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O livro como instrumento civilizatório

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Academic year: 2021

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J o s e fa N a o c o U ra ts u k a , M a ria A n g é lic a R o d rig u es Q u em el, M a ria d o S o c o rro F o n te n elle M a rin a d os S a n to s A lm eid a , T h e re z a D ia co li Q u a d re li. L istag em d e P e rió d ic o s em ciên cias sociais e h u ­ m an as: u m a m e to d o lo g ia ...

S E S S Ã O D E E S T U D O S X :

P r e s id e n te : M a g a ly R e n a ta V a n D ijk V e rg o lin o S e c r e tá r io : O d ilo n P e re ira d a Silva

E te lv in a L im a . A b ib lio te c a n o e n sin o s u p e rio r --- 847 M a r ia L u iza M o n te iro d a C u n h a . C o n tro le b ib lio ­

g rá fic o u n iv ersal, no v o d e sa fio às b ib lio tec as u n i­ v e rsitá ria s ... ... 863 A n a M a ria A th a y d e P o lk e , E liz a b e th d e M e lo B o n ­

fim A ra ú jo , M a ria A u g u s ta d a N o b re g a C e sa rin o . A n á lise d o m e rc a d o de tra b a lh o d o b ib lio te c á ­ rio em B elo H o riz o n te ... 8 7 5 A n a L ad isla v a R e n d w a n sk i, M a ria B e n ed ita M en o n i,

U rs u la N ic k la s . In te g ra ç ã o d a b ib lio tec a c o m o la b o ra tó rio d e • e n sin o ... 911

S E SS Ã O D E E S T U D O S X I:

Presidente: N a n c y W es tp h a le n C o rrê a Secretária: Â n g e la M a c h a d o

H e lo ís a L ib e ralli B e llo tto . A s b ib lio tec as esp e ciali­ z ad a s em estu d o s b ra sile iro s n o e x te rio r: c a r a c te ­ rísticas e r e s p o n s a b ilid a d e ... 917 N a n c y B u e n o . A d isse m in a ç ã o d a in fo rm a ç ã o em

a rte s a n a to ... 977 B ib lio g rafia so b re A rte s a n a to B ra sile iro 1962-1972 . . 993

P ru d ê n c ia Y o lita A q u in o , M a ria C e c ilia de Q u e iro z E steves, E ld a A p a re c id a S a m p aio M u lh o lla n d , M a ria M a tild e C a ro n e d e A lm e id a C a rd o s o . O C e n tro de In fo rm a ç õ e s T éc n ic a s d a C o m p a n h ia V ale d o R io D o c e e s tr u tu r a e fu n ç õ e s ... 1015

L a ila G e b a ra . P ro p o s ta p a ra a c o m p o siç ão de um — ac e rv o em p esq u isa e d u c a c io n a l... 1037 S o fia M a resk i, V icen te S a ru b i. U n a e x p e rie n c ia p a ra -

g u a y a en la d isse m in a c ió n en la d ise m in a ció n en M a ria d o C a rm o A lm eid a , A d e laid e B a ra ta F a lk e iv )

“e n tre n a m ie n to en S erv icio ” ... /1 0 4 3 b a c h . E stu d o d o perfil d o u su á rio d a s e m p re sa s d e e n erg ia e lé tric a: C B E E , C E L F , E L E T R O - B R Á S , E L E T R O S U L , L I G H T ...1057 D E C L A R A Ç Ã O F I N A L D O 8 . ° C O N G R E S B R A S IL E IR O D E B IB L IO T E C O N O M IA E D O C U M E N T A Ç Ã O .

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O Livro com o Instrum ento Civilizatório

LAURO DE OLIVEIRA LIMA

A civilização se inicia com a d esco b erta d a escrita, d esco b erta irreversível e sem a qual v o ltaríam o s ao p ré -c iv iliza tó rio . A e scrita a serviço d a g rav ação dos m itos, lendas e h istó rias d a so cied ad e. As técnicas de sobrevivência co n tin u am a ser tra n s m iti­ d as p o r aprendizagem d ireta e assistem ática até o lim iar do m u n d o m o d ern o (co rp o raçõ es de ofício m edievais). G ra ç a s à escrita, ao livro, os c o n h e c i­ m en to s se to rn a ra m c u m u la tiv o s. A b iblioteca no re p o sitó rio das invenções hu m an as. A civilização d a im ag em . O cinem a, a fita m agnética, a televisão e tc .. m eios m o d ern o s de fix ar a cu ltu ra, co n stitu em a rca ís­ m os perigosos: desvalorizam o livro e fazem a civi­ lização v o lta r à o ra lid a d e . O ritm o de assim ilação e d a e la b o raç ã o m ental e a fu g acid ad e do processo o r a l. A le itu ra d in âm ica . A b ordagem “g estáltica" (estru tu ral) do texto. U m a rede c ap ilar de bibliotecas: c o n d iç ão indispensável ao processo civ ilizató rio . A c ria çã o do h á b ito de ler e de in te rp re ta r os textos • ■ em p ro fu n d id a d e .

1. AS SOCIEDADES PRÉ-HISTÓRICAS

Pode-se dividir a civilização em dois períodos, segundo os meios de com unicação de que se utiliza: a) as sociedades baseadas na comunicação oral e b) as sociedades baseadas n a comunicação escrita. A característica fundam ental das sociedades pré-históricas é a o ra lid a d e . A falta de escrita determ ina relações estritam ente instantâneas, hic et nunc (aqui e agora) e elim ina a possibilidade de relações à distância, tanto com relação ao espaço

(lugares diferentes), quando com relação ao tempo (épocas diferentes). Assim , nas sociedades agráficas, as relações entre os indivíduos são fugazes e perecíveis só podendo realizar-se face a face. Inicialm ente, a necessidade

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da escrita deve ter surgido das exigências de com unicação a distancia (espacial), em ocasiões com o quando o im perador desejava transm itir or­ dens a seus generais, na frente de b a ta lh a . H eródoto n a rra u m a pitoresca mensagem dos C itas a D ario: os Citas enviaram ao rei dos persas um

pássaro, um rato, um a e cinco flechas. D ario interpretou a mensagem com o sinal de rendição, quando, de fato, a mensagem equívoca dos Citas era um desafio, com o se soube depois: “se vós n ão vos converterdes em

pássaro e voardes p a ra o céu, ou em rato, p a ra vos esconderdes no seio da terra, ou em rã p a ra fugirdes pela á g u a . . . sereis m orto por estas fechas” (A . A . Llorach, em C om unication G rap h iq u e. Le L anguage. p g . 5 1 6 ). É evidente a precariedade desta com unicação “p o r meio de objetos” (tão em uso ainda hoje entre enam orados). Os objetos, portanto, nem sem pre fáceis de serem transportados, logo serão substituídos por sua representação

figurativa, iniciando-se, assim, outra função (tem poral) d a com unicação escrita. As pinturas rupestres, que ainda hoje são encontradas nas caver­ nas, o utrora habitadas pelos trogloditas, são o exem plo mais flagrante desta hipotética nova etapa do desenvolvim ento histórico da escrita. A religião utilizou, longam ente, a com unicação pictográfica p a ra levar ao povo rude dos “P A G U S” (PA G Ã O S), a m ensagem teológica. Os quadros d a Via-Sacra foram , talvez, a prim eira historieta em q u adrinhos. A historieta em q ua­ drinhos, portanto, tão aparentem ente “revolucionária”, segundo o ponto

de vista dos com unicólogos m odernos, não é senão extensão sofisticada da escrita pictográfica do hom em das cavernas, muito abaixo, em operaciona­ lidade codificadora, aos hieróglifos dos antigos sacerdotes egípcios, estes sim, já um a escrita propriam ente dita, por constituírem “um sistema de comunicação humana por ineio de signos visuais convencionais” (Gelb) de forma linear. D aí p a ra a representação silábica foi apenas um passo (que exigiu, contudo, milênios p a ra ser d ado). Segundo V oltaire, a “escrita é uma espécie de pintura da voz, e deve o mais possível, ser parecida com et-a” . E sta equivalência tem sido o objetivo perseguido pelos sistemas o rto ­ gráficos através do tem po.

2 . AS SOCIEDADES HISTÓRICAS

O aparecim ento da escrita (pictográfica e alfabética) m arca, p o r­ tanto, o início da história, na m edida em que perm ite relações perm anen­ tes e à distância, superando os limites do espaço e do tem po p ró x im o s. C om o sem pre ocorre com as funções, na m edida em que a escrita se dis­ tancia de sua fonte natural (que é oralidade), ganha autonom ia e conver­

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te-se em ESTRUTURA INDEPENDENTE, transform ando-se num objeto cultural, com suas próprias leis de funcionam ento, com o se fosse um novo

ente natural, mas um a presença tão envolvente que pode ser considerado nova ecologia do ser h u m a n o . U m a biblioteca — do ponto de vista da m anutenção do processo civilizatório — corresponde, por exem plo, à at­ m osfera no que a atm osfera é a condição da vida biológica. M as, antes que esta substancialização ocorra, podem os rastrear ao longo da história a predom inância ou alternância das duas funções iniciais que assinalam os. N o decorrer do tem po, cada vez mais as duas funções se diferenciam . Se, n o início da escrita, provavelm ente, a m ensagem rem etida à distância deve te r sido a função fundam ental d a escrita, no m undo m oderno, a função da escrita é, evidentem ente, guardar a experiência h um ana p a ra as gerações seguintes (função te m p o ra l). . . se m inim izarm os, p o r um m om ento, p ara efeitos didáticos, o enorm e e vital papel da escrita com o ecologia e objeto cultural de que depende o funcionam ento da m oderna sociedade. De fato, os m odernos meios de comunicação de massa, sobretudo o telefone, o ci­ nem a, o rádio e a televisão, retom ando a oralidade, aparentem ente dispen­ sam a escrita com o instrum ento de superação da distância. Existe um a convicção (pouco convincente) entre os com unicólogos, de que a com u­ nicação à distância não precisa mais da escrita, apesar de não cessar de crescer, gigantescam ente, o volum e de correspondência p o s ta l. O s mais radicais chegam a afirm ar que tam bém a conservação da m ensagem no tem po dispensará, brevem ente, a escrita, substituída por gravações audio­ visuais. P o r um lado, não se pode, realm ente, im aginar, hoje, o funcio­ nam ento da sociedade sem os meios de com unicação de m assa, sobretudo sem meios com o o telefone, este pequeno mass media tão desprezado peloá com unicólogos. P o r outro lado, não se deve esquecer que, p o r mais que rufe a banda dos partidários da “civilização da im agem ” (este arcaism o ressucitado pelos m eios de com unicação de m assa), a escrita continua a ser a infra-estrutura de todo processo civilizatório, tanto assim que não existe civilização sem “papéis” (a inform ática é, hoje, a condição de viabi­ lidade no funcionam ento das em presas e instituições, e não se pode pensar na m anipulação de inform ação pelos com putadores o u /e um banco de dados sem a utilização da escrita). E sta ilusão de dim inuição da im portância da escrita decorre do fato de o p oder de decisão e a obrigação de m anuten­ ção da continuidade dos processos sócio-culturais estarem concentrados nas m ãos de um núm ero dim inuto (incrivelm ente pequeno) de pessoas (as únicas, portanto, que devem fixar nos “p apéis” os projetos e tra n saçõ es). O que dim inui, portanto, não é a universalidade da im portância da E S C R

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I-T A , m as a parcela de hom ens que, n a sociedade m odem a, tem P O D E R D E D E C IS Ã O . D aí a ilusão fantasm agórica de M c L u h an quando decre­ tou a extinção da civilização da escrita. O s meios de com unicação orais (audio-visuais), realm ente, planetarizaram a com unicação face-a-face, p o r interm édio, p o r exem plo, do telefone (instrum ento de im portância civiliza- tó ria mil vezes superior à televisão). M as, a com unicação face-a-face, é o mais prim itivo meio de com unicação. O s meios de com unicação basea­ dos na oralidade são, p o rtanto, p u ro e sim ples arcaism o: retom a, em esca­ la planetária, o processo tribal de com unicação (face-a-face). M c' L u h an tem toda razão quando fala em aldeia global (planetária), m as a “ aldeia global” n ão é um avanço civilizatório: é , apenas, u m a reform ulação sin- crôm ica da convivialidade. R etom a o processo histórico no p o n to em que os agrupam entos hum anos, atom izados pelas barreiras geográficas, cons- troem “civilizações” autônom as, com vários graus de decalage. R eform ula o convívio de todos os seres hum anos num a única aldeia, agora p la n e tá ria .

um avanço civilizatório, se tom arm os a civilização com o um p ro d u to unitá-

um avanço civilizatório, se tom arm os a civilização com o um produto u n ittá- rio e geral da hum anidade. Este processo de terraplanagem é, incisivam ente evidente, m esm o dentro de um a m esm a “nacionalidade, com o o B rasil, onde convivem, no m esm o m om ento, agrupam entos hum anos com padrões de conduta da época da p ed ra lascada, com agrupam entos da civilização es­ p acial. A planetarização produz, apenas, hom ogeneização, por vezes bai­ xando mesmo o pad rão cultural dos mais avançados. A ilusão de avanço que esta hom ogeneização produz decorre da décalage dos vários níveis civi­

lizatório em que vivem ainda hoje, os diversos agrupam entos hum anos que se tangenciam . A novela de televisão, p a ra a dona de casa sem i-analfabeta, m ergulhada na vegetatividade enervante das tarefas culinárias, é autêntico terrem oto psicológico, dando, portanto, ao observador, a im pressão de que foi a televisão, em si, que produziu a “revolução”, quando, de fato, foi o confronto e a interpenetração de dois m om entos civilizatórios. O m esmo fato ocorreu, em m uitas ocasiões, no m undo antigo, m esm o sem televisão, q uando duas civilizações de níveis diferentes se interpenetravam (com o foi o caso de R om a ao dom inar, m ilitarm ente, a G récia). N inguém pensaria em m inim izar a im portância que p a ra a hum anidade tem esta planetarização h om ogeneizadora. M as, não tenham os ilusões: a retomada da oralidade em que implica este fenômeno é uma regressão, do ponto de vista civilizatório

geral. A oralidade — seja qual for a sofisticação tecnológica de que se uti­ lize p a ra m anifestar-se — é um F A T O P R IM IT IV O , perante o qual a

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escrita é um avanço civiüzatório (e, com o se sabe, os processos civilizatórios são irreversíveis). Os m eios de com unicação de m assa (por mais revoluções m icrotópicas que produzem em agrupam entos hum anos em estado civili- zatório anacrônico) são, portanto, a retom ada do processo civilizatório pe­ los m étodos tribais, m esm o que os conteúdos (mensagem) sejam totalm en­ te diferentes. M c L u h an tem to d a razão ao referir-se à “ aldeia global” : tu d o se passa com o se os povos adiantados viessem à pedra lascada buscar p a ra a civilização as populações que perm aneceram “ prim itivas” (a aldeia global, pois, é a convivência dos contrários: um a simbiose do novo e do arcaico). A ilusão de superação da escrita, pois, provém a) da “revolução” que a oralidade e visualidade dos M CM produzem nos agrupam entos re­ tardatários do processo civilizatório (decalage), levando à hom ogeneização pelo nívei civilizatório superior e b) do fato já assinalado de só um peque* n o contingente de indivíduos, no atual m odelo civilizatório, dispor de p o ­ der de decisão e de responsabilidade pela continuidade do processo histó­ rico, podendo grandes m assas hum anas setorizadas perm anecerem no nível da m era “inform ação” (notícia, espetáculo, divulgações, e tc .): é a falta de capacidade “política” de operar que to rn a a escrita irrelevante p a ra as m as­ sas . Q uando a “ aldeia global” de Mc L uhan, finalm ente, constituir-se (ple­ n a planetarização), e quando o p oder de decisão disseminar-se pela com u­ nidade toda (na “ aldeia global” as decisões são, grupalm ente, deliberativas: a com unidade toda delas participa, pois o simples fato de saber já im plica em iniciar um tipo de participação), quando esta revolução final tiver o co r­ rid o . . . V er-se-á que os m eios-de com unicação de m assa baseados na o ra ­

lidade nada tinham de revolucionários, do pontu de vista da continuidade civilizatória global (diacronia). O fato de a oralidade superar as distâncias geográficas e até m esmo as distâncias tem porais (com o quando a ver- balidade é gravada num a fita m agnética e a visualidade se fixa num a p elí­ cula) não elim ina seu “calcanhar de A quiles” que é a INSTANTANEI-D A INSTANTANEI-D E. O ra, a nosso ver, a instantaneidade inerente à oralidade (tanto a “ n atu ra l” quanto a tecnológica) é um im pecilho a certo tipo de operacio­ nalidade da inform ação, com o verem os. Assim, se grande massa de indi­ víduos, no atual m om ento histórico da hum anidade, dispensa a E SC R IT A , não é que a escrita se tenha tornado anacrônica: é sim plesm ente porque a) grande parte da hum anidade vive ainda em fases arcaicas com relação à civilização possível, e b) porque o modelo civilizatório em vigor, de caráter heteronôm ico, não perm ite a participação das m assas no processo “político ’ (P O D E R D E D E C IS Ã O ). Do ponto de vista planetário (hom ogeneização), a hum anidade está retom ando a tribalização em escala m undial. A

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tribali-zação representa um avanço civilizatório com relação ao estado de “h o rd a ” com um a todos os prim atas: tribalizar, pois, seria o prim eiro m om ento da “hom inização” . E sta tribalização é ainda tão incipiante que não chegou sequer, ao nível de um a total comunicação face-a-face, como ocoi'reu na aldeia primitiva. P rova disto é que não consegue, por exem plo, fazer fun­ cionar um a assem bléia planetária como as N A Ç Õ ES U N ID A S (O N U ) nos moldes de poder gerontocrático, como ocorria na trib o . O ra, o “fogo do conselho” (deliberação coletiva) é o órgão decisório das com unidades que vivem sem códigos e sem acum ulação gráfica da experiência (relações face- a-face: hic et nunc). A aldeia global m oderna, portanto, não tem ainda seu órgão p ró p rio de deliberação, sem o qual não é possível vida com u n itária. O fato de um a nação mais forte, por exem plo, p oder tom ar m edidas que prejudiquem nações mais fracas, dem onstra que a “ aldeia global’’ dos M C M não é ainda um a “ aldeia real”, cujos m em bros adultos deliberam coletN vãm ente, face-a-face, p a ra proteger o agrupam ento todo, incluindo fortes e fracos, hom ens e m ulheres, crianças e adultos. O fato de a com unidade toda (plebiscito), nesta pseudo-aldeia global não poder participar das de­ cisões, dem onstra, apenas, a) quanto estam os longe da hom ogeneização de todos os povos num a única “ tribo” internacional e b) quão atrasados são, tecnologicam ente, os m eios de com unicação de m assa p ara servirem, efici­ entem ente, a um a aldeia planetária (enquanto um com putador descom unal, localizado, p o r exem plo, em Brasília, com term inais em todas as esquinas onde vivem agrupam entos de indivíduos, não estiver à disposição dos poderes da república p a ra im ediata e instantânea consulta ao povo, nos m om entos de deliberação, nad a houve de extraordinário n a tecnologia dos meios de com unicação de m assa). C om o se vê, não term inou, ainda, a função da oralidade com o instrum ento organizador da “ aldeia global”, isto é, não com eçou ainda a civilização d a aldeia p lan etária. Q uando isto ocorrer, estarem os ainda na pré-história agora um a pré-história mundial da raça hum ana com o um to d o . Em m atéria de hom ogeneização tu d o ainda está p ara o co rrer. V oltarem os, portanto fatalm ente, à REVOLUÇÃO DA ESCRITA, com o voltam os à R E V O L U Ç Ã O DA O R A L ID A D E (tribaliza­ ção). U m esperanto qualquer, a tradução autom ática, os bancos internacio­ nais de dados, são hipóteses prováveis desta planetarização da E S C R IT A , m uito mais viável que a planetarização da oralidade. N aturalm ente, este fe­ nôm eno não ocorrerá com o um a “nova etap a”, m esmo porque, n a m edida em que a oralidade (visualização) se planetariza, a escrita, tam bém , se inter­ nacionaliza, de m odo que os dois fenôm enos aparecerão imbricados- M as, p a ra efeitos didáticos, pode-se dizer que a “planetarização d a escrita” será

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um a etapa posterior à planetarização da oralidade. Aliás, o intercâm bio de m aterial escrito (livros, jornais revistas) é, hoje em dia, um fenôm eno de m uito m aior im portância civilizatória que a planetarização provocada pelos M CM , em bora restrito ao pequeno grupo que tem poder de decisão. O livro, pois, não morreu, com o dizem os entusiastas do M CM . Nem sequer atingiu todos os agrupam entos hum anos, quer do ponto de vista da sociedade in ter­ nacional, quer do ponto de vista das divisões sociais de classe. Se n ão nos deixássem os deslum brar pelos clarões mágicos do “espetáculo” que é o alim ento básico de que se nutrem a televisão e o cinem a, verificam os que na infraestrutura da sociedade ocorrem fenôm enos m uito m ais graves e deci­ sivos, aparentem ente pouco relevantes p ara o processo civilizatório. Po­ demos im aginar a civilização prosseguindo, tranquilam ente, sem o cinem a

e a televisão, m as impossível é im aginar a sobrevivência do atual estágio ci­ vilizatório, po r exem plo, sem telefone (qualquer grande m etrópole entraria no caos, se todos os telefones parassem de funcionar durante 24 h o ras). O m esmo ocorre na área da com unicação escrita, em que a grande im prensa e a indústria do livro fazem parecer irrelevantes certos m icrofenôm cnos realm ente fundam entais. É alarm ante, p o r exem plo, que os especialistas em com unicação não estudem o fenôm eno revolucionário decorrente do M I- M E Ó G R A F O e da C O P IA D O R A , bem com o não se im pressionam com o aum ento progressivo e gigantesco da correspondência postal, microproces- sos de que depende o verdadeiro funcionam ento das estruturas sociais e econôm icas. Que terá havido, de repente, em pouco mais de vinte anos, apenas, p a ra que a hum anidade tenha sentido vital necessidade de m ilha­ res e m ilhares de m im eógrafos e de copiadoras? N ão se pode im aginar o funcionam ento do sistem a de produção e dos serviços, sem estes recursos m enores (telefone, m im eógrafo, xerox, e tc .), ao passo que, raram ente, em ­ presas utilizam o cinem a ou a televisão, os únicos instrum entos da tecno­ logia e da com unicação que merecem a atenção dos especialistas. P or m ais que se fale, apenas, nos meios que se utilizam da oralidade e d a visualidade eletrônicas (audiovisuais), no fundo, o processo civilizatório todo, apesar de Mc L uhan, repousa na ESCRITA. C om o o telefone, a copiadora, o g ra­ vador, o m im eógrafo, etc., a escrita parece — diante do im pacto feérico da televisão — um fenôm eno m enor, e, além disto, arcaico. M il vezes mais arcaico é o processo im agético e oral em que se baseiam o cinem a e a tele­ visão. Q uanto à visualização, a celebérrim a “civilização da imagem"’ é um anacronism o, tanto mais em polgante e popular quanto m ais se sabe que a com unicação p o r im agens corresponde a um a “pré-lin^uagem ” (Piaget), no desenvolvim ento hum ano, exigindo níveis operacionais m uito rçienos ele­

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vados que a linguagem oral (só p a ra exem plificar, n ão se deve esquecer

que o pensam ento de nível operacional (isto é, o pensam ento pós-intuitivo) só funciona m ediante conjunções e to d o m undo sabe que a linguagem vi* suai n ão dispõe de conjunções). É verdade qu e os estruturalistas p artid á­ rios de Levi Strauss (m ais radicais que o m estre) desconhecem a categoria “ operacionalidade” das relações sociológicas na análise dos níveis civiliza- tórios: p a ra eles, qualquer processo sócio-cultural é equivalente a outro qualquer, d a m esm a form a que m uitos “psicólogos” confundem o pensa-i m ento sim bólico pré-operatório dos povos “prim itivos” com a “ álgebra das proposições” utilizada p ela logística. É o desconhecim ento elem entar da filiação das estruturas, p o r com plexificação e m obilidade crescentes, tão n ítida n a biologia e na m atem ática, e a negação global d o processo evoluti­

vo (não há estru tu ra sem gênese: J . P ia g e t). A diacronia, necessariam ente, é um a ultrapassagem (com plexificação, m obilidade, am pliação), vez que a reequilibração dos desequilíbrios sincrônicos n ão se pode fazer n o nível em que o desequilíbrio se processou. A reequilibração dos desequilíbrios ge­

ra, fatalm ente, a diacronia, queiram ou não os estruturalistas fixistas (não genéticos). Assim , em m atéria de linguagem , o aum ento de operacionali­ dade configura-se, de m aneira geral, pela introdução das conjunções n a lin­ guagem, o que perm ite a algebrização dos juizos elem en tares. U m a lingua­ gem sem conjunção, p o rtanto, é um a pré-linguagem. A “civilização d a im a­ gem ”, pois, é um a regressão histórica, só adm issível n o m om ento d a ho- m ogenização p la n e tá ria . A escrita pictográfica (im agem ) corresponde, pois, a um a linguagem arcaica, sem conjunções, e linguagem sem conjunções é etap a vencida no processo de “hom inização” do h o m e m . A escrita m e d i a i te um código sistem ático, articulado e linear de signos é a correspondência gráfica desta su p e ra ç ã o . P o r aí se vê que ainda n ão chegou o m om ento his­ tórico da necessidade universal e planetária d a E S C R IT A . E stam os vivení- do ainda a planetarização d a im agem e da oralid ad e. A grande m aioria da hum anidade se satisfaz com um a pré-linguagem p a ra sua inform ação, não tendo ainda alcançado o nível operacional em que a escrita se to m a um instrum ento indispensável. Se lem brarm os que os convênios, acordos, có­ digos, protocolos, etc (quando livrem ente estabelecidos entre as partes) são o m ais alto nível de criação de relações entre os indivíduos, caracterizando um plano civilizatório de nível superior ao do direito consuetudinário, fi­ carem os convencidos de que ainda não com eçou, propriam ente, a CIVILI­ ZAÇÃO DA ESCRITA (se analisarm os o fenôm eno do p o nto de vista pla­ netário) . Os juristas m uito bem sabem a im portância transcendental que tem p a ra o D ireito (e o D ireito é a regra de convívio entre os hom ens) o

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fato de as norm as poderem ser escritas, e, p o rtan to , analisadas, herm eneuti- cam ente, em todas as suas possibilidades operatórias (álgebra das p roposi­ ções). O prim eiro sintom a que assinala a saída de um povo do estado p ri­ m itivo p a ra o estado civilizatório é a codificação escrita das leis e costumes

e n ad a leva a crer que a escrita venha a ser S u b stitu íd a neste seto r. A es­ crita substitui a m em ória (a conservação do com prom isso) que é a condição da continuidade form al das relações (socialização), qu er sejam elas valori- tivas, quer lógicas, econôm icas ou sociais. É neste sentido que J . Píaget diz que “a lógica é um produto social”, isto é; um com prom isso interindi- vidual que garante a perm anência dos princípios de identidade e de não- contradição em que se baseia a troca das inform ações, a deliberação cole­ tiva e a cooperação v e rb a l. Q uando este com prom isso se avolum a e se dis­ tancia d a relação face-a-face, a única m aneira de m antê-lo presente é a escrita (dificilm ente se poderia im aginar a assim ilação da CRITICA DA RAZÃO PURA de Kant, através de um processo oral, m esm o que fixado em fita m ag n ética).

3 . OS LIVROS QUE VÃO DESAPARECER

J á vimos que a finalidade da escrita, no início, deve ter sido a com unicação à distância, no tem po e no espaço (m ais im portante, talvez, p a ra as relações no espaço que p a ra as relações no te m p o ). V im os tam bém que os m odernos meios eletrônicos, levando a oralidade p a ra além do hic ét nunc (aqui e agora), aparentem ente parecem ter extinguido a necessida­ de da E S C R IT A , a p o nto de M c L u h an te r decretado sua m o rte . T angen­ cialm ente, vimos, tam bém , que a eletrônica, ao levar a oralidade além do espaço e do tem po próxim os (ondas hertezianas e gravação m agnética), não supera sua debilidade intrínseca, que é a IN S T A N T A N E ID A D E (neste sentido, do ponto de vista im agético, a fotografia é “ escrita” e o cinema é “ oral” )- Deixem os as coisas neste pé e passem os a analisar outras funções que a escrita adquiriu, com o co rrer do tem po. E n tre outros tipos de divi­ são didática, podem os adotar, por exem plo, um a dicotom ia que nos leve a dividir a escrita (livro) em dois tipos: a) os livros que fixam “reflexões”* (um livro de m atem ática, dé filosofia, um m anual técnico, um livro cien­ tífico, etc), e b) os livros que fixam “estórias” (um rom ance, um livro de poesia, to d a esta faixa que se denom ina hoje “literatu ra”). O ra, um livro de “ estórias” pode, sem p erd a ponderável de conteúdo, ser a) oraüzado (com o quando se transm ite pelo rád io um novela) ou b) visualizado (com o nas histórias em quadrinho, e, em grande parte, na telev isão ). A instantaneidade

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d a transm issão oral ou d a projeção cinem atográfica n ão só não dificulta a assim ilação deste tipo de inform ação, com o, provavelm ente, é até um re­ curso m otivador que aum enta seu im pacto em ocional. Q uanto à visualiza­ ção, a imagem é um fato r enriquecedor insuperável da “estória” . Q uatro ou cinco páginas de um rom ance descrevendo a decoração de um a sala o n ­ de os personagens do rom ance se m ovim entam , podem ser substituídas com vantagem p o r um a única tom ada de câm era, quer p o r meio do cinem a (processo de reprodução instantânea), quer p o r meio de u m a fotografia (processo de reprodução fixa). Q ualquer pessoa prefere (m esm o porque é um processo mais “n a tu ra l” e prim itivo, do p o nto de vista da codificação)

ver e ouvir um a “estória” que ter que lê-la num livro (a leitura exige todo um processo de reconstituição pessoal, tanto das ações dos pernsonagens, q u an to dos am bientes em que eles se d eslo cam ). A oralização e a visualizai ção aproxim am a narração da “estória” do p ró p rio acontecim ento (tanto assim que se costum a dizer hoje que os M CM — tornando os acontecim en­ tos contem porâneos de todos — elim inam a “notícia”) i A film agem de u m a narração p o r dois cineastas diferentes m ostra com o a leitura de um a “estória” é u m a elaboração tipicam ente p essoal. O ra, se um livro d eter­ m inado conta, apenas, “ estória” . . . não há vantagem em que se use, p a ra divulgá-lo, a escrita, em vez d a palavra oral e d a im agem , sobretudo num m undo de analfabetos reais e funcionais (resistentes ao esforço exigido pe­ la leitu ra). Pode-se im aginar o privilégio que é p a ra os analfabetos brasi­ leiros o fato de poderem dispor, hoje, da televisão p a ra lhes co n tar “estó­ rias” (a função da televisão term ina aí: é, apenas, um a “lanterna m ágica” eletrônica). N a “estória” , a conjunção, que caracteriza a linguagem de ní­ vel superior, é irrelevante, vez que os fatos se ligam p o r sua sucessividade, com o se observa no cinem a, o que corresponde à form a de pen sar das m as­ sas sem i-an alfab etas. P or outro lado, jam ais a escrita ca p ta ra a “ anim ação” tran sm itid a pela linguagem im agética: pelo contrário, a função d a escrita é “desm otivar” , afetivam ente, a narração, perm itindo a reflexão sobre os fatos (ver o teatro de B recht) É m uito com preensível, p o rtanto, que este tipo de livro venha a desaparecer, ficando o futuro rom ancista lim itado à prep aração do “ script” em que se baseia a filmagem, em bora p a ra surpresa dos discípulos de Mc L uhan, as novelas e filmes tenham provocado um a co r­ rid a às livrarias, em busca dos livros que lhes dão origem , crian d o o fenô­ m eno de best seller, o que com prova que a “instantaneidade” com que a “ estória” é con tad a n a televisão ou no cinem a é insatisfatória p a ra um a “ degustação” m ais sofisticada (prolongam ento de prazer) e até m esm o p a ra um a com preensão, em p ro fu n d :dade, dos fatos e am bientes que são p n >

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jetad o s. A o que parece, a instantaneidade da sucessão da inform ação, se­ gundo o m odelo oral, m esmo que acom panhada da visualização dos fatos narrados, é incom patível com o propósito da “reflexão” , m esmo que o con­ teúdo da inform ação seja um a “estória” . Talvez por isto os livros “ ilus­ trados” sejam tão populares (se é que se pode falar em popularidade do livro diante da insignificância das tiragens editoriais com paradas com o uni­ verso de telespectadores de televisão). O livro ilustrado alia a não-instan- taneidade d a escrita com a fixidez da im agem , perm itindo que dois proces­ sos psco ló g ico s (reflexão e “ im aginação”) se exerçam concom itantem ente (todos conhecem a eficiência do cartaz com o meio de P R O P A G A N D A , pelo fato de pertencer a duas ordens diferentes de código). O ra, se um a novela de televisão que atinge 100 milhões de espectadores provoca a ven­ da de, digam os, um m ilhão de livros, e se o adquirente do livro é, eviden­ tem ente, um consum idor de “ estórias” de nível superior, o fato m ostra, apenas, que há m uito mais gente de nível inferior que de nível su p erio r. Se alguém, m otivado pelo filme ou pela televisão, recorre ao livro, prova com isto que seu nível de consum o cultural é incom patível com a instan­ taneidade d a projeção cinem atográfica e televisionada. C om o se supõe que o nível geral da hum anidade tende a crescer (mesmo porque sem um levan­ tam ento de nível global não é possível prosseguir com a perm anente renp- vação tecnológica e com a com plexificação progressiva das explicações ci­ entíficas), é m uito provável que o futuro esteja mais a favor do livro que a favor da televisão. . . ficando a televisão e o cinem a com o um a espécie de m otivação (departam ento d e . propaganda do liv ro ). D e fato, se, p a ra o sem i-analfabeto e o indivíduo de baixo nível m ental, a leitura é um obstá­ culo intransponível (já do p o nto de vista d a m ecânica de leitura, já do pon­ to de vista d a reconstituição psicológica d a “estória”), p ara o indivíduo de nível superior, perfeitam ente alfabetizado, a leitura do livro é u m a “lib erta­ ção” : perm ite as m ais variadas reconstituições, deixando m argem (nos in ­ tervalos que propositadam ente estabeleça) p a ra elaborações paralelas e p a ra

prolongada “degustação” (prolongam ento do p razer). Jean Piaget consta­ ta que o desenvolvim ento m ental im plica num a “degenerescência” progres­ siva da percepção (e os audiovisuais são, preponderantem ente, “percepti* vos” , m esm o porque, dada a sua instantaneidade e sucessividade dos estí­ m ulos, n ão perm item a reflexão). A oralidade e a visualização em cadeia (cinem a e televisão) não adm item (ou o fazem precariam ente) as p aradas p a ra a reflexão, com o é perm itido ao leitor, em bora os cortes, nestes ins­ trum entos, possam ser m uito mais eficientes num a observação perceptiva de detalhes (ver a análise de lab o rató rio da autenticidade da voz de um in­

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divíduo, feita num laboratório eletrô n ico ). M as, com o se sabe, não são os detalhes que interessam à reflexão, e sim as unidades significativas (frase, período, te x to ). Assim, as “p arad as” possíveis dos audiovisuais servem , ape­ nas, p a ra um a pesquisa m aterial, sobretudo nas gravações d a oralidade (gravação da visualidade abrange unidades m uito mais am plas (fotografia), de m odo que o trabalho fotográfico é m iyto m ais significativo do ponto de vista d a totalidade da “estória” : a fotografia está p a ra a não-instanta- neidade do cinem a, com o a escrita está p a ra a não-instantaneidade da fala). E stam os argum entando, pois, com o se um romance} consistisse,

apenas, em “estória” . . . é um sacrilégio p a ra a “intelligentzia” literá­ ria (quem pensa o contrário, provavelm ente nunca leu P ro u s t). E que n ão diriam disto os poetas concretistas? A liás, a poesia, ao que parece, é, essencialm ente, um a arte gráfica, tanto assim que n ão vingaram os discos de p o esia. Sente-se que falta “ algo” quando um ator (m esm o que seia um m onstro sagrado, com o Paulo A utran ou Lim a D uarte) recitam poesia na televisão. A “poesia” oral parece que se extinguiu com os jograis da idade m édia e com os cantadores do N ordeste (só a m úsica consegue m anter a o ra­ lidade d a p o e sia ). N ão levando em conta que, quase sem pre, o autor de um rom ance pretende m ais que, sim plesm ente, c o n tar “estórias” (apesar de um Jorge A m ado se descrever com o um “contador de estórias”), ainda assim, dificilmente, o cinem a e a televisão conseguem criar o “clim a” do rom ance (sobretudo se o am biente é psicológico ou sociológico). N o cinem a e n a te> levisão, o fio da intriga (enredo), fatalm ente, sobreleva aos dem ais aspectos, m inim izando as intensões “didáticas” do a u to r. N a novela G A B R IE L A , de Jorge A m ado, p o r exem plo, tran sp o rtad a p ara a televisão, a mise en scène

e as peripécias irrelevantes do destino pessoal dos personagens facilm ente em polgam a im aginação, tornando irrelevante o objetivo tem ático do autor, que, no caso, é ressucitar um m om ento histórico da vida brasileira, em de­ term inada região, através do ângulo da exploração do cacau: praticam ente, os fenôm enos sociológicos provocados pela exploração do cacau desapa­ recem da novela n a versão televisionada. O ra, só o leitor extrem am ente m edíocre se satisfaria com a intriga p u ra e simples, com o ocorre com os leitores de rom ances policiais (daí o “policial” ter-se tornado o p rato de resistência e a espinha dorsal do cinem a e da telev isão ). Salvo no caso de m onom ania (fixação de hábito com pulsivo sem elhante à dependência do to- xicônom o com relação às drogas), o leitor norm al cedo se cansa de seguir, apenas, a “estória” mil vezes repetida; elevando o nível do seu gosto e pas­ sando a ler o rom ance com outros propósitos (justam ente os propósitos que, dificilm ente, seriam satisfeitos no filme de intriga, apesar de haver

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filmes que são, excepcionalm ente, verdadeiras obras de a rte). M as, apesar de todos estes “ contudo” , adm itam os para argum entar, que os m eios audio­ visuais (oralidade - visualização) venham a substituir, totalm ente, a leitura da “ estória” escrita (o que, com o se viu, é m uito pouco provável). A inda assim, ficam, com o instrum entos insubstituíveis, todos os livros científicos, técnicos e filosóficos. Q uem pode im aginar, por exem plo, um a exposição, de m atem ática superior film ada o u /e em fita m agnética (aliás, adm ite-se que a m atem ática é um a ciência essencialm ente gráfica, a prim eira enlre todas que se planetarizou, talvez precisam ente porque é escrita?) Assim, a pretensa “m orte do livro” , provavelm ente, refere-se à morte da “estó­ ria” escrita do tipo rom ance • p o lic ia l. Se o objetivo é, apenas, contar “ estórias” . . . no espaço de um a hora, cem milhões, duzentos milhões de telespectadores podem tom ar conhecim ento de um enredo, pela televisão (o mais irônico é que a im prensa nasceu, precisam ente, com o “industriali­ zação” do m anuscrito, antigo produto artezanal, cujas origens se perdem na “pré-história”) . O fato de a televisão, agora, concorrer com o livro repre­ senta, apenas, a regressão ao “co ntador de estórias” d a aldeia tribal: a assim ilação desta função pelo livro foi puram ente circunstancial. A escrita — processo que logo se transform a em instrum ento de reflexão — conviveu com o “contador de estórias” durante milênios, cada um dos dois com sua função específica. Só quando o livro se torna p roduto industrial é que a escrita passou a ser veículo popular fundam ental de alim entação d a fan­ tasia das m assas, m esmo porque o livro de reflexão não tinha (com o não tem ainda) divulgação suficiente p ara alim entar um processo de produção em série. A superposição ou confusão de funções é m uito recente e tende a desfazer-se, logo m ais. Assim, quando a eletrônica perm itiu m assificar a “estória” , por meio do cinem a e da televisão, a oralidade (agora junto à v isualização), retom a seu lugar h istórico. O fenôm eno pode ser visto p o r um ângulo diam etralm ente oposto: enquanto o processo artesanal m anteve o livro com o um objeto raro, a reflexão (cujo instrum ento natural é a es- cr t i ) se fazia, predom inantem ente, através de processos orais (aulas expo- sitivas), apesar da evidente ineficácia e da falta de rentabilidade desta m e­ todologia. H oje, o professor conferencista (orador) é considerado um fóssil (neste sentido, nossa escola é um m useu paleontológico). H oje, enquanto o espetáculo dispensa, cada vez mais, o livro com o m ediador do drama (tea­ tro), a escola, cada vez mais, passa a girar em torno da biblioteca ( le itu r a ) . Em outras palavras: tendo a oralidade, agora, descoberto seu instrum ento eletrônico de m assificação, passa a dispensar o livro de que ',e utilizara du­ rante séculos. P ara contar “ estórias” , por sua vez, n a m edida em que o

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livro se torna um instrum ento de massa, pela industrialização e pela divul­ gação da alfabetização, a reflexão abandona a oralidade (aula expositiva) e volta a trab alh ar com textos. E stam os no divisor das águas, n a m edida em que se intensificam as funções próprias dos dois processos, agora num a escala p la n e tá ria . É com preensível que o processo de m assificação se inicie pela “estória” e pela oralidade, para, só num segundo m om ento, atingir a reflexão e a escrita. A hipótese é que, no f n a l deste processo, o “p oder de decisão” não fique concentrado num a pequena parcela da hum anidade (tec- n o cratas). M as, p a ra isto, conta-se com a tribalização da hum knidade pro­ vocada pela oralidade eletrônica: n a “aldeia global”, todos tendo op o rtu ­ nidade de participar, não há lugar para grupos privilegiados. Percebe-se, p o r outro lado, que a “estória” perde, cada vez mais, suas conotações .his­ tóricas de veículo de “teorias” , passando esta função às ciências hum anas

(sociologia, psicanálise, história, etnologia, antropologia, etc). P o r sua vez, os textos científicos vão-se tornando cada vez mais densos e m atem a-

tizados, exig:ndo abordagem de alto nível reflexivo, o que não é exequível senão através de processos que superem a instantaneidade d a o ra lid a d e .

4. A ACUMULAÇÃO DA EXPERIÊNCIA

N as sociedades prim itivas, a “experiência” (exceto um kno»v how m uito elem entar que passava de geração p a ra geração, assistem atica- mente, através do próprio convívio social) é constituída de m itos, fábulas e religiões. Os prim eiros livros foram L IV R O S SA G R A D O S (não foi por acaso que a im prensa com eçou com a D IV U L G A Ç Ã O da B íb lia ). O livro sagrado, fixando a “ experiência” , im pedia que a tradição oral deturpasse o patrim ônio cultural da tribo (experiência sim bólica). O perigo d a d etur­ pação é um fato natural e decorre da necessidade de transm itir a experiên­ cia acum ulada a cada nova geração (não há um a hereditariedade das m ito­ logias, apesar dos “ arquétipos coletivos” de Jung: cada nova geração tem o poder de criar mitos com a m esm a facilidade com que nossos ancestrais fabularam na pré-história). N a m edida em que a hum anidade vai superan- dos as mitologias (as quais, no m om ento atual, denom inam -se “ideologias” ), a experiência a transm itir passa a ser: a) know how, progressivam ente, mais técnico e cada vez mais científico e b) um a reflexão (filosofia) que se apre­ senta, hoje, menos com o “sabedoria” que com o conhecim ento positivo (so­ ciologia, psicologia, m atem ática, etc — ver “A Sabedoria e as Ilusões da Filosofia” , de Jean P iaget). É por isto que o rom ance vai perdendo suas funções clássicas de veículo de “m ensagem ” (reflex ão ), e filosofia vai

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sando a depender, mais e mais, do conhecim ento científico. O ra, se os antigos tiveram que recorrer à escrita p ara evitar que a oralidade d e tu r­ passe os m ;tos, que dizer dos m odernos com relação à tecnologia e à ciência? O livro com o veículo da ciência e da tecnologia, pois, apenas ensaia seus prim eiros vôos (basta p ara isto ver o êxito de banca de jornal das publica­ ções de “ divulgação científica”) . É evidente que grande m assa da h um ani­ dade n ão tenha, ainda, capacidade p a ra u t:lizar esta nova experiência co­ letiva, m esm o porque nem está no nível civilizatório em que a ciência e a técnica passam a ser novo “ m odo de vida” , nem (quando a civilização já é bastante técnica e científica) tem p oder de decisão sobre a aplicação destes recursos n a vida com um (a decisão fica com pequenos grupos de tecnocra- tas do serviço público e do sistem a de p ro d u ção ). Salvo se a civilização ca­ m inha p a ra distinguir duas hum anidades (um a que decide, constituída de um pequeno núcleo de tecnocratas e um que obedece, constittuída das granj des m assas sem i-letradas), é provável que se chegue a um p onto em que a ciência e a tecnologia tornar-se^ão tão vitais p a ra a vida social quanto, na cidade a n t:ga, a m itologia era fundam ental p a ra a sobrevivência da com u­ nidade: não adiantaria existirem term inais de im ensos bancos de dados, em cada casa, se seus habitantes não souberem utilizar as inform ações disponí­ veis (o que vale dizer que, um dia, os tecnocratas terão de cu id ar do desen­ volvim ento hum ano com o condição de sua p ró p ria sobrevivência com o do­ nos do conhecim ento), isto é, terão que criar m ercado de consum o p a ra sua

própria mercadoria: sendo um processo dialético, a tecnocracia gera sua p rópria destruição (a am pliação do conhecim ento e seu uso generalizado term inarão p o r torná-lo “p o p u lar” , o que im plica em destruir os tecnocra­ tas). O ra, é p o u co provável que to d a experiência científica e tecnológica já acum ulada seja estocada exclusivam ente em películas e em fitas m agné­ ticas, salvo em seu aspecto inform ático, p a ra viabilizar rápido acesso à in­ formação escrita (o fato de o livro ser m icrofilm ado o u /e transm itido ele­ tronicam ente , n ão altera, essencialm ente, a n atureza gráfica do livro; m uda, apenas, sua form a de estocagem e de acesso: é provável que a cópia forne­ cida ao consulente p a ra estudo seja sem pre um a reprodução escrita, vez que a assim ilação dos conteúdos sem i-óticos exige sem pre a estabilidade e fixidez do texto (dificilm ente se p ode “estu d ar” um a inform ação científica atra­ vés de um tape ou filme). O s processos básicos de im pressão sensorial e os m ecanism os de assim ilação do hom em n ão se m odificam , p o r m ais que

a tecnologia progrida: não é provável que a m an eira de “estu d ar” venha a m udar m uito n o futuro, com o pretendem os autores de ficção científica, ao sugerirem que se aprenderá, logo m ais, m ediante injeções e transplantes

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(se a m aneira de ap render vier a m udar, o processo digestivo tam bém sofrerá m odificações, o que é pouco p ro v á v e l). As m udanças tecnológicas n ão têm provocado m udanças funcionais e fisiológicas no organism o hum ano, vez que a digestão continua a ser feita da form a com o se fazia na caverna: o m esmo se pode dizer com relação ao funcionam ento do sistem a neurótico em que se apóia, biologicam ente, a função se m ió tica. A ssim , p o r m ais sofis­ ticação que a inform ática venha a acrescentar à estocagem da experiência científica e tecnológica, fundam entalm ente, a E S C R IT A perm anecerá, m es­ m o no futuro, o instrum ento básico de codificação dos dados, e a LF^TURA

a fórm ula de as novas gerações dela tom arem conhecim ento. N o fundo, ttoda a parafern ália eletrônica está e estará, no futuro, a serviço destas duas técnicas básicas com plem entares (escrita e leitu ra). A prender a ler e a es­ crever (no sentido técnico dos term os, segundo a m oderna psicologia) será, provavelm ente, no futuro, condição fundam ental de hominização, isto é, é provável que os textos científicos, no futuro, tenham tan ta im portância p a ­ ra a sobrevivência d a espécie h u m an a q u an to os livros sagrados tiveram p a ­ ra a estabilidade das sociedades prim itivas. C om o ocorre ainda com a tec­ nocracia de hoje, tam bém n a antiguidade, os textos sagrados foram privilé­ gio (iniciação) dos sacerdotes do tem plo: foram os p rotestantes (R eform a) que destruíram os “tecnocratas da T eologia”, levando o texto sagrado ao hom em com um (dessacralização): um dia, tam bém , haverá um a “reform a pro testan te” co n tra os tecnocratas, guardiões da tecnologia e da ciência, arrancando-se-lhes o segredo em que baseiam seu p o d e r. A prim eira revo­ lução d a im prensa favoreceu os que protestavam co n tra a exclusividade d a posse e d a in terp retação dos textos sagrados, pelos tecnocratas do tem ­ plo, a segunda revolução da im prensa favorecerá os que protestarem co n tra os “ teólogos da tecnologia” : a escrita, ao que parece tem ainda um a grande ‘ e histórica m issão a cum prir quando o livro científico ficar ao alcance de todos (m assificação), d a m esm a form a com o a televisão perm itiu a todos no m om ento atual, ouvir “ estórias” (a televisão teria feito o m esm o pela ciência se a reflexão n ão fosse incom patível com a instantaneidade e a fal­ ta de fixidez característica dos processos baseados n a o ralid ad e).

5 . DUAS INVARIÁVEIS DO PROCESSO CIVILIZATÓRIO

D e onde provêm estas “certezas” sobre o curso futuro dos p ro ­ cessos de codificação dos p rodutos m entais e dos m eios de com unicação e de inform ação? Pelo m enos duas invariantes podem ser identificadas com o fio condutor dos processos (a função é invariante, em bora as estruturas, p o r meio das quais se efetivam , sejam variáveis” — J. Piaget):

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l . a Invariante: A SUCESSIVIDADE DAS NOVAS GERAÇÕES

T o d o m undo sabe que h á apenas dois processos básicos de com ­ portam ento: a) o instinto e b) a inteligência (o hábito é um m odelo interm e­ diário que p articip a d a estrutura destes dois processos, n ão m erecendo ser encarado aqui, m esm o porque, do ponto de vista funcional, com porta-se (m esm o que proveniente originalm ente de um ato inteligente) com o um instinto adq u irid o ). Instinto é o com portam ento de origem genética que vem inserido na anatom ia e na fisiologia do anim al, caracterizando-se po r sua forte estereotipia (in v ariab ilid ad e). M esm o que se adm ita (com o se faz hoje) certa aprendizagem do instinto (de fato, trata-se de m era atualização — ver C . L o ren tz). Sua característica fundam ental é independer de in­ venção ou descoberta do a n im a l. J á a inteligência, pelo contrário, se ca­ racteriza pela invenção (interna) e pela descoberta (externa): o anim al é tanto mais inteligente quanto m ais seu com portam ento depende destes dois fatores (criatividade). O ra, quanto mais um anim al sobe na escala zoológica (cefalização — T . C h a rd in ), m ais seu com portam ento é m enos instintivo (estereotipado e inato) e mais inventado e descoberto. O conhecim ento (e conhecim ento equivale a com portam ento) no anim al é (?) , com o diz J . Piaget. O hom em deve “ ap ren d er” a com portar-se (com preender). O hom em — “p o n ta filética da evolução” , segundo T. C hardin — é o anim al em que m enos se identificam instintos (pode-se dizer, m esm o, que o hom em não tem instintos — tem necessidades: p a ra satisfazê-las tem que inventar ou descobrir com portam entos, m esm o em sua vida sexual). N o hom em p re ­ dom ina, pois, a inteligência (m esm o que grande m assa d a hum anidade, coa­ gida e envlecida, n ão invente nada, com portando-se através de m ecanis­ mos de hábitos im postos pelos d om inadores). A ssim , cada criança que nasce (cada n ova geração) tem que recriar to d a experiência acum ulada pela hum anidade (é este processo que se denom ina edu cação ). A ssim , di­

ferentem ente dos anim ais, um a das preocupações fundam entais dos adul­ tos que entendem o processo evolutivo é inventar instrum entos de inform a­ ção destinados à educação das novas gerações. E sta educação pode ser

um a “conformação” ou u m a “transformação”, as duas m odalidades de

“ aprendizagem ” que caracterizam a sociedade fechada e a sociedade aberta:

a sociedade aberta perm ite que a reinvenção que a juventude faz da cul­ tu ra im plique em “ transform ação” dos processos culturais, o que garante a perm anente evolução da hum anidade, a sociedade fechada é aquela que dificulta a invenção e a descoberta, levando as novas gerações a “ confor­ m ar-se” com o modus vivendi das gerações adultas: a sociedade fechada

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com porta-se, em educação com o se tentasse transm itir, “ h ered itariam en te”, seus “instintos”, isto é, seus h áb ito s. Assim, os instrum entos sócio-cultu- rais de “inform ação” (com unicação) têm duas funções básicas: a) perm itir

o funcionamento sincrônico da sociedade adulta (por isto lem bram os que u m a das prim eiras finalidades da escrita deve ter sido a com unicação à distância, no esp a ç o ); b) perm itir o funcionamento diacrônico, isto é, as ligações com as novas gerações, dando continuidade histórica às conquistas (experiência) da hum anidade (é a com unicação no tem p o ). C om o vimos,

a orblidade seria, hipoteticam ente, satisfatória p a ra o funcionam ento sin­ crônico (relações entre adultos), sobretudo agora que a eletrônicà com eça a perm itir a reinvenção da “ aldeia global” (por isto lem bram os a im p o r­ tância do telefone n a planetarização e n a hom ogenização cultural da h u m a­ nidade), em bora se pudesse defender a tese contrária, dem onstrando-se a

função d a escrita nas relações atuais (hic et nunc — códigos, docum entos, correspondência postal, escrituras, m im eógrafo, copiadoras, im prensa, li­ teratura, e t c ) , ê duvidoso, porém , que a oralidade seja suficiente p a ra o

funcionamento diacrônico da sociedade, sobretudo se p o r diacrônico com ­

preendermos as relações não com as novas gerações, m as com as gera­

ções futuras (os professores, nas escolas, insistem em estabelecer esta dia-

cronia através de processos orais — aula expositiva — m as é evidente que se trata de um equívoco técnico, só tolerável enquanto o livro científico

nSo estiver ainda à disposição de todos: dificilm ente se poderia, p o r exem ­

plo, ensinar Matemática através de processos orais exclusivos (veja-se a importância do quadro-negro na aula de M atem ática) e jam ais o corpo

docente pretenderia substituir uma BIBLIOTECA. A m assa de inform a­ ções científicas nas mais diversas áreas, que estão hoje à disposição das novas gerações, é incompatível com um a transm issão oral ou visualizada (já vimos as limitações da visualização n a elaboração de uma reflexão de nível superior). A falsa im pressão de que a eletrônica substituirá, um dia, a escrita (e vamos chamar de “escrita” todo código sistemático G E R A L e LINEAR que não utilize o ouvido com o m ecanism o de leitura), decorre da ignorância da função da informática, que é m enos uma form a nova de transmissão que um processo de aum ento da operacionalidade n a manipu­ lação da inform ação escrita. A invariável da sucessão das gerações ,ligada à reinvenção necessária do processo cultural, garante, a nosso ver, a p er­

manência histórica da escrita, m esm o que o atual processo ortográfico ve­

nha a sofrer drásticas modificações, com o ocorreu através d a história

(escrita pictográfica, ideográfica, ortográfica, e tc).

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2 a Invariante: RITMO FISIOLÓGICO DE ASSIMILAÇÃO

Je a n Piaget m ostrou, à sociédade, que a assim ilação dos proces­

sos culturais nad a tem de essencialm ente diferente do processo geral de assim ilação biológica (digestão). A “ aprendizagem " (tom am os aqui “apren­

dizagem ” no sentido lato, com o faz J . Piaget, incluindo neste processo as

“ aprendizagens” perceptivas, m otoras, equilibrações, indução, dedução, etc),

é. apenas, um a form a diferenciada do processo geral de alim entação do ser

vivo com o tal estando ligada, pela base, com os processos fisiológicos (sis­

tem a neurônico). C om o um processo diacrônico típico (gênese — segundo J . Piaget), não pode descartar-se de sua dim ensão temporal. Assim , pode-

se analisar o ritmo temporal da “ aprendizagem ” , da m esm a form a como

se mede o ritm o tem poral da digestão dos alim entos. Sabe-se, p o r exem plo, qual é a d uração m ínim a para que a percepção assimile um a sucessão de quadros (é neste lim iar perceptivo que se apoia a projeção cinem atográ­ fica). Se isto é verdade com relação à percepção (onde se situa a oralida- de e a visualização), com m uito mais razão é verdadeiro quando o proces­ so de assim ilação im plica em longos rodeios com o no processo indutivo e

dedutivo (p o r isto dizíam os que a fotografia está p a ra o cinem a com o uma

escrita: perm ite um processo assim ilativo mais prolo n g ad o ). Vimos, tam­

bém, que a “estória” é tão simples em sua estrutura operacional que não

exige longas “exposições” p ara ser assim ilada. É por isto que a oralidade

não rouba nada de essencial à “ estória” (pelo contrário, talvez seja a ora­

lidade a m elhor form a de “co n tar estórias” , tanto assim que se costuma ler

em voz alta a “estória” ) . Foi basead o nisto que argum entam os que a mas­

sificação eletrônica da “ estória” n ad a tem de revolucionário. Já a infor­

mação “científica” (que exige longa meditação e assimilação de processos

altam ente operacionais) é incom patível com a instantaneidade da comuni­

cação oral (salvo em indivíduos altam ente treinados na reflexão, assim

mesmo, com apoio num instrum ento de trabalho qualquer de caráter es­

crito). A ssim , n a m edida em que a reflexão se com plexifica e o processo civilizatório se apóia em m ecanism o de nível operacional superior, m ais provável é que a escrita (que é um m ecanism o de desaceleração da infor­

m ação) se torne a infra-estrutura dom inante do processo civilizatório, so­ b retudo em sua dim ensão d iacrô n ica. O fracasso da cham ada “leitu ra d i­ nâm ica” é bem exem plificativo: a leitura n ão foi feita p a ra ser “d inâm ica” mas p a ra perm itir a m editação (neste sentido, o que se deve ensinar é a

“desaceleração da leitura” ) . Pode-se, pois, dizer que a T E L E V IS Ã O e o C IN E M A chegaram m uito tarde no processo evolutivo, e a E S C R IT A e

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o L IV R O chegaram m uito cedo. R esta saber se a hum anidade incentivará a reflexão a ponto de ela vir a ser um fenôm eno de m assa (seria a destrui­ ção d a tecnologia). Se vier a fazer isto, provavelm ente o fará através d a divulgação da L E IT U R A .

6. UMA SOCIEDADE EM PERMANENTE MUDANÇA

V im os que a função d a oralidade é m anter o processo sincrô- nico (isto é, as relações aqui e agora, m esm o que este “ aq u i” seja to p lan eia e o “agora” envolva as gerações jovens escolarizadas). V im os que a escri­ ta, ao aparecer no processo civilizatório, tem com o p rim eira função fixar, através dos L IV R O S SA G R A D O S, as tradições, tanto do p onto de vista sincrônico, qu an to do ponto de vista diacrônico. A ssim , a inform ação —• oral e escrita — nos seus prim órdios, apresenta-se com o um processo de fixação do status quo, tanto com relação ao m om ento atual, qu an to com relação a sucessividade das gerações. Pode-se, então, p erg u n tar se a m as­ sificação da com unicação n ão terá o m esm o efeito, nos tem pos m odernos. O ra, já vimos que os M CM são altam ente revolucionários, n a m edida em que hom ogenizam a hum anidade de m odo que, se tende a um a fixação do

status quo, esta fixação se faz pelo nível superior (interpenetração das cul­ tu ras). Com relação à escrita, a m assificação, substituindo os L IV R O S S A G R A D O S pelo T R A T A D O C IE N T IF IC O , gerará um a sociedade em perm anente m udança, vez que é pró p rio d a ciência (quando a ciência é um processo criativo e não reprodutivo) inovar permanentemente (m udar a

axiom ática a p a rtir da qual se desenvolve a sincronia d a vida sócio-cultu- r a l ) . Estam os, pois, assistindo a dois processos revolucionários: a) um de atualização, representado pela him ogenização e b) outro de permanente

m udança, que é a m assificação do processo científico (já vim os que a in ­ form ática desem penha p a ra com a escrita o m esmo papel que a televisão desem penha p a ra a oralidade e a visualização).

7 . ESTOCAGEM DE INFORMAÇÕES ESCRITAS

Se forem verdadeiras as considerações que estão sendo feitas, no m om ento atual, o grau civilizatório pode ser m edido p o r dois parâm etros: a) volum e e extensão dos M CM (cujo lim iar prospectivo atual é o satélite artificial) e b) dissem inação de B IB L IO T E C A S . D este últim o p o n to de vista, o B rasil é o país dos trogloditas: somos, talvez, dentre os países consi­

derados “civilizados”, o em que a B IB L IO T E C A tem m enos função

(bas-598 R . B ibliotecon. Brasília 5 (2) j u l./d e z . 1977 v.

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ta saber que elevadíssim a percentagem de escolas — e um a escola é, fu n ­ dam entalm ente um a B IB L IO T E C A — elevadíssim as percentagem de esco­

las não possuem B IB L IO T E C A S ). A tiragem m édia do livro brasileiro girando em torno de 5 .0 0 0 exem plares (exceto os livros de “estórias” que podem alcançar 100 ou 200 mil exem plares) diz m uito bem de nosso nível civilizatório em term os de participação das m assas (o Brasil é o país m ais elitista do m undo, apesar das divulgações ideológicas divulgadas nas escolas e na im prensa, com o a da “dem ocracia social” : ver tese de doutoram ento de G . M ota, da U niversidade de São P au lo ). Chegou o m om ento de “se­ mearmos livros, livros à mancheia” com o já queria o poeta condoreiro ao cantar em hino a função civilizatória da im p ren sa. Se com pararm os a ati­ tude da população de um país desenvolvido com a de nossa população, com relação a leitura, ficarem os escandalizados: já viajei 36 horas de ônibus sem ver um único passageiro ler sequer um jornal ou revista de quadrinhos (para avaliar o fato, esclareço que o ônibus era de lu x o ).

8 APRENDIZAGEM DA LEITURA

N ão é necessário que planejem os e incentivem os a m assificação dos meios audiovisuais: a propaganda deles se apossou e levará ao p a ro ­ xismo sua divulgação. P o r outro lado, o próprio funcionam ento (sinerô- nico) da sociedade (o único aspecto que im pressiona os hom ens que não têm visão do futuro, e hom ens sem visão do futuro são, precisam ente, os que acum ulam em suas m ãos m aior p o d er de decisão), o próprio funciona­ mento da sociedade forçará o desenvolvim ento dos instrum entos de com u­ nicação hic et nunc (pode-se, neste sentido, adm irar a m aravilhosa exp an ­ são nacional das com unicações p o r m icro-ondas). O s hom ens de visão devem preocupar-se (m esm o porque quase ninguém se preocupa com . isto) com a expansão da escrita e os m eios de reflexão. O ra, en q u a n to os M C M contam com os m ecanism os naturais de perceção (a audição e a visão), dispensando qualquer treinam ento p rév io . . . a E S C R IT A exige um longo e penoso processo de aprendizagem de m odo que a L E IT U R A passa a ser um índice de form ação cultural su p erio r. T odos sabem com o tem sido cheio de peripécias e recuos a universalização da alfabetização com o que os hom ens práticos dem onstram que não são tão tolos com o m uitos q ue­

rem fazer crer: no fundo todos sabem que a capacidade de ler introduz no agrupam ento hum ano um a dim ensão nova, m uita vez incom patível com o estado de dom inação que; tan to proveito traz aos que u su rp aram privilé­ gios dos m em bros da com unidade. A L E IT U R A d á ao indivíduo acesso

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