• Nenhum resultado encontrado

VIOLÊNCIA DE GÊNERO E A LEI MARIA DA PENHA NA CIDADE DE MACAÉ

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "VIOLÊNCIA DE GÊNERO E A LEI MARIA DA PENHA NA CIDADE DE MACAÉ"

Copied!
82
0
0

Texto

(1)

DEPARTAMENTO INTERDISCIPLINAR DE RIO DAS OSTRAS CURSO DE GRADUAÇÃO DE SERVIÇO SOCIAL

RAQUEL GOMES DEVEZA

VIOLÊNCIA DE GÊNERO E A LEI MARIA DA PENHA NA CIDADE DE MACAÉ

Rio das Ostras 2016

(2)

VIOLÊNCIA DE GÊNERO E A LEI MARIA DA PENHA NA CIDADE DE MACAÉ

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Graduação de Serviço Social, como requisito parcial para conclusão do curso.

Orientador:

Prof. Dr. Bruno Ferreira Teixeira.

Rio das Ostras 2016

(3)

VIOLÊNCIA DE GÊNERO E A LEI MARIA DA PENHA NA CIDADE DE MACAÉ

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Graduação em Serviço Social, como requisito parcial para conclusão do curso.

Aprovada em _____ de _________________ de 20_____.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________________________ Prof. Dr. Bruno Ferreira Teixeira (Orientador)

____________________________________________________ A.S. Ana Cristina de Matos Pereira (1ª Examinadora)

____________________________________________________ Prof. Ms. Gabrielle Gomes Ferreira (2ª Examinadora)

Rio das Ostras 2016

(4)

(5)

Desejo agradecer em primeiro lugar a UMBANDA, a cultura afrodescendente que me ensinou a lutar pelos meus objetivos. Agradeço ao meu Pai Oxalá, aos Orixás e aos guias espirituais que fizeram com que eu acreditasse em mim mesma quando ninguém mais acreditava. Pois não era tarde para recomeçar e ainda havia tempo para caminhar na estrada da vida.

À minha mãe, Enilde, mulher guerreira, que sempre lutou diante das adversidades impostas pela vida.

Dedico ao meu pai, Nêro Corrêa Gomes, que por vontade suprema não teve a oportunidade de conviver conosco, porém tenho a certeza que ficou imensamente contente ao ver o caminho que sua filha trilhou.

À minha família que sempre esteve ao meu lado, buscando alternativas para que eu pudesse trilhar o caminho do conhecimento. Principalmente ao meu marido Paulo Cezar, em entender a minha ausência durante a minha formação. À minha filha, Thamiris Gomes Deveza, que sempre foi minha “inspiração” em ser uma vencedora na vida. E ao meu filho Diego Gomes Deveza, que me tornou mais forte do que eu pensava ser.

À Universidade Federal Fluminense, que trouxe desafios a serem superados, devido estar incluída nesta totalidade. Agradeço aos professores que possuem o dom na transmissão de seus conhecimentos, que buscam e acreditam, para além, que é possível construir um profissional comprometido com sua formação, transpondo os limites da precariedade institucional.

Agradeço à parceria da minha amiga Vera Lúcia Soares, pois sempre esteve ao meu lado, principalmente nos momentos mais difíceis.

Agradeço sim, ao estágio institucional, o encontro da teoria com a prática, uma parceria fundamental que conduz embasando o meu agir profissional. Tive o imenso prazer de conviver com diversos profissionais, além de entender a ação mediadora que exerce o Assistente Social. E digo mais, que o campo institucional é rico de possibilidades e que nós possamos entender os “atores sociais” que tanto escutamos em sala de aula, de acordo com essa tal singularidade, mas que também é dotada de uma totalidade.

À minha Supervisora de Campo, Ana Cristina de Matos Pereira, que não mediu esforços em desempenhar uma orientação profissional comprometida com as diretrizes

(6)

Agradeço ao setor de estágio, por toda compreensão recebida neste período de inquietação, pelas pessoas maravilhosas que encontrei ao longo deste período, onde cada uma tem participação significativa no meu processo de formação.

Ao professor orientador, Bruno Ferreira Teixeira, pela dedicação ao longo deste trabalho. Em acreditar que seria possível a realização do mesmo e que estaria sempre disposto a auxiliar e incentivar quando necessário. Observando pequenas atitudes na busca de dados e enaltecendo cada ação para que eu não desistisse no meio do caminho ou que eu deixasse o trabalho se perder.

À Professora Gabrielle Gomes Ferreira, que trouxe uma visão nova e de grande valia ao trabalho referente à categoria de gênero.

Enfim, agradeço aos amigos que ao longo desses quatros anos e meio encontrei, agradeço a todas as dificuldades que passei, pois cada uma delas serviu para que eu não continuasse no mesmo lugar.

(7)

Mais tarde fui Maria Dando à luz aquele Que traria a salvação Mas isso não bastaria Para eu encontrar perdão.

Passei a ser Amélia A mulher de verdade

Para a sociedade Não tinha a menor vaidade Mas sonhava com a igualdade.

Muito tempo depois decidi: Não dá mais!

Quero minha dignidade Tenho meus ideais! Hoje não sou só esposa ou filha Sou pai, mãe, arrimo de família

Sou caminhoneira, taxista, Piloto de avião, policial feminina,

Operária em construção... Ao mundo peço licença

Para atuar onde quiser Meu sobrenome é COMPETÊNCIA

E meu nome é MULHER.

(8)

Neste trabalho iremos abordar a construção histórica do patriarcado e a sua relação direta com a violência de gênero, uma vez que a mesma se faz muito presente em nosso cotidiano. Partindo deste pressuposto, a submissão da “mulher” está inserida em nossa sociedade patriarcal, e se alimenta através de uma ideologia dominante que responde e/ou justifica qualquer barbárie praticada contra a mesma, culpabilizando-a. Explanaremos ainda os caminhos que levaram a mulher a tomar a consciência sobre essa dominação, uma vez que a mesma assume uma nova forma de pensar e passa a lutar pelos seus direitos. Diante dessa nova forma de pensamento, a mulher busca a sua liberdade e autonomia e passa a integrar os movimentos sociais, incorporando assim, uma nova identidade social. A partir dessas mudanças, da quebra de paradigmas surge o movimento feminista com a finalidade de avançar e consolidar essa luta em prol das mulheres. Por fim, a violência de gênero ganha notoriedade e para enfrentar o tema com mais rigor, foi criada a Lei 11.340 de 2006 - Lei Maria da Penha. A partir de então, a sociedade e o Judiciário passaram a coibir o problema da violência contra a mulher com mais ênfase. Portanto, é importante dizer, que diante de tantas lutas a criação da Lei foi um avanço para as mulheres, mas, ainda assim é preciso superar desafios impostos pela contradição do capital.

Palavras-chave: Patriarcado. Violência de Gênero. Movimento Feminista. Lei Maria da Penha.

(9)

In the first chapter we will discuss the historical construction of patriarchy and its direct relation to the gender violence, once it is very present in our daily lives. Based on this assumption, the submission of the "woman" is inserted in our patriarchal society, and feeds through a dominant ideology that responds and/or justifies any barbarity practiced against her, blaming her. In the second chapter, we will explain the ways that led women to take awareness of this domination, since it assumes a new way of thinking and starts to fight for their rights. Faced with this new way of thinking, the woman seeks her freedom and autonomy and becomes part of the social movements, incorporating so a new social identity. Based on these changes, the break of paradigms comes the feminist movement for the purpose of move forward and consolidates this fight for women. Finally, gender violence gains notoriety and to face the issue more rigorously, was created Law 11.340 of 2006 - Maria da Penha Law. After that, the society and the Judicial began to curb the problem of violence against women with more emphasis. So it is important to say that with so many fights the creation of the Law was a step forward for women, but it is still necessary to overcome challenges imposed by the contradiction of the capital.

(10)

Gráfico 1 – Tipo de Violência Relatada... 41

Gráfico 2 – Relação Vítima e Agressor... 42

Gráfico 3 – Idade da Vítima – 2013... 43

Gráfico 4 – Idade do Agressor – 2013... 43

Gráfico 5 – Etnia da Vítima – 2013... 43

Gráfico 6 – Etnia do Agressor – 2013... 44

Gráfico 7 – Grau de Instrução da Vítima – 2013... 44

Gráfico 8 – Grau de Instrução do Agressor – 2013... 44

Gráfico 9 – Concentração de Violência Doméstica por Bairros – 2013... 45

Gráfico 10 – Tipos de Violência – 2013... 45

Gráfico 11 – Idade da Vítima – 2014... 46

Gráfico 12 – Idade do Agressor – 2014... 47

Gráfico 13 – Etnia da Vítima – 2014... 47

Gráfico 14 – Etnia do Agressor – 2014... 47

Gráfico 15 – Grau de Instrução da Vítima – 2014... 48

Gráfico 16 – Grau de Instrução do Agressor – 2014... 48

Gráfico 17 – Concentração de Violência Doméstica por Bairros – 2014... 49

Gráfico 18 – Tipos de Violência – 2014... 49

Gráfico 19 – Idade da Vítima – 2015... 50

Gráfico 20 – Idade do Agressor – 2015... 50

Gráfico 21 – Etnia da Vítima – 2015... 51

Gráfico 22 – Etnia do Agressor – 2015... 51

Gráfico 23 – Grau de Instrução da Vítima – 2015... 51

Gráfico 24 – Grau de Instrução do Agressor – 2015... 52

Gráfico 25 – Concentração de Violência Doméstica por Bairros – 2015... 52

Gráfico 26 – Tipos de Violência – 2015... 54

Quadro 1 – Tipos de Violência – 2013... 45

Quadro 2 – Tipos de Violência – 2014... 49

(11)

INTRODUÇÃO ... 11

1 PATRIARCADO ... 13

1.1 CONSTRUÇÃO HISTÓRICO CULTURAL... 13

1.2 VIOLÊNCIA DE GÊNERO... 21

2 MOVIMENTOS FEMINISTAS... 24

2.1 FATOS HISTÓRICOS E LUTAS CONTEMPORÂNEAS NO CONTEXTO BRASILEIRO... 24

2.2 A CRIAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA... 28

2.3 CENTRO ESPECIALIZADO DE ATENDIMENTO À MULHER (CEAM) 32 2.3.1 Rota de Atendimento do CEAM... 35

2.4 CICLO DA VIOLÊNCIA... 36

3 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA EM MACAÉ... 38

3.1 A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER... 38

3.1.1 Perfil dos atendimentos de primeira vez realizados no ano de 2013... 43

3.1.2 Perfil dos atendimentos de primeira vez realizados no ano de 2014... 46

3.1.3 Perfil dos atendimentos de primeira vez realizados no ano de 2015... 50

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 55

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 58

APÊNDICE A− Serviços de Atendimento à Mulher e Organismos Governamentais... 63

ANEXO A – Estatísticas de Atendimento do CEAM – MACAÉ... 65

(12)

INTRODUÇÃO

Ao adentrar no mundo do trabalho comecei a questionar o papel da mulher em nossa sociedade. Porque a mulher “aceita o papel” imposto pela sociedade? Essa inquietação cresceu quando adentrei na Subsecretaria de Políticas Públicas para as Mulheres em Macaé. E foi a partir de então, que conheci a temática “violência contra a mulher”, como uma forma estrutural grave de violência e que possuía políticas públicas para seu enfrentamento.

Na verdade, a violência era muito mais que um simples slogan, onde se costumam dizer que em “briga de marido e mulher ninguém mete a colher”. E assim, fui tomada por uma vontade de buscar conhecimento para que eu pudesse me apropriar desse problema social que aflige tantas mulheres.

Entretanto, passei por diversas dificuldades e desafios desde o início, pois sou uma mulher e como podemos ver ao longo do trabalho, possuímos papéis predeterminados, tanto pela família quanto pela sociedade civil. Porém precisava de embasamento teórico metodológico para “enfrentar” essa expressão da Questão Social.

Ao ingressar na Universidade Federal Fluminense precisei me desconstruir, e a lutar contra os preconceitos sociais que foram inseridos culturalmente. Precisava sair da visão do senso comum e entrar na realidade dos fatos de uma sociedade de classes, com uma desigualdade social presente nas relações sociais.

A desigualdade social não está relacionada à meritocracia como somos ensinados a pensar, ou na culpabilização dos seres. Esses fatores são perpassados através de uma ideologia como forma de dominação da classe burguesa, que é oriunda de uma cultura patriarcal.

Na primeira parte do trabalho, procuramos entender qual a relação que o sistema patriarcal exerce em nossa sociedade. Porque essa dominação é construída ao longo da humanidade e quais são os rebatimentos causados pela mesma, seja no âmbito privado ou público.

Encontramos em nossas análises, a “família nuclear” patriarcal, uma instituição tradicional que normalmente é constituída pelo pai, mãe e filhos, unidos pelo matrimônio. O núcleo familiar possui um importante papel de dominação e subordinação da mulher em nossa sociedade que perpetua até nos tempos de hoje. Entretanto, a família, como instituição social, tem assumido novas roupagens em sua estrutura, a partir da sua organização. Porém, mesmo com essa inversão de papéis, a família ainda é o locus da violência.

Partindo desta premissa, encontramos a violência de gênero presente na relação de subordinação e exploração da mulher. Sendo assim, a violência contra as mulheres é uma

(13)

expressão da dominação patriarcal e faz parte de um dos seus mecanismos de sustentação. Por tal motivo, analisamos a violência de gênero baseada na divisão sexual do trabalho e no patriarcalismo.

Na segunda parte desta monografia, abordamos a busca incessante da mulher pela sua autonomia e liberdade. Essa busca não se sustenta de forma passiva após a tomada de consciência, importante atributo na luta que deu origem aos movimentos feministas no Brasil. E assim sendo, relatamos alguns marcos teóricos referentes a trajetória da luta feminina, que de certa forma tiveram um importante papel concomitantemente aos movimentos sociais para sua emancipação. Ressaltamos ainda a posição que a mulher desempenha ao entrar no mercado de trabalho, quais são os efeitos do processo de reestruturação produtiva1, e seus impactos causados a partir da feminização2 como parte de um processo mais amplo de transformação do capitalismo.

Após a compreensão das relações de desigualdade em que estão envolvidos homens e mulheres, buscamos compreender porque a sociedade e o judiciário passaram a enfrentar o problema da violência contra a mulher com mais ênfase. E assim foi criada a Lei Maria da Penha, com o objetivo de coibir e prevenir a violência doméstica, amparadas pelo Código Penal.

Posteriormente, expomos as formas de violência e o ciclo em que a mesma ocorre. Devido sua grande notoriedade, a violência passa a ter um importante equipamento de defesa na luta da violência contra a mulher, sendo criado o Centro Especializado de Atendimento à Mulher – CEAM. Analisamos o atendimento humanizado que a mulher recebe na instituição evidenciando os desafios a serem superados e os avanços a serem aprofundados.

Para dar mais ênfase ao trabalho foram demonstrados dados estatísticos das pesquisas realizadas pelo CEAM no período de 2013 a 2015, bem como um recorte do perfil da usuária e do agressor.

1 Para Harvey, ela “é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo. Ela se apóia na flexibilidade

dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. A acumulação flexível envolve rápidas mudanças dos padrões de desenvolvimento desigual, tanto entre setores quanto entre regiões geográficas, criando por exemplo, um vasto movimento no emprego no chamado “setor de serviços”, bem como conjuntos industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas”. (2002 p.140)

2 Refere-se ao modo de elevação progressiva de mulheres no mercado de trabalho, configurando numa nova

(14)

1. PATRIARCADO

1.1. CONSTRUÇÃO HISTÓRICO-CULTURAL

O tema patriarcado foi construído ao longo dos anos e está em permanente transformação, e assim sendo, a cada período histórico o termo recebe uma nova roupagem que se fragmenta em diversas áreas da nossa sociedade. Analisando a partir deste pressuposto, iremos abordar ao longo do trabalho algumas referências teóricas sobre o tema para melhor compreendê-lo. Entretanto, ao adentrar no conceito patriarcado deparamos com uma forte tendência de subordinação, exploração e violência feminina ao longo da humanidade.

Para conhecer o sistema patriarcal, ao qual estamos “obrigados” não apenas a conviver e sim aceitar como algo “natural”, é importante retornar aos primórdios da humanidade quando os “seres selvagens” viviam uma relação em grupo onde não existia um único parceiro sexual, o que os impossibilitava estabelecer a paternidade de seus descendentes. Neste período, a mulher não era subordinada ao homem.

Entretanto, é na fase monogâmica que o homem se torna proprietário da fonte de alimento e trabalho, e a partir deste novo padrão os descendentes são reconhecidos da sua linhagem, sem contestação. Nesta fase a mulher deve fidelidade e assim sendo, o poder de dominação é conferido ao homem. Segundo Engels (2009, p. 75), começa a derrota do sexo feminino.

A mulher foi degradada, convertida em servidora, em escrava do prazer do homem e em mero instrumento de reprodução. Esse rebaixamento da

condição da mulher, tal como aparece abertamente sobretudo entre os gregos dos tempos heroicos e mais ainda dos tempos clássicos, tem sido gradualmente retocado, dissimulado e, em alguns lugares, até revestido de formas mais suaves, mas de modo algum eliminado.

É preciso compreender que essa dominação feminina perpassa por várias áreas, inclusive na vertente sexual, e por isso se faz necessário abordar essa dominação através da citação que Saffioti (2015) faz trazendo a reflexão da teoria/doutrina política do contrato3, segundo a luz de Pateman (1993).

3 Pateman sustenta que a sociedade civil, que resulta do contrato social, está ancorada no patriarcalismo. É a

(15)

A dominação dos homens sobre as mulheres e o direito masculino de acesso sexual regular a elas estão em questão na formulação do pacto original. O contrato social é uma história de liberdade; o contrato sexual é uma história de sujeição. O contrato original cria ambas, a liberdade e a dominação. A liberdade do homem e a sujeição da mulher derivam do contrato original e o sentido da liberdade civil não pode ser compreendido sem a metade perdida da história, que revela como o direito patriarcal dos homens sobre as mulheres é criado pelo contrato.

A liberdade civil não é universal – é um atributo masculino e depende do direito patriarcal. Os filhos subvertem o regime paterno não apenas para conquistar sua liberdade, mas também para assegurar as mulheres para si próprios. Seu sucesso nesse empreendimento é narrado na história do contrato sexual. O pacto original é tanto um contrato sexual quanto social: é social no sentido de patriarcal – isto é, o contrato cria direito político dos homens sobre as mulheres -, e também sexual no sentido do estabelecimento de um acesso sistemático dos homens ao corpo das mulheres. O contrato cria o que chamarei, seguindo Adrienne Rich, de “lei do direito masculino”. O contrato está longe de se contrapor ao patriarcado: ele é o meio pelo qual se constitui o patriarcado moderno (SAFFIOTI, 2015, p.57).

De acordo com o contrato social, o homem tem a liberdade e a mulher a subordinação, ambas são construídas socialmente. O “patriarcado” exerce uma subordinação expressiva na vida das mulheres, uma vez que a mesma não possui liberdade de viver sua própria vida, pois o seu senhor é detentor do poder econômico e, para além, exerce o direito sexual e reprodutivo de forma abusiva, com a intenção de realizar seus atos e desejos mais primitivos desde os primórdios da humanidade.

Segundo Engels (1979), a primeira divisão do trabalho foi a existente entre a mulher e o homem para a procriação e “(...) o primeiro antagonismo de classe que apareceu na história coincide com o desenvolvimento do antagonismo entre o homem e a mulher na monogamia e a primeira opressão de classe coincide com a opressão do sexo feminino pelo sexo masculino”.

O contrato social é responsável pela formação positivada do casamento, inclusive do núcleo familiar, e a “família” tem um papel fundamental para o entendimento histórico de exploração e opressão feminina. Por esse motivo, abordaremos o significado histórico e etimológico da família.

De acordo com Danda Prado (1985), citada por Cisne (2014, p. 81), o termo tem sua origem no latim famulus, que significa “conjunto de servos e dependentes de um chefe ou senhor”. Nessa mesma ótica, complementa Delphy (2009) citado por Cisne (2014, p. 81):

(16)

[...] a família é unidade de produção. Família em latim designa um conjunto de terras, de escravos, de mulheres e crianças submissos ao poder (então sinônimo de propriedade) do pai de família. Nessa unidade o pai de família é dominante: o trabalho dos indivíduos sob sua autoridade lhe pertence ou em outros termos a família é conjunto de indivíduos que devem seu trabalho a um chefe.

Portanto, a família em linhas gerais, tem como atributo básico uma estrutura hierarquizada, na qual o marido/pai exerce autoridade e poder sobre a esposa e os filhos. Essa dominação é a grande responsável pela violência contra a mulher como iremos demonstrar ao longo deste trabalho.

A primeira corrente teórica que Santos e Izumino (2005) utilizam ao pesquisar o tema sobre violência para compor seu artigo “Violência contra as mulheres e Violência de Gênero:

Notas sobre Estudos Feministas no Brasil”, encontra-se baseado nos estudos na década de 80

no trabalho da socióloga Marilena Chauí intitulado “Participando do debate sobre Mulher e Violência”. Este artigo relata que a violência é resultante de uma ideologia de dominação própria masculina que é produzida e reproduzida por homens e mulheres em nossa sociedade. A autora ainda define a violência como uma ação que transforma diferenças em desigualdades hierárquicas com o objetivo de dominar, explorar e oprimir. A mulher é vista como objeto e não como um indivíduo com ações plenas, o que a torna refém da relação, que na maioria das vezes é sempre desigual em nosso sistema societário. Seguindo essa concepção, Chauí define que a violência contra as mulheres é resultante de uma ideologia que define a mulher como um ser inferior ao ser masculino.

Nas palavras de Saffioti (1987), citada por Santos e Izumino (2005, p.150):

O patriarcado não se resume a um sistema de dominação, modelado pela ideologia machista. E mais do que isto, ele é também um sistema de exploração. Enquanto a dominação pode, para efeitos de análise, ser situada essencialmente nos campos político e ideológico, a exploração diz respeito diretamente ao terreno econômico.

A socióloga rejeita a ideia de que as mulheres sejam cúmplices da violência. Por outro lado, embora as concebendo como vítimas, a autora as define como sujeito dentro de uma relação desigual de poder com os homens, pois a mulher foi educada para submeter-se aos desejos masculinos e têm essa relação como normal, pois foi passada por várias gerações, tomando-a como “natural”. As mulheres se submetem à violência não porque consentem: elas são forçadas a ceder porque não têm poder suficiente para consentir, apenas se calam diante da situação.

(17)

O homem patriarcal é o senhor da casa, o dono da vida da mulher, onde tem a mulher como propriedade privada, e para além, a detém como objeto dos seus desejos sexuais e reprodutivos. A mulher vive submissa, ou melhor, não vive sua vida.

O espaço doméstico é considerado um espaço de privação, onde as mulheres têm o papel de reprodução sexual na perpetuação da espécie e da propriedade, além de depender economicamente dos seus parceiros, pois as mesmas são criadas culturalmente para ser a dona do lar. E assim vivem em função de seus maridos e seus filhos. Não possuindo uma identidade. A mulher perde sua essência e consequentemente perde a capacidade de pensar, agir ou de querer algo.

Segundo Prado (1985) citado por Cisne (2014, p. 74), o patriarcado está relacionado a apropriação masculina do corpo da mulher, ou seja, ele veio legitimar o poder masculino em “impor à mulher um grande número de gravidezes a fim de gerar mão de obra abundante em seu próprio benefício”. Nas palavras de Saffioti (2004, p.58), esse novo sistema tornou as mulheres “objetos de satisfação sexual dos homens, reprodutoras de herdeiros, de força de trabalho e novas reprodutoras”.

Definimos de forma particular o quão é entristecedor ver a realidade de milhares de mulheres que ainda nos tempos atuais dependem economicamente de seus machos reprodutores. E ainda assim, devem obediência pelo medo vivido diante de ameaças veladas no âmbito privado na forma de coação. O silêncio impera e a omissão faz parte da vida destas mulheres. Portanto, o controle sobre as mulheres empreendido pelo patriarcado se desdobra ainda pelo medo que a ele é associado. Ou seja, “a dinâmica entre controle e medo rege o patriarcado” (SAFFIOTI, 2004, p 136).

Tendo como referência Saffioti (2004) citada por Cisne (2014, p. 78), podemos sintetizar alguns elementos que compõem a estrutura do patriarcado:

Não se trata de uma relação privada;

Dá direitos sexuais aos homens sobre as mulheres, praticamente sem restrições [...]; Configura um tipo hierárquico de relação, que invade todos os espaços da sociedade; Tem uma base material;

Corporifica-se;

Representa uma estrutura de poder baseada tanto na ideologia quanto na violência (CISNE, 2014, p. 78).

A priori, o termo patriarcado que iremos nos atentar neste trabalho se refere ao conceito a partir da divisão sexual do trabalho, no período da propriedade privada e na perspectiva feminina marxista. Compreendendo a violência como expressão do patriarcado, onde o mesmo é utilizado para sobrepor à força coercitiva que o homem exerce sobre a

(18)

mulher, resultando assim, a anulação da autonomia feminina. E assim sendo, a mulher tende a perder sua essência e consequentemente anula sua capacidade de pensar, agir ou até mesmo de querer algo. A violência contra as mulheres é uma expressão da dominação patriarcal e um dos seus mecanismos de sustentação.

Dessa forma, é importante analisar o uso diferenciado da força de trabalho das mulheres, onde encontramos a contradição que é posta na divisão sexual do trabalho como uma das formas de exploração do capital sobre o trabalho. Essa divisão segmenta os trabalhos propriamente ditos femininos e masculinos, onde a mulher tem papéis predeterminados na sociedade capitalista. E ainda assim, é importante ressaltar que as mulheres ao adentrarem no mercado de trabalho, após lutas alicerçadas pelos movimentos feministas, são discriminadas ao receberem salários mais baixos em relação ao homem. Ao receber menos que o homem pela sua força de trabalho, a mulher ocupa um espaço de inferioridade que tem o intuito de subalternizá-la diante da sociedade civil.

A desigualdade salarial entre homens e mulheres é um problema social que está inserido em nossa sociedade ao longo dos anos. Ao investigar a posição da mulher perante o trabalho, está se recompondo todo processo de socialização que ela viveu. A escolha de uma carreira e de um trabalho é síntese de toda uma preparação prévia onde a orientação dos valores sociais se fez sentir encaminhando a mulher para determinadas carreiras (...). Subjacente às escolhas determinadas pela vocação, está um longo processo que leva a jovem gostar de carreiras adequadas ao sexo feminino, que não encontram elevadas barreiras quando exercidas e que não dificultam muito o casamento. Estas vantagens compensam algumas desvantagens, como remuneração baixa e o exercício de carreiras cujo prestígio social não é muito elevado (BLAY, 1978 apud CISNE, 2012, p. 110).

Para McInstosh, o Estado detém, indiretamente, um importante papel na opressão da mulher, por meio do seu apoio a uma forma particular de lar: “o lar dependente amplamente de um salário masculino e do serviço doméstico feminino”, modelo relacionado por sua vez, à produção capitalista, na medida em que é funcional à reprodução da classe trabalhadora e à manutenção das mulheres como um exército de reserva de mão de obra. Ao realizarem trabalhos domésticos não remunerados e ao serem amplamente responsáveis pelos cuidados com os filhos, as mulheres estão realizando funções que são essenciais para um funcionamento contínuo e uniforme do sistema capitalista (MCINSTOSH, 2001 apud CISNE, 2012, p. 115). Então, faz-se entender que a cultura de subordinação feminina está diretamente relacionada à manutenção e reprodução do capital.

(19)

Segundo Bruschini (1994) citado por Cisne (2012, p. 119), a entrada da mulher no mercado de trabalho brasileiro foi “uma das mais marcantes transformações sociais ocorridas no país desde os anos de 1970”. O autor ainda aponta que mesmo com as crises econômicas na década de 80, a presença das mulheres no mercado de trabalho urbano brasileiro é cada vez mais intensa e diversificada, e não tende a nenhum retrocesso.

Em 1990, “o número de trabalhadoras brasileiras chegou à cifra de mais de 22,9 milhões, 18 dos quais concentrados na zona urbana (...), representando um crescimento relativo da ordem de 59,7% na década de 1980” (NEVES, 2000 apud CISNE, 2012, p.119). Hobsbawm corrobora este quadro com a seguinte informação: “Em 1940, as mulheres casadas que viviam com os maridos e trabalhavam por salário somavam menos de 14 por cento do total da população dos EUA. Em 1980, eram mais da metade: a porcentagem quase duplicou entre 1950 e 1970” (apud NETTO, 1996, apud CISNE, 2012, p. 119).

Seguem dados atualizados referentes ao crescimento do público feminino no mercado de trabalho, conforme informações da última Relação Anual de Informações Sociais (RAIS 2013) do Ministério do Trabalho e Emprego. Em um recorte por gênero, os dados evidenciam que, em 2013, o nível de emprego da mão de obra feminina cresceu 3,91%, ante um aumento de 2,57% para os homens, uma diferença de 1,34 pontos percentuais. (PORTAL BRASIL, 2015). Os dados revelam ainda uma continuidade no processo de elevação da participação das mulheres no mercado trabalho formal, que passou de 42,47% em 2012 para 42,79% em 2013 (PORTAL BRASIL, 2015).

A partir dos dados acima relacionados precisamos refletir sobre a entrada em massa das mulheres no mercado de trabalho, seus impactos causados e consequentemente a desigualdade gerada na vida de nós mulheres.

Ressalto ainda, que com a entrada marcante da mulher no mercado de trabalho, a naturalização dos ditos papéis femininos atende diretamente aos interesses do capital, pois o mercado amplia seus lucros, uma vez que as mulheres recebem seus salários menores em relação ao homem e ainda assim colabora com uma diminuição significativa sobre o custo salarial da reprodução da força de trabalho.

Para corroborar com as afirmações acima, o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID evidencia que, apesar do recente crescimento econômico e das políticas destinadas a reduzir as desigualdades, as diferenças salariais relacionadas de gênero e etnia afirmam que os homens ganham mais que as mulheres não importando o segmento etário e nem o nível de instrução.

(20)

O Brasil apresenta um dos maiores níveis de disparidade salarial. No País, os homens ganham aproximadamente 30% a mais que as mulheres que possuem a mesma idade, inclusive com o mesmo nível de instrução.

Neste mesmo sentido, segundo os dados do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), homens ainda ganham mais do que as mulheres: em 2014, homens tinham o salário médio de R$ 1.831, enquanto as mulheres ganhavam R$1.288. As mulheres negras têm a menor remuneração, com valor médio salarial de R$ 946, e os homens brancos com maior rendimento, de R$ 2.393. (PORTAL BRASIL, 2015)

Assim, devemos compreender a feminização do trabalho como “parte de um processo mais amplo de transformação do capitalismo, que vem sendo identificada com os processos de globalização e de reestruturação produtiva” (ARAÚJO, 2000 apud CISNE, 2012, p. 120).

O sistema capitalista está em constante construção, onde se metamorfoseia para que possa atender sempre a classe burguesa, visando a dependência do trabalhador, uma vez que cada dia fica mais distante ele possuir seus meios de produção e reprodução nas relações sociais. O trabalhador se torna refém do modo de produção na sociedade capitalista.

Diante das análises descritas acima é importante observar que a emancipação da mulher se encontra engendrada nas contradições do movimento do capital. Onde uma nova roupagem surge na sociedade brasileira, travestida de bandeiras de luta das mulheres, ocasionada pelas mudanças na divisão sexual do trabalho, que tem como desdobramento o aumento da sobrecarga de trabalho, pelo fato de ser responsável pelos trabalhos “ditos” domésticos.

Devemos refletir ao considerar, além da singularidade, do senso comum, que a mulher está se emancipando? Que a mesma está conquistando sua independência? Liberdade e autonomia? Com a entrada no mercado de trabalho após tantas lutas alicerçadas por movimentos sociais?

Mészáros (2002) citado por Cisne (2012, p. 120) afirma que “durante o desenvolvimento histórico do capital também são ativadas algumas potencialidades positivas para emancipação das mulheres – apenas para serem mais uma vez anuladas sob o peso das contradições do sistema”. O autor apresenta em sua análise crítica uma reflexão desveladora desse fenômeno.

A extralimitação do capital por si mesmo em relação às mulheres traz força de trabalho e um número cada vez maior delas, sob o inexorável impulso expansionista do sistema: uma alteração que não pode se completar sem que se levante a questão da igualdade de mulheres, eliminando no processo alguns tabus e barreiras anteriormente existentes. Esse movimento – que surge do indispensável impulso do

(21)

capital para a expansão e não dá mais leve inclinação a uma esclarecida preocupação emancipadora em relação às mulheres – erra o tiro no momento oportuno. Não apenas porque as mulheres têm de aceitar uma parcela desproporcional das ocupações mais inseguras e mais mal pagas no mercado de trabalho e estejam na péssima situação de representar setenta por cento dos pobres do mundo. (MÉSZÁROS, 2002 apud CISNE, p. 121).

Diante desta análise, a feminização do mercado de trabalho “não se trata tão somente de uma conquista social das mulheres no espaço público do trabalho assalariado, mas, sobretudo, uma conquista do capital”. (MÉSZÁROS, 2002 apud CISNE, p. 123).

Podemos observar que as conquistas referentes à emancipação feminina, encontram-se relacionadas de forma direta ou indiretamente a favor da ordem do capital. Pois a entrada da mulher não ocasionou uma ruptura com as “suas” responsabilidades domésticas, sobrecarregando a mesma, além de estarem submetidas às formas mais precárias de trabalho, e arcar com toda responsabilidade familiar, como afirma Mészáros.

Por fim, após relatos da entrada significativa da mulher no mercado de trabalho, é importante ressaltar as desigualdades em que as mesmas estão submetidas, inclusive as trabalhadoras de nível superior, com qualificação profissional. Como podemos ressaltar a violência de gênero em outra dimensão, encontramos a subordinação da mulher no mundo do trabalho.

Na divisão de tarefas domésticas, a mulher ainda faz a maior parte do trabalho, sobrecarregando-a. O preconceito está muito presente na maioria dos homens, entretanto, questiono ser somente um machismo ou seria acomodação? Porque mudar uma situação que é favorável à classe. Na verdade, existe uma correlação entre ambos que servem de suporte para manter a ideologia patriarcal presente em nossa sociedade.

A autonomia das mulheres não se resulta apenas da conquista de igualdade entre gêneros, conforme vimos ao longo do trabalho, se faz necessária a igualdade no mercado de trabalho. Pois a exploração e dominação extinguem com qualquer possibilidade de libertação. Logo a emancipação deve ser atingida tanto dentro do seu núcleo familiar, quanto na sociedade.

(22)

1.2. VIOLÊNCIA DE GÊNERO

A violência de gênero não se iniciou no período do capitalismo, mas certamente foi nele “intensificada”, com um caráter ainda mais perverso e violento e assim sendo, esta passa a ser considerada uma expressão da questão social.4

Na verdade, a categoria de gênero é muito complexa e envolvem vários atores sociais, porém a intenção neste trabalho é elencar alguns pressupostos que norteiam os estudos para posteriormente adentrar no contexto da violência de Gênero.

A principal referência para os estudos de gênero é da historiadora feminista e americana Joan Scott, a mesma faz a definição de gênero no seu artigo “Gender: A useful category of historical analysis”, onde diz que gênero “é um elemento que se constitui das relações sociais baseadas nas diferenças entre os sexos”. Portanto, enfatiza ao dizer que gênero constitui em um campo no qual as relações de poder são articuladas.

Segundo Joan Scott,

Minha definição de gênero tem duas partes e vários itens. Eles estão interrelacionados, mas devem ser analiticamente distintos. O coração da definição reside numa ligação integral entre duas proposições: gênero é um elemento constitutivo das relações sociais, baseado em diferenças percebidas entre os sexos (...). Entretanto, minha teorização de gênero está na segunda parte: gênero como uma forma primária de significação das relações de poder. Talvez fosse melhor dizer que gênero é um campo primário no qual ou através do qual o poder é articulado (Scott, 1988).

Segundo a autora, podemos destacar três conceitos usuais do termo relacionado ao gênero. O mais simples é quando o uso da palavra atua como sinônimo de mulher, porém o seu uso surge para amenizar o efeito carregado de sentidos políticos que vieram à tona com a onda feminista.

Mais tarde, o conceito de gênero incorpora o homem tornando-se um caráter relacional, rompendo com a ideia de que estudar mulher é se adentrar em uma esfera separada. Em seguida, tem-se o uso descritivo e mais acentuado de gênero, quando o termo se refere a uma categoria social imposta sobre um corpo sexuado, ou seja, a diferença entre o corpo, o “sexo biológico”, e os aspectos socioculturais e a historicidade do gênero.

Entretanto, o uso das três abordagens acima para compreender todo seu processo de transformação na história oferece uma análise muito limitada, é necessário ir além, visando

4 A questão social expressa as desigualdades e/ou expressões de ordem econômica, política, cultural e social

(23)

entender o gênero enquanto uma categoria de construção social, que ultrapassa as características biológicas de um corpo.

Segundo Cisne (2012, p. 77), os estudos de gênero surgem inseridos no movimento feminista acadêmico entre as décadas de 1970 e 1980, devido a necessidade de desnaturalizar as desigualdades entre homens e mulheres que são determinadas pelas relações sociais em nossa sociedade. As acadêmicas feministas começaram a substituir a categoria “mulher” pela categoria “gênero”, abrindo novas perspectivas de estudo.

Portanto, o conceito de gênero perpassa pelo sentido de análise sobre a subordinação da mulher em relação ao homem. Sendo assim, a categoria se constitui em uma categoria relacional, conforme aborda Scott. Contudo, a mesma amplia suas relações e não se limita apenas nas relações entre homem e mulher, mas também de homem-homem, e mulher-mulher, ou seja, na construção do masculino e do feminino.

Podemos observar que ao longo da análise, a categoria de gênero é alicerçada na subordinação que existe nas relações, sejam entre mulheres ou homens. Encontramos a gênese da violência de gênero no interior das mesmas.

Conforme Saffioti (1995), violência de gênero é um conceito mais amplo que o de violência contra a mulher e por sua vez, produz-se e reproduz-se nas relações de poder onde se entrelaçam as categorias de gênero, classe, raça/etnia. Expressa uma forma particular da violência global mediatizada pela ordem patriarcal que dá aos homens o direito de dominar e controlar suas mulheres, podendo, para isso, usar a violência.

Vários trabalhos sobre violência contra as mulheres passam a utilizar a expressão “violência de gênero” na mesma perspectiva de Saffioti. Sendo assim, Gayle Rubim corrobora uma dicotomia na relação sexo/gênero. Gênero é a construção social e o sexo seria o que é determinante biologicamente, portanto naturalmente. (SAFFIOTI, 2015)

Para que possamos entender essa expressão social a partir da perspectiva de Gênero, é preciso analisar o tema sobre os processos de socialização e sociabilidade masculinas e o papel que ele exerce na sociedade contemporânea.

Segundo Cecilia Toledo, existe uma correlação entre o gênero feminino e a divisão de classes, que resulta na exploração e subalternização da mulher, alicerçando o sistema capitalista. E consequentemente a emancipação feminina não será alcançada em uma sociedade capitalista. E para além, faz entender que a mulher tem um papel importante para a reprodução e sustentação da exploração econômica. (apud NOGUEIRA, 2011)

(24)

A autora marxista relata em seu livro “Mulheres: o Gênero nos une, a classe nos divide”, que a opressão da mulher está vinculada a propriedade privada dos meios de produção e somente poderá ser superada através do socialismo.

A discriminação da mulher está diretamente relacionada a violência de gênero, uma problemática comum e recorrente no contexto social. Essas agressões aparecem principalmente no âmbito familiar, sendo necessária a erradicação da violência. Precisamos construir uma mudança no paradigma cultural, para transpor o machismo encontrado em nossa sociedade, transformando e promovendo o respeito a diversidade através da promoção da equidade.

Convém lembrar que o patriarcado tende a classe dominante, e existe uma correlação entre o gênero e violência, da mesma forma que a categoria de gênero se relaciona com a ideologia. A mulher sofre uma dominação que se intensifica ideologicamente no patriarcado, essa subordinação se concretiza nas relações sociais que consequentemente resulta na violência. Apesar disto, a mulher não se calou; assim, veremos no próximo capítulo um histórico de suas lutas alicerçadas pelos movimentos.

(25)

2. MOVIMENTOS FEMINISTAS

2.1. FATOS HISTÓRICOS E LUTAS CONTEMPORÂNEAS NO CONTEXTO BRASILEIRO

Neste capítulo, pretendemos fazer um breve resgate sobre o movimento feminista, devido ao termo ser bastante flexível, uma vez que engloba todo um processo de questionamentos de paradigmas e transformações sociais impostos pela sociedade patriarcal. Ademais, o movimento é resignificado a cada nova geração de feministas de acordo com seus desafios, ideais e contradições.

Ao incorporar leituras sobre o feminismo deparamos com duas importantes explicações à luz da autora Mirla Cisne, para nossa compreensão. O movimento feminista tem como objetivo a luta contra a opressão e pela liberdade das mulheres, sua luta enfoca uma bandeira, ou seja, luta por um tema em específico como, aborto, sexualidade, violência, autonomia, direitos civis e políticos. Porém precisamos entender que nem todo movimento de mulheres, necessariamente possui uma configuração feminista.

Portanto, o movimento de mulheres definiu-se por muitos anos, sendo um movimento de lutas nas demandas sociais, com o objetivo na melhoria das condições de vida e consequentemente de trabalho. Ambos os movimentos se hegemonizavam no Brasil e se confundiam significativamente. Contudo, de uma forma geral, podemos dizer que ambos constroem a mesma história: a luta de mulheres.

Neste sentido, a luta contra a violência doméstica, por exemplo, é uma bandeira feminista incorporada ao movimento de mulheres, onde ganhou expressão a partir dos anos 70, quando os movimentos feministas começaram a enfatizar que os crimes eram sexistas, ou seja, sua condição de gênero era um fator determinante para sua realização e/ou efetivação. Para ser construído um movimento feminista é preciso que a mulher atue em conformidade a uma consciência militante, como sujeito de direitos, rompendo com as mais variadas alienações impostas pela sociedade.

Portanto, destacamos alguns marcos teóricos referente à trajetória da luta feminina que de certa forma contribuíram juntamente com os movimentos sociais para sua emancipação. Segundo Kergoat (2009) citado por Cisne (2014, p. 130), o começo do movimento feminista se deu:

(26)

A partir da tomada de consciência de uma opressão específica: tornou-se coletivamente “evidente” que uma enorme massa de trabalho era realizada por mulheres; que esse trabalho era invisível; que era feito não para si, mas para os outros e sempre em nome da natureza, do amor, e do dever maternal.

A partir do século XVIII, nos primórdios da Revolução Francesa, as mulheres se organizaram e passaram a lutar por direitos, para além do espaço doméstico e político onde confrontavam a burguesia, iniciando uma batalha histórica para poder inserir-se ativamente na sua própria vida, no espaço público, buscando ser protagonista no mundo do trabalho remunerado, além de buscar sua inserção na Educação, sua luta perpassava pelo direito do amor livre e o divórcio.

No período da segunda metade do século XIX, com o avanço do capitalismo ocorre o agravamento da “questão social” e consequentemente aumenta a opressão das mulheres em nossa sociedade. Este fato contribui para que as mulheres se organizem com um viés maior no socialismo, e em torno deste lutam e se organizam pela reivindicação dos direitos políticos, assim, surge o “movimento sufragista5”. (PINTO, 2003 apud CISNE, 2014, p. 131).

Podemos dizer que ao longo de sua trajetória o movimento feminista se fragmentou em três correntes: radical, socialista e liberal. As feministas radicais, “lutam contra o sistema patriarcado e com as formas diretas e indiretas do poder falocrático6”. (FOUGEYROLLAS-SCHWEBEL, 2009 apud CISNE, 2014, p.132). Enquanto o movimento socialista parte do pressuposto que a transformação deve advir de um contexto global com a queda do modo de produção capitalista. E o feminismo liberal apoia a promoção de movimentos voltados aos valores individuais, sua ação é voltada para as políticas onde buscam reduzir as desigualdades entre homens e mulheres.

No Brasil, a luta sufragista se manifesta a partir do século XIX, mas é na década de 1920 que o movimento adentra no campo nacional. O movimento liderado por Bertha Lutz7 foi denominado a primeira vertente feminista, considerada a mais forte, onde a mesma buscou o papel da mulher como sujeito político (PINTO, 2003 apud CISNE, 2014, p. 133). Entretanto, é importante frisar que esse movimento era composto por mulheres cultas da elite brasileira que buscavam direitos políticos, assim, esse movimento não confrontava o “sistema

5 O sufrágio feminino motivou a produção, em 2015 do filme chamado As Sufragistas, que conta um pouco da história da luta das mulheres pelo voto.

6 Representa a dominação da mulher no sistema.

7“A bióloga Bertha Lutz foi uma das pioneiras do movimento feminista no Brasil, responsável direta pela

articulação política que resultou nas leis que deram direito de voto às mulheres e igualdade de direitos políticos nos anos 20 e 30.” Ver em: http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2012/04/bertha-lutz

(27)

capitalista” como um sistema de exploração e opressão das mulheres e nem tão pouco questionava o patriarcado (PINTO, 2003 apud CISNE, 2014, p. 133).

Considerado como a primeira onda, o movimento teve um caráter conservador por não questionar a opressão da mulher. Neste sentido, a busca se pautava na conquista da sua cidadania. Nesta fase o movimento não passava pelo terreno das relações de gênero.

[...] se a luta das mulheres cultas e das classes dominantes se estruturava a partir da luta pelo voto, não era tão somente porque esta se colocava como a luta do momento nos países centrais, mas também porque encontrava respaldo entre membros desta elite e conseguia respeitabilidade até na conservadora classe política brasileira. Era, portanto, um feminismo bem-comportado, na medida em que agia no limite da pressão intraclasse, não buscando agregar nenhum tipo de tema que pudesse pôr em xeque as bases das relações patriarcais (PINTO, 2003 apud CISNE, 2014, p. 133).

A segunda vertente foi denominada de “feminismo difuso”, onde expressa as mais variadas “manifestações da imprensa feminista alternativa”. Esse grupo também era composto por mulheres cultas, “com vidas públicas” onde muitas delas eram jornalistas e escritoras. Essas mulheres reivindicavam o direito a Educação e questionavam a dominação masculina, além de questionar os interesses dos homens em deixá-las ausentes do mundo público. Esse período configurou-se no início do século XX (PINTO, 2003 apud CISNE, 2014, p. 133). Esta fase do movimento era considerado “malcomportado”.

A terceira vertente encontrada está associada ao Partido Comunista, onde as mulheres eram intelectuais e trabalhadoras, militantes de esquerda que defendiam a libertação da mulher de forma radical e seu tema central era a exploração do trabalho (PINTO, 2003 apud CISNE, 2014, p. 134). Tal ideário tem presença marcante em grandes greves operárias no país onde a mulher era vista como uma colaboradora constante.

Neste primeiro momento de organização do feminismo no Brasil, as conquistas foram poucas, porém podemos destacar um movimento com grande ênfase na história brasileira que foi a conquista do direito ao voto, denominado sufrágio feminino.

Existe uma ruptura no processo de organização política do feminismo devido ao golpe de 1937. No final dos anos 1940 e início dos anos 1950, no Brasil, várias mulheres de diferentes classes sociais passam a integrar movimentos contra a carestia, ou seja, lutam contra o alto custo de vida e criam os clubes de mães8. Ainda assim, lutavam por melhorias na área da saúde, educação e serviços públicos em geral. Segundo Pinto (2003) citado por Cisne

8 Movimentos de mulheres organizados “a partir da própria condição de dona-de-casa, esposa e mãe” com suporte da Igreja Católica.

(28)

(2014, p. 139), o principal objetivo deste grupo era a luta pela transformação da sua condição de subordinação na qual estavam inseridas.

A partir de 1970, as feministas passaram a integrar a luta contra a ditadura militar, com marcante presença nos movimentos da esquerda em prol da anistia. Muitas mulheres, a exemplo de Zuzu Angel, foram presas neste período, barbaramente torturadas e submetidas inclusive a tortura sexual.

Entretanto, o período da ditadura limitava os movimentos feministas diante da forte repressão e mortes bárbaras, porém por outro lado, por conta do exílio, muitas mulheres beberam na fonte da revolução cultural onde colocavam em dúvida a naturalização do “poder do homem”. Essas mulheres não retornam ao Brasil da mesma forma, conforme corrobora a autora.

[...] uma nova forma de pensar sua condição de mulher, em que o antigo papel de mãe, companheira, esposa não mais servia. Essas mulheres haviam descoberto seus direitos e, mais do que isso, talvez a mais desafiadora das descobertas, haviam descoberto os seus corpos, com suas mazelas e prazeres. Mas o Brasil que encontravam era um país dominado por uma ditadura militar sangrenta, na qual todas as frestas de expressão que sobraram deviam ser ocupadas pela luta pró-democratização, pelo fim da censura, pela anistia aos presos políticos exilados. Somava-se a isso uma tradição marxista [...] que via esse tipo de luta como um desvio em relação à luta fundamental do proletariado contra a burguesia. [...]. De qualquer forma, no fim da década havia um fato inegável: o movimento feminista existia no Brasil. Frágil, perseguido, fragmentado, mas muito presente, o suficiente para incomodar todos os poderes estabelecidos, tanto dos militares como dos companheiros homens da esquerda (PINTO, 2003 apud CISNE, 2014, p. 133).

Em 1972, o contexto foi pautado pelas contradições e pelo sigilo de suas reuniões que eram realizadas nos Estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Este período marca uma espécie de transição entre a fase do “bem comportado” para o “mal comportado”. Neste momento o importante congresso promovido pelo Conselho Nacional da Mulher era liderado pela advogada Romy Medeiros.

O ano de 1975 foi um marco para o movimento, pois o mesmo adentrava na esfera pública devido às questões reivindicadas para enfrentar a quebra de tabus em nossa sociedade; destaca-se ainda o ano Internacional da Mulher, decretado pela ONU – Organização das Nações Unidas. O feminismo no Brasil insere o evento “O papel e o comportamento da mulher na sociedade brasileira" como fomento na comemoração do Ano Internacional.

A década de 1980 é marcada por um movimento mais institucionalizado, chamado de feminismo da redemocratização. A partir do ano de 1985 foram criados os Conselhos da Condição da Mulher e as Delegacias da Mulher. O feminismo acadêmico também tem

(29)

presença marcante nesta fase, com destaque para as pesquisas na área da saúde e da violência contra a mulher. A criação destes dispositivos de enfretamento foi um avanço na luta, pois a mulher passou a ser concebida como vítima de violência.

Contudo, nos anos 1990, a institucionalização do feminismo atinge seu ápice, um fenômeno que costumamos chamar de “onguização”. Neste período identificamos uma nova roupagem de pensamento, bem como o rumo que o movimento tomou, havendo uma dicotomia.

Em suma, consideramos que a mulher com o decorrer das diversas fases do movimento, abre espaço para que a mesma seja protagonista da sua própria história, sendo assim, esta passa a atuar ou exercer o papel político deixando o seu lado submisso na história de lado e vislumbra diversos espaços em nossa sociedade.

2.2. A CRIAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA

A violência contra as mulheres é um dos fenômenos sociais que mais ganhou visibilidade nos últimos anos. Milhares de Marias, Anas e Joanas fazem parte das estatísticas cada vez mais alarmantes em nosso País. A agressão era concebida como normal e natural em nossa sociedade, uma vez que se dizia “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”. E assim, os envolvidos deveriam resolver suas demandas sem quaisquer interferências.

Entretanto, para enfrentar o tema com mais rigor, foi criada a Lei 11.340 de 2006 - Lei Maria da Penha. A partir de então, a sociedade e o Judiciário passaram a enfrentar o problema da violência contra a mulher com mais ênfase.

Para que possamos entender a criação da Lei Maria da Penha faremos um breve relato sobre a vida da farmacêutica bioquímica Maria da Penha Maia Fernandes, que sofreu violência doméstica durante 20 anos e lutou incessantemente para ver condenado o homem marido que a agredia.

No ano de 1983, ela ficou paraplégica em consequência de um tiro que Marco Antônio Heredia Viveros proferiu de espingarda em suas costas. Em 2001, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Unidos (OEA), em seu Informe nº 54, responsabilizou o Estado brasileiro por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica contra as mulheres. Depois de ter seu sofrimento divulgado em todo o mundo, Maria da Penha viu o Brasil reconhecer a necessidade de criar uma lei que coibisse a violência doméstica contra as mulheres.

(30)

A Lei Maria da Penha surge como resultado da luta coletiva histórica alicerçada pelos movimentos de mulheres e com a participação dos poderes públicos no enfrentamento a violência doméstica e familiar devido ao alto índice de morte de mulheres no País.

Segundo a Lei, as mulheres têm o direito à segurança dentro do âmbito doméstico, para isso foi determinado que o Poder Público desenvolvesse políticas que garantam os direitos das mulheres nas relações domésticas e familiares para coibir todas as formas de violência, submissão e opressão. (Brasil, 2006)

Esta Lei tem como objetivo criar mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a Mulher, nos termos do § 8º do art. 226 Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências.

De acordo com o Art. 2º toda mulher, independente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.

A definição de violência doméstica e familiar contra a mulher encontra-se no Art. 5º desta Lei; se configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral e patrimonial.

A violência doméstica pode ser compreendida no âmbito da unidade doméstica, isto é, compreendida como o espaço de convívio da família ou em qualquer relação íntima de afeto, isto é, deve haver vínculo familiar. A partir desta premissa, existem várias formas de violência, como: moral, física, sexual, psicológica e patrimonial.

No capítulo II desta Lei, encontramos as formas de violência doméstica e familiar contra a mulher. Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

A violência física – caracteriza-se como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou cause danos ao corpo físico das mulheres ou das meninas.

A violência psicológica ou emocional – entendida como qualquer ação que lhe cause prejuízo emocional que atinja a sua autoestima, ou que lhe prejudique e perturbe o pleno

(31)

desenvolvimento ou ainda que vise degradar ou controlar suas ações e comportamentos mediante ameaças, além de causar algum tipo de constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir, ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo a saúde psicológica e a sua autonomia. Porém é uma forma de violência que é mais subjetiva e difícil de ser denunciadas pela vítima devido ao fato de não deixarem marcas no corpo da mulher, mas pode deixar marcas emocionais profundas na essência feminina que irão prejudicar por toda sua vida.

A grande maioria das mulheres não tem consciência que esse tipo de agressão é considerado uma forma de violência, que em seu ápice, a mulher pode ser proibida de sair de casa mesmo que seja para estudar e/ou trabalhar, tolhendo sua autonomia.

A violência sexual – acontece quando a mulher ou menina é obrigada a praticar ou presenciar atos sexuais que não deseja mediante intimidação, ameaça, coação, com uso da força física. A mulher não pode ser privada do exercício pleno de seus direitos sexuais e reprodutivos, como não deve ser proibida de utilizar qualquer método de anticoncepcional, pois também é uma forma de violência ao corpo da mulher. A mulher deve ser livre para que possa decidir sobre o que deseja em relação ao seu corpo. O estupro, a tentativa de estupro e o ato obsceno são exemplos de violência sexual.

A violência patrimonial – configura-se como qualquer conduta de retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades. Também é considerada uma forma de violência quando a mulher é impedida de ter acesso aos seus próprios bens materiais como dinheiro, salário, pensão alimentícia, Bolsa Família ou outros recursos importantes para a sobrevivência e bem-estar da mulher e de sua família.

A violência moral – fere a conduta da mulher, onde a mesma torna-se vítima de calúnia, difamação ou injúria. A calúnia ocorre quando uma pessoa acusa a outra falsamente de ter praticado algo que seja crime, como por exemplo, chamar a mulher de ladra, sem ter provas. Enquanto, a difamação acontece quando alguém ofende a reputação de outra pessoa perante as demais e/ou quando cria fofoca. A injúria ocorre quando a mulher recebe uma ofensa à dignidade com intuito de ofendê-la com objetivo de atingir sua autoestima por meio de palavras faladas ou escritas. Esses crimes só podem ser investigados com a autorização (queixa) da vítima. No caso de menores ou de pessoas incapazes, é preciso que a queixa seja realizada pelos responsáveis legais.

(32)

Com o avanço da Lei Maria da Penha, o juiz passou a ter poderes para conceder as chamadas “medidas protetivas”, essas medidas servem para proteger a mulher que está sofrendo violência e são aplicadas quando o juiz entende que existe a necessidade de resguardar a integridade física da mulher. Essa medida pode ser executada no prazo de 48 horas. O pedido é solicitado pela vítima no momento do seu boletim de ocorrência.

Em resumo, a Lei prevê medidas protetivas, tais como:  Afastamento do agressor do lar ou sua prisão preventiva;

 Suspensão da posse ou restrição de posse de arma pela pessoa que agrediu;  Proíbe que o agressor se aproxime da mulher e de seus familiares;

 Proíbe que o agressor frequente determinados lugares;

 Restrição ou suspensão de visitas do agressor aos seus dependentes.

Existem outras formas de violência que não se enquadram na Lei Maria da Penha, mas, também são formas de violência contra a mulher e são amparadas pela Legislação Penal, por exemplo, o assédio sexual, é quando alguém se beneficia de uma posição superior na hierarquia com objetivo de fazer perseguições ou ameaças de demissão ou de redução salarial com o objetivo de conseguir favores sexuais. Esse tipo de violência geralmente acontece no local de trabalho, porém está suscetível acontecer em escolas.

É importante ter ciência de que a mulher também sofre assédio em locais públicos, sendo porventura constrangidas com atos abusivos oriundos dos homens, que se prevalecem do poder que eles exercem em nossa sociedade.Os assédios sexuais podem ser cometidos por homens e mulheres.

Outra forma de preconceito, a lesbofobia, consiste na discriminação, o ódio, a aversão, a opressão e a prática de violência física, sexual e psicológica contra as mulheres que se relacionam afetiva e/ou sexualmente com outras mulheres, esse fato se deve por serem lésbicas e/ou bissexuais. Esse tipo de violência é praticado através de espancamentos, humilhações, estupros corretivos. A lesbofobia (homofobia) ainda não foi definida como crime. Mas, a pessoa que o praticou pode e deve responder pelos crimes de lesão corporal, estupro, constrangimento ilegal, ameaça, entre outros.

Um dos avanços a se observar na Lei Maria da Penha é que “as relações de pessoas enunciadas independem de orientação sexual” (artigo 5º, parágrafo único), ou seja, não faz diferença se a mulher agredida mantém relações com homem ou com mulher, os seus direitos estão assegurados de qualquer modo.

(33)

Outro fato importante que devemos nos atentar é o de que as mulheres que sofrem violência também podem sofrer violência institucional, ou seja, é um tipo de violência praticada pelas instituições privadas e públicas (delegacias, hospitais, entre outros) seja por ação ou omissão, na oferta dos serviços de atendimento. A mulher ao realizar a denúncia de sua agressão, caso a mesma seja recebida com grosserias e desrespeito, sendo discriminada e/ou mal atendida devido sua raça, cor, religião, classe social ou orientação sexual.

Também consideramos exploração sexual quando o indivíduo se beneficia ou tem lucro financeiro com a prostituição de outra pessoa, seja em troca de favores sexuais, incentivo a prostituição, turismo sexual ou rufianismo, mas popularmente conhecido com cafetino(a), que são pessoas que vivem à custa de outras que se prostituem. Neste caso, podem ser incluídas mulheres, jovens, crianças, idosas e adolescentes. Quando a prostituição acontece por desejo da mesma não é considerada uma forma de exploração sexual.

Por fim, a aplicabilidade da Lei amplia o acesso da mulher à justiça e reduz a impunidade. Além de propiciar a proteção das mulheres que são agredidas e permite que o seu agressor seja preso em flagrante. Para garantir a sua efetivação é importante fomentar a legislação, ampliando o seu conhecimento entre toda a sociedade, realizando campanhas que enfoquem a mudança de paradigma cultural para o combate da violência doméstica. A erradicação da violência deve ser um compromisso de toda a sociedade que deve recusar-se a conviver com essa situação degradante da mulher.

2.3. CENTRO ESPECIALIZADO DE ATENDIMENTO À MULHER (CEAM)

O Centro Especializado de Atendimento à Mulher é um importante equipamento de defesa na luta contra a violência feminina, onde a mulher encontra o suporte necessário para que a mesma rompa com o ciclo de violência. Esse rompimento compreende em uma decisão muito difícil, que pode levar anos até que a mesma decida de fato acabar com esse “ciclo vicioso” que a torna refém por muito tempo. Porém é muito importante que a mulher busque ajuda nos primeiros episódios das agressões, sejam elas, em menor ou maior grau, pois cada tipo de agressão requer uma atenção e atendimento diferenciados de acordo com suas especificidades. Por tal motivo, a mulher em situação de violência doméstica e familiar deve dirigir-se a uma Delegacia da Mulher (CEAM) e caso não exista deve comparecer a uma Delegacia Legal de sua cidade.

Referências

Documentos relacionados

Both the distribution of toxin concentrations and toxin quota were defined by epilimnetic temperature (T_Epi), surface temperature (T_Surf), buoyancy frequency (BuoyFreq) and

No presente estudo, catorze animais (34,15%) apresentavam algum tipo de parentesco procedente de oito diferentes propriedades rurais (26,66%), ora relacionado à vaca, ora ao touro,

Neste estudo foram estipulados os seguintes objec- tivos: (a) identifi car as dimensões do desenvolvimento vocacional (convicção vocacional, cooperação vocacio- nal,

Entre as atividades, parte dos alunos é também conduzida a concertos entoados pela Orquestra Sinfônica de Santo André e OSESP (Orquestra Sinfônica do Estado de São

Neste presente estudo foi aplicado um questionário sobre a aceitação de um dos seus detergentes comparado a dois concorrentes utilizando a escala ideal , além

- Remover as pastilhas usadas e retornar todo o parafuso de regulagem em seguida montar uma pastilha nova do lado da roda, empurrando com a mão a pinça no sentido do cilindro de

Este relatório técnico trata do processo ortorretificação de duas imagens Quickbird que faz parte de um amplo estudo, onde inferências espaciais foram feitas para dois bairros

A Lei nº 2/2007 de 15 de janeiro, na alínea c) do Artigo 10º e Artigo 15º consagram que constitui receita do Município o produto da cobrança das taxas