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A PRÁTICA DO PSICÓLOGO NO SISTEMA PRISIONAL DO ESTADO DE SÃO PAULO MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

ROSELI GOUVÊA

A PRÁTICA DO PSICÓLOGO NO SISTEMA PRISIONAL DO

ESTADO DE SÃO PAULO

MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

SÃO PAULO

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

ROSELI GOUVÊA

A PRÁTICA DO PSICÓLOGO NO SISTEMA PRISIONAL DO

ESTADO DE SÃO PAULO

MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Psicologia Social, sob a orientação do Prof. Doutor Salvador Antonio Mireles Sandoval.

SÃO PAULO

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AGRADECIMENTOS

Para que a realização deste trabalho fosse possível, diferentes pessoas disponibilizaram seu tempo, atenção, apoio e conhecimento. A todos que participaram na construção desta dissertação, o meu agradecimento.

Agradeço ao Prof. Doutor Salvador Antonio Mireles Sandoval pela confiança, orientação, questionamentos e memoráveis aulas.

Aos Psicólogos que colaboraram com esta pesquisa, meu especial agradecimento, sem os quais este trabalho não seria possível. Agradeço a lição de humildade, confiança e maturidade ao exporem suas práticas profissionais.

Ao Prof. Doutor Alvino Augusto de Sá e ao Prof. Doutor Antonio da Costa Ciampa agradeço as preciosas considerações e contribuições.

A Mauro Rogério Bittencourt, Diretor Técnico de Departamento de Reintegração Social Penitenciário da Secretaria da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo e a Andréa Paula Piva, psicóloga, Diretora Técnica de Divisão de Saúde do Departamento de Reintegração Social Penitenciário, agradeço pelo apoio, abertura e colaboração à pesquisa.

A Arlindo da Silva Lourenço, Diretor do Sindicato dos Psicólogos agradeço pelo apoio à pesquisa.

Agradeço a Adriana Eiko Matsumoto, Conselheira e Coordenadora do Grupo de Trabalho do Sistema Prisional do Conselho Regional de Psicologia - 6ª Região - SP e a Valdirene Daufemback, Comissão de Atuação do Psicólogo no Sistema Prisional do Conselho Federal de Psicologia, pelo apoio à pesquisa e a disponibilização de dados, informações e registros.

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Na pessoa do Dreyf de Assis Carvalho agradeço aos caros colegas que conheci no Programa, os quais possibilitaram o partilhar de conhecimentos e dúvidas.

Agradeço a Márcia Barros de Toledo Rosolia pela motivação inicial e o apoio durante a trajetória.

A Adilson Fernandes de Souza, Lúcia Patrocínio da Silva, Márcia Trezza, Marisa Fortunato, Maria da Conceição Santim Capello e Mônica Moreira de Oliveira Braga Cuckierkorn, agradeço a motivação, o apoio e o partilhamento de experiências profissionais, que me possibilitaram crescer.

Pela atenciosa e pronta ajuda na organização da pesquisa, execução e finalização deste trabalho, agradeço a Amanda de Moraes Gouvêa, a Dumara Shirosa Mendes, a Luisa Crema, ao Marcos Brunini, Rafaela de Moraes Gouvêa e a Roslaine Gouvêa.

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RESUMO

O objetivo deste trabalho é conhecer a prática do psicólogo no sistema prisional do Estado de São Paulo, pesquisa de caráter exploratório, visto a diminuta referência de estudos sobre o referido tema nos últimos dezessete anos.

Para tanto, orientamos nossa pesquisa por meio de diferentes métodos, os quais possibilitaram a busca, o complemento e o cruzamento de dados provenientes de diversas fontes, a saber: 1) pesquisa e análise de documentos legais e oficiais, caracterizando o sistema prisional nacional e estadual, bem como as atribuições do psicólogo no sistema prisional nos termos da legislação vigente; 2) pesquisa da literatura científica, acompanhamento de encontros regionais, estaduais e nacional, promovidos pelo sistema conselhos da classe de psicólogos, e interlocução com instituições afins; 3) questionários e entrevistas individuais com os próprios profissionais, psicólogos e psicólogas, que atuam no sistema prisional do Estado de São Paulo, considerando os diferentes regimes (provisório, fechado e semi-aberto) e respectivas unidades prisionais.

Como resultado, constatamos a construção paulatina, contínua e desafiadora da prática do psicólogo no sistema prisional paulista, influenciada e protagonizada por diversos atores envolvidos na elaboração e referência das atribuições profissionais. Essa prática profissional é traduzida por diversas atribuições, objetivos e diferentes sujeitos de atenção do psicólogo no sistema prisional e judiciário.

Conhecer a prática profissional do psicólogo e os questionamentos atuais sobre essa prática, nos possibilita desvelar e refletir sobre a contribuição da Psicologia, num contexto social e econômico desigual e excludente, marcado por um sistema seletivo de segurança, justiça e punição.

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ABSTRACT

The aim of the present essay is to know more about psychologists’ professional practice developed in São Paulo State prison system, an explorative research, given the very little amount of studies concerning the subject-matter published throughout the last seventeen years.

We conducted our research using different methods, which provided the search, complement and data and information’s crossing from the following sources: 1) legal and official documents’ research and analysis , distinguishing Brazilian national, and São Paulo’s prison system, and psychologists’ functions in the system according to current legislation; 2) review of scientific literature, keeping up with professionals’ regional meetings promoted by psychological societies and contacting related institutions; 3) questionnaires and personal interviews involving psychologists themselves, both male and female, working in São Paulo’s prison system, considering those environments sentences are carried out - including residential and non residential settings combined, and residential model only, as well as provisory detention -, and their prison unities respectively.

As a finding, we note a gradual, continuous and defiant professional practice construction regarding psychologists in São Paulo’s prison system, being influenced and leaded by several actors involved with the construction itself and like references for psychology’s application in this particular field. This practice shows itself through its functions, aims and attention psychologists pay to different persons on justice and prison systems. Knowing psychologists’ professional practice and their actual questions about it, point us a chance to reflect and unveil Psychology’s contribution, considering an inequable social and economic context that excludes, marked by a selective system of security, justice and punishment.

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SUMÁRIO

LISTA DE TABELAS ...10

1. INTRODUÇÃO...11

2. PRISÃO - CONSTITUIÇÃO SOCIAL, POLÍTICA E HISTÓRICA...17

2.1 Política da Ilegalidade ...25

2.2 No Brasil...28

2.3 Exclusão ...31

3. CRIMINOLOGIA ...38

3.1 Do conceito...38

3.2 Do objeto e respectivos conceitos ...42

3.2.1 Do delito ... 42

3.2.2 Do criminoso... 43

3.2.3 Da vítima... 44

3.2.4 Do controle social do delito... 45

3.3 Teoria Crítica...46

4. SISTEMA PRISIONAL ...57

4.1 Prisão, instituição total ...57

4.2 Bases conceituais para um sistema prisional...61

5. METODOLOGIA...64

6. SISTEMA PRISIONAL DO BRASIL E A CARACTERIZAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DO PSICÓLOGO SEGUNDO A LEGISLAÇÃO VIGENTE ...72

6.1 Sistema Prisional do Brasil...72

6.2 Caracterização das atribuições do psicólogo do sistema prisional segundo a legislação nacional vigente...77

7. SISTEMA PRISIONAL DO ESTADO DE SÃO PAULO ...83

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8.1 Inserção do psicólogo ...93

8.2 Caracterização das atribuições do psicólogo no sistema prisional do Estado de São Paulo ...97

8.2.1 Caracterização das atribuições do psicólogo no sistema prisional segundo a legislação estadual... 97

8.2.2 Caracterização das atribuições do psicólogo do sistema prisional do Estado de São Paulo segundo o Manual de Projetos de Reintegração Social... 109

8.2.3 Caracterização das atribuições do psicólogo do sistema prisional do Estado de São Paulo segundo registros do Conselho Regional de Psicologia - 6ª região - São Paulo... 112

9. CARACTERIZAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DO PSICÓLOGO NO SISTEMA PRISIONAL DO ESTADO DE SÃO PAULO SEGUNDO OS PRÓPRIOS PROFISSIONAIS ……….. ………121

9.1 Identificação dos profissionais ...121

9.2 Identificação da prática profissional...122

9.2.1 A prática profissional por unidade e respectivo regime prisional... 125

9.2.2 - Sistematização em relação à freqüência da execução das atividades ... 127

9.2.3 Atividades desenvolvidas e técnicas empregadas ... 128

9.2.4 As atividades e seus respectivos objetivos ... 130

10. CONCLUSÃO...139

11. EPÍLOGO ...143

12. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA... 148

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - População Prisional na América Latina - Ano de 2003 ...72

Tabela 2 - População Prisional no Brasil ...73

Tabela 3 - População Prisional por Estados – Ano 2004 ...74

Tabela 4 - População Prisional do Estado de São Paulo ...84

Tabela 5 - População Prisional do Estado de São Paulo -Tipo de Regime - Gênero ...88

Tabela 6 - Distribuição Quantitativa de Estabelecimentos Prisionais no Estado de São Paulo por Coordenadorias Regionais……….…...89

Tabela 7 - Estabelecimentos Prisionais e Respectivas Estruturas ...91

Tabela 8 - Psicólogos no Sistema Prisional Paulista ...95

Tabela 9 - Estabelecimentos Prisionais e Estruturas de Composição da Equipe Técnica...97

Tabela 10 - Atribuições do Centro de Reabilitação com Núcleo Interdisciplinar de Reabilitação e do Centro de Reintegração e Atendimento à Saúde ...100

Tabela 11 - Atribuições do Psicólogo no Centro de Reabilitação e Núcleo Interdisciplinar de Reabilitação e no Centro de Reintegração e Atendimento à Saúde com Núcleo de Atendimento à Saúde...104

Tabela 12 - Atribuições do Psicólogo no Núcleo de Atendimento Multidisciplinar...108

Tabela 13 - Manual de Projetos de Reintegração Social – Eixos e Temas ...110

Tabela 14 - Teses elaboradas no I Encontro Estadual da Atuação do Psicólogo no Sistema Prisional ...116

Tabela 15 – Prática profissional, unidade e respectivo regime prisional ...125

(11)

1. INTRODUÇÃO

O objetivo deste estudo, de caráter exploratório, é derivado dos questionamentos e reflexões oriundas da experiência pessoal e profissional de atuação na área da Psicologia Social, experiência essa iniciada em 1990 no trabalho com crianças e adolescentes abandonados, em situação de risco pessoal e social; em seguida, com comunidades em favelas em programas de habitação; e posteriormente, junto à população carcerária do Estado de São Paulo, em programas de educação e trabalho.

Nessa trajetória profissional, estiveram sempre presentes o questionamento e a reflexão quanto à prática do psicólogo num contexto social marcado pela desigualdade socioeconômica, onde o fenômeno de exclusão, constituído por um processo de

vulnerabilização, precarização e degradação das relações entre o sujeito e a sociedade, encerra-se em fatores estrutural e histórico.

Ante a amplitude dessa realidade, os sujeitos envolvidos e a recorrente reflexão quanto à prática profissional, consideramos delimitar o foco de nossa atenção e buscar conhecer a prática do psicólogo no sistema prisional do Estado de São Paulo, objeto do estudo desta dissertação.

O objetivo desta pesquisa é um recorte que visa compreender, na perspectiva da Psicologia Social, a intervenção profissional do psicólogo voltada a uma significativa parcela da população, que traz em sua história, a vivência de um processo de exclusão, e encontra-se num estágio crítico desse processo, a segregação e a possível aniquilação social.

(12)

Para conhecer a referida prática, enveredamos nossos estudos, inicialmente, para o local de trabalho desse profissional, a prisão - sua constituição histórica, social, política e econômica no final do século XVIII e início do século XIX, período marcado por significativas transformações socioeconômicas e, pela transição da forma de punir, da vingança pública - o suplício, para o período denominado humanitário, caracterizado pela

reforma do direito penal e a instituição da pena de privação de liberdade, analisadas por Foucault (1977), como a instituição da nova economia da política do poder de punir.

Considerando os objetivos da execução da pena de privação de liberdade, segundo a legislação nacional1, buscamos ainda ampliar a reflexão quanto ao fenômeno de exclusão, entendendo-o, conforme apontado por Castel (1997), como o “desfecho de procedimentos oficiais [...] que repousa sobre julgamentos e passa por procedimentos cuja legitimidade é atestada e reconhecida” 2 e, complementa Sawaia (2001), compreendendo-o, como um processo dialético de exclusão e inclusão que se constituem numa relação dinâmica e perversa, “condição da ordem social desigual” 3.

.

[...] processo complexo e multifacetado, uma configuração de dimensões materiais, políticas, relacionais e subjetivas [...] processo sutil e dialético, pois só existe em relação à inclusão como parte constitutiva dela [...] é um processo que envolve o homem por inteiro e suas relações com os outros. Não tem uma única forma e não é uma falha no sistema, devendo ser combatida como algo que perturba a ordem social, ao contrário, ele é produto do funcionamento do sistema. (Sawaia, 2001, p. 9)

1 Lei de Execução Penal, nº. 7210, de 11 de julho de 1984. Art. 1º - A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.

2 Castel, R. Wanderley, L. E. W. Wanderley, M. B. Desigualdade e a questão social. São Paulo: EDUC. 1997, p. 39 e 40.

(13)

A ponderação, quanto à execução da pena de privação de liberdade estar imbricada com um processo de exclusão, nos remete à necessidade de buscarmos compreender o fenômeno da criminalidade e “a criação de diferentes modelos explicativos dela” 4. Para tanto, no capítulo três, buscamos o diálogo com a Criminologia, observando a amplitude de atenção do objeto dessa ciência: o crime, a pessoa autora do crime, a vítima e o controle social do delito5.

Dentre os diferentes modelos explicativos da criminalidade, destacamos a perspectiva da teoria crítica, a qual considera que “o fundamento mais geral do ato desviado deve ser investigado junto às bases estruturais econômicas e sociais que caracterizam a sociedade na qual vive o autor do delito.” 6

No capítulo quatro, iniciamos nossa análise sobre o sistema prisional sob dois enfoques de estrutura e organização da prisão: o enfoque sociológico, referente às características de funcionamento da prisão, considerando-a como uma instituição total e suas conseqüências prejudiciais à pessoa presa, segundo Goffman (2003) 7. E o segundo enfoque, sob a organização e administração de um sistema prisional, apresentando “um esboço de bases conceituais” 8 e sua importância para um alinhamento conceitual e operacional, numa perspectiva “que torne menos dolorosa e danosa a vida na prisão” 9.

No capítulo posterior, realizamos a caracterização do sistema prisional e das atribuições do psicólogo segundo a lei vigente, em âmbito nacional e estadual.

4 Shecaira. S. S. Criminologia, São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2004. p. 76. 5 Shecaira. S. S. Criminologia, São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2004. 6 Ibid., 2004. p. 367.

7 Segundo, Goffman, E. Manicômios, prisões e conventos. São Paulo: Perspectiva, 2003.

8 Segundo, Sá. Alvino Augusto. Sugestão de um Esboço de Bases Conceituais para um Sistema Penitenciário. In Secretaria da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo. Departamento de Reintegração Social Penitenciário. Manual de Projetos de Reintegração Social. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2005. p. 13.

(14)

Esta caracterização indica-nos que o sistema prisional nacional possui 339.580 pessoas presas, distribuídas em 1051 estabelecimentos prisionais, com um déficit de 103.432 vagas10, considerando ainda, a estimativa de 42.000 pessoas adentrarem no sistema por ano, segundo cômputo do Ministério da Justiça - Departamento Penitenciário Nacional (Depen) 11.

A população carcerária do Estado de São Paulo representa 38% do universo nacional, ou seja, 130.29012 pessoas presas, distribuídas em 144 unidades prisionais, com um déficit de 56.287 vagas13, população e estrutura administradas por um grupo de funcionários, regidos pela legislação penal, constituindo-se no sistema prisional do Estado de São Paulo, sob responsabilidade da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária, a qual possui 329 psicólogos14em seu quadro funcional.

A caracterização da atribuição do psicólogo para atuação no contexto prisional descrito, se dá pela legislação nacional15, sendo o psicólogo, um dos profissionais que compõem a Comissão Técnica de Classificação16, a qual tem por função a classificação do condenado ou internado, segundo os seus antecedentes e personalidade, objetivando: 1) parecer técnico para orientação jurídica à progressão, regressão ou conversão de regime; 2) orientar a individualização da execução penal.

10 Segundo dados do Ministério da Justiça – Departamento Penitenciário Nacional (Depen), referente a dezembro de 2006, o sistema prisional nacional possui: Total de Estabelecimentos: 1.051; População do Sistema Penitenciário: 339.580; Vagas do Sistema; Penitenciário: 236.148; Secretaria de Segurança Pública: 61.656; População Prisional do Estado: 401.236; Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/depen/sistema/consolidado%202007.pdf >. Acesso em: jul.2007.

11 Cf. Ministério da Justiça –Departamento Penitenciário Nacional (Depen). Sistema Penitenciário no Brasil – Diagnóstico e Propostas. 2005.

12 Secretaria da Administração Penitenciária. Disponível em :<http://www.sap.sp.gov.br>. Acesso em: nov.2006.

13 Segundo dados do Ministério da Justiça – Departamento Penitenciário Nacional - Depen,. Sistema Penitenciário no Brasil – Diagnósticos e propostas, 2005.

14 Referência, maio de 2006, Secretaria da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo., maio de 2006. 15 Lei de Execução Penal, nº. 7210, de 11 de julho de 1984. Artigos 5º, 6º, 7º 8º e 9º.

(15)

A partir, da legislação de âmbito estadual17, as atribuições do psicólogo são esmiuçadas, sendo este profissional parte integrante das estruturas de comissões, centros ou núcleos, guardando essas estruturas a semelhança das atribuições dos profissionais que as compõem.

A dimensão dos números em escala estadual e a restrita referência de pesquisa desenvolvida18 sobre o tema proposto, fazem desta dissertação um estudo exploratório da prática do psicólogo no sistema prisional paulista.

Para tanto, orientamos nossa pesquisa por meio de diferentes métodos, os quais possibilitaram a busca, o complemento e o cruzamento de dados e de informações de diversas fontes, das quais destacamos a participação ou monitoramento de encontros regionais, estaduais e nacional, dos profissionais que atuam no sistema prisional paulista, promovidos pelo sistema conselhos de Psicologia.

Esses encontros possibilitou-nos conhecer e dividir os questionamentos e reflexões quanto à prática e os desafios profissionais no sistema prisional paulista; o papel da psicologia nas prisões; referências para formação; ética profissional; entre outros temas, de relevância e interesse do sistema de conselhos, psicólogos e psicólogas que atuam no sistema prisional paulista.

Constatamos através deste trabalho a construção paulatina, contínua e desafiadora da prática do psicólogo no sistema prisional, influenciada e protagonizada pelos diversos atores envolvidos na construção e referência das atribuições profissionais.

Conhecer a prática profissional em questão e os questionamentos atuais sobre essa prática, nos possibilita desvelar e refletir sobre a contribuição da Psicologia no processo de

17 Decretos de Lei que dispõem sobre a instituição e organização de estabelecimentos prisionais.

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resgate das relações, sujeito e sociedade, do restabelecimento do diálogo, visando à reintegração social19 da pessoa presa.

Cabe a Psicologia Social buscar compreender e intervir no restabelecimento e na

qualidade das relações sujeito e sociedade, promovendo a reflexão sobre o seu papel e responsabilidade frente a execução e construção de políticas públicas, orientadas a realidade de um contexto social e econômico desigual e excludente, marcado por um sistema seletivo de segurança, justiça e punição.

19

(17)

2. PRISÃO - CONSTITUIÇÃO SOCIAL, POLÍTICA E HISTÓRICA

No século XVIII e início do século XIX na Europa e nos Estados Unidos acontecem transformações sociais, econômicas e políticas que influenciaram, reorientaram e mudaram as relações na sociedade. Dentre essas transformações, encadeadas e entrelaçadas, que promoveram tantas outras, podemos destacar a urbanização, caracterizada pela formação das grandes cidades, concentração de pessoas e pelo crescente adensamento populacional; o novo sistema de produção, transformando as relações de trabalho; a medição do tempo, passando das estações do ano que orientavam o plantio e a colheita para o dia composto de vinte e quatro horas que orientavam o funcionamento da cidade urbanizada e da produção; a proletarização; a industrialização; a multiplicação e concentração da riqueza concomitante à multiplicação da pobreza; o avanço tecnológico representado pelas máquinas industriais; a evolução da ciência; etc.

A constituição de grandes cidades no século XIX, como Paris e Londres, será palco da junção das referidas transformações, sendo a urbanização e a industrialização impulsionadas pela expansão e abertura comercial entre os países, inaugurando o sistema capitalista industrial.

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A sociedade londrina constitui-se por classes hierarquizadas e apresenta uma escala

de valores morais associada ao exercício do trabalho, sendo os ricos considerados trabalhadores honestos; os desempregados ocasionais passíveis de serem resgatados pelo mundo do trabalho; e os desocupados considerados uma ameaça à sociedade.

Londres vai se tornando, dessa maneira, o outro lado da moeda, o símbolo das más conseqüências da vida urbana e da industrialização. Nela podem se acomodar os dissolutos, os preguiçosos, os mendigos, os turbulentos e os esbanjadores de dinheiro. Vê-se, portanto, reputada como o grande desaguadouro daqueles despidos das qualidades necessárias para integrar as fileiras do operariado fabril [...] a alternativa do emprego casual ou de formas menos honestas de sobrevivência, fazem da cidade de Londres o símbolo do resíduo social, aqueles homens que se encontram fora da sociedade [...] pessoas que não pautam suas existências pelos valores constitutivos da vida social - o trabalho, a propriedade e a razão [...] (Bresciani, 1982, p. 42 e 44).

Os pertencentes ao grupo denominado “resíduo social”, composto por uma população de mendigos, vagabundos, miseráveis, desempregados e trabalhadores ocasionais, expressam suas insatisfações e revoltas quanto às situações indignas através de manifestações nas ruas.

A organização dos pobres e miseráveis, em manifestações reivindicatórias é identificada na Inglaterra como “contágio moral” 20, em referência à influência negativaque a “classe residual” poderia exercer sobre os trabalhadores, através da identificação e reivindicação de interesses comuns de melhoria da qualidade de vida. Motivos pelos quais, a sociedade cobra políticas, ações de repressão e normas reguladoras.

A cidade de Paris não difere das condições de exploração e miséria que vive o trabalhador e o desempregado em Londres: “para o francês da época, praticamente inexiste

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diferença entre homem trabalhador, pobre e criminoso. Na verdade, constituem níveis de uma mesma degradada condição humana, a do trabalhador dos grandes centros urbanos.” 21

Na França, a ameaça de movimentos reivindicatórios era considerada ameaça política, pois, além da reivindicação de melhoria da qualidade de vida, também era reivindicada a representação política e, portanto, a mudança de regime político.

A associação entre o pobre, o vagabundo, a miséria e o crime é colocada como uma ameaça política e social, pois os que não se encaixamno mundo disciplinador e civilizatório do trabalho, temorizam “uma sociedade inquieta, com medo e orgulhosa de seu progresso” 22, sendo essa classe seguida e intimidada.

E isso porque identificam na miséria (tipo degradado da pobreza) um subproduto, uma criatura, da sociedade do trabalho; um dejeto, sobra sem lugar no social e, portanto, ameaça sempre presente na forma

inquietante do crime, mas também na forma mais perigosa da revolução. (Bresciani, 1982, p.58).

A preocupação mediante a ameaça de uma massa crescente de miseráveis, impõe a aplicação de orientação moral e legal para a disciplina e obrigação do trabalho através de normas reguladoras, como por exemplo, A Nova Lei dos Pobres de 1834, em vigor em toda a Inglaterra em 1840, que mantinha assistência aos sem-trabalho, mediante a obrigatoriedade de freqüência regular nas Casas de Trabalho (workhouses), supervisionadas por um conselho eleito por contribuintes.

Essas Casas, chamadas pelo homem pobre de Bastilha, configuravam uma verdadeira prisão. Seus altos muros e a disciplina carcerária, que previa a separação dos membros da família, trabalho pesado para os homens, refeições magras e em silêncio, a proibição de fumar, as visitas raras sob observação e pouquíssimo conforto, contribuíram para

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formar essa imagem. Se alguma dúvida perdurava quanto a uma nítida separação entre pobres no trabalho e pobres fora do trabalho, a Nova Lei dos Pobres cuidou de eliminar. (Bresciani, 1982, p. 101).

A sociedade que não podia conviver com a miséria fabricada, apresenta propostas de controle do “resíduo social”, como por exemplo:

[...] leis severas de controle da superpopulação e medidas no sentido de exportar o resíduo para as colônias; outros [...] propõem colônias de trabalho que reúnam tanto o resíduo como os desempregados em geral; [...] antigos membros da liberal COS chegam a formular a hipótese de colônias de trabalho, organizadas pelo governo, para recolher a pobreza residual; [...] adeptos de uma solução imperial, que consideram necessária, para além de medidas assistenciais do Estado, a solução radical de colônias de trabalho capazes de transformar o resíduo em trabalhadores que seriam alocados através do vasto Império Britânico. (Bresciani, 1982, p.107).

Concomitantemente em Paris, o temor da revolução, no século XIX, desencadeia ações para inibir e impedir manifestações “das classes perigosas” 23:

A tarefa de demolir uma revolução, na Paris do século XIX, foi entregue a equipe de técnicos que formulavam soluções pontuais permitindo devassar toda a vida das classes pobres. As portas de suas casas foram abertas, seus interiores vasculhados, sua conduta avaliada, seus valores morais aquilatados. O arsenal de informações colhidas e sistematizadas fornece as bases sobre as quais a família do pobre se transforma numa

realidade social passível de ser estudada cientificamente. (Bresciani, 1982, p.120).

(21)

Nesse contexto social, econômico, político e cultural, influenciado pelo movimento filosófico Iluminista, caracterizado pelas contestações dos ideais absolutistas e o culto à razão

como expressão e conquista da liberdade social e política24, ocorrerá a reforma das leis e da administração da justiça.

Na segunda metade do século XVIII e início do século XIX, identificamos a evolução histórica do direito penal25, caracterizada pela transição do período da vingança -fase da vingança pública26 para o período humanitário, sendo Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, (1738-1794), reconhecido como oporta voz dos anseios e ideais do referido período e, considerado ainda, o primeiro pensador da chamada Criminologia.

Em sua obra, “Dos delitos e das penas” (1764), o Marquês de Beccaria evoca a humanização e razão na legislação penal27, manifestando-se contra a tradição jurídica, contra os processos e julgamentos secretos, o juramento imposto aos acusados, a tortura, a confiscação, a desigualdade dos castigos segundo as pessoas e classe social oriunda, a atrocidade dos suplícios; estabelece limites entre a justiça divina e a justiça humana, entre os pecados e os delitos; condena o direito de vingança e toma por base do direito de punir a utilidade social; declara a pena de morte inútil e reclama a proporcionalidade das penas aos delitos, assim como a separação do poder judiciário e do poder legislativo28.

Esse movimento de transição entre o período de vingança (fase pública - o suplício) para o período humanitário é considerado por Foucault (1977), como o período em que “foi redistribuída, na Europa e nos Estados Unidos, toda a economia de castigo. Época de grandes

24 A “Filosofia da Ilustração foi decisiva para as idéias da Revolução Francesa de 1789”. Chauí, Marilena. Convite à Filosofia, 2003: Ática, p. 49.

25 Duarte, Maércio Falcão. Evolução histórica do direito penal. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 34, ago. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=932>. Acesso em: 09 jun. 2007.

26 O período da vingança é constituído por três fases históricas: fase da vingança privada, fase da vingança divina e fase da vingança pública. Conforme nota anterior.

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‘escândalos’ para a justiça tradicional, época dos inúmeros projetos de reformas: nova teoria da lei e do crime, nova justificação moral ou política do direito de punir; abolição das antigas ordenanças, supressão dos costumes; projeto ou redação de códigos modernos [...] Para a justiça penal, uma era nova.” 29

Foucault (1977) apresenta e analisa a transição da técnica de punir: dos bárbaros suplícios30, nos quais o objeto de punição é o corpo, para a prisão, onde o objeto de punição se desloca para a alma31, visando-a “privar o indivíduo de sua liberdade considerada ao mesmo tempo como um direito e um bem” 32.

A reforma do direito penal, nos séculos XVIII e XIX, discutida, idealizada e concretizada por inúmeros atores, entre eles magistrados, filósofos e legistas dá-se num contexto de diversos interesses, de pressão e insatisfação popular e numa onda de transformações sociais, econômicas e políticas, a saber:

- protestos populares contra os suplícios;

- a crítica e indignação de uma população quanto às práticas da (in) justiça penal, principalmente quanto à diferenciação da pena em função da classe social oriunda; - protestos “contra as penas excessivamente pesadas para os delitos freqüentes e

considerados pouco graves [...] ou contra castigos que punem certas infrações ligadas a condições sociais, como o furto doméstico” 33;

29 Foucault, 1977, p.13.

30 “O suplício penal não corresponde a qualquer punição corporal: é uma ´produção diferenciada de sofrimentos, um ritual organizado para a marcação das vítimas e a manifestação do poder que pune: não é absolutamente a exasperação de uma justiça que, esquecendo seus princípios, perdesse todo o controle. Nos ‘excessos dos suplícios, se investe toda a economia do poder.” (Foucault, 1977, p. 35).

31 “Que o castigo, se assim posso exprimir, fira mais a alma do que o corpo”. G. de Mably. De la législation, Oeuvres complètes. 1789.t. IX p.326. (apud Foucault, 1977, p. 21).

(23)

- a multiplicação das riquezas e das propriedades (imobiliária, comercial e industrial);

- a necessidade de segurança e garantia dos bens;

- a valorização moral e jurídica das relações de propriedade;

- a transição dos crimes contra o direito para os crimes contra a propriedade; - intolerância aos delitos;

- a justiça e seus textos (códigos) tornam-se mais severos, principalmente quanto ao delito roubo;

- a ampliação do aparato policial;

- a crença generalizada do aumento da criminalidade;

- mecanismos de poder ajustados ao controle e observação social;

- a crítica à justiça penal não sistematizada e unificada, orientada pelas diferenças de costumes e de procedimentos;

- a proposta de reforma do poder judiciário, que busca suprir a corrupção, abuso de poder, os privilégios por interesses particulares de orientação política e ou econômica e a definição de papéis entre a formulação e aplicação das leis;

- a autonomia do judiciário em relação à monarquia;

(24)

De acordo com Foucault (1977), a reforma penal constitui-se a partir da crítica à “má economia do poder e não tanto [...] à crueldade” 34 dos suplícios. Tendo como interesse principal, a diminuição do custo econômico e político das punições e o controle social.

O verdadeiro objetivo da reforma, e isso desde suas formulações mais gerais, não é tanto fundar um novo direito de punir a partir de princípios mais eqüitativos: mas estabelecer uma nova ‘economia’ do poder de castigar, assegurar uma melhor distribuição dele, fazer com que não fique concentrado demais em alguns pontos privilegiados, nem partilhado demais entre instâncias que se opõem; que seja repartido em circuitos homogêneos que possam ser exercidos em toda a parte, de maneira contínua e até o mais fino grão do corpo social. A reforma do direito criminal deve ser lida como uma estratégia para o remanejamento do poder de punir, de acordo com modalidades que o tornam mais regular, mais eficaz, mais constante e mais bem detalhado em seus efeitos; enfim que aumente os efeitos diminuindo o custo econômico [...] e seu custo político. A nova teoria jurídica da penalidade engloba na realidade uma nova ‘economia política’ do poder de punir [...] fazer da punição e da repressão das ilegalidades uma função regular, coextensiva à sociedade; não punir menos, mas punir melhor; punir talvez com uma severidade atenuada, mas para punir com mais universalidade e necessidade; inserir mais profundamente no corpo social o poder de punir. (Foucault, 1977, p. 75-76).

Configurando-se a transformação da técnica de punir, justificada por princípios humanizadores na aplicação e execução da pena imposta, a transição do suplício para o encarceramento, deu-se de forma irregular e gradual na Europa e nos Estados Unidos sendo, até os dias atuais, a privação de liberdade associada às sanções ao corpo, como trabalho forçado, alimentação inadequada, insalubridade dos espaços físicos e outras condições que causam sofrimento físico.

(25)

Cabe destacar que a punição através do suplício só foi eliminada no início do século XIX, sendo a Inglaterra um dos países mais resistentes ao término do suplício como aplicação de pena, sendo essa resistência uma alternativa de repressão e controle social, mediante o quadro de vulnerabilidade social e política que se encontrava nesse período.

2.1 Política da Ilegalidade

“A conjuntura que viu nascer a reforma não é portanto a de uma nova sensibilidade; mas a de outra política em relação à ilegalidade” 35. Essa política, desencadeada na reforma penal, analisada por Foucault (1977), apresenta a codificação e penalidade criminal de determinadas práticas ilegais, toleradas pela sociedade como ilegalidades de bens e de direitos.

Antes da reforma penal, no Antigo Regime, os diferentes estratos sociais contavam com a tolerância a determinadas práticas ilegais, as quais pertenciam ao funcionamento político e econômico da sociedade. Essas ilegalidades traduziam-se: em privilégios individuais ou coletivos concedidos às camadas mais favorecidas; em margens de tolerância à inobservância à lei como expressão geral; em “consentimento mudo do poder, de uma negligência ou simplesmente da impossibilidade efetiva de impor a lei e reprimir os infratores” 36. Tais práticas ilegais ou privilégios eram tão incrustadas no funcionamento de cada estrato social que as tentativas para reduzí-las ou reprimí-las geravam manifestações do respectivo estrato: de populares, da nobreza, do clero e da burguesia37.

35 Foucault, 1977, p.76. 36 Ibid., p. 76.

(26)

Essa ilegalidade necessária, tolerada e exercida por diferentes estratos sociais apresenta uma série de “paradoxos” 38 relacionados à ambigüidade da ilegalidade dos bens e dos direitos39, dificultando a distinção jurídica e moral.

Assim, “a criminalidade se fundamentava numa ilegalidade mais vasta, à qual as camadas populares estavam ligadas como a condição de existência; e inversamente, essa ilegalidade era um fator perpétuo de aumento da criminalidade” 40, tal ambigüidade era retratada nas atitudes populares através da aceitação ou reprovação, conforme a especificidade de determinado ato.

Na segunda metade do século XVIII, num contexto de aumento da riqueza e propriedades (principalmente comerciais e industriais), associado ao crescimento demográfico, a ilegalidade popular muda o foco dos direitos para os bens: “a pilhagem , o roubo, tendem a substituir o contrabando e a luta armada contra os agentes do fisco” 41. A pressão sobre a ilegalidade popular, durante a Revolução Francesa e durante todo o século XIX, se traduz numa repressão rigorosa, buscando a codificação e punição das ilegalidades, submetendo a ilegalidade popular a um regime de maior controle:

Com as novas formas de acumulação de capital, de relações de produção e de estatuto jurídico da propriedade, todas as práticas populares que se classificavam, seja numa forma silenciosa, cotidiana, tolerada, seja numa forma violenta, na ilegalidade dos direitos, são desviadas a força para a ilegalidade dos bens [...] a economia das ilegalidades se reestruturou com o desenvolvimento da sociedade capitalista. A ilegalidade dos bens foi separada da ilegalidade dos direitos. Divisão que corresponde a uma oposição de classes, pois, de um lado, a ilegalidade mais acessível às classes

38 Foucault, 1977, p. 76.

39 “[...] da ilegalidade fiscal à ilegalidade aduaneira, ao contrabando, ao saque, à luta armada contra os agentes do fisco depois contra os soldados, à revolta enfim, havia uma continuidade onde as fronteiras eram difíceis de marcar; ou ainda a vadiagem[...]” (Foucault, 1977, p. 77).

(27)

populares será a dos bens - transferência violenta das propriedades; que de outro a burguesia, então, se reservará à ilegalidade dos direitos: a possibilidade de desviar seus próprios regulamentos e suas próprias leis; de fazer funcionar todo um imenso setor da circulação econômica por um jogo que se desenrola nas margens da legislação – margens previstas por seus silêncios, ou liberadas por uma tolerância de fato. E essa grande redistribuição das ilegalidades se traduzirá até por uma especialização dos circuitos judiciários: para as ilegalidades de bens [...] os tribunais ordinários e os castigos; para as ilegalidades de direitos [...] jurisdições especiais com transações, acomodações, multas atenuadas, etc. [...] (Foucault, 1977, p. 80)

Assim, de acordo com Foucault (1977), a reforma penal busca o aperfeiçoamento das estratégias e técnicas de punição que se traduzirá na legislação criminal e penal, as quais tinham como objetivos: a racionalização e humanização das penas; a codificação clara dos delitos; a diminuição da arbitrariedade; o consenso e legalidade do poder de punir; e a alteração, controle e coerção das ilegalidades não mais toleradas. “Em resumo, constituir uma nova economia e uma nova tecnologia do poder de punir: tais são sem dúvida as razões de ser essenciais da reforma penal no século XVIII.” 42

Através de um pacto social, legitimam-se e instituem-se os princípios da reforma, onde o cidadão que romper com as leis da sociedade está contra essa sociedade, sendo passível de punição, desta feita, “o direito de punir deslocou-se da vingança do soberano à defesa da sociedade” 43.

Essa defesa caracteriza-se pelo direito e poder de punir e é pautada pelo exercício crescente de mensuração e ajustamento da pena, a qual deve ter a função de reparar à sociedade o prejuízo perpetrado, bem como a função exemplar de impedir, inibir e prevenir -sob as odes da humanização busca-se uma racionalidade técnica.

(28)

O dilema para os reformistas foi encontrar uma pena alternativa para o suplício, um castigo que não fosse arbitrário; que possibilitasse sua atenuação a partir dos efeitos positivos

que produzisse; que possibilitasse ao delinqüente associar a idéia de crime à pena, e a esta o reparo à sociedade. Assim, institui-se a prisão, abaixo da pena de morte, como possibilidade da mudança do comportamento e da alma.

[...] em menos de vinte anos, o princípio tão claramente formulado na Constituinte, de penas específicas, ajustadas, eficazes, que formassem, em cada caso, lição para todos, tornou-se a lei de detenção para qualquer infração [...] a diversidade, tão solenemente prometida, reduz-se finalmente a essa penalidade uniforme e melancólica [...] grande aparelho uniforme das prisões, rede de imensos edifícios se estenderá por toda França e Europa [...] teoria, característica do século XVI, de uma transformação pedagógica e espiritual dos indivíduos por um exercício contínuo, e as técnicas penitenciárias imaginadas na segunda metade do século XVIII. (Foucault. 1977, p. 104 e 108).

2.2 No Brasil

(29)

No período de 1512 a 1830, imperam no país as Ordenações de acordo com os preceitos legais e a administração da justiça da monarquia.

Aos contrários à ordem estabelecida destina-se arbitrariamente, a pena e a atrocidade do suplício, sendo a transição para a pena de prisão, a partir do século XIX, longa e similar às transformações ocorridas na Europa.

Em 1830 é sancionado o Código Criminal do Império do Brasil, o qual tinha como base o código francês de 1810 e o napolitano de 181944:

Fixava-se na nova lei um esboço de individualização da pena, previa-se a existência de atenuantes e agravantes, e estabelecia-se um julgamento especial para os menores de 14 anos. A pena de morte, a ser executada pela força, só foi aceita após acalorados debates entre liberais e conservadores no congresso e visava coibir a prática de crimes pelos escravos [...] Apesar de suas inegáveis qualidades [...] apresentava defeitos que eram comuns à época: não definira a culpa, aludindo apenas ao dolo, havia desigualdade no tratamento das pessoas, mormente os escravos. (Duarte, 2007, p.10).

Posteriormente, em 1890, é editado o Código Criminal da República, o qual sofre inúmeras críticas e alterações, e “apesar de ter sido mal sistematizado, dentre outros defeitos, o Código Criminal da República, constituiu um avanço na legislação penal da época, uma vez que, além de abolir a pena de morte, instalou o regime penitenciário de caráter correcional” 45. Em 1942, entra em vigor no país o Código Penal de 1940, referência vigente, o qual se caracteriza pela “conciliação entre os postulados das escolas clássica e positiva,

44 Duarte, Maércio Falcão. Evolução histórica do Direito Penal. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 34, ago. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=932>. Acesso em: 09 jun. 2007.

(30)

aproveitando o que de melhor havia nas legislações modernas de orientação liberal, em especial nos códigos italiano e suíço” 46.

Em 1984, através da Lei 7.209 de 11/07/1984, a Parte Geral do referido Código é alterada e instituída a Lei de Execução Penal, Lei nº. 7.210 de 11/07/1984, a qual será foco de nossa atenção em capítulo posterior.

A instituição do sistema penal no nosso país não difere e abarca os objetivos da reforma penal ocorrida na Europa, conforme destacado anteriormente.

Ao cárcere serão encaminhados os criminosos, doentes mentais, grupos de expressão contrária à ordem política estabelecida, os mendigos e os vagabundos. Imperativo destacar que, com a abolição dos escravos e o advento de imigrantes ao Brasil, uma população negra, oriunda de uma condição de escravidão e servidão, colocada à margem, será atenção de controle social.

A explanação social, política, econômica, cultural e histórica realizada até aqui, é uma tentativa de buscar compreender a punição como uma função social complexa, e ainda, entender a associação de uma das facetas dessa função a um contínuo e crescente processo de exclusão. Para essa reflexão buscaremos, no próximo tópico, conhecer o fenômeno da exclusão.

(31)

2.3 Exclusão

Segundo o dicionário da língua portuguesa, exclusão significa “eliminar; pôr fora; expulsar; retirar” 47, significados estes que identificam a realidade e a condição de setores da população no Brasil, que traduzem a extrema desigualdade social, econômica, política, de justiça, de direito e de poder.

Crítico do uso indiscriminado do conceito exclusão, Castel (1997), propõe sua substituição por uma noção mais apropriada para nomear e analisar “os riscos e as fraturas sociais atuais” 48 e, destaca o autor, o conceito de exclusão abarca um número imenso de situações diferentes, encobrindo a especificidade de cada uma, pois “falar em termos de exclusão é rotular com uma qualificação puramente negativa que designa a falta, sem dizer no que ela consiste nem de onde provém” 49.

O autor supracitado propõe a substituição do conceito exclusão por desafiliação “cuja trajetória é feita de uma série de rupturas em relação a estados de equilíbrio anteriores mais ou menos estáveis, ou instáveis” 50, o que nos possibilita compreender o fenômeno da exclusão como um processo que pressupõe a vulnerabilização, precarização e degradação das relações do sujeito e a sociedade, em decorrência do encadeamento e sobreposição de faltas em relação ao trabalho, à renda, à moradia, à educação, à saúde, à cultura, à política, ao poder, etc., sendo o ponto extremado deste processo, a exclusão, traduzida por meio do rompimento das relações do sujeito com todas as esferas da vida social.

Para o enfrentamento da questão, Castel (1997) propõe que devemos analisar as circunstâncias em que as ausências são construídas no processo de exclusão, precisamos

47 Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio Século XXI: O minidicionário da língua portuguesa. 4ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.

(32)

atentar e interrogar-nos sobre as dinâmicas globais, sobre os princípios e mecanismos da sociedade que são responsáveis pelos desequilíbrios desencadeadores dos processos que geram os estados de falta e ausência, pois as “políticas ditas de inserção” 51, destinadas ao enfrentamento da exclusão, atuam de forma pontual e reparativa nas situações em curso ou já degradadas52.

De acordo com Castel (1997), podemos identificar na nossa realidade social que, a atenção à exclusão se traduz em ações tradicionais de ajuda social à população alvo para o atendimento focado ao déficit específico, desconsiderando, o “perfil próprio desses novos públicos e sua diferença irredutível em relação àquela da clientela clássica da ação social” 53. Assim, não podemos tratar a questão como desqualificação da competência coletiva, pois, as populações “se tornaram inválidas pela conjuntura: é a transformação recente das regras do jogo social e econômico que as marginalizou. Não é o caso de tratá-las com uma intervenção especializada para reparar ou cuidar de uma incapacidade pessoal”.

A busca pela compreensão e intervenção do processo de exclusão deve eleger ações de prevenção, o que exige um tratamento econômico e político, pois sugere questionar a lógica econômica e social. No entanto, sabemos e indentificamos as ações e políticas voltadas ao efeito, políticas públicas essas que naturalizam o processo54.

Considerando a exclusão por padrão como característica da sociedade, Castel (1997) classifica a heterogeneidade de práticas de exclusão em três “subconjuntos” 55:

51 Ibid., p.24.

52 Exemplos de ações: Programa renda mínima e Programa frente de trabalho, encerrado em julho de 2007, pelo Governo do Estado de São Paulo.

53 Castel, 1997, p.28.

54 A análise não é uma crítica às políticas de inserção enquanto tais. “Estas apresentam o mérito de não se resignar ao abandono definitivo de novas populações colocadas pela crise em situação de inutilidade social”. (Castel, 1997, p. 24 e 25)

(33)

- O primeiro subgrupo denominado erradicação total e caracterizado pela supressão completa da comunidade: 1) sob a forma de expulsão, por exemplo, a expulsão dos judeus espanhóis (1592) e mouros espanhóis (1606) da Espanha; 2) sob a forma de pena de morte ou banimento de diferentes categorias (heréticos, criminosos, vagabundos e sediciosos); 3) sob a forma de genocídio.

- A segunda modalidade é a construção de espaços fechados e isolados da comunidade no seio mesmo da comunidade, como por exemplo, leprosários, guetos, prisões e manicômios;

- O terceiro subconjunto, a atribuição de um status especial (de caráter negativo) a certas categorias da população, que lhes permita coexistir na comunidade, mas com a privação da participação em certas atividades sociais e privação de certos direitos, como por exemplo, colonização, escravidão, apartheid, discriminação de gênero.

Castel (1997) assinala que, para além da diversidade de modalidades e níveis de radicalismo, a exclusão apresenta aspectos em comum.

Ela impõe uma condição específica que repousa sobre regras, mobiliza aparelhos especializados e se completa por meio de rituais [...] Assim, a exclusão não é nem arbitrária e nem acidental. Emana de uma ordem de razões proclamadas [...] a exclusão, no sentido próprio da palavra, é sempre o desfecho de procedimentos oficiais e representa um verdadeiro status. É uma forma de discriminação negativa que obedece a regras estritas de construção. (Castel, 1997, p. 38-40)

(34)

num tratamento explicitamente discriminatório dessas populações” 56, e que as “políticas ditas de inserção” podem corroborar e oficializar a exclusão.

A análise referente às práticas de exclusão, esboçada anteriormente em três subconjuntos, nos auxilia a entender e refletir sobre os riscos da transmutação das “políticas ditas de inserção” para discriminação oficial da exclusão, na atualidade, a saber:

1. A erradicação total, “parece impossível, exceto pela degradação absoluta da situação política e social. Porém, é difícil que uma sociedade que tenha guardado um mínimo de referências democráticas possa suprimir pura e simplesmente seus “inúteis ao mundo” ou seus indesejáveis, como era o caso em outros tempos” 57. 2. A segregação em espaços especiais, “parece muito menos improvável” 58, damos

como exemplo a segregação sócio-espacial caracterizando a constituição de guetos. A resposta ao déficit da moradia traduz-se na construção conjuntos habitacionais localizados em bairros periféricos, por vezes, denominados cidades dormitórios, em referência ao isolamento e distância do centro urbano. Outro exemplo próximo ao nosso estudo é a prisão;

3. Aexclusão por atribuição de um status especial a certas categorias da população é, sem dúvida, a ameaça principal na conjuntura atual. Relaciona-se à ambigüidade profunda das políticas de discriminação positiva. Podem-se assim chamar as tentativas de compensar as desvantagens sofridas por algumas categorias sociais em matéria de acesso ao trabalho, à moradia, à educação, à cultura, etc. [...] vê-se que a margem é estreita entre as medidas específicas que visam a ajudar públicos em dificuldade e sua instalação em sistemas de

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categorização que lhes atribuem um status de cidadão de segunda classe.” 59, que lhes permitam coexistir na comunidade, mas com a privação de certos direitos e a privação da participação em certas atividades sociais.

De acordo com as conclusões de Castel (1997), a atenção à exclusão deve: distinguir fatores, processos e fenômenos; cuidar para que as medidas de discriminação positiva, que são sem dúvida indispensáveis, não se degradem em status de exceção; e a atenção deve ser preventiva, esforçando-se para intervir nos fatores a saber: processos de produção e distribuição das riquezas sociais.

Em complemento à reflexão exposta até aqui, e com a finalidade de ampliarmos nosso conhecimento em relação ao tema exposto, trazemos as colaborações de Bader Sawaia (2001), a qual considera a ambigüidade “inerente” ao conceito exclusão e propõe que ao invés de “rechaçar” o conceito devemos “aprimorá-lo” explicitando suas ambigüidades, pois elas revelam a complexidade e contraditoriedade do processo de exclusão, principalmente a sua transmutação em inclusão social.

Sawaia (2001), propõe “abordar a exclusão social sob a perspectiva ético-psicossociólogica para analisá-la como processo complexo, que não é em si subjetivo nem objetivo, individual nem coletivo, racional nem emocional” 60, considerando a exclusão social como processo sócio-histórico.

Para subsidiar nossa compreensão quanto à concepção de exclusão social, nos baseamos na proposta da autora supracitada, a qual considera três dimensões para análise da exclusão:

(36)

1. a dimensão objetiva da desigualdade social; 2. a dimensão ética da injustiça social;

3. a dimensão subjetiva do sofrimento.

Sawaia (2001) destaca, ainda, a contrariedade do processo de exclusão e chama atenção para o entendimento do conceito de exclusão como um processo “dialético de exclusão/inclusão social” 61, sendo esses termos interligados e indissociáveis, que se constituem numa relação dinâmica e perversa, condição da ordem social desigual. A dinâmica entre as duas categorias, inclusão e exclusão, “demonstra a capacidade de uma sociedade existir como um sistema. Essa linha de raciocínio permite concluir, parafraseando Castel (1998), que a dialética exclusão/inclusão é a aporia fundamental sobre a qual nossa sociedade experimenta o enigma de sua coesão e tenta conjurar os riscos de sua fratura” 62.

Nesta concepção Sawaia (2001) propõe ampliar a análise do processo de exclusão, ora entendido como a “dialética exclusão/inclusão”, para além da dimensão objetiva, econômica e social; introduz a ética da injustiça social e a subjetividade na análise sociológica da desigualdade. “Dessa forma, exclusão passa a ser entendida como descompromisso político com o sofrimento do outro” 63.

Na análise psicológica, Sawaia (2001) apresenta o sofrimento ético-político como categoria de análise da dialética exclusão/inclusão, e na mesma obra64 organizada pela autora supracitada, Jodelet (2001) apresenta os processos psicossociais da exclusão, destacando

61 Sawaia, 2001, p.8 62 Ibid., 2001. p.108 63Ibid., 2001, p.8

(37)

preconceitos e estereótipos65 e Guareschi (2001) apresenta os pressupostos psicossociais da exclusão: a competitividade e a culpabilização66.

Conceito polissêmico e multidimensional, a exclusão nos possibilita uma amplitude de interessantes e importantes análises, mas visto o tempo e o objetivo dado a este trabalho – conhecer a prática do psicólogo no sistema prisional paulista, buscamos entender e refletir sobre o fenômeno e o processo dialético de exclusão/inclusão social, sua estreita relação com a condição de segregação social da pessoa presa e o objetivo oficial da pena de privação de liberdade: efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado67.

65 Ibid., p. 53. 66 Ibid., p. 141.

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3. CRIMINOLOGIA

Considerando 1) as atribuições do psicólogo segundo a legislação nacional68, conforme apresentado no capítulo anterior; 2) o artigo 8º da Lei de Execução Penal, o qual aponta que o condenado no cumprimento de pena privativa de liberdade, em regime fechado, será submetido a exame criminológico para a obtenção dos elementos necessários a uma adequada classificação com vistas à individualização da execução da pena69; 3) o objeto de estudo deste trabalho dando a conhecer a prática do psicólogo no sistema prisional paulista; buscamos neste capítulo o diálogo com a Criminologia, por identificarmos ser a área de conhecimento que pode auxiliar-nos a ampliar a reflexão e compreensão sobre o fenômeno da criminalidade, posto que, a Criminologia é a ciência que se propõe a investigar e conhecer sobre o crime, a pessoa autora do crime, a vítima e o controle social do crime.

3.1 Do conceito

Para falarmos sobre a Criminologia nos apoiaremos na obra de Sérgio Salomão Shecaira (2004), de título homônimo ao da área de conhecimento em questão, Criminologia, onde o autor destaca a relação dessa ciência com o direito penal e a política criminal. O autor em questão pondera e apresenta as distinções e interdependências recíprocas entre as citadas

68 Brasil. Lei de Execução Penal. Lei nº. 7.210, de 11 de julho de 1984. Artigos 5º ao 9º.

(39)

áreas, bem como, as escolas sociológicas da criminalidade que influenciaram a legislação penal70 e, mais recentemente, as políticas de prevenção criminal.

O nascimento da criminologia tem seu marco histórico no século XVIII, quando da evolução histórica do direito penal e de sua transição do período da vingança (privada, divina e pública) para o período humanitário71, sendo Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, por meio de sua obra “Dos delitos e das penas” (1764), considerado o primeiro pensador da chamada criminologia.72

Em busca do entendimento sobre o crime e o criminoso diferentes pensadores se

inspiraram nas diversas áreas da ciência e verdades da época, no decorrer dos séculos XVIII ao XX73, destacando-se “duas correntes do pensamento filosófico-jurídico em matéria penal e em criminologia: a escola clássica e a positivista” 74. A escola clássica busca compreender o fenômeno da criminalidade privilegiando como objeto de atenção o crime. A escola positivista elege como objeto de atenção o criminoso, considerando o delito como um fenômeno determinado biológica e socialmente.

Shecaira (2004) propõe conhecer as teorias criminológicas a partir da perspectiva macrocriminológica, considerando e valorizando o imbricamento das diferentes perspectivas existentes nas ciências humanas, e considera:

[...] examinar as diferentes visões justificadoras do delito, explicativas ou críticas, não tendo por escopo examinar a interação entre indivíduos e pequenos grupos, mas sim fazer uma abordagem da sociedade como um todo, do seu complexo sistema de funcionamento, de seus

70Destacamos a importância dessas influências, (in)diretamente, na atribuição do psicólogo no sistema prisional, conforme legislação nacional, Lei de Execução Penal, nº. 7210/84, objeto de estudo e atenção deste trabalho no capítulo 5, item 5.2, Caracterização das atribuições do psicólogo do sistema prisional segundo a legislação nacional vigente.

71 Duarte, Maércio Falcão. Evolução histórica do Direito Penal. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 34, ago. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=932>. Acesso em: 09 jun. 2007.

72 Shecaira, 2004, p. 75.

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conflitos e crises, de modo a obter, mediante o estudo do fenômeno delituoso, as diferentes respostas explicativas da criminalidade [...] (Shecaira, 2004, p. 133)

O autor supracitado destaca duas visões principais da macrossociologia que influenciaram o pensamento criminológico, sendo agrupadas e denominadas em:

1. teorias do consenso, dentro das quais o autor apresenta a escola de Chicago; a teoria da associação diferencial; a teoria da anomia; e a teoria da subcultura delinqüente;

2. teorias do conflito, dentro das quais o autor destaca a teoria do labelling approach

(interacionista ou da rotulação social) e a teoria crítica.

As teorias do consenso, apresentam a concepção funcionalista de sociedade, sendo a sociedade uma estrutura de funcionamento integrada e harmônica, pois “a finalidade da sociedade é atingida quando há um perfeito funcionamento das suas instituições de forma que os indivíduos compartilham os objetivos comuns a todos os cidadãos, aceitando as regras vigentes e compartilhando as regras sociais dominantes” 75.

As teorias do conflito partem de uma concepção conflitiva da realidade, pois “a coesão e a ordem na sociedade são fundadas na força e na coerção, na dominação por alguns e sujeição de outros; ignora-se a existência de acordos em torno de valores de que depende o próprio estabelecimento da força.” 76.

(41)

Considerando diferentes perspectivas e abordagens teórico-metodológicas para compreensão e explicação da natureza e da realidade social77, e especificamente a compreensão e explicação do fenômeno da criminalidade a partir de dada concepção, elegemos explorar o tema proposto sob a perspectiva da teoria crítica. Porém, antes definiremos, Criminologia e respectivo objeto de estudo, base essencial para adentrarmos na teoria crítica da análise criminológica.

Shecaira (2004) aponta os dados necessários para a conceituação da Criminologia realizando a comparação dessa ciência com o direito penal e a política criminal78. Apresenta a criminologia a “partir do pensamento crítico da realidade fenomênica” 79, área integrante das ciências humanas, sendo seu “método empírico de análise a observação da realidade” 80, ciência dada a conhecer e explicar a realidade, compreender o problema criminal e transformá-lo.

Assim o autor em questão define Criminologia como:

Estabelecidos os conceitos que constituem a base do pensamento criminológico, trata-se agora de definir criminologia. Seguindo o pensamento de Antonio García-Pablos de Molina, é a criminologia “uma ciência empírica e interdisciplinar, que se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle social do comportamento delitivo, e que trata de subministrar uma informação válida, contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime – contemplando este como problema individual e como problema social –, assim como sobre os programas de prevenção eficaz do mesmo e técnicas de intervenção positiva

77 Cf. Burrel, G. and Morgan, G. Sociological Paradigms and Organizational Analysis. London: Heinemann, 1979.

78 Cf. Shecaira, Sérgio Salomão. Criminologia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 36-42. 79 Shecaira, 2004, p. 37-38.

(42)

no homem delinqüente”. 81 Outras não são as principais definições, mais ou menos na mesma linha que exposta acima82. (Shecaira, 2004, p. 40)

3.2 Do objeto e respectivos conceitos

Conforme a definição de Criminologia anteriormente apresentada consideramos o objeto desta ciência: o “crime, a pessoa do infrator, a vítima e o controle social do comportamento delitivo” e para acompanharmos os termos designados por Shecaira (2004), autor de nossa referência, consideraremos objeto desta ciência: o delito, o criminoso, a vítima e o controle social do delito.

3.2.1 Do delito

Considerando a visão do direito penal sobre o delito, Shecaira (2004) apresenta que para “o direito penal o crime é a ação típica, ilícita e culpável [...] uma visão centrada no comportamento do indivíduo.” 83, prescindindo dessa visão, o autor apresenta a visão ampla da criminologia, considerando o delito “como um fenômeno comunitário e como um problema social” 84.

Shecaira (2004) acrescenta a reflexão quanto à criminalização de determinada conduta em determinado contexto histórico e pressupõe quatro elementos constitutivos do conceito criminológico do delito85, a saber:

81 Morillas Cueva, LORENZO. Metodologia y ciência penal.Granada: Universidade de Granada, l990, p. 316 apud Shecaira, 2004, p. 40.

82 Cf. Shecaira, 2004, p.40. 83 Shecaira, 2004, p.43. 84 Ibid., p. 43.

(43)

1. a incidência massiva na população; 2. a incidência aflitiva do fato praticado;

3. a persistência espaço-temporal do fato que se quer imputar de delituoso;

4. o inequívoco consenso a respeito de sua etiologia e de quais técnicas de intervenção seriam mais eficazes para o seu combate;

3.2.2 Do criminoso

Para a apresentação do conceito - criminoso, Shecaira (2004) passeia pela construção histórica e teórica do referido conceito, e suas diversas concepções, desde a visão clássica, que considera o criminoso um pecador; à visão positivista, considerando o determinismo biológico e social; à visão correcionalista, considerando o criminoso um ser inferior e incapaz devendo, portanto, ser tutelado pelo Estado; à visão marxista, destacando o determinismo social e econômico; para chegar à sua definição:

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Tabela 2 - População Prisional no Brasil Ano       População Prisional
Tabela 4 - População Prisional do Estado de São Paulo Ano  População Prisional  Entrada 164 Saída 165
Tabela 5 - População Prisional do Estado de São Paulo  -Tipo de Regime - Gênero
Tabela 9 - Estabelecimentos Prisionais e Estruturas de Composição da Equipe  Técnica Penitenciária Centro de  Progressão  Penitenciária Centro de Detenção Provisória Hospitais de Custódia e Tratamento  Psiquiátrico  Centro de  Ressocialização Comissão  Téc
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Referências

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