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Alfabetização de jovens e adultos: representações sociais de professores da EJA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – PPGED

JÉSSICA LIRA DA SILVA

ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORES DA EJA

NATAL/RN 2020

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ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORES DA EJA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, do Centro de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para obtenção do título de Mestre em Educação.

Orientadora: Profª. Drª. Erika dos Reis Gusmão Andrade

NATAL/RN 2020

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Moacyr de Góes - CE Silva, Jessica Lira da.

Alfabetização de jovens e adultos: representações sociais de professores da EJA / Jessica Lira da Silva. - Natal, 2020. 128 f.: il.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Educação, Programa de pós-graduação em Educação. Orientadora: Profª. Drª. Erika dos Reis Gusmão Andrade.

1. Alfabetização - Dissertação. 2. Educação de jovens e adultos - Dissertação. 3. Representações sociais - Dissertação. I.

Andrade, Erika dos Reis Gusmão. II. Título.

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ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PROFESSORES DA EJA

Dissertação examinada e aprovada pelo Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Educação, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para a obtenção do título de Mestre em Educação.

Aprovada em 20 de fevereiro de 2020.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________________ Profa. Drª. Erika dos Reis Gusmão Andrade

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN (Orientadora)

___________________________________________________________ Profª. Drª. Rosa Aparecida Pinheiro

Universidade Federal de São Carlos – UFSCar (Examinadora Externa)

___________________________________________________________ Prof. Dr. Alessandro Augusto de Azevedo

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN (Examinador Interno)

___________________________________________________________ Prof. Dr. André Augusto Diniz Lira

Universidade Federal de Campina Grande – UFCG (Suplente Externo)

___________________________________________________________ Profª. Drª. Denise Maria de Carvalho Lopes

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN (Suplente Interna)

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À Cristo, por sua capacidade de enxergar na fragilidade humana o terreno fértil do potencial ainda desconhecido por nós. Por sua conduta inspiradora de trazer profundidade nas coisas simples, e, principalmente por ter sido exemplo de luta contra a condição de oprimidos de homens e mulheres.

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À Deus pela companhia diária; pelo amor incondicional; pela força dada a mim. Gratidão, Deus!

À minha orientadora, Erika Andrade, pela parceria, compreensão e exemplo de docente comprometida com a militância política e pedagógica.

Aos meus colegas pela parceria, apoio, risadas e choros conjuntos nos descabelamentos diários da rotina de ser pós-graduandos. Gratidão, queridos!

À minha vó, Francisca Silva, por todos os cuidados comigo, por ter me ensinado desde cedo a resiliência. Gratidão, vozinha!

Aos meus pais, Jean Mary e Gracilda Lira, pelo apoio, mesmo sem entenderem essa vida de pós-graduação, estão sempre no primeiro lugar da torcida por meu sucesso.

Ao meu esposo, Daniel Gurgel, pelo carinho, compreensão e apoio durante toda a minha trajetória de mestranda. Gratidão, meu amor!

À minha querida amiga, Monalysa Themistocles. Iniciamos juntas desde a graduação, construímos laços fortes de amizade e seu apoio foi fundamental na minha trajetória. Gratidão, amiga!

Gratidão a todas as participantes do estudo, sem as quais essa pesquisa não seria possível.

A todos que direta ou indiretamente atravessaram meu caminho contribuindo de alguma maneira, ainda que somente com um sorriso nos momentos de angustias. Gratidão!

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“É algo importante perceber que a realidade social é transformável; que feita pelos homens, pelos homens pode ser mudada”.

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A presente pesquisa teve como objetivo investigar as representações sociais sobre alfabetização de professores da Educação de Jovens e Adultos (EJA) e suas repercussões nas práticas de alfabetizar. Foi realizada com docentes que atuam no 1º segmento da Educação de Jovens e Adultos, em duas instituições de ensino do município de Natal/RN. As bases teóricas utilizadas fixam-se nos estudos sobre a alfabetização e letramento; Educação de Jovens e Adultos e a Teoria das Representações Sociais (MOSCOVICI, 1961). O percurso teórico-metodológico do estudo está pautado na Teoria das Representações Sociais por presta-se a compreender os processos de elaboração das representações sobre alfabetização de adultos e o reverberar dessas representações nas condutas pedagógicas. Portanto, a pesquisa é caracterizada como um estudo exploratório de caráter qualitativo. A construção dos dados deu-se através da aplicação dos instrumentos de pesquisa: as entrevistas semiestruturadas; observações do tipo não participativa e questionário aplicado às docentes. As análises e a discussão dos dados estão baseadas na abordagem teórica assumida, pautada nos pressupostos da análise de conteúdo de Bardin (2011) e no eixo interpretativo de Arruda (2005). Os resultados, frutos da análise da triangulação dos dados, emitidos pelas participantes mostram que não há uma representação social comum partilhada. Há variações e contrastes entre os grupos e dentro deles. No primeiro grupo há maior familiarização com o objeto da representação e maior aproximação com as práticas de alfabetizar jovens e adultos. No segundo grupo há uma representação hibrida, fundamentada tanto nos aspectos do universo reificado quanto do senso comum e consequentemente maior distanciamento das práticas de alfabetização de adultos. As representações apreendidas apresentam-se ancoradas em elementos diversos, sendo o principal deles a formação inicial e o tempo de atuação na Educação de Jovens e Adultos. A objetivação também se traduz de maneiras distintas nos comportamentos de cada participante do estudo. A pertinência desta pesquisa centra-se na relevância social do tema, uma vez que trará contribuições para as instituições formadoras repensar seus currículos no que diz respeito a formação dos docentes que atuarão na EJA, haja vista que a pesquisa apontou como principal elemento constituinte da representação social sobre alfabetização a formação inicial nos cursos de graduação.

Palavras-chave: Alfabetização. Educação de Jovens e Adultos. Representações Sociais.

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This research aims to investigate the social representations about literacy of YAE (Youth and Adult Education) teachers and their repercussions on literacy practices. It was carried out with teachers who work with the first segment of Youth and Adult Education, in two educational institutions in the city of Natal / RN. The theoretical bases used are centered on studies on literacy; Youth and Adult Education and Theory of Social Representations (Moscovici, 1961). The theoretical-methodological path of the study is based on the Theory of Social Representations because it offers understanding of the processes of elaborating representations about adult literacy and the reverberation of these representations in pedagogical behaviors. Therefore, the research is characterized as a qualitative exploratory study. The construction of the data took place through the application of the research instruments: semi-structured interviews; non-participatory observations and a questionnaire applied to teachers. The analysis and discussion of the data are based on the assumed theoretical approach, based on the assumptions of the content analysis of Bardin (2011) and on the interpretive axis of Arruda (2005). The results, outcomes of the analysis of the triangulation of the data, issued by the participants show that there is no shared common social representation. There are variations and contrasts between and within groups. In the first group, there is greater familiarity with the object of representation and a greater approximation with the practices of literacy for young people and adults. In the second group there is a hybrid representation, based both on aspects of the reified universe and common sense and, consequently, greater distance from adult literacy practices. The representations apprehended are anchored in different elements, the main one being the initial training and the length of experience in Youth and Adult Education. Objectification also translates in different ways in the behavior of each study participant. The relevance of this research is centered on the social relevance of the topic, since it will bring contributions to the training institutions to rethink their curricula with regard to the training of teachers who will work with YAE, given that the research pointed out as the main constituent element of representation literacy training initial training in undergraduate courses.

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Quadro 1 – Universos das Representações Sociais... 39

Quadro 2 – Categorias de trabalhos apresentados na ANPEd no campo da EJA... 50

Quadro 3 – ANAIS dos trabalhos apresentados na JIRS 2017... 51

Quadro 4 – Levantamento dos estudos realizados na EJA no repositório da UFRN... 52

Quadro 5 – Levantamento dos estudos realizados na EJA no banco de teses e dissertações da CAPES... 56

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Tabela 1 – Descrição das observações realizadas na turma de nível I da EJA (docente Esperança)... 98 Tabela 2 – Descrição das observações realizadas na turma de nível II da EJA

(docente Transformação)... 99 Tabela 3 – Descrição das observações realizadas na turma de nível II da EJA

(docente Libertação)... 101 Tabela 4 – Descrição das observações realizadas na turma de nível I da EJA (docente

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ANPEd – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CEB – Câmara de Educação Básica

CEFAMs – Centros Específicos de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério CF – Constituição Federal

CNE – Conselho Nacional de Educação CONAE – Conferência Nacional de Educação

CONFITEA – Conferências Internacionais de Educação de Adultos EJA – Educação de Jovens e Adultos

ENADE – Exame Nacional de Desempenho de Estudantes ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio

JIRS – Jornada Internacional de Representações Sociais LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização ONU – Organização das Nações Unidas

PIBID – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência PNE – Plano Nacional de Educação

RN – Rio Grande do Norte

SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica SEA – Sistema de Escrita Alfabética

TCC – Trabalho de Conclusão de Curso TRS – Teoria das Representações Sociais

UERN – Universidade Estadual do Rio Grande do Norte UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte UNP – Universidade Potiguar

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1 INTRODUÇÃO ... 12

2 EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS ... 15

2.1 Implicações históricas e representações partilhadas ... 15

2.2 O (não) lugar do docente da EJA ... 20

2.3 Desafios na formação docente em EJA: a busca por uma identidade ... 23

2.4 EJA: uma modalidade singular ... 29

2.5 Alfabetização, letramento e especificidades da alfabetização de jovens e adultos 30 3 A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS: O PERCURSO ...CONSTITUTIVO DA PESQUISA ... 35

3.1 A epistemologia das Representações Sociais ... 35

3.2 Conceito, processos de elaboração das Representações Sociais e suas funções ... 39

3.3 O delineamento da pesquisa ... 46

3.3.1 Sujeitos e lócus da pesquisa... 59

3.3.2 Os instrumentos de acesso ao objeto da representação ... 62

3.3.3 O percurso interpretativo da representação social ... 65

4 ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: REPRESENTAÇÕES ...SOCIAIS DOCENTE ... 67

4.1 O desvelamento do universo simbólico das representações sociais de ...alfabetização: primeira categoria... 67

4.1.1 Alfabetização na Educação de Jovens e Adultos: Segunda categoria ... 82

4.2 Educação de Jovens e Adultos: terceira categoria ... 93

4.3 A face figurativa da representação social sobre alfabetização ... 96

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 111

REFERÊNCIAS ... 115

APÊNDICES ... 119

Apêndice A – Questões Norteadoras da Entrevista com as Docentes ... 120

Apêndice B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ... 121

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1 INTRODUÇÃO

O sonho é que leva a gente para a frente. Se a gente for seguir a razão, fica aquietado, acomodado. (SUASSUNA, 1950, p. 56[?], grifo nosso).1

Sem dúvidas, as inquietações que surgiram durante a trajetória acadêmica, no curso de Pedagogia, foram responsáveis por impulsionar a busca pelo aprofundamento do estudo em tela. As vivências da graduação despertaram um olhar sensível para a modalidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA) que começaram por meio das experiências vivenciadas no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID).

Com ingresso em 2011.1 – ainda no início da graduação – experienciávamos, por meio do PIBID, práticas pedagógicas de alfabetização para jovens e adultos, nos contextos escolares. Tais práticas evidenciavam uma descaracterização da modalidade EJA, pois não levavam em consideração as suas especificidades e de seus sujeitos; constatávamos uma não valorização dos saberes dos educandos que se reverberava na imposição de atividades desvinculadas do que os estudantes traziam como necessidade de aprendizagem. Necessidade essa ligada a utilização dos conhecimentos da linguagem escrita frente às demandas de uso social dessa aprendizagem, como por exemplo, elaborar uma lista de supermercado, ler um rótulo, escrever um bilhete, enviar uma mensagem escrita pelas redes sociais e aplicativos de mensagens, dentre outras.

Constatávamos ainda a reprodução de outros currículos na modalidade, currículos esses infantilizados e desprovidos de sentido para os jovens e adultos, uma vez que seus anseios escolares estavam muito mais ligados a demandas de uso real da língua do que a memorização mecânica de letras e sílabas, esvaziadas de sentido. Também a desvinculação da alfabetização com as práticas de uso real da língua, tornava-se impeditivo aos jovens e adultos de exercerem, com autonomia, o uso das habilidades de leitura e escrita, já que as atividades desenvolvidas não os levavam a reflexão da língua, nem tampouco a utilização dela nas demandas sociais. A partir disso, realizamos como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), uma investigação das concepções sobre alfabetização de professores da EJA. Evidenciou-se nas análises que os professores não apresentavam conhecimentos específicos para alfabetizar na EJA, embora houvesse uma vaga preocupação em articular a alfabetização com as práticas de letramento, (SILVA, 2014).

Trilhando uma trajetória na alfabetização de adultos, nutrimos uma paixão que se estendeu à pós-graduação e nos levou a novas inquietações. Partindo da seguinte problemática:

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as práticas desenvolvidas pelos professores não apresentam um conhecimento específico para alfabetizar na EJA. Essas práticas desconsideram o diálogo, os usos e reflexões sobre a língua e sobretudo minam a inserção mais autônoma dos sujeitos nas práticas sociais que envolvem os conhecimentos da leitura e da escrita.

Nossa questão de partida é: Quais as representações de alfabetização têm norteado as práticas de alfabetizar dos professores da EJA? Como pressuposto, inferimos que: as representações que os professores possuem a respeito da alfabetização repercutem positiva ou negativamente nas práticas que desenvolvem; implicam diretamente em sua conduta e orientam o seu fazer pedagógico. No entanto, não se baseiam em conhecimentos sistematizados sobre o ensino para o adulto.

Assim, delineamos o nosso objeto de estudo: As representações sociais de professores da EJA sobre alfabetização. Temos por objetivo: Investigar as representações sociais sobre alfabetização de professores da EJA e suas repercussões nas práticas de alfabetizar. Embora a observação das práticas de alfabetizar requeiram maior tempo e aprofundamento nas análises, nosso intuito é trazê-las como potencializadoras das nossas análises, somadas às entrevistas e questionários.

O estudo que propomos se desenvolveu através da Teoria das Representações Sociais (TRS), visto que essa teoria nos fornece elementos teóricos-metodológicos suficientes para abordar a temática em questão. A TRS engloba tanto o fenômeno de representação quanto o conceito e a teoria construída para explica-lo, (SÁ, 1993). Ela nos permite compreender como os sujeitos constroem as representações que guiam suas ações no cotidiano comum. Como disse Moscovici (2015), em sua obra “Representações sociais: investigações em psicologia social”: a representação é essencialmente um sistema que nos permite classificar e dar sentido às coisas. Por isso, a nossa investigação está fundada na necessidade de conhecer como os docentes dessa pesquisa constroem sentidos para a alfabetização, em quais aspectos estão ancoradas suas representações e como tais representações repercutem em seus fazeres pedagógicos.

A pesquisa caracteriza-se como estudo exploratório, de caráter qualitativo. Os sujeitos participantes dessa pesquisa são docentes da rede básica de ensino da cidade de Natal/RN. Participaram do estudo quatro (04) docentes as quais lecionavam em turmas de alfabetização de jovens e adultos, na modalidade EJA, 1º segmento. As quatro docentes são de duas escolas da rede municipal de ensino. A primeira instituição da pesquisa se situa na zona norte de Natal e a segunda instituição, na zona sul dessa cidade.

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O presente estudo encontra-se estruturado em 5 seções, a saber: a Introdução que traz uma exposição geral do trabalho, destacando o delineamento do estudo realizado no que tange a problemática, questão de partida, pressuposto, objeto e objetivo do estudo, bem como o tipo de estudo e de pesquisa, além da caracterização dos participantes.

No primeiro capítulo, “Educação de Jovens e Adultos”, abordamos as implicações históricas que originaram a representação acerca dos sujeitos não alfabetizados no curso da educação no Brasil, bem como os desdobramentos para a formação docente no contexto da Educação de Jovens e adultos. Trazemos também o referencial teórico a partir do qual compreendemos e discutimos a modalidade EJA, a alfabetização, o letramento e as especificidades da alfabetização na EJA.

No segundo capítulo, intitulado “A Teoria das Representações Sociais: o percurso constitutivo da pesquisa”, apresentamos a TRS em seus aspectos epistemológicos, bem como os seus aspectos fundantes. Trazemos a abordagem metodológica da pesquisa, a caracterização do campo e das participantes desse estudo, além de um levantamento bibliográfico acerca dos estudos empreendidos na área da alfabetização na Educação de Jovens e Adultos.

No terceiro capítulo “Alfabetização de Jovens e Adultos: representações sociais docente” trazemos as falas das docentes acerca do objeto de estudo, bem como as observações realizadas em suas salas de aula. As análises empreendidas desse objeto da representação social: a Alfabetização que se conduzirá através da explanação das três Categorias Temáticas emergidas das entrevistas com as docentes, a saber: a Categoria da Alfabetização cujas dimensões incluem os conceitos de: Alfabetização, Letramento e articulação entre ambos. Na segunda Categoria: Alfabetização na EJA, as dimensões são: competências/conhecimentos para alfabetizar na EJA; Dificuldades para alfabetizar na EJA. E a terceira Categoria: Educação de Jovens e Adultos, da qual decorre a dimensão do conceito da EJA. Na descrição das análises, promovemos um diálogo entre os achados da pesquisa e os estudos que tratam dessa temática.

Por fim, apresentamos algumas conclusões acerca do trabalho, denominada Considerações finais, em que retomamos toda a discussão empreendida durante o trabalho, tecendo reflexões sobre as análises e apontando possíveis contribuições desse estudo para a área da educação, mas especificamente para os cursos de formação de professores os quais irão atuar na modalidade da Educação de Jovens e Adultos.

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2 EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Ninguém é analfabeto por eleição, mas como consequência das condições objetivas em que se encontra. (FREIRE, 2015, p. 25, grifo nosso).2

Abordaremos nesse primeiro capítulo as implicações históricas que originaram a representação acerca dos sujeitos analfabetos no curso da educação no Brasil, bem como os desdobramentos para a formação docente no contexto da Educação de Jovens e adultos. Trazemos também o referencial teórico a partir do qual compreendemos e discutimos a modalidade EJA, a alfabetização, o letramento e as especificidades da alfabetização na EJA.

2.1 Implicações históricas e representações partilhadas

Começaremos a nossa discussão em torno da representação social construída e partilhada ao longo da história no Brasil acerca dos sujeitos analfabetos3, bem como os desdobramentos para a formação docente.

Debruçamo-nos na obra “Preconceito contra o analfabeto” de Ana Maria de Oliveira Galvão e Maria Clara Di Pierro (2012), a fim de analisarmos a construção histórica do preconceito contra os sujeitos que não sabem ler e escrever, bem como as implicações dessa visão no cenário educacional brasileiro.

Todo preconceito é gerado e situado historicamente. Assim, a representação que se tem do indivíduo não alfabetizado foi gestada e difundida socialmente no Brasil em contextos históricos específicos. Conforme as autoras, ser alfabetizado nem sempre foi prioridade no nosso país e o estigma contra o analfabeto foi sendo constituído em tempos determinados. “O preconceito não é, portanto, nem natural nem universal.” (GALVÃO; DI PIERRO, 2012, p. 31).

Ambas as autoras trazem uma síntese dos períodos em que se pode notar os primeiros indícios do estigma contra o analfabeto. Começam por situar algumas ocasiões nas quais ter os conhecimentos da leitura e da escrita não era relevante ou foi negado aos adultos o direito dessa aprendizagem. Galvão e Di Pierro (2012) situam a partir do século XVII, período da ocupação holandesa em parte do Brasil. Eles se preocuparam em transmitir os ensinamentos religiosos às crianças, já que consideravam os adultos “estúpidos” e “desinteressados”.

2 Autoria do educador e filósofo Paulo Freire (1921-1997).

3 O termo analfabeto utilizado neste trabalho retrata a construção da visão preconceituosa construída acerca dos indivíduos que não sabem ler e escrever no Brasil. Não sendo, portanto, a visão que compartilhamos sobre os sujeitos não alfabetizados.

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Na primeira metade do século XIX o que prevalecia eram as condições econômicas. Dessa forma, até mesmo os fazendeiros analfabetos, porém donos de grandes propriedades, exerciam grande influência nas regiões em que tinham bens materiais. “O analfabetismo, assim, estava presente, embora de maneira diferente, em todas as camadas e grupos sociais: entre homens e mulheres brancos, proprietários de terras, homens e mulheres escravos e libertos.” (GALVÃO; DI PIERO, 2012, p.34).

Na segunda metade do século XIX, os alunos maiores de 15 anos passaram a ter instrução para aprender a ler e escrever. Eram ensinados por professores que não recebiam nada pelos serviços prestados e a Constituição do Império e o Código Criminal eram as bases para o ensino da leitura e da escrita, (GALVÃO; DI PIERO, 2012). Ainda nesse século, foi instituída a Lei Saraiva que retirou do analfabeto o poder do voto.

Já no século XX, observando que o analfabetismo era percebido como vergonha nacional, os intelectuais brasileiros discutiam em várias instâncias as possibilidades de resolução da questão.

Diante desse quadro, as primeiras décadas do século XX foram marcadas por intensas mobilizações, em diversas esferas da sociedade, em torno da alfabetização de adultos. Foram muitas as campanhas pela alfabetização no período. Ao lado de associações que congregavam intelectuais, vários estados, muitos dos quais administrados na área educacional pelos intelectuais vinculados ao movimento da Escola Nova, tomaram iniciativas diversas em relação à questão. (GALVÃO; DI PIERRO, 2012, p. 40).

Assim, dentro do movimento da Escola Nova havia interesses vários e distintos. A maioria dos intelectuais acreditavam que as “elites esclarecidas” deveriam desempenhar o papel de regeneração da nação, por meio da educação.

Contrário a esse pensamento de que a educação seria uma doação, uma forma de “regenerar” uma nação não escolarizada, Paulo Freire defendia uma cultura popular, na qual os sujeitos fossem vistos como seres potenciais, dotados de conhecimentos. Dessa forma, pautados nos pressupostos Freireanos, diversas campanhas foram realizadas, principalmente no Nordeste, com o intuito de alfabetizar jovens e adultos. Os ideais da educação popular propunham um ensino baseado nos próprios contextos de vida dos sujeitos, o que teria como eixo o diálogo como balizador da construção de pessoas conscientes de suas realidades e capazes de transformá-las.

Todavia, com o Golpe do Regime Civil Militar, os movimentos de educação popular foram reprimidos, seus líderes perseguidos e seus ideais censurados (HADDAD; PIERRO, 2000). Houve ainda uma tentativa do Estado de minimizar os “danos” causados, fundando o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), em 1967 – que tentava, conforme as suas

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propostas, conciliar os interesses educativos de uma grande massa de adultos com os interesses hegemônicos do modelo socioeconômico implementado pelo regime militar.

Embora o MOBRAL tentasse reproduzir o modelo da educação popular, assemelhava-se somente quanto ao método e material didático, entretanto, diferia quanto aos ideais e intenções pedagógicas, já que as premissas da educação popular era promover a consciência crítica, tendo por base a valorização dos sujeitos e de seus saberes. Já o MOBRAL pretendia manter a ordem e promover o desenvolvimento econômico do país, levando os sujeitos ao entendimento de que o esforço individual os levaria ao progresso. (GALVÃO; DI PIERRO, 2012).

Entende-se que só após a Constituição Federal (CF) de 1988 é que os jovens e adultos passam a ser respaldados em seus direitos, efetivamente, garantidos pela responsabilização do Estado na oferta do ensino básico, seguindo os artigos 6º e 205 da CF (BRASIL, 1988). Um período de redemocratização que traz marcas do passado no que diz respeito a representação social do analfabeto.

Assim, compreendemos que

Quando a cultura escrita não ocupava o lugar de cultura legítima e central na sociedade brasileira, não se podia falar da existência de um preconceito contra o analfabeto. [...] o estigma contra o analfabeto não é universal, mas relativo ao poder da cultura escrita em tempos, grupos sociais e sociedades historicamente determinadas. (GALVÃO, DI PIERRO, 2012, p. 53).

Conforme a cultura escrita ganhou centralidade nos meios de comunicação social, bem como foi sendo associada às classes econômicas mais favorecidas, originou-se uma representação de “pobres”, “marginalizados”, “sem cultura” sobre todos àqueles sujeitos que não eram alfabetizados. Essa representação repercutiu tão fortemente que até mesmo os analfabetos incorporavam e legitimavam o preconceito contra si mesmos, acreditando que suas condições eram frutos de suas realidades vivenciais.

Em contrapartida, há também os sujeitos analfabetos que não se sentem inferiorizados por não saberem ler e escrever, pois desenvolveram habilidades outras para atuarem em meio a uma sociedade marcada tão fortemente pela presença da escrita. É admirável como os sujeitos produzem táticas para participar da vida social, sem ter os conhecimentos exigidos pela sociedade contemporânea, dominam estratégias exitosas de sobrevivência em meio a uma sociedade de práticas letradas, desenvolvem capacidades relacionadas ao cálculo mental, a observação, a oralidade, a memorização de escritos, dentre tantas outras.

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Contudo, as representações partilhadas ao longo da história tendem a legitimar o preconceito contra o analfabeto, gerando uma visão equivocada desses sujeitos, como se não possuíssem nenhum conhecimento, como se fossem desvalidos e incapacitados de participar da vida social. Essa representação não foi construída no vazio, possui suas origens no seio de uma sociedade injusta e desigual. Sociedade esta que trata o que hoje se constitui em direito, como se fosse uma doação, um benefício ofertado àqueles que não estudaram na idade mais apropriada.

É imprescindível que a compreensão acerca das necessidades educacionais dos jovens e adultos vá além da dimensão da alfabetização, pois as premissas da modalidade EJA estão pautadas no entendimento de uma educação ao longo da vida. No entanto, ressaltamos a importância da alfabetização, haja vista a necessidade prática desse conhecimento em nossa sociedade. Como vimos, a importância da leitura e da escrita é relativa aos contextos históricos e sociais. Todavia, em nossa sociedade, ter os conhecimentos da leitura e da escrita ampliam as possibilidades de participação na vida nacional; oportunizam que os sujeitos conheçam e defendam mais fortemente os seus direitos. Assim, minimiza as consequências históricas do analfabetismo no Brasil.

Neste sentido, os direcionamentos que hoje se fazem em torno da alfabetização, estão ligados a democratização da cultura, na qual os sujeitos possam experienciar o mundo por meio das diversas possibilidades que são oferecidas por uma autêntica e transformadora alfabetização, em especial no seio da Educação de Jovens e Adultos.

Ainda que sem um aparato consolidado no que diz respeito às práticas pedagógicas que se destinam ao público da Educação de Jovens e Adultos, o esforço empreendido é na direção de superar a condição marginalizada ocupada por este segmento da educação. Não só em relação a alfabetização, mas no avanço do entendimento da educação ao longo da vida, como postulado na V Conferência Internacional sobre Educação de Adultos (V CONFINTEA), em julho de 1997, em Hamburgo, Alemanha:

[...] a educação de adultos, dentro desse contexto, torna-se mais que um direito: é a chave para o século XXI; é tanto consequência do exercício da cidadania como condição para uma plena participação na sociedade. Além do mais, é um poderoso argumento em favor do desenvolvimento ecológico sustentável, da democracia, da justiça da igualdade entre os sexos, do desenvolvimento socioeconômico e científico, além de ser um requisito fundamental para a construção de um mundo onde a violência cede lugar ao diálogo e à cultura de paz baseada na justiça. A educação de adultos pode modelar a identidade do cidadão e dar um significado à sua vida. A educação ao longo da vida implica repensar o conteúdo que reflita certos fatores, como idade, igualdade entre os sexos, necessidades especiais, idioma, cultura e disparidades econômicas. (UNESCO, 1999 apud EVANGELISTA; SEKI, 2017, p. 174).

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É notório que a EJA começa a se delinear por outro ângulo de compreensão que não aquele do senso comum – o da naturalização da omissão do direito ou até mesmo do conformismo com a condição de não saber. Esse documento, assim como outros (Constituição Federal e a Lei Diretrizes e Bases da Educação) asseguram a inclusão da Educação de Jovens e Adultos no plano político, ou seja, essa modalidade tem prerrogativa legal, está prevista dentro do sistema de ensino nacional e deve ser tratada com atenção.

É numa conjuntura atravessada pelas mudanças políticas, sociais e econômicas que se desenham as modificações no tratamento da educação de jovens e adultos. Mudanças estas que incluem um novo plano político, no qual a responsabilidade da educação é do Estado e essa torna-se direito de todos os cidadãos a partir da Constituição Federal de 1988. Também o entendimento econômico do país, de que quanto menos acesso ao conhecimento, menos desenvolvimento na economia, pois as novas exigências trazidas pela industrialização requeriam pessoas mais “qualificadas” para atuarem na produção de bens e serviços, fez com que as políticas de acesso à educação se ampliassem. Além das demandas sociais que se tornavam cada vez mais complexas, uma vez que se diversificavam através dos usos da linguagem escrita, da sofisticação dos meios de comunicação, entre outros fatores.

Todos esses aspectos engendraram no país uma rachadura na representação generalizada de que a escola não é espaço para pessoas adultas. De que não existe cultura de saber entre as pessoas não escolarizadas, ou ainda que são incapazes de aprender por não terem tido acesso à educação na idade mais apropriada.

As gradativas mudanças do contexto nacional reabrem espaço para se discutir a questão da educação de pessoas jovens e adultas, mesmo num espaço de tensões políticas e econômicas, no qual vivenciamos constantes embates na efetivação do direito a educação para todos, podemos perceber algumas aberturas na maneira de conceber o sujeito jovem e adulto, as quais foram ocasionadas por elementos que se constituíram ao longo da história da educação no Brasil.

No entanto, as lentas aberturas na história da educação de jovens e adultos não significa já a mudança radical na compreensão e na prática pedagógica para com esse público. As “rachaduras” deram espaço para um repensar deste segmento, mas muito ainda precisa ser feito para se consolidar o direito a educação de jovens, adultos e idosos. Superamos um período nebuloso em que as pessoas adultas não alfabetizadas ou que não puderam continuar os estudos eram invisibilizadas e excluídas das políticas de acesso à educação. Entretanto, as formas de

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promover a educação dessas pessoas é que precisam ser discutidas e incorporadas a uma prática que possibilite a libertação histórica da negação, da exclusão do direito educacional.

Veremos no próximo item as implicações para a formação de educadores no campo da EJA, dada a complexidade histórica de constituição dessa modalidade e os desafios ainda emergentes.

2.2 O (não) lugar do docente da EJA

Atualmente vive-se um paradoxo no campo educacional, se, por um lado tem-se maior acesso ao conhecimento, diversos avanços científicos e tecnológicos, reconhecidamente maior papel social e político atrelado à função da escola e da educação, por outro lado, acumulam-se problemas relacionados à identidade docente em diferentes níveis e modalidades de ensino, ações pedagógicas que frequentemente estão dissociadas dos problemas do cotidiano escolar e do contexto do educando, assim como propostas no campo político que ensejam verdadeiros retrocessos nessa área.

Desse modo, discutir sobre educação não é uma tarefa fácil. E refletir sobre formação e trabalho docente segue o mesmo viés, principalmente, porque para compreender as implicações do contexto atual vivenciado no país para o trabalho e a formação docente se faz necessário entender à conjuntura dessa profissão no país, seus meandros, avanços e desafios historicamente constituídos.

O trabalho docente não se esgota no horário escolar, exige compromisso contínuo, é intensificado em sua jornada e frequentemente acarreta adoecimentos, portanto, como ressalta Novoa (1992), a profissão docente não pode ser pensada sem articulação das dimensões: pessoal (que envolve história de vida e trajetórias individuais dos professores), profissional (por favorecer o acolhimento da docência como profissão) e organizacional (uma vez que a escola precisa ser pensada como organização global do trabalho pedagógico). Desse modo, a caracterização do trabalho docente “como um trabalho diferenciado de outros na medida em que envolve alto grau de subjetividade e, em relação a ele, não se tem uma medida absoluta daquilo em que se resulta” defendida por Ferreira e Hypólito (2010) se faz pertinente e essencial para a discussão a que se propõe.

O trabalho docente exerce um papel fundamental na economia, política e cultura de um país, sendo sua identidade profissional um processo evolutivo de interpretação e reinterpretação de experiência. No que tange à escolarização no Brasil, ela não só nasceu, como permaneceu por muito tempo atrelada à elite, contudo, à busca por uma política educacional inclusiva da

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população que resultasse na superação dos problemas comumente conhecidos pela sociedade, como oferta reduzida e sucateamento de escolas públicas, elevados índices de analfabetismo/semianalfabetismo e analfabetismo funcional, baixa representatividade dos estudantes no ensino médio e superior, reduzida participação efetiva na vida cidadã e no mundo do trabalho. Estas características refletem o quanto o Brasil, não só chegou tarde ao mundo da educação, como conjunturalmente organizou-se nessa área de forma excludente e precarizada no tocante a todos os sujeitos do processo ensino-aprendizagem.

No tocante aos marcos legais dos cursos de formação docente no Brasil, a formação de professores em cursos específicos ocorreu de forma escassa no final do séc. XIX, com as Escolas Normais; o início do séc. XX foi marcado por preocupações com a formação de professores para o secundário, em cursos regulares e específicos, onde de um lado tínhamos o trabalho sendo exercido por profissionais liberais e autodidatas e de outro a criação das universidades, seguido por um processo constante de industrialização do país, o que demandou progressivamente mais escolarização (GATTI; SÁ, 2009).

Refletir sobre formação e trabalho docente no Brasil envolve compreender as estruturas formativas de professores antes e depois da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Educação Brasileira (Lei nº 9.394/96). A estrutura curricular dos cursos de formação de professores no país antes da LDB, foi regida pelas Leis n° 4.024/61; 5.540/68; 5.692/71; 7.044/82 e normatizações federais e estaduais, nas quais se observou a consolidação da formação de professores para o primário e secundário desde as primeiras décadas do séc. XX. (BRASIL, 1996).

As discussões em torno do currículo disperso, da reforma da educação básica no país, da extinção das escolas normais, criação do magistério4, e sua posterior descaracterização, perda de algumas especificidades na formação, instauração de cursos de licenciatura curta em nível superior, introdução de opções formativas para docentes dos anos iniciais e finais do Ensino Fundamental e formação de professores com integração de áreas. Além disso, como aponta Silva et al (1991, p.135), “a formação de professores no período de 1950 a 1986 foi caracterizada por imprecisão quanto ao perfil docente; currículos enciclopédicos, elitistas e idealistas; reformas dos currículos só diluíam a formação geral e tornavam a específica superficial.”

De acordo com Gatti e Sá (2009), esse contexto é caracterizado por uma formação estanque e identidade problemática do licenciando, pelo novo conceito de profissionalização dos

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professores baseado na proposta de continuum de formação, diversas necessidades formativas, inclusive no que tange à problemática de articular e relacionar a formação em disciplina específica, a formação educacional geral e a formação didática específica. Ao considerar os níveis de ensino, foi criada a Lei 9.394/96, através da qual foram preconizadas iniciativas diferenciadas voltadas para a formação e a titulação de professores, entendidas enquanto demanda de órgãos públicos responsáveis pela gestão de sistemas educacionais, com o intuito de graduar seus docentes; realizar alterações nas instituições formadoras e nos cursos de formação de professores; apresentar novas perspectivas para a formação docente do ponto de vista estrutural e de articulação formativa dos currículos. Estes pressupostos foram pautados na preocupação com a qualificação dos formadores, apesar da persistente desagregação entre a formação docente e a fragmentação curricular. (BRASIL, 1996).

A Lei 9.394/96 regulamenta a valorização dos profissionais da educação pelos sistemas de ensino assegurando-lhes em seu Art. 67, ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos; aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento periódico remunerado para esse fim; piso salarial profissional; progressão funcional baseada na titulação ou habilitação, como também na avaliação do desempenho; período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho; condições adequadas de trabalho, o que infelizmente em diversas regiões do país e contextos educacionais ainda enfrenta entraves para propiciar uma prática em sala de aula e na gestão da escola saudável para os profissionais da educação. (BRASIL, 1996).

É possível perceber que tanto a função social da escola, como a formação e trabalho docentes sofrem interferências das políticas de currículo e do progressivo modelo gerencialista na educação do país, no qual se acentuam as preocupações com eficiência e eficácia das escolas no manejo das políticas de currículo e com o rendimento dos alunos nos estabelecimentos de ensino, refletidas não só através das ações do Ministério da Educação e nas redes estadual e municipal, como da introdução das avaliações de sistema (como Saeb, ENEM e ENADE) e do processo contínuo de centralização das políticas de currículo.

A educação, portanto, enquanto direito humano e direito às diferenças com qualidade social, é um desafio não só no chão de sala de aula, mas, nas políticas locais e globais que nela interferem. No contexto em que a escola em que está inserida e no perfil do educando e do educador. As políticas e regulamentações da formação docente no país estão imbrincadas com a precarização desse trabalho que envolve dupla jornada, contradições entre o tecnicismo e os aspectos didático, pedagógicos e humanos da formação, a carência de condições físicas,

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psicológicas, humanas, financeiras, estruturais e conjunturais para o exercício digno da profissão, sem falar nas dificuldades de reconhecimento e valorização sociais.

Nesse víeis, se agravam os tensionamentos quando colocados frente às demandas de formação dos docentes em EJA, uma vez que há uma tendência a uma formação generalista, contrapondo-se então a necessidade do olhar singular para as especificidades da formação de educadores da EJA.

2.3 Desafios na formação docente em EJA: a busca por uma identidade

Se nos chamados níveis regulares de ensino, a constituição de uma identidade (ou identidades docentes) é um desafio, na Educação de Jovens e Adultos o sentimento de pertença e a definição de uma identidade característica de quem atua nessa modalidade de ensino é ainda mais desafiadora.

O esforço que se faz pela definição de uma identidade própria no campo da educação de jovens e adultos é historicamente marcado por fragilidades e potencialidades e tem sido realizado por instituições e agentes diversos.

As fragilidades na busca pela identidade docente em EJA estão relacionadas as condições pelas quais os professores chegam nessa modalidade. Geralmente as razões pessoais levam os docentes a atuarem na Educação de Jovens e Adultos; conveniência de horário, proximidade do local de residência, entre outros fatores. Como consequência da não formação específica para EJA, os professores tendem a reproduzir os modelos dos quais estão acostumados a lidar, do ensino regular que em nada se assemelha com a EJA (VARGAS; FANTINATO, 2011).

Deparando-se com a realidade da Educação de Jovens e Adultos, percebem que muitas são as especificidades, a começar pelo próprio público que é o primeiro diferencial nessa modalidade. Público este permeado por condições de intermitências, recomeço, começo e finalizações; gerações distintas em busca de interesses comuns se cruzam nos espaços escolares, gerando grandes desafios aos docentes.

As potencialidades na busca pela identidade em EJA também se valem das fragilidades: ao mesmo tempo em que as especificidades dessa modalidade desafiam o fazer docente, podem tornar-se também a fonte de elaboração de um currículo específico para este público, considerando o contexto social e as demandas de aprendizagem que os sujeitos jovens e adultos apontam como necessários.

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Nos contextos de educação de adultos, os docentes defrontam-se com diversas histórias de vida que interromperam, negaram e fizeram voltar à escola os sujeitos jovens e adultos. As condições de vida dos educandos, suas necessidades de trabalho, sobrevivência e realização pessoal são o pontapé para a reflexão docente no sentido de repensar o seu papel que, fundamentalmente consiste em reverter processos severos de exclusão e marginalização dos sujeitos que tiveram processos de aprendizagens descontínuos, ou até mesmo o direito a educação negado, bem como são marcados pelo “carma” do fracasso escolar, reforçado pelos sistemas de reprovações e marginalização dos seus saberes.

Esse processo de tornar-se docente da Educação de Jovens e Adultos, requer primordialmente uma aproximação e identificação com a modalidade. Essa aproximação é motivada, dentre outros fatores, pela proximidade de faixa etária, o que permite aos docentes abordar assuntos cujas matrizes estão diretamente ligadas a vida social, com os aspectos do trabalho, da cultura, da política, da economia, os quais perpassam e interferem a vida dos educandos.

Outro fator que gera proximidade é a origem social destes docentes e dos educandos. Comumente os docentes são oriundos das camadas populares, assim como tradicionalmente a EJA é caracterizada pela presença das classes populares. As histórias de vida se entrecruzam, aquelas ligadas às dificuldades de inserção na educação, a não escolarização dos pais e os esforços empreendidos na luta pelo acesso aos conhecimentos socialmente privilegiados, marcam as trajetórias de um número significativo de docentes, não só na EJA, pois na constituição da formação docente no Brasil, a docência foi sendo historicamente ocupada por pessoas advindas de classes sociais menos abastardas, o que reforça os estereótipos da profissão, como o baixo prestígio social, escassas remunerações e baixos investimentos no campo da educação, embora muitos docentes não se reconheçam nessa categoria. Mas, se não se reconhecem enquanto tal, haverá um preconceito dos docentes em torno da própria modalidade a qual lecionam? esses estereótipos reforçam a visão negativa acerca dos sujeitos da EJA? São questionamentos que nos levam a refletir os perfis dos docentes da EJA e, talvez, os preconceitos envoltos da modalidade que se originou historicamente e ainda traz marcas ao presente.

Essas trajetórias ligadas as subjetividades dos sujeitos envolvidos nos espaços de aprendizagem, fazem com que os docentes enxerguem nisso as possibilidades de efetivação de direitos, essencialmente à educação que tem desdobramentos na vida como um todo.

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No entanto, a falta de uma formação especifica também se torna um agravante nessa constituição de identidade. Nos cursos de licenciaturas nada ou pouco se fala em Educação de Jovens e Adultos. A ausência de reflexões nas licenciaturas sobre as características de uma educação que privilegie a diversidade, a autonomia e o diálogo geram entraves para a adoção de uma postura que leve em conta os saberes e processos de construção de conhecimentos dos sujeitos jovens e adultos.

Essas premissas de consideração da diversidade, exercício da autonomia e diálogo são imprescindíveis na modalidade EJA, quando não realizadas dificultam o trabalho pedagógico com o seu público, gerando desmotivações e desistências, pois quando não reconhecidos no seu processo de aprendizagem o indivíduo se vê desmobilizado na vontade de prosseguir os estudos. Além de constituir-se em entrave na construção da identidade do professor, uma vez que não sabendo administrar os princípios basilares de seu trabalho, os docentes se veem não pertencentes a essa modalidade, e, consequentemente, reproduzem o que sua zona de conforto lhes permitem (os métodos e concepções do ensino regular). Ao fazer isso recebem a devolutiva negativa dos educandos – ainda que num ato não consciente – pois esses sujeitos são fortemente marcados pelas necessidades emergentes de suas trajetórias de vida, que só uma prática dialógica permite conhecer e utilizar como fonte de sistematização de aprendizagens.

Os desafios concernentes à Educação são diversos. Desde antes da garantia jurídica do direito a educação para todos, até sua efetivação, por meio da Constituição Federal de 1988, não tivemos ainda um histórico de consolidação desse direito, principalmente nas modalidades de menor prestigio como a Educação de Jovens e Adultos.

Se no ensino regular, no qual temos um leque de documentos que regem e orientam esse sistema (Diretrizes Curriculares Nacionais, Parâmetros Curriculares Nacionais, Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil, Referenciais Curriculares Nacionais para Educação Infantil, etc) ainda assim a busca pela identidade docente nesses níveis de ensino é uma constante. Na Educação de Jovens e Adultos não é diferente e os desafios são ainda maiores.

Apesar de haver Diretrizes específicas para a Educação de Jovens e Adultos (Resolução CNE/CEB, nº 1, de 5 de julho de 2000), os docentes consideram inconsistentes para orientar o trabalho com jovens e adultos, conforme relatam informalmente em diálogos nos espaços escolares. Talvez essa compreensão esteja pautada na visão “amadorista” do trabalho com adultos, uma vez que, culturalmente não se tem efetivamente políticas de formação para educadores da EJA.

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Pela conjuntura histórica que se delineou no país, temos pelo menos dois grupos de estudantes da modalidade EJA: os que não tiveram acesso à escola e os deixaram a escola por diversas razões.

Em uma perspectiva atual, temos um outro grupo de educandos da EJA, que são aqueles que tiveram uma trajetória escolar de fracassos (marcados pelas reprovações, não identificação com o espaço escolar e suas práticas, dentre outros motivos). Esses alunos são levados à modalidade sem que saibam onde estão “pisando”, pois estão em um momento de transição de um grupo para outro, caracterizando assim, a juvenilização da modalidade, fenômeno recorrente devido aos diversos desdobramentos do ensino regular que não tem assegurado, eficazmente, o ensino para os adolescentes.

Essa heterogeneidade dos grupos que compõem a modalidade EJA se constitui como um enorme desafio aos docentes, uma vez que eles lidam com gerações distintas, trajetórias de vida diversas e interesses de aprendizagem que ora se cruzam, ora se distanciam.

Se cruzam quando os adultos advindos, muitas das vezes, de experiências anteriores com o ensino escolar, reconhecem na escola a possibilidade de “melhorar” sua condição de ser e estar no mundo.

Se distanciam quando uma geração juvenil adentra os espaços escolares de EJA forçados pelo sistema que, sob o rótulo de fracasso, são levados a estarem nessa modalidade sem que se identifiquem com as propostas de ensino, que muitas vezes não condiz com seus interesses e necessidades de aprendizagem.

Essa diversidade que é característica da EJA torna-se desafiadora aos docentes, pois pensar numa educação que leve em consideração as diferentes faixas etárias, interesses de aprendizagens e trajetos de vida não se constitui tarefa simples.

Não se constitui tarefa simples, pois pensar numa educação para esse público implica romper com os paradigmas do ensino tradicional reforçados pelos conteúdos das disciplinas consagradas no âmbito educacional como sendo as únicas relevantes para formação dos sujeitos. Pensar numa cultura específica para o ensino de jovens e adultos é pensar num currículo apropriado à essa modalidade que, primeiramente reconheça que o principal diferencial dessa modalidade é seu público e que o cerne da educação não está no conteúdo a ser ministrado, mas na compreensão dos aspectos das realidades dos sujeitos (culturais, sociais, relacionais) que poderá ser operacionalizado nas práticas pedagógicas, servindo de referentes para as práticas de escrita e leitura nas quais os educandos sejam de fato agentes.

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E que aspectos são esses? As vivências, o trabalho, as histórias, as estruturas familiares, as heranças culturais, seus anseios e perspectivas dentro dos espaços escolares. Todos esses aspectos compõem o que denominamos de currículo específico da EJA. Investigar e sistematizar tais conhecimentos é papel do docente e de todos os segmentos participantes da EJA que, ao trabalhar com esses indivíduos terão de ampliar seus conhecimentos estabelecendo intima relação entre os saberes científicos e os saberes comuns aos educandos da EJA.

Nesse sentido, do ponto de vista pedagógico, temos os desafios referentes a construção de um currículo específico para EJA, pois embora haja alguns parâmetros oficiais para o ensino de jovens e adultos que podem ser utilizados pelos docentes, ainda há grandes entraves quanto a efetivação dessa proposta, pois múltiplas são as realidades da educação de adultos no Brasil, o que gera encaminhamentos diversos e até mesmo a dispersão de práticas que poderiam ser sistematizas e adaptadas para cada contexto vivencial nos quais há jovens e adultos compondo os sistemas escolares.

Para esta tarefa, o docente é a pessoa mais indicada para elaborar, junto aos sujeitos da EJA, um currículo que atenda às necessidades de aprendizagens desse público, pois são estes os protagonistas desse processo, os quais trazem em seus trajetos de vida os elementos que poderão compor os seus processos formativos.

É necessário que se leve em consideração a elaboração de um currículo que se baseie não apenas nos conteúdos escolares, referentes as disciplinas consagradas como as mais relevantes, mas que se estabeleça uma relação de aproximação entre aquilo que os educandos trazem como conhecimentos consolidados ao longo de suas experiências e os conteúdos sistematizados no âmbito escolar.

Os princípios que regem essa elaboração de um currículo específico para Educação de Jovens e Adultos trazem como eixo basilar o diálogo, bem como uma postura crítica e comprometida dos docentes. Somente por meio das bases do diálogo com os jovens e adultos é que se pode pensar na sua formação, pois é justamente essa condição que levará os docentes a descobrirem nas profundezas das trajetórias interrompidas, não alcançadas ou “fracassadas” as portas de acesso para os novos conhecimentos.

Por outro lado, os desafios da formação do docente em EJA estão ligados aos aspectos mais amplos das políticas voltadas a esta modalidade. Ainda há grande escassez nos cursos de licenciaturas de formação específica para se atuar nesse segmento. E o caso é ainda mais grave nas licenciaturas de disciplinas específicas. A pouca ou não formação referente ao ensino de jovens e adultos, contribui significativamente para a reprodução de modelos de ensino que não

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são próprios da modalidade, o que consequentemente também contribui para não definição de uma identidade docente no segmento da EJA.

Conforme aponta Soares (2011, p.285):

Segundo dados do INEP, em 2003, dos 1.306 cursos de pedagogia existentes no País, apenas 16 ofereciam habilitação em educação de jovens e adultos. Nove destes cursos eram mantidos por instituições privadas de ensino superior, e sete, por universidades públicas – duas federais e cinco estaduais. Dessa forma, uma questão recorrente diz respeito à necessidade de se ter uma formação específica para o educador de jovens e adultos.

Entre os vários desafios colocados para a EJA, certamente a formação docente para essa modalidade é crucial e está para além da formação de alfabetizadores. Precisa ser pensada de maneira mais ampla, a fim de desmistificar a noção de que para atuar nessa modalidade vale o amadorismo, ou nas palavras de Arroyo como se a EJA fosse um “terreno sem dono”, onde tudo é permissível e qualquer um põe a mão.

Assim, contribuiu para as visões discriminatórias e estigmatizadas referentes a essa modalidade de ensino, o tratamento político marginalizado oferecido a EJA nas políticas de educação. Di Pierro (2005) diz que a falta de formação específica dos professores que atuam na Educação de Jovens e Adultos, as limitações curriculares e as escassas políticas para esse campo corroboram a indefinição da identidade ou das identidades da EJA.

A pouca atenção na formação inicial e a escassa formação durante o exercício da profissão (falta de formação continuada para os docentes em EJA) acarreta em dificuldades no desenvolvimento do trabalho pedagógico com esse público estudantil, levando a uma conduta que descaracteriza os processos construídos socialmente pelos sujeitos da EJA, uma vez que não são considerados em seus processos formativos.

Pensamos ser essencial que se assegure a formação inicial e se promova a formação continuada dos docentes em EJA, na tentativa de reduzir o descompasso entre a formação inicial e a prática docente na modalidade, tendo em vista uma proposta curricular alternativa para esse campo da educação.

Proposta esta que pense em políticas plurais para EJA, no sentido de promover unidades de princípios dessa modalidade e não de propostas, haja vista as especificidades inerentes a cada realidade vivida pelos jovens e adultos nas diferentes regiões do país, pois a EJA tem como uma de suas características se apresentar como um espaço de aprendizagens diversas e em diferentes espaços, inclusive os espaços não formais.

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2.4 EJA: uma modalidade singular

É sabido que a Educação de Jovens e Adultos é uma modalidade singular, que tem especificidades próprias, nesse aspecto, conhecer a realidade de vida dos educandos e tomá-la como ponto de partida no âmbito das aprendizagens escolares, é fundamental.

Tamarozzi (2009) corrobora essa noção destacando algumas especificidades características da EJA: Os sujeitos da Educação de Jovens e Adultos têm desejo fervescente de aprender; aprendem somente aquilo que tem necessidade de aprender; aprendem melhor na prática; têm o aprendizado encentrado em situações reais; aprende melhor em diálogos informais, nos quais se sintam à vontade para mostrar suas ideias, vivências, duvidas e anseios; possuem experiências de vida que afetam o aprendizado; demonstram melhor aproveitamento quando utilizados vários métodos, recursos e procedimentos de ensino e, sobretudo, querem oportunidades para descobrir e construir conhecimentos com autonomia, principalmente quando se refere ao acesso aos bens culturais e à valorização social resultantes do domínio da leitura e da escrita.

Nesse aspecto, as salas de aula de EJA tornam-se espaços de múltiplas aprendizagens, onde professor e aluno se envolvem em situações para além dos “muros escolares”. O olhar sensível do professor para as experiências e vivências que os indivíduos trazem ao longo de seus trajetos de vida é o diferencial de ensino-aprendizagem nessa modalidade de ensino. Também a escuta sensível do professor faz com que o aluno se sinta envolvido afetivamente pela aprendizagem, tornando o ensino bem mais significativo para os sujeitos que por algum motivo não puderam seguir seus estudos ou tiveram negados os seus direitos à educação.

Segundo Arroyo (2011) uma característica marcante da EJA é a tentativa de configurá-la quanto à sua especificidade. Essa especificidade da modalidade está diretamente ligada aos seus sujeitos, às suas diversidades de tempos de ser jovem ou adulto. A compreensão desses tempos e o avanço no estudo deles fará com que se avance também na formulação das especificidades da EJA.

A Educação de Jovens e Adultos tem de partir, para sua configuração como um campo específico, da especificidade desses tempos da vida – juventude e vida adulta – e da especificidade dos sujeitos concretos históricos que vivenciam esses tempos. Tem de partir das formas concretas de viver seu direito à educação, ao conhecimento, à cultura, à memória, à identidade, à formação e ao desenvolvimento pleno (LDB, n. 9394/96, Art. 1º e 2º). (ARROYO, 2011, p. 22).

O ponto de partida é questionar-se: quem são esses sujeitos que hoje compõem a modalidade? Entendendo-os como sujeitos de direitos, com histórias de vidas marcadas pela

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exclusão, pelo preconceito que culminaram na visão da EJA como um remédio para “curar” as carências dos sujeitos, “seja de alfabetização, de escolarização, seja de fome e exclusão e agora da violência e deterioração moral.” (ARROYO, 2011, p. 26).

Para reconfigurar o direito à educação de jovens e adultos, e, especialmente configurar sua especificidade, o caminho é avançar na visão positiva dos jovens e adultos enquanto sujeitos potenciais, dotados de saberes; reconhecê-los como sujeitos de direitos e não olhá-los como coitadinhos, marginalizados, os quais o Estado presta um benefício ao dispor escolarização à eles.

Esse olhar em torno do sujeito portador de direitos, fará prosseguir também nas políticas de formação de educadores da educação de adultos, uma vez que é a partir do reconhecimento do direito particular e social do jovem e adulto que se conduzirá a um tratamento mais afinco das políticas de formação docente em EJA, levando em consideração a premissa de aprendizagem ao longo da vida, direito ainda em elaboração dos jovens e adultos.

2.5 Alfabetização, letramento e especificidades da alfabetização de jovens e adultos

O conceito de alfabetização está estritamente ligado ao conceito de linguagem. Por muito tempo a linguagem foi concebida como meio de comunicação e como expressão do pensamento. Ambas as abordagens concebiam a linguagem desvinculada de seus usos e de seus contextos de produção. Assim, a língua constituía-se em mero código de comunicação entre emissor e receptor, sendo a língua considerada inata ao homem. Nessa perspectiva, os estudos da alfabetização estavam fundamentados numa concepção mecanicista na qual a leitura e a escrita eram entendidas como o desenvolvimento de habilidades mecânicas de treino e decifração de códigos escritos.

Em contrapartida, surgem os estudos sociointeracionistas da linguagem que passam a considerá-la sob o fenômeno da interação social (VYGOTSKY, 1988). Vygotsky postula que a linguagem não é só meio de comunicação e de expressão de pensamento. Mais do que isso, a linguagem é o trabalho humano de constituição de sentidos nos contextos de interação em que ela se faz presente. A linguagem é ação efetiva subjacente aos fenômenos sociais e culturais. Portanto, não é inato ao indivíduo, mas construída na e para as interações sociais.

Nessa perspectiva, os estudos da alfabetização reconfiguram-se no cenário educacional brasileiro, mas especificamente com as contribuições de Ferreiro e Teberosky (1985) através dos estudos da Psicogênese da língua escrita que ocasionaram significativas mudanças no âmbito da alfabetização. Tais estudos apontam que o aprendizado do Sistema de

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Notação Alfabética não é mecânico, ou como disse Vygotsky (1988), “escrever não é apenas ato de mãos e dedos”. É uma atividade cognitiva que envolve a construção de conceitos, a saber: 1) o que é a escrita 2) o que a escrita representa/nota 3) como representa/nota. Estes estudos também redirecionam o olhar docente para a necessidade de se conceber o sujeito aprendiz como potencial construtor do conhecimento. Esse por sua vez, não apenas recebe influências da língua – como enfatizado na abordagem mecanicista da alfabetização – mas também a significa, construindo hipóteses e buscando regularidades no sistema de escrita. Dessa forma, os estudos de Ferreiro e Teberosky não consistem na apresentação de um novo método de alfabetização, mas sim na reconfiguração conceitual e prática do termo, uma vez que o foco passa do como ensinar a quem se ensina – o alfabetizando como sujeito ativo no processo de ensino-aprendizagem.

Nesse sentido, houve um redirecionamento da definição da alfabetização no Brasil. A alfabetização passa a ser entendida como o processo específico de apropriação do sistema de escrita que envolve duas dimensões indissociáveis: a apropriação do sistema de notação alfabética – a compreensão pelo aprendiz do funcionamento da língua. E o desenvolvimento de habilidades de produção de escrita e compreensão dos diversos gêneros discursivos (VIEIRA, 2010).

Concomitante às novas ideias de alfabetização, surgem os estudos sobre Letramento. O termo Letramento traduzido da palavra inglesa “literacy” que vem do latim “litera” (letra), aparece pela primeira vez no Brasil em 1987 na obra de Mary Kato (No mundo da escrita) e a partir da década de 1990 se vincula ao termo da alfabetização. O letramento designa a condição do sujeito que se apropria do sistema de escrita, isto é, o letramento torna-se imprescindível à alfabetização, uma vez que se refere aos usos da linguagem escrita em diferentes contextos sociais (SOARES, 2017).

O letramento é a inserção dos indivíduos nas práticas sociais de leitura e de escrita. Por se tratar de um elemento social, esse não pode ser estudado como universal. Conforme Vieira (2010):

O conceito de letramento não pode ser estudado como um fenômeno universal, indeterminado social e culturalmente, e sim, como um conjunto de práticas sociais de leitura e de escrita, em contextos específicos, para objetivos específicos. Desse modo, o letramento é um fenômeno social que é definido e reelaborado em cada cultura, em cada grupo e, por contraste e diferenciação, entre vários grupos (VIEIRA, 2010, p.115).

Sendo assim, o letramento deve ser compreendido dentro de um determinado contexto social, de uma determinada cultura produzida pelos seus sujeitos constituintes. Desse modo,

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