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OLHOS DE RESSACA. GABRIEL E a ressaca puxa, né, pro fundo do mar.

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Academic year: 2021

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OLHOS DE RESSACA

Diálogos entre GABRIEL e VERA.

GABRIEL – “Traziam não sei que fluido misterioso e enégico, uma força que arrastava para dentro como a vaga que se retira da praia nos dias de ressaca”...

“Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saia delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me”.

00:02:10 Minutos/Segundos.

GABRIEL - É difícil dizer assim, um detalhe, né.

Nós.. eu tinha uma atração por ela. É como diz o Machado de Assis sobre a Capitú, né... : “Tinha olhos de ressaca que atraiam”... eu achava a coisa mais linda.

00:02:43 Minutos/Segundos.

Título: Olhos de Ressaca

00:03:08 Minutos/Segundos.

GABRIEL – E a ressaca puxa, né, pro fundo do mar.

VERA – Tinha uma casa entre a minha e a dele. O quintal dele encontrava com o quintal da nossa casa lá no fundo, e tinha uma mangueira, mangubá. Manga amadurecia, caía lá em casa… A gente ficava lá esperando, né... acompanhando.

00:03:47 M.S

(2)

VERA – Depois, de noite, a gente reunia todo mundo, uma turma grande, todos os vizinhos ali... tinham umas amigas, outros rapazes e ficavam lá na calçada, faziam um grupinho e ficava lá batendo papo...

Aí é que eu notei que tinha um dos rapazinhos que era bem interessante. Ele era mais atencioso, mais educado do que os outros, e achava ele bonito.

Achava ele bonito mesmo! E eu vi que tinha uma

correspondenciazinha. Aí a gente começava a flertar.

Flertar naquele tempo, era olhar bem nos olhos, e eu notei que ele gostava de olhar pra mim.

Então eu fiquei toda entusiasmada, né...

Ele só entrou lá em casa no dia que eu fiz 15 anos, que eu convidei a turma toda, né, pra ir lá pra casa pra gente dançar.

Aí a gente dançou, e ele me deu uma medalhinha, medalhinha de santo Antonio, que é o santo

casamenteiro...

Aí é que a gente começou, começou a namorar.

00:05:45 M.S.

GABRIEL (cantando) – Seus olhos são negros, negros, como a noite sem luar, são ardentes, são profundos, como o negrume do mar.

– Por isso eu te amo querida, quer no prazer, quer na dor, rosa, canto, sombra, estrela, o gondoleiro do amor...

00:06:50 M.S.

GABRIEL (cantando) – Quando vim da minha terra, não trouxe nada de meu, trouxe uma coberta velha, essa mesma o boi comeu, ôôôôôôôô boi da guia, vêm, vêm, vêm...

(3)

00:07:25 M.S.

VERA – Meu pai falava assim: eu tô ouvindo vocês falarem que vão morar na fazenda, você não tem

costume. Acho melhor você ir lá conhecer, por que se você não gostar não precisa casar..

- Eu fui, gostei e casei.

00:08:39 M.S.

VERA – Aqui não tinha telefone, tinha rádio amador.

Então passei um recado pelo rádio pra minha sogra;

aí eu falei: “Avisa lá na minha casa, pra me mandarem um vestido de bolinha.”

Aí a Elza falou: “É por que ela ta grávida.”

GABRIEL – É o código.

VERA – Código de gravidez.

GABRIEL – Pra não ficar pondo no rádio.

00:09:33 M.S.

VERA – Eu sei que quando a Marília tava com dois anos e meio, eu já tinha três filhos, tinha ela, o Flávio e a Laura...

Naquela época bastava sacudir uma cueca perto de mim que eu engrávidava.

00:10:00 M.S.

VERA – Eu gostava muito de andar descalça, detestava colocar sapato.

Chutava bola, a gente chamava de futebol, mas era só chutar a bola.

(4)

00:10:30 M.S.

GABRIEL – Eu era chorão, mas evitava, tinha vergonha, né... por que os meninos gozavam os chorões, eles falavam: “oh manteiga derretida, chorão...” então a gente aprende a reprimir.

00:11:03

GABRIEL – Eu lembro que eu ia pros acampamentos, ficava muito carente, e eu lembro que eu gravei uma cançãozinha da Laura cantando com a Julinha: “eu sou a pituchinha, gosto de doce de leite, por isso tirei a caixinha”...

00:11:49 M.S.

VERA – Minha mãe era muito macia, mas ela pouco tinha tempo pra abraçar a gente, por que ela trabalhava muito.

- Ela que costurava pra nós, ela fazia comida...

- Senti muito a morte dela... sinto até hoje, sinto falta dela, do carinho dela, do riso dela; sinto no coração e na memória.

00:13:17 M.S.

VERA – Eu sou mais impetuosa, ele é mais calmo.

- Eu sou mais... real, ele mais sonhador.

- Ele chega sempre atrasado, eu chego sempre adiantada.

- E fica aí se deliciando com as obras de Castro Álves, Machado de Assis...

(5)

00:14:43 M.S

GABRIEL – “Oh, eu quero viver, Beber perfume na flor silvestre que embalsama os ares, Ver minha alma

adejar pelo infinito, Qual branca vela na amplidão dos mares, No seio da mulher há tanto aroma, Nos seus beijos de fogo há tanta vida, Árabe berrante, Vou dormir à tarde à sombra fresca da palmeira erguida”.

00:15:27 M.S

GABRIEL - A mocidade é a glória. Naquele poema:

Mocidade e Morte você vê quão bonita é a mocidade, né.

VERA – Algumas vezes eu tenho certas dificuldades, de me movimentar, de dizer algumas palavras, de cantar, a voz não sai...

Eu vejo que isso é a idade que ta... mudando.

00:16:24 M.S.

GABRIEL – É, eu não tenho angustia de Castro Álvares não, a morte pra nós que temos 80 anos é um , uma coisa natural que pode vir a qualquer hora, e nós temos que encarar... assim e não ter muito medo.

- Agora, na hora que ela vier chegando eu sei que vai dar medo... quando ele tiver mais perto... pelo menos é o que dizem os poetas.

00:17:28 M.S.

VERA – Mas em compensação, a gente conhece mais

coisas, a gente distingue melhor as aproximações das pessoas que tem mais carinho com a gente.

- Essa percepção das coisas que nos envolvem aumenta com... com a idade.

(6)

- Uma delas é essa aqui, ó... mas isso sempre foi assim, isso é muito importante. Não é qualquer pessoa que tem momentos assim, como eu tenho com ele.

- Que a gente sente o apoio um do outro, sem precisar falar nada, só de cruzar o olhar...

GABRIEL – É mesmo.

VERA – Não é!!! É a melhor coisa do mundo!

00:18:45 M.S.

VERA – Nós não temos mais aquela paixão do início, né... a gente tem ainda aquele carinho um com o outro, e é um carinho mesmo. Assim, puro, muito

suave, muito agradável, que dá estímulo pra gente de continuar tudo.

- A gente não sabe viver separado mais não.

- Nossa vida é toda entrelaçada mesmo.

00:20:10 M.S.

GABRIEL – Ô senhor… Mire veja: o mais importante e

bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso que me alegra, montão.

FIM

Referências

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