Poesias de A a Z Volume II
Miguel Rodrigues
Julho/Agosto 2020
Alimento
Alivia a fome por um momento
Em excesso traz grande tormento Alguns só apetecem ao paladar
Outros causam até repulsa, nem podendo encostar.
Alguns servem de válvula de escape Para esquecer um ressentimento
Alguns comem até dizer: não cabe
Muitos de vez em nunca dispõe de um alimento.
Bagunça
Feita pelas crianças
Também na divisão da herança
Na soltura do preso que pagou fiança.
Nas contas públicas desde o Império Nas nomeações sem qualquer critério País assim não se leva a sério.
É inimiga da organização Não rima com maturidade
Muito menos com prosperidade.
Coisa
Qualquer que seja Tem quem deseja Mesmo sendo vago
Tal qual objeto no lago.
Pode ser importante Uma busca incessante
Às vezes não se sabe o que é Nem se vai dar pé.
Ela pode ser julgada Pode ser culpada
E também no lixo jogada.
Pode ser de cinema, de novela
Ou algo que escandaliza, que escabela E incrivelmente pode ser bela.
Dentro
Da verdade Da legalidade
Ou fora, não tem outra opção Escolher está fora de questão.
Escadas
Havemos
de subir os degraus da maturidade
Mas também
descerAqueles que começam na soberba
E terminam na humildade.
Fronteira
O sul que me deste Faz divisa
Com o norte que puseste Como limite àquele povo.
Cada qual com seu costume Quando ultrapassa a barreira Não é pequeno o queixume Até que veio a guerra.
Não foi uma invasão Mas uma visita
Para estabelecer uma relação
Nunca se sabe o dia da necessidade.
Gestão
Quando é ruim Indigestão
Quando o projeto é bom
Espera-se como se fosse gestação.
Quando é pública Interrogação
Se for reprovada Cassação.
Nas mãos erradas Assombração
Cadeira desocupada
A maior competição.
Hesitante
Se hesito
Não consigo êxito Decerto é irritante.
Hei de ser assertivo Não errante
E tão-somente não vacilante.
Inteligências
Artificial
Fora do normal Irracional
Eleitoral?
Para o bem e o mal Surreal
Espacial
Neopsicogeoemocional.
Do que adianta Se uma anta Com indicação
Vai ganhar a colocação.
Janelas
Terapêutica Epidemiológica
E para ver a banda passar.
De alumínio De madeira
E do sistema operacional.
Com as frestas pro ar circular Fechadas pro som da festa abafar
Bem aberta pro sol no quarto entrar.
Leve
O peso insuportável de decidir Os rumos da elevada carga
Tributária, é necessário agir
Para que o projeto não vá pela descarga.
A força é brutal O peso é irreal
Questão de sobrevivência
Mas não afeta quem age por conveniência.
A dureza é inegável E o povo está duro
É fato presente e futuro.
Até o sono é pesado Pesadelo continuado
Situação incontrolável.
Massa
De manobra
Não tem aquela dita cinzenta Sofre mas aguenta.
E o que sobra
Até dá pra fazer uma obra
Faz acreditar que está no caminho certo.
Navegação
Já dizia o poeta: viver não é preciso Mas é necessário ter uma direção Se na bússola busca pelo norte
Jamais chegará se estiver rumo ao sul.
Ossos
Do ofício não respondido Difícil e duro de roer
Nem cachorro pega pra morder.
Desgastado e mal recompensado Dá-se o sangue pela repartição
Vão dizer: não fez mais do que obrigação.
Perdão
Pela canção sem melodia Pela prosa sem coesão
Pela pintura de traços falhos.
Mais uma chance
Não cancele este poema Verás que valerá a pena.
Pela verdade dita atravessada Pela falta de bajulação
Pela sinceridade na relação.
É preciso mais transparência Muito mais paciência
E menos indiferença.
Questão
De bom senso
Apesar do contrassenso De opinião
Fundada numa interpretação.
De honra
A qualquer custo ser preservada?
De ideologia
A qualquer custo defendida?
De paladar
Afinal gosto não se discute De personalidade
Ou aceita ou daqui se mude.
Rup tura
Realidade rompida Razão reacionária Raiz renegada.
Riqueza riscada Rivalidade rasgada Resposta rechaçada.
Risco relegado Rixa reiterada
Rapadura repaginada.
Sério
Que é assim mesmo?
Que a mentira se alastra mais que a verdade?
Que as condições são precárias?
Que os interesses pessoais prevalecem?
Que a justiça muitas vezes é seletiva?
Que a política é um jogo masculino?
Que a boa educação é para poucos?
Que é difícil mudar este quadro?
Tradição
Milenar ou recente
Nem sempre dá pra traduzir Para a geração presente.
Muitas vezes congelada no tempo Exageradamente arcaica
Um verdadeiro convite para o conflito.
Vale a pena manter?
Não dá para ser flexível?
Quem está ganhando?
Utopia
É pensar fora da caixinha, Mas dentro dela é agradável Tão gostosa e quentinha Mudança é desagradável.
Quem fica só na caixinha Não conhece o mundo afora E quando sai se choca
Com a realidade, o preconceito é quase certo.
Volátil
É a substância que quer se evaporar É a memória que não quer se guardar
É a riqueza que se ganha sem ter que trabalhar É o relacionamento em que não há desejo de amar.
É uma infância não vivida
É uma juventude que foi esquecida É uma maturidade não reconhecida É uma vida não vivida.
O tempo não aproveitado O planejamento ignorado O sonho não lembrado.
A ideia do poema não escrito O sentimento não traduzido O elogio que quase foi dito.