Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito.
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO - NATUREZA JURÍDICA DOS
INCENTIVOS DECORRENTES DOS PROGRAMAS ESTADUAIS
DE ESTÍMULO À EMISSÃO DE NOTA FISCAL E SUA
ADERÊNCIA À LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL
Brasília - DF
2014
CARLOS TADEU DE CARVALHO MOREIRA
NATUREZA JURÍDICA DOS INCENTIVOS DECORRENTES DOS
PROGRAMAS ESTADUAIS DE ESTÍMULO À EMISSÃO DE NOTA FISCAL E SUA ADERÊNCIA À LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL
Dissertação apresentado ao Programa
de Pós-Graduação Stricto Sensu em
Direito da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito.
Orientador: Professor Doutor Julio Cesar de Aguia.
7,5cm
Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB
M838n Moreira, Carlos Tadeu de Carvalho.
Natureza jurídica dos incentivos decorrentes dos programas estaduais de estímulo à emissão de nota fiscal e sua aderência à Lei de Responsabilidade Fiscal. / Carlos Tadeu de Carvalho Moreira – 2014.
119 f.; il.: 30 cm
Dissertação (Mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2014. Orientação: Prof. Dr. Julio Cesar de Aguiar
1. Direito. 2. Brasil. Lei de responsabilidade fiscal. 3. Nota fiscal. 4. Programas de estímulo. 5. Contribuição de melhoria. I. Aguiar, Julio Cesar de, orient. II. Título.
Agradeço à minha mãe Maria dos Anjos que praticamente sozinha, criou e educou quatro filhos.
Agradeço a meus poucos e bons amigos, especialmente Letícia Valentim. Agradeço ainda à Dra. Suzana Borges Viegas de Lima que me ajudou no “abstract”.
MOREIRA, Carlos Tadeu de Carvalho. Natureza jurídica dos incentivos decorrentes dos Programas Estaduais de Estímulo à Emissão de Nota Fiscal e sua aderência à Lei de Responsabilidade Fiscal. 2014. (120 f.). Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Direito da Universidade Católica de Brasília. UCB, Brasília. 2014.
Com esta dissertação, objetiva-se analisar a natureza jurídica dos diversos benefícios atribuídos aos participantes dos programas estaduais de estímulo à emissão de nota fiscal. Também é objetivo o estudo da adequação de tais programas à Lei de Responsabilidade Fiscal, além da descrição e comparação desses mesmos programas estaduais entre si, no que tange ao fundamento legal, modus operandi, dentre outros aspectos. O estudo baseia-se em análibaseia-se bibliográfica e utilização de fontes imediatas de interesbaseia-se jurídico, como os sites dos programas de estímulo e das secretarias de fazenda. Inicialmente disserta-se descritivamente sobre os diversos programas, indicando a origem e a correlação entre os programas e o processo de educação fiscal. Após essa análise, adentra-se na natureza jurídica dos incentivos dos programas, na Lei de Responsabilidade Fiscal e da imbricação entre esta e os estímulos, para em seguida verificar como os estados e o Distrito Federal vêm tratando o problema. Por fim, é verificado se os programas atendem as exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal, além do estudo sobre os riscos fiscais dos programas.
MOREIRA, Carlos Tadeu de Carvalho. Legal nature of the incentives stemming state programs to stimulate issue invoice and its adherence to the Fiscal Responsibility Law.
With this thesis, we aim to analyze the legal nature of the various benefits given to participants of state programs to stimulate the issue of tax invoices. It also intends to analyze if such programs are coherent with Fiscal Responsibility Law, going beyond the mere description and comparison of the state programs among themselves in regard to the legal basis, modus operandi, among other aspects. The study is based on bibliographic and other sources of interest, such as web sites concerning incentive programs and those of the Secretaries of Finance. Initially our work describes the various programs, indicating the origin and the correlation between education programs and tax process. After this analysis, we enter the study of the legal nature of the incentive programs, the Fiscal Responsibility Law and the overlap between this and the incentives, to then see how the states and the Federal District are addressing the problem. Finally, we verify if the programs meet the requirements of the Fiscal Responsibility Law, in addition to the study of the tax risks involved in the programs.
Tabela 1. Unidade da federação, criação ou não de programa de estímulo e nome do programa...22
Tabela 2. Crescimento do Programa Nota Legal entre os anos de 2010 e 2013 ...24
Tabela 3. Unidade da federação e modalidade de incentivo...26
Tabela 4. Evolução dos beneficiários e do valor dos descontos...34
Tabela 5. Relação das leis instituidoras dos programas em cada unidade da federação e sua regulamentação...77
Tabela 6. Previsão de receita do IPTU para os anos de 2013,2014 e 2015...80
Tabela 7. Previsão de receita do IPVA para os anos de 2013,2014 e 2015...80
Tabela 8. Aumento da participação no Programa Nota Legal...100
Tabela 9: Aumento da arrecadação do ICMS, já descontada a inflação do período...100
Tabela 10: Aumento da arrecadação do ISS, já descontada a inflação do período...101
Tabela 11: Valores da renúncia de receita do IPTU e IPVA...101
Tabela 12: Alteração dos valores dos prêmios do Programa Minas Legal...102
Tabela 13: Aumento dos usuários cadastrados no Programa Nota Paulista
Tabela 15: Valores dos créditos distribuídos pelo Programa Nota Paulista.104
ADI – Ação direta de inconstitucionalidade ARO – Antecipação de Receitas Orçamentárias BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento CD – Compact disc
CF – Constituição Federal
CNPJ – Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica
CONFAZ – Conselho Nacional de Política Fazendária CPF – Cadastro de Pessoas Físicas
CTN – Código Tributário Nacional DF – Distrito Federal
DVD - Digital versatile disc
ENAT - Encontro de Administradores Tributários
ENCAT - Encontro Nacional de Coordenadores e Administradores Tributários Estaduais
ESAF - Escola de Administração Fazendária
FMCC - Fator de Multiplicação para o Cálculo do Crédito GET - Grupo de Trabalho Educação Tributária
ICMS – Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano
IPVA – Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores ISSQN – Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza
LDO - Lei de Diretrizes Orçamentárias LOA - Lei Orçamentária Anual
LRF – Lei de Responsabilidade Fiscal NF-e – Nota fiscal eletrônica
PIB – Produto Interno Bruto
PNAFE - Programa Nacional de Apoio à Administração Fiscal para os Estados Brasileiros
PNEF - Programa Nacional de Educação Fiscal PPA - Plano Plurianual
RS – Rio Grande do Sul
SINPROFAZ – Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional SMS - Short Message Service
SP – São Paulo
1 OS PROGRAMAS ESTADUAIS E DISTRITAL DE ESTÍMULO AO PEDIDO DE NOTA FISCAL. ORIGEM E DESCRIÇÃO DOS
PROGRAMAS...14
1.1 ORIGEM DOS PROGRAMAS DE ESTÍMULO AO PEDIDO DE NOTA FISCAL...14
1.2 OS PROGRAMAS DE ESTÍMULO AO PEDIDO DE NOTA FISCAL NO CONTEXTO DO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO FISCAL...18
1.3 DESCRIÇÃO DOS PROGRAMAS ...21
1.4 O PROGRAMA NOTA PAULISTA DE SÃO PAULO...30
1.4.1 Fundamento jurídico, estrutura e funcionamento...30
1.4.2 Incentivos ao participante...31
1.4.3 Estágio de implantação do programa...32
1.5 O PROGRAMA NOTA LEGAL DO DISTRITO FEDERAL...33
1.5.1 Fundamento jurídico, estrutura e funcionamento...33
1.5.2 Incentivos ao participante...35
1.5.3 Estágio de implantação do programa...35
1.6 O PROGRAMA NOTA FISCAL CIDADÃ DO PARÁ...39
1.6.1 Fundamento jurídico, estrutura e funcionamento...39
1.6.2 Incentivos ao participante...40
1.6.3 Estágio de implantação do programa...40
1.7 O PROGRAMA NOTA FISCAL GAÚCHA DO RIO GRANDE DO SUL...41
1.7.1 Fundamento jurídico, estrutura e funcionamento...41
1.7.2 Incentivos ao participante...42
1.7.3 Estágio de implantação do programa...42
1.8 O PROGRAMA TODOS COM A NOTA DE PERNAMBUCO...42
1.8.1 Fundamento jurídico, estrutura e funcionamento...42
1.8.2 Incentivos ao participante...44
CORRELAÇÃO COM A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL...45
2.1 A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL...45
2.2 RECEITA PÚBLICA...51
2.3 RENÚNCIA DE RECEITA...53
2.4MODALIDADES DE RENÚNCIA DE RECEITA...59
2.4.1 Anistia...59
2.4.2 Remissão...60
2.4.3 Isenção...62
2.4.4 Subsídio...64
2.4.5 Crédito Presumido...65
2.4.6 Redução de alíquota ou modificação da base de cálculo...66
2.4.7 Outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.67 2.5 SOBRE O SIGNIFICADO DA EXPRESSÃO NATUREZA JURÍDICA...69
2.6 OS DESCONTOS NO IPVA E NO IPTU DERIVADOS DOS PROGRAMAS DE ESTÍMULO TÊM A NATUREZA JURÍDICA DE BENEFÍCIO TRIBUTÁRIO, CARACTERIZANDO HIPÓTESE DE RENÚNCIA DE RECEITA...70
2.7 OS DEMAIS BENEFÍCIOS DOS PROGRAMAS DE ESTÍMULO ENQUANTO DESPESA PÚBLICA...73
2.7.1 Gasto público...74
2.7.2 Despesa pública...74
2.8 COMO AS UNIDADES DA FEDERAÇÃO TRATAM EM SUA CONTABILIDADE OS BENEFÍCIOS DOS PROGRAMAS DE ESTÍMULO...79
2.8.1 Renúncia de receita do IPVA e do IPTU...79
2.8.2 Conversão dos créditos em dinheiro, depositado em conta corrente ou caderneta de poupança...82
2.8.3 Sorteios em Dinheiro...83
2.8.4 Auxílio em dinheiro a entidades sociais...84
REPÚBLICA E DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL...87
3.1 CRITÉRIOS EXIGIDOS PARA A RENÚNCIA DE RECEITA PRODUZIDA PELA REDUÇÃO DO VALOR DO IPVA E DO IPTU NOS PROGRAMAS DE ESTÍMULO AO PEDIDO DE NOTA FISCAL...87
3.2 As demais formas de estímulo configuradoras de despesa pública e a Lei de Responsabilidade Fiscal...98
3.3 O RISCO FISCAL DOS PROGRAMAS DE ESTÍMULO...99
CONCLUSÃO E SUGESTÕES...105
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo analisar os programas estaduais de
estímulo ao pedido de nota fiscal, questionando-se sobre a natureza jurídica
das diversas formas de estímulo, assim como pretende concluir se os
programas estão seguindo as diretrizes da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Para cumprir este objetivo, serão analisados cinco programas
específicos, começando pela descrição e comparação desses mesmos
programas estaduais entre si, no que tange ao fundamento legal, modus
operandi, dentre outros aspectos, para então tentar responder aos seguintes
questionamentos, a título de problema de pesquisa:
a) Qual a natureza jurídica dos diversos incentivos concedidos
pelos programas estaduais de estímulo à emissão de nota
fiscal?
b) Considerando a sua respectiva natureza jurídica, os referidos
incentivos se enquadram ou não nas exigências da LRF?
c) Para aqueles que estejam enquadrados, como se pode avaliar
o cumprimento das exigências da LRF por parte dos gestores
de tais programas (governos estaduais e do Distrito Federal)?
Assim, quanto à questão da natureza jurídica, nossa hipótese é que os
benefícios concedidos pelos programas podem ser de dois tipos, benefício
tributário gerando renúncia de receita ou despesa pública, enquadrando-se,
em ambos os casos, na Lei de Responsabilidade Fiscal.
No tocante à questão do cumprimento da LRF pelos estados, a análise
da natureza jurídica dos incentivos em tais programas mostra-se decisiva
para a aferição do cumprimento ou descumprimento da Lei de
Responsabilidade Fiscal pelos estados, pois a depender da exata
determinação de sua natureza, benefício tributário ou despesa, o estímulo
produz renúncia de receita ou despesa pública, alterando radicalmente as
exigências contidas na norma para seu estabelecimento segundo as
O trabalho se divide em três capítulos. No primeiro são analisadas a
origem dos programas, suas principais características e estrutura, bem como
são descritos os incentivos aos participantes.
Ainda neste capítulo são estudados cinco programas eleitos como
paradigmas, em relação ao seu fundamento jurídico, estrutura,
funcionamento, incentivos ao participante, além do estágio de implantação
dos mesmos.
O segundo capítulo trata da natureza jurídica dos incentivos dos
programas, bem como da correlação das diversas modalidades de incentivo
com a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Partindo das análises realizadas nos capítulos anteriores, no terceiro
capítulo é abordada a aderência dos programas à LRF, notadamente quanto
ao cumprimento de suas exigências para a regular instituição de renúncia de
receita e de despesa pública, sendo também estudado o risco fiscal
produzido pelos programas.
1 OS PROGRAMAS ESTADUAIS E DISTRITAL DE ESTÍMULO AO PEDIDO DE NOTA FISCAL. ORIGEM E DESCRIÇÃO DOS PROGRAMAS
1.1 ORIGEM DOS PROGRAMAS DE ESTÍMULO AO PEDIDO DE NOTA FISCAL
A Constituição de 1988 introduziu importantes mudanças nas
relações entre União, estados e municípios, que resultaram numa forte
descentralização de gastos e receitas. No que diz respeito ao sistema
tributário, a Constituição concedeu aos entes federados autonomia para
legislar, controlar os recursos e fixar as alíquotas de impostos, ou seja,
competência para instituir e administrar os respectivos tributos. O
incremento da autonomia tributária resultou em uma excessiva burocracia,
baixa transparência e na impossibilidade de comparação dos dados fiscais
dos contribuintes (MATTOS, 2013).
Tentando reduzir esta ineficiência, em 19 de dezembro de 2003, foi
alterado o artigo 37 da Constituição Federal, por meio da Emenda
Constitucional 42, incluindo o inciso XXII, determinando que as
administrações tributárias da União, dos estados, do Distrito Federal e dos
municípios, atividades essenciais ao funcionamento do Estado, exercidas por
servidores de carreiras específicas, terão recursos prioritários para a
realização de suas atividades e atuarão de forma integrada, inclusive com o
compartilhamento de cadastros e de informações fiscais, na forma da lei ou
convênio.
Com o objetivo de atender o disposto na Emenda Constitucional 42, foi
realizado em julho de 2004, na cidade de Salvador, o Primeiro Encontro de
Administradores Tributários - ENAT, reunindo autoridades das
administrações tributárias dos diferentes níveis de governo (BRASIL, 2013a).
Dois protocolos de cooperação técnica foram aprovados no ENAT, o
Projeto do Cadastro Sincronizado e a Nota Fiscal Eletrônica (NF-e). O projeto
da Nota Fiscal Eletrônica teve como objetivo a substituição da sistemática de
emissão de documento fiscal em papel pela implantação de um modelo fiscal
eletrônico. Com validade jurídica garantida pela assinatura digital do
dos contribuintes e possibilitando o acompanhamento em tempo real pelo
fisco das operações comerciais. Dentre os principais objetivos da
implementação do programa Nota Fiscal Eletrônica estava, ainda, a melhora
na atividade de fiscalização das operações envolvendo o ICMS e o IPI, de
forma a diminuir a sonegação desses impostos (MATTOS, 2013).
Em 2005 foi iniciada a fase do projeto piloto da NF-e, compreendendo
as secretarias da fazenda de Goiás, Rio Grande do Sul, São Paulo, Bahia,
Maranhão e Santa Catarina, além de diversas empresas de grande porte. No
dia 15 de setembro de 2006 foram emitidas as primeiras NF-e com validade
tributária nos estados de Goiás e Rio Grande do Sul. Desde então, a Nota
Fiscal Eletrônica deixou de ser um projeto piloto e passou a ser um
mecanismo de controle fiscal, recebido pelas secretarias de fazenda de vários
outros estados (BRASIL, 2012).
O Projeto Nota Fiscal Eletrônica foi sendo desenvolvido de forma
integrada, pelas secretarias de fazenda dos estados e municípios, e a Receita
Federal do Brasil, a partir da assinatura do Protocolo ENAT nº 03, de 27 de
agosto de 2005, que atribuiu ao Encontro Nacional de Coordenadores e
Administradores Tributários Estaduais (ENCAT) a coordenação e a
responsabilidade pelo desenvolvimento e implantação do Projeto NF-e
(BRASIL, 2012).
Desde então, a cooperação e a integração entre as administrações
tributárias estaduais, principalmente no Brasil, que possui forte grau de
descentralização fiscal, têm sido temas de estudo e debate (BARBOSA,
1998).
Atualmente, as administrações tributárias despendem grandes somas
de recursos para captar, tratar, armazenar e disponibilizar informações
sobre a emissão de notas fiscais dos contribuintes. Os volumes de
transações efetuadas e os montantes de recursos movimentados crescem
num ritmo intenso e, na mesma proporção, aumentam os custos inerentes à
necessidade do Estado de detectar e prevenir a evasão tributária. Desta
forma, a implantação da Nota Fiscal Eletrônica justifica-se pela necessidade
fiscal, possibilitando melhor intercâmbio e compartilhamento de informações
entre os entes da federação, a redução de custos e entraves burocráticos,
facilitando o cumprimento das obrigações tributárias, e fortalecendo a
fiscalização tributária (BRASIL, 2012).
No bojo da implantação da Nota Fiscal Eletrônica, projeto que alterou
profundamente os paradigmas da gestão de informática, surgiram os
programas estaduais de estímulo ao pedido de nota fiscal tal qual como hoje
conhecidos, tendo como principal objetivo, além da implementação de
programas de educação fiscal, elevar a arrecadação em setores de difícil
fiscalização como o comércio varejista, e que só tornou-se possível graças ao
alto grau de tecnologia da informática associado à implementação da NF-e.
Assim, explica-se a inexistência de tais programas em período pretérito, pelo
menos nos moldes atuais, pois apenas com o advento dos meios eletrônicos
de processamento de documentos fiscais, é que foi possível a introdução
deste tipo de projeto (MATTOS, 2013).
Para ilustrar a necessidade de um sólido sistema de processamento de
informações fiscais, somente o Programa Nota Fiscal Paulista do Estado de
São Paulo, processou entre os anos de 2009 e 2014, quase trinta bilhões de
documentos fiscais (29.676.749.923), mais de dezesseis milhões de
documentos processados por dia (SÃO PAULO, 2014).
Um dos primeiros programas implantados, e o mais amplo até o
momento, foi o Nota Fiscal Paulista, criado pelo Estado de São Paulo por
meio da Lei nº 12.685, de 28 de agosto de 2007, seguido por outros estados,
cujos programas têm natureza semelhante, em que são oferecidas
recompensas de diferentes tipos como forma de incentivo à exigência de
documento fiscal por parte dos consumidores na compra de produtos e
serviços.
Os programas de estímulo podem ser entendidos como um mecanismo
de estímulo à cidadania fiscal, ao fornecer incentivos aos cidadãos para
exercerem um direito e um dever que de outra forma não exerceriam. Assim,
através de um estímulo financeiro, torna o consumidor verdadeiro fiscal
oferecido pelo programa, e o governo com o aumento da arrecadação
(MATTOS, 2013).
Justifica-se a criatividade do legislador estadual ao propor tais
programas, pois o Brasil é um dos países com as mais elevadas estimativas
de evasão fiscal do mundo, atingindo 8,4% do PIB segundo estudo do
SINPROFAZ – Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional
(2014).
Várias razões podem ser apontadas para explicar a evasão fiscal
brasileira. A primeira causa é a pouca habilidade do sistema tributário para
se adaptar às mudanças da economia. O setor de serviços se expandiu, com
redução do setor manufatureiro, porém, nas empresas prestadoras de
serviços a taxação é mais difícil do que nas manufatureiras (MATTOS, 2013).
Evidência neste sentido é fornecida por Mattos (2013) que classifica e
analisa os setores difíceis de taxar, dos quais os serviços merecem destaque.
O número de transações envolvidas também parece ser determinante
para o processo de evasão, eis que profissionais liberais derivam suas rendas
de múltiplas transações com clientes e acham fácil esconder suas rendas.
Este seria tipicamente o caso do comércio e dos serviços no Brasil. O número
de transações é alto, prevalecem os pequenos negócios e não há o hábito da
empresa emitir nota fiscal, exceto se o cliente exigir (MATTOS, 2013).
Outra causa seria a existência de uma norma social de não
cumprimento (non-compliance), consubstanciada em um padrão de
comportamento que envolve a não emissão de nota fiscal nas compras e que
era julgado da mesma forma por todos envolvidos na transação, portanto,
sustentado por uma pretensa aprovação social. Este não cumprimento das
obrigações fiscais parece ter se generalizado, fazendo com que a norma
social de que os impostos devem ser pagos tenha esmaecido, com a anuência
dos consumidores e tomadores de serviço (MATTOS, 2013).
Diante da presença de uma norma social de non-compliance, uma
alternativa para atacar o problema da evasão fiscal seria, além de reconhecer
a importância da ênfase à punição (enforcement), promover mudanças no
de serviços para os contribuintes. Isto conduziria a um conjunto diferente de
políticas, que promoveriam a provisão de serviços à população através, entre
outros, de educação dos contribuintes e desenvolvimento de serviços para
ajuda destes em cada passo do preenchimento das declarações de impostos,
propaganda ampla ligando os impostos com os serviços do Estado,
simplificação do pagamento dos impostos, além da promoção de um “código
de ética” para os contribuintes, garantindo a estabilidade relativa do sistema
fiscal (ALM E MARTINEZ-VAZQUEZ, 2007).
Os programas de estímulo ao pedido de nota fiscal, além dos
programas de cidadania fiscal, podem também ser encarados desta forma,
como uma resposta das autoridades fiscais a uma nova percepção dos
contribuintes como clientes que precisam de serviços. Ao invés de agir sobre
os vendedores e fornecedores (sobre quem recaem os impostos), agindo sobre
os consumidores, torna-os parceiros na fiscalização através não só de
incentivos financeiros, mas também de massivas campanhas publicitárias
em que são apresentados os benefícios dos programas para os consumidores
e a importância dos mesmos para o aumento da arrecadação (MATTOS,
2013).
1.2 OS PROGRAMAS DE ESTÍMULO AO PEDIDO DE NOTA FISCAL NO CONTEXTO DO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO FISCAL
No seminário do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ,
sobre administração tributária, realizado na cidade de Fortaleza, em maio de
1996, foi inserido o tema Educação Tributária. Nas conclusões constou como
item de destaque a introdução do ensino nas escolas, do programa de
consciência tributária, sendo fundamental para despertar nos jovens a
prática da cidadania, e o respeito ao bem comum (MINAS GERAIS, 2014).
No dia 13 de setembro de 1996, celebrou-se o Convênio de Cooperação
Técnica entre a União, os estados e o Distrito Federal, tendo como tema
central a elaboração e a implementação de um programa nacional
permanente de conscientização tributária, para ser desenvolvido nas
Apoio à Administração Fiscal para os Estados Brasileiros – PNAFE, com
recursos financeiros oriundos de empréstimo junto ao Banco Interamericano
de Desenvolvimento (BID), e com a Unidade de Coordenação do Programa –
UCP, vinculada à Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda. Em seu
Regulamento Operativo, aprovado pela Portaria n.º 36, de 3 de fevereiro de
1997, do Secretário Executivo do Ministério da Fazenda, o PNAFE
estabeleceu como objetivo geral do programa a melhoraria da eficiência
administrativa, a racionalização e a transparência na gestão dos recursos
públicos estaduais. Para alcançar esses objetivos, previu o apoio a projetos
de modernização fiscal, destinados à elaboração e implementação de um
programa nacional permanente de educação tributária, a ser desenvolvido
pelos estados (BRASIL, 2014a).
Em reunião de 25 de julho de 1997, o CONFAZ aprovou a criação do
Grupo de Trabalho Educação Tributária – GET, constituído por
representantes do Ministério da Fazenda (Gabinete do Ministro, Secretaria
da Receita Federal, Escola de Administração Fazendária – ESAF), das
secretarias de fazenda, finanças ou tributação dos estados e do Distrito
Federal. A Portaria nº 35, de 27 de fevereiro de 1998, do Ministério da
Fazenda, que oficializou o grupo de trabalho, formulou seus objetivos como
sendo a promoção e a coordenação das ações necessárias à elaboração e
implementação de um programa nacional permanente de educação
tributária, além do acompanhamento das atividades do Grupo de Educação
Tributária nos estados. Em março de 1999, passam a integrar o grupo,
representantes da Secretaria do Tesouro Nacional e do Ministério da
Educação (BRASIL, 2014a).
Em julho de 1999, tendo em vista a abrangência do programa que não
se restringe apenas aos tributos, mas que aborda também as questões da
alocação dos recursos públicos e da sua gestão, o CONFAZ aprovou a
alteração de sua denominação que passa a ser Programa Nacional de
Educação Fiscal – PNEF (MINAS GERAIS, 2010).
Um dos principais fatores genéticos dos programas de estímulo ao
desenvolvidos nos estados, notadamente após a criação do PNEF – Programa
Nacional de Educação Fiscal. O PNEF tem por objetivo ampliar a percepção
do cidadão sobre a importância social dos tributos e dos orçamentos
públicos, ao compartilhar conhecimentos e interagir com a sociedade sobre a
origem, aplicação e controle dos recursos públicos, favorecendo a
participação social (GONÇALVES, 2013).
Constituem ainda objetivos do Programa Nacional de Educação Fiscal
promover e institucionalizar a educação fiscal para o pleno exercício da
cidadania, sensibilizando o cidadão para o entendimento sobre a função
socioeconômica do tributo e a aplicação dos recursos públicos. Suas ações
devem ter caráter de educação permanente e, portanto, desvinculadas de
campanhas de premiação com finalidade exclusiva de aumento de
arrecadação (BRASIL, 2014).
No entanto, é grande a quantidade de cidadãos que seguem alheios ao
conteúdo pretendido pelo PNEF, até porque este programa não se encontra
implementado em todos estados e municípios do Brasil. Ademais, promover
uma mudança por intermédio da educação fiscal demanda muito tempo,
apesar de seu papel em sensibilizar o cidadão para a função socioeconômica
do tributo.
A educação fiscal pode ser definida como a abordagem
didático-pedagógica capaz de interpretar as vertentes financeiras da arrecadação e
dos gastos públicos de modo a estimular o contribuinte a garantir a
arrecadação e o acompanhamento de aplicação dos recursos arrecadados em
benefício da sociedade com justiça, transparência, honestidade e eficiência,
minimizando o conflito de relação entre o cidadão contribuinte e o estado
arrecadador (SILVA, 2012).
Uma das maiores preocupações do gestor público, quando da
implementação do programa de estímulo ao pedido de nota fiscal, é a de que
deve evitar a vinculação de campanhas de premiação ao programa, com a
finalidade exclusiva de incrementar a arrecadação, desvinculada dos
Os números indicam que os programas parecem estar motivando o
comportamento dos cidadãos para que peçam a nota fiscal em suas
compras. Os números positivos dos estados indicam isso. Mas isto não
implica necessariamente um estímulo à participação socialmente
responsável no tocante à cidadania, pois pedir nota fiscal perfaz apenas uma
pequena parte do aprendizado sobre a função social do tributo (SILVA,
2012).
1.3 DESCRIÇÃO DOS PROGRAMAS
Os programas estaduais de estímulo foram criados com o claro
objetivo de incentivar o pedido de emissão de notas fiscais, transformando o
consumidor de produtos e serviços em verdadeiro fiscal da fazenda pública
estadual e distrital, ao receber inúmeros benefícios, a depender do
programa. Tais programas continuam em expansão pelo Brasil. Além do
Distrito Federal, dezessete estados adotam programas que incentivam os
compradores a pedir a inclusão do número do CPF nas notas fiscais, com o
objetivo de incrementar as receitas e combater a sonegação fiscal (BRASIL,
2013).
As unidades da federação que criaram programas de incentivo são os
Estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará,
Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rondônia, Rio
Grande do Sul, Rio de Janeiro, Sergipe, São Paulo, e o Distrito Federal.
Não instituíram nenhum programa de estímulo nove Estados, Acre,
Amapá, Amazonas, Espírito Santo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul,
Roraima, Santa Catarina e Tocantins.
Percebe-se que a maioria dos estados instituiu programa que objetiva
o estímulo ao pedido de nota fiscal, oferecendo como benefício algum tipo de
prêmio, desconto, sorteio, enfim, alguma vantagem individualmente
Assim, podemos vislumbrar a situação de cada estado da Federação, e
do Distrito Federal, quanto à adesão ou não a programas de incentivo, na
seguinte tabela:
Tabela 1 - Unidade da federação, criação ou não de programa e respectivo nome
ESTADO CRIOU PROGRAMA DE
ESTÍMULO?
NOME DO PROGRAMA
Acre Não **
Alagoas Sim Nota Fiscal Alagoana.
Amapá Não **
Amazonas Não **
Bahia Sim Sua Nota é um Show.
Ceará Sim Sua Nota Vale Dinheiro.
Distrito Federal Sim Nota Legal.
Espírito Santo Não **
Goiás Sim Nota Show de Bola.
Maranhão Sim Viva Nota.
Mato Grosso Não **
Mato Grosso do Sul Não **
Minas Gerais Sim Minas Legal.
Pará Sim Nota Fiscal Cidadã.
Paraíba Sim Cupom Legal.
Paraná Sim Nota Fiscal Paranaense.
Pernambuco Sim Todos com a Nota.
Piauí Sim Sua Nota Bate um Bolão.
Rio Grande do Norte Sim Cidadão Nota Dez.
Rio Grande do Sul Sim Nota Fiscal Gaúcha.
Rio de Janeiro Sim Cupom Mania.
Rondônia Sim Nota Legal Rondoniense.
Roraima Não **
Santa Catarina Não **
São Paulo Sim Nota Paulista.
Sergipe Sim Nota da Gente.
Tocantins Não **
Impende notar que programas semelhantes vêm sendo praticados no
Serviços de Qualquer Natureza, como é o caso, dentre inúmeros outros, de
Porto Alegre (RS) e São Paulo (SP).
A ideia básica de tais programas vem se disseminando, até mesmo no
âmbito internacional, como é o caso de Portugal, que implementou em nível
nacional o chamado “e-factura”, criado pelo Decreto Lei nº 198, de 2012 e
que entrou em vigor no dia 01 de janeiro de 2013, cujo objetivo é a criação
de medidas de controle da emissão de faturas (nota fiscal), bem como a
criação de um incentivo de natureza fiscal (PORTUGAL, 2013), limitado a
duzentos e cinquenta euros anuais, como forma de abatimento do Imposto
de Renda devido pela pessoa física ou jurídica inscrita no “e-factura”.
Na avaliação dos governos estaduais que criaram esses programas, os
ganhos compensam os custos com os benefícios pagos aos contribuintes. À
medida que mais compradores pedem a nota fiscal, o comerciante é obrigado
a registrar a venda da mercadoria evitando a sonegação do Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Além disso, o consumidor
passa a fiscalizar o comércio ao denunciar casos em que os valores
creditados ou a pontuação concedida divergem em relação à nota (BRASIL,
2013a).
No caso do Distrito Federal, os contribuintes do Imposto sobre
Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), além do Imposto sobre Circulação
de Mercadorias e Serviços (ICMS), também estão albergados pelo
denominado Programa Nota Legal.
Os programas de incentivo tornaram-se populares por devolverem, na
forma de alguma vantagem individual, como descontos em impostos,
dinheiro e sorteios, parte ideal do imposto efetivamente recolhido pelos
estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços. Assim, há um
estímulo à exigência do documento fiscal.
Os benefícios para os participantes variam conforme a unidade da
Federação. Alguns governos estaduais transformam os créditos do
participante em dinheiro (Alagoas, Distrito Federal e São Paulo), outros
oferecem desconto no pagamento de impostos, como o Imposto sobre
sorteiam prêmios em dinheiro (Rio de Janeiro) ou distribuem ingressos para
shows e jogos de futebol (Bahia e Pernambuco). Como estímulo, entidades
sociais também recebem doações em dinheiro, como no caso de São Paulo.
Para ilustrar a popularidade dos programas, vejamos o crescimento do
número de pessoas que indicaram ao menos um bem para o uso dos
créditos, o abatimento do valor do imposto a pagar e a própria evolução dos
descontos concedidos no Distrito Federal (DISTRITO FEDERAL, 2014b):
Tabela 2 – crescimento do Programa Nota Legal entre os anos de 2010 e 2013
Ano
Consumidores que
efetuaram a
indicação
IPVA IPTU
Total utilizado Nº
veículos Valor R$
Nº
imóveis Valor R$
2010 18.295 13.872 350.950,46 3.098 110.709,09 461.659,55
2011 106.216 75.290 17.289.536,12 20.245 5.762.509,57 23.052.045,69
2012 256.182 181.394 60.180.450,01 53.378 18.474.675,67 78.655.125,68
2013 330.633 248.819 71.444.863,87 63.543 19.053.872,17 90.498.736,04
Dessa forma, em face do incremento do pedido de nota fiscal, fazendo com que contribuintes do ICMS e do ISSQN recolham efetivamente os
impostos, embora não exista cálculo objetivo sobre o incremento de
arrecadação derivado dos programas de estímulo, ao que tudo indica, os
programas devem estar contribuindo para o aumento na arrecadação do
ICMS e do ISSQN. Neste rumo, os resultados divulgados são cada vez mais
expressivos (AMORIN, 2011).
No Distrito Federal, o número de pessoas que usaram os créditos
acumulados para abatimento nos impostos saltou de 18.295 em 2010, para
330.634 em março de 2013 (DISTRITO FEDERAL, 2014b). Porém, conforme
já antecipado, não há um estudo mais aprofundado sobre a repercussão de
tais programas no aumento da arrecadação dos impostos. Os estados
normalmente afirmam que os programas aumentam a arrecadação, embora
tal assertiva esteja desacompanhada de comprovação, como no caso de
No ano de 2012, o Programa Nota da Gente recepcionou cerca de 91 milhões de documentos fiscais, oriundos de aproximadamente 80.000 consumidores cadastrados, dentre os quais 5.412 foram premiados mediante sorteios. Desta forma, esse estímulo à exigência da Nota Fiscal favoreceu um aumento na receita, além do aperfeiçoamento dos controles, pelo cruzamento de informações (SERGIPE, 2012).
Uma das raras análises sobre o possível incremento da arrecadação
dos impostos pela existência de programas de estímulos foi realizada por
Enlinson Mattos e outros (MATTOS, 2013), que estudaram o aumento de
arrecadação do ICMS no Estado de São Paulo, chegando os autores à
seguinte conclusão:
Considerando a primeira estratégia, os resultados sugerem que o Programa NFP teve efeito limitado sobre a arrecadação de ICMS no Estado de São Paulo. Encontra-se um efeito positivo e significativo entre 5% e 10% na arrecadação do setor terciário em termos reais. Neste painel de Estados, não é encontrada evidência robusta do programa NFP sobre a arrecadação total, nem efeito não linear no tempo. Finalmente, a alteração da data de implementação do Programa de forma aleatória parece não produzir estimações que comprometam o procedimento aqui adotado.
[...]
Se o aumento de arrecadação do setor terciário em termos reais (100 milhões a 200 milhões) é comparado com nossa estimativa de prêmio concedido, cerca de 170 milhões tem-se um aumento de, no máximo, 30 milhões nesta arrecadação, ou menos de 2% da arrecadação média do setor terciário para São Paulo. Um dos motivos para este pequeno aumento é que é possível que uma boa parcela das NFPs venha de estabelecimentos que já dariam nota fiscal independente do programa.
Por outro lado, para o professor da Universidade de Brasília José
Matias Pereira, especialista em finanças públicas, políticas como os
Programas de Incentivo são sempre benéficas, tanto para o estado quanto
para o consumidor. Estimular a pedir nota fiscal é fundamental para o
sistema de controle. Indicadores mostram que, quando esse tipo de estímulo
é usado, acabam sendo criadas condições para que se aumente a
arrecadação. As experiências nos estados, como São Paulo, têm sido bem
sucedidas (BRANCO, 2011).
Para a análise comparativa do conteúdo dos diversos programas,
foram escolhidos cinco programas, tendo como pressuposto a distribuição
nordeste (Pernambuco), outro do sul (Rio Grande do Sul), um da região
sudeste (São Paulo) e finalmente um do centro-oeste (Distrito Federal).
Mostrou-se também relevante para a escolha dos cinco programas
supra indicados, a diversidade de incentivos contidos em cada programa.
Vejamos como ocorre a distribuição dos incentivos:
Tabela 3 – Unidade da federação e modalidade de incentivo
Unidade da
Federação
Desconto em
impostos
Crédito em
dinheiro
Permuta por
ingressos ou
bens
Auxílio a
Entidades
Sociais
Sorteios
Alagoas X X X X
Bahia X X
Ceará X X
D.F. X X
Goiás X
Maranhão X X
Minas Gerais X
Pará X
Paraíba X
Paraná X
Piauí X
Pernambuco X X
R.G. do Norte X
R. G. do Sul X X
Rio Janeiro X
São Paulo X X X X
Sergipe X X
Total 3 5 6 9 10
Percebe-se que o incentivo mais utilizado é o sorteio de dinheiro ou
outro bem, seguido da entrega de dinheiro a entidades sociais cadastradas
nos diversos programas e pela permuta de notas fiscais por ingressos em
jogos de futebol ou eventos culturais. Os estímulos menos adotados são o
crédito em dinheiro em conta corrente ou poupança com a utilização por
cinco unidades da federação, e o “desconto” em impostos (IPVA e IPTU)
utilizado por apenas três programas.
Conforme será melhor abordado, a pouca utilização dos descontos de
impostos, justifica-se por impactarem diretamente as receitas tributárias das
unidades da federação, podendo levar a desequilíbrio orçamentário e
eventualmente contrariar as diretrizes da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Como o objetivo deste estudo não é explorar de forma descritiva os
programas de todos os estados e do Distrito Federal, foram escolhidos cinco
programas para uma análise mais aprofundada, que cobrem a totalidade dos
incentivos propostos pelos programas de estímulo, além de estarem
distribuídos geograficamente por todas as regiões do Brasil.
A facilidade de acesso aos dados contábeis também foi um fator
preponderante na escolha destes programas, pois em muitos estados o
acesso aos dados é tormentoso, senão impossível.
Assim, foi escolhido o Estado do Pará e seu programa Nota Fiscal
Cidadã, que oferece como estímulo ao participante sorteio em dinheiro, ao
contrário do outro escolhido, o Programa Nota Legal do Distrito Federal,
cujos incentivos são descontos no pagamento do IPVA e no IPTU, além de
créditos em dinheiro depositados em conta corrente ou poupança indicada
Por seu turno, o terceiro programa, denominado Todos com a Nota, do
Estado de Pernambuco, troca notas fiscais por ingressos de jogos de futebol,
assim como aporta recursos a entidades sociais previamente cadastradas.
Já o Nota Fiscal Gaúcha, do Rio Grande do Sul, oferece como incentivo
sorteios em dinheiro e apoio financeiro a entidades sociais. Por derradeiro, o
Programa Nota Paulista, do Estado de São Paulo oferece todos os incentivos,
exceto a troca de notas por ingressos de futebol.
Para tornar o processo mais transparente, quase todas as secretarias
de fazenda dos estados e do Distrito Federal mantêm portal eletrônico em
que são divulgadas as notas fiscais lançadas, os créditos recebidos, os
sorteios realizados, bem como a legislação básica. Além disso, os
participantes podem reclamar créditos não recebidos, o que permite à
autoridade tributária uma regularização rápida da situação junto à empresa
emissora do documento fiscal. Tudo isso faz com que se possa observar de
forma clara, fácil e concreta o benefício que resulta do exercício da cidadania
fiscal, aumentando a confiança nos programas e a adesão aos mesmos.
Neste momento se faz necessária uma análise objetiva dos diversos
estímulos para melhor compreensão do tema. Os programas possuem como
incentivos o desconto no valor de impostos (IPVA e IPTU), crédito em
dinheiro, permuta de documentos fiscais por ingressos de jogos de futebol e
outros espetáculos, auxílio a entidades sociais, além de sorteio em dinheiro
ou bens móveis.
Todos os programas têm uma sistemática similar, qual seja, parte
ideal do imposto pago pelo fornecedor de produto ou serviço, ICMS ou
ISSQN, é creditado a favor do participante do programa, sendo que os
créditos são atrelados ao CPF ou CNPJ do mesmo, ou ainda, os documentos
fiscais são trocados por ingressos, bens móveis, participação em sorteios ou
redundam em atribuição de dinheiro a entidades sociais.
Na primeira hipótese, de descontos em impostos e crédito em dinheiro,
caso o participante tenha efetuado compras no estado participante ou no
Distrito Federal, do valor efetivamente recolhido pelo estabelecimento
do imposto pago, e que varia de programa a programa, é objeto de crédito em
benefício do participante (até 30% do imposto recolhido). Com esses créditos,
agora transformados em dinheiro na paridade de um crédito equivalente a
um real, o participante pode obter redução dos impostos ou crédito de
dinheiro em conta bancária, como no caso de São Paulo e do Distrito
Federal.
Pode também ser oferecida ao participante a troca de documentos
fiscais por ingressos de futebol ou outros espetáculos (peças de teatro,
shows, etc.). Na Bahia, o programa Sua Nota é Show de Bola, permite a troca
de dez notas fiscais por um ingresso de jogo de futebol. O mesmo programa
também permite a troca das notas por produtos culturais (CD, DVD, artigos
desportivos, livros, etc.).
No Estado de Goiás, a cada duzentos reais em notas fiscais, um
ingresso pode ser adquirido e cada torcedor tem direito a dois ingressos por
partida.
Já no Viva a Nota maranhense, todo participante que possui notas
fiscais declaradas recebe um vale ingresso a cada cem reais, observando-se o
limite máximo de resgate por pessoa de até cinco ingressos por evento.
Por seu turno, o programa de Pernambuco oferta o mesmo estímulo,
porém, a forma de utilização dos créditos é diferente. Lá o participante
recebe um cartão de plástico com senha, que serve para acúmulo e gasto dos
créditos em troca pelos ingressos.
No estímulo mais adotado, que é o sorteio em dinheiro ou bens móveis,
em geral, a cada valor previamente fixado em notas fiscais, o sistema gera
um cupom eletrônico que dá direito a participar do sorteio. No Maranhão, a
cada cem reais, um cupom eletrônico é gerado. Já no Rio de Janeiro, além
de dinheiro é sorteado um carro mensalmente.
Importa salientar que alguns dos programas exigem que o participante
envie os dados do cupom fiscal via aparelho celular por SMS, ou pela
internet, o que pode ocasionar uma baixa participação popular no programa.
A periodicidade dos sorteios varia de programa a programa, podendo
também é variável, podendo chegar a um milhão de reais como no caso do
Rio Grande do Sul (RIO GRANDE DO SUL, 2014a).
O último dos estímulos é o auxílio em dinheiro a entidades sociais e
que possui formatação diferente em cada unidade da federação. No caso de
Alagoas, as entidades estaduais de assistência social, sem fins lucrativos,
cadastradas na Secretaria de Estado da Fazenda, são indicadas como
favorecidas pelo crédito, no caso do documento fiscal eletrônico não indicar o
nome do consumidor.
No caso do Sua Nota Vale Dinheiro do Ceará, o conceito de entidade
social é elástico, abrangendo as instituições sem fins lucrativos, associações
de classes, sindicatos, fundações, instituições filantrópicas, organizações
religiosas, culturais e assistenciais, organizações não governamentais,
conselhos de fiscalização profissional, além de entidades esportivas. Neste
estado a entidade social faz a entrega das notas emitidas em suas próprias
compras ou doadas para ela, nos postos de recebimento da Secretaria de
Fazenda. Em Pernambuco, quem quiser contribuir com a entidade social
deve colocar os cupons fiscais nas urnas instaladas nas entidades
participantes. Aquelas com o maior valor em documentos fiscais são
premiadas pelo programa.
Todos os programas preveem prazo para utilização dos créditos que
varia de dois (Distrito Federal) a cinco anos (São Paulo), sob pena de
prescrição. Porém, no caso de troca de créditos por bilhetes para sorteio, ou
de troca de documentos fiscais por bilhetes para sorteio, não há previsão de
cancelamento ou prescrição de créditos, pois os bilhetes que participam do
sorteio perdem a validade para os sorteios posteriores.
1.4 O PROGRAMA NOTA PAULISTA DE SÃO PAULO
1.4.1 Fundamento jurídico, estrutura e funcionamento
A Lei nº 12.685, de 28 de agosto de 2007 introduziu no ordenamento
popularmente conhecido como Nota Fiscal Paulista, tendo como objetivo
incentivar os adquirentes de mercadorias, bens e serviços sujeitos ao ICMS,
a exigir do fornecedor a entrega de documento fiscal hábil. A regulamentação
do programa foi efetivada pelo Decreto nº 54.179, de 30 de março de 2009
(SÃO PAULO, 2014a).
A pessoa natural ou jurídica que adquirir mercadorias, bens ou
serviços de estabelecimento fornecedor localizado no Estado de São Paulo,
que seja contribuinte do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de
Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e
Intermunicipal e de Comunicação - ICMS, faz jus ao recebimento de créditos
do tesouro do estado.
O valor correspondente a até 30% (trinta por cento) do ICMS que cada
estabelecimento tenha efetivamente recolhido será distribuído como crédito
entre os respectivos adquirentes de mercadorias, bens e serviços de
transporte interestadual e intermunicipal. O crédito calculado desta forma
fica limitado a 7,5% (sete e meio por cento) do valor do documento fiscal, nos
termos do art. 3º, § 3º da Lei nº 12.685, de 28 de agosto de 2007 (SÃO
PAULO, 2014a).
De acordo com a mesma lei, em seu artigo 5º, § 2º, o beneficiário do
programa possui o prazo de cinco anos para a utilização dos créditos,
contados da data em que tiverem sido disponibilizados pela Secretaria da
Fazenda.
Nos termos do mesmo artigo, em seu § 3º, não poderão utilizar os
créditos os inadimplentes em relação a obrigações pecuniárias, de natureza
tributária ou não tributária, devidas ao Estado de São Paulo.
1.4.2 Incentivos ao participante
Conforme descrito, a pessoa natural ou jurídica que adquirir
mercadorias de quem seja contribuinte do ICMS, fará jus ao recebimento de
créditos do Tesouro do Estado. Com tais créditos, o participante do
a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) do exercício seguinte, relativo
a veículo de sua propriedade ou solicitar depósito dos créditos em conta
corrente ou poupança de sua titularidade, mantida em instituição do
Sistema Financeiro Nacional. O depósito ou o crédito somente poderá ser
efetuado se o valor a ser creditado corresponder a, no mínimo, vinte e cinco
reais.
A cada cem reais em compras registradas em documentos fiscais
eletrônicos, o adquirente fará jus a um cupom numerado para concorrer,
gratuitamente, a sorteio (art. 3º, § 2º da Lei nº 12.685, de 2007). Os valores
dos prêmios variam de dez reais a cinquenta mil reais. Em datas
comemorativas estabelecidas pela legislação o maior prêmio será de
duzentos mil reais (SÃO PAULO, 2014a).
O programa permite, nos termos das diversas Resoluções que o regem,
que sejam indicadas como favorecidas pelo crédito, no caso de o documento
fiscal não indicar o CPF do participante, entidades paulistas de assistência
social, cadastradas na Secretaria da Fazenda, tais como entidades da área
da saúde, culturais ou desportivas, de defesa e proteção animal, além de
entidades de educação, desde que sejam certificadas como beneficentes,
todas sem fins lucrativos.
1.4.3 Estágio de implantação do programa
O programa está plenamente em funcionamento, albergando todas as
modalidades de incentivo, exceto a permuta de notas fiscais por ingressos de
futebol.
Possui os números mais expressivos do Brasil com R$
8.685.007.573,68 de créditos distribuídos, R$ 1.022.800.000,00 sorteados,
com 15.885.158 de participantes cadastrados até março de 2014 (SÃO
PAULO, 2014a).
A participação no projeto da Nota Fiscal Paulista tornou-se obrigatória
para os estabelecimentos comerciais localizados no Estado de São Paulo, e
seguiu o cronograma de implantação estabelecido pela Secretaria da
1.5 O PROGRAMA NOTA LEGAL DO DISTRITO FEDERAL
1.5.1 Fundamento jurídico, estrutura e funcionamento
O programa de concessão de créditos para adquirentes de mercadorias
ou bens e tomadores de serviços do Distrito Federal, mais conhecido como
Programa Nota Legal, foi instituído pela Lei Distrital nº 4.159, de 13 de junho
de 2008 e regulamentado pelo Decreto nº 29.396, de 13 de agosto de 2008.
Desde seu surgimento, o programa Distrital sofreu várias alterações
em seu conteúdo, nos termos das Leis Distritais nº 4.360, de 2009, 4.444,
de 2009 e 4.886, de 2012, além dos Decretos nº 30.238, de 2009, 30.514, de
2009, 30.630, de 2009, 31.218, de 2009, 32.040, de 2010, 32.941, de 2011,
33.963, de 2012 e 35.124, de 2014.
Estruturalmente o programa tem como fundamento o recebimento de
créditos do tesouro do Distrito Federal em benefício da pessoa física ou
jurídica adquirente de mercadoria, bem ou serviço de contribuintes do ICMS,
ou tomadora de serviço dos contribuintes do Imposto sobre Serviços de
Qualquer Natureza – ISSQN (DISTRITO FEDERAL, 2014b).
O beneficiário do programa, adquirente ou tomador, faz jus ao valor de
até 30% (trinta por cento) do ICMS ou do ISSQN efetivamente recolhido pelo
estabelecimento fornecedor ou prestador.
Importante frisar que o Distrito Federal, ante sua natureza de ente
federado atípico ou misto, cumula a competência tributária dos estados e
municípios, possibilitando não só incluir o ISSQN no programa de estímulo,
bem como incluir os descontos no tributo do IPTU.
Tendo a seu favor estes créditos, o participante pode utilizá-los para
obtenção de abatimento do débito do Imposto sobre a Propriedade Predial e
Territorial Urbana – IPTU ou do Imposto sobre a Propriedade de Veículos
Automotores – IPVA, assim como crédito de dinheiro em conta corrente.
Neste sentido, o artigo 3º do Decreto nº 29.369, de 13 de agosto de 2008
determina:
decorrente das operações ou prestações promovidas pelos contribuintes do ICMS ou do ISS enquadrados nas atividades econômicas que venham a ser estabelecidas em ato da Secretaria de Estado de Fazenda do Distrito Federal. (NR)
§ 1º Para efeito de cálculo e distribuição do crédito a que se refere o caput, serão considerados:
I - a proporcionalidade entre o valor do documento fiscal referente à aquisição e o valor total dos documentos fiscais emitidos pelo contribuinte, no respectivo mês, considerados os documentos não cancelados e com indicação do CPF ou do CNPJ do adquirente passível de participação no programa;
II - em relação a cada documento fiscal, o limite de 7,5% (sete inteiros e cinco décimos por cento) para ICMS e 1,5% (um inteiro e cinco décimos por cento) para ISS;
O programa Nota Legal alcançou grande popularidade, com a adesão
maciça da população ao programa. Vejamos o crescimento do número de
pessoas que indicaram ao menos um bem para o uso dos créditos e
abatimento do valor do imposto a pagar, e a própria evolução dos descontos
concedidos entre os anos de 2010 e 2013 (DISTRITO FEDERAL, 2014b):
Tabela 4 - Evolução dos beneficiários e do valor dos descontos
Ano
Beneficiários que efetuaram a
indicação
IPVA IPTU
Total utilizado R$ Nº
veículos Valor R$
Nº
imóveis Valor R$
2010 18.295 13.872 350.950,46 3.098 110.709,09 461.659,55
2011 106.216 75.290
17.289.536,12 20.245 5.762.509,57 23.052.045,69
2012 256.182 181.394
60.180.450,01 53.378 18.474.675,67 78.655.125,68
2013 330.633 248.819
71.444.863,87 63.543 19.053.872,17 90.498.736,04
2014 347.263 252.922 62.537.202,11 62.334 16.028.635,80 78.565.837,91
Assim, desde a sua entrada em vigor, aludido programa já deu descontos no pagamento de tributos a 2.875.516 contribuintes (DISTRITO
FEDERAL, 2014b).
Os créditos a favor dos beneficiários do Programa Nota Legal ficam
disponíveis para utilização por dois anos, findos os quais serão cancelados e
estornados ao caixa do tesouro do Distrito Federal, nos termos do artigo 5º, §
1.5.2 Incentivos ao participante
Conforme visto, o participante do Programa Nota Legal pode utilizar
seus créditos no abatimento dos valores devidos à Fazenda Distrital no IPTU
e no IPVA, além de crédito de dinheiro em conta corrente e poupança.
No uso dos créditos pelo participante, quanto à redução do imposto do
veículo automotor ou do imóvel, não é exigido vínculo entre o possuidor do
crédito e os imóveis ou veículos a serem contemplados pelo abatimento, nem
a conta corrente ou poupança precisa estar em nome do beneficiário do
programa, bastando a simples indicação do bem ou conta para crédito. Esta
é a dicção da Lei Distrital nº 4.159, de 13 de junho de 2008:
Art. 5º Os créditos a que se refere esta Lei poderão ser utilizados como abatimento do valor do débito do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU e do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA.
§ 1º A transferência de créditos de que trata esta Lei será permitida somente entre pessoas físicas.
§ 2º Não será exigido vínculo entre o possuidor do crédito e os imóveis ou veículos a serem contemplados pelo abatimento.
§ 3º Não poderão utilizar ou transferir créditos os inadimplentes em relação a obrigações pecuniárias, de natureza tributária ou não-tributária, administradas pela Secretaria de Fazenda do Distrito Federal.
§ 4º Não serão objeto de abatimento o IPTU ou o IPVA relativos a imóvel ou veículo referente ao qual exista débito vencido.
§ 5º Serão cancelados e estornados ao caixa do Tesouro do Distrito Federal os créditos não utilizados no prazo de dois anos, contados do mês em que ocorreram as aquisições.
§ 6º As pessoas físicas ou jurídicas não contribuintes dos impostos a que se refere este artigo poderão receber o crédito por meio de depósito em conta corrente ou poupança, mantida em instituição financeira do Sistema Financeiro Nacional e indicada pelo beneficiário cadastrado no programa.
Os créditos para descontos nos impostos, ou para crédito em conta
corrente, apenas podem ser utilizados para beneficiários do programa em dia
com o fisco distrital, nos termos do art. 5º, § 3º da Lei Distrital nº 4.159, de
13 de junho de 2008.
O crédito em dinheiro é residual, pois apenas os não proprietários de
imóveis ou de veículos podem optar por essa modalidade de incentivo.
O programa encontra-se plenamente implantado, apesar da ocorrência
de inúmeros percalços pelos quais passou (e passa). Na tabela 4 (acima),
percebe-se a queda significativa dos valores objeto de indicação para o
desconto do IPTU e do IPVA, tendo ocorrido uma redução superior a
dezesseis milhões de reais entre os anos de 2013 e 2014, diferença não
compensada com a indicação de conta corrente ou poupança para crédito,
no importe aproximado de R$ 3.300.000,00, até 29 de agosto de 2014
(DISTRITO FEDERAL, 2014b).
Esta redução no valor dos créditos e consequentemente do abatimento
nos impostos, deve-se à mudança da forma do cálculo dos créditos ocorrida
em 2012, podendo ocasionar desinteresse da população pelo programa
(RODRIGUEZ, 2014).
Voltando à descrição do estágio de implantação do programa, desde o
início do Nota Legal em agosto de 2008, até julho de 2012, o benefício só era
aproveitado por quem tinha que pagar o Imposto Predial e Territorial Urbano
(IPTU) e o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).
Projeto de Lei de iniciativa da Câmara Legislativa estendeu o benefício ao
restante da população, ainda que não possuidores ou proprietários de
veículo automotor ou imóvel, por meio de créditos em dinheiro depositados
em conta bancária. O projeto foi vetado pelo Poder Executivo, veto que foi
posteriormente rejeitado pela Câmara Legislativa Distrital, redundando na
aprovação da Lei nº 4.886, de 13 de julho de 2012.
A proposta aprovada pela Câmara Distrital e vetada pelo Executivo,
tentava a época aproximar o Nota Legal do programa no qual ele se inspirou,
o Nota Fiscal Paulista. A versão paulista concede desde sua criação, a
qualquer participante, o direito de decidir se quer receber o crédito sob a
forma de desconto ou pagamento em dinheiro em espécie, por meio de
depósito em conta corrente ou poupança. O programa distrital oferecia como
única opção o desconto de seus créditos incidentes sobre o débito fiscal do
IPTU e do IPVA.
O principal argumento trazido a lume como fundamento do veto, dizia
financeira do DF, e que haveria sérias implicações na Lei de
Responsabilidade Fiscal por causar impacto desconhecido no orçamento,
afirmações que serão analisadas em momento oportuno no presente
trabalho.
O Secretário de Fazenda à época, havia se declarado desfavorável ao
projeto de lei que introduzia as alterações. Assentou sua opinião no fato de o
programa ter um teto de remuneração que não poderia se sustentar, caso
fossem incluídos mais beneficiários além daqueles que pagavam IPTU e
IPVA, ao contrário do que vinha sendo praticado no Estado de São Paulo.
Aludiu ainda que uma versão ampliada do Nota Legal traria dificuldades ao
erário pois uma mudança desse tipo forçaria a alteração da própria
estrutura do programa com a reorganização do mesmo (BRANCO, 2011).
Importa frisar que o Programa Nota Paulista, que aparentemente serviu
de paradigma para a implantação do programa distrital, sempre concedeu
créditos em dinheiro aos participantes, inclusive não residentes em São
Paulo.
Sob outro prisma, a lei instituidora do Programa Nota Legal,
estabelecia inicialmente que o crédito utilizado no abatimento do pagamento
do IPTU e IPVA (posteriormente também crédito em dinheiro) seria no
percentual de até 30% (trinta por cento) do imposto, e o decreto
regulamentador – Decreto nº 29.396, de 2008 – previa que a outorga do
crédito seria de 20% (vinte por cento). Posteriormente, o Decreto nº 30.328,
de 2009 fixou o percentual de 30% (trinta por cento) para o abatimento
(DISTRITO FEDERAL, 2014a).
Em outubro de 2012, outro Decreto, nº 33.963, de 2012 autorizou a
Secretaria de Fazenda do Distrito Federal a definir o percentual de até 30%
(trinta por cento) em razão da atividade econômica preponderante, do regime
de apuração do imposto, do porte econômico ou da localização do fornecedor
ou prestador, produzindo efeitos retroativos a partir de 1º de maio de 2012, o
que resultou na edição da Portaria nº 187, de 2012, que por sua vez criou
uma fórmula de cálculo, denominada de Fator de Multiplicação para o
documento fiscal, mediante a multiplicação do fator correspondente ao
enquadramento por atividade econômica preponderante, estabelecido na
forma do anexo único da referida portaria.
Portanto, de acordo com a alteração superveniente na forma de cálculo
do crédito, este passaria a ser obtido mediante a multiplicação desse
percentual por um índice que o Distrito Federal elegeria, a seu exclusivo
juízo, em relação a determinadas categorias de serviços ou compras de bens.
As modificações acima descritas, no sistema de apuração e cálculo do
Nota Legal acarretavam uma redução do valor dos créditos e do desconto
obtido pelos participantes do Programa, com efeitos retroativos a maio de
2012, aparentemente infringindo a cláusula constitucional que trata do
direito adquirido (BRASIL, 2013b). E o valor dos créditos vem caindo desde
2012. Por exemplo, em relação ao valor médio resgatado por contribuinte a
queda foi de 16,9% entre os anos de 2013 e 2014. Enquanto em 2013 cada
consumidor conseguiu, em média, R$ 272,72, em 2014, o resgate foi de R$
226,51 (MAIA, 2014).
Desta forma, apesar da possibilidade de alteração dos programas de
incentivo a qualquer tempo, modificando o cerne do programa, inclusive no
que diz respeito ao percentual de descontos incidentes sobre o IPTU e o
IPVA, há que se preservar o princípio do direito adquirido previsto no artigo
5º inciso XXXVI da Constituição da República.
No ano de 2014 um fenômeno interessante ocorreu com o programa
em análise, pois apenas 41,8% dos contribuintes aptos a receber descontos
nos impostos resgataram os créditos para tal fim. Segundo informações da
Secretaria de Fazenda do Distrito Federal, dos 836 mil consumidores
cadastrados, apenas 347 mil usaram o valor para abatimento no IPVA e no
IPTU. Da quantia disponível, somente 36,9% dos R$ 213 milhões foram
utilizados, totalizando R$ 78,6 milhões. Em relação ao valor médio resgatado
por contribuinte a queda foi de 16,9% (MAIA, 2014).
Segundo o Executivo Distrital, há duas explicações para essa situação:
“Primeiro que muita gente está esperando o prazo para fazer o resgate em
com o crédito e a inadimplência está alta", explicou Márcia Robalinho,
secretária adjunta da Secretaria de Fazenda (MAIA, 2014).
A previsão de impossibilidade de utilização dos créditos do programa
no caso de inadimplência em relação a obrigações pecuniárias, de natureza
tributária ou não tributária, administradas pela Secretaria de Fazenda do
Distrito Federal, encontra previsão no artigo 5º, § 3º da Lei nº 4.159/2008
que instituiu o programa distrital (DISTRITO FEDERAL, 2008).
No site do programa, a queda do valor utilizado para os descontos é
clara, passando de R$ R$ 90.499.195,68 em 2013 para R$ 78.565.837,91
em 2014 (DISTRITO FEDERAL, 2014b), provocando uma redução do valor
dos descontos no IPVA e no IPTU de quase doze milhões de reais. E a
redução no valor dos descontos não foi compensada pelo aumento dos
créditos em dinheiro nas contas dos participantes, pois a indicação para
depósito foi de R$ 1.665.891,15. Assim, existe uma redução real da
utilização dos créditos no importe de R$ 10.267.006,98 ainda que tenha
ocorrido um incremento no número de participantes que indicaram um bem
para o desconto no tributo, que passou de 330.634 em 2013 para 347.263
em 2014, o menor crescimento da história do programa.
1.6 PROGRAMA NOTA FISCAL CIDADÃ DO PARÁ
1.6.1 Fundamento jurídico, estrutura e funcionamento
O programa Nota Fiscal Cidadã foi instituído pela Lei nº 7.632, de 22
de maio de 2012 e regulamentado pelo Decreto nº 490, de 1º de agosto de
2012.
O programa prevê a realização de sorteio em dinheiro ao participante
que exigir a emissão de documento fiscal hábil, com créditos do tesouro do
estado.
Para efeito de premiação, o participante deve se inscrever no site do
programa. A cada compra deve solicitar a nota ou cupom fiscal, informando
documento do comprador. O vendedor repassa eletronicamente à Secretaria
da Fazenda, as informações que vão gerar um banco de dados para fins de
emissão de bilhetes para sorteio. Trimestralmente são gerados bilhetes, um a
cada cem reais em compras, para cada CPF ou CNPJ registrado. No dia do
sorteio, os bilhetes serão escolhidos de forma eletrônica e os valores serão
depositados em conta corrente ou caderneta de poupança. O montante
global da premiação corresponde a até 5% do valor total do ICMS recolhido
mensalmente pelos estabelecimentos enquadrados no Programa, que conta
com mais de 118.000 participantes, com distribuição total de prêmios
superior a um milhão e quatrocentos mil reais (PARÁ, 2014).
Não há previsão de cancelamento ou prescrição de créditos, pois são
gerados bilhetes para o sorteio e que perdem a validade para os sorteios
posteriores.
Por seu turno, o Decreto nº 490, de 1º de agosto de 2012 impede a
participação nos sorteios da pessoa natural ou jurídica em situação irregular
com o fisco, nos termos do artigo 10, inciso III.
No balancete governamental de novembro de 2013 a premiação no mês
correspondeu a R$ 47.783,24 e acumulado no ano a R$ 702.547,64 (PARÁ,
2013).
1.6.2 Incentivos ao participante
Prêmios em dinheiro após sorteio dos bilhetes, ao consumidor que
exigir do fornecedor de mercadorias e bens a emissão de documento fiscal
hábil, com identificação do adquirente.
O montante global da premiação corresponderá a até 5% do valor total
do ICMS recolhido mensalmente pelos estabelecimentos enquadrados no
Programa Nota Fiscal Cidadã.
Os sorteios são trimestrais e os prêmios variam de R$ 50,00
(cinquenta reais) até R$ 30.000,00 (trinta mil reais).