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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO COORDENAÇÃO DE ATIVIDADES COMPLEMENTARES E MONOGRAFIA JURÍDICA FRANCISCO SUDERLEY HOLANDA PEREIRA LEITE

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Academic year: 2018

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COORDENAÇÃO DE ATIVIDADES COMPLEMENTARES E MONOGRAFIA JURÍDICA

FRANCISCO SUDERLEY HOLANDA PEREIRA LEITE

A CONSTITUCIONALIDADE DO PODER REGULAMENTAR

DAS AGÊNCIAS REGULADORAS

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A CONSTITUCIONALIDADE DO PODER REGULAMENTAR

DAS AGÊNCIAS REGULADORAS

Monografia submetida à Coordenação de Atividades Complementares e Monografia Jurídica, da Universidade Federal do Ceará, como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Área de concentração: Direito Administrativo. Orientador de conteúdo: Prof. Paulo Martins dos Santos.

Orientador de metodologia: Prof. Flávio Gonçalves.

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A CONSTITUCIONALIDADE DO PODER REGULAMENTAR

DAS AGÊNCIAS REGULADORAS

Monografia submetida à Coordenação de Atividades Complementares e Monografia Jurídica, da Universidade Federal do Ceará, como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Administrativo.

Aprovada em ___ / ___ / ______.

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________ Prof. Paulo Martins dos Santos (Orientador)

Universidade Federal do Ceará – UFC

_______________________________________________ Adv. José Mairton Magalhães de Almeida Filho

Universidade de Fortaleza - Unifor

_______________________________________________ Adv. Rafael Costa de Sousa

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A minha Mãe e Débora

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À Débora pelo incentivo constante desde o vestibular; pelo desejo sincero no meu futuro, no meu sucesso; pelo amor, companheirismo, dedicação e atenção durante todo o curso.

À minha Mãe pelo apoio incondicional em todas as minhas decisões, pela credibilidade que sempre me conferiu, por todos os anos duramente empenhada no patrocínio dos meus estudos.

Às minhas irmãs Emanuelle e Evelyne pela companhia nos momentos de lazer. Ao professor Paulo Martins dos Santos, pela orientação.

Ao professor Luis Eduardo dos Santos, pelas sábias lições, sugestões e conselhos. Aos advogados e amigos José Mairton e Rafael Costa, pela disponibilidade na composição da banca examinadora e pela sincera amizade.

Aos advogados José Roberto de Carvalho, Marta Rejane de Carvalho Lima, Tiago Albano, Aureni Batista Aragão, Maria das Graças Dias de Sousa, pelos valiosos ensinamentos jurídicos.

Aos amigos e colegas da Faculdade de Direito da UFC, pelos inúmeros momentos de descontração.

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“Os primeiros passos são inúteis quando não se percorre o caminho até o fim.”

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Direito, sofreu grandes transformações. Durante o Estado Liberal, a conduta estatal era de interferir o mínimo possível no mercado. Os serviços tidos atualmente como públicos eram exercido pela iniciativa privada, sem a interferência pública. Em razão da crise do capitalismo, o Estado passou a ser Intervencionista, abarcando uma grande gama de serviços. Estávamos na era do Estado empresário. O Estado, entretanto, não conseguia arcar com tamanhos investimentos. Volta-se então a interferir menos no mercado. O Estado passa a conceder a execução dos serviços que antes estavam sob o seu monopólio para entes privados, mas sob o pálio do seu controle e fiscalização. Temos aqui a formação do Estado Regulador. No Brasil, o processo de desestatização ocorreu em meados da década de 90. Inúmeros serviços e obras foram privatizados, concedidos e autorizados a empresas privadas. A complexidade, o dinamismo e o tecnicismo dessas áreas demandavam uma nova forma de regramento. Com o fim de aplicar o princípio da eficiência, de manter a qualidade dos serviços, a modicidade das tarifas, são então criadas as Agências Reguladoras. Essas autarquias especiais exercem inúmeras funções com uma considerável autonomia, entre elas a normativa. Esse poder normativo das Agências Reguladoras inclui o Poder Regulamentar. Tal atribuição levantou críticas quanto a sua constitucionalidade. A edição de regulamentos por tais entes, entretanto, encontra-se perfeitamente compatível com os princípios constitucionais da separação dos poderes, da legalidade, bem como não viola uma competência exclusiva do Chefe do Executivo. Quanto ao princípio da separação dos poderes, temos na atualidade uma revisão da teoria clássica, na qual se dá prioridade ao critério material em detrimento do orgânico. O princípio da legalidade encontra-se em perfeita harmonia com a teoria da delegificação. Por fim, a competência para edição de regulamentos não é uma atribuição exclusiva do Chefe do Executivo, podendo sim ser conferida a outras entidades. Desta forma, através de uma pesquisa doutrinária e jurisprudencial, defende-se neste trabalho a constitucionalidade do Poder Regulamentar das Agências Reguladoras.

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INTRODUÇÃO...10

1 INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ECONOMIA: BREVE HISTÓRICO E SISTEMÁTICA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA...13

1.1 Estado Liberal...13

1.2 Estado Intervencionista...16

1.3 Estado Regulador...18

1.4 Sistemática Constitucional brasileira de intervenção do Estado na economia...21

2 ESTADO REGULADOR BRASILEIRO...24

2.1 Formação do Estado Regulador Brasileiro...24

2.1.1 O Estado Desenvolvimentista: de 1930 a 1980...25

2.1.2 Redemocratização – surgimento do Estado Regulador...27

2.2 Função Regulatória...29

3 REVISÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO...34

3.1 O Estado Democrático de Direito...34

3.2 Separação dos Poderes...36

3.2.1 Crítica ao Critério Orgânico para Determinação dos Poderes...39

3.3 Princípio da legalidade...41

4 PODER REGULAMENTAR...45

4.1 Concepções preliminares...45

4.2 Espécies de Regulamento...47

4.2.1 Regulamento de Execução...47

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5 AGÊNCIAS REGULADORAS...50

5.1 Concepções preliminares...50

5.2 Panorama norte-americano...50

5.3 Panorama brasileiro – principais características...53

5.4 Agências Reguladoras Existentes no Brasil...55

6 CONSTITUCIONALIDADE DO PODER REGULAMENTAR DAS AGÊNCIAS REGULADORAS...56

6.1 O Poder normativo das Agências Reguladoras...56

6.2 Atribuições das Agências Reguladoras e a Separação dos Poderes...59

6.2.1 A descentralização normativa...61

6.3 O Poder Normativo das Agências Reguladoras e os Princípios do Estado Democrático de Direito...62

6.4 Poder Regulamentar das Agências Reguladoras e o Princípio da Legalidade...63

6.4.1 Teoria dos Atos Normativos das Agências Reguladoras Enquanto Regulamentos Autônomos...64

6.4.2 O Poder Normativo das Agências Reguladoras enquanto Manifestação de Poderes Discricionários...65

6.4.3 Delegificação...66

6.5 O caráter não exclusivo da competência regulamentar do Chefe do Poder Executivo...70

CONSIDERAÇÕES FINAIS...71

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Após o surgimento do Estado Regulador, e notadamente do movimento de desestatização ocorrido principalmente em meados da década de 90, iniciado no Governo Collor e fortalecido no Governo FHC, em que se punha para os particulares o exercício de vários serviços públicos antes atribuições estatais exclusivas, surgia para o Estado a necessidade criar instrumentos eficazes para o controle dos novos prestadores de serviço. O Estado permanecia titular de tais serviços, mas a execução na prática estava com a iniciativa privada. Desta forma seria imperioso, em busca da satisfação do interesse geral coibir eventuais abusos e alcançar a eficiência na execução de complexas atividades econômicas como o fornecimento de energia, água, serviço de coleta de lixo, serviço de esgoto, entre outros.

Organismos estatais “presos” ao aparato burocrático não seriam adequados para tratar com as peculiaridades da matéria econômica, a dinamicidade e complexidade da sociedade, bem como o tecnicismo das áreas reguladas. Foram então instituídas as agências reguladoras, que são autarquias especiais, independentes, qualificadas tecnicamente com a função precípua de regular e fiscalizar os assuntos atinentes a suas respectivas esferas de atuação.

Cada um desses entes foi devidamente criado por lei específica. Neste trabalho, citamos as criadas pela União, quais sejam: a Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL –, a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL –, a Agência Nacional do Petróleo – ANP, a Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT –, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS – e a Agência Nacional de Águas – ANA. No Ceará, a ARCE – Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Estado do Ceará.

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exercício do Poder Regulamentar. Através de regulamentos, por serem mais comodamente modificáveis, essas autarquias estariam efetivando o princípio da supremacia do interesse público, adequando o teor das normas às novas realidades, buscando a efetivação do princípio da eficiência na prestação dos serviços públicos, mas sempre preservando seus valores e fins. Ora, diante da complexidade da vida moderna, lei elaboradas há dezenas de anos convertem-se em assuntos para especialistas, convertem-sem aplicabilidade precisas, importando em inúmeras contradições pelos atingidos.

A existência desses entes em nosso Ordenamento Jurídico com atribuições típicas dos três poderes, notadamente do poder normativo, conduziram ao registro na jurisprudência e na doutrina de questionamentos sobre a sua constitucionalidade frente ao princípio da separação dos poderes, da legalidade, da invasão de uma competência tida como exclusiva do Chefe do Executivo.

Em suma, passaram a ser feitas as seguintes indagações: estaria havendo atividade criativa do direito? Ou seja, estaria havendo a violação ao princípio da legalidade e ao da reserva legal? Estaria havendo a indevida invasão de um poder sobre o outro? Enfim, existira constitucionalidade no poder-dever de um ente da Administração Pública editar normas a serem fielmente obedecidas pelos entes regulados? Por outro lado, interpretando-os como constitucionais e legais, haveria violação a uma atribuição privativa dos Chefes do Poder Executivo?

Essas serão as questões que tentaremos elucidar com o maior esmero possível nesta monografia, mas sem a pretensão audaciosa de exaurir o tema, nem de conferir caráter de definitividade às considerações finais obtidas. Desde já, antecipamos que defenderemos nesta monografia a constitucionalidade do poder regulamentar das agências reguladoras.

A linha que divide a lei dos atos administrativos de cunho normativo a uma primeira impressão parece ser por demais tênue. Não são poucos os esforços de grandes doutrinadores na tentativa de discriminar características específicas para cada um dos dois tipos. A discussão, como poderia aparentar a primeira vista, não é restrita ao meio universitário. Suas conclusões refletem diretamente no meio jurídico.

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com função principal de otimizar, especificar, facilitar a aplicação das leis. Toda a atividade regulamentar só tem validade se subordinada à lei. O regulamento não pode extrapolar, nem modificar dispositivos estritamente prescritos em lei.

A lei criadora de determinada agência reguladora, através da utilização da teoria adotada do Direito Francês da delegificação, simplesmente reduz o grau hierárquico de determinada norma para o nível infra-legal, possibilitando, assim, que a Administração Pública discipline a matéria "enfraquecida" via regulamento. A fonte da obrigação, portanto, seria sempre a lei, e nunca o regulamento. Tanto assim que a superveniência de lei em sentido contrário à regulamentação poria este por terra. Não há interferência de um poder sobre o outro; nem muito menos a delegação da função legisferante.

É bem verdade que o poder regulamentar foi concebido originalmente como atribuição privativa dos Chefes do Poder Executivo. A reserva feita pelo legislador constituinte, entretanto, não tem caráter absoluto. Há a faculdade de determinada lei delegar tal poder a outras autoridades públicas ou a entes descentralizados.

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BRASILEIRA

Desde o surgimento do Estado Moderno, e a conseqüente compreensão de uma sociedade mais complexa, mais comercial, mais burguesa, que repugnava os conceitos estáticos da sociedade feudal, tivemos a condução de políticas públicas maciças no que se refere à atuação do Estado na economia com o fito de alcançar o bem comum da sociedade. Como provedor do interesse geral, o Estado passou a perceber que o desenvolvimento nacional estava diretamente relacionado com a economia e deveria adotar a melhor conduta possível para que esta se fortalecesse.

Em todas as modalidades de Estados que surgiram no decorrer da formação do Estado Democrático de Direito, como hoje constituído, a exemplo, Estado Liberal, Estado Social, Estado do Bem-Estar Social - Welfare State, Social-Democracia, Estado Neoliberal, tivemos nuances variadas da participação do Estado no domínio econômico. Desta forma tivemos três fases distintas no contexto da atividade estatal na economia: Estado Liberal, Estado Intervencionista e Estado Regulador

Neste primeiro momento do presente trabalho passaremos a apresentar as principais características de cada um desses modelos.

1.1 Estado Liberal

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do Mercantilismo. Tal sistema, fundado no metalismo, nas adoção de barreiras alfandegárias, na busca insaciável de novos mercados (colonialismo) e na balança comercial favorável, tinha a finalidade de fortalecer o Estado e possibilitar que o Rei alcançasse suas finalidades, concentrando em si o máximo de poderes possíveis. Aos poucos, entretanto, o Monarca se sobrepôs de poderes, impossibilitando o desenvolvimento da sociedade burguesa, já que o Estado, além de controlar absolutamente todo o mercado, impunha uma carga tributária desmesurada a seu critério.

Sob a influência da Revolução Industrial de 1750 e dos princípios aclamados pelos ideais da Revolução Francesa de 1789 e da Norte-Americana de 1798, surge o Estado Liberal. O primeiro desses modelos foi marcado pela intervenção mínima do Estado na economia. Contra os excessos praticados no período do Absolutismo, o Estado agora deveria ser mínimo. O Estado Absenteísta defendia como uma forma de auto-limitação que as relações de direito privado fossem regidas pela mais ampla liberdade, defendendo sempre a propriedade privada, ficando-lhe atribuído apenas funções reduzidas, confinadas à segurança, justiça e serviços essenciais. Para os interesses da burguesia, principal classe responsável pelas revoluções, era mais conveniente esse modelo de Estado uma vez que só interferiria na esfera privada para defender exatamente os seus interesses, quais sejam, a propriedade privada.

Formava-se uma espécie de bipartição em compartimentos estanques do público e do privado. Existe neste modelo uma repartição bastante clara entre o que seria público, (cidadania, segurança jurídica, representação política) e o privado, mormente, a vida, a liberdade, a individualidade familiar, a propriedade, o mercado (trabalho e emprego capital).

Como já mencionamos, para que a burguesia alcançasse seus objetivos econômicos, era necessário que o Estado fosse mínimo. Muitos foram os pensadores que abraçaram a teoria da intervenção mínima do Estado durante esse período. Segundo Adam Smith, principal defensor do liberalismo econômico, e a teoria da “mão invisível”, o Estado não deveria interferir na economia, que deveria ser regida somente pelo próprio mercado.

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produtores tem-se a maximização do bem-estar da sociedade em seu conjunto. Curioso salientar, que a expressão “mão invisível” historicamente adotada para essa política econômica estatal nunca foi utilizada por Adam Smith.

Apesar de parecer um paradoxo, foi durante o Estado Liberal que surgiria pela primeira vez na história a noção de serviço público como atribuição do Estado a ser exercida em atendimento a necessidade coletiva. O conceito de serviço público seria, inclusive, o principal parâmetro para a divisão entre direito público e privado. Estes serviços públicos eram exercidos pelo Estado de forma tímida, caracterizada pela prestação de serviços essenciais. A grande maioria dos serviços ficava a cargo de entes privados através de regime de concessões. Entre esses entes privados e os indivíduos se estabelecia relações privadas, o que condicionava a interferência mínima do Estado, que existia com o único intuito de preservar a liberdade de cada parte envolvida.

Com o decorrer do tempo, passou-se a perceber que esse sistema não satisfazia aos fins almejados pelos representantes da massa, a maioria da sociedade.

Em decorrência de uma segunda fase na revolução industrial (metade do século XIX ao início do século XX), marcada pela industrialização desenfreada, aumentou o número de grupos empresariais detentores dos meios de produção, aumentou ainda a concentração de riquezas e a diminuição da possibilidade de concorrência, uma vez que se instauravam inúmeros monopólio privados com trustes e cartéis mundiais. Por conseguinte, aumentaram-se os problemas sociais provenientes da ausência de um poder que pudesaumentaram-se reduzir a desmedida atuação dos indivíduos e a acumulação de riquezas nas mãos da pequena minoria detentora dos meios de produção. Surgiram, então, inúmeros movimentos sociais revolucionários.

Por outro lado, em decorrência do “Crack da bolsa de Nova York” em 1929, por motivos relacionados diretamente a 1ª Guerra Mundial e ao crescimento econômico americano, o capitalismo entrava em colapso, derrubando a economia de todos os países. Caia por terra o ideal de um Estado mínimo.

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processo no qual a liberdade individual e econômica cedia espaço para o Estado que pretendia promover a igualdade material entre os indivíduos.

1.2 Estado Intervencionista

A formação ideológica do modelo de Estado Social, primeiro modelo de Estado Intervencionista, teve seus antecedentes delineados ao longo de 80 anos. Entre outros, tiveram fundamental importância: revoluções européias do ano de 1848, Comuna de Paris em 1871, Revolução Mexicana de 1910 e a Revolução Russa de 1917.

O Estado Social foi marcado por inúmeras conquistas da classe operária, que reunida em inúmeros movimentos políticos revolucionários (o mais conhecido entre nós é o anarquismo), conseguiram a implementação dos direitos sociais em diversas áreas da sociedade.

O “New Deal”, muitas vezes tido como a data de origem deste modelo de Estado, foi na verdade um marco histórico já posterior a sua formação histórica. O denominado “New Deal” (1933-1938) foi um plano econômico de restauração da economia americana, que havia sido abalada pela quebra da Bolsa de Nova York. O mencionado plano, elaborado no período do Governo de Franklin Delano Roosevelt fundamentado nos princípios do economista John Maynard Keynes, significou o marco econômico do Estado Social. Entre outras diretrizes, pautava-se principalmente na realização de grandes obras públicas para geração de empregos, fixação de preços mínimos para o petróleo, carvão e produtos agrícolas, com o objetivo de estimular a produção.

Conforme Vinício C. Martinez (2006, on line):

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Como se percebe pelos marcos expostos, para a formação do Estado Social comungaram diversos fatores, provindo de três vertentes. Primeiramente, o capitalismo expansivo formava um grande número de cartéis, monopólios e trustes que impossibilitava o desenvolvimento social; por outro lado, pela própria natureza do modelo de capitalismo adotado, o mundo passou por uma grande depressão, que culminou na crise de 1929; o modelo imperialista também mostrava a profundeza de suas mazelas. De outro lado, os movimentos sociais e trabalhistas cresciam em todo mundo, culminando com o aparecimento de países socialistas, notadamente a URSS, do fascismo na Itália e do Nazismo na Alemanha.

Após anos de liberalismo, no qual o Estado se preocupava apenas com a segurança, intervindo minimamente no mercado, agora se procedia o desenvolvimento do processo de redirecionamento das funções do Estado e de reapropriação do Direito pelas camadas sociais populares. Não se buscava mais um modelo de Estado opressor, mas um Estado que garantisse a liberdade ou autonomia.

O Estado Social começava a agregar um infinito número de papéis, acumulando funções assistencialistas, paternalistas, previdenciárias, intervencionistas na economia, concedendo determinados benefícios aos grupos de oposição, para se sustentar a classe burguesa a nível político.

O Estado do Bem Estar Social (Welfare State), por sua vez, também pode ser caracterizado como um Estado intervencionista, guardadas as devidas distinções com o modelo que o precedeu. Teve o Plano Marshall (1947) como seu marco principal. Nasceu no momento histórico do fim da Segunda Guerra, quando a Europa estava inteiramente devastada pelas batalhas, e era imperioso para a economia mundial que se procedesse a sua reestruturação. Este modelo perdurou até o fim dos anos 70 do século passado.

O que existia agora era a necessidade de depurar o avanço das campanhas socialistas provindas da URSS. Esse modelo de Estado era essencialmente capitalista.

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Estado empresário. Por este motivo é que esse modelo ganha também a denominação de Estado Providência. Num primeiro momento, foi possível arcar com praticamente todos os serviços públicos e a produção de bens tidos como essenciais ao Estado

Nessa ocasião, o Executivo passa a ser fortalecido, começando a receber funções normativas, para atender à necessidade de regulação. Percebemos o início de grandes transformações no direito público, expressada na descentralização do aparato estatal, na relativização do modelo hierárquico e, por conseguinte, na pluralização das fontes de produção normativa, não mais concentradas no poder legislativo.

O Estado Intervencionista era um modelo com gastos exorbitantes. Havia sempre a necessidade de se aumentar os quadros de servidores, os investimentos, a formação e o financiamento de novos entes estatais. Em razão das vultuosas somas despendidas pelo Estado, havia a necessidade do aumento da carga tributária. Por outro lado, percebia-se a baixa qualidade e produtividade dos bens produzido e dos serviços prestados. Aos poucos, o Intervencionismo se mostrava como modelo insuficiente aos interesses da sociedade.

Desta forma, o Welfare State mostrou que não conseguiria resolver os problemas e as mazelas do capitalismo. O endividamento estatal, a ineficiência na prestação de serviços e a burocratização que travara a Administração, levaram esse modelo ao declínio. A partir de então, viu-se a necessidade de uma revisão da atuação do Estado na economia.

1.3 Estado Regulador

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Por outro lado a gestão direta dos serviços públicos impedia a ampliação da concorrência e da eficiência na prestação desses serviços. Consumava-se a necessidade de retornar a ideologia da liberdade de mercado, bem como adotava-se o princípio da subsidiariedade.

Conforme Marcos Juruena Villela Souto (2002, p.31):

O surgimento do Estado-regulador decorreu de uma mudança na concepção do conteúdo do conceito de atividade administrativa em função da subsidiariedade e da crise do Estado bem-estar incapaz de produzir o bem de todos com qualidade e a custos que possam ser cobertos com o sacrifício da sociedade. Daí a descentralização de funções públicas para particulares.

A sociedade ficaria desamparada na continuidade do modelo anterior. Procurando uma solução, o Estado mais uma vez adota uma função subsidiária. Estabelecendo uma espécie de parceria, passa a atribuir determinadas funções para a iniciativa privada. Começa a partir de então um fenômeno mundial, a desestatização. O Estado permaneceria com as suas funções de soberano, indelegáveis por natureza. Esse processo não ocorreu de modo desmedido, pois a experiência do liberalismo demonstrou que o mercado não poderia ser inteiramente livre, e que certas atividades não poderiam ser bem exercidas livremente pelos particulares. O Estado necessitava regular, fiscalizar e fomentar essas atividades.

Em obediência a essa subsidiariedade, o Estado deveria concentra-se somente naquilo que é essencial, repassando a iniciativa privada as demais atividades, seja pelo regime da livre iniciativa, seja pelo regime de direito público. Importante nesse azo é salientar a existência de uma certa crise na concepção do que seria serviço público. Com o surgimento do Estado regulador, o que passou a interessar foi a noção de serviço econômico de interesse geral. Desta forma, o importante não é saber quem seria o titular do serviço público, mas a maneira como ele é regulado.

O Estado não poderia retroagir para o seu caráter mínimo que marcou o liberalismo, mas também não poderia continuar arcando com os vultuosos gastos do intervencionismo exagerado do Welfare State. Era necessário evoluir, mas mantendo os progressos conquistados até então.

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mesmo paradigmas de espaço e tempo de outrora, sem contar com a latente necessidade de se gerir a riqueza capitalista contemporânea.

A nova ordem econômica exigiu do Estado que ele adequasse suas estruturas políticas a tal contexto. Desta forma, o Estado que antes em nada intervinha, e depois em tudo intervinha, passou a apenas regular e fiscalizar as atividades que agora estavam sendo realizadas por particulares. Passou ainda a balizar a concorrência, a fomentar a oferta de serviços e a criar oportunidades para o desenvolvimento da atividade privada, incentivando também o desenvolvimento tecnológico.

Para ajustar a economia nacional à estrutura globalizada, principiou-se a regulação de setores fundamentais para o fortalecimento e aumento da competitividade dos países no mercado internacional, criando ainda canais de acesso dos particulares às atividades controladas pelo Estado.

As privatizações foram sendo efetuadas em setores estratégicos para as economias nacionais. Concomitantemente, o Estado criava instrumentos, entes que fiscalizassem os particulares. O movimento foi de tal forma, que houve a necessidade de uma considerável autonomia a esses entes em relação ao chefe do Poder Executivo. Desta forma, passaram a exercer funções de supervisão e normatização dos serviços públicos. A especialidade de cada setor demandou a feitura de ordenamentos setorizados em cada área regulada. O instrumento normativo passa a ser a principal ferramenta da intervenção estatal na economia.

O aparato necessário a essa função vem com a criação das agências reguladoras. A regulação constitui, assim, traço de um modelo econômico caracterizado pela intervenção estatal fundada não no exercício da atividade, mas sim em sua autoridade.

1.4 Sistemática Constitucional brasileira de intervenção do Estado na economia

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opção pelo sistema capitalista está expressa no artigo 173 da Carta Magna, quando está enunciada a excepcionalidade da exploração direta da atividade econômica pelo Estado.

Antes de adentrarmos especificamente no tema da intervenção estatal no domínio econômico, imperioso faz-se trazer à baila uma prévia distinção entre os serviços públicos, especialmente os de cunho econômico e social, e as atividades econômicas.

A atividade econômica, no regime capitalista, é desenvolvida através da livre iniciativa, mas com respeito à justiça social, a valorização do trabalho e o desenvolvimento nacional. Os serviços públicos, por seu turno, são por natureza estatais. Desta forma, estará sempre sob o regime jurídico de direito público. A titularidade é sempre do Estado, mesmo nos serviços de conteúdo econômico (art. 21, XI e XII, CF/88).

A distinção preliminar é importante para que possamos entender num primeiro momento os limites das empresas estatais, pois estas diferenciam-se entre si exatamente entre as que prestam serviços públicos (Correios e Telégrafos) e as que exploram atividades econômicas (Petrobrás). As primeiras entram no conceito de descentralização de serviços pela personalização da entidade prestadora, podendo a União explorar tais atividades diretamente ou mediante os regimes de autorização, concessão e permissão. Cabe à Administração, no gozo de seu Poder Discricionário, decidir se explora diretamente ou através da iniciativa privada.

A limitação constante no art. 173 refere-se à exploração da atividade econômica e não a de serviços públicos. Portanto, reafirmando, não haverá preferência no caso dos serviços públicos para a iniciativa privada. A natureza das empresas estatais prestadoras de serviços públicos se assemelha às concessionárias de serviços públicos, guardadas as devidas peculiaridades. A Constituição, inclusive, na medida do possível, tenta fazer uma simetria entre as empresas estatais e as privadas prestadoras de serviços públicos.

Por conseguinte o artigo 174, traz a pretensão da criação de entidade reguladora, com atribuições normativas no que se refere a tais atividades. Existe em tal dispositivo o fundamento jurídico da função reguladora, que abordaremos mais a frente.

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da efetivação das políticas de desestatização. Desta forma, não adentraremos nos procedimentos hodiernos das privatizações, concessões, permissões, autorizações, parcerias público-privadas.

Pelo exposto, percebemos que o Estado brasileiro atua na economia de forma direta nas atividades tipicamente econômicas ou de forma indireta, como Estado normatizador e regulador das atividades econômicas. Conforme José Afonso da Silva (2005, p. 804):

Pode-se manter, em face da atual Constituição, a mesma distinção que surtia das anteriores, qual seja a de que ela reconhece duas formas de ingerência do Estado na ordem econômica: a participação e a intervenção. Ambas constituem instrumentos pelos quais o Poder Público ordena, coordena e atua a observância dos princípios da ordem econômica tendo em vista a realização de seus fundamentos e de seu fim.

A exploração estatal da atividade econômica dá-se através dos monopólios e das atividades tidas como necessárias em razão da segurança nacional ou interesse coletivo relevante. Tal exploração dá-se através das empresas públicas, sociedade de economia mista e outras entidades estatais e paraestatais.

A intervenção propriamente dita do Estado no domínio econômico muitas vezes é tida como qualquer forma de atuação do estado na atividade econômica ou na prestação de serviços. A Constituição de 1988 não repudia essa definição. A distinção correta, entretanto, é bem explanada por José Afonso da Silva (2005, p. 807):

Duas modalidades de atuação estatal – a participação e a intervenção, tomada esta ultima em sentido restrito. A primeira com base nos arts. 173 a 177, caracterizando o Estado administrador de atividades econômicas; a segunda fundada no art. 174, em que o Estado aparece como agente normativo e regulador da atividade econômica, que compreende a função de fiscalização, incentivo e planejamento, caracterizando o Estado regulador, o Estado promotor e o Estado planejador da atividade econômica.

Em suma, o Estado atua no domínio econômico de duas formas: a direta e a indireta. Pela forma direta, como participante, ou seja, como Estado empresário, ele explora os monopólios, as atividades tidas como necessárias, quando presentes os imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo. Por outro lado, pode atuar indiretamente, intervindo, disciplinando a ordem econômica, respeitando certos princípios e certas metas a se alcançar. Neste ponto, faz-se importante colacionar o artigo 170 da Constituição:

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I - soberania nacional;

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade;

IV - livre concorrência;

V - defesa do consumidor;

VI - defesa do meio ambiente;

VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

VIII - busca do pleno emprego;

IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País

O Estado intervém na economia, pelo teor do art. 174, conforme explanado por José Afonso da Silva, como Estado regulador, Estado promotor e Estado planejador da atividade econômica. A primeira dessas modalidades de intervenção será objeto mediato desta monografia

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2.1 Formação do Estado Regulador Brasileiro

Durante a maior parte do século XX, vivemos no Brasil sob a égide de uma forte intervenção estatal na economia. Vivemos sob 20 anos de regime militar, com mais 15 anos de Getúlio Vargas, sem contar com anos de leis que inibiam a livre iniciativa e fechavam o país a investimentos provenientes do exterior.

A formação do intervencionismo brasileiro configurava-se primordialmente pela existência de inúmeros monopólios. Existia no Brasil um verdadeiro Estado empresário. Dono de inúmeras empresas, o Estado dominava a exploração de petróleo, a geração e distribuição de energia elétrica, serviços de telefonia, gás, entre inúmeros outros.

Esse modelo de Estado proporcionava, notadamente com o intuito de obter uma maior arrecadação de impostos, a formação de um verdadeiro clientelismo e um complexo esquema de troca de favores, uma vez que as pessoas que estavam à frente dessas empresas utilizavam o seu poder e sua influência como verdadeira moeda de troca, para angariar mais poder, de cunho eleitoreiro ou mesmo para outros projetos pessoais; gerava ainda muita corrupção, uma vez que a fiscalização da empresas estatais era feita pela própria estrutura estatal.

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Era o fim da fase intervencionista com um Estado executor de um grande número de atribuições, ou seja do Estado empresário. A partir de agora, passaria a existir um Estado fiscalizador, o denominado Estado Regulador. Os monopólios, em sua ampla maioria, eram desfeitos, e os serviços que antes eram de sua titularidade agora passaram a iniciativa privada. Concomitantemente, passou a existir o Direito Regulatório, uma junção de Direito constitucional, econômico e administrativo, regendo a atuação das agências reguladoras, permissionários, concessionários e os usuários.

2.1.1 O Estado Desenvolvimentista: de 1930 a 1980

O Brasil vivia em um cenário político extremamente instável por volta da década de 30. Até meados da daquele ano, existia no Brasil a política do café-com-leite, na qual era procedida uma alternância no poder entre paulistas e mineiros. Por uma série de motivos não pertinentes a esta monografia, passou a existir um grande inconformismo por parte de uma série de outros estados. Tal sentimento conduziu a formação de um movimento revolucionário articulado pelos estados do Rio Grande do Sul, Paraíba e Minas Gerais que conduziu a perpetração de um golpe que levou Getúlio Vargas a Presidência da República.

A eleição de 1930 levou Júlio Prestes, candidato indicado pelo Governo de Washington Luís, à vitória em um pleito marcado por inúmeras denúncias de fraudes. Júlio Preste, entretanto, nunca tomaria o poder. O presidente seria Getúlio Vargas através de um levante iniciado no Rio Grande do Sul.

(27)

Aprofundaram-se e consolidaram-se as diretrizes de Getúlio Vargas através de um outro golpe, que conferiu maiores poderes ao presidente, através de um regime ainda mais autoritário. Tratava-se do Estado Novo.

Durante o Estado Novo, estavam alicerçadas as bases para o desenvolvimento do Estado Desenvolvimentista. A característica mais marcante deste período foi o incentivo considerável ao desenvolvimento dos assuntos relativos à terra e aos bens de capital, como máquinas e equipamentos. Getúlio criaria ainda o DASP – Departamento de Administração do Serviço Público, a Voz do Brasil, desenvolveria os direitos trabalhistas e daria início ao chamado “populismo”.

A partir de 1950, ano em que Getúlio Vargas retornaria ao poder através de eleições diretas, “nos braços do povo”, era iniciada no Brasil uma fase industrial. Foi durante este período que se iniciou a campanha nacionalista pelo petróleo e pela Petrobrás, bem como houve a criação do Banco Nacional do Desenvolvimento – BNDE.

Vargas continuava com sua política intervencionista, mas voltada principalmente para a indústria nacional. O capital que financiaria essa atuação do Estado, segundo as diretrizes de seu Governo, deveria ser proveniente do próprio Estado e de capital privado nacional.

O suicídio de Vargas e a ascensão de Juscelino Kubitschek à Presidência da República conduziram o Brasil a uma nova fase. A partir de então o capital estrangeiro passou a ter caminho livre para adentrar no território nacional, financiando o industrialismo brasileiro, com a instalação de inúmeras indústrias multinacionais. O Brasil conheceu durante o Governo de JK um efetivo desenvolvimento econômico, marcado principalmente pela participação do capital internacional.

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O primeiro desses grupos, do qual faziam parte Médice e Costa e Silva implantou no país um regime com maior abertura econômica, no qual existia o apoio à livre iniciativa e ao ingresso de capital estrangeiro no país

Com a ascensão de Geisel ao poder, o país voltou a adotar uma política intervencionista rígida. Tratava-se de uma brusca mudança na política econômica em busca do desenvolvimento. Não mais privilegiava o ingresso de capital estrangeiro nem a livre iniciativa. O regime de Geisel adotou como diretriz governamental na área econômica angariar empréstimos internacionais para financiar empresas estatais. Nessa época a dívida externa disparou

Márcio Challegre Coimbra (2001, p. 39):

Assim como Getúlio Vargas, Geisel baseou o seu governo no desenvolvimentismo estatal pleno. Como prova cabal da política intervencionista estatal praticada no período de Geisel, vale ressaltar o fato de que em seu governo foram criadas 52 empresas estatais. O governo, mais uma vez, estava bancando o desenvolvimento do Estado.

Apesar de ser um regime que combatia fortemente o comunismo e todo o modelo político soviético, o regime militar adotava uma conduta semelhante à adotada na União Soviética. E, assim como ocorreu naquele país, o regime também faliu aqui. Pelo prisma da política, a sociedade não mais aceitava um regime que era inteiramente contra as liberdades individuais. Em relação à economia, o Brasil não poderia mais suportar os vultuosos gastos necessários para sustentar a atuação estatal, as empresas, e todo o investimento necessário para a geração do desenvolvimento.

2.1.2 Redemocratização – surgimento do Estado Regulador

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O governo de Fernando Collor de Mello foi marcado pela queda do modelo intervencionista, do Estado Desenvolvimentista e pelo surgimento do Estado Regulador Brasileiro. Nessa época, se inicia a desestatização, as leis começam a ficar mais flexíveis e a intervenção do Estado passa a ser bem menor. A Lei nº. 8.031/90 apresentou as primeiras linhas a esse novo papel do Estado. No período do Governo FHC, com a Lei nº. 9.491/97, foi consolidado efetivamente no Ordenamento Jurídico Brasileiro o “Programa Nacional de Desestatização”

Nas palavras de Paulo Roberto Ferreira Motta (2003, p. 06):

A atual reforma do Estado brasileiro começa, de fato e de direito, durante o governo de Fernando Collor de Mello, por meio da Medida Provisória n. 155, editada em 15 de março de 1990, rapidamente aprovada e transformada na Lei n. 8.031, de 12 de abril de 1990. Estava criado o Programa Nacional de Desestatização, que pretendia a reordenação da posição estratégica do Estado na economia, transferido à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público; visando reduzir a dívida pública, concorrendo para o saneamento das finanças do setor público e a retomada de investimentos nas empresas e atividades que viessem a ser transferidas à iniciativa privada, com a modernização do parque industrial do País, ampliando a sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia; permitindo que a Administração Pública concentrasse seus esforços nas atividades em que a presença do Estado fosse fundamental para a consecução das prioridades nacionais, bem como para o fortalecimento do mercado de capitais, através do acréscimo da oferta de valores mobiliários e da democratização da propriedade do capital das empresas que viessem a integrar o Programa.

Conforme já havíamos afirmado, essa política foi consolidada com o governo de Fernando Henrique Cardoso a partir de 1994.

Conforme Márcio Challegre Coimbra (2001, p. 40):

Em resumo, com a crise e falência do Estado Desenvolvimentista iniciado por Getúlio Vargas no Brasil e que resistiu até meados da década de 80, surge uma nova forma de atuação do Estado, tanto no âmbito nacional, quanto no internacional. O modelo intervencionista gerou um crescimento da dívida, o que estrangulou o Estado, que como conseqüência não conseguiu mais manter o mesmo nível de investimento. Logo, com vistas a diminuir a dívida pública e fornecer algum tipo de liberdade econômica, nasce o “Estado Regulador”

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atuação dessas empresas particulares, configurando-se não mais como um Estado Interventor, mas agora como um Estado Regulador.

Com o surgimento do Estado Regulador, a sociedade passou a conviver com uma nova forma de prestação de serviços públicos. A partir de então, tais serviços passaram a ser exercidos de duas formas: direta e indireta. A forma indireta é caracterizada por quatro institutos de direito administrativo: concessão, permissão, autorização e terceirização. As empresas particulares passaram a atuar como uma longa manus do Estado. Com a quebra dos monopólios, o Estado passa a não ser mais o único executor dos serviços públicos.

A esse movimento, seria mais apropriado a denominação desestatização, uma vez que englobaria não somente as privatizações (nas quais o Estado se retira completamente da prestação dos serviços públicos), mas também as concessões, permissões, autorizações e terceirizações

A substituição do setor privado pelos espaços antes ocupados pelo poder público acarretou no surgimento de novas estruturas administrativas e de novas categorias de normas, quais sejam, as agências e as normas reguladoras.

2.2 Função Regulatória

Com a impossibilidade do Estado atender todas as necessidades públicas, a opção adotada foi a quebra dos monopólios, e, consequentemente, através dos instrumentos necessários, conceder à iniciativa privada a execução dos serviços e obras públicas. A atividade do Estado, neste azo, é resumidamente orientar e acompanhar como os serviços públicos que passam a ser exercidos. Reside aí, de forma bastante sintética, a concepção de função regulatória.

Para Ismael Matta (1996 apud MOTTA, 2003, p. 48):

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Segundo Marcos Juruena Vilela Souto (2002, p. 37), o mecanismo da função regulatória se desenvolve da seguinte maneira:

[...] envolve o recebimento do poder político pela autoridade eleita, com as instruções de atendimento do interesse geral (mediante o acolhimento de um determinado programa político no processo eleitoral; o agente político formula a política pública que, para atender o interesse geral, deve ser executada com eficiência; aí entra a atividade regulatória, expedindo diretrizes para a eficiente implementação da política pública sufragada. Esse o limite da função regulatória, traduzindo em comandos técnicos a orientação normativa, executiva ou judicante, para a implementação de uma política pública. Não há, pois, discricionariedade ampla na atuação dos agentes econômicos, mas mera integração técnica do comando legal que reflete uma decisão política.

Para Tony Posner (1997 apud SOUTO, 2002, p. 38), a regulação seria:

[...] um conjunto de atos de controle e direção de acordo com uma regra, princípio ou sistema, que se desenvolve por intermédio de normas legais e outras medidas de comando e controle, caracterizadores da intervenção pública que afeta a operação de mercados e as decisões econômicas das empresas, normalmente pelas restrições de mercados.

Várias são as concepções para regulação, mas pela pesquisa realizada pode-se constatar que a maioria dos doutrinadores de renome que discorreram sobre o tema, apesar de emanações próprias, caminham no mesmo sentindo. A função regulatória é aquela na qual o Estado controla e fiscaliza as atividade na economia de interesse geral, aqui, notadamente os serviços públicos exercidos pelos particulares através de instrumentos normativos e executivos, em razão da sua não participação direta na economia. À essa função do Estado, pode-se fazer uma repartição em dois modelos básicos: a função normativa e a operacional.

Conforme José Eduardo Bustamante (1993 apud SOUTO, 2002, p. 39) haverá três tipos de regulação: a regulação controle, que tenha o escopo de impedir a conduta abusiva dos prestadores de serviços; a regulação de solidariedade, podendo também ser denominada de regulação paternalista, tendo por diretrizes a proteção do trabalhador e dos consumidores; e, por fim, a regulação de fomento, com o objetivo de apoiar o desenvolvimento de determinados setores, em defesa de valores atendidos de forma insuficiente no mercado.

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Art. 174 - Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

Em razão da especialidade e do tecnicismo que as áreas reguladas demandam, cabe preferencialmente às Agências Reguladoras pelo sistema constitucional e administrativo o exercício da função regulatória dos serviços públicos. Cabe aqui esclarecer que existem outras entidades no cenário nacional que também exercem tal função (Banco Central e CADE, por exemplo), mas em áreas completamente diferentes, não pertinentes ao presente trabalho.

Para Guilherme Mussi (2004, on line), existem cinco ações estatais distintas no contexto da competência regulatória:

1) a normatização do comportamento dos agentes econômicos; 2) a fiscalização da conduta dos mesmos; 3) o poder de sancionar atos contrários aos princípios constitucionais da ordem econômica e aos ditames legais; 4) o arbitramento de conflitos entre os prestadores de serviços regulados e 5) o fomento as atividade econômica.

O artigo 174 da Constituição Federal de 1988 previu expressamente a função normativa, e nada mais é que não a possibilidade de edição de normas jurídicas regrando a conduta de agentes econômicos participantes de um setor da economia que esteja regulado. Sobre o tema nos dedicaremos mais aguçadamente posteriormente nesta monografia. Podemos exemplificar, no plano legal, o deferimento da competência normativa na lei que instituiu a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, Lei n°. 9.427/1996, senão vejamos:

Art. 3° Além das incumbências prescritas nos artigos. 29 e 30 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, aplicáveis aos serviços de energia elétrica, compete especialmente à ANEEL:

I - implementar as políticas e diretrizes do governo federal para a exploração da energia elétrica e o aproveitamento dos potenciais hidráulicos, expedindo os atos regulamentares necessários ao cumprimento das normas estabelecidas pela Lei no 9.074, de 7 de julho de 1995;

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estipuladas como indispensáveis. Podemos citar um dispositivo da Lei n°. 9.961/2000, que criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar, que prevê um das hipóteses que poderá ser exercida a fiscalização, in verbis:

Art. 4º Compete à ANS:

(...)

XXIII - fiscalizar as atividades das operadoras de planos privados de assistência à saúde e zelar pelo cumprimento das normas atinentes ao seu funcionamento;

Por sua vez, o exercício da função sancionatória é um verdadeiro corolário da função fiscalizadora, uma vez que ao se fiscalizar as atividades das entidades particulares pelas emanações provenientes da própria agencia reguladora, impõe ao não atendimento de tais disposições uma determinada sanção. Ou seja, de nada adiantaria fiscalizar sem a existência de uma possibilidade de coerção pela inércia. Mantendo o modelo adotado nesta monografia, apresenta-se agora um exemplo desta previsão de sanção, atribuída a ANATEL pela Lei n°. 9.472/1997:

Art. 19 À Agência compete adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento das telecomunicações brasileiras, atuando com independência, imparcialidade, legalidade, impessoalidade e publicidade, e especialmente:

(...)

XI - expedir e extinguir autorização para prestação de serviço no regime privado, fiscalizando e aplicando sanções;

A quarta atividade da função reguladora é o arbitramento de conflitos surgidos entre as partes envolvidas na área regulada. Tal atribuição não mitiga o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário, conforme disposto no artigo 5°, XXXV da Constituição Federal de 1988, uma vez que as demandas interpostas perante o ente regulador, podem ser novamente submetidas às barras do Judiciário. Exemplificando, podemos apresentar dispositivo da Lei n°. 9.782, diploma que instituiu a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, in verbis:

Art. 15 Compete à Diretoria Colegiada:

(...)

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A última atividade é a de fomento, caracterizada pelo incentivo dado pelo Estado a determinado setores da atividade econômica com objetivos diversos como o de desenvolver algumas regiões do país, ou reduzir as desigualdades sociais, ou ainda geração de empregos, ou mesmo a evolução de determinada atividade industrial. Tais incentivos são exercidos através de isenções tributárias, incentivos fiscais e outros privilégios. Exemplificando, com base no mesmo diploma normativo anteriormente citado:

Art. 7º - Compete à Agência proceder à implementação e à execução do disposto nos incisos II a VII do art. 2º desta Lei, devendo:

(...)

II - fomentar e realizar estudos e pesquisas no âmbito de suas atribuições;

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Antes de adentrarmos no tema do poder normativo, e, por conseguinte, da constitucionalidade do poder regulamentar das agências reguladoras, salutar se faz analisar, para a compreensão geral do tema, o Estado Democrático de Direito, o princípio da Separação dos Poderes, bem como os limites estabelecidos em face do princípio da legalidade.

Desta forma, em um primeiro momento analisaremos o Estado Democrático de Direito, a Separação dos Poderes e o Princípio da Legalidade. Tais assuntos estão diretamente interligados, e são de fundamental importância para tal trabalho.

Outra não poderia ser a nossa conclusão, uma vez que em um Estado Democrático de Direito, no qual existe a Separação dos Poderes e o império do princípio da legalidade, a Administração Pública só poderá atuar com o intuito de atingir seus fins constitucionais a partir dos ditames enumerados no direito positivo.

3.1 O Estado Democrático de Direito

O conceito de Estado Democrático de Direito está em constante mutação, pelo fato de seus dois pilares fundamentais, a própria concepção de Direito e o ideal de Justiça, serem por natureza conceitos mutáveis.

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Direito é o instrumento de limitação de toda atividade pública pelo Direito, bem como garantidor das prerrogativas fundamentais dos administrados.

O Estado Democrático de Direito, entretanto, não se configura simplesmente com esse binômio: o mínimo de garantia dos direito individuais com a limitação da atuação Estatal pelo Direito positivo. Os regimes totalitários que dominaram a Alemanha, Itália, Portugal, Espanha e Brasil são exemplos de Estados de Direito. O ordenamento jurídico vigente nestas nações, com o mínimo de garantia de direito individuais, legitimava a atuação ditatorial, pelo menos no aspecto jurídico.

José Afonso da Silva (2005, p. 122) traz um rol dos princípios fundamentais para concepção da idéia de um Estado Democrático de Direito:

(a) princípio da constitucionalidade, que exprime, em primeiro lugar, que o Estado democrático de direito se funda na legitimidade de uma Constituição rígida, emanada da vontade popular, que, dotada de supremacia, vincule todos os poderes e os atos deles provenientes, com as garantias de atuação livre da jurisdição constitucional; (b) princípio democrático que, nos termos da Constituição, há de se constituir uma democracia representativa e participativa, pluralista, e que seja a garantia geral da vigência e eficácia dos direitos fundamentais (art. 1º); (c) sistema de direitos fundamentais individuais, coletivos, sociais e culturais (Títulos II, VII e VIII); (d) princípio da justiça social, referido no art. 176, caput, no art. 198, como princípio da ordem econômica e da ordem social; como dissemos, a Constituição não prometeu a transição para o socialismo mediante a realização da democracia econômica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa, como o faz a Constituição portuguesa, mas abre-se ela, também, para a realização da democracia social e cultural, embora não avance significativamente rumo à democracia econômica; (e) princípio da igualdade (art. 5º, caput e inciso I); (f) princípio da divisão dos poderes (art. 2º) e da independência do juiz (art. 100); (g) princípio da legalidade (art. 5º, II); (h) princípio da segurança jurídica (art. 5º, XXXVI a LXXIII)

De acordo com o exposto pelo ilustre autor, o Estado Democrático de Direito reúne os princípios do Estado Democrático e do Estado de Direito.

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Conforme Guilherme Mussi (2004, on line), “o Estado Democrático de Direito é aquele em que as formas de atuação estatais estão submetidas ao Direito resultante da participação popular no processo de sua elaboração, pautado primordialmente na concretização do bem-estar do indivíduo.”

3.2 Separação dos Poderes

O poder estatal, também denominado poder político, é um fenômeno sócio-cultural. Em decorrência da independência e da soberania do Estado, tal poder tem como principais características ser uno, indivisível e indelegável. Daí uma certa impropriedade em falar na separação dos poderes. Entretanto, sabe-se de uma imensa gama de atribuições da competência do Estado, e estas não podem ser exercidas por apenas uma pessoa ou órgão, ou ainda um grupo restrito de pessoas ou órgão, sob pena de retroagirmos aos regimes totalitários de outrora.

Há que se distinguir primordialmente função de poder. As expressões Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário têm sentido duplo, pois há um mesmo tempo exprimem as funções executiva, legislativa e judiciária, bem como indicam os respectivos órgãos que as exercem.

Ao longo da história, alguns pensadores traçaram teorias na tentativa de definir as funções essenciais de um Estado, bem como a forma e a quem seriam atribuídas essas funções. A partir de então, tinha-se no universo jurídico o desenvolvimento da teoria da separação dos poderes.

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Montesquieu, entretanto, como dito anteriormente evolui a teoria. Na obra “O Espírito das Leis”, é dado o enfoque da necessária existência de órgãos autônomos e distintos, sem nenhuma subordinação entre si, exercendo as funções legislativa, executiva e judiciária. Não estava sendo sugerida em tal obra uma separação do poder político em organismos estanques, mas o exercício de funções distintas por cada órgão de modo harmônico.

Com Montesquieu, a teoria da separação dos poderes passou a vislumbrar a autonomia de cada órgão, mas com total harmonia, sem a preponderância de qualquer dos órgãos sobre o outro. A atividade de cada ente deveria ser realizada com interdependência.

Faz-se salutar abrir nesta monografia uma breve explanação da teoria vista sob o ângulo de John Locke, dada a sua importância para o desenvolvimento sistemático da organização do poder estatal. Para Locke não existiriam apenas três poderes, mas quatro na realidade: executivo, legislativo, federativo e prerrogativo. Locke ignorou a existência do Poder Judiciário. O Legislativo seria o órgão elaborador das normas jurídicas. Ao Executivo seria atribuída a função de aplicar e executar as prescrições emanadas pela lei nos limites do seu respectivo Estado. A Função Federativa estava relacionada com o poder de declarar guerra, estabelecer alianças, e as relações internacionais em geral. Por fim, a função Prerrogativa consiste na atribuição de se fazer o bem público, independentemente de regras preordenadas, sem a observância de subordinação de qualquer espécie. Estava diretamente relacionada com a tomada de decisões em situações excepcionais.

A característica mais relevante da teoria de Locke estava na quantidade de órgãos incumbidos de exercer as quatro funções, que eram apenas dois, quais sejam, Parlamento e Rei. Ao Parlamento só caberia o exercício da função legislativa. Ao Rei, por seu turno, caberia o exercício da função executiva, e de acordo com as circunstâncias, a federativa e a prerrogativa.

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reunidos, o Juiz seria o criador das próprias leis que desejasse por em prática. Enfim, isto caminharia completamente em sentido contrário aos ideais do Estado Moderno.

Antes de Montesquieu, desta feita, já se havia forjado a distinção das funções, passo importantíssimo à teoria da separação dos poderes. Independente do órgão que a exerceria, já se estipulava a especialização das tarefas governamentais. Com Montesquieu, tivemos a configurarão da divisão dessas funções nos três poderes que temos atualmente.

A Constituição da República Federativa do Brasil adotou a teoria da separação dos poderes, definindo que as funções estatais seriam exercidas por três órgãos harmônicos e ao mesmo tempo independentes entre si. No artigo 2° do mencionado diploma a teoria de Montesquieu está erigida a categoria de princípio fundamental da República Federativa do Brasil.

Apesar da importância para a evolução do atual modelo de Estado, a teoria da separação dos poderes de Montesquieu não está isenta de inúmeras críticas. Afinal, trata-se de uma teoria elaborada há mais de duzentos e cinqüenta anos, e os Estados, a sociedade e os órgãos incumbidos de tais funções evoluíram. Desta forma algumas modificações foram e ainda devem ser implantadas à divisão dos poderes.

As funções devem ser exercidas com independência e harmonia entre os poderes. Pela independência, entende-se que a investidura de pessoas num determinado órgão não depende da aprovação de um outro, bem como a permanência de tal pessoa; não há necessidade de consulta de um órgão pelo outro para a elaboração de diretrizes ou decisões; são livres em sua organização, respeitando apenas os ditames constitucionais. Pela harmonia, tem-se como principal caracterização o sistema dos freios e contrapesos, pelo qual cabe a um órgão não intervir nas atividades um do outro diretamente, mas fiscalizá-los. Assim, existem algumas prescrições constitucionais para a participação no exercício de funções do executivo, legislativo e judiciário por órgãos que não são os titulares de tal atribuição.

(40)

A independência e a harmonia existem justamente para manter uma das finalidades precípuas do Estado Democrático de Direito, qual seja, a limitação do poder.

A teoria da separação dos poderes possui ainda uma “cláusula-parâmetro”, conforme Anna Cândida da Cunha Ferraz (1994 apud MUSSI, 2004), configurada pela indelegabilidade de poderes, que atualmente encontra-se em uma fase de considerável abrandamento:

a regra da não delegação de poderes se curva apenas a dois limites: de um lado, a impossibilidade de abdicação do poder ou competência originária constitucionalmente atribuída a determinado poder; de outro, o estabelecimento de condições e limites claros para a atuação do poder delegado

O Direito Constitucional Brasileiro já admitia a delegação de funções, mesmo antes da Carta Magna de 1988. A cláusula de indelegabilidade das funções, inclusive, não se encontra prevista na Constituição Federal. Com o intuito de privilegiar a lógica interna do ordenamento jurídico brasileiro, o princípio da separação dos poderes foi flexibilizado para permitir a participação de um poder em atividades típicas de outro. Para esta monografia, interessa principalmente a previsão do Executivo participar da elaboração de normas.

Assim, várias são as exceções, demonstrando o declínio da indelegabilidade de funções, caracterizadas pela atuação atípica de um poder em atribuições típicas de um outro. Assim, o Executivo por vezes elabora medida provisória, leis delegadas, regulamentos. O Judiciário, através de seus tribunais emana leis referentes ao seu Regimento Interno. O Legislativo, através do Senado, pode vir a fazer as vezes de um órgão do Judiciário, julgando o Presidente da República em crimes de responsabilidade.

A tradicional visão da teoria não deve mais ser aplicada na atualidade. A partir da Constituição Federal de 1988, pode-se perceber que não há mais a divisão estanque entre os poderes. Estas funções, como teremos oportunidade de falar mais a frente, devem em razão da complexidade e dinamicidade da sociedade ser exercidas em colaboração pelos poderes.

(41)

O texto de nossa Constituição, pela atual sistemática adotada, possui uma dissonância para com o critério original adotado para a determinação ou distinção das funções (poderes aqui está neste sentido) na doutrina de Montesquieu.

Como já dito anteriormente nesta monografia, as funções existentes pela doutrina de Montesquieu seriam a legislativa, executiva e judiciária, de acordo com a autoridade que a exerce. Trata-se da utilização do critério orgânico para a separação dos poderes. Por tal critério, importa saber quem seria o sujeito responsável pelo exercício da função pública, independente do conteúdo e da extensão dos atos praticados.

Tal critério não se faz suficiente para explicar a atual sistemática do exercício das funções estatais na atualidade. Eros Roberto Grau (2003) defende a reformulação desta classificação, adotando um critério denominado material, em detrimento do critério orgânico ou institucional, que havia se mostrado insuficiente para abarcar todas as realidades conjunturais. Esta inaptidão estaria caracterizada pelo fato da confusão que se fizera entre o órgão titular da função e a função propriamente dita. A função, desta feita, viria definida pelo órgão e não o órgão pela função. O mencionado autor entende que mesmo na teoria original não há uma efetiva separação dos poderes, mas sim uma distinção entre eles, voltada ao equilíbrio do exercício das funções estatais.

Para Eros Roberto Grau (2003), pelo aspecto material, revelando a essência jurídica do poder, existiriam na realidade três funções estatais, quais sejam: a função normativa, administrativa e jurisdicional.

Ao presente trabalho, interessa principalmente a concepção da função normativa. A esta corresponderia o poder-dever de emanar estatuições primárias, contendo preceitos abstrato e genérico, sejam ela provenientes de poder originário ou derivado. A principal diferença com o conceito de função legislativa é que esta, apesar de também ser destinada a elaboração de prescrições primárias, não obrigatoriamente precisam possuir conteúdo normativo. O grau de abstração e generalidade, bem como o nomen júris que adentra as emanações no universo jurídico, portanto, são os critérios que distinguem as duas concepções.

(42)

A concepção do mencionado autor sobre a separação dos poderes conduziu a uma releitura também sobre o princípio da legalidade. Conforme Eros Roberto Grau (2003), quando a CF/88 prenuncia que determinadas matérias só poderão ser tratadas por meio de lei, o texto constitucional possibilita que as demais matérias sejam tratadas por regulamentos.

O autor ampliou o sentido de legalidade, sem vislumbrar os defeitos que adviriam de tal concepção, como é o caso da expedição de regulamentos autônomos, que com exceção do artigo 84, IV da Constituição Federal não são aceitos pelo Direito Constitucional Brasileiro.

A importância do Trabalho de Eros Roberto Grau (2003) para a presente monografia está na possibilidade do Poder Executivo exercer o denominado poder normativo, desde que o seja com limitações quanto ao conteúdo e ao ser exercício desvinculado, assim como acontece com as agências reguladoras, como será examinado mais a frente quando adentrarmos em tal tópico.

Conforme Gabriela Azevedo Campos Sales (2002, p. 19):

Ora, insistir na manutenção da tripartição rígida, sem manter seu real funcionamento, leva à ignorância do que ocorre para além dela; dificulta a identificação de abusos, que podem ser acobertados pela tripartição. Destarte, o reconhecimento das limitações do modelo clássico é importantíssimo para que se tome consciência da necessidade de reflexão, ao menos no plano teórico, acerca de novas maneiras de reorganizar o Estado, conciliando a necessidade de eficiência e dinamismo com o respeito aos direitos fundamentais e a preservação da democracia.

3.3 Princípio da legalidade

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O princípio da legalidade é uma conquista proveniente do Estado de Direito, no qual se buscava a qualquer custo conter os abusos do Absolutismo, conferindo segurança jurídica à sociedade, notadamente para garantir os direitos individuais.

A própria idéia de Estado de Direito se caracteriza pela concepção da lei como ato emanado do Parlamento, pelo qual todas as atividades estarão subordinadas ao império da legalidade. Desta forma, caracteriza-se este modelo de Estado pela supremacia da lei sobre a Administração; a limitação de poderes autônomos da Administração, garantindo os direitos individuais; por fim, pela presença de juízes independentes para a solução de litígio entre as pessoas ou entre essas e o Estado.

O Estado de Direito, concebido pelo Estado Liberal, tinha a sua auto-afirmação no princípio da legalidade. A lei era o ato normativo supremo, sendo as demais emanações provenientes de outras fontes do Direito descartadas a um segundo plano, bem distante da importância tida pela lei. Era uma forma de defender os abusos ocorridos durante o Absolutismo, período no qual as decisões do Rei eram irretocáveis, sem a necessária preexistência de uma norma anterior.

Em nosso Direito Administrativo, há uma interpretação diferente do princípio da legalidade para o particular e para o administrador. O administrador só pode atuar nos limites do que a lei autoriza, já o particular pode atuar livremente até o limite do que a lei o proibir.

Conforme Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2005, p. 68), “segundo o princípio da legalidade, a administração Pública só pode fazer o que a lei permite. No âmbito das relações entre particulares, o princípio aplicável é o da autonomia da vontade, que lhes permite fazer tudo que lei não proíbe.”

Em nosso direito positivo, para a Administração Pública, o princípio da legalidade encontra-se exposto no artigo 37 da Constituição Federal de 1988; e como cláusula geral, no artigo 5°, inciso II. Assim, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

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