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União estável como factum probandum: liberdade probatória e o seu perante o juízo penal

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Academic year: 2018

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SAULO BAQUIT REIS

UNIÃO ESTÁVEL COMO FACTUM PROBANDUM: LIBERDADE PROBATÓRIA E

O SEU RECONHECIMENTO PERANTE O JUÍZO PENAL

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UNIÃO ESTÁVEL COMO FACTUM PROBANDUM: LIBERDADE PROBATÓRIA E O SEU RECONHECIMENTO PERANTE O JUÍZO PENAL

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Me. Raul Carneiro Nepomuceno

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Gerada automaticamente pelo módulo Catalog, mediante os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

R312u Reis, Saulo Baquit.

União estável como factum probandum : liberdade probatória e o seu reconhecimento perante o juízo penal / Saulo Baquit Reis. – 2017.

72 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2017.

Orientação: Prof. Me. Raul Carneiro Nepomuceno.

1. União estável. 2. Processo penal. 3. Meios de prova. I. Título.

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UNIÃO ESTÁVEL COMO FACTUM PROBANDUM: LIBERDADE PROBATÓRIA E O SEU RECONHECIMENTO PERANTE O JUÍZO PENAL

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito.

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Prof. Me. Raul Carneiro Nepomuceno (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Profª. Me. Fernanda Cláudia Araújo da Silva

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Mestranda Débora Tomé de Sousa

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À Deus.

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A Deus, primeiramente, pois sinto Sua presença sempre intercedendo por mim. À toda minha família, por ser minha sólida base. Em especial à minha mãe, Cláudia, por não medir esforços no cuidado para comigo e por sempre almejar o meu aprimoramento enquanto ser humano.

Aos meus avós José e Nilza, pelas lições de vida, por todo o zelo e o afeto. Por serem, de fato, pais em dobro.

Aos meus irmãos, Arthur e Matheus, e ao meu primo, que tem a estima de um irmão, Pedro Bruno, pelo companheirismo e amizade

À Universidade Federal do Ceará, por me mostrar que o mundo é maior que minha pequena aldeia.

A todos os professores que participaram da minha formação intelectual. Em especial, ao Prof. Raul Nepomuceno, docente que se destaca por sua dedicação com o magistério, e o qual tive a oportunidade de ser aluno em duas disciplinas e agora na posição, privilegiada, de orientando; ao Prof. Francisco Macedo, pessoa pela qual preservo imensa admiração e nítidas lembranças de manhãs engrandecedoras, pelo seu senso de comprometimento na árdua tarefa de transmitir o saber, conciliando gentileza e seriedade; à “tia” Nilvia, por suas aulas vespertinas, passos iniciais, que cultivaram em mim o apreço pelo saber.

Aos membros da banca, Profa. Fernanda Cláudia e Mestranda Débora Tomé, pela disponibilidade de tempo e sugestões a engrandecer o presente trabalho.

Ao Tribunal de Justiça do Ceará, pelo extraordinário estágio, na pessoa do Des. Francisco Gomes de Moura e de todos que os servidores que compõe o seu gabinete, pela oportunidade que me deram de aprender diariamente com profissionais que representam a responsabilidade com a efetivação da justiça.

À minha namorada Nathalia, por me dar forças para seguir em frente e conseguir me fazer sorrir mesmo diante das adversidades.

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“Andava o dia inteiro com o espírito alerta, vagando pelas ruas para tirar fotos no calor da hora, fotos que fossem como flagrantes delitos. Tinha, sobretudo, o desejo de captar numa única imagem o essencial de uma cena que emergia. ”

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A pesquisa ora empreendida analisa a união estável como factum probandum para o deslinde da demanda penal. Enquanto entidade familiar, a união estável é marcada pela própria informalidade; por outra perspectiva, a existência dela se opera no plano dos fatos. Deve-se à convivência entre duas pessoas de forma estável, contínua, pública e o com intuitu familiae. Além disso, a Constituição Federal, ao reconhecer seu status enquanto família, também a colocou sob a égide do Estado. O instituto, nesse sentido, revela-se como um bem tutelado pelo Direito Penal. Para tal pesquisa, a metodologia utilizada se volta à análise bibliográfica, jurisprudencial e legislativa. Verifica-se que a união estável, enquanto tema de prova, difere-se dos demais status das pessoas: a condição particular de existência é provada com ampla liberdade probatória, de forma a não surtir efeito a limitação imposta pelo parágrafo único do artigo 155 do Código Penal. O reconhecimento do status de companheiro, nesses casos, é dado pelo próprio juízo da ação penal, o qual deve indicar nos elementos de prova o cumprimento dos elementos constitutivos essenciais, sob pena de não fundamentar a decisão. Ademais, analisa-se que, para além do vínculo formado a partir da própria união estável entre os companheiros, esse tipo de união também gera o parentesco por afinidade. Os parentes adquiridos por essa via também geram reflexos na codificação penal. Desta forma, observa-se que a união estável se apresenta como factum probandum em diversas hipóteses apontadas pelo Códex Penal, motivo pelo qual carece, precisamente, de análise da sua comprovação perante o juízo da ação.

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Die eheähnliche Gemeinschaft als Familieneinheit zeichnet sich durch ihre Ungezwungenheit aus. Ihre Existenz ist auf folgenden, gegebenen Tatsachen begründet. Nämlich auf dem stabilen Zusammenleben zwischen zwei Personen, das auf den Ebenen der Öffentlichkeit und der intuitu familiae erfolgt. Darüber hinaus erkennt die brasilianische Bundesverfassung die eheähnliche Gemeinschaft als Familie an und hat sie auch unter ihren Staatsschutz gestellt. In diesem Sinne wird das Institut auch durch das Strafrecht überwacht. Die durchgeführte Recherche analysiert in diesem Zusammenhang die eheähnliche Gemeinschaft als factum probandum bezüglich der Auflösung der Strafverfolgung. Die genutzte Methodik beruht auf einer literaturbasierten Recherche, der Legislative und der Judikative. Es scheint so als würde sich die eheähnliche Gemeinschaft, in Bezug auf die Beweisproblematik in einem Rechtsfall, von dem geläufigen Zivilstand der Personen unterscheiden. Ihre Existenzgrundlage ist jedoch mit reichlich Freiheit beweiskräftig erwiesen, so dass die Begrenzung durch den Artikel §155 StGB (des brasilianischen Strafgesetzbuches) nicht wirksam ist. Die Anerkennung der eheähnlichen Gemeinschaft als einen Zivilstand, tritt nach der Beurteilung der kriminellen Handlung ein und muss nachweislich grundlegende Beweisbestandteile erfüllen, die aussagekräftig für die Rechtssprechung sind. Ferner lässt sich beobachten, dass neben der erzeugten Bindung durch die eheähnlichen Gemeinschaft zwischen den Lebenspartnern, ebenfalls eine familiäre Affinität zu der Verwandtschaft des Lebensgefährten entsteht. In der strafrechtlichen Rechtssprechung werden diese Personen als Verwandte betrachtet. Die eheähnliche Gemeinschaft präsentiert sich in verschiedenen, durch den Straf Codex hingewiesenen Hypothesen als factum probandum und muss vor Gericht analysiert und bewiesen werden.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 1

2 PROVAS NO PROCESSO PENAL: ACEPÇÕES, PRINCÍPIOS ORIENTADORES E PROVAS EM ESPÉCIE ... 3

2.1 Conceito de Prova ... 3

2.2 Provas e Elementos Informativos ... 4

2.3 Sistema de avaliação da prova ... 5

2.4 Princípios referentes às provas ... 7

2.4.1. Princípio da autorresponsabilidade das partes...7

2.4.2. Princípio da aquisição ou comunhão da prova...8

2.4.3 Princípio da oralidade...9

2.4.4 Princípio da identidade física do juiz...9

2.5 Meios de prova e Meio de investigação da prova ... 10

2.6 Princípio da Liberdade Probatória e a Previsão Legal dos Meios de Prova ... 11

2.7 Prova anômala e prova irritual ... 14

2.8. Provas em espécie ... 14

2.8.1 Prova testemunhal...15

2.8.1.1 Conceito...15

2.8.1.2 Características...15

2.8.1.3 Compromisso da verdade, isenção e proibição de depor...17

2.8.1.4 O perecimento da memória e a prova testemunhal antecipada...19

2.8.2 Prova documental...20

2.8.2.1 Conceito...20

2.8.2.2 Produção...21

3 UNIÃO ESTÁVEL COMO ENTIDADE FAMILIAR E SEUS REFLEXOS NO ESTADO DAS PESSOAS...22

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3.2 Conceito e requisitos da união estável ... 24

3.3 Impedimentos para a união estável ... 27

3.4 Concubinato e união estável ... 28

3.5 União estável entre pessoas do mesmo sexo ... 29

3.6 Estado da pessoa e estado civil ... 30

3.7 Dissolução da união estável ... 32

4 A UNIÃO ESTÁVEL COMO FACTUM PROBANDUM NO DESLINDE DA AÇÃO PENAL ... 34

4.1 Direito Penal e Direito Civil ... 34

4.2 Princípios limitadores do estado na esfera penal e a união estável: o Direito Penal como a última ratio e a estrita legalidade ... 35

4.2.1 Princípio da intervenção mínima e a união estável...35

4.2.2 Princípio da legalidade e a união estável...38

4.3 Competência para os litígios sobre a união estável ... 39

4.4 Meios de prova para o reconhecimento da união estável no persecutio criminis ... 41

4.4.1 Sistema de avaliação de provas e a consideração do status de companheiro na ação penal...45

4.5 Reflexos da união estável no Código Penal ... 46

4.5.1 A imunidade prevista no art. 181, I, do Código Penal e a sua aplicação para o companheiro...49

4.6 Reflexos da união estável para além do companheiro: parentesco afim ... 51

4.7 União homoafetiva como união estável para o Direito Penal ... 53

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 55

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1 INTRODUÇÃO

Com o advento da Constituição Federal de 1988, foi finalmente reconhecida a condição de entidade familiar à união estável, que, nessa posição, passou a gozar da importante proteção estatal. Nessa perspectiva, o instituto é atualmente regulamentado pela codificação civil de 2002, tendo inclusive título próprio, no livro IV, dedicado ao Direito de Família. Ademais, sua repercussão extrapola a seara familiar, sucessória, previdenciária, também reverberando na esfera penal, foco específico desta pesquisa.

Objetiva-se com o presente trabalho monográfico realizar a análise específica da união estável como factum probandum na ação penal. Para tanto, faz-se necessário ponderar sobre os meios de prova admitidos ao tratar o status de companheiro como objeto de prova, além de analisar conceitos civilistas referentes àquele para a integralização da norma penal, bem como tal status repercute no persecutio crimini.

Nessa toada, a união estável, enquanto objeto de prova na ação penal, revela diversas peculiaridades a serem observadas, ao passo que se distancia dos demais status das pessoas, em especial do casamento, ao não se constituir por um ato formal, firmando-se independentemente de qualquer documento. A sua aferição, nesse sentido, é circunstancial.

A metodologia volta-se à pesquisa bibliográfica e jurisprudencial para analisar a prova no processo penal, a união estável como entidade familiar, para por fim, explorar a união estável inserida no contexto penal, enquanto fato a ser provado e os reflexos disso. Lança-se mão de um método de pesquisa compilatória, bem como hipotético-dedutiva, partindo de proposições gerais para dirimir dúvidas específicas.

Assim, o primeiro capítulo discorre acerca da prova no processo penal, tendo como escopo o delineamento de alguns conceitos pertinentes, princípios aplicáveis, além de analisar o sistema de avaliação de prova privilegiado pelo ordenamento pátrio. Também se procura tratar da abrangência da liberdade probatória e de dois meios de provas de forma específica, a saber, o testemunhal e o documental.

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Já no derradeiro capítulo, analisa-se a especificidade do trato da união estável no Direito Penal, sob o enfoque principiológico deste como última ratio e da estrita legalidade. Delimita-se suas possibilidades, bem como esse factum probandum se revela na ação penal.

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2 PROVAS NO PROCESSO PENAL: ACEPÇÕES, PRINCÍPIOS ORIENTADORES E PROVAS EM ESPÉCIE

A tentativa de reconstituição do passado é fundamental para o Direito Penal, como forma de impor qualquer sanção. Os interesses afetados fazem com que a pretensão de aferir a verdade regressa se deem de maneira a conferir maior fidedignidade entre o apresentado e o efetivamente ocorrido.

Nessa incumbência, é conferida às provas, dentro de um arcabouço principiológico, a função de fornecer ao julgador da causa o juízo de segurança que as alegações ali trazidas assistem o devido fundamento com a realidade.

Assim, nesse viés, faz-se mister trazer justamente um panorama sobre a temática prova, já que ela se relaciona diretamente com o tema central do trabalho, ou seja, a união estável como objeto de prova no deslinde da demanda penal.

2.1 Conceito de Prova

A palavra “prova” deriva do latim e hoje possui uma significação ampla. O seu uso, tanto concernente à prática forense jurídica quanto no trato coloquial, pode ser expressado referindo-se a significados diversos. Senão se veja algumas conceituações.

No âmbito do Direito Processual, conforme aduz Ada Pellegrini: “a prova constitui, pois, o instrumento por meio do qual se forma a convicção do juiz a respeito da ocorrência ou inocorrência dos fatos controvertidos no processo” (in CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2013, p. 385).

Quando se desloca o debate para o âmbito processual penal, tem-se, a definição trazida por Guilherme Nucci:

Prova é a demonstração lógica da realidade, no processo, por meio dos instrumentos legalmente previstos, buscando gerar, no espírito do julgador, a certeza em relação aos fatos alegados e, por consequência, gerando a convicção objetiva para o deslinde da demanda. (NUCCI, 2015, p. 20).

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como resultado, como meio de prova e meio de obtenção de prova, a ver também no contexto do processo penal.

O primeiro sentido, prova como fonte, “refere-se às pessoas ou coisas utilizadas como prova, consideradas como fontes de estímulos sensoriais que chegam à percepção da entidade decisora (por exemplo, o juiz) sobre um fato” (FEITOZA, 2010, p. 716). Já a prova como manifestação da fonte, refere-se à exteriorização das pessoas que atuam como prova pessoal, ou seja, o depoimento de uma testemunha, por exemplo. Neste caso, é possível diferenciar a própria fonte da prova e suas manifestações (ibidem, 2010, p. 716). No sentido de a prova como atividade probatória, o conceito é entendido como “o ato ou conjunto de atos tendentes a formar a convicção da entidade decisora sobre a existência ou inexistência de um fato” (ibidem, 2010, p. 716). Sob esta ótica, diz-se que existe, para defesa e acusação, um direito à prova, o qual deriva do próprio direito de ação (FEITOZA, 2010).

Por seu turno, prova como resultado configura-se pela formação do juízo decisório ao longo do processo acerca da existência ou não de certas situações fáticas (LIMA, 2017). Os dois sentidos restantes, prova como meio de prova e meio de obtenção de prova, serão detalhados em tópico próprio, porém aqui já se tem por demonstrado como o vocábulo é expresso em um leque de possibilidades dentro da perspectiva processual penal.

2.2 Provas e Elementos Informativos

O art. 155 do Código Processual Penal, com o advento da nova redação dada pela lei nº 11.690/08, deixa expressa a distinção entre prova e elementos informativos. O vocábulo prova só pode ser empregado para aqueles dados objetivos utilizados no convencimento do julgador que são, em regra, endoprocessuais, e que conseguem cumprir as garantias do devido processo legal, resguardada a ampla defesa e o contraditório, mesmo que na forma diferida. O “contraditório funciona, pois, como verdadeira condição de existência e validade das provas” (LIMA, 2017, p. 584) e a produção dessas fora da fase judicial pode ser ressalvada em casos das cautelares, não repetíveis e antecipadas.

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Tais elementos também podem integrar o próprio juízo de certeza do magistrado como fundamento de sua decisão, desde que sejam complementares às provas judicializadas, e nunca isoladamente, conforme disposição expressa do próprio art. 155 do Código de Processo Penal. Nesta senda é o entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça, a ver, trecho do voto do relator, Ministro Ribeiro Dantas, em uma ação de habeas corpus (HC 330.625/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 05/04/2017), em que se alegava constrangimento ilegal decorrente da manutenção da majorante do uso de arma no delito tipificado no art. 157 do Código Penal, com o argumento de que a referida majorante foi deferida com base em provas produzidas extrajudicialmente:

A teor do art. 155 do Código de Processo Penal, não se mostra admissível, que a condenação do réu seja fundada exclusivamente em elementos de informação colhidos durante o inquérito e não submetidos ao crivo do contraditório e da ampla defesa, ressalvadas as provas cautelares e não repetíveis. Contudo, mister se faz reconhecer que tais provas, em atendimento ao princípio da livre persuasão motivada do juiz, desde que corroboradas por elementos de convicção produzidos na fase judicial, podem ser valoradas na formação do juízo condenatório. Precedentes. (HC 330.625/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 05/04/2017).1

Logo, tem-se que os elementos de informação não podem ser utilizados, isoladamente, como fundamentação para decisão penal condenatória, mas de forma supletiva, a auxiliar o juízo de convicção do decisor.

2.3 Sistema de avaliação da prova

Ao desempenhar o papel jurisdicional, especificamente no momento de eventual sentença penal condenatória, o juízo sentenciante deve, antes mesmo de recorrer às fontes do Direito para aplicar o melhor Direito, firmar sua convicção acerca dos fatos, a existência do ilícito penal e sua autoria ou participação, ou seja, entender comprovada a materialidade e autoria delitivas, respectivamente. Nesse âmbito, o juízo alcançado no julgador deve ser de certeza, já que, em regra, aplica-se no direito pátrio o princípio in dubio pro reo.

Exatamente da análise da dualidade prova/decisão prolatada é que surgem os Sistemas de Avaliação de Prova, sendo três mais relevantes, a saber: Sistema da íntima

1 HC 330.625/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe

05/04/2017. Disponível em:

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convicção, Sistema da prova tarifada e Sistema do convencimento motivado. Nesse sentido, Renato Brasileiro de Lima cita:

Quando se aborda o presente tema, tem-se em vista a relação existente entre o julgamento da causa pelo juiz natural e as provas produzidas em juízo. Busca-se investigar a vinculação (ou não) do magistrado a alguma modalidade de prova. São basicamente três sistemas acerca do assunto, a saber: 1) Sistema da íntima convicção; 2) Sistema da prova tarifada; 3) Sistema da persuasão racional do juiz (convencimento motivado). (LIMA, 2017, p. 616).

Por força de disposição constitucional, “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade” (BRASIL. Constituição, 1988, art. 93, inciso IX) sendo adotado, dessa forma, pelo ordenamento nacional, o Sistema do convencimento motivado.

Ademais, Renato Brasileiro Lima (2017) aduz que pela nova redação dada pela lei nº 11.690/2008 ao art. 155 do Código Processual Penal, também se tem a adoção do referido Sistema, agora por determinação infralegal:

Com a nova redação dada ao art. 155 do CPP pela Lei nº 11.690/2008, agora também é possível se extrair a adoção do sistema do convencimento motivado do próprio Código de Processo Penal, senão vejamos: “o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas provas cautelares, não repetíveis e antecipadas” (grifos do autor). Fica claro pelo texto da lei que o convencimento do juiz deve ser formado, em regra, a partir da prova produzida em contraditório judicial, sendo obrigatório que o magistrado fundamente sua conclusão. (LIMA, 2017, p. 617).

Observa-se que no referido Sistema não há hierarquia entre as provas produzidas judicialmente, ou seja, “concluiu-se pela impossibilidade de ‘catalogar’ valores, preestabelecendo a eficácia de cada prova a parir de uma definição” (MENDRONI, 2015, p. 10) sendo o magistrado livre na formação de seu convencimento a partir da sua própria valoração das provas coligidas aos autos, mas devendo, por sua vez, fundamentar como chegou a tal ponto conclusivo. Neste sentido, Guilherme Nucci (2015) aduz:

A livre apreciação da prova não significa uma livre convicção. A análise e a ponderação do conjunto probatório são desprendidas de freios e limites subjetivamente impostos, mas a convicção do julgador deve basear-se nas provas coletadas. Em suma, liberdade possui o juiz para examinar e atribuir valores às provas, mas está atrelado a elas no tocante à construção do seu convencimento em relação ao deslinde da causa. (NUCCI, 2015, p. 25).

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quesitos, com respostas afirmativas ou negativas, assim, valendo-se do Sistema da íntima convicção.

Observa-se, porém, que até mesmo em tal exceção, o Plenário do Júri não opera irrestritamente, baseando-se em seu puro subjetivismo, ao menos em primeiro momento. Explica-se. Em mencionado sistema o julgador não fica adstrito a nenhuma prova colecionada aos autos, podendo valer-se inclusive de elemento extraprocessual para a formação de seu convencimento e não sendo obrigado a fundamentar sua decisão. Ocorre que pode acontecer um controle externo para a aferição se a votação dos jurados foi totalmente contrária à prova dos autos, com recurso de apelação interposto pelo parquet, ou seja, a decisão do tribunal popular, mesmo que soberana, pode ser anulada, caso não guarde nenhuma identidade com as provas do auto, tendo que se proceder um novo júri. E, ainda, diz que essa exceção não é irrestrita apenas em um primeiro momento, pois “havendo dois julgamentos sucessivos com jurados distintos que tenham decidido contra a prova dos autos, referida decisão há de prevalecer” (LIMA, 2017, p. 15).

Ou seja, a única exceção ao Sistema do convencimento motivado, acontece nos casos decididos pelo tribunal do júri e, de forma irrestrita, prevalecendo inclusive decisão que contraria o acervo probatório, apenas em segundo momento, quando a decisão for irrecorrível.

2.4 Princípios referentes às provas

Observa-se que a busca pela reconstrução fidedigna dos fatos pretéritos não se pode operar de maneira irrestrita. Nessa senda, os princípios regulares das provas no processo penal norteiam o magistrado na condução do processo em compasso com garantias processuais penais, dentre os quais se destacam os seguintes, analisados abaixo.

2.4.1. Princípio da autorresponsabilidade das partes

As partes, acusação e defesa são responsáveis por provar as próprias alegações. “A frustração ou o êxito estão ligados à conduta probatória do interessado no transcorrer da instrução” (TÁVORA, 2014, p. 535). Antônio Magalhães Gomes Filho (1997) aduz que, sob esse aspecto, o direito à prova é visto como um ônus em relação à cada parte que pretende aceita sua alegação, nesse sentido, registre-se:

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atribuídos os riscos da falta de provas no julgamento da causa. (GOMES FILHO, 1997, p. 83).

Assim, o citado princípio parece ir de encontro com o princípio da busca da verdade, mas dentro de um sistema não inquisitorial, não poderia, de fato, o juiz assumir uma postura tão ativa a ponto de comprometer a sua imparcialidade.

2.4.2. Princípio da aquisição ou comunhão da prova

A prova que integra o processo não pertence a nenhuma das partes, ademais, assevera Renato Brasileiro de Lima (2017) que ela também não é exclusiva do juízo do feito, sendo invocável por qualquer uma das partes, e não somente por quem a produziu. Távora e Alencar (2014) ampliam o entendimento em relação ao referido princípio ao afirmar que seu preceito alberga não apenas a prova já produzida como aquela que teve sua realização solicitada por uma das partes. Dessa forma, afirmam que “se parte deseja desistir de prova que tenha proposto, a parte contrária deve obrigatoriamente ser ouvida” (TÁVORA; ALENCAR, 2014, p. 535).

Entretanto, o art. 401 do Código de Processo Penal é límpido em autorizar a parte a desistir de qualquer testemunha arrolada, sendo esta hipótese ressalvada apenas quando o magistrado proceder à oitiva de ofício, lançando mão da possibilidade de produzir provas de forma suplementar. Nesta senda, deve-se entender que no momento em que o julgador acolhe a produção de prova, proposta por uma das partes, a sua integralização ao processo acontece à medida que a outra parte exerce o contraditório, mesmo que diferido, manifestando-se ou, no mínimo, tendo a oportunidade para tal, já que pode quedar-se inerte e silenciar-se.

Ciente disso, destaca-se que o princípio da comunhão da prova decorreria de um raciocínio lógico, o qual a prova inserida na ação teve sua feitura a partir de um percurso pretenso a ser dialético, por uma de suas próprias condições de existência, aceitando-se aqui, o contraditório como uma dessas condições no sistema brasileiro.

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proposta, podendo o julgador dela dispor para formar sua convicção, mesmo que, eventualmente, por exemplo, venha a prejudicar o réu em uma proposta por ele.

2.4.3 Princípio da oralidade

Renato Brasileiro de Lima (2017) expressa que antes da reforma processual de 2008, a oralidade apenas era adotada nos Juizados Especiais Criminais e no Tribunal do Júri. Porém, com as inovações trazidas pela lei nº 11.719/09 e pela lei nº 11.689/08, adotou-se o princípio da oralidade no sistema processual brasileiro com a predominância pela palavra falada, incluindo agora como regra “no procedimento comum e também em ambas as fases do procedimento bifásico do Júri” (LIMA, 2017, p. 646).

2.4.4 Princípio da identidade física do juiz

A lei nº 11.690/2009 incluiu o §2º do art. 399 do Código Processual Penal, o qual dispõe in verbis: “O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença”. Dessa forma, há a expressa exigência que a sentença seja proferida por aquele juiz que teve contato imediato com a prova, salvo exceções legalmente previstas, com a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil. Ademais, “a concentração dos atos (necessários para a identidade física) impõe que a instrução seja realizada em uma única audiência ou, caso isso não seja possível, em audiências realizadas em breve espaço de tempo” (LOPES JÚNIOR, 2014, p. 577).

Sobre o referido princípio, pondera Aury Lopes Jr.:

O princípio da identidade física traz vantagens e inconvenientes. O juiz que presidiu a coleta da prova e teve contato direto com as testemunhas, peritos, vítima e o imputado tem uma visão mais ampla do caso penal submetido a julgamento. Essa é uma vantagem, mas, ao mesmo tempo, pode ser um grave inconveniente. Isso porque, esse juiz pode estar contaminado, seduzido pelos seus prejulgamentos e sem alheamento suficiente para ponderar a prova colhida e julgar com serenidade. Esse pode ser um grave problema. (LOPES JÚNIOR, 2014, p. 577/8).

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2.5 Meios de prova e Meio de investigação da prova

Os meios de prova, segundo Marcellus Polastri (LIMA, 2013, p. 388) “são os elementos que podem justificar ou esclarecer os fatos que se apuram, através dos quais se irá adquirir o conhecimento de um objeto de prova”. De acordo com o apreendido por Feitoza (2010, p. 755) “são os instrumentos aptos a serem utilizados no processo para formar a convicção da entidade decisora sobre a existência ou não de uma dada situação de fato”. Já para Renato Brasileiro de Lima (2017), meios de prova são os instrumentos hábeis a retirar das fontes de provas suas manifestações, introduzindo-as no processo para que sirvam ao convencimento do julgador acerca da existência ou não de um fato, tratando-se de uma atividade endoprocessual, desenvolvida perante o juiz, com o conhecimento e participação das partes, a qual se destina essencialmente na fixação dos dados probatórios ao processo.

Nesse sentido, cite-se Gustavo Badoró (apud LIMA, 2017):

[...] a testemunha de um fato é a fonte de prova, enquanto suas declarações em juízo são o meio de prova. O documento é uma fonte de prova, a sua incorporação ao processo é o meio de prova. O livro contábil é a fonte de prova, enquanto a perícia contábil é o meio de prova. (BADARÓ apud LIMA, 2017, p. 589).

Já os meios de investigação da prova, também chamados de meios de obtenção de prova, referem-se a certos procedimentos, em regra extraprocessuais, regulados por lei, que visam à obtenção de provas materiais. Esses procedimentos podem ser desenvolvidos por outros funcionários que não o próprio juízo que preside a instrução, a exemplo dos agentes policiais (LIMA, 2017). Ou seja, meios de investigação são diligências legais que visam obter provas a serem integradas ao processo, a exemplo da busca pessoal e domiciliar, previstas na codificação processual penal e aquelas reguladas em legislação extravagante, como a interceptações telefônicas, lei nº 9.296/96 e a infiltração de agentes, prevista tanto na lei nº 11.343/06 quanto na lei nº 12.850/13.

Sobre a distinção entre meios de prova e meios de investigação e como em dada situação este pode fazer às vezes daquele, ao servir de prova negativa, Denilson Feitoza (2010) aduz:

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Observa-se, por fim, que Código Processual Penal não fez diferenciação entre meios de prova e meios de obtenção de prova, já que inseriu a busca pessoal e domiciliar no título VII, das provas, entres os meios de prova.

2.6 Princípio da Liberdade Probatória e a Previsão Legal dos Meios de Prova

Dada a relevância das consequências práticas do Direito Processual Penal, prevalece, nos ditames brasileiros, a ampla liberdade probatória, objetivando a veracidade das afirmações para a satisfação da justiça. A sua repercussão direta em interesses situados em polos opostos, mas que se identificam pela máxima estima perante a sociedade, a segurança pública e a liberdade dos indivíduos, aquela enquanto adstrita ao Direito Penal para sua efetivação e esta como direito indisponível, dentro de uma perspectiva de direitos fundamentais de primeira geração, faz incidir o princípio da liberdade probatória (FEITOZA, 2010).

Assim, além de sua aplicação como derivação do princípio da busca da verdade, também se tem que o princípio da liberdade probatória, apesar de não constar expressamente no Código Processual Penal, aplica-se por analogia no processo penal brasileiro, a partir do artigo 369 do Código Processual Civil: “As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz”. Bem como, nos termos do artigo 295 do Código Processual Penal Militar, in verbis: “É admissível, nos têrmos dêste Código, qualquer espécie de prova, desde que não atente contra a moral, a saúde ou a segurança individual ou coletiva, ou contra a hierarquia ou a disciplina militares”.

Nesse viés, Denilson Feitoza (2010) alude que o referido princípio se traduz na mais vasta liberdade quanto: ao momento da prova, ao tema de prova e aos meios de prova. Em referência ao primeiro, tem-se, em regra, no Direito Processual Penal que a provas podem ser produzidas em qualquer momento, podendo-se, por exemplo, juntar documentos até mesmo na ocasião da audiência de instrução e julgamento. Quanto ao meio de prova, a limitação que se impõe é sobre as provas obtidas por meios ilícitos, imorais e antiéticos, como reverência à própria dignidade humana, por outro lado, ressalvadas aquelas, são aceitos em nosso ordenamento tanto os meios de prova nominados e inominados.

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Ou seja, para a prova ser considerada nominada deve existir a previsão nomen juris do meio de prova, contida no Código Processual Penal, ou até mesmo em legislação extravagante (LIMA, 2017). Já os meios de provas inominados, como visto, também aceitos em nosso sistema, são aqueles não previstos em lei, mas não vetados. Nesse sentido, Renato Brasileiro de Lima (2017) expõe:

[…] como desdobramento do princípio da busca da verdade, além dos meios de prova especificados na lei (nominados), também se admite a utilização de todos aqueles meios de provas que, embora não previstos no ordenamento jurídico (inominados), sejam lícitos e moralmente legítimo. (LIMA, 2017, p. 601).

Ademais, sobre o tema, entende Tourinho Filho (2013) que o princípio da não taxatividade dos meios de prova no sistema processual penal pátrio deve ser extraído do próprio Código Penal, quando o parágrafo único do art. 155 aponta para uma exceção, indica que a regra é a liberdade dos meios de prova:

E a prova maior da não taxatividade dos meios de prova no sistema do nosso CPP pode ser aferida pela própria redação do parágrafo único do art. 155: ‘somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil’. Em princípio há, pois, uma liberdade na procura da verdade real, quer na fase de investigação policial, como se infere dos incisos IV, V, VI, VII, VIII, IX do art. 6º do CPP, com especial ênfase para o inc. III, onde se fala de ‘todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias’, quer na fase instrutória, como se dessume pela redação do parágrafo único do art. 155 do mesmo estatuto, com a redação dada pela Lei n. 11.690/2008.

Assim, não há em tese, nenhuma restrição aos meios de prova, com ressalva, apenas e tão somente, daquelas que repugnam a moralidade ou atentam contra a dignidade da pessoa humana. (TOURINHO FILHO, 2013, p. 567)

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Registre-se, ainda, que se optou aqui pela utilização da posição ampliativa na conceituação de prova atípica, segundo a qual entende-se por prova atípica aquela que se enquadra em duas situações: uma quando ela estiver prevista no ordenamento jurídico, mas não sendo legislado o seu procedimento, outra quando não ocorre nem o nomen juri nem a regulamentação do procedimento. Diferentemente da posição restritiva, a qual a atipicidade da prova estaria relacionada com a noção de ausência de previsão legal da fonte de prova a qual se pretende usar na ação penal, confundindo-se, desta forma, seu próprio conceito com o da prova inominada.

Por fim, quanto ao tema da prova, tem-se em regra que qualquer fato relevante à uma decisão ou julgamento pode ser objeto de prova (FEITOZA, 2010). Porém, observa-se, novamente pela inteligência do art. 155, parágrafo único, do Código Processual Penal, que apesar do princípio da liberdade probatória, impõe-se a limitação estabelecida pela lei civil aos meios de prova quando o objeto é estado das pessoas, nesta toada, esclarece Guilherme Nucci (2015):

Em processo penal, são admitidas todas as provas obtidas por meio lícito, devendo-se, entretanto, respeitar a restrição estabelecida quanto ao estado das pessoas (casamento, menoridade, filiação, cidadania, entre outros). Nesta hipótese, deve-se acatar o disposto na lei civil. Exemplo disso é a prova do estado de casado, que somente se faz pela apresentação da certidão do registro civil, de nada valendo outro meio probatório.

Outras eventuais restrições fixadas na lei civil não valem no processo penal. […] não dizendo respeito ao estado das pessoas, pode a parte pretender ouvir testemunhas, ainda que seja para contrariar algo constante em qualquer documento ou mesmo para confirmar ou afastar a credibilidade da confissão, cujo valor é relativo na esfera criminal. Lembremos que o juiz formará a sua convicção pela livre apreciação das provas (Grifos do autor). (NUCCI, 2015, p. 32).

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2.7 Prova anômala e prova irritual

Verificando-se a conformidade da finalidade do meio de prova com sua previsão legal, a doutrina cita duas classificações, a prova anômala e a prova irritual. Quanto à primeira, dissertam Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar (2014),

A prova anômala trata-se de desvio de finalidade da prova consistente no uso de meio de prova previsto no ordenamento jurídico, em substituição a outro meio também previsto no sistema e que seria mais apropriado para o fim almejado. (TÁVORA; ALENCAR, 2014, p. 503/4).

Neste sentido, exemplifica Renato Brasileiro de Lima (2017) ao citar o caso em que o juiz para proceder à oitiva de testemunha que reside em comarca alheia, determina que o oficial de justiça entre em contato, por telefone, para que colha suas declarações acerca dos fatos, empós, certificando a diligência nos autos, relatando as palavras da inquirida. Ou seja, o juiz, a fim de colher o depoimento de uma testemunha residente em sede diversa de sua competência, substitui o meio de prova cabível para a hipótese, carta precatória, e realiza um verdadeiro “malabarismo procedimental”.

Já a prova irritual trata de prova típica, ou seja, com procedimento previsto em lei, sendo este inobservado. Servindo de ilustração o caso julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, nos autos de ação de habeas corpus, de nº 148.215/RJ, em que a declaração da vítima foi oferecida por escrito em audiência, na presença do magistrado, advogado de defesa e acusação, mas de encontro ao disposto no art. 204 do Código Processual Penal (LIMA, 2017).

2.8. Provas em espécie

O Código de Processo Penal brasileiro, de forma não taxativa, traz em seu corpo normativo meios de prova típicos, sendo eles: exames periciais, em geral, arts. 158 a 184, a prova testemunhal, a confissão, arts. 197 a 200, declarações do ofendido, art. 201 arts. 202 a 225, a prova documental, o reconhecimento de pessoas e coisas, arts. 226 a 228, arts. 231 a 238 e indícios, art. 239.

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Já Supremo Tribunal Federal manifestou-se no RTJ 73/760 no sentido de ser o interrogatório um meio de defesa, entendo ser tal momento a oportunidade de o acusado exercer sua autodefesa, narrando a sua versão dos fatos, ou mesmo, fazer uso do seu direito constitucional de permanecer em silêncio.

Dentre os meios de provas citados, o presente trabalho abordará especificamente a prova testemunhal e documental.

2.8.1 Prova testemunhal

2.8.1.1 Conceito

Segundo Guilherme Nucci (2015, p. 211): “testemunha é a pessoa que toma conhecimento de um fato juridicamente relevante, sendo apta a confirmar a veracidade do ocorrido, sob o compromisso de ser imparcial e dizer a verdade”. Já de acordo com a definição de Renato Brasileiro de Lima:

Testemunha é a pessoa desinteressada e capaz de depor que, perante a autoridade judiciária, declara o que sabe acerca de fatos percebidos pelos seus sentidos que interessam à decisão da causa. A prova testemunhal tem como objetivo trazer ao processo dados de conhecimento que derivam da percepção sensorial daquele que é chamado a depor no processo. (LIMA, 2017, p. 694)

Assim, a pessoa que prestará depoimento, em juízo, deve testemunhar sobre fato do passado, deste modo, tratando do thema probandum e transmitindo suas percepções sensoriais, externas e pretéritas ao processo (FEITOZA, 2010).

2.8.1.2 Características

Parte da doutrina enumera cinco características da prova testemunhal, sendo elas: judicialidade, oralidade, objetividade, individualidade e retrospectividade.

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b) oralidade: conforme dispõe o art. 205 e art. 205, parágrafo único, ambos do Código Processual Penal, o depoimento será prestado oralmente, não sendo permitido à testemunha trazê-lo por escrito, sendo, entretanto, permitido a ela realizar consulta, de forma ágil, a apontamentos no momento de sua oitiva. Porém, mesmo sendo a oralidade característica da prova testemunhal, existem exceções, conforme aponta Renato Brasileiro:

Apesar de a regra ser a oralidade, o próprio CPP prevê algumas exceções: 1) De acordo com o art. 221, § 1º, do CPP, certas autoridades poderão optar pela prestação de depoimento por escrito: nesse caso, para que seja preservado o contraditório e a ampla defesa, as perguntas, formuladas pela parte e deferidas pelo juiz, lhes serão transmitidas por ofício; 2) Em se tratando de depoente mudo, surdo, ou surdo-mudo, sua oitiva será realizada da seguinte forma (CPP, art. 223, parágrafo único, c/c art. 192): ao surdo serão apresentadas por escrito as perguntas, que ele responderá oralmente; ao mudo as perguntas serão feitas oralmente, respondendo por escrito; ao surdo-mudo as perguntas serão formuladas por escrito e do mesmo modo dará as respostas. Nesses casos, se o depoente não souber ler ou escrever, intervirá no ato, como intérprete e sob compromisso, pessoa habilitada a entendê-lo. (LIMA, 2017, p. 694/5).

Assim, prioriza-se o depoimento oral, como regra, embora haja situações que o permita por escrito, faculdade conferida a algumas autoridades, e por sua impossibilidade, no caso da testemunha ser portador de deficiência que interfira, como mudos, surdos ou surdos-mudos.

c) objetividade: o art. 213 do Código de Processo Penal dispõe, in verbis, “O juiz não permitirá que a testemunha manifeste a suas apreciações pessoais, salvo quando inseparáveis da narrativa do fato”, assim sendo, a testemunha deve se limitar a narrar fatos, excluindo de seu depoimento subjetivismo, salvo, quando este tiver atrelado ao próprio contexto fático. Assim, “por exemplo, em um crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor, quando a testemunha relata a suposta velocidade em que se encontrava o veículo dirigido pelo acusado” (LIMA, 2017, p. 695).

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magistrado possa dar o devido valor ao aquilatar o depoimento” (TÁVORA; ALENCAR, 2014, p. 576).

e) retrospectividade: a testemunha narra o que sabe, sendo esse conhecimento obtido por percepções pretéritas, pois cuida de acontecimentos igualmente passados. Caso abordasse o futuro, atuaria em campo meramente especulativo (ibidem, 2014, p. 576).

2.8.1.3 Compromisso da verdade, isenção e proibição de depor

Dispõe a primeira parte do art. 203 do Código Processual Penal: “A testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado”, desta forma refere-se o código ao ato de prestar compromisso, imposto à testemunha. Nesse sentido, Guilherme Nucci considera, inclusive, o juramento feito pela testemunha como o cerne que a diferencia de um declarante, senão vejamos:

Trata-se de compromisso de dizer a verdade ou do juramento. É exatamente a fórmula encontrada pela lei para estabelecer a diferença entre a testemunha (pessoa obrigada a narrar a verdade, sob pena de responder pelo crime de falso testemunho) e outros declarantes, que podem prestar informações ao juiz, embora sem o dever de narrar fielmente a verdade (Grifos do autor). (NUCCI, 2015, p. 213).

Mister registrar que Denilson Feitoza (2010) expõe que o referido artigo detém natureza meramente processual, sendo seu valor jurídico de exortação, decorrendo, em realidade, a obrigação da testemunha com a verdade do tipo penal de falso testemunho, art. 342, do Código Penal. Observa-se, desta forma, que mesmo que o magistrado se olvide de compromissar a testemunha, tal fato “constitui mera irregularidade e não elimina o dever de narrar a verdade, pois este dever é advém de lei” (NUCCI, 2015, p. 213).

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Segundo Renato Brasileiro de Lima (2017, p. 694/5): “o dispositivo em questão (CPP, art. 206) tem como objetivo precípuo preservar a harmonia familiar, evitando que pessoas ligadas por laço de parentesco ou conjugais sejam obrigadas a depor em detrimento de seus entes próximos”. Assim, estão em regra isentas de depor mencionadas pessoas, somente o fazendo em duas situações: a primeira, por vontade própria e a segunda hipótese “consistente na impossibilidade de se obter ou de se integrar a prova do fato (imputação principal) e de suas circunstâncias (tipo derivado, além de agravantes e atenuantes) de outro modo, senão ouvindo tais pessoas” (NUCCI, 2015, p. 215/6).

Nesses casos as pessoas serão ouvidas na condição de declarantes ou informantes, vez que não prestam compromisso legal, não sendo, porém, unânime entre os doutrinadores a possibilidade ou não dessas mesmas pessoas serem responsabilizadas por crime de falso testemunho.

Abordando justamente a diferença entre testemunhas e declarantes, Guilherme Nucci (2015) aduz que “somente aquelas devem responder por falso testemunho”, racionalizando que o Código Penal deixa claro como agente ativo do tipo especificamente a figura testemunha, não podendo, desta forma, ser nele enquadrado o informante ou a vítima. Denilson Feitoza (2010) aduz, ainda, que tal isenção de prestar compromisso legal não seria o equivalente a permissão para que o declarante minta de forma deliberada e impunemente, pois, de fato, pode silenciar-se quando indagado se tem notícia de o réu ter cometido alguma infração penal, mas caso atribuísse a outrem o fato criminoso versado na ação penal, sabendo não ser verdade, “dando causa à instauração de inquérito policial ou processo judicial contra este, poderá responder por denunciação caluniosa (art. 339, CP)”.

Ainda sobre o tema, também não são obrigados a prestar juramento, consoante o art. 208, do Código de Processo Penal, os menores de 14 (quatorze) anos e pessoas com deficiência, por estes não possuírem o discernimento exigido para a validade do compromisso e aqueles pela possibilidade de fantasiar o que viram e saber (NUCCI, 2015).

Por sua vez, o já mencionado autor, Denilson Feitoza (2010), entende que parte do art. 208 do Código Processual Penal foi revogado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, no que tange o artigo aos menores de 14 anos, senão vejamos:

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devido processo socioeducativo, a uma medida socioeducativa e/ou medida específica de proteção, aplicada por juiz da infância e da juventude, enquanto uma criança poderá estar sujeita a uma pedida específica de proteção, aplicada por conselho tutelar ou, se não houver este, por juiz da infância e juventude. (FEITOZA, 2010, p. 785/6).

Por fim, observa-se, que os familiares da vítima, diferentemente do que ocorre com os do acusado, não é dada a faculdade de não depor e devem sempre prestar compromisso legal, entretanto, “deve ter o magistrado especial cuidado na valoração de tais depoimentos, em razão do envolvimento emocional que é peculiar em tais situações” (TÁVORA; ALENCAR, 2014, p. 578).

Já o art. 207 do Código Processual Penal cuida das pessoas impedidas de testemunhar, aquelas que mesmo que desejem depor estão impossibilitadas por vedação legal, ressalvada quando desobrigadas pela parte interessada. “Exemplificando, são as situações dos médicos, advogados, sacerdotes, psicólogos, dentre outros” (NUCCI, 2015, p. 216).

Note-se, ainda, que ainda que se desobrigadas pela parte interessada, só irão depor caso desejem, assim figurando como testemunha, situação a qual devem prestar compromisso legal. Observando-se, também, que se múltiplas pessoas forem interessadas, ou seja, relacionadas com o depoimento do impedido, faz-se necessária a autorização de todas (LIMA, 2017).

2.8.1.4 O perecimento da memória e a prova testemunhal antecipada

Provas antecipadas são aquelas produzidas perante o juízo competente, com contraditório real, mas “em momento processual distinto daquele legalmente previsto, ou até mesmo antes do início do processo, em virtude de situação de urgência e relevância. Tais provas podem ser produzidas na fase investigatório e em juízo, sendo indispensável prévia autorização judicial” (LIMA, 2017, p. 586).

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Indispensável ainda ao tema a leitura da súmula nº 455, do Superior Tribunal de Justiça, in verbis: “A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no artigo 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo”. Logo, pelo exposto, não pode a parte solicitar a oitiva antecipada de uma testemunha sob a alegação única da demora na formação da culpa.

2.8.2 Prova documental

2.8.2.1 Conceito

Segundo Guilherme Nucci (2015, p. 251): “documento é toda base materialmente disposta a concentrar e expressar um pensamento, uma ideia ou qualquer manifestação de vontade do ser humano, que sirva para expressar e provar um fato ou acontecimento juridicamente relevante”. Referem Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar (2014) que o conceito de documentos pode ser visto sob dois pontos de vista, um restritivo e outro amplo, nesse sentido:

Na concepção restritiva dada pelo caput do art. 232 do CPP, consideram-se

‘documentos quaisquer escritos, instrumentos ou papéis, públicos ou particulares’ (grifos do autor). Para o CPP, remontando a década de 40, seriam documentos os escritos em papel (matéria prima, o material que contém escritos).

Já os instrumentos seriam os documentos confeccionados com o intuito de fazer prova (documentos pré-constituídos), como os contratos, que se distinguem dos documentos eventuais ou acidentais (meros papeis), pois estes não foram feitos com o intuito de provar, mas podem ser utilizados com esse objetivo, como uma carta ou um bilhete. Já na concepção ampla, que é a atual, em face da interpretação progressiva da lei, considera-se documento qualquer objeto representativo de um fato ou ato relevante, e ai poderíamos incluir, v.g., fotos, desenhos, esquemas, planilhas, e-mails, figuras digitalizadas. (TÁVORA; ALENCAR, 2014, p. 595).

Assim, por interpretação progressiva, é considerado documento qualquer objeto representativo de um fato ou de um ato que tenha importância ao processo, desta forma, o conceito não se limita à interpretação literal do art. 232, caput, do Código Processual Penal.

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2.8.2.2 Produção

Os documentos, em regra, podem ser apresentados em qualquer fase do processo, de acordo com o art. 231 do CPP, sendo sua produção espontânea ou provocada. Nesta, a produção é determinada pelo magistrado, nos termos do art. 234 do CPP, sendo por mera requisição ou até mesmo valendo-se de mandado de busca e apreensão; enquanto naquela as próprias partes apresentam os documentos (TÁVORA; ALENCAR, 2014).

Devem, porém, em observação ao princípio do contraditório, art. 5º, LV, CF/88, as partes serem cientificadas de todo documento produzido no processo. Nesta esteira, aplica-se o disposto no art. 379 do CPPM, o qual prevê que, quando uma parte apresentar uma prova, no curso do processo, a outra será ouvida a seu respeito, ou sendo a prova provocada, serão ouvidas ambas as partes, incluindo-se também, por requerimento, o assistente de acusação e o curador (FEITOZA, 2010).

Observa-se, ainda, as restrições impostas aos documentos obtidos por meio ilícito, nos moldes do art. 5º, LVI, CF/88, como acontece com as demais provas. Neste sentido, Denilson Feitoza aduz: “Assim, as cartas particulares ou correspondência de qualquer natureza, interceptadas ou obtidas por meio criminoso, não serão admitidas em juízo (art. 233 do CPP e art. 375, 1ª parte, do CPPM), devendo ser desentranhadas dos autos” (FEITOZA, 2010, p. 800). Bem como as restrições que versam do procedimento do Tribunal do Júri, nos termos do art. 479 do Código Processual Penal, advinda da redação dada pela lei nº 11.689/08, nas palavras de Renato Brasileiro de Lima:

[…] dispõem o art. 479 do CPP, com redação dada pela Lei nº 11.689/08, que não será permitida a leitura de documento ou exibição de objeto durante o julgamento de que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de 3 (três) dias úteis, dando-se ciência à outra parte. Compreende-se na proibição deste artigo a leitura de jornais ou qualquer outro escrito, bem como a exibição de vídeos, gravações, fotografias, laudos, quadros, croqui, ou qualquer outro meio assemelhado, cujo conteúdo versar sobre a matéria de fato submetida à apreciação e julgamento dos jurados. (Grifos do autor). (LIMA, 2017, p. 722).

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3

UNIÃO ESTÁVEL COMO ENTIDADE FAMILIAR E SEUS REFLEXOS

NO ESTADO DAS PESSOAS

O princípio da busca da verdade autoriza, no Direito Penal, a ampla liberdade dos meios probatórios. Entretanto, essa liberdade não opera de forma irrestrita, pois, dentre suas limitações, o tema da prova, por exemplo, quando versa sobre o estado das pessoas, deve seguir as restrições da lei civil, nos termos do art. 155, parágrafo único, do Código Processual Penal. A união notória entre duas pessoas, de forma estável e contínua, com a intenção de constituir família é critério determinante e suficiente para que surja uma união estável. Hoje, além de uma relação amorosa, ou como entendida outrora, uma sociedade de fato, a união estável surge, albergada pelo Direito, enquanto entidade familiar.

A família, assim, antes formada apenas pelo matrimônio, também se constitui a partir da união estável. E, como consequência prática dessa nova realidade, o novo vínculo familiar tem o condão de repercutir justamente no estado das pessoas, em especial no que concerne ao status familiar, mostrando-se imensamente relevante. Nesse diapasão, cumpre analisar o instituto, desde uma breve reflexão acerca de sua evolução, como também expor conceitos relevantes que rodeiam o instituto, seus requisitos constitutivos e reflexos no estado das pessoas.

3.1 Breve introdução da união estável no ordenamento jurídico brasileiro

O Direito intenta sempre por regulamentar os fatos sociais, acompanhando-os conforme as mudanças ocorrem na sociedade, seja pelo advento de novas tecnologias ou, simplesmente, por mudanças comportamentais da própria coletividade. Nota-se, entretanto, que acerca da união estável, tal lógica não foi seguida à risca, pois, como aborda Maria Berenice Dias (2013), foi perceptível uma rejeição social e repúdio do legislador no tocante à existência de vínculos afetivos fora do casamento, o que não teve o condão de embargar o fato em si, mas retardou o seu regulamento.

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nenhuma tentativa de repelir o instituto, mas sim mera abstenção sobre o tema, além de um caráter protetivo em relação ao patrimônio familiar, a ver:

No Brasil, como em todos os países do mundo, o concubinato nunca foi tipificado como crime. Nossos textos legais não o regulavam, mas também não o proibiam. É o que se pode constatar desde as organizações Filipinas. Mesmo as proibições de doações feitas à concubina, disposta no Código Civil de 1916, sendo a maioria dos doutrinadores e a jurisprudência, não se constituiu propriamente uma ‘repulsa ao concubinato, mas, sim, uma defesa do patrimônio da família’. Mesmo que essa afirmação possa em alguns aspectos parecer contraditória, denota, de qualquer forma, uma não proibição, não interdição do Estado a esse tipo de relação. (PEREIRA, 2012, p. 35/6)

Neste vagaroso processo de regulamentação, Flávio Tartuce e José Fernando Simão (2012) apontam no Direito brasileiro o Decreto-Lei no 7.036/1944 como a primeira norma a

tratar do assunto, reconhecendo a companheira como beneficiária da indenização em caso de acidente de trabalho, a qual teria vitimado seu companheiro. Também indicam os supracitados autores que a jurisprudência já nos anos 1960 começou a reconhecer direitos aos companheiros, ainda que sob a denominação de concubinato. À época, o próprio Supremo Tribunal Federal que fincou o esteio para a evolução da construção jurisprudencial e doutrinária, por meio das Súmulas 380 e 382, de um “direito concubinário” (PEREIRA, 2012).

Nessa senda, foi com promulgação Constituição Federal de 1988 que a união estável foi reconhecida com entidade familiar, consolidando o termo no direito pátrio e equiparando a proteção estatal reservada à família da mesma sorte que a constituída pelo matrimônio, nos termos do art. 226, §3º: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento”. Muito embora já conquistado o status de entidade familiar, a redação constitucional não permitia aplicabilidade de forma contundente, assim, “exatamente para dar efetividade ao dispositivo constitucional, entrou em vigor a lei no 8.971/1994”, importante

marco, já que foi a primeira legislação a trazer os requisitos para que se constituísse o instituto (TARTUCE; SIMÃO, 2012).

Empós, a lei no 7279/1996 trouxe novos critérios para que fosse reconhecida a união

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Hoje, essas duas leis foram ab-rogadas pelo atual Código Civil, que tratou, de forma quase completa, das matérias nelas reguladas, permanecendo em vigor apenas o art. 7º, parágrafo único e art. 9º, ambos da lei no 9278/96 (MONTEIRO; SILVA, 2016). Cumpre

ressaltar que consta na nova codificação título próprio ao instituto, no livro IV, dedicado ao Direito de Família.

3.2 Conceito e requisitos da união estável

O art. 1.723 do Código Civil de 2002 dispõe, in verbis: “é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradora e estabelecida com o objetivo de constituição de família”, observando-se, por logo, que o Código Civil imprimiu o mesmo conceito de união estável constante na lei no

7279/1996. Segundo Arnaldo Rizzardo (2014, p. 829): “é uma união sem maiores solenidades ou oficialização pelo Estado, não se submetendo a um compromisso ritual e nem se registrando em órgão próprio”. Já Rodrigo da Cunha Pereira (2016, p. 51) diz: “em síntese, união estável é a relação afetiva-amorosa, não incestuosa, entre duas pessoas, com estabilidade e durabilidade, vivendo sob o mesmo teto ou não, constituindo família sem o vínculo de casamento civil”.

Já no que concerne aos requisitos para que se configure a união estável, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2017), após entenderem “firmado o caráter relativo do requisito ‘dualidade de sexo’”, o qual será tratado em tópico próprio, enumeram sete elementos, dividindo-os em dois grupos: elementos caracterizadores essenciais e elementos caracterizadores acidentais. Dentre os elementos ditos por essenciais, explicam os autores, estes derivam da sintetização do próprio art. 1.723 do Código Civil de 2002 e consistem em publicidade, estabilidade, continuidade e objetivo de constituir família, a seguir detalhados.

a) Publicidade: exige que a união não deve ser mantida em sigilo, reclusa, mas em sentido contrário, que seja reconhecida perante a sociedade, ou parte dela. Sobre o tema, Maria Berenice Dias (2013) aduz acerca da abrangência da publicidade a qual a lei se refere:

A publicidade denota a notoriedade da relação no meio social frequentado pelos companheiros, objetivando afastar da definição de entidade familiar as relações menos compromissadas, nas quais os envolvidos não assumem perante a sociedade a condição de ‘como casados fosse’ (grifos da autora). (DIAS, 2013, p. 180).

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relacionamento, em posse de casado, ser de conhecimento ao menos entre o meio social atinente ao casal, amigos e familiares. Motivo esse pelo qual a doutrina diz que a lei não exige a publicidade, em si, mas a notoriedade do relacionamento, a qual é mais reservada.

b) Estabilidade: A lei não visa estatuir como entidade familiar um relacionamento que se propõe fugaz e transitório, mas, em sentido oposto, protege aquelas uniões que se revelam como norteadas pelos elementos dirigentes do casamento, tendo como uma de suas características basilares a estabilidade (VENOSA, 2017). Segundo Carlos Roberto Gonçalves (2017), esta característica deve ser depreendida da própria nomenclatura do instituto, a ver:

A denominação “união estável” já indica que o relacionamento dos companheiros deve ser duradouro, estendendo-se no tempo. Não obstante, tal requisito foi enfatizado no art. 1.723 do Código Civil, ao exigir que a convivência seja pública, contínua e “duradora”. (GONÇALVES, 2017, p. 620).

Desta forma, tem-se que “o decurso por um período mais ou menos longo é o retrato dessa estabilidade na relação do casal” (VENOSA, 2017, p. 44).

c) Continuidade: “a união estável não se coaduna com a eventualidade, pressupondo a convivência continua sendo justamente por isso, equiparada ao casamento em termos de reconhecimento jurídico” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 432). Ou seja, exige-se, em regra, que o relacionamento ocorra ininterruptamente, tratando-exige-se, inclusive, de um complemento da estabilidade.

d) Objetivo de constituir família: “o principal e inafastável elemento para o reconhecimento da união estável, sem sombra de dúvidas, é o elemento teológico ou finalístico: o objetivo de constituição de família” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 434). Sobre a essencialidade deste requisito, de cunho subjetivo, e como ele cumpre o diferencial em relação à união estável e ao mero relacionamento amoroso, cita-se Flávio Tartuce e José Fernando Simão (2012):

A constituição de família é que diferencia cabalmente o namoro da união estável. Se há um projeto futuro de constituição de família, estamos diante de namoro. Se há uma família já constituída, com ou sem filhos, estamos diante da união estável. (TARTUCE; SIMÃO, 2012, p. 265)

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Ademais, cumpre anotar os três elementos remanescentes: tempo de convivência, a existência de prole e a exigência de coabitação são considerados caracterizadores acidentais justamente por diferirem dos supracitados por serem prescindíveis, todavia, quando presentes, “facilitam a sua demonstração judicial, reforçando imensamente a tese da sua existência” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 437).

Sobre o tema, o art. 1º da lei no 8.971 de 1994 dispunha, in verbis, “A companheira

comprovada de um homem solteiro, separado judicialmente, divorciado, viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos ou dele tenha prole, poderá valer-se do disposto na lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968, enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade”. Assim, à época, optou-se por um lapso temporal fixo para que se constituísse a união estável.

Tal critério, o qual era decisivo, é criticável, vez que o prazo inflexível de cinco anos gerava situações de injustiça. Por exemplo, poderia uma união não ser considerada estável por tido como insatisfeito o tempo exigido, mas pela contagem do termo inicial ter ocorrido de forma errônea, por ser esse marco de difícil precisão, ou imagine-se um caso em que o casal vivia com todos elementos constitutivos da união estável e um deles é vítima fatal em um acidente automobilístico, ou ainda o “casal que não teve a união estável reconhecida por terem desfeito o vínculo dias antes de atingirem o limite mínimo de tempo” (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 440). Enfim, os exemplos são diversos.

Atualmente, pelo Código Cível de 2002 e desde a vigência da lei no 9.278/96, não

há mais em se falar em requisito temporal, tampouco em prole em comum, como expõe Rodrigo Cunha Perreira (2016), a ver:

Embora a jurisprudência após a CF/88 começasse a apontar uma outra direção em matéria de tempo para a caracterização da união estável, a Lei n. 8.971, de 29 de dezembro de 1994, definiu esse prazo em cinco anos, e, havendo prole, era menor. Na verdade, o que interessa sobre o tempo in casu é que ele caracterize a estabilidade da relação. Isso pode se definir com menos de dois anos, por exemplo, ou mesmo não acontecer com mais dez anos de relacionamento. Foi nesse sentido que a Lei n. 9.278, de 13 de maio de 1996, veio estabelecer que não há prazo rígido para a caracterização da união estável. Revogando, portanto, o prazo de cinco anos estabelecido na lei anterior. Mesmo com essa revogação, o costume, já consagrado, servirá como referencial à caracterização dessas uniões, ou seja, o prazo de mais ou menos cinco anos será sempre um referencial, ainda que subjetivo, para a busca do delineamento objetivo de tais uniões. Mas tal prazo, como se disse, é apenas uma referência, e não poderá ser jamais elemento determinante. É em adição a outros elementos, como affectio societatis, estabilidade, projetos de vida em comum, relação de dependência econômica, e a elementos que cada caso apresenta, que se caracterizará união estável, a entidade familiar. […]. (PEREIRA, 2016, p. 57/8)

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comum sob o mesmo teto, ‘more uxoria’, não é indispensável à caracterização do concubinato”, fato é, que não há na codificação atual “a referência ao dever de convivência sob o mesmo teto, que é dispensável” (TARTUCE, 2017, p. 363). Até porque, por mais que esta seja de grande relevância para o relacionamento casal, pode acontecer diversas situações práticas que impeçam a habitação comum, ao exemplo de transferências de um dos companheiros por motivo de trabalho, missões diplomáticas ou militares, entre outras, como também não descartada possibilidade da própria autonomia da vontade do casal ou “como fórmula para a durabilidade das relações” (PEREIRA, 2016, p. 53).

Cumpre destacar, por tudo dito, que os requisitos são separados aqui como meio de empreender maior didática, mas, na análise do caso concreto, deverão ser observados concomitantemente, na medida que esses elementos se apresentam, para a união estável, intimamente interligados.

3.3 Impedimentos para a união estável

De acordo com Rizzardo (2014), é inconcebível a imposição de diversas exigências para o casamento e eximir estas àqueles os quais pretendem constituir união estável, considerando legal uma união de fato que para o casamento incorreria em situação espúria, incestuosa ou adulterina. De tal sorte, o §1º do art. 1.723, do Código, remetendo às causas de impedimentos do casamento, art. 1.521, também do Código Civil, também vedou a constituição da união estável nas mesmas hipóteses, as quais:

I - os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil; II - os afins em linha reta;

III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;

IV - os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive;

V - o adotado com o filho do adotante; VI - as pessoas casadas;

VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte.

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4. “A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que a existência de casamento válido não obsta o reconhecimento da união estável, quando há separação de fato ou judicial entre os casados”. (AgRg nos EDcl no AgRg no AREsp 710.780/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 25/11/2015.) 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 64.546/RJ, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 15/12/2015, DJe 18/12/2015).

Também não obsta a união estável as causas suspensivas para o casamento, consoante §2º do art. 1.723 do Código Civil, com razão, pois conforme esclarece Maria Berenice Dias (2013, p. 185) sobre estas, citando Euclides de Oliveira: “São causas meramente penalizadoras na esfera patrimonial dos contraentes, sem invalidar o ato matrimonial”.

3.4 Concubinato e união estável

Durante longo período, foram empregadas como equivalentes as expressões concubinato e união estável, de forma que a concubina seria a companheira. Confusão esta que não mais assiste razão, por certo, desde a Constituição Federal de 1988 (TARTUCE; SIMÃO, 2012). De fato, qualquer relação afetiva fora das balizas legais do matrimônio eram pretensamente excluídas da proteção estatal e identificadas como concubinato, pouco importando se ela decorresse da pura escolha dos casais ou houvesse, efetivamente, algum impedimento para o casamento. Nessa perspectiva, assenta Paulo Nader (2016, p. 555): “Malgrado a falta de proteção da lei, era natural que as uniões extramatrimoniais se verificassem. Alguns fatores contribuíam para tanto. A indissolubilidade do vínculo do casamento era uma casa de formação de relações concubinária”.

Hoje, o casamento pode ser extinto, e a união estável é reconhecida como entidade familiar pela Constituição, desde que cumpra todos os requisitos para tanto. Já sobre a expressão concubinato tornou-se mais delimitada, nesse sentido, aduz Carlos Roberto Gonçalves (2017):

Concubinato é hoje utilizada para designar o relacionamento amoroso envolvendo pessoas casadas, que infringem o dever de fidelidade, também conhecido como adulterino. Configura-se, segundo o novo Código Civil, quando ocorrem “relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar” (CC, art. 1727). (GONÇALVES, 2017, p. 605).

Referências

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