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Marcadores discursivos em língua francesa: o uso de alors, donc, mais e bien no discurso de sala de aula

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FERNANDA CRISTINA PUÇA FRANÇA

MARCADORES DISCURSIVOS em língua francesa: O uso

de alors, donc, mais e bien no discurso de sala de aula

DISSERTAÇÃO APRESENTADA AO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO –UFPE-, COMO PARTE DOS REQUISITOS PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM LINGÜÍSTICA.

ORIENTADORA:

PROFa Dra KAZUE SAITO MONTEIRO DE BARROS.

RECIFE

2007

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França, Fernanda Cristina Puça

Marcadores discursivos em língua francesa: o uso de alors, donc, mais e bien no discurso de sala de aula / Fernanda Cristina Puça França. – Recife : O Autor, 2007.

187 folhas : il., tab., graf., quadros.

Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Pernambuco. CAC. Letras, 2007.

Inclui bibliografia e anexos.

1. Lingüística. 2. Língua francesa – Estudo e ensino. 3. Análise de interação em educação. I.Título.

801 CDU (2.ed.) UFPE

410 CDD (22.ed.) CAC2007-

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FERNANDA CRISTINA PUÇA FRANÇA

MARCADORES DISCURSIVOS em língua francesa: O uso de

alors, donc, mais e bien no discurso de sala de aula.

DISSERTAÇÃO APRESENTADA AO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO – UFPE, COMO PARTE DOS REQUISITOS PARA OBTENÇAO DO GRAU DE MESTRE EM LINGUÍSTICA.

Aprovada em 21 de agosto de 2007

BANCA EXAMINADORA

Profa Dra Kasue Saito Monteiro de Barros (orientadora)

Examinadora / Presidente – UFPE.

Profa Dra Rosane Alencar

Examinadora externa – UFRPE.

Profa Dra Abuêndia Padilha Pinto

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AGRADECIMENTOS

Inicialmente agradeço a Deus, o autor e Senhor da vida. Aquele que sempre está ao meu lado em todos os momentos de minha vida, incluindo a realização deste Mestrado.

Esta dissertação é o resultado de esforço pessoal e de ajuda de pessoas muito queridas e respeitadas. Agradeço a minha orientadora Profa Dra Kazue Saito Monteiro de Barros pela confiança, pela paciência, pelo apoio, ajuda, amizade e profissionalismo dispensados durante as orientações.

Ao meu marido pela compreensão, ajuda e força nos momentos em que mais precisava.

Aos meus queridos filhos Gabriella Fernanda e Paulo Henrique, por existirem e tornarem minha vida mais feliz.

Aos professores do Mestrado em Lingüística da UFPE, em especial, agradeço a Profa Dra Abuêndia Padilha Pinto pela amizade, incentivo, ajuda e confiança.

Aos meus amigos de curso Edmilson, Irã, Eva, Rosângela, Flávia, Daniel, Carla e demais mestrandos pelo companheirismo e amizade.

Aos meus colegas do Colégio de Aplicação Edson Wagner Falcão e Marlon Freire de Melo pela ajuda dada ao assumir parte de minha carga horária para que eu pudesse fazer o Mestrado.

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«Tout est possible à celui qui croit »

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo investigar a função e os pontos de ocorrência dos marcadores discursivos alors, donc, mais e bien, identificados como os mais produtivos no discurso em sala de aula de língua francesa. A base teórica ancora-se, principalmente, nos estudos de Schiffrin (1987, 2001), Fraser (1999) e Barros (1991) sobre marcadores discursivos. Os marcadores são observados em três aulas de metodologia da língua francesa, ministradas por uma professora francesa. Uma dessas aulas, identificada como corpus restrito, é analisada de forma detalhada com o intuito de demonstrar que não é possível determinar as funções dos marcadores sem uma análise profunda do próprio discurso. A investigação torna evidente que os marcadores discursivos são sensíveis a aspectos da organização tópica: na fala do professor, salientam metadiscursivamente, mudanças, desdobramentos, digressões e retomadas do tópico discursivo, constituindo-se numa ferramenta confiável para a análise desse fenômeno.

Palavras-chave: Marcadores discursivos; interação em sala de aula;

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RÉSUMÉ

Ce travail a pour objectif de faire des recherches sur la fonction et la localisation des marqueurs discursifs, alors, donc, mais et bien, reconnus comme étant les plus productifs du discurs en français en salle de classe. La base théorique est centrée surtout dans les études de Schiffrin (1987, 2001), Fraser (1999) et Barros (1991) sur les marqueurs discursifs. Les marqueurs sont observés en trois cours de methodologie de la langue française, donnés par une professeure française. Un de ces cours, identifié comme corpus restreint, a été analysé de manière detaillé dans l’intention de démontrer qu’il n’est pas possible de déterminer les fonctions des marqueurs sans une profonde analyse du discours en lui même. L’investigation rend évidente que les marqueurs discursifs sont sensibles aux aspects de l’organisation des sujets: dans les mots du professeur, ils montrent, de forme metadiscursive, des changements, des dédoublements, des digressions et le retour du sujet, constituant ainsi un outil fiable pour l’analyse de ce phénomène.

Les mots-clés: Marqueurs discursifs ; interaction dans la salle de classe;

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LISTA DE QUADROS, GRÁFICOS E TABELAS

QUADROS

Quadro 6.1. Macromudanças. Aula 1: La consigne (A instrução). ...p. 107 Quadro 6.2. Macromudanças. Aula 2: D’une langue à l’autre: la mediation (De uma língua a outra: a mediação)...p. 108 Quadro 6.3. Macromudanças. Aula 3: L’interaction orale: Présentation et analyse

d’activités. (Interação oral: apresentação e análise de atividades)... p. 108

GRÁFICOS

Gráfico 6.1. Freqüência dos marcadores encontrados nas aulas 1, 2 e 3. ...p.97

TABELAS

Tabela 6.1. Distribuição dos marcadores na aula 1. ...p. 96 Tabela 6.2. Alors como marcador de micromudanças na aula 1 ...p. 113 Tabela 6.3. Alors como marcador de micromudanças na aula 2...p. 113 Tabela 6.4. Alors como marcador de micromudanças na aula 3...p. 115 Tabela 6.5. Mais como marcador contrastivo na aula 1...p. 121 Tabela 6.6. Mais como marcador contrastivo na aula 2...p. 122 Tabela 6.7. Mais como marcador contrastivo na aula 3...p. 122 Tabela 6.8. Donc como marcador resumitivo na aula 1...p. 125 Tabela 6.9. Donc como marcador resumitivo na aula 2...p. 126 Tabela 6.10. Donc como marcador resumitivo na aula 3...p. 126

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LISTA DE ABREVIATURAS

AC Análise da Conversação AD Análise do Discurso

CECR Quadro Europeu de Referência para a Aprendizagem de Línguas. EC Etnografia da Comunicação

FLE Francês língua estrangeira LE Língua Estrangeira

MD Marcadores Discursivos SI Sociolingüística Interacionista ZDP Zona de Desenvolvimento proximal

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... p. 13 1. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS...p. 16 1.1. Amostra ...p. 16 1.2. Coleta e seleção de dados ...p. 17 1.3. Metodologia de análise dos dados ...p. 19 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: Interação... p. 22 2.1. INTERAÇÃO VERBAL: Conceito... p. 23 2.2. INTERAÇÃO VERBAL: Principais perspectivas envolvidas

no trabalho...p. 28 3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: Estudos sobre o discurso

de sala de aula... p. 40 4. MARCADORES DISCURSIVOS ... p. 49 4.1. Estudos já realizados sobre marcadores discursivos...p. 51 4.2. Uma abordagem funcional dos marcadores ... p. 60 4.3. Os marcadores discursivos alors (então), donc (pois, logo, assim), mais (mas) e bien (bem)... p. 68 4.4. Função metadiscursiva dos marcadores discursivos ...p. 74 5. ASPECTOS ETNOGRÁFICOS DO EVENTO AULA...p. 79

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6. ANÁLISE DOS MARCADORES DISCURSIVOS

EM FRANCÊS NO EVENTO AULA ...p. 95 6.1. Os marcadores como organizadores de macroestrutura

do evento aula: bien + alors. ...p. 98 6.2. Marcador de micromudanças: alors...p. 110 6.3. Marcador indicando digressão e retomada: alors... bien...p. 114 6.4. Marcador contrastivo: mais...p. 117 6.5. Marcador resumitivo : donc...p. 122 6.6. Uma macrofunção dos marcadores: a metadiscursiva. ...p. 126 7. RESULTADOS OBTIDOS E PALAVRAS FINAIS...p. 134 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...p. 140 ANEXO ...p. 148

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INTRODUÇÃO

A imagem que temos da sala de aula é a de um espaço de ensino-aprendizagem onde idéias são compartilhadas e atividades realizadas. Considerando ou não essa imagem correspondente à realidade, ela é a idealização que condensa valores, conceitos, crenças em relação à escola.

Tínhamos como objetivo inicial verificar as funções desempenhadas por alguns marcadores discursivos em francês no discurso de sala de aula. Quando iniciamos, verificamos a estreita relação dos marcadores com o tópico discursivo e observamos que as ações tópicas podem ser sistematicamente correlacionadas aos marcadores - este é o foco do presente trabalho.

Para identificar a função dos marcadores analisamos o tópico e a estrutura da aula. Os resultados evidenciaram que os marcadores são ferramentas confiáveis na análise da organização tópica. O corpus analisado são três aulas em francês, ministradas por uma professora francesa. Uma das aulas, que denominamos de

corpus restrito, foi analisada de forma detalhada.

A partir de uma perspectiva interacionista, o presente estudo procura investigar, as funções e os pontos de ocorrência dos marcadores discursivos (aqui denominados MD) mais produtivos na fala do professor em sala de aula. Entendemos por MD partículas verbais e não verbais que desempenham importante papel pragmático na interação. Os marcadores que desempenham, prioritariamente, um papel na organização textual, são os marcadores textuais; já os marcadores que

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antecedem hesitação, são os cognitivos; e, por fim, os que monitoram a interação, que são os marcadores interacionais.

Os marcadores aqui estudados têm função predominantemente, textual, identificando as mudanças tópicas no discurso do professor. Pode-se dizer que nos estudos sobre marcadores há duas grandes perspectivas: a predominantemente formal e a predominantemente funcional. A perspectiva predominantemente formal parte de uma análise dessas partículas para verificar as suas funções no discurso. A perspectiva predominantemente funcional parte de uma análise do discurso em si, examinando qual o papel desempenhado por essas partículas. No trabalho, as funções encontradas têm relação direta com a seleção do marcador e seus pontos de ocorrência, por isso procedemos a uma análise predominantemente funcional dos mesmos.

Constatamos, através de observações preliminares e bibliografia sobre o assunto que o uso de MD por nativos da língua francesa é alto (cf., por exemplo, com Chanet, 2003b). No entanto, não se observam trabalhos sistemáticos sobre os mesmos nos manuais didáticos. Segundo Chaudron (1986), a ausência de marcadores dificulta a compreensão, e acreditamos que o seu uso melhora a fluência de alunos brasileiros que aprendem o francês como segunda língua.

Uma aula tem como objetivo máximo a construção de conhecimentos. Na sala de aula, os MD, principalmente os textuais, são usados para tornar mais claro o discurso, para deixar evidente o que está sendo dito, o fluxo dos tópicos, etc. No decorrer de nossa análise, observaremos os marcadores mais produtivos encontrados na aula analisada, de forma detalhada. A freqüência e a lista dos MD

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mais produtivos serão comparadas à lista apresentada por Chanet, 2003b, autora que apresentou uma lista com os MD mais utilizados no francês falado. Sua lista é composta de 85 formas, consideradas mais utilizadas a partir de um corpus de 1 500 000 palavras (CORPAIX, 1 050 000 palavras e o CRFP – Corpus de referência do francês falado – 450 000 palavras). Segundo a autora, as formas mais freqüentes, aquelas que aparecem, no mínimo, a cada dois minutos, são essencialmente monossilábicas, com exceção de alors e parce que que estão entre as dez primeiras palavras e não são monossílabos. Os dez primeiros marcadores mais freqüentes, destacados por Chanet, são, por ordem de apresentação: mais, donc, alors, bon, là,

bien, parce que, quoi, ben e puis. De forma análoga, neste estudo, os mais

encontrados no discurso do professor são: alors, donc, mais e bien.

Na organização desta dissertação, iniciamos pela metodologia (Capítulo 1) que se segue a esta introdução. Os pressupostos e conceitos que baseiam nossa análise se encontram nos Capítulos 2 e 3. O Capítulo 4, ainda teórico, é exclusivamente dedicado aos MD. A análise mostrou que o uso de marcadores é sensível às características do gênero em questão. Por isso, aspectos contextuais do evento aula são discutidos no Capítulo 5, que constitui o primeiro capítulo da análise. A observação e a análise dos marcadores discursivos em francês no discurso de sala de aula são apresentadas no Capítulo 6. Por fim, o Capítulo 7 condensa os resultados obtidos. Após o capítulo 7, encontramos a bibliografia e no anexo, transcrevemos e traduzimos, na íntegra, a aula 1 que corresponde ao nosso corpus

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1. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Tínhamos como idéia inicial observar o uso de marcadores discursivos por professores de língua francesa que não tinham essa língua como a materna. Após a realização de estudo preliminar, observamos através de gravações desses professores que o uso dos marcadores não era tão produtivo quanto o uso feito por nativos de língua francesa, e alguns manuais didáticos analisados não contemplavam o assunto. Prosseguimos com um levantamento dos marcadores mais produtivos no francês falado. Dessa feita, decidimos observar um grupo de marcadores que ocorrem de forma sistemática nas aulas de língua francesa ministradas por professores nativos dessa língua. O objetivo da escolha do gênero aula se deve ao fato de a clareza ser seu objetivo específico. Em estadia de um mês, no ano de 2006, na França, realizando um curso de formação em metodologia da língua francesa, pudemos observar, numa série de aulas, a alta freqüência de marcadores específicos. É evidente que o material coletado foi bem maior do que o analisado em nosso trabalho. Todavia, os dados selecionados foram suficientes para a realização de nossa pesquisa, e a noção de tópico discursivo, aquilo sobre que se está falando num discurso, foi importante para a identificação desses marcadores.

1.1. Amostra

A amostra é composta por dados que incluem três aulas: aula 1, aula 2 e

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restrito; das outras duas aulas, aula 2 e aula 3 - aqui chamadas de corpus estendido -

nós destacamos alguns pontos específicos, a freqüência e a forma de marcadores indicando macromudanças no evento aula. Eles servem para conferir mais confiabilidade aos resultados. Em nossa análise, averiguamos: a) as formas dos marcadores discursivos (itens); b) os pontos de ocorrência dos mesmos na estrutura tópica; e c) as funções dos marcadores mais freqüentes. Escolhemos analisar de forma detalhada a aula 1 para demonstrar os resultados, já que a análise mostra que a função do marcador é sensível ao ponto de ocorrência no discurso. A aula aqui analisada é de metodologia da língua francesa, ministrada em francês por uma professora formadora, francesa, a um grupo de professores de diversas nacionalidades.

1.2. Coleta e seleção de dados

Os participantes das aulas 1, 2 e 3 foram a professora formadora e professores de língua francesa de diferentes nacionalidades (três gregos, dois turcos, um holandês, três brasileiros, uma inglesa, uma cubana e uma etíope), perfazendo um total de 12 professores (homens e mulheres).

O critério de escolha de análise dos MD alors, donc, mais e bien baseia-se, como dissemos, na freqüência e na produtividade dos mesmos nas aulas selecionadas para análise. O resultado encontrado corrobora a lista apresentada por Chanet, 2003b, na qual a autora apresenta os marcadores mais freqüentes no francês falado.

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A aula 1, escolhida para a análise detalhada, foi registrada após três semanas de curso. O procedimento adotado na escolha é justificado por compreendermos que, no primeiro momento, o grupo ainda não interagia de forma espontânea e natural. Dessa forma, preferimos analisar a aula que, em teoria, fosse mais interativa, ou seja, em que houvesse uma maior participação oral dos alunos. Alguns alunos e a professora mantiveram contato em outros módulos do curso, e parte do grupo já se conhecia e tinha um bom relacionamento dentro e fora da sala de aula.

Optamos por coletar um evento natural com o objetivo de minimizar a influência do observador sobre os observados (já que o observador faz parte do grupo dos observados), visto que há uma interação coletiva entre os interlocutores, na qual os participantes produzem falas com certo grau de naturalidade que não se verifica em entrevistas mais estruturadas. O que se defende em favor dessa metodologia é a atenção voltada ao tema proposto para discussão: a atenção dos interlocutores é desviada do gravador e de como a pesquisadora observa seus informantes, uma vez que esta igualmente participa da interação. Consideramos que a presença da pesquisadora não interfere, nos resultados, uma vez que o foco foi a fala do professor.

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1.3. Metodologia de análise dos dados

As análises preliminares demonstraram que havia relação sistemática entre o uso de marcadores e mudanças tópicas. Daí, termos procurado investigar essa relação e, ainda, estudos realizados sobre tópico discursivo.

De acordo com Galembeck et al. (1990), a noção de tópico, conquanto esteja genericamente ligada à noção de tema ou assunto, apresenta dois níveis principais de abrangência: o tópico sentencial, também conhecido por tópico frasal, e o tópico discursivo. No primeiro caso, discute-se o papel do tópico na estruturação do enunciado (articulação tema - rema ou tópico - comentário). Quanto ao tópico

discursivo, focalizam-se suas propriedades (centração, concernência, organicidade) e

o fato de ele estar ligado ao desenvolvimento do processo interacional. Também se discute o papel do tópico discursivo no estabelecimento e na manutenção da relevância conversacional. A noção de tópico discursivo não elimina a frase, mas considera-a sempre relacionada tanto a aspectos cotextuais como contextuais.

Trabalhos anteriores (cf., por exemplo, Barros, 1991) também demonstram que os MD têm relação com o estudo das ações tópicas. Na interação em sala de aula é possível distinguir as macromudanças das micromudanças, e as

macromudanças são claramente marcadas por marcadores textuais.

Inicialmente, em nossa análise, sinalizamos as macromudanças de tópicos com duas barras e as micromudanças de tópicos com apenas uma barra. Posteriormente, solicitamos que outro professor de língua francesa fizesse a leitura

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do material e pudemos verificar que estivemos de acordo com a maioria das mudanças marcadas.

Os resultados demonstram que as macromudanças são marcadas mais claramente do que as micromudanças. Nestas, a abertura do tópico implica o fechamento de um tópico anterior.

A identificação dos pontos de ocorrência das ações tópicas revelou um número de elementos estruturais com funções específicas no desenvolvimento do tópico. Finalmente, observamos que o uso dos marcadores poderia confirmar a segmentação das estruturas. Essas estruturas internas foram identificadas a partir de critério semântico e mostraram congruência com a identificação dos MD, definidos de acordo com o critério metadiscursivo.

Os passos metodológicos seguidos foram os seguintes:

1. Observamos os aspectos etnográficos do evento aula. Dentre os aspectos observados, verificamos que a organização dos participantes determina o tipo de aula ministrada. Consideramos, nesse caso, como tipo de aula, uma aula centrada no professor, não centrada no professor ou uma aula centrada no aluno.

2. Escolhemos um tipo de aula: aula mais interativa, centrada no aluno, isto é, uma aula em que o aluno tem mais oportunidades de falas.

3. Transcrevemos outras aulas para checar a recorrência dos marcadores e, dessa forma, dar mais confiabilidade à análise.

4. O texto principal foi segmentado por dois olhares, observando as ações tópicas.

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5. A estrutura interna do desenvolvimento do tópico foi observada.

6. O uso de marcadores foi examinado para verificar se houve consistência com as estruturas tópicas.

Preferimos nos concentrar em um único evento, provendo descrições detalhadas do que está acontecendo para auxiliar o leitor a entender nossas intenções. Na maioria das vezes, a recorrência de elementos pode ser vista através do texto.

Durante o curso de que participamos, embora tivéssemos a mobilidade de montar nosso programa semanal de aulas, o programa geral do curso já havia sido pré-determinado. Poderíamos definir se veríamos tal conteúdo na primeira ou na segunda semana, por exemplo. Foi um curso intensivo com aulas nos períodos da manhã e da tarde. Durante cada semana os alunos-professores tinham, no mínimo, três professores diferentes. Normalmente o grupo permanecia toda a semana no mesmo espaço físico. Embora os professores mudassem, o espaço geralmente era o mesmo. Quando possível, as cadeiras eram dispostas para formar um semicírculo. Com um programa pré-determinado e assuntos que precisavam ser contemplados, alguns professores formadores monopolizavam a fala durante as aulas.

Os passos metodológicos definidos para a construção desta pesquisa nos demandaram pesquisar conceitos e perspectivas interativas necessárias para a realização da mesma.

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2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: Interação

“A interação verbal é a realidade fundamental da linguagem.” Mikael Bakhtin, 2004.

Sendo a citação acima verídica, as abordagens interativas deveriam poder se aplicar a todo fenômeno da linguagem, qualquer que seja a sua natureza. Observamos os MD em sala de aula numa perspectiva interacionista, já que consideramos aula = interação. Averiguamos os processos envolvidos no uso dessas partículas e algumas posturas quanto ao seu estudo. Adotamos o conceito de línguagem enquanto interação e realizamos uma análise interacionista. Acreditamos que a ausência de marcadores compromete diretamente a compreensão, como comprovam outros estudos (cf., por exemplo, Chaudron, 1986).

Vimos afirmando que este trabalho adota perspectiva interacionista. Assim, faz-se necessário discutir o conceito de interação, o que é realizado em 2.1. O conceito varia, de acordo as múltiplas perspectivas envolvidas no estudo da interação, podendo a interação ser estudada de uma perspectiva predominantemente: a) lingüística, com vistas à observação da organização textual; b) interpretativista, buscando relacionar as condições do contexto ao comportamento lingüístico; e c) interpretativista e inferencial, que busca interpretar os processos inferenciais envolvidos na atualização da interação. Alguns pressupostos e conceitos dessas três vertentes – que, obviamente, estão imbricados – são discutidas em 2.2.

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2.1. INTERAÇÃO VERBAL: Conceito.

Utilizamos em nosso aparato de análise algumas perspectivas no estudo da interação. Recorremos à Análise da Conversação e observamos algumas características básicas constitutivas, que, segundo Marcuschi (2003), são: a) interação entre pelo menos dois falantes; b) presença de uma seqüência de ações coordenadas; c) execução numa identidade temporal; d) envolvimento numa interação centrada. Ainda por se tratar do evento aula, usamos alguns preceitos da Etnografia da

Comunicação (por exemplo, funcionalidade do evento e elementos que o compõem).

Com base nos estudos dos processos interacionais, referenciamos algumas correntes do sociointeracionismo que englobam diferentes pensamentos. Mesmo ciente das diferenças de alguns conceitos, ao tratarmos da interação, decidimos observar duas perspectivas diferentes, mas que do nosso ponto de vista se assemelham, quais sejam: os sociointeracionistas de linha bakhtiniana, como Brait e outros, e os sociointeracionistas que seguem uma linha da sociolingüística interacionista, como Goffman e outros. Dessas duas perspectivas, focamos a aula que consideramos um momento de compartilhar os diversos conhecimentos, sejam eles científicos ou empíricos, um momento interativo, pois.

A interação é a ação ou influência mútua entre os seres. É o que se passa quando duas ou mais pessoas se encontram reunidas. É uma ação mútua porque os indivíduos agem uns sobre os outros e changent en échangeant, como diz Kerbrat-Orecchioni (1990). Ela é um componente do processo de comunicação, de significação, de construção de sentido e faz, dessa forma, parte de todo ato de linguagem. Como

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afirma Marcuschi (1986), a interação acontece, necessariamente, entre dois falantes que se caracterizam como atores da interlocução e que vão se relacionar enquanto parceiros. Como parceiros, os interactantes desenvolvem uma atividade cooperativa que decorre da seqüência da troca interativa organizada, já que interação é negociação de sentido. Em diferentes situações de comunicação, os falantes trocam informações, expressam idéias, constroem o texto juntos e desempenham papéis como num jogo cujo resultado é fruto de um trabalho conjunto.

O sociointeracionista Erving Goffman (1998), um dos pilares da Sociolingüística Interacionista (SI), diz que uma situação completa de interação seria tornar completo um confronto face a face com os ingredientes paralingüísticos, tais como tons de voz, gesticulação, significado facial. Para ele, isso auxiliaria no fornecimento de pistas para se construir sentido. Ele acrescenta que a observação das formas dessa maneira de dizer junto a outros recursos (entoação, gestualidade, expressão facial, etc.) permite uma leitura dos pressupostos, dos elementos que, mesmo estando implícitos, se revelam em algum momento.

Goffman (1998) desenvolveu em seu trabalho o conceito de estruturas de expectativas, que são compostas pelos enquadres e pelos esquemas. Os esquemas de conhecimento (sob o ângulo da psicologia e da inteligência artificial) apresentam mensagens calcadas na informação pressuposta. Já os chamados enquadres interativos de interpretação operam as mensagens calcadas nas múltiplas relações que os participantes co-constroem em um encontro face a face. A interação face a face é uma categoria descritiva na questão da análise da interação da construção em nível micro. No entanto, Goffman (1998) propõe uma outra categoria descritiva, que é o

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alinhamento (footing). Este, segundo o autor, caracteriza o aspecto dinâmico dos enquadres. Seria a postura, a posição e a projeção de um participante com relação a si próprio, com relação ao outro e com relação ao discurso em construção. Ou seja, alinhamento que os participantes estabelecem para si e para os outros em uma dada situação. Na verdade, o conceito de alinhamento proposto por ele é um desenvolvimento da noção de enquadre. E um elemento chave no enquadramento é o uso de registros lingüisticamente identificáveis.

Em relação à sala de aula, por exemplo, o enquadre no contexto pode incluir o alinhamento do professor em relação ao alinhamento dos alunos entre si, e destes em relação a objetos físicos, como quadro, mural, caderno, livros, etc. Afinal, nós aprendemos o sentido de todas essas coisas socioculturalmente. Por isso, o professor deve estar atento e não ser ingênuo quanto ao uso da linguagem e do seu papel social enquanto detentor de poder. A noção do alinhamento, que foi a grande contribuição desse autor, está na construção de sentido co-construído por falantes e ouvintes, e para o dinamismo da interação, em como as relações interpessoais são negociadas o tempo todo e mudam o tempo todo. Dessa forma, o alinhamento também apresenta o papel discursivo e social que se negocia ao longo da interação e que pode mudar, ou seja, ser (re-) construído o tempo todo. Goffman afirma que a lingüística nos fornece pistas e marcadores através dos quais tais footings se tornam manifestos, ajudando-nos a encontrar o caminho na direção de uma base estrutural para a sua análise. Nesse contexto, compreendemos que os conhecimentos - segundo Koch e Travaglia (2005) o conhecimento lingüístico, o conhecimento de mundo e o conhecimento partilhado - são negociados pelos interactantes na interação.

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Para Brait (2001), sociointercionista de linha bakhtiniana, a interação é um fenômeno sociocultural possuidor de características lingüísticas e discursivas que podem ser observadas, descritas, analisadas e interpretadas. Essa autora acrescenta que uma abordagem chamada interacional permite verificar em um texto as relações interpessoais, intersubjetivas, que são passadas pela maneira de organização do evento. Goffman (1998) e Brait (2001) estão em sintonia quando afirmam a necessidade de se observarem todos os aspectos e elementos envolvidos numa interação. Há elementos que são ditos de forma clara e outros que estão implícitos na maneira de dizer. Afinal, numa situação de interação verbal, outros elementos, e aqui nos referimos aos paralingüísticos, além de palavras estão envolvidos. Para Brait, o olhar captador e difusor de informações é como uma câmera que interpreta e expressa aspectos, características, que, embora não explicitados por palavras, interferem de forma direta na dimensão interacional de um determinado evento.

Além de discorrer sobre o tema interação, Brait aponta o processo de autoria. Este compreende os procedimentos cognitivos e metacognitivos que se realizam pelas e nas operações de linguagem. Operações que estão implicadas nos diversos mecanismos enunciativos e de textualização. É através desses mecanismos que o autor (consciente ou inconscientemente) faz sua escolha, faz sua seleção, organiza e decide sobre o conteúdo temático a ser semiotizado. Ele também gerencia e adapta o texto empírico às inúmeras variáveis de sua situação de comunicação. O autor, guiado por emoções, crenças e valores, imprime ao texto um estilo pessoal. Isso porque, ao apresentar-se como autor, o indivíduo assume diante das instituições o papel social que se constitui a partir de sua relação com a linguagem e o mundo. É preciso que o

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indivíduo se torne princípio do agrupamento, instituindo o domínio sobre as várias posições nas quais se instaura o sujeito, imprimindo a ele significações coerentes e dando sentido aos fatos.

Ainda para Brait (2001), a organização interacional prevê um conjunto de regras com o objetivo de oferecer aos que participam de dado evento de interação determinadas características de comportamento que estimulam ou antecipam atitudes caracterizadoras do intercurso conversacional. Tais regras variam e podem ser rompidas. Sua manutenção demonstra o esforço, por parte dos interlocutores, em manter a negociação, e o seu rompimento evidencia um processo polêmico e desarmonioso.

Tendo por base o pensamento de vários estudiosos, a mesma autora afirma que um ato de linguagem é uma interação pelo fato de fundar-se no olhar avaliativo dos parceiros, isto é, daqueles que participam desse ato com a atenção profundamente voltada para todos os aspectos que, de alguma forma, interferem nesse evento.

Tomamos como foco central a interação em sala de aula. As perspectivas apresentadas, embora possuam algumas diferenças conceituais, têm como foco central a interação. Acreditamos que os MD desempenham importante papel no processo interativo.

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2.2. INTERAÇÃO VERBAL: Principais perspectivas envolvidas no trabalho.

O processo interativo pode ser visto como um jogo de subjetividades, um jogo de representação. Nesses jogos, o conhecimento se dá através de um processo de negociação, de trocas, de normas partilhadas, de concessões.

Observando essas especificidades e tomando a interação como objeto central de estudo, vários campos do conhecimento, nem sempre teoricamente semelhantes, apresentam contribuições nos estudos sobre interação. Destacamos a Análise da

Conversação (AC) por ser capaz de descrever a organização textual-interativa do objeto

de estudo . Além dela, a Etnografia da Comunicação (EC), por considerar relevante a observação dos participantes e suas relações. A partir da EC, podemos categorizar a aula como um evento comunicativo. Com base nos estudos dos processos interacionais, é possível referir algumas correntes do sociointeracionismo. Por isso decidimos observar aqui duas perspectivas, os sociointeracionistas de linha bakhtiniana, como Brait e outros, e os sociointeracionistas que seguem uma linha da Sociolingüística Interacionista, como Goffman e outros, isso porque consideramos a aula = interação.

Para a Análise da Conversação, qualquer conversação tem uma estrutura organizada. E, nessa estrutura, segundo Marcuschi (2003), encontramos cinco características básicas constitutivas: 1) interação entre pelo menos dois falantes; 2) ocorrência de pelo menos uma troca de falantes; 3) presença de uma seqüência de ações coordenadas; 4) execução numa identidade temporal; e 5) envolvimento numa interação centrada. É na AC que verificamos como a conversação se estrutura com

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organizadores globais e locais. É senso comum que a abordagem da AC seja rigorosamente empírica, ou seja, apenas dados autênticos sejam analisados. A perspectiva é indutiva e a maioria das categorias usadas em um dado trabalho é conseqüência da própria análise. A AC pesquisa estruturas recorrentes, e a unidade de análise, ou o foco de interesse, deve estar acima do nível da sentença. Para a AC, uma conversação inclui qualquer interação em que dois ou mais participantes dividam o

tópico discursivo.1

A conversação está definida como uma atividade na qual participam dois ou mais interlocutores que se alternam. Esses interlocutores organizam a fala em turnos, sem uma disposição fixa, podendo ser caracterizados como modelos simétricos e assimétricos. O modelo simétrico é a conversação em que os interlocutores têm o mesmo direito não só de tomar a palavra, mas também de escolher o tópico discursivo, direcionando-o de acordo com o tempo de participação. Já no modelo assimétrico ocorre uma prioridade no que diz respeito ao uso da palavra, cabendo a um dos interlocutores começar a conversação, conduzi-la e também mudar o tópico. O critério de simetria social entre os participantes, ou a liberdade dos participantes em alternância de falas, não é empregada como critério de definição de conversa, já que é mais do que fala entre iguais.

1

ROULET et al. L’articulation du discours en français contemporain. Peter Lang. Sciences pour la communication. 1985.; SCHIFFRIN, D. Conversational analysis, in F. Newmeyer (ed.), Linguistics: The

Cambridge Survey IV. Language: The Socio-Cultural Context. Cambridge: Cambridge University Press.

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O corpus analisado é concebido como conversação, tendo em vista que a

interação em sala de aula envolve, no mínimo, dois papéis de participantes: falante-ouvinte; falante-audiência; falante-ouvinte e audiência.

Em seu livro Discourse Markers, Schiffrin (1987) demonstra interesse em

saber como as pessoas se comunicam e interpretam significados na conversação. Ela procura examinar onde e quando ocorrem os MD. A autora inicia a sua argumentação concordando com Gumperz (1984) que sugere uma visão integrada da coerência. Para Schiffrin, Gumperz sugere que o significado comunicativo é atingido através do processo de interpretação da situação, no qual o ouvinte infere as estratégias e intenções dos falantes através da interpretação de pistas lingüísticas que contextualizam suas mensagens. Tais pistas são chamadas de pistas de contextualização. Elas são aspectos verbais e não verbais do código comunicativo que provê um esquema interpretativo para o conteúdo referencial da mensagem. Esses esquemas, também conhecidos como padrões de conhecimento, são padrões de expectativas e hipóteses sobre o mundo, seus habitantes e objetos. O mais importante no modelo de Gumperz (1984) é a idéia de que esses esquemas não são apenas forçados pela grande estrutura interacional na qual eles estão situados, mas de que eles de fato criam contextos interpretativos através dos quais a intenção comunicativa do falante pode ser inferida. E as pistas lingüísticas ou maneiras de falar evidenciam e sinalizam a mudança de enquadres e esquemas. Assim, produção e recepção de uma mensagem dependem de acesso compartilhado, definido culturalmente, de repertórios de esquemas verbais e não verbais que estão situados na estrutura interacional em que ocorrem. A coerência, dessa maneira, dependeria da bem sucedida integração dos

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diferentes esquemas verbais e não verbais, do falante, para situar a mensagem numa estrutura interpretativa, com a habilidade do ouvinte em perceber e compreender as pistas e, por conseguinte, interpretar a mensagem.

Acreditamos que princípios que regem a AC sejam pertinentes à nossa pesquisa, porque analisamos dados autênticos numa abordagem empírica, foram esses dados que indicaram o caminho que precisaria ser percorrido, observamos estrururas recorrentes e consideramos o corpus analisado como uma conversação.

A Etnografia da Comunicação é um termo concebido por Hymes para se referir a uma abordagem sociolingüística que concerne não apenas ao uso da línguagem, mas também às regras da fala, entendida como os meios pelos quais os falantes associam modos particulares de fala, tópicos ou formas de mensagens, com cenários e atividades particulares. A ênfase dessa análise está no contexto. O destaque da EC é que ela considera a linguagem como uma forma cultural socialmente situada2. Assim, o enfoque dado é a investigação de o que, como e por que um falante deve se comunicar de forma apropriada para ser inteiramente compreendido. Nomes como John Gumperz, Dell Hymes e Muriel Saville-Troike estão entre os pesquisadores dessa área. Metodologicamente, muito desse trabalho foi desenvolvido por meio de observação-participante e também ao fazerem gravações orais das interações estudadas. Em se tratando de sala de aula, as questões levantadas por Hymes sobre competência comunicativa influenciaram Widdoson (1978) a escrever Teaching language as

communication, daí surgindo as idéias de uma abordagem comunicativa no ensino de

línguas estrangeiras.

2

SAVILLE-TROIKE, Muriel. The ethography of communication – an introduction. New York: Basil Blackwell Ltd, 1982.

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Os autores que adotam essa abordagem, iniciam suas análises a partir de um exame detalhado do evento no qual a interação descrita acontece. Hymes (1973) é considerado o pioneiro e a maior figura dessa forma de estudo da comunicação. O primeiro conceito central dessa escola é a comunidade de fala, definida por Hymes como uma comunidade dividindo regras para a conduta e interpretação do discurso e regras para a interpretação de, no mínimo, uma variável lingüística. Em sua procura por modelos lingüísticos e regularidades, os etnógrafos da comunicação baseiam suas análises na descrição de princípios de modelos sociais existentes em certa comunidade

de fala. Para eles, deve-se iniciar com um grupo social e considerar todas as variáveis

lingüísticas presentes nele, ao invés de começar com qualquer variável.

Baseada na EC, encontramos a microanálise etnográfica da conversação. Os estudos que adotam essa abordagem de pesquisa têm em comum o objetivo de apresentar um autêntico e holístico retrato de um determinado contexto cultural e social e, portanto, como toda pesquisa com esse tipo de objetivo, apresentam perfil de pesquisa interpretativa e etnográfica. Para caracterização do evento de fala, o segundo conceito-chave da EC, os etnógrafos da comunicação devem categorizar o texto. Hymes (1986) define um evento de fala como uma atividade ou aspectos de uma atividade em que as regras sociais são estritamente conectadas com as lingüísticas. Ele sugere que, para qualquer evento de fala, o etnógrafo deve descrever os componentes básicos da fala, que são forma da mensagem (como as coisas são ditas), conteúdo da mensagem (como tópicos e mudanças de tópicos influenciam a estrutura de um evento), cenário, falante ou ouvinte, propósitos, canais, formas de fala, normas de interação, normas de interpretação e gêneros. Esses componentes serão

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sistematicamente observados no capítulo 5. E, por fim, o terceiro conceito-chave da EC,

ato de fala, que é o enunciado efetivamente realizado por um determinado falante numa

dada situação.

Essa abordagem permite-nos realizar um exame detalhado do evento aula, para podermos descrever o princípio de modelo social existente nessa comunidade de fala. Ao observarmos os componentes básicos da fala, e mais especificamente quem controla o canal de comunicação nesse evento, podemos verificar a predominância dos MD a serem encontrados e, assim, obtermos um retrato desse contexto. Contexto esse que se refere a um gênero determinado.

Os gêneros são padrões comunicativos que, socialmente utilizados, funcionam como espécies de modelos comunicativos em conhecimento social localizado em situação concreta. Bakhtin (2004) afirma que somente sob forma de gêneros específicos os enunciados se revestem de sentidos na cadeia discursiva. Como as situações/ atividades variam no seio da sociedade, os gêneros também são altamente heterogêneos e se mesclam conforme a necessidade imposta pela dinâmica social.

A idéia de que gêneros discursivos são construídos nas práticas sociais sugere que a situação de enunciação não seja algo que se acrescenta à língua, mas algo que condiciona a organização da língua e, portanto, a historiciza. Os gêneros discursivos em cada esfera de atividade adquirem do ritual em que são produzidos suas características comuns, mas cada um deles se singulariza pelos traços bakhtinianos: o tratamento do tema, o querer-dizer do locutor e as formas típicas de estruturação do gênero. Todavia, o gênero não é uma forma fixa, cristalizada, mas constituída numa

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relação heterogênea com outros gêneros, posto que é no acontecimento enunciativo que o gênero adquire concretude.

O gênero aula remete a uma experiência em que cada um conhece o seu papel na interação. Alguns elementos ritualísticos são determinados (papel do professor, papel do aluno), pois há certas operações discursivas que fazem parte do ritual de sala de aula (quem fala primeiro, quem fala depois). De acordo com Uyeno (1956), as relações hierárquicas da sociedade são apreendidas por meio de cotidianos ritualizados, fazendo crer que são naturais. É o imaginário social que legitima as relações de poder, incidindo nas relações de ensino no bojo da escola.

Ao se fazer uso da fala, ao se produzir um discurso qualquer, presume-se um tipo de ritual social da linguagem implícito, mas que é partilhado por todos. Em uma instituição escolar, por exemplo, qualquer discurso produzido por um professor, na sala de aula, é apresentado em um contrato que lhe credita o lugar de detentor do saber. O contrato de fala que o liga aos interlocutores, alunos da instituição de ensino, não lhe permite ser não possuidor do saber, não possuidor do conhecimento científico.

Durante o evento de fala, o professor dá ao aluno pistas para que o mesmo seja capaz de acompanhar o seu raciocínio lógico utilizado no decorrer do mesmo. Acreditamos, baseada em trabalhos que serão oportunamente discutidos, que o uso de marcadores discursivos na interação em sala de aula funciona como orientador e facilitador da compreensão das informações veiculadas no evento.

Outra perspectiva envolvida nesta dissertação é a sociointeracionista, aqui incluindo tanto autores como Gumperz e seus seguidores quanto Vygotsky e os que nele se baseiam para o desenvolvimento de seus estudos. Essa perspectiva está

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ancorada na pesquisa qualitativa empírica e interpretativa. Trata-se do estudo da organização social do discurso em interação. Dessa forma, o que se propõe é o estudo do uso da língua na interação social. Essa interação social ou qualquer tipo de encontro face a face demonstra uma complexidade que pode ser vislumbrada em uma análise da organização do discurso e da interação social. Isso porque, na condição de participantes, estamos freqüentemente introduzindo ou sustentando mensagens que organizam o encontro social, mensagens que orientam a conduta dos participantes e atribuem significado à atividade em desenvolvimento ao mesmo tempo que ratificam ou contestam os significados atribuídos pelos demais participantes.

Como participante dessa interação, o interlocutor tem a posição de quem procura entender o significado do discurso, a partir do contexto interacional, indagando sempre: onde se situa o contexto da fala, onde está a realidade de uma dada interação? O que está acontecendo? Por que isso agora? Todavia, nessa abordagem do discurso, tanto o falante como o ouvinte têm papéis ativos na elaboração da mensagem e na definição do que está passando aqui e agora. A noção de contexto ganha relevância, passando a ser entendida como criação conjunta de todos os participantes presentes ao encontro e emergente a cada novo instante interacional3 .

Esses papéis ativos na elaboração da mensagem demonstram a dependência social do outro. E essa dependência é percebida desde o nascimento, quando o Homem entra em um processo histórico que, de um lado, oferece dados sobre o mundo e, de outro, permite a construção de uma visão pessoal sobre esse

3

RIBEIRO, Branco Telles e GARCEZ, Pedro M. (orgs.) Sociolingüística Interacional. Edições Loyola, São Paulo, Brasil, 2002.

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mesmo mundo. A experiência é pessoal, intransferível e está inserida em um tempo e espaço em movimento constante. No entanto, cada vida se integra e se entrelaça com outras muitas histórias de outras vidas. Como resultado, sendo seres ontologicamente sociais, passamos a construir a nossa história só e exclusivamente com a participação dos outros e da apropriação do patrimônio cultural da humanidade. Temos assim um movimento de constituição do Homem que passa pela vivência com os outros e vai se consolidar na formação adulta de cada um de nós.

Essa discussão tem em Vygotsky (1996, 1998) e em outros psicólogos russos a sua origem. Seu aprofundamento vem sendo feito à luz de experiências, especialmente do campo educacional. Na perspectiva sociointeracionista vygotskyana, encontramos uma visão de desenvolvimento humano baseada na idéia de um organismo ativo cujo pensamento é construído em um ambiente histórico e cultural: a criança reconstrói internamente uma atividade externa como resultado de processos interativos que se dão ao longo do tempo. Vygotsky salienta que as possibilidades que o ambiente proporciona ao indivíduo são fundamentais para que este se constitua como sujeito lúcido e consciente, capaz, por sua vez, de alterar as circunstâncias em que vive. O nascimento proporciona vivências em situações diversas, interações sociais com parceiros mais experientes – adultos ou companheiros de mesma idade – que orientam o desenvolvimento do pensamento e o próprio comportamento da criança e daqueles de quem dependerão as suas aprendizagens mediante as experiências a que for exposta. A mediação é importante porque, enquanto sujeito do conhecimento, o homem não tem acesso direto aos objetos, mas acesso mediado, através de recortes do real, operados pelos sistemas simbólicos de que dispõe. Dessa forma, Vygotsky

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enfatiza a construção do conhecimento como uma interação mediada por várias relações, ou seja, o conhecimento não está sendo visto como uma ação do sujeito sobre a realidade, e sim pela mediação feita por outros sujeitos. Assim sendo, o importante é a aquisição de conhecimentos pela interação do sujeito com o meio.

Segundo Vygotsky (1984), o processo de construção do conhecimento ocorre em uma complexa dinâmica interativa, da qual participam três elementos essenciais: o aluno, como sujeito do conhecimento; os conteúdos e os significados; o professor que atua como mediador. Essa concepção supõe um caminho em direção à identificação e análise dos mecanismos mediante os quais ocorre o conhecimento. Suas concepções sobre o conhecimento representam um marco na interação que existe simultaneamente entre aprendizado e desenvolvimento humano. As relações com um conhecimento anteriormente possuído dirigem a atenção e a memória do indivíduo, orientando sua percepção e facilitando a aprendizagem. Os mecanismos mediadores são internalizados e o indivíduo deixa de operar com signos externos, passando a usar as representações mentais, os conceitos, as imagens visuais, as palavras, realizando atividades mais complexas nas quais é capaz de controlar deliberadamente suas ações através de recursos internalizados. Trata-se, então, de uma trama complexa implícita no processo de construção do conhecimento dos seres humanos. Embora concordemos com as concepções de conhecimento apresentadas por Vygotsky, as análises realizadas vão mostrar que a professora – pelo menos nos dados que constituem a base desta investigação – não atua em todos os momentos como mediadora.

A linguagem é o principal instrumento simbólico de representação da realidade nesse processo de intermediação em que há a transformação das funções

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psicológicas elementares (por exemplo: memória) em superiores (por exemplo: raciocínio, atenção voluntária). A linguagem foi preocupação central para Vygotsky que a abordou em seu aspecto funcional, psicológico. Ela não foi considerada como um sistema lingüístico de estrutura abstrata, mas estudada em conexão com o pensamento. Quando criança, o pensamento evolui sem a linguagem, pois há uma linguagem pré-intelectual e um pensamento pré-lingüístico. Quando os prés se juntam, surge um novo tipo de organização lingüístico-cognitiva. É aí que o pensamento se torna verbal e a linguagem, racional. Há um propósito na fala, e esta serve ao intelecto.

Os vários campos do conhecimento, destacados neste item, apresentam contribuições aos estudos sobre interação. Em nossa pesquisa utilisamos princípios de cada perspectiva, que nos conduziram a observar aspectos, como: organização do evento, observação dos participantes e suas relações; e organização social do discurso na interação.

Em conformidade com as discussões implementadas, tomamos o conceito de

interação como uma produção conjunta, em que dois ou mais conversacionalistas vão

construindo o texto. As ações estão interligadas numa complexa rede de intervenções, com base nas contribuições dos envolvidos, que atuam de acordo com as formas como eles lêem o evento, isto é, com base em suas interpretações do que está ocorrendo. Três grandes perspectivas de estudo formam a base das nossas investigações: da AC de linha etnometodológica, tomamos a preocupação com as questões que giram em torno da organização, já que à etnometodologia interessa saber como se cria ordem social. Adotamos seu pressuposto básico de que toda conversação tem uma estrutura

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organizada. Dela, extraímos os conceitos de marcador discursivo e de tópico discursivo, que serão discutidos mais adiante.

A EC nos dá a base para considerarmos a aula enquanto um evento

comunicativo, isto é, como práticas governadas por regras de conduta e interpretação:

no Capítulo 5, usaremos suas categorias para observar aspectos do evento aula.

Por fim, os comportamentos de professores e alunos estão baseados em suas estruturas de expectativas, que determinam os vários alinhamentos que se atualizam em sala de aula. Valemo-nos desses conceitos do Sociointeracionismo para, mesmo sem procedermos à uma análise cognitiva detalhada, explicarmos os comportamentos dos interactantes, tais noções estão na base do aparato teórico metodológico que fundamenta esta pesquisa. Obviamente, os limites entre as três perspectivas aqui destacadas não são claramente demarcados e os pressupostos teóricos e categorias, mesmo que com nomes diferentes, podem ser equivalentes, assim como posturas metodológicas. A exposição foi assim dividida por propósitos didáticos.

(41)

3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA : Estudos sobre o discurso de sala de aula

Os estudos sobre o discurso em sala de aula são variados e cumprem objetivos diferentes. Há que se considerar que a interação em sala de aula, por suas características e funcionalidade, guarda especificidades, ao lado de nossas próprias observações, alguns achados a respeito dessa interação são aqui comentados. Pelos objetivos subjacentes à interação em sala de aula, o tópico discursivo – visto como uma co-construção de dois ou mais conversacionalistas – tem características próprias, peculiares ao evento comunicativo em questão.

No processo de interação há uma relação de troca. No caso da interação na sala de aula, esse processo envolve vínculos entre quem ensina e quem aprende. Nesse momento, percebemos que quem ensina aprende e vice-versa. O aluno não é ensinado nem o professor o faz aprender. Aluno e professor interagem no espaço denominado sala de aula. Esse espaço é a primeira aproximação da criança das esferas públicas de interação social. Todavia ele ainda pode ser considerado como público restrito, tendo em vista que os atores desse processo foram previamente determinados e são de certa forma limitados em número.

Nesse espaço, o discurso é representado como um processo de construção social. Isso porque o significado é um construto negociado pelos participantes, ou seja, não é intrínseco à linguagem. E ainda, a construção social do significado é situada em circunstâncias sociohistóricas particulares e é medida por práticas discursivas específicas nas quais os participantes estão posicionados em relação de poder. Percebemos que, nessa visão de discurso como construção social por meio do qual os

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participantes constroem a realidade e a si mesmos através do discurso, a construção da identidade social é vista como estando sempre em processo. A identidade é identificada como produção, como processo, visto que é dependente da realização discursiva em circunstâncias particulares: os significados que os participantes dão a si mesmos e aos engajados no discurso. Assim, concordamos com a afirmação de Shotter (1989, apud Moita Lopes, 2002) de que somos criados da forma que somos pelos outros à nossa volta.

As práticas discursivas na sala de aula desempenham um papel importante no desenvolvimento de sua conscientização sobre suas identidades e a dos outros. Isso se entendermos a escola como instituição socialmente justificável como espaço de construção de conhecimento/ aprendizagem, na qual os significados que são gerados nas salas de aula têm mais crédito social do que em outros contextos. E esse crédito é devido ao papel de autoridade que o professor desempenha na construção do significado. Por conseqüência, as atividades sociais construídas na escola podem desempenhar um papel importante na vida dos indivíduos quando se depararem com outras práticas discursivas nas quais suas identidades são reexperenciadas ou reposicionadas1.

A construção dessas atividades sociais é resultado da negociação patente na interação entre professor e aluno. Segundo Moita Lopes (1996), essa negociação é que vai levar à construção de um conhecimento comum entre esses participantes. Esse conhecimento é construído conjuntamente em sala de aula através de um processo que

1

MOITA LOPES, Luís Paulo da. Identidades Fragmentadas: A construção discursiva de raça, gênero e sexualidade na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2002.

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envolve controle, negociação, compreensão e falhas na compreensão, até que passa a fazer parte do conhecimento compartilhado na sala de aula.

A aprendizagem em sala de aula é caracterizada pela interação social entre os significados do professor e os dos alunos, na tentativa de construção de um contexto mental comum. Ao colocarmos junto a essa aprendizagem o ensino, verificamos que os dois são processos que ocorrem por meio de uma produção lingüística, inevitável e imprescindível, presente em toda e qualquer sala de aula. Professores e alunos necessitam se apropriar do recurso lingüístico, para que, em permanente articulação, alcancem seus objetivos nas tarefas de ensino e aprendizagem. Pois é no contexto de sala de aula que professores e alunos, mediados pela linguagem, constroem ativamente o sentido de mundo.

De acordo com Mortimer e Scott (2003), o processo de aprendizagem não é visto como a substituição das velhas concepções, que o indivíduo já possui antes do processo de ensino, pelos novos conceitos científicos, mas como a negociação de novos significados num espaço comunicativo no qual há o encontro entre diferentes perspectivas culturais, num processo de crescimento mútuo. Embora os autores façam referência, especificamente, ao ensino de Ciências, compreendemos que seja possível ampliar os comentários feitos para um contexto educacional mais geral. Afinal de contas, uma aprendizagem significativa contempla não apenas o que se deseja ensinar e aprender, mas também aquilo que já se sabe. Dessa forma, o termo negociação, utilizado pelos autores, representa claramente essa concepção de ensino e aponta para a importância da interação entre professor/aluno e aluno/aluno no espaço da sala de aula.

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Acreditamos que um cenário de negociação supõe a consolidação de ambos os discursos, o do professor e o do aluno. É imprescindível que haja o reconhecimento recíproco das mensagens, cabendo ao professor aceitar como legítimo o discurso do aluno e vice-versa, e ao educando, ouvir e respeitar a comunicação de seu mestre. E, assim, é em um ambiente de fluidez lingüística que os objetivos que norteiam qualquer processo de ensino-aprendizagem podem ser alcançados.

Por isso, quando os alunos deixam de ser considerados interactantes e os professores assumem o discurso monológico que veicula o saber, ocorre a perda de reconhecimento do professor pelo aluno. Embora se estabeleça um padrão de comunicação nesse contexto, pautado em um discurso de autoridade, o reconhecimento recíproco deixa de existir, promovendo uma desmotivação progressiva dos alunos no ato de aprender. Nesse contexto, não há reconhecimento mútuo dos envolvidos no evento. Existe a presença do aprendiz, mas não há negociação pela mediação da linguagem. E isso não deveria acontecer, porque é na sala de aula que o educador escolar serve de mediador entre a criança e o mundo.

Acrescentamos que a falta de estímulo interfere na interação. Se os alunos são motivados a se expressar oralmente, suas comunicações adquirem valor na sala de aula, estimulando as relações interativas, o que pode propiciar um ambiente de negociação e aprendizagem. Essas relações interativas provenientes das trocas entre os parceiros têm sua importância como momentos significativos no processo de ensino-aprendizagem. Tal importância remete à psicologia sociohistórica. Essa psicologia sugere objetivo e finalidades que, acredita-se, devam ter ação educativa. Essa mesma

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psicologia traz em seu bojo a concepção de que todo Homem se constitui como ser humano pelas relações que estabelece com os outros.

A negociação valoriza as trocas entre os parceiros em sala de aula, pois é nas interações que tanto o conceito científico pode ser mais detalhado pelo professor, pois passa a ser mais discutido em um processo descendente, quanto os conceitos mais cotidianos dos alunos passam a ser enriquecidos e tomam um caminho mais ascendente, pois são ampliados pelo conhecimento científico, elaborado historicamente.

Professores e alunos podem conferir às palavras significados e sentidos diferentes. Dessa forma, interações sociais de crianças com parceiros mais experientes, como fora postulado por Vygotsky, estimulam-nas não só na apropriação da linguagem, como também na sua expansão, possibilitando, assim, a elaboração de sentidos particularizados que dependem da vivência infantil e da obtenção de significados mais objetivos e abrangentes.

Na perspectiva sociointeracionista, sociocultural ou sociohistórica na qual se insere Vygotsky, o desenvolvimento humano se dá em relação, nas trocas entre parceiros sociais, através de processos de interação e mediação. Ele enfatizava o processo histórico-social e o papel da linguagem no desenvolvimento do indivíduo. Sua questão central é a aquisição de conhecimentos pela interação do sujeito com o meio. Para ele, o sujeito é interativo, pois adquire conhecimentos a partir de relações intra e interpessoais e de troca com o meio, partindo de um processo denominado mediação. Os conceitos sobre desenvolvimento e aprendizagem, nessa perspectiva, podem ser mais bem compreendidos ao tratarmos o que Vigotsky denomina de Zona de

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Desenvolvimento proximal (ZDP). Esse conceito define a distância entre o nível de desenvolvimento real, determinado pela capacidade de resolver um problema sem ajuda, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da resolução de um problema sob a orientação de um adulto ou em colaboração com outro companheiro. A ZDP é o campo intermediário do processo.

Para Vygotsky, o processo de aprendizagem deve ser olhado por uma ótica prospectiva, ou seja, não se deve focalizar o que a criança aprendeu, mas sim o que ela está aprendendo. Em nossas práticas pedagógicas, sempre procuramos prever em que tal ou qual aprendizado poderá ser útil àquela criança, não somente no momento em que é ministrado, mas para além dele. É um processo de transformação constante na trajetória das crianças. As implicações desta relação entre ensino e aprendizagem para o ensino escolar estão no fato de que este ensino deve se concentrar no que a criança está aprendendo, e não no que já aprendeu. Vygotksy firma esta hipótese no seu conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP).

(Creche Fiocruz, 2004)

Vygotsky (1996, 1998) dá grande valor ao processo de interação, às intervenções pedagógicas e ao ensino na construção do conhecimento. Para ele, não é suficiente ter todo o aparato biológico da espécie para realizar uma tarefa se o indivíduo não participa de ambientes e práticas específicas que propiciem essa aprendizagem. O processo de ensino-aprendizagem se dá via interação. É na interação entre as pessoas que em primeiro lugar se constrói o conhecimento que depois será partilhado pelo grupo junto ao qual tal conhecimento foi conquistado ou construído. O desenvolvimento e a aprendizagem estão relacionados ao fato de o ser humano viver em um meio social.

O processo interativo em uma sala de aula oferece o direito de fala a todos, proporciona o levantamento de hipóteses, negociações, permite chegar a conclusões que ajudam o aluno a se perceber parte de um processo dinâmico de construção. Não

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é uma sala de aula onde cada um faz o que quer, mas onde o professor seja o articulador dos conhecimentos e todos se tornem parceiros de uma grande construção, pois, ao valorizarmos as parcerias, estamos mobilizando a classe para pensar conjuntamente e não para esperar que uma única pessoa tenha todas as respostas para tudo.

Todavia (mesmo valorizando as interações), reafirmamos que na sala de aula há papéis que precisam estar bem definidos, mas também queremos reforçar que esses papéis não estão rigidamente constituídos, ou seja, o professor vai, sim, ensinar o seu aluno, mas este poderá aprender também com os colegas mais experientes ou que tiverem vivências diferenciadas. Ao professor caberá, ao longo do processo, aglutinar todas as questões que aparecem e sistematizá-las de forma a garantir o domínio de novos conhecimentos por todos os seus alunos.

Na interação em sala de aula, os tópicos são pré-determinados, no sentido de que eles são parte de um programa de curso previamente elaborado. É preciso notar que os objetivos de um evento influenciam consideravelmente a forma do conteúdo da mensagem. Barros (1991) declara que em algumas atividades em língua estrangeira, cujo objetivo primordial é praticar a estrutura da língua, alvo maior do que transmitir certas informações, a escolha dos tópicos deve ser menos restrita. Em se tratando de um curso de formação intensiva de professores de língua estrangeira (Língua Francesa) com um programa de curso previamente elaborado, os tópicos são pré-determinados e o objetivo não é apenas praticar a estrutura da língua, mas transmitir informações específicas.

(48)

Segundo Barros (1991), no evento aula nós observamos três níveis principais, relacionados a saberes específicos, considerando o tipo de tópico discursivo que pode surgir:

- um nível instrucional, compreendendo tópicos que se referem ao tópico acadêmico envolvido. O foco está na informação específica;

- um nível organizacional, que inclui tópicos relativos a negociações entre interactantes: mudança de horário, exames, o programa do curso; e

- um nível disciplinar, incluindo tópicos relativos à admoestação de alunos, chamando a atenção deles para a relevância do tópico acadêmico.

O tipo de interação que ocorre na sala de aula entre o professor e os alunos é usualmente considerado formal. Uma maior ou menor participação dos envolvidos no evento revela o grau de formalidade do mesmo. Segundo Tardelli (2002), os lugares e os papéis dos interactantes já foram previamente definidos, tanto pela instituição de ensino quanto pela sociedade, e a compreensão desse princípio direciona o grau de formalidade no registro lingüístico utilizado e as relações interpessoais, além de intervir no tipo de gerenciamento da aula.

Em um contexto de interação, o conhecimento se constrói nas atividades de interlocução que possibilitam a emergência de falas heterogêneas e a condição de torná-las relevantes e incorporá-las ao tema trabalhado. E este, por sua vez, subsidia a produção de texto. Assim, o processo pedagógico atende a uma necessidade real de comunicação. Por isso, ao trabalhar o conteúdo por meio de ações, ou seja, trabalhar competências, o professor deixa de ser aquele que detém o conhecimento, trabalha em parceria com o aluno e atua como mediador na construção do saber.

(49)

Embora ocorra na escola a construção de conhecimento por parte dos alunos, mediada pelo professor, reafirmamos que os conteúdos a serem trabalhados não são, na maioria das vezes, negociados pelos interactantes. A maioria deles é uma imposição institucional. Os alunos devem aprender mesmo não achando o tópico atrativo ou interessante. Cabe ao professor otimizar as condições de aprendizagem. Para tanto, algumas técnicas ou estratégias usadas pelo professor têm a finalidade de assegurar a atenção do aluno ao tópico em foco, garantir certo armazenamento das mensagens e permitir que o aluno identifique e assimile o conhecimento científico. O professor pode realizar atividades em duplas ou em grupos pequenos, utilizar músicas, filmes, leituras de contos, dramatizações de diálogos estudados, apresentações teatrais, etc.

Acreditamos que qualquer modelo teórico apresenta limitações. É provável que um modelo específico seja útil para a percepção e análise de certos fatos ou fenômenos lingüísticos, mas inadequado para trabalhar com outros ou mesmo aceitar a sua existência. Por isso recorremos a diferentes estudos, com o intuito de elaborar um aparato que melhor dê conta dos processos interacionais que ocorrem na sala de aula.

(50)

4. MARCADORES DISCURSIVOS

Neste capítulo, nos propomos discutir o conceito de marcador discursivo, vistos como itens que, do ponto de vista informacional, podem ser considerados como sintaticamente irrelevantes, mas com importante papel pragmático (4.1.), defendendo uma postura que privilegia um enfoque funcionalista da questão (4.2.). Procedemos, também, com uma breve revisão bibliográfica sobre os principais marcadores estudados neste trabalho (4.3.). Os marcadores desempenham uma macrofunção metadiscursiva, reportando-se ao próprio discurso de forma rápida e eficiente, assim contribuindo para a criação de sentidos – tal função é discutida em 4.4.

Nos estudos sobre marcadores encontramos duas grandes tendências de observação: os que partem de itens definidos previamente como marcadores e tentam observar seus pontos de ocorrência e usos; e os que partem de uma análise do discurso em si, verificando qual o papel de tais partículas no texto. Na tendência predominantemente formal, Marcuschi (2003) afirma que os marcadores podem ser responsáveis tanto pela sintaxe da interação quanto pela segmentação e pelo encadeamento de estruturas lingüísticas. De forma geral, os MD podem ser observados do ponto de vista formal, para o funcional, e do ponto de vista da função, para a forma.

Os MD podem ser produzidos pelo falante e pelo ouvinte e aparecem no início, no meio ou no fim das unidades lingüísticas. Os produzidos pelo falante ou pelo ouvinte servem para sustentar o turno, preencher pausas, dar tempo à

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