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A argumentação em matemática : investigando o trabalho de duas professoras em contexto de colaboração

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FACULDADE DE CIÊNCIAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO

A argumentação em Matemática

Investigando o trabalho de duas professoras

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FACULDADE DE CIÊNCIAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO

A argumentação em Matemática

Investigando o trabalho de duas professoras

em contexto de colaboração

Dissertação apresentada na Universidade de Lisboa

para obtenção do grau de Doutor em Educação

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Resumo

A argumentação em Matemática: Investigando o trabalho de duas professoras em contexto de colaboração

Este estudo é uma investigação com o professor sobre o seu trabalho. Tem dois objectivos: (1) descrever e analisar o trabalho de duas professoras orientado para o envolvimento dos seus alunos em actividades de argumentação matemática; (2) compreender potencialidades e problemas emergentes do desenvolvimento de um projecto de investigação colaborativa centrado na reflexão sobre as práticas destas professoras. Ao primeiro objectivo associam-se questões que visam dar a conhecer desafios com que as professoras se confrontaram ao prepararem o ensino e ao criarem nas suas aulas contextos facilitadores da emergência e desenvolvimento de argumentação matemática. Do segundo objectivo decorreram questões focadas em aspectos considerados relevantes ou problemáticos no desenvolvimento do projecto e naquilo que o facilitou ou constrangeu.

A problemática da argumentação na aula de Matemática é analisada no enquadramento teórico do presente estudo a partir de contributos da área da filosofia e da educação matemática. É também abordado o tema da colaboração, discutindo-se significados atribuídos a este conceito e analisando-se possíveis modos de desenvolver uma investigação colaborativa.

Em termos metodológicos o estudo insere-se no paradigma interpretativo colaborativo que aceita a existência de diversas formas legítimas de conhecer o mundo. Este paradigma enquadra diferentes modalidades de investigação que assentam no pressuposto de que a partilha deste conhecimento num grupo regulado por normas de comunicação autêntica, contribui para entender mais profundamente este mundo. Visando aprofundar a compreensão sobre a argumentação na aula de Matemática, constituiu-se um grupo designado por grupo de pesquisa, cuja actividade contemplou várias fases entrelaçadas de acção e reflexão que se informaram mutuamente.

O estudo ilustra que a exploração, pelos alunos, de tarefas abertas é favorável à argumentação matemática. No entanto, os episódios de argumentação geram-se no interior das interacções da aula quando no decurso da acção o professor consegue encontrar formas de facilitar a sua emergência. Um bom conhecimento do currículo e de conexões entre os temas matemáticos nele incluídos, um investimento na promoção de interacções entre alunos e em actividades de formulação de conjecturas, sua avaliação e prova, uma cuidadosa selecção de tarefas e uma preparação cuidada e meticulosa das aulas podem dotar o professor de recursos que, em situação, lhe permitem improvisar o melhor modo de agir para favorecer e apoiar a argumentação.

Actividades propícias ao envolvimento dos alunos em argumentação matemática parecem ser a negociação dos significados de conjectura, contra-exemplo e prova; a valorização da actividade de formulação de conjecturas; a partilha, na turma, de conjecturas formuladas durante fases de trabalho em pares/grupos; a análise colectiva de enunciados de conjecturas tendo por suporte um registo escrito observável pela turma; e a avaliação colectiva da plausibilidade de conjecturas. Além disso, a compreensão do valor e necessidade da prova e a aprendizagem da produção de provas, parecem ser facilitadas pelo enquadramento da prova em actividades de argumentação desencadeadas pela exploração de tarefas abertas que apelam à formulação de conjecturas. Parece ser igualmente importante envolver frequente e sistematicamente os alunos em experiências de prova; destacar, persistentemente, que uma conjectura não provada tem um carácter provisório; acompanhar a apresentação de ideias matemáticas que podem ser provadas mas que não o são, por uma explicação que permita salientar que a prova não foi feita e porque não o foi; aproveitar as situações que surgem no decurso das interacções da aula para salientar as limitações do raciocínio indutivo; e pôr a ênfase no valor da prova enquanto meio de iluminar o porquê da

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Um contexto que se destaca como favorável à argumentação matemática é a exploração de situações de desacordo tendo em vista a obtenção de consensos matematicamente fundamentados pela turma. Estas situações podem ser desencadeadas pela exploração de tarefas que permitam fazer surgir vários processos de resolução e que suscitem a reflexão. A legitimação da possibilidade dos alunos exprimirem pontos de vista diferentes, tornar visíveis posições em confronto e instituir estas posições como objecto de reflexão individual e colectiva, são aspectos que facilitam a emergência e resolução de desacordos. Paralelamente, o estudo evidencia que a exploração de situações de divergência de ideias envolve riscos e que precavê-los passa por dar atenção a aspectos do domínio cognitivo e afectivo.

Um outro aspecto que se destaca como particularmente relevante para a argumentação matemática é a negociação de normas sociais e normas sociomatemáticas que colocam a ênfase na expressão audível, na escuta atenta, na partilha de ideias, na manifestação pública de desacordos e na explicação e justificação de contribuições. Atributos do processo de negociação cuja conjunção parece ser significativa para ajudar os alunos a apropriarem-se destas normas, são a importância da

sistematicidade e persistência; a pertinência de uma negociação contextualizada; e a essencialidade da coerência. No seu conjunto, estes atributos remetem para a necessidade de no

processo de negociação existir uma forte e sistemática consistência entre o que explicitamente se diz e as mensagens que implicitamente se veiculam através do modo como se age.

O envolvimento dos alunos em actividades de argumentação matemática parece ser, além disso, facilitado pela articulação frequente entre o trabalho de pares/grupos e o trabalho colectivo. Também a existência de suspensões temporárias de curta duração durante uma discussão colectiva, destinadas a proporcionar aos alunos oportunidades de reflexão sobre ideias enunciadas, parece favorecer a argumentação. Um dos aspectos fundamentais para não se desperdiçarem oportunidades de argumentação é existir uma demarcação clara e bem vincada entre as fases destinadas a trabalho de pares/grupos e as fases de trabalho com a turma. A orquestração de discussões colectivas revelou-se uma tarefa extremamente complexa e exigente, mas fortemente favorável à argumentação matemática. Repetir, reformular ou relatar as contribuições dos alunos, são estratégias discursivas que foram úteis às professoras para lidar com esta complexidade. Paralelamente, a prática de orquestrar discussões colectivas e a reflexão sobre o trabalho realizado contribui para o esbatimento das dificuldades.

A análise dos desafios com que as professoras lidaram permite evidenciar a existência de seis espaços-problema que se interrelacionam: (1) ensinar o valor das conjecturas e provas em Matemática e promover e sustentar a produção de provas; (2) compreender as ideias apresentadas, instituí-las como recursos de apoio ao ensino e lidar com sentimentos que originam; (3) descentrar o discurso de si, transformar a aula numa comunidade que cuida e combater a irresponsabilidade matemática dos alunos; (4) apoiar a actividade dos alunos e favorecer a sua autonomia; (5) harmonizar e equilibrar diferentes vozes na orquestração de discussões; e (6) articular propósitos e agendas pessoais com vontades dos alunos.

Quanto ao segundo objectivo do estudo, a investigação desenvolvida permite evidenciar que um trabalho em colaboração cuja equipa inclui pessoas com formações, experiências, perspectivas e contextos de trabalho diversificados e em que a reflexão sobre a prática do professor tem um lugar privilegiado, parece ser um contexto significativamente propício ao desenvolvimento do professor. Factores que favoreceram a colaboração foram a organização do trabalho, uma clara definição de papéis e responsabilidades, a possibilidade de dialogar autenticamente, a existência de uma negociação transparente, continuada e igualitária, a existência de um período de conhecimento recíproco entre todos os elementos do grupo de pesquisa prévio à observação de aulas das professoras e o tempo longo de duração do projecto.

Palavras-chave: Argumentação em Matemática; professor; ensino da Matemática;

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Abstract

Argumentation in Mathematics: Investigating the work of two teachers in a collaborative context

This study is an investigation with a teacher about his/her work, directed by two goals: (1) to describe and analyze the work of two teachers who wish to involve their students in mathematical argumentation activities; and (2) to examine the potentialities and problems arising from a collaborative research project which focuses on reflection about these teachers’ practices. In the first objective, I intend to reveal the challenges faced by the teachers when planning and creating a classroom environment which facilitates the fostering and development of mathematical argumentation. The second objective deals with questions regarding aspects the teachers consider to be relevant or problematic in the development of the research project and making it easier or harder.

The review of the literature addresses mathematical argumentation in the classroom through contributions from the fields of philosophy and mathematics education. It also includes a discussion about the meaning of collaboration and the analyses of different ways to develop a collaborative research project.

Methodologically, this study is framed on the interpretative-collaborative paradigm, which assumes the existence of several legitimate forms of knowing the world. This paradigm embraces several styles of investigation that build on the assumption that the sharing of this knowledge by a group where communication is ruled by authenticity, contributes to the vaster, deeper understanding of this world. In order to understand mathematical argumentation better in the classroom, a group designated by inquiry group, has been formed. Its work involves several intertwined phases of action and reflection.

This study shows that the students’ exploration of open tasks favours mathematical argumentation. However, the episodes of argumentation developed within classroom interactions when the teacher found ways to facilitate their emergence. Sound knowledge of the curriculum and of the connections between its mathematical subjects; an investment in the promotion of student interaction and in activities concerning the formulation, evaluation and proof of conjectures; a careful selecting of tasks; and a careful, meticulous preparation of classes, can provide the teacher with resources which allow him/her to find the best way to favour and support argumentation.

Favourable activities for involving students in mathematical argumentation appear to be: the negotiation of the meanings of conjecture, counter-example and proof; valuing the activity of conjecture formulation; the class-sharing conjectures formulated during phases of pair/group work; the collective analysis of conjectural statement, based on a written text visually available to the class; and the collective evaluation of the plausibility of conjectures. Furthermore, understanding the value and the need for proof and learning about the production of proofs seem to be facilitated by argumentative activities triggered by the exploration of open tasks that call for conjecture formulation. Additionally, math argumentation is enhanced by: involving students frequently and systematically in proof experiments; persistently clarifying that a non-proved conjecture has a temporary character; accompanying the presentation of mathematical ideas that can be proved but are not, by an explanation that stresses that proof was not shown and why it was not shown; seizing the situations that arise during class interactions to highlight the limitations of inductive reasoning; and stressing the value of proof as a means of explaining why a conjecture is, or is not, a valid statement.

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view, highlighting positions in a confrontation, and establishing these positions as an object of individual and collective reflection are aspects that facilitate the emergence of disagreements and of discussions focused on how to overcome the divergence using mathematical reasoning. At the same time, the study shows that these discussions carry risks and that preventing them implies paying attention to cognitive and affective aspects.

Another aspect that stands out as particularly relevant for the emergence and development of mathematical argumentation is the negotiation with students of social norms and

sociomathematical norms that emphasize explaining and justifying, respecting the ideas of others,

expressing positions audibly, listening carefully, sharing ideas, and articulating divergent viewpoints when they exist. The attributes of the negotiation process which appear to help students assimilate these norms significantly are: the importance of being systematic and persistent; the

pertinence of a contextualised negotiation; and the essentiality of coherence. Together these

attributes imply the need for the existence of a strong, systematic consistency between what is explicitly said and the messages that are implicitly conveyed through one’s behaviour in the negotiation process.

Involving students in mathematical argumentation activities seems to be facilitated by the frequent articulation between pair/group work and collective work. During class-wide discussions, argumentation also appears to be favoured by the presence of temporary suspensions, aimed at providing the students with opportunities to reflect upon stated ideas. One of the aspects that may be essential to not waste argumentation opportunities is a clear, well-marked boundary between phases devoted to pair/group work and phases of whole-class work.

The orchestration of collective discussions ended up being an extremely complex, demanding task, but highly favourable for mathematical argumentation. The teachers found the discursive strategies of repeating, reformulating or reporting students’ contributions useful for dealing with this complexity. At the same time, the practice of orchestrating collective discussions and the reflection about this practice contributed to the lessening of existing difficulties.

Analyses of the challenges with which the two teachers dealt, reveals the existence of six problem-spaces that are intertwined: (1) teaching the value of conjectures and proofs in mathematics and promoting and sustaining the proofing process; (2) understanding and using student ideas as resources for teaching and dealing with personal feelings; (3) sharing with students the control of classroom mathematical discourse, transforming the class into a caring community and combating students’ mathematical irresponsibility; (4) supporting students’ activities and favouring their autonomy; (5) harmonising and balancing different voices within collective discussions; and (6) coordinating personal aims and agendas with the students’ desires.

As for the second objective of the study, the investigation shows that collaborative work by a team that includes people with different competencies, experiences, perspectives, and working contexts, and where reflection upon teacher practice has a privileged place, seems to be a relevant context for teacher development. Aspects favouring collaboration within the collaborative research project were the organisation of work, a clear definition of roles and responsibilities, the possibility of authentic dialogue, the presence of equal and continuous negotiation, the existence of a period of reciprocal acquaintance prior to the teachers’ classroom observation, and the long-lasting duration of the project.

Keywords: Argumentation in Mathematics; the teacher; Mathematics teaching;

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Agradecimentos

À Anita e Rebeca, as professoras que tive o privilégio de conhecer e com quem trabalhei, por me abrirem as portas das suas aulas, das suas casas e das suas vidas, pela disponibilidade constante mesmo quando o trabalho foi muito, pela boa disposição e empenhamento permanentes em cada encontro e pela relação de amizade que fomos construindo.

Ao Professor Doutor João Pedro da Ponte, meu orientador, pela confiança que sempre senti depositar em mim, por me incentivar a enveredar pelos caminhos da colaboração, pelo cuidado de me dar a conhecer bibliografia relevante para o meu trabalho, pelas suas pertinentes críticas e sugestões e pelo apoio e palavras amigas que chegaram nos momentos certos.

À Escola Superior de Educação de Setúbal, que me proporcionou condições favoráveis ao desenvolvimento da investigação.

Aos meus colegas do grupo Didáctica e Formação (DIF), pelas possibilidades de aprendizagem que me proporcionam e pelo prazer de estar.

Às minhas colegas e amigas do Departamento de Matemática da ESE de Setúbal, por todo o apoio e pela generosidade de assumirem trabalho que era meu; em especial à Fátima também pela disponibilidade e cuidado na revisão de parte do texto e à Joana pelas mesmas razões e ainda pelas boas conversas quando as dúvidas “bateram à porta”.

Ao Luís, por me ter facilitado enormemente a impressão deste trabalho.

Ao Mário, pela imensa disponibilidade com que me apoiou na edição final deste trabalho, pela paciência para esperar e pelas horas que “roubou” ao seu sono para me dar.

À Leonor, pela proveitosa conversa quando me preparava para iniciar o trabalho de campo e por me ter feito sorrir em alturas problemáticas através da magia da infância.

À Raquel que, apesar da distância, sempre me fez sentir a sua presença e solidariedade. À Paula, porque lá muito, muito longe descobriu os artigos que eu quis ler, pela disponibilidade permanente e abrangente e pelo apoio cognitivo e afectivo, inesquecível e imprescindível, nos tempos conturbados do final da escrita deste trabalho.

À Fátima e à Paula, pela ajuda inestimável, pela partilha, cumplicidade, palavras de encorajamento, gestos solidários e comentários valiosos a versões preliminares de vários capítulos deste trabalho.

À Mena e ao Carlos, pela amizade e carinho sempre presentes e também pelo refúgio ao pé do mar de portas sempre abertas.

Aos meus pais e à Bela, minha irmã, que sempre acreditaram em mim.

Ao Zé, meu companheiro de vida, pela permanente ajuda em tudo aquilo que precisei e pela paciência para me escutar nos momentos difíceis desta aventura sem nunca duvidar de que seria capaz de a levar a bom porto.

Ao João, meu filho e a quem dedico este trabalho, com quem muito aprendi a argumentar, compreendendo, através das experiências únicas que vivi, que a lógica e a intuição, o sentir e o

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ÍNDICE

Capítulo I - Introdução ...1

A importância de ensinar a argumentar em Matemática...3

Um projecto de colaboração centrado na argumentação matemática: Uma opção metodológica ...11

Objectivos e organização do estudo ... 17

Capítulo II - A argumentação na aula de Matemática ...21

À volta dos significados de argumentação e de argumentação em Matemática ...23

Origem da teoria da argumentação ...24

Racionalidade, adesão e justificação: O contributo de Perelman ...27

Argumentação versus demonstração...32

A noção de auditório...38

Tipos de argumentos ...42

Selecção e organização dos argumentos ...50

Pensando a argumentação em Matemática com o contributo de Perelman ... 54

Percursos argumentativos e pluralidade de campos de argumentação: O contributo de Toulmin ... 60

Campos de argumentação ...62

Argumentos analíticos e argumentos substanciais... 67

Modelo de análise da microestrutura de um argumento ...69

Pensando a argumentação em Matemática com o contributo de Toulmin... 75

Ensinar Matemática, construindo uma cultura de argumentação...87

Ensinar: Um trabalho complexo e multifacetado...87

Construindo uma cultura de argumentação: Constituir e manter uma comunidade de discurso matemático ...95

O discurso na aula de Matemática ...97

Normas de acção e interacção...101

Redizer: Modo possível de trabalhar com as ideias dos alunos...105

Orquestrar discussões colectivas: Análise de um exemplo...107

Complexidades de ensinar a argumentar em Matemática...115

Ensinar a discordar: Comunidade que cuida e polidez matemática...115

Que fazer com as contribuições dos alunos? ...118

Gerir a tensão entre apoiar o processo de discurso matemático e o conteúdo matemático do discurso...120

Riscos de lidar diferenciadamente com as contribuições dos alunos ... 122

A importância de um conhecimento amplo e evolutivo dos alunos ...122

Incerteza e emoções originadas pelas contribuições dos alunos...123

Capítulo III - Colaboração e investigação colaborativa: Perspectivas e desenvolvimento ...129

(12)

Relação de colaboração ...145

O truísmo da confiança ...149

A importância da conversação ...149

Envolvimento negociado...152

Desenvolvimento de investigações colaborativas ...154

Questões epistemológicas ...155

Grupos de pesquisa cooperativa: Possível ponto de partida ...163

Um modelo de investigação colaborativa que privilegia a reflexão ...166

Complexidades da colaboração ...171

Uma rede complexa de dilemas interligados: Análise de um caso ...171

Investigação colaborativa: Percurso incerto...175

Objectivos comuns: Chave para a colaboração? ...176

Benefícios e custos desiguais ...179

Diferentes relações com o conhecimento...182

O papel do investigador ...183

Temporalidade e colaboração ...185

Confiança: Pouca compreensão sobre o seu significado...186

A questão da escrita ...187

Capítulo IV - Metodologia ...193

Uma investigação interpretativa...194

Uma abordagem colaborativa...198

Perspectiva geral ...199

Um projecto de investigação colaborativa ...201

A modalidade estudo de caso...205

Procedimentos metodológicos...207

Em demanda do grupo de pesquisa: Os primeiros passos...207

Recolha, organização e análise de informação: Perspectiva geral ...210

Recolha documental ...225

Aulas ...226

Sessões de trabalho ...232

Entrevistas ...235

Análise de dados: Aspectos particulares ...241

Capítulo V - Projecto de investigação colaborativa: Concepção e desenvolvimento ...253

Fundação do grupo de pesquisa colaborativa...254

Esboçando, negociando e renegociando o plano de trabalho...256

A primeira fase do projecto...256

A segunda fase do projecto ...262

Desenvolvimento do projecto...268

(13)

Delineando e concretizando o trabalho ...274

Análise e discussão de documentos de natureza diversa ...274

Diálogos de sala de aula... 274

Documentos de carácter teórico ou teórico/prático ...278

Narrativas de episódios de argumentação matemática ...289

Preparação de aulas...295

Troca de ideias sobre aulas a leccionar...296

À procura de tarefas...298

Observação e reflexão sobre aulas ...308

Divulgação do trabalho: Preparação e concretização ...321

A relação de colaboração ...328

Construindo a relação de colaboração...328

Inquietações vividas ...340 Capítulo VI - Rebeca ...359 Traços de um retrato...360 A pessoa, a professora...360 Contextos de trabalho...365 A escola de Rebeca ...365 A turma do projecto ...366

A propósito da tarefa Números em círculos ...370

Panorama geral sobre a aula...371

Promovendo a formulação e avaliação de conjecturas ...374

Acompanhando, nos grupos, a formulação de conjecturas...374

Lidando, na turma, com a apresentação das conjecturas ...379

Problemas experienciados...384

Tive dúvidas se havia de mandá-las logo demonstrar para os positivos ...384

Não tinha pensado que eles iam ordenar os números por ordem decrescente...386

Não percebi e conduzi para outro lado ...388

Lidando com o ensino do discurso de prova...390

Conduzindo e acompanhando os grupos em direcção à prova ...390

Gerindo a apresentação da prova algébrica de uma conjectura ...394

Problemas experienciados...397

Não há uma interpretação matemática das letras...397

Convencê-lo que quando utilizou o x não tinha imposto nenhuma restrição não foi fácil ...398

Queria que eles provassem e eles não estavam a perceber a necessidade... ...399

Lidando com a emergência e resolução de desacordos...401

Emergência do desacordo ...401

Processo de resolução do desacordo ...404

(14)

Ensinando para e através da constituição e desenvolvimento de uma comunidade

de discurso matemático ...409

Procurando constituir uma comunidade de discurso matemático...410

Problemas experienciados...413

Aqui podem surgir mais situações de que não estamos à espera...413

Mas podia pô-los, de algum modo, a confrontarem-se mais uns com os outros... ...414

Quanto menos dirigirmos, mais tempo perdemos; quanto mais dirigirmos, mais tempo poupamos... ...415

A propósito da tarefa À procura de dízimas finitas...417

Panorama geral sobre as aulas...417

Aula de 17/10/02...418

Aula de 21/10/02...419

Aula de 24/10/02...420

Promovendo a formulação e avaliação de conjecturas ...423

Acompanhando, nos grupos, a formulação de conjecturas...423

Lidando com a apresentação, formulação e avaliação de conjecturas...428

Gerindo a partilha e avaliação de conjecturas formuladas pelos alunos...429

Apoiando a construção do enunciado de uma conjectura...444

Problemas experienciados...451

Uma dificuldade foi eles não terem dado importância às conjecturas que refutaram... ..451

Eu não estava a perceber mesmo o raciocínio delas ...456

Temos que estar sempre atentas à organização dos exemplos e, às tantas, não estamos...457

Lidando com o ensino do discurso de prova ...459

Desafiando os grupos a produzir a prova de uma conjectura “não contrariada” ...459

Gerindo a produção da prova de uma conjectura não “contrariada” ...464

Observando exemplos indo para além deles...464

Trabalhando com o caso geral, visitando um exemplo...470

Problemas experienciados...485

Deveria ter ficado claro que se ia provar nos dois sentidos...485

A sugestão que dei para a prova foi ao contrário...486

Um problema foi não estar claro que p/10k representa, de uma maneira geral, todas as dízimas finitas ...488

Queríamos provar a conjectura para o 1 sobre e depois estávamos com fracções do tipo y sobre ...489

No caso 1/2nx5p tinha pensado que talvez nem fosse para as letras e a ir, iria sempre separar os casos em que n>p e p>n...493

Lidando com a emergência e resolução de desacordos...496

Desacordos emergentes e sua caracterização...496

Processos de resolução de desacordos ...499

Vamos lá ver se eu percebo bem o que está aqui...499

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Problemas experienciados...516

Se tivesse perguntado porquê podia ter aproveitado para depois mostrar os limites do raciocínio indutivo ...516

O mal não é não perceber. É não termos consciência no momento que podemos não estar a compreender ...518

Ensinando para e através da constituição e desenvolvimento de uma comunidade de discurso matemático ...522

Constituindo e mantendo uma comunidade de discurso matemático ... 522

O modo de estar e participar dos alunos no discurso...523

O modo de estar e aspectos do trabalho da professora ...525

Problemas experienciados...539

A gente vai no andamento, não é? E depois avançamos... ...539

Ela às vezes estava a tentar explicar as coisas e eu ia logo toda lançada ...540

Temos que aprender a ter consciência quando é que podemos sair do guião e quando não podemos...541

Outra dificuldade que eu sinto muito é o parar porque temos que ir discutir...544

Outra dificuldade é não validar as respostas... 546

Conseguirmos que todos os outros façam parte daquelas duas conversas paralelas, é uma das dificuldades que eu senti...548

O que é que nós fazemos quando há aqueles alunos que estão muito mais à frente que os outros? ...552

Capítulo VII - Anita ...561

Traços de um retrato...562

A pessoa, a professora...562

Contextos de trabalho...569

A escola de Anita ...569

A turma do projecto ...571

A propósito da tarefa Máximo divisor comum e mínimo múltiplo comum: Que relações? ...575

Panorama geral sobre a aula...577

Promovendo a formulação e avaliação de conjecturas ...579

Apoiando a construção do enunciado da conjectura...579

Criando uma situação para destacar o carácter provisório das conjecturas ...582

Problemas experienciados...591

E depois os alunos começam a avançar com conjecturas! E eu não queria dizer nada, nem queria que fossem lá... ...591

E no meio daquilo tudo, mesmo já depois dos contra-exemplos e tudo...595

Lidando com o ensino do discurso de prova...600

Desafiando os alunos a justificarem a conjectura ... 600

Produzindo, com a turma, a justificação da conjectura ...606

(16)

Por um lado eu digo que os exemplos não provam e, por outro, vou recorrer a um

exemplo...612

É caso para dizer que o professor tinha mais expectativas... ...614

Lidando com a emergência e resolução de desacordos...616

Ensinando para e através da constituição e desenvolvimento de uma comunidade de discurso matemático ...618

Procurando constituir uma comunidade de discurso matemático...618

Problemas experienciados...622

Alguns continuam com as conjecturas, outros querem avançar para a ficha... ...622

Eles estavam muito calados, mais do que o habitual ...623

Só que fala muito baixinho e depois não diz mais alto …...625

É muito difícil eu conseguir pôr um a interagir com outro...629

Tem muito valor aquele caminho que os ajudo a percorrer, embora, se calhar, se eles o conseguissem percorrer sozinhos ganhassem mais...631

A propósito da tarefa À procura de dízimas finitas...634

Panorama geral sobre as aulas...635

Aula de 13/01/03...636

Aula de 16/01/03...637

Aula de 20/01/03...638

Promovendo a formulação e avaliação de conjecturas ...641

Acompanhando o trabalho de pares durante a formulação de conjecturas ...641

Lidando com a apresentação e formulação de conjecturas ...644

Gerindo a partilha das conjecturas formuladas pelos alunos ...644

Apoiando a construção do enunciado de uma conjectura...657

Lidando com a avaliação de conjecturas...665

Gerindo o processo de avaliação de conjecturas formuladas pelos alunos...665

Envolvendo a turma na investigação de uma conjectura visando ampliar do seu domínio de validade ...690

Problemas experienciados...700

Mas se eu os deixasse aperfeiçoar as conjecturas não estaria a alimentar aquela perfeição exagerada, desvalorizando o resto? ...700

O 1/23 passou um bocado à margem, se calhar... ...705

Lidando com o ensino do discurso de prova ...708

Desafiando a turma a produzir a prova de uma conjectura que “resistiu”...709

Produzindo, com a turma, a prova de uma conjectura que “resistiu” ...712

Trabalhando com um exemplo...712

Trabalhando com o caso geral, visitando um exemplo...720

Problemas experienciados...725

Mesmo com um exemplo houve ali problemas em termos do que fazer e como pela parte dos alunos ...725

(17)

Desacordos emergentes e sua caracterização...726

Processos de resolução de desacordos ...729

Estão a aparecer duas conjecturas muito parecidas ...729

Todas as contradições são boas para esclarecer...733

Problemas experienciados...741

Fui pelo implícito e não devia ter ido... ...741

Ensinando para e através da constituição e desenvolvimento de uma comunidade de discurso matemático ...743

Constituindo e mantendo uma comunidade de discurso matemático ... 743

O modo de estar e participar dos alunos no discurso...743

O modo de estar e aspectos do trabalho da professora ...748

Problemas experienciados...760

Para mim a questão da participação influencia tudo logo ...760

Foi o sentido de oportunidade que, se calhar, falhou...763

Há alguns alunos que dificilmente falam...765

Capítulo VIII - Ensinar a argumentar em Matemática no contexto do projecto...771

Pensando a argumentação matemática ...772

Rebeca: Do carácter pontual ao sentido holístico ...772

Anita: Do desejar ao conseguir ... 775

Preparando o envolvimento dos alunos em actividades de argumentação matemática ...781

Vertentes da preparação ...782

Intensificando e complexificando a preparação...784

Via objectivos ...784

Via tarefas ...788

Compatibilizar tarefas abertas com o currículo de Matemática ...788

Cuidar da formulação de tarefas sem esquecer que elas não bastam...790

Preparar meticulosamente as aulas com tarefas abertas ...794

Criando contextos para o envolvimento dos alunos em actividades de argumentação matemática ...797

Incentivando a formulação, avaliação e prova de conjecturas...798

Negociando significados, valorizando as actividades...798

Apoiando a formulação e partilha de conjecturas... 802

Envolvendo os alunos em experiências de prova ... 817

Origem dos objectos de prova ...818

Tipos de provas produzidas ...818

Conjecturas formuladas versus conjecturas provadas ...819

Conjecturas e motivação para a prova ...822

Necessidade da prova...826

Percursos de prova ...833

(18)

Investindo na negociação de normas de acção e interacção ...854

Importância ...855

Processos de Negociação ...856

Atributos do processo de negociação de normas ...860

Atentando na orquestração de discussões colectivas ...870

Discussão e interacções ...870

Início e suspensão da discussão. ...875

Andamento e harmonia da discussão...881

Capítulo IX - Conclusão...891

Ensinar a argumentar em Matemática ...892

Preparar o ensino, pensando na improvisação ...893

Contextos para a argumentação em Matemática: Trabalhando para e através da construção de teias de relações...898

Entrelaçar a formulação, avaliação e prova de conjecturas ...899

Explorar situações de desacordo com diplomacia ...906

Caminhar com os alunos: A turma enquanto auditório interveniente, informado e crítico ...909

Convivendo com desafios cruzados e entrecruzados ...915

O projecto de investigação colaborativa ...920

Contexto de desenvolvimento do professor ...921

Opção metodológica...929

Encerrando o estudo ...938

Referências bibliográficas...941

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Índice de Tabelas

Tabela 1: Perelman — Demonstração Versus Argumentação ...36

Tabela 2: Síntese de Diferenças e Semelhanças entre os Três Tipos de Investigação Educacional Cooperativa Analisados por Wagner ...142

Tabela 3: Recolha de Material Empírico — Métodos, Fontes e Formas de Registo ...211

Tabela 4: Aulas Presenciadas e sua Distribuição no Tempo...227

Tabela 5: Entrevistas Realizadas...236

Tabela 6: Campos de Colaboração, Actividades e Fases do Projecto...272

Tabela 7: Documentos de Carácter Teórico ou Teórico/prático ...279

Tabela 8: Tarefas Propostas em Aulas da 1ª Fase e 2ª Fase do Projecto ...300

Tabela 9. Tarefa À procura de dízimas finitas: Principais desacordos na aula de Rebeca ...497

Tabela 10: Conjecturas Formuladas na Aula de Anita para Fracções do Tipo 1/n ...670

Tabela 11: Tarefa À procura de dízimas finitas: Principais Desacordos nas Aulas de Anita ...728

Índice de Figuras Figura 1: Representação da forma mínima de argumentação, segundo Toulmin ...72

Figura 2: Modelo de análise da microestrutura de um argumento, segundo Toulmin...73

Figura 3: Representação esquemática do argumento dos alunos, segundo Krummheuer...80

Figura 4: Ensinar como trabalhando em relações: Um modelo básico da prática segundo Lampert...91

Figura 5: Esquema elaborado a partir de exemplos de movimentos do professor numa discussão colectiva, segundo Lampert...110

Figura 6: Macroestrutura da actividade do grupo de pesquisa e sua relação com a actividade individual dos seus membros...269

Figura 7: Slide sobre tarefas apresentado no grupo de discussão...307

Figura 8: Apresentação e avaliação de conjecturas na aula da Rebeca: Macroestrutura da actividade desenvolvida ...430

Figura 9: Apresentação de conjecturas na aula da Anita: Macroestrutura da actividade desenvolvida ...645

Figura 10: Macroestrutura da actividade desenvolvida durante a avaliação de conjecturas na aula de Anita ...673

Figura 11: Como calcular rapidamente o quadrado de um número terminado em 5? ...807

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Capítulo I

-

Introdução

O estudo que apresento é uma investigação com o professor sobre o seu trabalho. Mais precisamente sobre o trabalho de ensino focado na interacção com os alunos e a Matemática quando é intencionalmente orientado pelo propósito de os envolver em actividades de argumentação matemática. É também um contributo para compreender potencialidades e problemas da opção metodológica de fundo tomada para investigar o trabalho de duas professoras que leccionam turmas do 3º ciclo do ensino básico: o desenvolvimento de um projecto de investigação colaborativa.

A expressão “argumentação matemática” é usada para designar argumentação na aula de Matemática, ou seja, conversações aí desenvolvidas cujo foco é a Matemática e que assumem a forma de raciocínios de carácter explicativo e justificativo destinados seja a diminuir riscos de erro ou incerteza na escolha de um caminho, seja a convencer um auditório a aceitar ou rejeitar certos enunciados, ideias ou posições, pela indicação de razões. Esta caracterização merece-me três

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O primeiro foca-se na natureza discursiva da argumentação: “a argumentação serve-se da linguagem natural como utensílio de comunicação entre quem argumenta e o seu interlocutor” (Pedemonte, 2002, p. 29). Esta característica não exclui a referência a elementos não discursivos: por exemplo, figuras, dados numéricos ou algébricos (Douek, 2000).

O segundo reparo prende-se com o conceito de auditório que entendo, seguindo Perelman (1993), como “o conjunto daqueles que o orador quer influenciar pela sua argumentação” (p. 33). Este conceito remete para a ideia de que na argumentação se deve ter em conta um outro. No caso concreto da aula de Matemática, o auditório pode restringir-se apenas a um aluno que delibera consigo próprio, pode ser constituído pela turma, na sua globalidade, ou por alguém em particular com quem se estabelece um diálogo, ou pode ser formado pela comunidade matemática. Em qualquer dos casos, trata-se do “auditório universal” referido por Perelman, no sentido em que é “um auditório racional que pode estar de acordo ou em desacordo com quem argumenta mas que em todos os casos está apto a responder” (Pedemonte, 2002, p. 31).

O terceiro reparo visa destacar que considero a demonstração, designada no presente estudo por prova matemática ou simplesmente prova, como uma argumentação particular (Douek, 1998; Pedemonte, 2002; 2003), ou seja, a prova está sujeita a constrangimentos próprios: “No que respeita à forma do raciocínio visível no produto final, a argumentação apresenta uma gama de possibilidades mais amplas do que a prova matemática: não apenas dedução, mas também analogia, metáfora, etc.” (Douek, 2000, p. 3). Por exemplo, a formulação e avaliação de conjecturas, a que está subjacente o raciocínio plausível (Pólya, 1990), incluem-se nas actividades de argumentação matemática.

Centro este capítulo na fundamentação da pertinência do estudo e na apresentação dos objectivos e questões que o orientam. Começo por me focar na importância de ensinar a argumentar em Matemática tendo por referência as actuais orientações e recomendações para o ensino e aprendizagem desta disciplina.

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Apresento, em seguida, razões subjacentes à opção pelo desenvolvimento de um projecto de colaboração com professores cujo núcleo central é uma actividade reflexiva sobre aulas pensadas para, potencialmente, fazerem surgir e desenvolverem-se episódios de argumentação matemática. Finalizo referindo os objectivos e questões de investigação, que brotam da sinergia criada entre o meu interesse pelo ensino da argumentação matemática e a via escolhida para o estudar, e apresentando a estrutura organizativa do presente documento.

A importância de ensinar a argumentar em Matemática

O interesse pela argumentação no âmbito da educação matemática é bastante recente. Segundo Douek (1999) foi apenas nos anos 80 que ganharam terreno as discussões sobre o tema, no âmbito do esforço feito para “atacar” o problema da especificidade da prova matemática relativamente à argumentação e estabelecer ligações entre perspectivas epistemológicas, cognitivas e educacionais. Kilpatrick, ao apresentar uma perspectiva histórica sobre o ensino da Matemática, referiu-se ao período de 1980-2000 como “the age of argumentation”1.

Encontram-se nas actuais orientações para o desenvolvimento do currículo de Matemática, quer a nível nacional, quer internacional, diversas recomendações que remetem para a necessidade de se dedicar atenção à argumentação na aula de Matemática e de se criarem condições para os alunos se envolverem neste tipo de actividades (Abrantes, Serrazina, & Oliveira, 1999; APM, 1988; NCTM, 1991, 1994, 2000; Ponte, Boavida, Graça, & Abrantes, 1997). Nos currículos portugueses presentemente em vigor (Ministério da Educação, 1991) e também no Currículo Nacional do Ensino Básico: Competências Essenciais (Ministério da Educação, 2001) surgem referências, mais ou menos directas, a estas actividades, através de

1

Kilpatrick debruçou-se sobre a história recente, considerando, para lá desta, duas outras fases que designou por the age of discipline: 1865-1958 e the age of structure: 1958-1980. Esta perspectiva histórica foi apresentada em 19 de Abril de 1999 no simpósio Fostering Argumentation in the Mathematis Classroom:

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indicações relativas aos objectivos visados e competências a desenvolver e a sugestões de carácter metodológico. Por exemplo, sob o título Desenvolver o Raciocínio, um dos objectivos gerais indicados nos programas de 1991 para o 2º e 3º ciclos, encontramos indicações como “fazer e validar conjecturas”, “formular argumentos válidos para justificar opiniões”, “discutir ideias” e “produzir argumentos convincentes”. Também no documento Competências Essenciais, na “competência matemática que todos [os alunos] devem desenvolver” ao longo da educação básica, inclui-se a “concepção de que a validade de uma afirmação está relacionada com a consistência da argumentação lógica, e não com alguma autoridade exterior”, a “predisposição para (...) fazer e testar conjecturas, formular generalizações, pensar de maneira lógica”, e a “compreensão das noções de conjectura, teorema e demonstração” (p. 57). Considera-se, ainda, que a comunicação matemática deve ser transversal às “experiências de aprendizagem vividas pelos alunos” (p. 70) e que, entre outros aspectos, na comunicação oral “são importantes as experiências de argumentação e de discussão em grande e pequeno grupo” (idem).

O destaque atribuído ao raciocínio matemático entrelaça-se com a importância de aprender Matemática com compreensão. Subjacente a esta recomendação está a ideia de que saber Matemática é, fundamentalmente, fazer Matemática, e que os alunos através das experiências de aprendizagem que lhe são proporcionadas deverão desenvolver o seu “poder matemático” (NCTM, 1991, p. 6). Em aulas em que é valorizado o raciocínio, a explicação e a justificação são aspectos chave da actividade dos alunos e, assim, “uma ênfase no raciocínio, em todos os níveis da educação matemática, atrai a atenção para a argumentação e justificação” (Yackel & Hanna, 2003, p. 228).

A comunicação matemática é entendida como uma componente intrínseca do fazer Matemática: “Fazer Matemática envolve comunicar matematicamente” (Forman, 2003, p. 337). Esta recomendação surge associada a perspectivarem-se os fenómenos de aprendizagem em enquadramentos teóricos que reconhecem o valor da linguagem natural e das interacções sociais na construção de conhecimento.

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Entre outros, os trabalhos de Vygotsky e Bruner, trouxeram para primeiro plano a relevância da interacção social na aprendizagem humana. Interacção na aprendizagem significa comunicação, o discurso é o nosso principal modo de comunicação e, assim, a importância de promover conversações matemáticas parece estar fora de questão (Sfard, 2003). Neste âmbito, uma questão que se coloca é de que formas se deve revestir a comunicação na aula de Matemática. Vários educadores matemáticos respondem-lhe indicando que, em certa medida, esta se deve aproximar da existente na comunidade matemática (Lampert, 1990, 2001; O' Connor, 2001). As propostas sugeridas colocam a ênfase no processo discursivo, e não no produto deste discurso, e realçam, nomeadamente a grande importância dos alunos participarem em actividades de argumentação (Forman, 2003). Estas propostas, a par da valorização dos contextos sociais em que aprendizagens ocorrem, são, segundo Forman, Larreamendy-Joerns, Stein e Brown (1998), consistentes com actuais tendências em sociologia e filosofia da ciência. Estas tendências vão no sentido não só de iluminar o lugar central da argumentação no processo de obtenção de acordos sobre a natureza dos objectos científicos, mas também de mostrar que a ciência depende tanto da capacidade de convencer os membros da comunidade científica como do uso do método científico.

Há um outro argumento que justifica a atenção dedicada, em tempos recentes, às actividades de argumentação na aula de Matemática: a procura de caminhos facilitadores da aprendizagem da prova (Duval, 1999). Vários trabalhos revelam que esta é uma vertente do raciocínio matemático que coloca sérias dificuldades aos alunos (Balacheff, 1991a, 1991b; Brocardo, 2001; Lampert, 1988; Ponte, Matos, & Abrantes, 1998; Putnam, Lampert, & Peterson, 1990). Os alunos não compreendem a necessidade da prova, não lhe reconhecem valor, não se apercebem do poder explicativo que pode ter e, frequentemente, não conseguem encontrar sentido nos raciocínios demonstrativos, que surgem aos seus olhos como algo de estranho e obscuro. Hanna (1996) salienta que para a prova ser, antes de mais, um instrumento explicativo e para exercer o seu papel como forma última de justificação

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argumentação matemática” (p. 33). E acrescenta que, embora não seja fácil ensinar-lhes a reconhecer e a produzir argumentos válidos de um ponto de vista matemático, este é “um desafio que não podemos evitar” (idem).

A importância de não deixar cair no esquecimento ou de não remeter para plano secundário a aprendizagem da prova, transparece, em particular, no último documento com orientações curriculares publicado pelo NCTM (2000). Contrariamente ao seu antecessor (NCTM, 1991) em que nenhum dos títulos das normas aí indicadas incluía a palavra “prova”, no documento actual uma das normas respeitantes a processos matemáticos, ou seja, aquelas que “iluminam modos de adquirir e usar o conhecimento do conteúdo” (p. 29), é designada por reasoning and

proof. Na síntese explicativa sobre a incidência desta norma refere-se que os

programas de ensino de todos os níveis de escolaridade não superior, devem proporcionar a todos os alunos a oportunidade de “reconhecer o raciocínio e a prova como aspectos fundamentais da Matemática; formular e investigar conjecturas matemáticas; desenvolver e avaliar argumentos matemáticos e provas; [e] seleccionar e usar vários tipos de raciocínio e métodos de prova” (NCTM, 2000, p. 56).

Na minha perspectiva, há um argumento de natureza um pouco diferente dos anteriormente apresentados, que também justifica a pertinência de envolver os alunos em actividades de argumentação, muito em particular no ensino básico. Segundo Grácio (1992), a competência argumentativa pode entender-se simultaneamente como a “capacidade de dialogar, de pensar, de optar e de se comprometer” (p. 67): como capacidade de dialogar, remete para uma atitude de abertura nas relações com o outro que se torna efectiva pelo desejo de comunicar e pela disposição para ouvir; como capacidade de pensar, remete para uma atitude crítica e de atenção; como capacidade de optar e se comprometer, remete para indivíduos que procuram assumir as suas posições de forma esclarecida e, neste processo, assumem uma atitude interveniente e empenhada. O lugar que a argumentação ocupa num dado contexto reflecte o peso que a liberdade de reflexão e acção aí conquistou. E se se aceitar, seguindo Johnstone (1992), que argumentar é,

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também, correr riscos, e que correr riscos de um ou de outro tipo é fundamental para a estruturação e formação da pessoa, então a argumentação parece “ser constitutiva daqueles que nela participam” (p. 48). Deste modo, a educação para a argumentação é um objectivo democrático decisivo, pelo que importa pensá-la não apenas pelo ângulo intelectual, mas também pelo social e ético.

As ideias anteriormente apresentadas permitem evidenciar que a importância actualmente atribuída ao envolvimento dos alunos em actividades de argumentação, em particular na aula de Matemática, decorre da sinergia de vários argumentos de que destaco: (a) a valorização do raciocínio matemático nas suas múltiplas vertentes numa perspectiva que não põe a ênfase no rigor e formalismo entendidos como um fim em si mesmo, (b) a recomendação de que os alunos aprendam Matemática com compreensão, (c) o valor atribuído às linguagens naturais e à interacção social para a aprendizagem, (d) a aproximação da comunicação na aula de Matemática da existente na comunidade dos matemáticos, (e) dificuldades encontradas na aprendizagem da prova e a procura de caminhos que facilitem esta aprendizagem e (f) a relevância da escola proporcionar a todos os alunos condições necessárias para desenvolverem certas competências transversais, entre as quais está a competência argumentativa, fundamentais ao exercício pleno de uma cidadania responsável numa sociedade democrática.

Apesar do valor das actividades de argumentação matemática ser amplamente reconhecido, estas actividades têm uma expressão débil, ou mesmo inexistente, em muitas salas de aula de diversos níveis de ensino (Ponte et al., 1998; Putnam et al., 1990). O estudo PISA 2000 revela, por exemplo, que muitos jovens portugueses de 15 anos “têm uma fraca capacidade de argumentação, materializada nas justificações que apresentam” (Ramalho, 2002, p. 52). Em particular, “generalizam situações sem proceder à sua verificação; recorrem a informação do quotidiano para fundamentar as suas respostas, sem que esta informação seja pertinente para o problema em causa; [e] fundamentam as suas respostas em informações claramente excluídas pelas condições enunciadas” (idem). Frequentemente os alunos agem com

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como se não fizesse parte do seu papel comprometerem-se com a coerência, avaliação ou justificação dos seus raciocínios, nem com a análise crítica e fundamentada do que ouvem dos colegas. Lidar com esta tendência de modo a alterá-la não é simples.

Não há em Portugal investigações focadas no trabalho do professor orientado para o ensino da argumentação em Matemática, embora haja estudos que, ao analisarem práticas do professor associadas à exploração e discussão de tarefas de investigação matemática, abordam aspectos deste trabalho (por exemplo, Cunha, 1998; Fonseca, 2000; Oliveira, 1998; Ponte, 2003; Ponte, Ferreira, Varandas, Brunheira & Oliveira, 1999; Ponte, Segurado & Oliveira, 2003). Estes estudos referem papéis desempenhados pelos professores ao acompanharem a formulação e teste de conjecturas pelos alunos, ao moderarem discussões focadas na partilha e análise dos produtos do trabalho de grupo ou pares, ao promoverem a justificação ou prova de conjecturas e também questões e problemas com que se confrontam. Uma ideia que sobressai a partir da análise destes estudos é que, com frequência, os professores experienciam dificuldades, dilemas, tensões, desafios, situações problemáticas não antecipadas, que tornam o seu trabalho bem mais complexo e imprevisível do que seria se se limitassem a expor ou a “explicar bem” conceitos ou procedimentos matemáticos, a apresentar apenas exercícios visando a consolidação de conhecimentos ou se o controle do discurso que se desenrola na aula e o poder decisório sobre o valor matemático desse discurso estivessem inteiramente nas suas mãos. Outra ideia que sobressai são as exigências de grande flexibilidade, significativo investimento pessoal e um leque de competências profissionais mais amplo do que aquele que requer do professor o ensino dito “tradicional”.

Em termos internacionais, investigações especificamente centradas no tema do presente estudo também são escassas. Há um conjunto de trabalhos focados na prova. Entre estes, Herbst (2000) refere que “a tese de Eric Knuth é um dos raros estudos que abordam a prova do ponto de vista do professor” (p. 10). Sem negar a importância deste estudo, cuja opção metodológica foi a realização de entrevistas a professores com o propósito de analisar as suas concepções sobre a natureza e papel

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da prova, considera que é ele insuficiente para permitir compreender o trabalho realizado pelo professor nas condições de possibilidade da sua acção. Herbst (1998, 2002) investigou, ele próprio, práticas da aula de Matemática orientadas para o envolvimento dos alunos na produção de provas numa perspectiva de análise do trabalho do professor. Apoiando-se neste estudo problematizou o papel do professor na promoção da argumentação na aula de Matemática salientando a sua complexidade (Herbst, 1999).

No âmbito dos trabalhos focados na prova, há um grupo significativo que se interessa pelas relações entre prova e argumentação mas do ponto de vista da aprendizagem e em que o professor é, no caso dos que consultei, bastante invisível. As conclusões destes trabalhos não são consensuais, embora o seu conjunto não desvalorize o envolvimento dos alunos em actividades de argumentação na aula de Matemática. O debate centra-se em torno das potencialidades que este envolvimento traz para a aprendizagem da prova. Duval (1992-1993) refere que “mesmo nas suas formas mais elaboradas a argumentação não abre uma via para a demonstração” (p. 60). Balacheff (1999) considera que há uma relação complexa entre argumentação e prova e sublinha que a “argumentação constituiu-se como um obstáculo epistemológico à aprendizagem da demonstração e, mais geralmente, da prova matemática” (p. 5). Em contrapartida, a ideia de que há uma distância cognitiva entre argumentação e prova é fortemente contestada por um grupo de investigadores italianos que defendem que a exploração, pelos alunos, de problemas abertos que requeira a formulação de conjecturas e a avaliação da sua plausibilidade, pode favorecer uma significativa actividade argumentativa que, em muitos casos, se revela muito útil na construção da prova (Boero, 1999; Bussi, 2000; Pedemonte, 2002). Neste último sentido vão também estudos desenvolvidos por Douek (1998, 2000), bem como as ideias sobre a aprendizagem da generalização e prova emergentes de estudos realizados em Portugal apresentadas por Ponte, Matos e Abrantes (1998).

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características consistentes com as propostas pelo NCTM (1991, 1994, 2000) e para a criação de uma cultura de sala de aula regulada por normas que o favoreçam. Neste estudos encontram-se referências a papéis desempenhados pelo professor para desencadear e apoiar actividades de argumentação na aula de Matemática. Destaco, neste âmbito, os trabalhos de Chazan e Ball (1999), Cobb e Yackel (1998), Forman et al. (1998), Heaton (2000), Herbst (2003), Lampert (1990, 2001), Sherin (2002), Wood (1999), Yackel (2002a) e Yackel e Cobb (1996). Alguns destes trabalhos, de que saliento muito em particular o de Lampert (2001), ilustram que é possível criar contextos de aprendizagem com alunos do ensino básico em que a argumentação matemática está em primeiro plano e, simultaneamente, o currículo instituído não é relegado para segundo lugar. Vários desses estudos evidenciam, no entanto, que promover e incentivar a argumentação matemática cria sérias dificuldades aos professores: Herbst (2003) analisa três tensões que afectam o trabalho do professor; Sherin (2002) escreve que criar e manter ambientes de aprendizagem que apoiem o “fazer e falar acerca da Matemática (...) é um empreendimento complexo para os professores” (p. 205) e debruça-se sobre “duas tensões chave” (idem); Heaton (2000) refere surpresas e receios sentidos ao perspectivar o seu ensino de modo a, entre outros aspectos, trabalhar com os alunos no sentido de produzirem argumentos matemáticos; Chazan e Ball (1999) salientam dilemas vividos ao tentarem envolver as turmas em actividades de argumentação, assegurar a produtividade matemática das práticas argumentativas e evitar que os alunos enveredassem por caminhos passíveis de provocar frustração ou embaraço social. Os últimos dilemas que referi prendem-se com questões levantadas por vários outros autores: Em que medida é possível manter ligações entre as práticas matemáticas da aula e o modo como a Matemática avança enquanto construção humana? Qual o papel do professor na promoção e apoio ao desenvolvimento de argumentação matemática genuína na aula? De que modo pode tornar os alunos capazes de participar na argumentação matemática da aula e, ao mesmo tempo, assegurar a natureza matemática dessa argumentação?

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Em síntese, procurei fundamentar a importância do envolvimento dos alunos em actividades de argumentação matemática, sublinhar que este tipo de actividades não é usual em muitas aulas de Matemática, salientar que há ainda muito para investigar quer sobre as suas potencialidades, quer sobre possíveis vias de se materializarem nas práticas lectivas e evidenciar que estas práticas colocam significativos desafios ao professor. Pretendo com o presente estudo contribuir para uma conversação sobre aspectos associados a estas questões, esperando poder iluminar algumas das complexidades do trabalho desenvolvido pelo professor ao tentar concretizar esta orientação curricular nos contextos reais em que desenvolve a sua actividade. Refiro, em seguida, o porquê da opção pelo desenvolvimento de um projecto de colaboração entrelaçando razões de ordem mais experiencial e pessoal com outras da ordem dos saberes profissionais.

Um projecto de colaboração centrado na argumentação

matemática: Uma opção metodológica

Levar a cabo esta investigação é desenvolver um projecto fundado na minha história onde não é simples destrinçar onde começam e acabam os motivos de natureza mais profissional ou mais pessoal. Desde que me conheço sempre gostei de Matemática. Não se me colocou qualquer dúvida ao chegar o momento de ingressar na Faculdade: seria uma licenciatura em Matemática. O gosto pelo ensino veio mais tarde. Descobri-o por acaso, fruto de razões circunstanciais que me levaram a decidir ser essa a mais rápida via, assumida na altura como transitória, de conseguir a independência económica que desejava. Tendo feito esta descoberta, deixei de ver a minha vida profissional futura como via antes e, por opção, sou professora há perto de 25 anos.

Foi o mestrado que despertou o meu interesse pela investigação cujo foco é o professor. Na época senti-me fascinada pelo pensamento de Popper, Kuhn, Lakatos, entusiasmei-me com a procura de entendimento dos processos de produção do saber

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refutações, pela compreensão de relações entre Filosofia da Matemática e ensino da Matemática e pela análise de relações entre perspectivas do professor sobre a natureza da Matemática e concepções sobre o seu ensino. Concluí-o sentindo que, em termos pessoais, a sua principal contribuição foi a de entreabrir portas que me poderiam levar a caminhos de aprofundamento desta problemática. Entre estes caminhos estava a curiosidade e interesse em compreender se seria possível, em que condições e através de que vias, proporcionar aos alunos de níveis elementares experiências de aprendizagem que colocassem em primeiro plano a argumentação matemática.

Com o passar do tempo, informada pela literatura e pelo conhecimento experiencial oriundo da minha vida de professora, vou constatando que as questões relacionadas com o ensino da argumentação matemática são bem mais complexas do que inicialmente tinha imaginado. Concluo que não será possível compreendê-las em profundidade sem aceder a práticas de ensino que não excluam esse tipo de actividades, sem entender o que, na perspectiva do professor, é relevante para a preparação e concretização destas práticas, sem conhecer os seus pontos de vista sobre opções que toma e porque as toma.

É neste contexto que começa a tomar forma a ideia de realizar uma investigação com professores interessados na compreensão do que está em jogo quando, intencionalmente, procuram criar nas suas aulas situações de ensino e aprendizagem orientadas para o envolvimento dos alunos em actividades de argumentação matemática. Subjacente a esta ideia estão vários pressupostos, apresentados em seguida, que no seu conjunto contribuíram para esta via se me afigurar como relevante e adequada.

Há, a meu ver, diversas formas legítimas de conhecer o mundo. A possibilidade de analisar e reflectir sobre uma realidade a partir de perspectivas, experiências e saberes diversos, em suma, de olhares múltiplos, contribui para a construção de quadros interpretativos abrangentes que permitem um entendimento mais profundo dessa mesma realidade. Distancio-me, portanto, do que Olson (1997)

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designa por getting an education, versão epistemológica sobre o conhecimento herdada do positivismo e que está subjacente à valorização da racionalidade técnica. Esta versão supõe que o conhecimento formal, teórico, não experiencial, é superior a todas as outras formas de conhecer e, por isso mesmo, quando se trata do ensino, o importante é este tipo de conhecimento, construído por alguns, nomeadamente pelos investigadores, ser “passado” a outros, por exemplo, os professores, para estes o aplicarem na sua prática.

Quando se trata de investigar fenómenos educativos complexos, como considero ser o ensinar a argumentar em Matemática, os professores estão numa situação ímpar para, através dos saberes de que são portadores e a que reconheço valor, proporcionarem informações insubstituíveis sobre os modos como lidam com as várias vertentes do seu trabalho, os sentimentos que experienciam ao realizá-lo e onde se fundam as escolhas que fazem. Nesta medida, penso que na produção de conhecimento relevante sobre o ensino, professores e investigadores, embora tendo finalidades próprias e práticas e saberes específicos, necessitam uns dos outros. Na verdade, ambos podem contribuir para o processo de produção deste conhecimento. Uma via prometedora é o envolvimento em empreendimentos conjuntos focados na promoção de um diálogo profissional autêntico. Este diálogo, que pressupõe a aceitação das vozes pessoais decorrentes de experiências vividas, a possibilidade de se partilharem, com autenticidade, diferentes significados e perspectivas e a valorização dos conhecimentos de cada um, pode ocorrer no âmbito de trabalhos colaborativos baseados na construção de relações interpessoais não hierárquicas orientadas pela procura de paridade de poder e vozes e apoiadas na negociação e no cuidado (Christiansen, Goulet, Krentz, & Maeers, 1997a).

Tinha consciência de que a argumentação matemática, por circunstâncias diversas, é uma vertente do raciocínio matemático frequentemente secundarizada e mesmo esquecida em muitas salas de aula. Não pretendia embarcar num percurso de investigação que, eventualmente, me pudesse conduzir, apenas, à constatação de que os alunos não se envolvem neste tipo de actividades ou ao entendimento

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de que poderia correr o risco de realizar um estudo que, de algum modo, pudesse contribuir, mesmo que só implicitamente, para reforçar a imagem do professor como profissional “deficiente” cujas práticas de ensino, devido, por exemplo, a insuficiências do seu conhecimento, competências, qualificações ou a certas concepções, não integram aspectos do ensino da Matemática que a investigação e documentos curriculares consideram ser importantes.

Conjecturei, assim, que o desenvolvimento de um projecto de colaboração em que a prática do professor e a reflexão sobre a prática fossem componentes chave, poderia permitir enquadrar as motivações que me moviam, evitar o que não desejava e, simultaneamente, lidar com questões de natureza ética que se me colocavam quando imaginava as exigências de tempo, energia, abertura e disponibilidade que a concretização deste projecto requeria dos professores com quem viesse a colaborar.

Com efeito, “o paradigma colaborativo” (Reason, 1988c, p. 18) admite a possibilidade de existência de trabalhos orientados por um amplo propósito comum no âmbito do qual podem ser definidos objectivos diferenciados (Bednarz, Desgagné, Couture, Lebuis, & Poirier, 1999; Castle, 1997; Hookey, Neal, & Donoahue, 1997; Kapuscinski, 1997; Orr, 1997; Ponte et al., 2003). Nesta medida, seria legítimo propor a professores o desenvolvimento de um projecto centrado na argumentação na aula de Matemática, mas cujo tema fosse suficientemente abrangente para possibilitar várias portas de entrada. Esta proposta permitir-me-ia investigar a problemática que me interessava, na medida em que envolveria o compromisso de trabalhar conjuntamente no sentido de imaginar e problematizar possibilidades e condições para que esta argumentação pudesse surgir e se desenvolvesse. Ao mesmo tempo, deixaria espaço para os professores, no âmbito do tema, poderem identificar questões pertinentes para si, reflectir sobre problemas que se lhe colocam e prosseguir intenções consideradas por si relevantes. Nesta medida, seriam também protagonistas no projecto e não meras fontes de fornecimento de dados que servem os propósitos do investigador e têm por finalidade responder a questões que apenas este coloca.

Imagem

Tabela 1: Perelman — Demonstração Versus Argumentação  Itens
Figura 1: Representação da forma mínima de argumentação, segundo Toulmin
Figura 3: Representação esquemática do argumento dos alunos, segundo Krummheuer
Figura 4: Ensinar como trabalhando em relações: Um modelo básico da prática, segundo Lampert
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