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A modalidade na competência V do ENEM: a aula de produção textual como prática de letramento crítico sob a perspectiva sistêmico-funcional

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO

ESCOLA DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

Fabiane Dalben de Faria

A MODALIDADE NA COMPETÊNCIA V DO ENEM:

a aula de produção textual como prática de letramento crítico sob a perspectiva

sistêmico-funcional

GUARULHOS

(2)
(3)

FABIANE DALBEN DE FARIA

A MODALIDADE NA COMPETÊNCIA V DO ENEM:

a aula de produção textual como prática de letramento crítico sob a perspectiva

sistêmico-funcional

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Letras (Área de Concentração: Estudos

Linguísticos), da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP),

como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em

Letras.

Orientador: Prof. Dr. Orlando Vian Jr.

GUARULHOS

(4)

Na qualidade de titular dos direitos autorais, em consonância com a Lei de direitos autorais nº 9610/98, autorizo a publicação livre e gratuita deste trabalho no Repositório Institucional da UNIFESP ou em outro meio eletrônico da instituição, sem qualquer ressarcimento dos direitos autorais para leitura, impressão e/ou download em meio eletrônico para fins de divulgação intelectual, desde que citada a fonte.

Ficha catalográfica elaborada pelo autor

Faria, Fabiane Dalben de.

A modalidade na competência V do ENEM: a aula de produção textual como prática de letramento crítico sob a perspectiva sistêmico-funcional / Fabiane Dalben de Faria. – Guarulhos, 2019.

167 f.

Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal de São Paulo, Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, 2019.

Orientador: Prof. Dr. Orlando Vian Jr.

Título em inglês: Modality in the competence V of the National Secondary Education Examination (ENEM): the textual production class as critical literacy practice from the Systemic Functional Linguistics perspective.

1. Redação ENEM. 2. Letramento Crítico. 3. Gramática Sistêmico-Funcional. 4. Metafunção Interpessoal. I. Vian Jr, Orlando. II. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal de São Paulo, Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. III. A modalidade na competência V do ENEM: a aula de produção textual como prática de letramento crítico sob a perspectiva sistêmico-funcional.

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FABIANE DALBEN DE FARIA

A MODALIDADE NA COMPETÊNCIA V DO ENEM:

A AULA DE PRODUÇÃO TEXTUAL COMO PRÁTICA DE LETRAMENTO

CRÍTICO SOB A PERSPECTIVA SISTÊMICO-FUNCIONAL

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras (Área de Concentração: Estudos Linguísticos), da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Letras.

Orientador: Prof. Dr. Orlando Vian Jr.

Aprovação em: _____ de _____________ de _________.

Prof. Dr. Orlando Vian Jr. (Orientador)

Universidade Federal de São Paulo

Profa. Dra. Roxane Helena Rojo Rodrigues Universidade Estadual de Campinas

Profa. Dra. Vanda Maria da Silva Elias Universidade Federal de São Paulo

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AGRADECIMENTOS

Ao querido Prof. Dr. Orlando Vian Jr, meu orientador, por me aceitar e acolher em seu grupo de pesquisa, por permitir a união entre meu trabalho em sala de aula e meus estudos acadêmicos, pela paciência, pela compreensão, pela orientação, por me apresentar uma nova teoria ao mesmo tempo tão desafiadora e apaziguadora e, acima de tudo, pela oportunidade de crescer profissional e pessoalmente. Serei eternamente grata por tudo o que me ensinou.

À Profa. Dra. Roxane Rojo, a quem tanto admiro, por sua contribuição para minha formação desde o início da graduação em Letras, pela leitura atenta e crítica e pelas orientações tão assertivas na banca de qualificação. Principalmente por ser, para mim, um exemplo de educadora a ser seguido, minha inspiração.

À Profa. Dra. Vanda Elias, a quem conheci, primeiramente, pelas obras relacionadas à leitura e à produção de textos, pela leitura tão atenta, cuidadosa e criteriosa na banca de qualificação, a quem devo a honra de ter me inspirado, mesmo sem que o soubesse, a seguir a profissão de professora.

A todos os meus professores, por seu compromisso com uma educação pública de qualidade, pelo amor e o respeito à educação.

À minha mãe, um grande exemplo de superação e amor, aquela que sempre me apoiou e me incentivou a seguir meus estudos. Aquela que sempre esteve ao meu lado, mesmo que a distância às vezes nos impedisse o abraço.

Ao meu pai, que sempre me ofereceu o melhor que pode, por prezar pelo meu bem-estar, por garantir que nunca me faltasse o necessário, por ser um batalhador, símbolo de força e de luta.

Ao Pedro, meu sempre namorado, por compreender minhas ausências, mesmo estando fisicamente presente, por todo o cuidado com nosso lar, por ser meu companheiro, meu amigo, meu conselheiro e até meu psicólogo. Obrigada por abrir mão, tantas vezes, de suas vontades e atividades para permitir a realização de meu trabalho.

(8)

Às amigas Andrea Borges e Luciana Teixeira, que tantas vezes ouviram meus desabafos e angústias e sempre me incentivaram a seguir em frente, pessoas tão importantes na minha vida.

Aos colegas, orientandos e orientandas do professor Orlando, Alexandre, Anna Carolina, Dayane, Elio e Pedro, pelas conversas, pelas trocas de conhecimento, pelos livros emprestados e compartilhados, pelos momentos de desabafo e de comemoração.

À Fernanda e a todos da secretaria de pós-graduação da UNIFESP pela presteza e pelo apoio em todas as etapas deste trabalho.

Ao Júnior e ao Rodrigo, por permitirem e viabilizarem a realização da pesquisa nos colégios.

Por fim, aos meus alunos, tão queridos, sem os quais a realização deste trabalho não seria possível, por terem, gentilmente, cedido seus textos.

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RESUMO

Pesquisas na área de letramento(s) (STREET, 1984, 1988, 2011; COPE; KALANTZIS, 1993; HALLIDAY, 1996; BARTON; HAMILTON, 1998, 2000; SHOR, 1999; ROJO, 2009; MENEZES DE SOUZA, 2011; JANKS, 2016) dimensionam a complexidade do desenvolvimento de práticas e eventos de letramento que incentivem, por meio da escrita, uma postura mais crítica, permitindo, além do domínio da língua, uma formação que promova a participação ativa dos indivíduos na sociedade. Como forma de fornecer subsídios para a compreensão da relação entre língua e letramento, esta pesquisa baseia-se em um corpus de 301 redações produzidas por 60 alunos, de dois colégios particulares, que, em 2017, cursavam o Ensino Médio e o curso pré-vestibular. Os participantes da pesquisa foram organizados em dois grupos: no Grupo 1, concentram-se 21 alunos do colégio de Campinas, enquanto no Grupo 2, 39 alunos do colégio de Indaiatuba. A geração dos dados deu-se a partir da oferta de uma Oficina de Produção Textual no contraperíodo escolar. O objetivo geral da pesquisa é desenvolver práticas pedagógicas que permitam o ensino de convenções de linguagem adequadas para a produção textual, estabelecendo conexões entre o aprendizado escolar e outros domínios da vida dos alunos, além de (i) compreender como a teoria do Ciclo de Ensino e Aprendizagem (CEA) da Escola de Sydney (ROSE; MARTIN, 2012) e sua relação com as práticas de letramento podem auxiliar os alunos no desenvolvimento de sua produção textual; (ii) identificar as marcas linguísticas que demonstram o cumprimento da competência V exigida pelo exame nas propostas de dissertação que tomam como base o ENEM; e (iii) compreender quais sentidos são construídos por meio dessas realizações. A perspectiva teórica e analítica apoia-se na Gramática Sistêmico-Funcional, teorizada por Halliday e Hasan (1989), Halliday (1994), Eggins (2004) e Halliday e Matthiessen (2014). A análise dos dados é norteada pela Metafunção Interpessoal e seu sistema de Modo/Modalidade (HALLIDAY; MATTHIESSEN, 2014; EGGINS, 2004), especificamente na identificação dos operadores modais empregados nos textos dos alunos. Com este panorama, o percurso proposto para análise percorre dois níveis principais: (i) o primeiro nível está relacionado aos eventos e práticas de letramento desenvolvidos ao longo da Oficina oferecida, a partir dos níveis e etapas do CEA, e sua contribuição para o letramento crítico dos alunos; e (ii) o segundo, relacionado ao aspecto gramatical, no qual são analisados os operadores modais que figuram nos textos do corpus. Para a análise dos operadores modais nas redações dos alunos, faz-se uso do programa computacional AntConc. Os resultados demonstram que (i) desenvolvidas todas as etapas do CEA, houve avanços na produção textual dos alunos e, também, na apresentação das propostas de intervenção social; (ii) os alunos empregam verbos auxiliares modais, sendo o mais frequente deles o verbo dever, e, também, metáforas interpessoais (é necessário, é preciso...) com a função de modalizar a apresentação das propostas de intervenção social; (iii) o número de ocorrências de operadores modais que indicam alto comprometimento com as propostas de intervenção apresentadas aumentou ao longo do desenvolvimento dos temas, revelando que os alunos passaram a adotar posturas mais críticas e protagonistas em suas redações, comprovando, como proposto por Halliday (1996), que o domínio da língua assume papel importante no desenvolvimento dos letramentos.

PALAVRAS-CHAVE: Letramento Crítico; Gramática Sistêmico-Funcional; Modalidade; Ciclo de Ensino e Aprendizagem da Escola de Sydney; Redação ENEM.

(10)

ABSTRACT

Research in the literacy area (STREET, 1984, 1988, 2011, COPEL, KALANTZIS, 1993; HALLIDAY, 1996; BARTON, HAMILTON, 1998, 2000; SHOR, 1999; ROJO, 2009; MENEZES DE SOUZA, 2011; JANKS , 2016) aim to size the development complexity of literacy practices and events that encourage, through writing, a more critical stance, allowing, in addition to language proficiency, a training that promotes the active participation of individuals in society. As a way of providing subsidies for the understanding of the relationship between language and literacy, this research is based on a corpus of 301 essays produced by 60 students who, in 2017, attended the 2nd and 3rd years of high school and college preparation courses in two private schools. The research participants were organized into two groups: Group 1, with 21 students from a school located in Campinas and; Group 2, with 39 students from a school located in Indaiatuba. Data was collected from a Textual Production Workshop organized in the schools‟ counter-shifts. The general objective of this research, based on the analysis of the corpus, is to develop pedagogical practices that allow the teaching of adequate language conventions for textual production, establishing connections between school learning and other domains of students' lives and (i) understand how the Sydney School‟s Teaching and Learning Cycle (TLC) theory (ROSE; MARTIN, 2012) and their relationship with literacy practices can help students in the development of their textual production; (ii) identify the language realizations that demonstrate compliance with the competence V required by the exam in the essay proposals based on the ENEM and (iii) understand which meanings are construed through these realizations. The theoretical and analytical perspective is based on the Systemic Functional Grammar, theorized by Halliday and Hasan (1989), Halliday (1994), Eggins (2004) and Halliday and Matthiessen (2014). Data analysis is guided by the Interpersonal Metafunction and its Modality System (HALLIDAY; MATTHIESSEN, 2014; EGGINS, 2004), specifically in the identification of the modal operators used by the students in their texts. With this panorama, the proposed analysis development covers two main levels: (i) the first level is related to literacy events and practices developed throughout the offered Workshop, from the TLC levels and stages, and its contribution to the students‟critical literacy; and (ii) the second level is related to the grammatical aspect, in which the modal operators in the texts are analyzed. For the analysis of the operators in the students' essays, AntConc‟s Concordance and Word List tools were used to quantify the modal operators‟ frequency. The results show that (i) after all the stages of CEA had been developed, there was an improvement in the students' textual production and in the presentation of social intervention proposals; (ii) students use modal auxiliary verbs, must being the most frequent, and also interpersonal metaphors (it is necessary, it is needed...) aiming to modulate the social intervention proposals and (iii) the frequency of modal operators that indicate high commitment with the intervention proposals was increased during the development of the themes, revealing that students began to adopt more critical and protagonist positions in their textual productions, confirming, as proposed by Halliday (1996), that mastering language assumes an important role in the development of literacies.

Keywords: Critical Literacy; Systemic-Functional Grammar; Modality; Sydney School‟s Teaching and Learning Cycle theory; ENEM Essay.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Cebraspe: Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos Cespe: Centro de Seleção e de Promoção de Eventos da Universidade de Brasília

EM: Ensino Médio

ENEM: Exame Nacional do Ensino Médio GSF: Gramática Sistêmico-Funcional

Inep: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira LP: Língua Portuguesa

LSF: Linguística Sistêmico-Funcional MEC: Ministério da Educação e Cultura NEL: Novos Estudos do Letramento NLS: New Literacy Studies

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Inter-relação entre Gênero, Registro e Língua 29

Figura 2 - Porcentagem de participantes por gênero (feminino e masculino) 62

Figura 3 - Porcentagem de participantes por sexo no Grupo 1. 62

Figura 4 - Porcentagem de participantes por sexo (feminino e masculino). 64

Figura 5 - Porcentagem de participantes por sexo no Grupo 2. 64

Figura 6 - Frequência do verbo auxiliar modal deve na escrita do T1 pelos alunos do colégio

de Indaiatuba 67

Figura 7 - Correlação entre evento e práticas de letramento 73

Figura 8 - Ciclo de aprendizagem do programa Reading to Learning 76

Figura 9 - Estrutura textual - Gênero Redação Enem 84

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Síntese conceitual 31

Quadro 2 - Relação teoria x corpus 32

Quadro 3 - Papéis de fala e mercadorias na interação 36

Quadro 4 - Metafunção Interpessoal no corpus 38

Quadro 5 - Matriz de Referência para Redação do ENEM – competência V 57

Quadro 6 - Planejamento semanal do Projeto Oficina Produção Textual ENEM 2017 58

Quadro 7 - Perfil geral dos alunos do Grupo 1 61

Quadro 8 - Perfil geral dos alunos do Grupo 2. 63

Quadro 9 - Quantidade de textos por tema e por versão 65

Quadro 10 - Total de tokens e types do corpus 69

Quadro 11 - Quantidade de textos escritos para cada tema 70

Quadro 12 - Média de itens lexicais - tokens - por texto 70

Quadro 13 - Questões para Preparação da Leitura 83

Quadro 14 - Elementos constituintes da proposta de intervenção social – exemplo (8) 99

Quadro 15 - Elementos constituintes da proposta de intervenção social – exemplo (9) 100

Quadro 16 - Elementos constituintes da proposta de intervenção social – exemplo (10) 100

Quadro 17 - Exemplos de verbos e metáforas modais e graus de modalidade 102

Quadro 18 - Frequência das ocorrências dos verbos auxiliares modais – GRUPO 1 105

Quadro 19 - Frequência das ocorrências dos verbos auxiliares modais – GRUPO 2 106

Quadro 20 - Uso dos modais na escrita dos temas do Grupo 1 109

(14)

Quadro 22 - Uso dos modais na escrita dos temas do Grupo 2 116

Quadro 23 - Uso dos modais na reescrita dos temas do Grupo 2 118

Quadro 24 - Número e frequência de ocorrências de metáforas de modalidade nas redações

do Grupo 1 124

Quadro 25 - Número e frequência de ocorrências de metáforas de modalidade nas redações

(15)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 1

CAPÍTULO I 6

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 6

1.1. DA ALFABETIZAÇÃO AO(S) LETRAMENTO(S) 6

1.1.1 Alfabetização, alfabetismo(s) e letramento 7

1.1.2 Práticas e eventos de letramento 11

1.1.3 Novos Estudos de Letramento e letramentos múltiplos 14

1.1.4 Letramento cívico e letramento crítico 16

1.2 A PERSPECTIVA SISTÊMICO-FUNCIONAL DE LINGUAGEM 27

1.2.1 As metafunções 33

1.3 MODALIDADE – MODALIZAÇÃO E MODULAÇÃO 39

1.3.1 Modalidade e seu papel na proposta de intervenção do ENEM 44

CAPÍTULO II 46

2.1 UMA PESQUISA QUALIQUANTITATIVA NA LINGUÍSTICA APLICADA E NA

LINGUÍSTICA SISTÊMICO-FUNCIONAL 47

2.2 UMA PESQUISA QUALIQUANTITATIVA: A PESQUISA BASEADA EM

DOCUMENTOS 50

2.3 O CONTEXTO DE PRODUÇÃO DOS DOCUMENTOS SELECIONADOS 53

2.4 A OFICINA DE PRODUÇÃO TEXTUAL 55

2.4.1 A Oficina e seu planejamento 55

2.4.2 Os alunos participantes 60

2.4.3 A constituição do corpus 65

2.5 OS PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DOS DADOS 66

CAPÍTULO III 69

(16)

3.1 EVENTO E PRÁTICAS DE LETRAMENTO CRÍTICO: O TRABALHO COM A

LÍNGUA 72

3.2 O EVENTO DE LETRAMENTO: OFICINA DE REDAÇÃO ENEM 74

3.3 AS PRÁTICAS DE LETRAMENTO NA OFICINA DE REDAÇÃO E O CICLO

DE ENSINO E APRENDIZAGEM 78

3.3.1 As atividades para as práticas de letramento 79 3.3.2 Os níveis do CEA e sua relação com as práticas de letramento 82 3.3.3 Os passos do CEA e sua relação com as práticas de letramento 89

3.4 A MODALIDADE NO CUMPRIMENTO DA COMPETÊNCIA V DO ENEM 103

3.4.1 A competência V 103

3.4.2 Os auxiliares modais na competência V 105

3.4.2.1 Modalidade: modalização e modulação 108

3.4.2.1.1 Escolhas de modalização e de modulação nos textos do Grupo 1 109 3.4.2.1.2 Escolhas de modalização e de modulação nos textos do Grupo 2 115

3.4.3 As metáforas de modalidade 121

3.5 SÍNTESE DA ANÁLISE 128

CONSIDERAÇÕES FINAIS 130

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 136

ANEXO I – PROPOSTAS DE REDAÇÃO 140

ANEXO II – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO 148

(17)

INTRODUÇÃO

As motivações deste estudo decorrem de minhas experiências como professora de redação para alunos1 do ensino médio e do incômodo que sinto, provavelmente desde que eu mesma era aluna, ao entrar em contato tanto com professores quanto com materiais didáticos para ensino da produção textual que não se preocupam em estimular um posicionamento crítico dos estudantes, mas, na maioria das vezes, apenas em lhes ensinar fórmulas para a escrita dos mais diversos gêneros textuais, desconsiderando seu contexto de produção e, também, ignorando os conhecimentos que já fazem parte do repertório dos alunos.

Em muitos casos, principalmente nas escolas particulares, essa maneira de ensinar redação é justificada pela preocupação com os vestibulares e, hoje mais ainda, com o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), já que os resultados deste permitem uma classificação das escolas de acordo com as notas obtidas em cada área do conhecimento e com a nota geral (média das notas da prova objetiva e da prova de redação).

As questões que ainda surgem durante minha prática docente são: seria possível fazer diferente? Seria possível preparar os alunos para os exames vestibulares e, ao mesmo tempo, incentivá-los ao desenvolvimento, por meio da escrita, de uma postura mais crítica, permitindo, além do domínio das regras, uma formação que promova a participação mais ativa na sociedade?

Nesse sentido, a prova de redação do ENEM pode ser considerada um importante instrumento capaz de, se ressignificada no contexto escolar, favorecer um posicionamento e uma reflexão acerca de problemas sociais apresentados pela proposta de redação mas, principalmente, presentes no contexto cotidiano do aluno. Essa possibilidade surge a partir da cobrança, pela grade de correção da redação do exame, de uma proposta de intervenção social para a questão, de caráter social, cultural, político, etc., apresentada no tema da produção, que pode ser considerada, ao menos, uma percepção de que os problemas existem e de que devemos aprender a nos posicionar acerca deles. Sendo assim, pode-se afirmar que este modelo de produção de texto parece favorecer, nas salas de aula, práticas de letramento, visto que tem a intenção de convidar professores e alunos a se aprofundarem em interrogações de conhecimento em seus contextos globais.

1

Mesmo ciente de questões de gênero, opta-se, nesta pesquisa, pelo termo “aluno(s)” para se referir aos alunos e alunas participantes do projeto Oficina de Produção Textual ENEM 2017.

(18)

Torna-se relevante destacar que, a partir desse olhar proposto para as produções de texto e para a influência que o ENEM exerce sobre as aulas de redação, o objetivo geral desta pesquisa está em

 desenvolver práticas pedagógicas que permitam o ensino de convenções de linguagem adequadas para a produção textual, estabelecendo conexões entre o aprendizado escolar e outros domínios da vida dos alunos.

A fim de alcançá-lo, foram delineados os seguintes objetivos específicos:

1. descrever como a teoria do Ciclo de Ensino e Aprendizagem (CEA) da Escola de Sydney (ROSE; MARTIN, 2012) e sua relação com as práticas de letramento podem auxiliar os alunos no desenvolvimento de sua produção textual;

2. identificar as realizações linguísticas que demonstram o cumprimento da competência V2 exigida pelo exame nas propostas de dissertação que tomam como base o ENEM;

3. analisar os sentidos construídos por essas realizações.

Partindo do cenário e dos objetivos apresentados, esta investigação segue a discussão em torno do(s) letramento(s) e, mais especificamente do letramento crítico, apontada por pesquisadores como Street (1984; 1988; 2011), Cope e Kalantzis (1993), Halliday (1996), Barton e Hamilton (1998; 2000), Shor (1999), Rojo (2009), Menezes de Souza (2011) e Janks (2016) dentre outros, que discutem letramento(s) e práticas de letramento capazes de promover, nos alunos, a percepção de seus valores e significados através do domínio da língua escrita, permitindo, como afirma Halliday (1996), que o ser letrado opere em contextos complexos e múltiplos e desenvolva a consciência da força ideológica que perpassa os registros escritos.

Visto que o domínio da língua é requisito para o desenvolvimento do letramento crítico, é relevante apresentar a concepção de linguagem, fundamentada na área da Linguística Sistêmico-Funcional (LSF) teorizada por Halliday (1994), adotada para esta pesquisa. Segundo o autor, a ordem sistêmica da gramática vem da compreensão da linguagem como um sistema de escolhas do qual o falante dispõe para produzir significados

2

A competência V da prova de redação do ENEM é descrita, na Matriz de Referência para Redação ENEM, como “elaborar proposta de intervenção para o problema abordado, respeitando os direitos humanos” (BRASIL, 2017, p. 22).

(19)

nos contextos de comunicação que melhor atendam a suas necessidades comunicativas; enquanto o princípio da funcionalidade deriva da ideia de que a linguagem é produto concreto das interações entre os participantes.

Considerando as proposições apresentadas, as seguintes questões de pesquisa norteiam este estudo:

1. Como a teoria do Ciclo de Ensino e Aprendizagem da Escola de Sydney (ROSE; MARTIN, 2012) e sua relação com as práticas de letramento podem auxiliar no desenvolvimento da produção textual dos alunos?

2. Quais escolhas lexicogramaticais demonstram o cumprimento da competência V nas propostas de dissertação que tomam como base o ENEM?

3. Quais sentidos são construídos por meio dessas escolhas?

O corpus analisado a fim de responder a essas questões é composto por 301 redações produzidas por 60 alunos que, em 2017, cursavam o 2º e o 3º ano do Ensino Médio e do curso pré-vestibular, de dois colégios particulares situados nas cidades de Campinas e de Indaiatuba, ambas no interior do estado de São Paulo. Os alunos participantes da pesquisa foram organizados em dois grupos: no Grupo 1, concentram-se 21 alunos do colégio de Campinas, enquanto no Grupo 2, 39 alunos do colégio de Indaiatuba.

A produção dos textos aconteceu a partir de três diferentes temas (cf. Anexo I):

I. O aumento da expectativa de vida como desafio no Brasil; II. Alternativas de combate à violência infantil no Brasil; III. As complexidades do combate à homofobia no Brasil.

Cada um desses temas, preparados pela professora-pesquisadora tomando por base os temas de dissertação propostos no ENEM em exames anteriores, foi apresentado aos alunos durante a Oficina de Produção Textual ENEM 2017, realizada no contraperíodo escolar. A Oficina teve duração de sete semanas, com duas aulas de 45 minutos por semana, durante as quais os temas foram apresentados e discutidos. Também foram discutidas, uma a cada aula semanal, as cinco competências3 que compõem a Matriz de Referência para as

Redações do ENEM, com foco na competência V.

3

As cinco competências exigidas pelos critérios de avaliação do ENEM são descritas no capítulo II, Quadro 9, na página 55.

(20)

O corpus com as 301 redações foi organizado eletronicamente para posterior utilização de software de análise textual, além de facilitar a identificação das escolhas lexicais realizadas pelos alunos no momento de compor a proposta de intervenção social exigida pelo exame e avaliada na competência V. É válido ressaltar que os alunos permitiram o uso de seus textos para a composição do corpus após a assinatura de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (cf. Anexo II), além de o projeto ter sido aprovado pela Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo4.

Para a apresentação da presente pesquisa, esta dissertação está organizada nos seguintes capítulos:

O capítulo I, Fundamentação Teórica, está dividido em três partes. Na primeira, é reconstituído o percurso das principais concepções de práticas de leitura e escrita que se configuraram como o escopo do conceito de letramento(s), partindo da acepção de alfabetização e alfabetismo(s) (SOARES, 2003); abordando os conceitos de alfabetismo e letramento(s) (ROJO, 2009), os Novos Estudos do Letramento (NEL)5 até chegar-se à discussão do letramento crítico, teoria que permite analisar as práticas de letramento desenvolvidas ao longo da Oficina de Produção Textual. Na segunda parte, são abordados os pressupostos teóricos oriundos da Gramática Sistêmico-Funcional (GSF), com foco na Metafunção Interpessoal e na caracterização dos elementos estruturais do gênero que compõem a redação do ENEM. Por fim, a terceira parte aborda a Modalidade, com foco na discussão em torno dos verbos auxiliares modais e das metáforas de modalidade empregados pelos alunos com a função de modalizar a apresentação das propostas de intervenção social.

O capítulo II, Metodologia da Pesquisa, está organizado em quatro seções. A primeira destina-se à abordagem qualiquantitativa adotada para esta pesquisa. Na segunda, apresenta-se o propósito da pesquisa baseada em documentos, segundo a qual deve-se recuperar um conjunto de textos, sem apartá-los de seu contexto de produção e circulação. A terceira seção trata do contexto de produção dos documentos selecionados para a composição do corpus. Na quarta, é descrita a organização e o funcionamento da Oficina de Produção Textual da qual os alunos participaram.

4

A aprovação do projeto de pesquisa no Comitê de Ética em Pesquisa da UNIFESP foi conferida sob o número 6811120217.

5

(21)

O capítulo III, Análise e Discussão dos Dados, organizado em cinco seções, centra-se na análise dos eventos de letramento e das práticas de escrita a partir dos quais os dados foram gerados, além de destinar-se à análise quantitativa e qualitativa das escolhas linguísticas realizadas pelos alunos no momento de escrita das propostas de intervenção social, por meio dos recursos Wordlist e Concordance disponíveis no AntConc 3.5.6. e quais sentidos são construídos por meio de tais escolhas. Apresenta, por fim, uma síntese da análise realizada.

Nas Considerações Finais, são retomados os principais propósitos em que se baseia a pesquisa, bem como os princípios teóricos, abordagem metodológica e aspectos da análise. Serão discutidas, também, as contribuições para o ensino de redação no Ensino Médio. Seguem-se as Referências Bibliográficas utilizadas para o estudo, bem como os Anexos, com documentos pertinentes ao curso ministrado, aos participantes e aos dados gerados.

(22)

CAPÍTULO I

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Neste capítulo, serão tecidas considerações teóricas que fundamentam a presente pesquisa. Para tanto, inicialmente mobiliza-se a noção de alfabetização e, em seguida, a acepção de alfabetismo(s), a partir de Soares (2003), e suas implicações tanto para o ensino quanto para as investigações teóricas. A seguir, a partir de Rojo (2009), diferenciam-se os conceitos de alfabetismo e letramento(s), apresentando as principais concepções de letramento(s) no Brasil desde a divulgação dos estudos de Street (1984) e outros pesquisadores que o acompanharam nos chamados Novos Estudos do Letramento (NEL), tais como Kleiman (1995), até as discussões mais recentes acerca do tema.

Posteriormente, trata-se do letramento crítico (SHOR, 1999; MENEZES DE SOUZA, 2011 e JANKS, 2016), concluindo o capítulo com a apresentação da teoria de linguagem que embasa esta pesquisa, a Linguística Sistêmico-Funcional (LSF), apoiada nas contribuições teóricas de Halliday (1994, 1996); Eggins (2004); Halliday e Matthiessen (2004, 2014) e Vian Jr. (2014), com destaque para a metafunção interpessoal e o seu sistema gramatical subjacente, a modalidade, fenômeno a ser analisado nos textos que compõem o corpus da pesquisa.

1.1. DA ALFABETIZAÇÃO AO(S) LETRAMENTO(S)

Produções escritas para exames vestibulares e para o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) são alguns eventos de letramento ancorados em práticas de letramento escolar que permeiam o cotidiano do público jovem, principalmente nos últimos anos do Ensino Médio. É importante, portanto, notar como, nessas atividades, ocorrem os usos da escrita, a fim de compreendê-los como processos inerentes à escola e suas implicações pedagógicas em termos de apropriação de linguagens e saberes pelos alunos, o que pode levar à construção de sentido para as próprias reflexões e práticas pedagógicas desenvolvidas no ambiente escolar.

(23)

Diante de tal panorama, a mobilização de análises da escrita na sua relação com a vida social e cultural torna-se de extrema importância para a compreensão de seus usos. Para isso, é imprescindível a discussão acerca do conceito de letramento(s), cuja trajetória inicial está fortemente relacionada às concepções de alfabetização e alfabetismo(s).

1.1.1 Alfabetização, alfabetismo(s) e letramento

De acordo com Magda Soares (2017, p.16), uma das primeiras pesquisadoras brasileiras a debater o assunto, na primeira edição de seu livro, de 1985, o termo alfabetização6 não ultrapassa o significado de “levar à aquisição do alfabeto”, trata-se do “processo de aquisição do código escrito, das habilidades de leitura e escrita”. De acordo com a autora, o conceito de alfabetização desenvolve-se em torno de dois pontos de vista diferentes presentes no duplo significado dos verbos ler e escrever na língua portuguesa, sendo o primeiro significado relacionado ao “domínio da ´mecânica´ da língua escrita” (SOARES, 2017, p. 17). Nesse sentido, alfabetizar relaciona-se à habilidade de codificar a língua oral em língua escrita (escrever) e decodificar a língua escrita em língua oral (ler). Sob tal perspectiva, “a alfabetização seria um processo de representação de fonemas em grafemas (escrever) e de grafemas em fonemas (ler)” (SOARES, 2017, p. 17). O método de alfabetização com ênfase nesse ponto de vista é intitulado pela autora como “método fônico”. O segundo significado dos verbos ler e escrever está associado à “apreensão e compreensão de significados expressos em língua escrita (ler) ou expressão de significados por meio da língua escrita (escrever)” (SOARES, 2017, p. 17), e constitui o “método global” de alfabetização.

Convém apontar que, para Soares (2017), as duas perspectivas apresentadas não são excludentes, já que a alfabetização envolve tanto o processo de representação de fonemas em grafemas e vice-versa, quanto o processo de compreensão/expressão de significados através do código escrito. Porém, segundo a autora, elas são apenas parcialmente verdadeiras, já que, diferentemente do que faz supor a primeira perspectiva, “a língua escrita não é mera representação da língua oral” (SOARES, 2017, p. 18), além dos problemas de compreensão/expressão da língua escrita diferirem-se dos problemas de

6

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compreensão/expressão da língua oral. Sob esse ponto de vista, Soares (2017, p.18) reitera que,

em seu sentido pleno, o processo de alfabetização deve levar à aprendizagem [...] de uma peculiar e muitas vezes idiossincrática relação fonemas-grafemas, de um outro código, que tem, em relação ao código oral, especificidade morfológica e sintática, autonomia de recursos de articulação do texto e estratégias próprias de expressão/compreensão.

Vale ressaltar ainda que ambos os métodos apresentados, fônico e global, consideram a alfabetização como um processo individual e, assim, desconsideram a natureza social da leitura e da escrita, “os determinantes sociais das funções e fins da aprendizagem da língua escrita” (SOARES, 2017, p. 19). Dessa forma, muitos indivíduos, mesmo entre aqueles considerados alfabetizados, não desenvolvem as competências para o uso da leitura e da escrita em práticas cotidianas.

Com a finalidade de medir o desenvolvimento dessas competências de uso da língua surge o conceito de alfabetismo. Acerca dele, Soares (2017) enfatiza a complexidade dos processos de leitura e de escrita e sua importância social, que se configuraram como um deslocamento importante nessa área de estudos. Todavia, considerando a diversidade tanto social quanto cultural e histórica dos diferentes contextos, a limitação de alfabetismo a um único conceito, mesmo que abrangente, mostra-se simplista e ineficaz. Em vista disso, há o desdobramento da noção de alfabetismo em níveis de alfabetismo, que medem, a partir de exames individuais e pesquisas nacionais, tanto as habilidades de leitura quanto as de escrita. Rojo (2009) afirma que os níveis de alfabetismo de cada indivíduo se desenvolvem a partir das práticas sociais de letramento exercidas nos diferentes contextos de sua vida, inclusive as práticas escolares. Sendo assim, torna-se relevante considerar o que Soares (1998) aponta acerca das mudanças sofridas pela definição de alfabetismo em função das mudanças sociais. De acordo com a autora (SOARES, 1998, p. 45-46),

à medida que o analfabetismo vai sendo superado, que um número cada vez maior de pessoas aprende a ler e a escrever, e à medida que, concomitantemente, a sociedade vai se tornando cada vez mais centrada na escrita (cada vez mais grafocêntrica), um novo fenômeno se evidencia: não basta aprender a ler e a escrever. As pessoas alfabetizam, aprendem a ler e a escrever, mas não necessariamente incorporam a prática de leitura e da escrita, não necessariamente adquirem competência para usar a leitura e a escrita, para envolver-se com as práticas sociais de escrita [...].

Uma das pesquisas que revela os níveis de alfabetismo funcional, além de habilidades matemáticas, da população brasileira é o INAF – Indicador de Alfabetismo Funcional, coordenado pelo Instituto Paulo Montenegro e pela ONG Ação Educativa. De

(25)

acordo com o INAF, os indivíduos são agrupados em uma escala de proficiência, organizada em cinco grupos de alfabetismo, conforme as habilidades que apresentam, a saber:

Analfabetos Funcionais

Analfabeto - Corresponde à condição dos que não conseguem realizar tarefas simples que envolvem a leitura de palavras e frases ainda que uma parcela destes consiga ler números familiares (números de telefone, preços etc.);

Rudimentar - Corresponde à capacidade de localizar uma informação explícita em textos curtos e familiares (como um anúncio ou um bilhete), ler e escrever números usuais e realizar operações simples, como manusear dinheiro para o pagamento de pequenas quantias ou fazer medidas de comprimento usando a fita métrica;

Funcionalmente Alfabetizados

Até a edição de 2011, este grupo era subdividido nos níveis Básico e Pleno.

A partir de 2015, buscando aprimorar a interpretação dos resultados, os respondentes passam a ser classificados em 3 níveis:

Elementar - As pessoas classificadas neste nível podem ser consideradas funcionalmente alfabetizadas, pois já leem e compreendem textos de média extensão, localizam informações mesmo que seja necessário realizar pequenas inferências, resolvem problemas envolvendo operações na ordem dos milhares, resolvem problemas envolvendo uma sequência simples de operações e compreendem gráficos ou tabelas simples, em contextos usuais. Mostram, no entanto, limitações quando as operações requeridas envolvem maior número de elementos, etapas ou relações;

Intermediário – Localizam informações em diversos tipos de texto, resolvem problemas envolvendo percentagem ou proporções ou que requerem critérios de seleção de informações, elaboração e controle de etapas sucessivas para sua solução. As pessoas classificadas nesse nível interpretam e elaboram sínteses de textos diversos e reconhecem figuras de linguagem; no entanto, têm dificuldades para perceber e opinar sobre o posicionamento do autor de um texto.

Proficientes - Classificadas neste nível estão as pessoas cujas habilidades não mais impõem restrições para compreender e interpretar textos em situações usuais: leem textos de maior complexidade, analisando e relacionando suas partes, comparam e avaliam informações e distinguem fato de opinião. Quanto à matemática, interpretam tabelas e gráficos com mais de duas variáveis, compreendendo elementos como escala, tendências e projeções.

(Disponível em: http://www.ipm.org.br/inaf, acesso em 17 de abril de 2018)

Apesar da mudança na classificação por níveis de alfabetismo do estudo realizado em 2011 para o estudo de 2016, ainda é possível perceber uma abordagem individual e cognitivista do conceito em questão, guiado pela medição de habilidades, sem explorar práticas de leitura e escrita socialmente contextualizadas. Do mesmo modo, torna-se congruente destacar aqui que o ensino da leitura e da escrita, nas duas escolas onde os dados desta pesquisa foram gerados, encontra-se alicerçado nas habilidades previstas pelo alfabetismo. Nesse sentido, a maior parte das atividades desenvolvidas sempre tiveram como principal objetivo a atribuição de notas de acordo com o cumprimento ou não dos objetivos propostos para cada atividade, levando-se em consideração, nas aulas de produção textual, os critérios de avaliação dos principais exames vestibulares do Brasil, ou seja, a avaliação da

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habilidade pela habilidade, sem que as práticas de leitura e escrita se tornassem significativas para os alunos.

Soares (2004) chama a atenção para a semelhança e a proximidade entre os conceitos de alfabetização e letramento, este último empregado no Brasil a partir da década de 1980, por Kato (1986), como tradução do termo literacy da língua inglesa, língua em que recobre ao mesmo tempo os significados de alfabetização e letramento. De acordo com Soares (2004, p. 36),

no Brasil, a discussão do letramento surge sempre enraizada no conceito de alfabetização, o que tem levado, apesar da diferenciação sempre proposta na produção acadêmica, a uma inadequada e inconveniente fusão dos dois processos, com prevalência do conceito de letramento.

Para a autora, letramento é considerado como a “imersão das crianças na cultura escrita, participação em experiências variadas com a leitura e a escrita, conhecimento e interação com diferentes tipos e gêneros de material escrito” (SOARES, 2004, p. 15). Rojo (2009, p. 98) corrobora a colocação de Soares acerca da aproximação entre os termos alfabetismo e letramento, afirmando que ambos “recobriram significados muito semelhantes e próximos, sendo, por vezes, usados indiferentemente ou como sinônimos nos textos”. Todavia, a autora (ROJO, 2009, p. 98) chama a atenção para a distinção entre os dois conceitos:

o termo alfabetismo tem um foco individual, bastante ditado pelas capacidades e competências (cognitivas e linguísticas) escolares e valorizadas de leitura e escrita (letramentos escolares e acadêmicos), numa perspectiva psicológica, enquanto o termo letramento busca recobrir os usos e práticas sociais de linguagem que envolvem a escrita de uma ou de outra maneira, sejam eles valorizados ou não valorizados, locais ou globais, recobrindo contextos sociais diversos (família, igreja, trabalho, mídias, escola, etc.), numa perspectiva sociológica, antropológica e sociocultural.

Tal distinção ganha força no Brasil a partir das publicações de Kleiman (1995), para quem letramento é “um conjunto de práticas sociais que usam a escrita como tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos” (KLEIMAN, 1995, p. 18-19). De acordo com a autora, mesmo sem ser alfabetizado, um sujeito participa de eventos do mundo da escrita e, assim, pode ser considerado letrado, já que o conhecimento da cultura escrita acontece independentemente da alfabetização. Exemplos dessa situação podem ser observados quando uma pessoa não alfabetizada, que não saber ler, precisa tomar um ônibus para levá-la a algum lugar, ou mesmo quando discute com outras pessoas assuntos relacionados a acontecimentos ao redor do mundo.

(27)

Para esta pesquisa, mesmo tratando de práticas letradas no final do Ensino Médio, a discussão acerca da diferença entre alfabetismos e letramentos ainda permanece essa mesma já apresentada, que permeia o Ensino Fundamental, visto que grande parte dos professores do Ensino Médio, e mesmo dos cursos pré-vestibular, continuam ensinando a produção de textos a partir de “fórmulas” a fim de aumentar as chances de aprovação dos alunos em exames vestibulares e no ENEM. Nesse contexto, o que se trabalha na escola, bem como em muitas provas oficiais que medem a qualidade do ensino no país, como a Prova Brasil e o ENEM por exemplo, são os alfabetismos, ou seja, práticas de leitura e escrita valorizadas, ignorando as diversas possibilidades de desenvolvimento de atividades mais significativas, capazes de promover o letramento dos alunos a partir de conhecimentos variados e diferenciados que eles já possuam. Assim, o que este trabalho propõe, ao longo de sua execução, é a tentativa de mostrar que é possível desenvolver nos alunos as habilidades e competências necessárias para que eles sejam aprovados nos exames de ingresso para o curso superior, ao mesmo tempo em que se promovem práticas e eventos de letramento mais significativos, considerando o desenvolvimento dos alunos como cidadãos protagonistas.

1.1.2 Práticas e eventos de letramento

A concepção de letramento defendida por Kleiman tem como base os Novos Estudos do Letramento (NEL), inaugurados por Street (2003). De acordo com o autor (STREET, 2003, p.1), os NEL integram um campo de pesquisa que

representa uma nova visão da natureza do letramento que escolhe deslocar o foco dado à aquisição de habilidades, como é feito pelas abordagens tradicionais, para se concentrar no sentido de pensar o letramento como uma prática social. Isso implica o reconhecimento de múltiplos letramentos, variando no tempo e no espaço, e as relações de poder que configuram tais práticas. Os NLS [NEL], portanto, não tomam nada como definitivo no que diz respeito ao letramento e às práticas sociais a ele relacionadas, preferindo, ao contrário, problematizar o que conta como letramento em um espaço e tempo específicos e questionar quais letramentos são dominantes e quais são marginalizados ou resistentes.

Essa nova perspectiva de estudo do letramento apresenta princípios e pressupostos teóricos importantes para a compreensão do fenômeno, dentre eles duas perspectivas do letramento denominadas modelo autônomo e modelo ideológico, apresentadas pela primeira vez por Street (1984).

(28)

Nessa obra, Street afirma que o modelo autônomo caracteriza-se pelo fato de abordar o letramento como uma realização individual, cujo foco concentra-se no indivíduo, que adquire a habilidade, na maioria das vezes, dentro de um contexto educacional e não em um contexto social mais amplo no qual o indivíduo atua. O autor (STREET, 2001, p. 7) evidencia que

o „modelo autônomo de letramento‟ funciona a partir do pressuposto de que o letramento „per se‟ – autonomamente – terá efeitos em outras práticas sociais e cognitivas. Entretanto, esse modelo, levando a crer que tais práticas são neutras e universais, na verdade mascara e silencia as questões ideológicas que a elas são subjacentes.

A questão que perpassa o modelo autônomo de letramento é a total desconsideração da natureza social bem como do caráter plural das práticas de letramento. Ademais, esse modelo assume uma orientação que resulta em um controle da subjetividade das diversas manifestações sociais do letramento com a escrita, levando à ideia de que a escrita estaria resumida a uma das formas de letramento, o letramento pedagógico (MARCUSCHI, 2001, p. 15). Frente a esse modelo de pensamento, a escola trabalharia as atividades de leitura e de escrita como individuais, psicológicas, neutras e universais, independentes dos determinantes culturais e das estruturas de poder que as constituem no contexto social. Acerca disso, Pahl e Rowsell (2005, p. 3) afirmam que “a noção de letramento como decodificação e codificação, sem levar em conta os seus contextos de usos, desvirtua a complexa natureza da leitura e da escrita”7. Sob o ponto de vista do modelo

autônomo de letramento, haveria uma separação entre oralidade e escrita, alimentando a ideia de que esta abarca maior poder em detrimento da primeira.

Por outro lado, o modelo ideológico apresentado por Street (1984; 1995; 2001; 2003) assume uma perspectiva sociocultural do letramento e considera que as práticas sociais variam de um contexto para outro, além de se transformarem no decorrer de momentos históricos determinados. Diferentemente do modelo autônomo de letramento, o modelo ideológico parte do princípio de que o letramento não é, meramente, uma habilidade técnica e neutra, mas sim uma prática social; as abordagens com que os indivíduos utilizam a escrita são resultados de suas próprias concepções de aprendizagem, identidade e existência pessoal; outrossim, todas as práticas de letramento são aspectos das estruturas de poder em uma sociedade, além da cultura.

7

No original: Literacy as decoding and encoding without consideration of context belies the comple x nature of

(29)

Em síntese, as concepções e práticas de leitura e escrita, nesse modelo, aludem a contextos sociais e culturais específicos, corroborando com a posição de Barton e Hamilton (1998; 2000) de que existem diferentes letramentos associados a diferentes competências da vida. Nesse sentido, ainda que bastante influenciado pela escrita, esse modelo não desconsidera a oralidade e leva em consideração as estratégias de escrita veiculadas na fala, como a contação de histórias, evento de letramento presente em diferentes culturas. Heath (1982, p. 93), que primeiro usou o conceito de eventos de letramento em seus trabalhos socioantropológicos, define o termo como

qualquer sequência de ação, envolvendo uma ou mais pessoas, na qual a produção e/ou compreensão do texto impresso desempenha uma função... um evento de letramento apresenta certas regras de interação e exige competências interpretativas particulares por parte dos participantes. Alguns aspectos de leitura e/ou de escrita são exigidos de ao menos uma das partes, e certos tipos de eventos de fala são apropriados dentro de certos eventos de letramento.8

Ancorados nos trabalhos de Heath (1982) e de Street (1984; 1988), Barton e Hamilton (2000 [1998]) definem eventos de letramento como atividades em que a escrita assume um papel; episódios observáveis que resultam de práticas e são moldados por essas mesmas práticas. As práticas de letramento, por outro lado, são formas gerais de cultura, vivências que ancoram os usos da modalidade escrita e por meio das quais os indivíduos interagem durante suas vidas. Contudo, essas práticas, por envolverem valores, atitudes, sentimentos e relações sociais, não são unidades observáveis de comportamento.

Sob esse ponto de vista, as práticas de letramento instituem processos intrassubjetivos derivados de processos intersubjetivos, abarcando cognições compartilhadas, representadas em ideologias e identidades sociais. Assim, as práticas são melhor compreendidas como vivências derivadas das relações entre indivíduos dentro de grupos e comunidades do que como um conjunto de propriedades presentes no universo individual.

É importante destacar que a distinção entre eventos e práticas de letramento é de ordem teórica, visto que são conceitos interligados. Street (2001, p. 11) afirma que “o conceito de evento de letramento dissociado do conceito de prática de letramento não ultrapassa o nível da descrição”, ou seja, o conceito de evento de letramento considerado isoladamente não permite revelar como os sentidos e os significados, produtos da situação e

8

No original: Any action sequence, involving one or more persons, in which the production and/or

comprehension of print plays a role... a literacy event has certain interactional rules and demands particular interpretive competencies on the part of participants. Some aspects of reading and/or writing are required by at least one party, and certain types of speech events are appropriate within certain literacy events.

(30)

de suas características específicas, bem como das convenções e concepções de natureza cultural e social, são construídos. Sendo assim, é o conceito de práticas de letramento que leva à interpretação do evento de letramento para além de uma simples descrição.

Para esta pesquisa, ambos os conceitos – práticas e eventos de letramento – são importantes, já que as produções textuais que compõem o corpus para análise expressam modos (ou modelos) culturais de emprego do(s) letramento(s) associados ao letramento escolar. Nesse sentido, as produções dos participantes da pesquisa são práticas de letramento, na concepção de Barton (2000), que representam os modos ou meios como cada grupo se apropria dos usos do(s) letramento(s) em cada evento de letramento.

Os modelos de letramento autônomo e letramento ideológico são, posteriormente, em contextos cada vez mais particulares de usos da escrita, repensados por Street (1996; 2003) e também por Gee (1991).

1.1.3 Novos Estudos de Letramento e letramentos múltiplos

No processo de repensar os modelos de letramento autônomo e de letramento ideológico, Street (2003), declara que a noção de letramentos múltiplos já se fazia presente nas noções formuladas anteriormente de letramento autônomo e letramento ideológico, visto que já consideravam letramentos no plural. Citando obras anteriores (STREET, 1985; 1996) e autores como Gee (1991), Street afirma que os NEL embasam-se em uma nova tradição, guiada pelo modelo ideológico de letramento. Esse novo modo de pensar os letramentos, subentende o reconhecimento de múltiplos letramentos presentes em diferentes momentos, diferentes espaços e em relações de poder também diferenciadas, assim, a partir de uma abordagem etnográfica, identificando letramentos dominantes e letramentos marginalizados. O acentuado debate de teorias sociais sobre poder, identidade e intertextualidade, além de uma forte preocupação com a educação, formal e informal, e o desenvolvimento de propostas práticas para intervenções na educação regular constituem outra marcante característica dos NEL.

Com o principal objetivo de relacionar as experiências das crianças com os letramentos emergentes de seus meios culturais ao aprendizado escolar e à comutação das práticas de letramento necessárias em diferentes contextos, Hull e Schultz (2001),

(31)

encontram-se entre os primeiros pesquisadores a aplicar no campo educacional os propósitos e pesquisas dos NEL. Em seus estudos, as autoras construíram descrições fundamentais de eventos de letramento fora da escola e práticas desenvolvidas dentro dos NEL, direcionando o olhar para as relações entre o dentro e o fora do ambiente escolar, a fim de que os NEL não sejam interpretados como interessados apenas em letramentos locais e de resistência. Nesse contexto, o estudo promovido pelas autoras apontou uma divisão entre os letramentos do cotidiano das crianças fora da escola e os letramentos trabalhados na escola, separação que leva, em tese, ao não envolvimento dos alunos com as práticas escolares propostas e culmina na não aprendizagem dos conteúdos escolares. As pesquisadoras apontam também para a tensão no contexto escolar ao não envolver a vida prática dos alunos e ao abordar conhecimentos que sequer podem ser aplicados nas suas práticas cotidianas.

Humphrey (2009), fundamentando sua pesquisa em perspectivas teóricas sobre adolescentes e suas práticas de letramento, e baseando-se em autores como Bernstein (1990), Gee (2000; 2005), Vromen (2003) e Martin (2000; 2006), corrobora os apontamentos de Hull e Schultz (2001) e argumenta que os adolescentes contemporâneos envolvem-se em um amplo conjunto de práticas de letramento que nem sempre são reconhecidas por seus professores e que, por isso, há a necessidade de reconhecer e celebrar práticas de letramento associadas a uma participação bem-sucedida na aprendizagem além da escola. Para a autora, existe a necessidade de compreender tanto a relação dos jovens com a sociedade quanto as dimensões discursivas da participação dos adolescentes na esfera cívica, buscando explicitar os recursos semióticos cruciais para essa participação. Além disso, Humphrey (2009) chama a atenção para o fato de que muitos jovens são ativamente engajados em cidadania participativa, embora seus modos de engajamento sejam diferentes daqueles valorizados pelos adultos e, muitas vezes, desvalorizados por não se limitarem à manutenção do status quo institucionalizado.

A importância do contexto sociocultural mais amplo das práticas de letramento dos adolescentes é cada vez mais reconhecida na pesquisa sobre letramento, e pesquisadores da área advertem que, ao concentrar-se demais nas práticas de letramento escolar dos adolescentes, corre-se o risco de perder muito das “particularidades da vida letrada”9

(PHELPS, 1998, p.1) e pode-se excluir grupos particulares de alunos.

9

(32)

Frente a esse contexto, um tema comum a esta pesquisa é a intenção de oferecer aos alunos a oportunidade de estabelecer conexões entre seu aprendizado escolar e outros domínios de sua vida e, para isso, desenvolver práticas pedagógicas que permitam o ensino explícito das convenções de linguagem adequadas para a produção de textos. Neste ínterim, o trabalho com dissertações que seguem o modelo da prova de produção textual do ENEM permite que os alunos envolvam-se criticamente com questões de interesse não apenas global, mas que, na maioria das vezes, permeiam seu cotidiano, demonstrando que os limites entre os domínios pessoal, acadêmico e público não são necessariamente impenetráveis, além de permitir o desenvolvimento de habilidades e competências consideradas necessárias para a participação cívica, tal como a consciência da importância da dimensão interpessoal do uso da linguagem em convencer o leitor a corroborar sua posição, mesmo que ele, no início, não partilhe do mesmo posicionamento. Nesse sentido, Elias (2016) chama a atenção para o fato de que o ato de argumentar “constitui o ato linguístico fundamental”, visto que é a partir dele que se busca a adesão do interlocutor, sem cancelar o diálogo e a subjetividade. Esse ato faz-se prefaz-sente no dia a dia dos indivíduos, em situações que vão das mais simples, desde diálogos com amigos, por exemplo, durante os quais é necessário defender um posicionamento, até situações mais formais, como a produção textual exigida pelo ENEM e por outros vestibulares, nas quais se espera que o candidato desenvolva bem seus argumentos na escrita com atenção aos critérios de avaliação de cada exame.

1.1.4 Letramento cívico e letramento crítico

Esta capacidade de tornar explícitos recursos linguísticos e estabelecer conexões com importantes práticas de letramento da vida cotiadiana está na base do trabalho com o letramento crítico, que, nas palavras de Jesus e Carbonieri (2016, p. 13), “observa a linguagem no seu processo social e cultural, ampliando o exercício da cidadania”. Janks (2016, p. 22) afirma que “a língua e a forma como ela é usada estão no centro do que significa fazer letramento crítico.[...] Quando nós a usamos, produzimos textos orais e escritos para outros inferirem os sentidos que procuramos elaborar”. Isso permite pensar que os textos não são neutros, ao contrário, são parciais tanto porque retratam apenas parte de uma história, quanto porque refletem o ponto de vista apenas do produtor do texto, ou seja, “os textos são situados e trabalham para posicionar seu público-leitor” (JANKS, 2016, p. 23).

(33)

Justamente por serem parciais, cabe aos produtores de textos, ao longo do processo de representação do mundo, realizar escolhas lexicogramaticais, decidir em que tempo e modo verbal empregarão os verbos, se estabelecerão ligações entre as sentenças ou se as deixarão separadas. De acordo com Janks (2016, p. 24), essas escolhas

sinalizam que os textos escritos e falados são construídos com base num leque de possíveis opções linguísticas. Algo que tenha sido construído pode ser igualmente desconstruído. Esse processo de desfazer e desconstruir o texto aumenta nossa consciência acerca das escolhas que o enunciador faz. Toda escolha situa, no primeiro plano, o que foi selecionado e esconde ou oculta aquilo que não o foi. Se focalizarmos as seleções, teremos oportunidade de observá-las e pensar sobre seus efeitos.

Halliday (1996, p. 346) afirma que o escritor/autor está presente nas características atitudinais do léxico, “em palavras que indicam 'o que eu aprovo/desaprovo'; e, mais perceptível, na rede de sistemas interpessoais que compõem a modalidade”10. Segundo o

autor, em linguagem, modalidades – expressões de probabilidade, obrigação e afins – são o modo gramatical de expressar o julgamento do falante ou do escritor, sem tornar explícita a primeira pessoa do discurso (eu). Nesse sentido, por exemplo, quando um aluno apresenta como proposta de intervenção social, em sua redação, que “o governo deve disponibilizar psicólogos gratuitos em postos de saúde”11, isso assume o significado “penso que o governo

disponibilize psicólogos gratuitos em postos de saúde”. Modalidades, segundo Halliday (1996, p. 346), “nunca expressam o julgamento de terceiros. Elas podem ser apresentadas como despersonalizadas, ou objetivadas, especialmente na linguagem escrita, mas todas são, em última instância, manifestações do que 'eu penso'”12.

De acordo com Halliday (1996), a condição para ser letrado é que haja o domínio da língua escrita, o que significa dizer que o indivíduo está efetivamente empregando os padrões lexicogramaticais associados ao texto escrito, seja consciente ou inconscientemente. Isso implica que ele pode entender e fazer uso dos escritos, diferenciá-los dos padrões típicos da linguagem falada, além de reconhecer suas funções e seu valor na cultura. Outra característica do ser letrado apontada pelo autor é a consciência da força ideológica dos registros escritos, em outras palavras, estar ciente de como a sociedade é construída a partir do discurso, ou ainda da dialética entre o discursivo e o material.

10

No original: in words which signal 'what I approve / disaprove of '; and, most conspicuously, in the network of

interpersonal system that make up modality. 11

Fonte: dados da pesquisa.

12

No original: Modalities never express the judgment of some third party. They may be presented as

depersonalized, or objetified, especially in written language, but all are ultimately manifestations of what 'I think'.

(34)

Nesse contexto, pode-se afirmar que as escolhas feitas pelos produtores de textos jamais são neutras. A depender da situação de comunicação, elas podem ser ora deliberadas, ora insconscientes. Assim, em situações planejadas de comunicação, como um discurso político ou uma peça publicitária, essas escolhas são cuidadosamente pensadas, levando-se em consideração os prováveis efeitos que serão produzidos. Já em situações nas quais o foco é aquilo que se tem a comunicar e não há tempo para ponderar todas as alternativas disponíveis, como quando se fala com alguém, é como se as opções se fizessem escolher, do contrário, a comunicação não seguiria a rapidez do fluxo conversacional. Essa situação faz com que “o senso comum de pensar sobre o mundo próprio de nossas comunidades se reflita na produção dos textos que criamos. Esses textos são socialmente construídos em nossa sociedade” (JANKS, 2016, p. 25). Nesse sentido, os textos podem ser designados como discursos, ou seja, vinculações feitas com valores, crenças e práticas sociais. Janks (2016) afirma ainda que tanto a decisão sobre quem tem o direito de falar e agir em diferentes situações, quanto a escolha de quem é ouvido quando fala ou se faz notar no curso de uma ação são afetadas pelas diferenças de identidade e poder. São essas mesmas diferenças que afetam as escolhas linguísticas adequadas ou inadequadas a cada situação, exercendo influências nas oportunidades e possibilidades de vida das pessoas.

Por outro lado, a autora defende que a língua pode também ser utilizada para desafiar os modos como as coisas são, já que as pessoas podem provocar mudanças ao trabalhar em conjunto e ao se recusar a consentir. Segundo Janks (2016), a criticidade e a preocupação com a política de significados é o que torna o letramento desafiador. A autora (JANKS, 2016, p. 31) cita a obra de Freire (1972) para afirmar que

desde o início, a alfabetização crítica era vista como uma forma de libertação dos sujeitos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem. Se ele pudesse ensinar seus alunos adultos a reconhecer como seu mundo tinha sido construído e, ainda, se pudesse ajudá-los a ver que a maneira de nomear as coisas era opressiva, então, eles poderiam libertar-se, renomeando seu mundo. À luz dessa perspectiva, o ato de ler inclui a leitura sobre o mundo, a fim de mudá-lo. Assim, a transformação social que se esforça para alcançar a equidade e igualdade está no centro da perspectiva do letramento crítico.

Os estudos de Cope e Kalantzis (1993) também apontam para essa questão, afirmando que parte do processo de desenvolvimento de um letramento crítico envolve o reconhecimento da diversidade de formação cultural e linguística dos estudantes, dessa forma, um ensino eficaz constitui-se no diálogo entre a cultura e os discursos da escola e dos alunos. Nesse contexto, é atribuído à escola o papel de tornar explícita a natureza do letramento, a fim de fornecer a grupos historicamente marginalizados de estudantes acesso à cultura letrada e a

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