente, como não foi empregada a
expressão “indulto”, nada impede que tal instituto
seja concedido aos réus condenados pela prática
de tortura. Argumentam que, se o legislador
quisesse mesmo proibir o indulto, tê-lo-ia vedado
expressamente, tal como fez a Lei n. 8.072/90 (Lei
dos Crimes Hediondos) em seu art. 2º, I.
Não é a nossa posição.
Entendemos que o indulto também não pode ser
concedido para o crime de tortura. Com efeito, a
CF, em seu art. 5º, XLIII, ao proibir a concessão de
graça e anistia para a tortura, os crimes
hediondos, o terrorismo e o tráfico de drogas, não
fez também qualquer referência explícita ao termo
“indulto”. Isso não significou, porém, a exclusão
do indulto do rol de vedações, pois a Carta Magna
empregou o termo “graça” em sentido amplo,
compreendendo a graça em sentido estrito e o
indulto (chamado de graça coletiva). Por essa
razão, não importa se a Lei de Tortura referiu-se
expressamente ou não ao indulto, pois a
concessão desse benefício já estava vedada para
a tortura desde a Constituição Federal.
§ 7º - O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do
§ 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado.
O § 7º trata do regime de cumprimento de pena, seu início e progresso. Para o Supremo Tribunal Federal a lei estabelecer, abstratamente, que o condenado deverá cumprir inicialmente o regime fechado é inconstitucional, por violar o Princípio Constitucional de Individualização de Pena. Tal entendimento foi o mesmo invocado quando declarou a inconstitucionalidade do parágrafo 1º, do art. 2º, da Lei de Crimes Hediondos que previa que o condenado deveria cumprir a pena imposta integralmente em regime fechado. A decisão foi tomada em HC n.º 111.840, in verbis:
Lei n. 9.455/97
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EMENTA Habeas corpus. Penal. Tráfico de entorpecentes. Crime praticado durante a vigência da Lei nº 11.464/07. Pena inferior a 8 anos de reclusão. Obrigatoriedade de imposição do regime inicial fechado. Declaração incidental de inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90. Ofensa à garantia constitucional da individualização da pena (inciso XLVI do art. 5º da CF/88).
Fundamentação necessária (CP, art. 33, § 3º, c/c o art. 59). Possibilidade de fixação, no caso em exame, do regime
semiaberto para o início de cumprimento da pena privativa de liberdade. Ordem concedida.
1. Verifica-se que o delito foi praticado em 10/10/09, já na vigência da Lei nº 11.464/07, a qual instituiu a obrigatoriedade da
imposição do regime inicialmente fechado aos crimes hediondos e assemelhados.
2. Se a Constituição Federal menciona que a lei regulará a individualização da pena, é natural que ela exista. Do mesmo modo, os critérios para a fixação do regime prisional inicial devem-se harmonizar com as garantias constitucionais, sendo necessário exigir-se sempre a fundamentação do regime imposto, ainda que se trate de crime hediondo ou equiparado.
3. Na situação em análise, em que o paciente, condenado a
cumprir pena de seis (6) anos de reclusão, ostenta circunstâncias subjetivas favoráveis, o regime prisional, à luz do art. 33, § 2º,
alínea b, deve ser o semiaberto.
4. Tais circunstâncias não elidem a possibilidade de o
magistrado, em eventual apreciação das condições subjetivas desfavoráveis, vir a estabelecer regime prisional mais severo, desde que o faça em razão de elementos concretos e
individualizados, aptos a demonstrar a necessidade de maior rigor da medida privativa de liberdade do indivíduo, nos termos do § 3º do art. 33, c/c o art. 59, do Código Penal.
5. Ordem concedida tão somente para remover o óbice constante do § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/07, o qual determina que “[a] pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado“. Declaração incidental de inconstitucionalidade, com efeito ex
nunc, da obrigatoriedade de fixação do regime fechado para início do cumprimento de pena decorrente da condenação por crime
Lei n. 9.455/97
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No entanto, basta que a vítima seja brasileira e o infrator esteja sob jurisdição da justiça brasileira, em território nacional.
Novamente, Capez, assim entende:
Assim, temos duas hipóteses em que a lei nacional aplicar-se-á ao
cidadão que comete crime de tortura no estrangeiro:
(a) quando a vítima for brasileira: trata-se aqui da
extraterritorialidade incondicionada, pois não se exige qualquer
condição para que a lei atinja um crime cometido fora do território
nacional, ainda que o agente se encontre em território estrangeiro.
Basta somente que a vítima seja brasileira;
(b) quando o agente encontrar-se em território brasileiro: trata-se
da extraterritorialidade condicionada, pois, nesse caso, a lei
nacional só se aplica ao crime de tortura cometido no estrangeiro
se o torturador adentrar o território nacional.
Convém notar que esta última hipótese é conhecida como
princípio da jurisdição universal, da justiça cosmopolita, da
jurisdição mundial etc., pelo qual todo Estado tem o direito de
punir qualquer crime, seja qual for a nacionalidade do delinquente
e da vítima ou o local de sua prática, desde que o criminoso esteja
dentro de seu território. Finalmente, não se exige qualquer outra
condição prevista no art. 7º do Código Penal para a incidência da
lei brasileira sobre o crime de tortura praticado no estrangeiro,
pois prevalece o disciplinamento específico da Lei n. 9.455/97.
Art. 2º - O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido
cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se
o agente em local sob jurisdição brasileira.
O art. 2º traz uma hipótese de extraterritorialidade da lei penal. Ou seja, uma exceção ao Princípio da Territorialidade da Lei Brasileira, prevista no art. 5º, do Código Penal, in verbis:
Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de
convenções, tratados e regras de direito
internacional, ao crime cometido no território
nacional.
Lei n. 4.898/1965
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Art. 7º, do Código Penal - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: I - os crimes:
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil; II - os crimes:
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir; b) praticados por brasileiro;
c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados.
§ 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro.
§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.
§ 3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior:
a) não foi pedida ou foi negada a extradição; b) houve requisição do Ministro da Justiça.