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BULLYING: A RESPONSABILIDADE CIVIL E O DEVER DE INDENIZAÇÃO

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EVELIN SOFIA R. KONIG

BULLYING: A RESPONSABILIDADE CIVIL E O DEVER DE INDENIZAÇÃO

MESTRADO EM DIREITO

(2)

BULLYING: A RESPONSABILIDADE CIVIL E O DEVER DE INDENIZAÇÃO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de MESTRE em DIREITO, sob a orientação do Professor Doutor Francisco José Cahali

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BULLYING: A RESPONSABILIDADE CIVIL E O DEVER DE INDENIZAÇÃO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de MESTRE em DIREITO, sob a orientação do Professor Doutor Francisco José Cahali

Aprovado em: _____________

Prof. Dr. Francisco José Cahali (orientador)

Instituição: PUC-SP Assinatura_______________________ Prof. Dr.______________________________________________________ Instituição:___________________ Assinatura_______________________

(4)

Dedico este trabalho aos meus filhos, Edward e Beatrice, para que tenham um mundo melhor sem preconceitos e com tolerância.

Ao meu marido Martin, aos meus pais Cila e Adolfo (in memoriam), e

(5)

Aos queridos e admirados Professores Dr. Mário Luiz Sarrubbo, Dra. Mariângela Sarrubbo Fragata e Dr. Arnaldo Hossepian Salles Lima Junior, pelo apoio e a confiança que em mim depositaram.

Ao meu grande Mestre Dr. Fernando Bernardes Pinheiro (in memoriam),

meu agradecimento especial pela confiança irrestrita, pela oportunidade de ter trabalhado ao seu lado e por ter incentivado meus sonhos.

Ao Professor Dr. Francisco José Cahali pela honra de ser o orientador da minha tese e por partilhar seu saber e suas valiosas contribuições para o trabalho.

Os meus amados e idolatrados Pais, Cila Schaffer Rosenberg e Adolpho Rosenberg (in memoriam), que me ensinaram a ousar, ter fé e perseverança em meu

caminho.

Aos meus desejados e amados filhos, Edward Konig e Beatrice Alana Konig, que iluminam meus dias e me apoiam incondicionalmente em todos os momentos.

(6)

O bullying é um fenômeno relativamente recente, mas que traz consequências

extremamente nocivas à harmonia social. São agressões morais e físicas lastreadas na falta de tolerância e respeito em relação ao próximo. Assim, esta pesquisa questiona a responsabilidade civil das escolas em relação aos seus alunos e a responsabilidade civil dos pais em relação aos filhos menores de idade. Enraizada no preceito de não lesar a outrem, emerge a obrigação de reparar eventuais danos provocados, de qualquer natureza.

(7)

Bullying is a relatively recent phenomenon, but with extremely harmful consequences to social harmony. They refer to moral and or physical assaults supported by the lack of tolerance and respect towards others. Thus, this paper questions the liability of schools facing their students and the civil liability of parents toward their minor children. Rooted on the precept of no harm to others, emerges the obligation to repair damages of any nature.

(8)

1 CONCEITUANDO O FENÔMENO BULLYING 12

1.1 Conceito 12

1.2 A palavra bullying no Brasil e em sua língua de origem 13

1.3 Mitos X Conceito 16

1.3.1 Mitos e Fatos 17

1.4 Formas de Bullying 18

1.5 Personagens Envolvidos 21

1.5.1 Vítima 22

1.5.2 Agressor 23

1.5.3 Espectador 24

1.6 Consequências do Bullying 26

1.7 Cyberbullying 26

1.7.1 Breve História da Internet no Brasil 27

2 O TRATAMENTO HISTÓRICO DO BULLYING 30

2.1 Primeiros estudos científicos sobre bullying 31 2.2 Uma sugestão de tradução para o termo bullying 36 2.3 O bullying como um fenômeno social relativamente novo 39

2.4 Exemplos brasileiros e internacionais de casos de bullying

nas escolas 41

2.4.1 Fatos recentes relacionados ao bullying nos Estados Unidos 43 2.4.2 Fatos recentes relacionados ao bullying no Brasil 48 2.4.3 Fatos recentes sobre bullying como um crime no Brasil 56

3 RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATOS DE BULLYING 60

3.1 Pressupostos da Responsabilidade Civil 60

3.1.1 Ação e omissão 61

3.1.2 Dano 63

3.1.2.1 A reparação de danos no Código de Defesa do Consumidor 64

3.1.3 Nexo Causal 67

3.2 O Bullying como Ato Ilícito 69

3.3 Classificação da Responsabilidade Civil 71

3.3.1 Responsabilidade Contratual e Extracontratual 71 3.3.2 Responsabilidade Objetiva e Subjetiva 72 3.3.3 Responsabilidade por ato próprio ou por ato de terceiro 72

3.4 O Bullying e a Legislação Aplicável 72

3.5 Responsabilidade Civil das Escolas 73

3.6 Responsabilidade Civil dos Pais 75

4 DO DANO E SUA REPARAÇÃO 79

4.1 Dano Material e Dano Moral 79

4.2 Tendências Atuais de Reparação de Danos no Brasil 80

(9)

5 MEDIDAS DE PREVENÇÃO 91

5.1 Algumas sugestões de medidas voltadas ao esclarecimento e

ao controle do bullying 96

CONCLUSÃO 98

REFERÊNCIAS

(10)

INTRODUÇÃO

O bullying é um fenômeno social cuja inserção multidisciplinar nos meios

acadêmicos pode ser considerada relativamente recente. Apesar disso, trata-se de um problema já conhecido nas áreas de educação e de psicologia. A sociedade atual, conhecida como da informação, impõe novos desafios às instituições no trato de situações de tal natureza. Novas formas de bullying surgem na mesma toada das novas ferramentas

tecnológicas, uma vez que o problema em si está intrinsecamente ligado à comunicação humana de forma abrangente. Mas permanece a urgência que em nada se diluiu com o tempo – pelo contrário: como tratar desse fenômeno no âmbito social e, claro, jurídico.

Ignorar o problema não pode, certamente, ser aceito como um dos possíveis encaminhamentos, mas é esse tipo de inação que, infelizmente, tem predominado não só no âmbito jurídico. Pesquisas recentes sobre o tema esclarecem: uma das origens desse tipo de comportamento entre crianças e jovens, perpetuado na vida adulta, é um modelo de solução de conflitos com base em agressividade ou na violência.

Ora, e não é exatamente esta uma das funções primordiais do Direito? Oferecer modelos para a solução de conflitos de forma pacífica? É perigoso o distanciamento do sistema jurídico ante o bullying, uma vez que não faltam dados para amparar a conduta legal.

Temos assistido recentemente a um aumento de casos trágicos dentro de escolas brasileiras, uma tendência que há poucas décadas parecia ser um traço atávico da educação norte-americana.

Mesmo diante de tragédias com repercussão nacional, as ações concretas em âmbito estatal ainda não foram além de medidas de prevenção primária, como a discutível presença policial dentro de escolas, um modelo adotado em 2012, pelo governo estadual do Rio de Janeiro. Tratar o bullying dentro das escolas como um assunto de polícia não traz

resultados positivos, conforme demonstram experiências e estudos sobre o tema. Além disso, observamos debates isolados sobre a possibilidade de revistas aos alunos e instalação de detectores de metal nas instituições de ensino – ações que vão na contramão das melhores soluções já verificadas para o problema.

(11)

organizações nacionais de combate à discriminação e ao bullying, caso da Austrália, e

diversas outras medidas as quais citaremos durante o nosso estudo.

Porém, o papel do Direito nesse panorama é contribuir para refrear o problema e amparar a sociedade no trato dessa tendência, muito antes de se posicionar como um agente direto de combate. As bases da responsabilidade civil são suficientes para a adoção de medidas concretas no sentido adequar o aparato legal à sociedade, em acordo e harmonia com o arranjo desta última, como é essencial no Direito.

A erradicação não pode ser um dos objetivos no âmbito jurídico, assim como não o é em outras situações. A inexistência de fenômenos sociais que possam ser chamados

“anômalos” no campo da sociologia não depende e, historicamente, nunca dependeu somente

da via legal, mas sim de circunstâncias sociais amplas, em um ordenamento maior, no qual o Direito precisa exercer sua função de forma harmônica e coerente, não apenas com seus mecanismos e instituições internas, mas com todos os elementos da sociedade na qual opera.

Trata-se de uma preocupação não apenas com o futuro, mas também com o presente. Estamos presenciando a escalada das mazelas que resultam dessas omissões e, nas escolas, cada dia significa a perpetuação de um ciclo que se opõe ao ambiente emocionalmente propício no qual se dá o aprendizado.

No Direito, tornou-se uma obrigação compreender melhor o tema. Caso não o façamos poderemos contribuir, por desconhecimento, para formar futuras gerações com mais traumas – em uma sociedade já acometida por inúmeros transtornos de origem psíquica e comportamental. Esse cenário certamente contribui para a escalada dos processos indenizatórios no sistema legal e traz um ônus social incalculável.

Trata-se, portanto, de dever cívico e humanitário entender e identificar corretamente o bullying a fim de obtermos as melhores ferramentas para o aconselhamento e a

(12)

1 CONCEITUANDO O FENÔMENO BULLYNG

1.1 Conceito

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS)1, bullying é um problema de

saúde pública que requer ação conjunta e concentrada de profissionais de saúde, da educação, legisladores, governantes e familiares.

O Ministério Público de São Paulo, em sua cartilha Bullying não é legal2,

destaca o conceito atribuído pela Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência (Abrapia):

Compreende todas as formas de atitudes agressivas, realizadas de forma voluntária e repetitiva, que ocorrem sem motivação evidente, adotadas por um ou mais estudantes contra outro(s), causando dor e angústia e realizada dentro de uma relação desigual de poder.

A tarefa de delinear o conceito pode ser auxiliada em grande parte por um exame da palavra bullying em nosso país, a maneira pela qual vem sendo absorvida e

traduzida, além de uma análise minuciosa do vocábulo em sua língua original, o inglês. Percebemos que o termo vem sendo incorporado e aceito por obras de referência da língua portuguesa, mesmo sem uma tradução precisa e amplamente difundida. No inglês, por outro lado, a situação se inverte, existindo uma ampla gama de exemplos, significados e contextos possíveis, não somente para o termo bullying, que é o substantivo, o

problema em si, mas, também, para outros agentes envolvidos.

Verificaremos que as características da palavra em si carregam elementos intrínsecos ao bullying, quando este é compreendido dentro dos conceitos aos quais se chegou

para este problema como um fenômeno relativamente recente. Isso aconteceu por meio de pesquisas internacionais envolvendo especialistas no assunto e escolas ao redor do mundo.

Atualmente existe uma literatura consolidada sobre o tema, à qual iremos recorrer para conceituar o bullying e, igualmente importante para a nossa finalidade,

estabelecer os atores nele envolvidos.

1 Disponível em:< http://www.who.int/bulletin/volumes/88/6/10-077123/en/>. Acesso em: 10 jun.2013

(13)

1.2 A palavra bullying no Brasil e em sua língua de origem

Para entendermos o histórico do bullying como um fenômeno social e

estabelecermos os conceitos relevantes à finalidade jurídica da qual tratamos aqui, um exame da palavra em si, em sua língua original, é revelador.

Não existe ainda um termo equivalente em português para a palavra bullying, o

que em princípio pode significar um empecilho de ordem cultural, no âmbito linguístico, no que pudesse facilitar a compreensão do fenômeno, questão sobre a qual abordaremos mais adiante.

O termo bullying deriva da palavra bully, que pode ser tanto verbo quanto

substantivo, e, de acordo com o Moderno Dicionário Inglês Michaelis3 online, pode ser

traduzido como “brigão”, no caso de substantivo, ou “ameaçar, amedrontar, intimidar”, no caso de verbo.

No dicionário Collins4, também português-inglês, a palavra bully pode ser

traduzida como “fanfarrão” ou “valentão” quando se tratar de substantivo, e “intimidar” ou “tiranizar” quando se tratar de um verbo.

Para compararmos com as obras estrangeiras citadas a seguir, quando oportuno, utilizaremos essas traduções.

O Dicionário Analógico da Língua Portuguesa5 relaciona a palavra bullying ao

termo “desrespeito”, em meio a uma intricada lista de expressões e verbos correlatos. Esse

exemplo nos parece notável porque demonstra a crescente aceitação do termo bullying na

sociedade brasileira, mesmo sem haver ainda uma tradução ou ampla compreensão social do fenômeno.

Vejamos, então, como o dicionário britânico Cambridge6 define o termo:

bully obj FRIGHTEN / phonetic symbol / v [T] to hurt or frighten other people, often forcing them to do something they do not want to do * Our survey indicates that one in four children is bullied at school * Don’t let anyone bully you into doing something you don’t want to do.

3 MICHAELIS Moderno Dicionário da Língua Portuguesa

. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br>. Acessso em: 15

jun.2013.

4 COLLINS. Dicionário Escolar Inglês-Português / Português-Inglês. Disal: Grã Bretanha, 1995.

5 AZEVEDO, Francisco Ferreira dos Santos. Dicionário analógico da língua portuguesa: ideias afins/thesaurus. 2. ed.

atual. e rev. Rio de Janeiro: Lexikon, 2010.

6 CAMBRIDGE International Dictionary of English: Guides you to the meaning. Cambridge University Press: Grã

(14)

Tradução livre: machucar ou assustar outras pessoas, frequentemente forçando-as a fazer algo que elas não querem fazer * Nossa pesquisa indica que uma em cada quatro crianças sofre bullying na escola * Não deixe ninguém coagi-lo a fazer algo

que você não queira fazer.

Nota-se que o exemplo utilizado remete diretamente ao ambiente escolar, citando provavelmente uma notícia de jornal, fonte frequentemente usada pelos dicionários britânicos em busca de precisão sobre o contexto dos vocábulos. Necessário também perceber que as palavras “machucar” e “assustar” remetem a tipos diferentes de agressão, física e psíquica.

Cambridge vai adiante ao explorar o termo bully como um substantivo:

bully / phonetic symbol / n [C] * You’re just a big bully! * Teachers usually know who the bullies are in a class. * (infml dated) A bully boy is a rough and threatening man, esp. one paid by someone to hurt or frighten other people. Bully-boy tactics.

Tradução livre: bully * Você é apenas um grande valentão/brigão! * Os professores geralmente sabem quem são os valentões em uma sala de aula. * (informal, antigo) um bully boy é um homem grosseiro e ameaçador, especialmente algum pago por

alguém para ferir ou assustar as pessoas. Táticas de bully-boy.

Observamos que o dicionário novamente prioriza o ambiente escolar ao listar

seus exemplos. Primeiro com a interjeição de uso comum “Você é apenas um grande

valentão!” (tradução livre), e depois com o exemplo, “Os professores geralmente sabem quem

são os valentões em uma sala de aula”, que também é relevante por deixar subentendida uma das responsabilidades envolvidas na convivência com jovens, neste caso, voltada à figura do professor.

Outra referência com origem no Reino Unido, Oxford7 entende que o bully ou

“valentão” é “uma pessoa que usa a força dele ou dela para amedrontar ou machucar pessoas mais fracas”, seguindo-se o exemplo “Deixe aquela garotinha em paz, seu grande valentão!”.

Ao analisar o termo bully como uma ação, Oxford define:

bully v (pt, pp, bullied) to frighten or hurt a weaker person or group: [Vn] The older boys bullied him at school. * a small country bullied by its powerful neighbor. PHR V bully sb into doing sth to force sb to do sth by frightening them: The manager tried to bully his men into working harder by threatening them with dismissal.

Tradução livre: intimidar ou praticar bullying amedrontar ou machucar uma pessoa

ou um grupo mais fraco: Os garotos mais velhos o intimidavam na escola. * um pequeno país intimidado por seu poderoso vizinho. EXPRESSÃO VERBAL

intimidar alguém a fazer algo forçar alguém a fazer algo ao amedrontar esta pessoa: O gerente tentou intimidar seus homens a trabalhar mais duro ameaçando demiti-los.

Mais uma vez, contextos de infância e de escola vêm à tona nos exemplos utilizados. Notemos que esse dicionário acrescenta alguns elementos à definição do termo,

(15)

que em âmbito mais geral assemelha-se às outras referências. Um elemento adicional importante que podemos perceber logo de início é a possibilidade de “amedrontar ou machucar uma pessoa”, mas não apenas, e, sim, todo um “grupo mais fraco”.

Oxford também amplia o espectro de contextos nos quais o termo é cabível ao citar o exemplo de “um pequeno país intimidado por seu poderoso vizinho” e, a seguir, com o a menção a um gerente que intimida seus funcionários por meio de ameaças.

Ou seja, o dicionário privilegia o contexto infantil e escolar em suas definições e em seus exemplos, mas aumenta o espectro do bullying para as relações geopolíticas e para

o ambiente de trabalho.

No entanto, no único momento no qual cita o termo bullying como um

substantivo e, portanto, um conceito, considera suficientes as definições anteriores e segue diretamente para o exemplo que recorre ao ambiente escolar: “bullying n [U]: There was a lot of bullying at my school” (tradução livre: bullying: Havia muito bullying em minha escola).

Outra importante referência originária da Inglaterra, o dicionário Longman Dictionary of English Language and Culture8, como o próprio título sugere, é reconhecido

por enfatizar, mais ainda do que seus dicionários compatriotas, o aspecto cultural dos termos. O substantivo bullyé citado como “uma pessoa, especialmente um menino ou uma menina em

idade escolar, que machuca ou amedronta intencionalmente pessoas mais fracas” (tradução livre).

Novamente recorre-se ao contexto educacional, mas dessa vez na definição da palavra, e não como um exemplo.

Em seguida, ao trazer a palavra bully como um verbo, Longman lançará mão

do contexto infantil para amparar sua definição: “agir como um valentão em relação a, frequentemente com a intenção de forçar alguém a fazer algo: Ele intimida todos os outros garotinhos no playground. [...]”.

A enciclopédia norte-americana Webster’s9 define

bullying da seguinte forma:

v. bullied, bullying v.t To coerce by threats; intimidate”, o que pode ser traduzido como

“coagir por ameaças; intimidar” (tradução livre).

8 LONGMAN. Dictionary of English Language and Culture. 2 ed. rev. Longman: Inglaterra, 1992..

9THE NEW International Webster’s Comprehensive Dictionary of the English Language: Encyclopedic Edition. Trident

(16)

Outra obra estadunidense, o The American Heritage Dictionary10, define o

substantivo bully, ou valentão, como “pessoa que é habitualmente cruel, especialmente com

pessoas menores ou mais fracas”, e a ação do bullyingcomo “intimidar com tamanho ou força

superior”.

Mediante a análise apresentada com base no significado da palavra bullying em

inglês, julgamos relevante eleger ao menos um termo em português mais próximo possível do significado original. Por se tratar de uma discussão que se alastra para muito além do campo jurídico, e abranger principalmente o campo da linguística, adiante iremos apontar uma sugestão com o objetivo de possivelmente utilizá-la no meio jurídico

Antes, concluiremos listando elementos intrínsecos ao bullying, revelados

amplamente pelos próprios dicionários em língua inglesa, demonstrando que, independentemente do tratamento jurídico que cada um desses países dedique ao fenômeno, há uma compreensão social já bastante antiga e arraigada – nesses e nos países de língua inglesa em geral – quanto às características do bullying.

Entre elas, citamos desequilíbrio de força física ou de poder no grupo social em questão, frequentemente o escolar; presença do bullying tanto entre meninos quanto entre

meninas; indistinção entre agressão física ou psicológica como exigência para caracterizar o

bullying, ou seja, havendo um desses tipos de agressão, o termo estará sendo corretamente

empregado; a possibilidade de envolvimento de outros atores no problema, por exemplo, os professores; a presença de uma intenção por detrás de tais atos de bullying, normalmente

relacionada a forçar as pessoas a tomarem decisões que elas não tomariam se não estivessem sob pressão; e, finalmente, a possibilidade de ampliar o uso do termo em contextos distintos do educacional, como o geopolítico ou o ambiente de trabalho.

1.3 Mitos versus conceito

É senso comum e termo clichê – mas perfeitamente aceitável – definir bullying

como algo que sempre existiu e que está arraigado aos relacionamentos desde os primórdios da humanidade. E, de alguma forma, todos já tivemos algum tipo de participação na prática do bullying, seja como agressor, vítima ou testemunha.

(17)

Mas não se deve banalizar o bullying por isso. Todavia, é o que acaba

acontecendo conforme observamos pelos chorrilhos de opiniões e “achismos” difundidos pela mídia. Nessa linha de pensamento, afirmam Gomes e Sanzovo que11 “[...] o bullying

(praticado no contexto estudantil) é confundido com meras brincadeiras, aborrecimentos ou maus-tratos escolares [...] corriqueiro e normal ao crescimento de uma criança ou adolescente”.

Ainda segundo os autores, o bullying muitas vezes é tratado como meras

ofensas ou conflitos pessoais intrínsecos ao período estudantil, ou “um rito de passagem saudável” à vida da criança ou adolescente, considerando que as marcas emocionais, angústias e tormentos decorrentes destas ações são uma espécie de pedágio no desenvolvimento da pessoa, “um acontecimento imprescindível ao amadurecimento e à preparação para a vida adulta, como um fortalecedor (encorajador) dos desafios futuros”.

1.3.1 Mitos e fatos

Abaixo, apresentamos uma tabela com base nas informações do site www.bullying.org12:

Mitos Fatos

Bullying é apenas uma fase, uma parte normal da

vida. Eu passei por isto e meus filhos vão passar também.

Bullying não é um comportamento nem `normal` nem

socialmente aceitável. Na verdade, se aceitarmos este comportamento estaremos dando poder aos bullies.

Se eu contar pra alguém, só vai piorar. As pesquisas mostram que o bullying para quando

adultos com autoridade e os colegas se envolvem.

Reaja e devolva as ofensas ou pancadas. Embora algumas vezes as pessoas sejam forçadas a se defender, bater de volta geralmente piora o

bullying e aumenta o risco de sério dano físico.

Bullying é um problema escolar, os professores é que

devem tratar disto.

Bullying é um problema social mais amplo e que

ocorre com frequência fora das escolas, na rua, nos shoppings, na piscina, nos treinamentos esportivos e

11 GOMES, Luis Flávio; Sanzovo, Natália Macedo.

Bullying e prevenção da violência nas escolas: quebrando mitos, construindo verdades. São Paulo: Saraiva, 2013.

12 Disponível em: <http://www.bullying.org/external/documents/Bullying.org_Bullying_Myths-Facts%20Pamphlet.pdf>.

(18)

no local de trabalho dos adultos.

As pessoas já nascem bullies. Bullying é um comportamento aprendido e

comportamentos podem ser mudados.

Bullying.org é um projeto colaborativo internacional, que teve início em e começou a se desenvolver a partir de 2000, por iniciativa do professor canadense Bill Belsey. O projeto tem por base 3 objetivos: ajudar as pessoas vítimas de bullying a entenderem que

elas não estão sozinhas; que a intimidação não é culpa delas e ajudá-las a entender e conhecer alternativas positivas para lidar com o bullying.

1.4 Formas de bullying

Em nosso estudo, lançaremos mão das definições obtidas por Dan Olweus, pesquisador e professor da Universidade da Noruega, principalmente por ser o autor mais citado entre os especialistas.

De acordo com as informações divulgadas no site Olweus Bullying Prevention Program (OBPP)13, o pesquisador assim define o bullying escolar: “Uma pessoa sofre bullying quando ele ou ela é exposto(a), repetidamente e ao longo do tempo, a atitudes

negativas por parte de uma ou mais pessoas, e ele ou ela têm dificuldade de defender”.

A definição carrega três componentes fundamentais: “1. bullying é um

comportamento agressivo que envolve ações negativas e indesejadas. 2. bullying envolve um

padrão de comportamento repetido ao longo do tempo. 3. bullying envolve um desequilíbrio

de força ou de poder”.

Cleo Fante14 procura ater-se ao objeto em si:

Definimos o bullying como um comportamento cruel intrínseco nas relações

interpessoais, em que os mais fortes convertem os mais frágeis em objetos de diversão e prazer, através de “brincadeiras” que disfarçam o propósito de maltratar e intimidar.

13 Original em ingles: Dan Olweus, creator of the Olweus Bullying Prevention Program, defines bullying in his book,

Bullying at School: What We Know and What We Can Do: “A person is bullied when he or she is exposed, repeatedly and

over time, to negative actions on the part of one or more other persons, and he or she has difficulty defending himself or

herself.” This definition includes three important components: 1. Bullying is aggressive behavior that involves unwanted, negative actions. 2. Bullying involves a pattern of behavior repeated over time. 3. Bullying involves an imbalance of power or strength.

14 FANTE, C. Fenômeno bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. 6. ed. Campinas: Verus, 2011,

(19)

Chama-nos a atenção o fato de o bullying ser considerado pela pesquisadora

como “intrínseco” às relações humanas, o que por sua vez, em nosso entendimento, ratifica

ser um equívoco pretender eliminar tal comportamento.

Também devemos nos atentar para a palavra “brincadeiras” grafada entre aspas pela autora, pois é intrínseco ao bullying, de forma amplamente aceita, que não se trata de

uma brincadeira.

Tanto que, em razão dessa compreensão, estudiosos do tema, profissionais da área de educação e demais protagonistas conseguiram despertar a atenção da mídia e da

sociedade para a extrema gravidade do problema: “O bullying é um fenômeno prevalente no

mundo todo, encontrado em todas as escolas, presente em todas as classes sociais, que exerce influências negativas sobre os envolvidos e sobre todos os segmentos da sociedade, indistintamente”15.

Para dar ênfase à nossa pesquisa, que é o bullying escolar, trazemos o

pensamento de Aramis Antonio Lopes Neto16, para quem o fenômeno compreende

atitudes agressivas, intencionais e repetidas, que ocorrem sem motivação evidente, adotadas por um ou mais estudantes contra outro(s), causando dor e angústia, e executadas dentro de uma relação desigual de poder, tornando possível a intimidação da vítima.

Por meio de notícias, relatos de vítimas, pesquisas de especialistas e opiniões de sujeitos envolvidos especialmente no âmbito educacional, demonstraremos que o fenômeno bullying está intimamente relacionado a atitudes intolerantes e preconceituosas.

Nesse sentido descreve Priscilla Linhares Albino:

extremamente difícil é abandonar o campo da intolerância e do preconceito – fenômenos demasiado humanos que alimentam problemas aparentemente tão diversos como o bullying escolar, por um lado, e o Holocausto da história mundial

recente, por outro17

.

15 LOPES NETO, Aramis Antonio. Bullying: saber identificar e como prevenir. São Paulo: Brasiliense, 2011. 16 Id., Ibid., p.21.

17 ALBINO, P. L. Considerações críticas sobre o fenômeno do bullying: do conceito ao combate e à prevenção. Revista

(20)

Aramis Antonio Lopes Neto18 também contribuiu para uma identificação mais resumida sobre o bullying:

Note que o bullying apresenta três elementos fundamentais: são atos repetitivos,

comportamentos danosos e deliberados, existindo sempre uma assimetria imprópria de poder entre o agressor e a sua vítima.

Percebemos que o conceito de bullying foi-se delineando na mesma medida em

que os estudos sobre o problema se desenvolveram. Por isso, as definições daquele que é considerado uma das maiores autoridades do mundo no assunto, dizem não apenas o que é

bullying, mas também remetem à visão da vítima em relação ao fenômeno. Entretanto, com a

evolução dos estudos envolvendo vítimas e agressores, conseguimos identificar mais precisamente o problema.

É possível classificar o bullying por formas de agressão, de acordo com a Lei

nº 14.651, de 12 de janeiro de 2009, sancionada pelo governo do Estado de Santa Catarina:

Artigo 3º – O bullying pode ser classificado de acordo com as ações praticadas:

I – Verbal: apelidar, xingar, insultar;

II – Moral: difamar, disseminar rumores, caluniar; III – Sexual: assediar, induzir ou abusar;

IV – Psicológico: ignorar, excluir, perseguir, amedrontar, aterrorizar, intimidar, dominar, tiranizar, chantagear e manipular;

V – Material: destroçar, estragar, furtar, roubar os pertences; VI – Físico: empurrar, socar, socar, beliscar, bater; e

VII – Virtual: divulgar imagens, criar comunidades, enviar mensagens, invadir a privacidade.

A partir deste raciocínio, Ana Beatriz Barbosa Silva classifica o bullying por

formas diretas ou indiretas de agressão:

Verbal: Insultar; ofender; xingar; fazer gozações; colocar apelidos pejorativos; fazer piadas ofensivas; “zoar”.

Físico e Material: bater; chutar; espancar; empurrar; ferir; beliscar; roubar, furtar ou destruir os pertences da vítima; atirar objetos contar as vítimas.

Psicológico e Moral: irritar; humilhar e ridicularizar; excluir; isolar; ignorar, desprezar ou fazer pouco caso; discriminar; aterrorizar e ameaçar; chantagear e intimidar; tiranizar; dominar; perseguir; difamar; passar bilhetes e desenhos entre os colegas de caráter ofensivo; fazer intrigas, fofocas ou mexericos (mais comum entre as meninas).

Sexual: abusar; violentar; assediar; insinuar. E, Virtual 19

(21)

Importante destacarmos que estas atitudes costumam acometer a vítima de forma combinada e não isoladamente.

1.5 Personagens envolvidos

Olweus sugere um questionário às escolas no qual divide o conceito de

bullying em nove categorias20: verbal, caracterizado por palavrões e comentários

demeritórios; por meio de exclusão social ou isolamento; físico, com chutes, socos, cuspidas e

outras agressões; por danos a objetos ou dinheiro tomado pelos “valentões”; por ameaças ou

por ser forçado a fazer coisas; racial; por orientação sexual; cyberbullying, por telefone

celular ou via internet.

O autor alerta que “o bullyingnão é provocação”, e pode ser “difícil diferenciar

uma provocação, em tom de brincadeira, do bullying”. Mas há elementos fundamentais a essa

diferenciação. Em brincadeiras, há “dois ou mais amigos que agem conjuntamente de uma forma que parece engraçada para todos os envolvidos”.

As provocações são comumente feitas de forma “igualitária”, sem jamais

envolver “abuso físico ou emocional”.

Sobre a maneira como as novas tecnologias potencializam os efeitos do

bullying, Lélio Braga Calhau21 ilustra: “Cyberbullying é uma mudança de ferramenta. Uma

pichação difamatória em um muro de colégio atingia 500 pessoas; hoje, uma comunidade no Orkut atinge 50 mil pessoas em um dia”.

Pode nos parecer que o autor minimiza o surgimento do cyberbullying, mas

trata-se apenas de contextualizar que, em nosso tempo, as ferramentas de comunicação, todas, são potenciais meios para a ocorrência de bullying.

Conforme observamos, sendo este um fenômeno indissociável nas relações interpessoais, é importante estarmos sempre atentos ao surgimento de novas modalidades de

20 Original em inglês: Types of Bullying - Bullying can take on many forms. As part of the Olweus Bullying Questionnaire, students are asked if they have been bullied in any of these nine ways: 1. Verbal bullying including derogatory comments and

bad names 2. Bullying through social exclusion or isolation 3. Physical bullying such as hitting, kicking, shoving, and spitting 4. Bullying through lies and false rumors 5. Having money or other things taken or damaged by students who bully 6. Being

threatened or being forced to do things by students who bully 7. Racial bullying 8. Sexual bullying 9. Cyber bullying (via cell

phone or Internet) - Bullying is Not Teasing - It might be hard to tell the difference between playful teasing and bullying.

Teasing usually involves two or more friends who act together in a way that seems fun to all the people involved. Often they tease each other equally, but it never involves physical or emotional abuse.

(22)

bullying. Descobertas recentes tornam a discussão sobre as causas do bullying cada vez mais

complexas, principalmente em razão da participação de diferentes personagens nesse debate, que vão do ramo científico ao policial.

Mas Olweus divide de maneira didática três pontos fundamentais para o comportamento dos “valentões”22: forte necessidade de poder e dominação de forma negativa;

sentimento de satisfação ao ferir e causar sofrimento a outros estudantes; os “valentões” frequentemente têm algum tipo de recompensa, material ou psicológica, por seu comportamento.

Assim, qualquer que seja o meio de comunicação envolvido, devemos nos atentar às características das relações estabelecidas. Essa etapa é essencial para identificarmos casos de bullying, independentemente do local, físico ou virtual, no qual ele acontece.

A respeito dessa questão, Aramis Antonio Lopes Neto23 analisa: “Nem todas as agressões podem ser classificadas como bullying, mas todos os atos de bullying são agressões

danosas e derivadas de comportamentos hostis e prepotentes, não importando a forma como são praticados.”

Além disso, é necessário conhecermos os possíveis atores envolvidos na situação que certamente não se retringem a vítimas e agressores. A participação de adultos, por exemplo, é frequente nos casos de bullying, seja por omissão ou envolvimento direto.

Josevaldo Araújo de Melo24 alerta sobre a situação: “São vários os personagens que atuam no comportamento bullying. Faz-se necessário identificá-lo nas suas

especificidades para melhor compreender as nuances atitudinais e suas implicações”. Em

seguida, o autor recorre às definições obtidas por Cleo Fante, quando esta “sintetiza o trabalho de outros pesquisadores”.

1.5.1 Vítima

As vítimas são divididas em três categorias. A “vítima típica” é aquela que sofre com o bullying e costuma ser o “bode expiatório” de um grupo, sem conseguir se

22 Original em inglês: Why Students Bully Information about bullying suggests that there are three interrelated reasons why

students bully. 1. Students who bully have strong needs for power and (negative) dominance. 2. Students who bully find satisfaction in causing injury and suffering to other students. 3. Students who bully are often rewarded in some way for their behavior with material or psychological rewards.

23 LOPES NETO, Aramis Antonio. Bullying: saber identificar e como prevenir. São Paulo: Brasiliense, 2011, p. 23. 24 MELO, Josevaldo Araújo de. Bullying na escola: como identificá-lo, como preveni-lo, como combatê-lo. 5. ed. Recife:

(23)

defender. A “vítima provocadora”, por meio de seus próprios comentários ou atitudes, “atrai reações agressivas contra as quais não consegue lidar com eficiência”. Existe também a

“vítima agressora”, que sofrebullying e depois reproduz esse comportamento contra outros.

1.5.2 Agressor

O agressor é aquele que “vitimiza os mais fracos” e normalmente é do sexo masculino, conforme aponta Melo. Porém, observamos uma sensível mudança nesse paradigma, no qual as meninas também passaram a praticar atos de bullying.

Historicamente, a complexidade das amizades na adolescência e os conflitos decorrentes do relacionamento entre as meninas não foram temas muito pesquisados, estudados ou discutidos por educadores e especialistas, que se pautaram sobretudo pelo

bullying físico e agressivo, mais visível, praticado por garotos.

Ao contrário do que imaginamos, as meninas não são menos agressivas do que os meninos nos relacionamentos interpessoais. Elas são sim mais sutis e dissimuladas na maioria dos casos, mas atualmente são cada vez mais numerosas as notícias de agressão física, roubos ou danos a objetos pessoais. O problema é que a intervenção rápida ocorre apenas nos casos de violência física – porém, quando o bullying assume uma forma menos

óbvia, a reação é lenta ou inexiste.

O propósito do bullying entre meninas é o de isolar a vítima e aumentar o

status da agressora. Suas principais motivações estão pautadas no ciúme, na necessidade de chamar a atenção e no medo de uma possível concorrência.

Segundo Jane Middelton-Moz e Mary Lee Zamadski25, as práticas de bullying

mais comuns entre meninas incluem boatos maliciosos, intimidação com revelação de segredos, isolar, ignorar ou excluir de algum grupo ou atividade. Incluímos também as práticas de bullying verbais diretas, como os insultos e a humilhação por meio de apelidos ou

comentários maldosos e vexatórios sobre a aparência que envolvem peso, cabelo ou outras características relativas ao corpo.

25 MIDDELTON-MOZ. J.; ZAMADSKI, M. L. Bullying Estratégias de Sobrevivência Para Adultos e Crianças

. Porto

(24)

1.5.3 Espectador

Finalmente temos ainda o “espectador”, que pode ou não reagir de forma negativa ao comportamento bullying no qual está inserido pelo convívio.

Ana Beatriz Barbosa Silva26 detalha alguns tipos de espectadores. Entre eles,

os “passivos”, aqueles que têm medo de se tornarem vítimas, por vezes são ameaçados para

permanecerem em silêncio, e assim o fazem. Os “ativos”, por sua vez, não se envolvem

diretamente na violência contra as vítimas, mas oferecem apoio aos agressores com “risadas e palavras de incentivo”. E os “neutros”, frequentemente por questões sociais, não demonstram empatia perante o bullying que presenciam. Mas em todos esses casos de espectadores, existe

responsabilidade envolvida:

Seja lá como for, os espectadores, em sua grande maioria, se omitem em face dos ataques de bullying. Vale a pena salientar que a omissão, nesses casos, também se

configura em uma ação imoral e/ou criminosa, tal qual a omissão de socorro diante de uma vítima de um acidente de trânsito.

Aramis Antonio Lopes Neto27 aponta, ainda, uma outra maneira de categorizar o bullying: direto e indireto. No primeiro caso, “a vítima vê seu agressor”; no segundo, “a

vítima é ferida, mas nem sempre sabe a quem culpar”. O autor subdivide o bullying direto em

“físico (bater, chutar, tomar pertences), verbal (apelidos, insultos), gestual, sonoro ou relacional (sinais, imitações, sons simulados, atitudes preconceituosas, sexuais ou discriminatórias).” Já o bullying indireto compreende “a disseminação de histórias

desabonadoras, exclusão, ameaças, furtos, danos materiais.”

Importante assinalarmos tal qual o autor que o bullying indireto é mais difícil

de ser identificado por pais e professores, além de dificultar sobremaneira a autodefesa. É nesta categoria que encontramos a modalidade chamada de cyberbullying.

Ana Beatriz Barbosa Silva28 analisa as consequências da permissividade por

parte dos pais, e afirma que “educar é confrontar os filhos com as regras e os limites, além de

fornecer-lhes condições para que possam aprender a tolerar e enfrentar as frustrações do

(25)

cotidiano”. Ao serem incapazes de estabelecer tais limites, os pais estão a caminho de um futuro, no mínimo, arriscado para suas famílias29:

As consequências dessa renúncia dos pais aos seus papéis de educadores são, no mínimo, desastrosas, para não dizer explosivas. Resultam em filhos egocêntricos, sem qualquer noção de limites, totalmente despreparados para enfrentar os desafios e obstáculos inerentes à própria vida. Sem contar com o pior: filhos viciados em substâncias químicas ou em comportamentos que lhes garantam prazer imediato e inconsequente.

E ao analisar as novas necessidades e exigências que recaem sobre a escola nos tempos atuais, a autora assinala30:

Testemunhamos diariamente a multiplicação e o aumento da intensidade dos comportamentos agressivos e transgressores na população infanto-juvenil. As instituições educacionais se veem obrigadas a lidar com fenômenos como o bullying,

que, embora sempre tenha existido nas escolas de todo o mundo, hoje ganha dimensões muito mais graves. O fenômeno expõe não somente a intolerância às diferenças, como também dissemina os mais diversos preconceitos e a covardia nas relações interpessoais dentro e fora dos muros escolares.

Ou seja, na sociedade contemporânea novas necessidades recaem sobre pais e instituições de ensino, estejam estes preparados ou não para lidar estas demandas. Mas o despreparo, conforme temos observado, cobra um alto preço de ambos, e pode deixar sequelas por vezes irreversíveis aos cidadãos e à comunidade como um todo.

Sabemos também que quando a escola é tolerante ou omissa em relação ao bullying

ou suas intervenções para preveni-lo não se mostram efetivas, o ambiente escolar torna-se totalmente contaminado, aumentando a probabilidade de conflitos entre todos da comunidade e fazendo crescer a chance da ocorrência de atos graves de violência31.

Observamos, portanto, que há diversos tipos de atores envolvidos no bullying.

E todos eles podem ser responsabilizados. Os próprios agressores e seus pais são talvez as figuras mais óbvias. Escola e professores também estão nessa relação, como observamos nas notícias que relatam indenizações obtidas pelas vítimas, não só por parte dos agressores, mas, também, por parte da escola e dos pais. Adiante, detalharemos essas responsabilidades.

29 Ibid. p. 62-63. 30 Ibid. p. 64.

(26)

1.6 Consequências do bullying

De acordo com Ana Beatriz Barbosa Silva32, médica pós-graduada em psiquiatria, os problemas mais comuns que afetam a saúde das vítimas dos atos de bullying

são sintomas psicossomáticos (cefaleia, cansaço crônico, insônia, náuseas); transtorno do pânico (medo intenso e infundado, que parece surgir do nada, sem qualquer aviso); fobias escolar e social (transtorno de ansiedade social – TAS); transtorno de ansiedade generalizada (TAG); depressão; anorexia e bulimia; transtorno obsessivo-compulsivo (TOC); transtorno do estresse pós-traumático (TEPT) e, com menos frequência, a esquizofrenia, o suicídio e o homicídio.

1.7 Cyberbullying

Segundo um levantamento realizado pelo Ibope Media, no final de 2012, o Brasil ocupava a 5ª colocação entre os países mais conectados à internet; somávamos 94,2 milhões de brasileiros internautas – quase metade da população total.

Esse relatório considerou pessoas maiores de 16 anos com acesso em qualquer ambiente, como casa, trabalho, escola, lan house (85,3 milhões) e também crianças e

adolescentes entre 2 e 15 anos com acesso em casa (8,9 milhões). Foi a primeira vez que essa faixa etária esteve incluída nesse tipo de relatório33.

Em quatro anos, entre 2007 e 2011, o percentual aumentou de 27% para 48%. O ritmo de crescimento da internet no Brasil é intenso. Esse aumento de conectividade do brasileiro está diretamente ligado a questões econômicas, como a melhora do poder aquisitivo, o crescimento do emprego formal e o acesso a créditos. Somamos a isso o surgimento de tecnologias que diminuíram o custo dos equipamentos eletrônicos e permitiram novos meios de acesso, como os smartphones, tablets, netbooks, e maior área de cobertura 3G e das bandas largas34.

32 SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Bullying: mentes perigosas nas escolas. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010, p. 25-32. 33 Disponível em: http://www.ibope.com.br. Acesso em 10 jun.2013.

(27)

1.7.1 Breve história da internet no Brasil

A história da internet no Brasil é recente, tem pouco mais de 20 anos. Ao final dos anos 80 surgiram os primeiros sinais de rede cujo uso era restrito às universidades e instituições de pesquisa. Somente em 1995 teve início sua exploração comercial pela Embratel.

De lá pra cá os brasileiros aderiram completamente às novas tecnologias e se entregaram aos fascínios dos mensageiros eletrônicos e das redes sociais.

Um dos campeões de acesso durante muitos anos foi o Orkut, uma rede social criada em 2004 pelo Google, que tinha por objetivo ser uma ferramenta de aproximação e relacionamento entre seus usuários. A ferramenta recebeu este nome em homenagem ao projetista chefe, Orkut Büyükkokten, engenheiro do Google.

O sucesso da rede foi tanto que em 2009, dos 100 milhões de inscritos em todo o mundo na rede social, mais de 50% eram brasileiros.

O Orkut foi, por alguns anos, palco de muitos reencontros familiares, redescoberta de amantes, vizinhos, amigos e desafetos. Muitas amizades e relacionamentos amorosos tiveram início nas páginas pessoais e de comunidades, outros souberam aproveitar boas oportunidades profissionais e compartilhar informações técnicas.

Em contrapartida, muitos casamentos foram desfeitos e informações pessoais foram vasculhadas; houve intimidade revirada e inúmeros atos criminosos foram praticados.

Acessos Diários

38%

4 a 6 vezes por semana

10% 2 a 3 vezes

por semana 21%

1 vez por semana

18% Acessos Irregulares

13%

(28)

A quantidade de desaforos, xingamentos, palavrões e agressões de toda ordem redigidas nos scraps e divulgadas pelas comunidades foi imensa, assim como várias pessoas, por ingenuidade ou desconhecimento sobre a amplitude da internet, acabaram se expondo como também a familiares e amigos de forma exagerada.

A possibilidade de criar perfis falsos e postagens anônimas desencadeou ataques contra pessoas, grupos, empresas e organizações. Centenas de comunidades foram criadas apenas para ofender ou ridicularizar algo ou alguém, usuário ou não da rede social.

Diante disso, vimos o Orkut como palco de casos de pedofilia e de divulgação de conteúdo impróprio ou indevido, como por exemplo, as páginas de apologia ao racismo ou violência.

Nesse terreno fértil, o cyberbullying alastrou-se de forma epidêmica deixando

um rastro de intolerância, crueldade e covardia – humilhações reais e doloridas infligidas num mundo virtual.

Não é diferente o que ocorre em outras redes sociais, como o Facebook, MySpace e Twitter, e os canais de compartilhamento de imagens ou vídeos, como o YouTube. Blogs pessoais e Fóruns também são usados para práticas ilegais.

Cyberspace = Cybernetic (cibernético) + Space (espaço)

Cyberbullying = Cyberspace + Bullying

O cyberbullying envolve o uso de informações e de tecnologia da

comunicação, como o email, celular, SMS, ferramentas de mensagens instantâneas, sites pessoais (blog/vlog), além de páginas de enquete criadas para difamar e incentivar o comportamento deliberado, repetido e hostil por parte de um indivíduo ou grupo, que tem intenção de prejudicar outrem, segundo a definição de Shaheen Shariff35, especialista internacional em cyberbullying e professora da Universidade McGill em Montreal, Quebec,

Canadá.

As consequências da intimidação virtual são as mesmas do bullying

‘tradicional’, mas acrescidas de um número muito maior de espectadores. As vítimas tendem a se isolar, faltar às aulas, mudar de escola ou até de endereço como uma forma de se

(29)

protegerem. A saúde também é afetada, com manifestações de ansiedade, estresse, síndrome do pânico, depressão e outras patologias que podem persistir ao longo da vida da vítima, o que recomenda o tratamento com especialistas para superar os traumas sofridos.

Todos os sites de relacionamento social têm regras e formas para denunciar abusos e bloquear agressores.

O problema é o tempo de resposta no caso de denúncias. A disseminação das mensagens escritas ou vídeos difamatórios é muita rápida e de difícil controle. Depois da publicação, o monitoramento da visualização é dificultado pela instantaneidade da propagação e pela infinidade de pessoas que poderão acessar o conteúdo.

Se o serviço oferecido pelas empresas como Google e Facebook é gratuito, eles podem ser enquadrados no Código de Defesa do Consumidor?

Código de Defesa do Consumidor Capítulo I

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. (Grifo Nosso)

...

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (Grifo Nosso)

Segundo alguns autores, por remuneração entende-se qualquer tipo de ganho direto ou indireto pelo fornecedor.

(30)

2 O TRATAMENTO HISTÓRICO DO BULLYING

Por se tratar de um fenômeno complexo, que envolve aspectos emocionais, psíquicos, de convivência, entre muitos outros, entendemos que o bullying é,

fundamentalmente, um problema contemporâneo que precisa ser analisado à luz de diversas disciplinas, entre elas o Direito. O Brasil tem contribuído substancialmente para os estudos sobre o fenômeno, com pesquisadores reconhecidos e uma literatura sobre o tema que se amplia diariamente.

Não faltam críticos à atenção que tem sido dedicada ao bullying em âmbito

global. Segundo alguns deles, coloca-se a conjuntura como um alarde desnecessário, argumentando que se trata de uma fase da vida pela qual todos passamos ou passaremos; além disso, é possível identificar até mesmo nos animais um comportamento por vezes agressivo, territorial.

No entanto, apesar de admitirmos que tal comportamento guarda semelhança com o dos animais, não nos parece correto, por esse motivo, minimizar o que tem acontecido nessas últimas décadas.

O Brasil entra para um desastroso circuito de países os quais, assim como ocorre nos Estados Unidos, apesar de haver iniciativas incontáveis em prol da erradicação ou controle do problema, não tem havido qualquer diminuição. Ao contrário, continuamente tem aumentado, e de forma espantosa, impulsionado por novas tecnologias, atraindo cada vez mais a atenção da mídia e da sociedade.

Há um paradoxo ao nos propormos a um estudo sistemático do tema. Os especialistas mais conceituados no assunto consideram que desde o surgimento da escola existe bullying. Mas todos elegem a década de 1970 como marco no tratamento do problema,

devido aos casos e pesquisas citados a seguir, as quais delinearam de forma mais segura, embasada, os contornos desse tipo de violência, suas características, atores diversos e os possíveis encaminhamentos.

Ou seja, o bullying é tipicamente novo e antigo, milenar e contemporâneo.

Sempre existiu, mas agravou-se de forma chocante em nossa era, praticamente obrigando a um esclarecimento mais contundente.

(31)

bullying como motivo comprovado em casos de violência escolar com desdobramentos,

muitas vezes, trágicos. Mas, também, mostraremos algumas tendências sociais equivocadas quanto ao assunto, que se colocam na contramão dos estudos científicos, como a de se tratar o fenômeno como caso de polícia (embora, até possa assim se tornar).

2.1 Primeiros estudos científicos sobre bullying

Cleo Fante36 procura estabelecer um marco temporal no tratamento do tema:

O bullying é um fenômeno mundial tão antigo quanto a própria escola. Apesar de os

educadores terem consciência da problemática existente entre agressor e vítima, poucos esforços foram despendidos para o seu estudo sistemático até princípios da década de 1970. Foi nessa época que surgiu, primeiramente na Suécia, um grande interesse de toda a sociedade pelos problemas desencadeados entre agressor e vítima, figurantes desse fenômeno, que logo se estendeu por todos os outros países escandinavos.

Ana Beatriz Barbosa Silva37, que também coloca a década de 1970 como divisor de águas científico no tratamento do problema, explica o contexto:

Tudo começou na Suécia, onde grande parte da sociedade demonstrou preocupação com a violência entre estudantes e suas consequências no âmbito escolar. Em pouco tempo, a mesma onda de interesse contagiou todos os demais países escandinavos.

Cleo Fante38 analisa que, além da Suécia, a Noruega também demonstrou

“durante muitos anos” considerar o bullying como “motivo de preocupação nos meios de

comunicação e entre professores e pais, porém sem que as autoridades educacionais se comprometessem de forma oficial”.

Porém, “no final de 1982”, a nação norueguesa ficaria consternada diante do

suicídio de três crianças, entre 10 e 14 anos de idade, que “com toda a probabilidade, foi motivado principalmente pela situação de maus-tratos a que eram submetidas pelos seus companheiros de escola”.

36 FANTE, C. Fenômeno bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. 6. ed. Campinas: Verus, 2011,

p. 44.

37 SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Bullying: mentes perigosas nas escolas. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010, p. 111.

38 FANTE, C. Fenômeno bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. 6. ed. Campinas: Verus, 2011,

(32)

Diante da repercussão profunda que esse acontecimento adquiriu no país, o Ministério da Educação da Noruega iniciaria, no ano seguinte, “uma campanha em escala nacional contra os problemas entre agressores e vítimas”.

Ainda de acordo com Cleo Fante39, o pioneirismo na elaboração de critérios específicos para o problema do bullying deve ser atribuído ao pesquisador Dan Olweus, da

Universidade de Bergen, na Noruega. Com isso, tornou-se possível distinguir o fenômeno “de outras possíveis interpretações, como incidentes e gozações ou relações de brincadeiras entre iguais, próprias do processo de amadurecimento do indivíduo”.

Dan Olweus é professor e pesquisador na área de psicologia, associado ao

Research Center for Health Promotion (tradução livre: Centro de Pesquisas para a Promoção

da Saúde), da Universidade de Bergen e, há quatro décadas, vem realizando trabalhos relacionados ao bullying.

Seu estudo mais antigo sobre o assunto foi publicado na Escandinávia, em 1973 – posteriormente lançado também nos Estados Unidos, no ano de 1978, sob o título Aggression in the Schools: Bullies and Whipping Boys (tradução livre: Agressão nas Escolas: Valentões e Garotos Chorões).

Em entrevista recente40, Dan Olweus aborda as principais características e descobertas científicas sobre bullying, além de falar também sobre prevenção:

Acho importante nos darmos conta de que o bullying não é um conflito, é uma forma

de abuso entre pares. É basicamente um direito fundamental humano para um estudante se sentir seguro na escola e ser poupado desse tipo de humilhação repetida que está implícita no bullying

39 FANTE, C. Fenômeno bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. 6. ed. Campinas: Verus, 2011,

p. 45.

40 Disponível no site Violence Prevention Works – Safer Schools, Safer Communities (tradução livre, Prevenção da Violência Funciona – Escolas Mais Seguras, Comunidades Mais Seguras), www.violencepreventionworks.org

Original em ingles: I think it’s important to realize that bullying is not a conflict, it’s a form of peer abuse. It’s basically a

fundamental human right for a student to feel safe at school and be spared from this kind of repeated humiliation that is implied in bullying. Bullying is definitely a serious problem in today schools. We have a lot of large scales surveys showing that something between 15% and 30% of the students are involved with regularity in these problems, as students who are bullying other students or being bullied by others, and those who are both bullied and bully. And it has a lot of negative consequences this behavior.

What are the consequences of bullying?

(33)

Olweus defende que o bullying é um problema sério nas escolas, dado

comprovado em pesquisas de grande escala, que apontam uma incidência de 15% a 30% dos estudantes envolvidos regularmente nesse tipo de situação. Esse dado inclui três grupos distintos de alunos: aqueles que praticam o bullying contra seus pares, aqueles que sofrem bullying dos pares, e, ainda, aqueles que são vítimas e autores de bullying ao mesmo tempo.

Não há dúvidas de que o bullyingé algo doloroso para as vítimas, “que podem

ter consequências a longo prazo horríveis para elas”. Ansiedade, depressão, baixa autoestima, colocar a culpa em si mesmo, sintomas somáticos ou psicossomáticos como dores de cabeça e de estômago são alguns dos sintomas relacionados a esses efeitos de longo prazo que podem ser desenvolvidos pelas vítimas. Olweus afirma ainda:

E elas (as vítimas) podem se sair mal academicamente e essa rejeição pelo grupo de seus pares é muito difícil para eles lidarem, e eles se envolvem mais em idealização suicida e frequentemente sua avaliação negativa de si mesmos se torna tão pesada que eles veem suicídio como um desdobramento natural.

As pesquisas também delinearam um perfil psicológico e social dos agressores, conforme o trecho a seguir:

Tradução livre: Estudantes que praticam o bullying são tipicamente agressivos. Isso

está subentendido na definição, é claro, mas eles geralmente são também mais agressivos em relação a adultos, professores e pais. Eles têm uma atitude positiva quanto à violência e meios violentos como forma de resolver problemas. Eles são impulsivos, eles têm pouca empatia com as vítimas, frequentemente eles veem o

bullying como algo engraçado, e, se eles forem garotos, são frequentemente mais

fortes fisicamente do que os garotos em geral.

Original: Students who bully are typically aggressive. That’s implied in the definition, of course, but they are also more generally aggressive towards adults, teachers and parents. They have a positive attitude to violence and violent means as a way of solving problems. They are impulsive, they have little empathy with the victims, often they see the bullying as something fun, and if they are boys they are

often physically stronger than boys in general.

Mas esses mesmos estudos também demonstraram ser necessário adotar atitudes concretas contra o bullying não só em nome das vítimas, mas também em nome dos

agressores, conforme reproduzimos no trecho a seguir, em que Dan Olweus continua a ponderar sobre as consequências desse tipo de agressão:

Tradução livre: Mas alunos que praticam bullying são propensos a infringir regras

(34)

eles são propensos a continuar em um caminho antissocial, envolvendo criminalidade, abuso de drogas, relacionamentos pessoais destrutivos e assim por diante. E, portanto, é extremamente importante fazer algo a respeito desses problemas. Não apenas pelas vítimas, que são a maior causa motivacional, mas também pelos valentões.

Original: But students who bully are likely to break rules in various ways and therefore they often engage in other antisocial activities besides bullying. So if this

behavior does not stop they are likely to continue on an antisocial path, involving criminality, drug abuse, destructive personal relationships and so on. And therefore it’s extremely important to do something about these problems. Not only for the sake of the victims, who are the major motivational cause, but also for the sake of bullies.

Ficou demonstrado que o problema também se alastra para além destes dois

atores, o “valentão” – o agressor – e aquele que sofre bullying, a vítima. Na verdade, existem

níveis de bullying em um determinado ambiente que podem afetar toda a atmosfera do local:

Tradução livre: O bullying está afetando, certamente, não somente aqueles que

estão diretamente envolvidos, aqueles que praticam o bullying e aqueles que são

expostos ao bullying. Também tem efeitos sobre outros alunos em uma sala de aula,

eles são geralmente chamados de espectadores. E se você tiver muito bullying em

uma sala de aula ou em outro grupo, isso afetará toda a atmosfera, e criará um ambiente na escola ou na sala de aula de medo e apreensão.

Original: Bullying is certainly not only affecting those who are directly involved,

those who bully others and those who are exposed to the bullying. It has also effects

on other students in the classroom, they are usually called bystanders. And if you have much bullying in a classroom or other group, this will affect the whole

atmosphere, and create a school climate or classroom climate of fear and apprehension.

Olweus reitera na entrevista41 que esses conhecimentos foram apreendidos por meio de pesquisas extensivas por mais de 30 anos. E que essas mesmas pesquisas demonstraram inequivocamente ser o bullying “um problema prevalente na maioria das

escolas, que deve ser abordado de uma maneira sistemática”. Desta conclusão decorreu o

desenvolvimento do Olweus Bullying Prevention Program (OBPP, da sigla em inglês, cuja

tradução livre é Programa Olweus de Prevenção ao Bullying).

É fundamental nos determos por um instante no OBPP. É evidente que ao longo desses 30 anos de pesquisa sistemática envolvendo a comunidade internacional, incontáveis iniciativas, oficiais ou não, afloraram ao redor do mundo, e algumas delas serão mencionadas em nosso estudo. Porém, é inegável que a iniciativa de Olweus é a mais famosa

41 Original em inglês: Much of this knowledge has been derived on the basis of extensive research over more than 30 years

actually. And we have clearly shown that this is a prevalent problem in most schools, which must be addressed in a

(35)

e reconhecida de todas, exatamente pelo caráter científico com que é conduzida. Por isso, além de suas pesquisas pioneiras, esse autor é citado em praticamente toda obra que trata de

bullying.

Uma das características do programa é sua inserção em esferas diversas da instituição de ensino42. “O Programa Olweus de Prevenção ao Bullying é um programa

abrangente em toda a escola para prevenir e reduzir o comportamento do bullying escolar”.

Abarca quatro níveis distintos: o da escola, o da sala de aula, o individual e o da comunidade. Foi desenvolvido após o suicídio de três crianças na Noruega, citado anteriormente, tendo como causa mais provável “severa vitimização por parte dos pares”. Uma campanha nacional com apoio do Ministério da Educação daquele país custeou o OBPP em 42 escolas na cidade de Bergen.

E os resultados foram bastante positivos. Temos hoje seis avaliações em larga escala do programa, envolvendo mais de 40 mil alunos ao longo dos últimos 20 anos, aproximadamente.” As taxas de redução do bullying atingidas foram de 30% a 50%,

“então isso significa que o programa tornará a vida melhor para muitos, muitos estudantes”.

Também foram descobertos por meio dessas pesquisas contínuas que o programa não reduz apenas os problemas de bullying.

Outros tipos de comportamentos antissociais também apresentaram queda percentual, como o vandalismo, índice de faltas, abuso de substâncias ilícitas e “problemas similares”. Finalmente, foi constatado ainda que houve melhora no “clima da sala de aula”, no “clima da escola”, na “atitude em relação à escola” e outros indicadores.

Por meio da exposição dos principais acontecimentos mundiais em âmbito científico relacionados ao aumento de conhecimento público sobre o bullying, podemos

chegar a algumas conclusões. Uma delas é que o histórico foi se estabelecendo na medida em que o próprio conceito do problema foi sendo delineado, pois os especialistas concordam ser

42 Original em inglês: The Olweus Bullying Prevention Program is a comprehensive schoolwide program to prevent and

reduce bullying behavioring in school. It works at four different levels: the school level, the classroom level, the individual level, and also the community level. The program was first developed in the context of a nationwide campaign against bullying in Norway, which was initiated by the fact that three boys, young boys, had committed suicide, most likely as a consequence of severe victimization by peers. And in that context, the Ministry of Education gave us funding to implement

and evaluate the program in 42 schools in Bergen […]. And the results were quite positive. We have now six large scale

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