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O direito ao esquecimento e a ressocialização do condenado tcc asassunção

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Academic year: 2018

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(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE DIREITO

ADAÍZE DE SOUSA ASSUNÇÃO

O DIREITO AO ESQUECIMENTO E A RESSOCIALIZAÇÃO DO CONDENADO

FORTALEZA

(2)

ADAÍZE DE SOUSA ASSUNÇÃO

O DIREITO AO ESQUECIMENTO E A RESSOCIALIZAÇÃO DO CONDENADO

Monografia apresentada ao Curso de

Graduação em Direito da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como parte dos requisitos para obtenção do Título de Bacharel em Direito.

Área de concentração: Direito Penal.

Orientador: Prof. Me. Raul Carneiro

Nepomuceno

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

A851d Assunção, Adaíze de Sousa.

O direito ao esquecimento e a ressocialização do condenado / Adaíze de Sousa Assunção. – 2015.

69 f.; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2015.

Área de Concentração: Direito Penal.

Orientação: Prof. Me. Raul Carneiro Nepomuceno.

1. Personalidade (Direito) - Brasil. 2. Reabilitação de criminosos - Brasil. 3. Liberdade de Imprensa - Brasil. 4. Pena (Direito) – Brasil. I. Nepomuceno, Raul Carneiro (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.

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ADAÍZE DE SOUSA ASSUNÇÃO

O DIREITO AO ESQUECIMENTO E A RESSOCIALIZAÇÃO DO CONDENADO

Monografia apresentada ao Curso de

Graduação em Direito da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como parte dos requisitos para obtenção do Título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Penal.

Aprovada em ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________ Prof. Me. Raul Carneiro Nepomuceno (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

___________________________________________ Prof. Dr. Gustavo César Machado Cabral

Universidade Federal do Ceará (UFC)

___________________________________________ Mestrando Francisco Tarcísio Rocha Gomes Júnior

(5)

A Deus, por guiar todos os meus passos.

Aos meus pais, Jehovah e Adaíle, por serem

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AGRADECIMENTOS

A Deus pelo dom da vida, pela misericórdia infinita e por ser minha fortaleza diante de todas as dificuldades enfrentadas.

À Nossa Senhora de Fátima por sua constante intercessão e proteção.

Ao meu orientador, Professor Raul Nepomuceno, por sua admirável dedicação ao magistério e a esta Faculdade de Direito, por sua paciente e cuidadosa orientação e por cada sugestão e aconselhamento feitos ao longo da elaboração desta monografia, que foram imprescindíveis para o aprimoramento do presente trabalho.

Ao Professor Gustavo Cabral e ao Mestrando Tarcísio Rocha Júnior, por terem sido bastante solícitos e aceitado prontamente meu convite para participarem da Banca Examinadora deste trabalho de conclusão de curso.

À minha amada mãe, Adaíle Assunção, por estar presente em todos os momentos de minha vida, por sua paciência diante das situações mais difíceis, por seu amor que acalma e sua fé inabalável.

Ao meu querido pai, Jehovah Assunção, por seu amor incondicional, sua

constante dedicação à família, sua proteção que tanto tranquiliza e por sempre acreditar em mim e nos meus sonhos.

Ao meu irmão, Célson Neto, por seu carinho e companheirismo.

Às minhas queridas avós, Rosalina e Ilêda, pelo exemplo de mulher que representam; e ao meu avô, Adairton Sousa, por sempre transmitir a confiança de que tudo daria certo.

À minha tia Rosijane Assunção, por sua disponibilidade em sempre me ouvir, me aconselhar e me motivar a lutar ainda mais pelos meus sonhos, mesmo quando eles parecem inalcançáveis.

Aos meus tios, Adriana, Helton, Regisleda e Regislane, por terem contribuído ativamente para a concretização deste sonho.

Ao meu primo, Hélder Assunção, por sua companhia diária, por sua amizade e por todos os risos compartilhados.

(7)

À Ionara Carvalho, Mayara Ribeiro, Luana Carvalho, Juliana Oliveira e Thayanne Alves pela amizade de sempre, e que, embora tenhamos seguido caminhos diversos e os encontros não serem mais tão freqüentes, ela se fortifique e perdure ao longo dos anos.

À Carolina Galvão e à Thaís Viana pela amizade construída ao longo desta graduação, por todos os momentos divertidos que passamos juntas, pelo ombro amigo, pelo carinho de todos os dias, pelas inúmeras conversas que sempre me acalmaram, enfim, obrigada por fazerem parte da minha vida. Sem sombra de dúvidas, vocês são mais que amigas, são verdadeiras irmãs que a Faculdade de Direito me proporcionou.

À Claudiane Duarte, por sua bondade, por sua dedicação ao curso e, é claro, por seu sorriso inconfundível e contagiante, que tanto nos alegra.

À Ana Renata e ao Carlos Henrique, por serem exemplos de determinação na luta pela concretização de seus objetivos.

À Mariana Costa e à Isabelly Damasceno, pela amizade, por serem sempre muito solícitas e estarem constantemente dispostas a ajudar.

Ao Pedro Philippe e ao Thiago Gurgel pelas divertidas caronas e conversas durante o percurso para a faculdade.

A todos os servidores e estagiários da 16ª Vara da Justiça do Trabalho e da 5ª Vara da Justiça Federal, por terem sido uma segunda família no transcorrer da minha vida acadêmica e me proporcionarem conhecimentos práticos que somente o estágio é capaz de oferecer.

À Universidade Federal do Ceará e, de um modo especial, ao Curso de Direito, pelas oportunidades proporcionadas e pela aprendizagem adquirida ao longo destes cinco anos de formação acadêmica.

Ao Núcleo de Estudos em Ciências Criminais (NECC), por ter me motivado ainda mais a estudar e ampliar meus conhecimentos na área criminal.

Aos colegas da Turma de Direito 2015.1 pela troca de experiências e conhecimentos ao longo de toda a graduação.

Enfim, a todos que, mesmo indiretamente, ajudaram não só na elaboração deste trabalho, mas também na concretização de mais esse sonho, tornar-me bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará, e que este seja apenas o começo de uma próspera e brilhante jornada.

(8)

“Mesmo que não possamos adivinhar o tempo que virá, temos ao menos o direito de

imaginar o que queremos que seja.”

(9)

RESUMO

O direito ao esquecimento, pautando-se na ideia de regenerabilidade da pessoa humana e

afirmando-se verdadeiramente como um direito à esperança, é invocado como meio de

preservar a privacidade, imagem e honra do individuo, garantindo que acontecimentos indesejados do passado não sejam relembrados e vivificados na memória das pessoas, para que, assim, a ressocialização do ex-apenado não seja prejudicada. A mídia, justificando sua atuação no direito à liberdade de imprensa e de informação, tem se tornado cada vez mais invasiva na vida particular das pessoas o que acarreta a violação de diversos direitos personalíssimos, inclusive o próprio direito ao esquecimento. O direito à liberdade de imprensa e de informação, bem como o direito ao esquecimento, são princípios de direitos fundamentais, o que acarreta a necessidade de realizar um juízo de proporcionalidade quando ocorrer conflito entre eles. O presente trabalho objetiva indicar algumas ponderações que devem ser realizadas diante de um conflito para saber se será o direito ao esquecimento ou o de liberdade de imprensa e de informação que prevalecerá no caso concreto, e de que modo tal prevalência afeta a ressocialização do condenado. A metodologia utilizada consistiu na

leitura e análise de livros, artigos científicos, monografias, dispositivos constitucionais e infraconstitucionais, revistas e, também, de julgados internacionais e brasileiros que abordaram o tema.

Palavras-chave: Direito ao esquecimento. Ressocialização. Direito à liberdade de imprensa e

(10)

ABSTRACT

The right to be forgotten, basing on the regenerability of idea of the human person and asserting itself truly as a right to hope, is invoked as a means of preserving privacy, image and honor of the individual, ensuring that unwanted events of the past are not remembered and alive in people's memories, for what, so, the rehabilitation of ex-convict is not impaired. The media, justifying its action in the right to freedom of press and information, has become increasingly intrusive in people's private lives which leads to violation of various personality rights, including his own right to be forgotten. The right to freedom of press and information, as well as the right to be forgotten, are principles of fundamental rights, which implies the need for a judgment of proportionality when there is conflict between them. This paper aims to indicate some considerations that must be performed before a conflict to whether it will be the right to be forgotten or the freedom of press and information that will prevail in the concrete case and how such prevalence affects the rehabilitation of the convict. The methodology consisted of the reading and analysis of books, journal articles, monographs, constitutional and infra devices, magazines and also international and Brazilian judged that

addressed the issue.

Keywords: Right to be forgotten. Resocialization. Right to freedom of press and information.

(11)

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 12

2. DA PENA ... 15

2.1 Evolução histórica da pena ... 15

2.2 Teorias sobre a pena ... 18

2.2.1 Teorias absolutas ... 18

2.2.2 Teorias relativas ... 20

2.2.2.1 Prevenção Geral ... 20

2.2.2.2 Prevenção Especial ... 21

2.2.3 Teoria mista ... 22

2.3 A execução da pena no Brasil ... 24

2.3.1 O ideal ressocializador ... 25

2.3.2 O estigma de criminoso e a reincidência ... 27

2.3.3 O instituto da reabilitação ... 29

3. NOÇÕES PRELIMINARES SOBRE O DIREITO AO ESQUECIMENTO ... 33

3.1 Análise conceitual ... 33

3.2 O direito ao esquecimento no contexto internacional ... 36

3.2.1 Caso Melvin vs. Reid ... 36

3.2.2 Caso Lebach ... 37

3.3 Aplicação no direito brasileiro ... 38

3.3.1 Enunciado 531 do CJF ... 39

3.3.2 Caso Aída Curi ... 40

3.3.3 Caso Chacina da Candelária ... 42

4. O DIREITO AO ESQUECIMENTO DO CONDENADO ... 46

4.1 O direito ao esquecimento como um direito fundamental da personalidade ... 46

4.1.1 Dos direitos fundamentais ... 46

4.1.1.1 Efeitos dos direitos fundamentais ... 48

4.1.1.2 Características dos direitos fundamentais ... 50

(12)

4.1.3 Classificação do direito ao esquecimento como um direito fundamental da

personalidade ... 54

4.2 Direito ao esquecimento do condenado vs. Direitos à liberdade de imprensa e de informação ... 56

4.2.1 Colisão de direitos fundamentais ... 57

4.2.2 A máxima da proporcionalidade e a solução para a colisão de princípios ... 59

5. CONCLUSÃO ... 64

(13)

1. INTRODUÇÃO

O direito ao esquecimento, no Brasil, é conhecido desde os anos 90, mas,

recentemente, tem sido amplamente debatido em decorrência do julgamento de dois Recursos

Especiais pelo Superior Tribunal de Justiça nos casos que ficaram conhecidos como “Caso

Chacina da Candelária” e “Caso Aída Curi”.

Além do mais, foi de grande relevância para sua maior divulgação a aprovação do Enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil, promovido pelo Conselho de Justiça Federal, que, considerando a sociedade da informação que se apresenta atualmente, incluiu o direito ao

esquecimento como necessário à proteção da dignidade da pessoa humana.1

O direito ao esquecimento se manifesta como um meio de proteger a privacidade, a honra e a imagem do indivíduo diante da atuação da mídia, de forma a garantir que fatos pretéritos, geralmente causadores de más recordações, não sejam relembrados publicamente, pois a pessoa tem o direito de ter seu passado esquecido pela sociedade.

É importante destacar o pensamento de Anderson Schreiber2 acerca do tema, pois

segundo ele, o direito ao esquecimento não atribui a ninguém o direito de apagar fatos ou reescrever a História, mas sim garante a possibilidade de se discutir o uso que é dado aos fatos pretéritos, mais especificamente o modo e a finalidade com que são lembrados.

Considerando o direito ao esquecimento a partir de um viés penalista, pode-se afirmar, sem dúvidas, que seu reconhecimento está intimamente relacionado com a busca da efetivação do ideal ressocializador da pena, pois seria impossível atingir uma ressocialização

do condenado ao meio social se constantemente fosse relembrado publicamente o crime por ele cometido, o que criaria um verdadeiro estigma de criminoso.

O que se verifica, atualmente, é uma constante evolução tecnológica e a formação de uma mídia cada vez mais invasiva na vida privada das pessoas, a qual agindo, por vezes, de forma sensacionalista, dificulta a ressocialização do condenado, que, apesar de já ter cumprido sua pena, continua tendo sua imagem publicamente associada ao crime praticado. Diante dessas situações, o direito ao esquecimento é invocado como meio de preservar a privacidade do indivíduo e garantir que não sejam relembrados acontecimentos passados que, na verdade, busca-se esquecer.

Considerando essa atuação midiática cada vez mais sensacionalista ao tratar de crimes pretéritos, resultando, por vezes, no desrespeito a diversos direitos personalíssimos e à

1 BRASIL. Conselho da Justiça Federal. Enunciados aprovados na VI jornada de direito civil. Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/cjf/CEJ-Coedi/jornadas-cej/vijornada.pdf>. Acesso em 09 maio de 2015.

2

(14)

própria ressocialização do condenado, surgiu o interesse em estudar de que forma o direito ao esquecimento pode ser invocado pelo ex-apenado para minorar os prejuízos advindos dessas publicações, o qual já, tendo cumprido pena, deseja retornar ao convívio em sociedade.

No primeiro capítulo, será apresentada uma evolução histórica da pena desde o período em que ela era aplicada ao infrator como uma forma de vingança individual, divina ou pública pelo crime cometido até chegar à sua forma humanitária, que é a utilizada atualmente. Será feita também uma abordagem acerca das teorias que buscam explicar a finalidade da pena, apresentando, os prós e os contras de cada uma delas.

Além disso, realizar-se-á comentários acerca da execução da pena no Brasil, de modo a expor o seu ideal ressocializador, fazendo uma abordagem crítica sobre sua

efetividade, também será explicada a teoria do labelling approach de modo a considerar os

fatores que provocam a reincidência do ex-apenado e, ainda, será explanado o instituto da reabilitação e art. 202 da LEP, que, na verdade, representam indícios legais que justificam a aplicação do direito ao esquecimento.

No segundo capítulo, será realizada uma análise conceitual do direito ao esquecimento, será feita uma abordagem de tal direito no contexto internacional, apresentando

casos de grande repercussão. Ainda far-se-á uma exposição da aplicação do direito ao esquecimento no Brasil, relatando a importância do Enunciado 531 da VI Jornada de Direito

Civil, promovido pelo Conselho de Justiça Federal, do “Caso Chacina da Candelária” e do

“Caso Aída Curi”.

No terceiro capítulo, serão apresentadas explicações acerca dos direitos fundamentais e dos da personalidade, expondo as características de cada um para, em seguida, classificar o direito ao esquecimento como um direito fundamental da personalidade.

A partir dessa classificação, será feita uma exposição acerca da possibilidade de conflito entre ele e o direto á liberdade de imprensa e de informação, que também é um direito fundamental.

Além disso, relatar-se-á, a necessidade de utilização de um juízo de ponderação, que consiste na análise da adequação, necessidade e sopesamento propriamente dito para saber qual desses valores constitucionais terá prevalência no caso concreto.

(15)
(16)

2. DA PENA

2.1 Abordagem histórica da pena

A pena, atualmente, pode ser conceituada como uma espécie de sanção imposta exclusivamente pelo Estado em decorrência da prática de uma infração penal pelo indivíduo, sendo o Estado o único ente dotado de legitimidade para punir o infrator. Ao longo da história, os modos de aplicação da pena foram sofrendo alterações até chegarem em um nível mais humanitário, e essa evolução está intimamente relacionada com o próprio desenvolvimento estatal.

A manifestação mais remota de punição de condutas ofensivas é chamada de vingança penal, a qual passou por diferentes fases de evolução, resultando em diversas maneiras de conceber a finalidade e aplicação da pena.

É importante observar que não se visualiza uma progressão sistemática entre elas,

mas sim, a convivência de uma fase com outra por largos períodos. De acordo com Cezar

Roberto Bitencourt3, “a doutrina mais aceita tem adotado uma tríplice divisão, que é

representada pela vingança privada, vingança divina e vingança pública”.

Na Antiguidade, não existiam os princípios que hoje norteiam o Direito Penal, como o da proporcionalidade, da legalidade, do devido processo legal e mesmo o da dignidade da pessoa humana; e, ao acusado, eram impostas penas cruéis e degradantes, as quais ele pagava com sofrimentos físicos que, muitas vezes, eram aplicados publicamente para inibir que outros cometessem os mesmos erros.

Durante a era primitiva, o homem acreditava que todos os acontecimentos naturais decorriam da vontade de seres divinos, os quais premiavam ou castigavam a sociedade conforme seu comportamento. As pessoas cultuavam e adoravam objetos, chamados Totens, e, caso os desobedecessem, eram impostos castigos objetivando a

retratação do infrator frente à divindade, ou seja, a função da pena era reparatória.4

Esta fase ficou conhecida como vingança divina, pois decorre da grande influência que a religião exercia na vida das pessoas. Nesta época, não existia a preocupação com o ideal de justiça, sacrificava-se, inclusive, a própria vida do infrator, pois o objetivo

3 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral 1. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 72.

4 SHECAIRA, Sérgio Salomão; CORRÊA JUNIOR, Alceu. Teoria da Pena. São Paulo: Editora Revista dos

(17)

maior era a satisfação da divindade que foi ofendida pelo delito, sendo o castigo, aplicado

pelos sacerdotes por delegação divina, proporcional à grandeza do ofendido.5

Segundo Cezar Roberto Bitencourt6, “evoluiu-se, posteriormente, para a vingança

privada, que poderia envolver desde o indivíduo isoladamente até o seu grupo social, com

sangrentas batalhas, causando, muitas vezes, a completa eliminação de grupos”.

Nesta fase, o infrator poderia ser punido de duas formas, através da perda da paz ou por meio da vingança de sangue. A primeira era aplicada ao infrator que pertencia ao próprio grupo, e consistia na pena de banimento, em que o indivíduo perdia a proteção dos demais membros. Já a segunda ocorria quando a violação era cometida por pessoa estranha ao grupo, acarretando uma verdadeira guerra entre os grupos.

Com o transcorrer do tempo, surge a Lei do Talião, pregando a máxima “olho por

olho, dente por dente”. Embora, os castigos ao corpo do infrator e, inclusive, aos de seus familiares fossem aplicados de forma cruel, a referida lei representou o primeiro indício do

princípio da proporcionalidade entre o delito e a pena.7 Ao infrator era aplicado um castigo

proporcional ao mal que ele causou ao ofendido, limitando, assim, a extensão da vingança penal.

Nessa época, surgiu também a composição, que possibilitou ao infrator substituir o castigo pelo pagamento. Com essa substituição, o dano era reparado de forma menos severa, pois evitava a prática de punições cruéis ao corpo do delinquente.

Com a evolução do Estado e a maior organização social, surgiu a vingança pública, que possuiu, no início, forte influência da vingança divina, pois a religião ainda exercia muito poder sob o Estado, não existindo, neste período, separação entre poder político e poder divino. Nesta fase, a pena continuava sendo aplicada de forma severa, mas a sua finalidade era a garantia da proteção do soberano.

Diante do que foi exposto e conforme afirma Luigi Ferrajoli8,

A história das penas é, sem dúvida, mais horrenda e infamante para a humanidade do que a própria história dos delitos: porque mais cruéis e talvez mais numerosas do que as violências produzidas pelos delitos têm sido as produzidas pelas penas e porque, enquanto o delito costuma ser uma violência ocasional e às vezes impulsiva e necessária, a violência imposta por meio da pena é sempre programada, consciente, organizada por muitos contra um.

5 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral 1. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2014. 6 Ibidem, p. 73.

7 SHECAIRA, Sérgio Salomão; CORRÊA JUNIOR, Alceu. Teoria da Pena. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

(18)

Durante muito tempo, o Direito Penal foi utilizado como um instrumento de terror e de segregação social e foi reflexo de inúmeras injustiças e desigualdades na forma de punir. As penas capitais eram aplicadas com frequência e executadas de maneiras cruéis, como por arrastamento, esquartejamento, forca e fogueira. Nesta época, a privação da liberdade representava apenas uma preparação para a pena de morte.

Além do mais, o condenado deveria carregar publicamente sua culpa, revelando a todos sua condenação. A execução, normalmente antecedida de torturas físicas, representava um verdadeiro espetáculo de desumanidade, e o suplício sofrido pelos criminosos constituía mais uma forma de aterrorizar os espectadores do que um meio de dar exemplo e de educar. A aplicação dessas penas cruéis representava, na verdade, uma tentativa de restabelecer a

soberania lesada devido à prática do delito.9

Com a Revolução Francesa e o surgimento do Iluminismo, a forma de pensar começa a ser alterada, e o indivíduo passa a defender ideais, como os de liberdade, igualdade e fraternidade, dando início a uma nova fase na história das penas, a Fase Humanista.

Neste período, diversos movimentos reformadores foram deflagrados objetivando a humanização da pena. Pensadores renomados, como Voltaire, Montesquieu e Rousseau

criticaram a legislação penal existente, defendendo, em contrapartida, a existência de uma ponderação das punições, bem como uma proporcionalidade entre a pena aplicada e o delito cometido.

Importante ressaltar também a grande contribuição dada por Cesare Beccaria para a evolução humanitária da pena. Em sua famosa obra Dos Delitos e da Penas, o referido pensador criticou severamente o sistema jurídico vigente, opondo-se de modo veemente à forma cruel e arbitrária que as penas eram aplicadas. Ele criticou também a pena de morte e a tortura, propondo uma moderação das punições.

Conforme ressalta Cesare Beccaria10, “entre as penas e na maneira de aplicá-las

proporcionalmente aos delitos, é mister, pois, escolher os meios que devem causar no espírito público a impressão mais eficaz e mais durável, e, ao mesmo tempo, menos cruel no corpo do culpado”. Afirmando ainda que “não é o rigor do suplício que previne os crimes com mais segurança, mas a certeza do castigo, o zelo vigilante do magistrado e essa severidade inflexível que só é uma virtude no juiz quando as leis são brandas.”11

9 FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: Nascimento da Prisão. 20 ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1999.

10 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. Tradução de Paulo M. Oliveira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011. p. 59.

(19)

Percebe-se, portanto, que Beccaria, importante representante da fase humanitária do direito penal, não defendia a abolição da pena, considerando-a, na verdade, necessária para a manutenção da ordem social, desde que fosse essencialmente pública, a menor possível entre as prevista em lei e sempre proporcional ao delito praticado.

Esse viés humanitário da pena passou a ser adotado pelos regimes jurídicos dos mais diversos países, como é o caso do Brasil, que reconheceu a dignidade humana como fundamento do Estado e como princípio norteador da ordem social, vedando, consequentemente, a aplicação de penas cruéis e degradantes, como a perpétua, as corporais, a de morte e a de trabalho forçado.

2.2 Teorias sobre a pena

A pena, ao longo da história, foi se adaptando à realidade vivida pela sociedade de cada época. Com a evolução cultural, moral e espiritual da humanidade e com o desenvolvimento do Estado, mudaram-se não apenas as formas de execução da pena, que passaram a ser mais humanizadas, mas também sua finalidade.

Surgiram, assim, diversas teorias que buscaram esclarecer o sentido, função e finalidade das penas em suas diferentes fases evolutivas, objetivando, inclusive, dar

legitimidade ao jus puniendi estatal frente à delinquência. As três teorias mais importantes,

segundo Cezar Roberto Bitencourt12, são as absolutas, as relativas e as mistas ou unificadoras.

2.2.1 Teorias absolutas

As teorias absolutas, também chamadas de retributivas, têm como característica principal a aplicação da pena como um meio necessário para retribuir o mal causado pelo infrator e, assim, restaurar a ordem social violada.

Elas guardam profunda relação com a concepção de Estado absolutista e posteriormente com a de Estado burguês. Com a visão mais liberal de Estado, a pena deixa de ter um caráter religioso, cuja finalidade era a expiação dos pecados através do castigo, e passa a ser aplicada como um meio para garantir e restabelecer a ordem jurídica.

(20)

De acordo com Luigi Ferrajoli13, “são teorias absolutas todas aquelas doutrinas que concebem a pena como um fim em si próprio, ou seja, como “castigo”, “reparação” ou, ainda, “retribuição” do crime”. A pena teria como objetivo primordial retribuir o mal causado e realizar a justiça.

Os dois principais expoentes desta teoria foram Kant e Hegel. Contudo, para o primeiro a pena tem como fundamento uma retribuição de ordem ética, enquanto para o segundo é de ordem jurídica.

Segundo lições de Cezar Roberto Bitencourt14, “no esquema filosófico kantiano, a

pena deve ser aplicada somente porque houve infringência à lei. Seu objetivo é simplesmente

realizar a justiça (...)”. Kant era defensor da idéia de que o infrator deveria ser penalizado na

medida do mal cometido e, pelo simples fato de ter praticado um delito, não questionando, em momento algum, a utilidade da pena.

Por sua vez, Hegel defende a idéia de que a aplicação da pena é necessária para restabelecer a ordem jurídica violada. Para ele, o crime representa a negação do direito, e a imposição de uma pena constitui a negação da negação, isto é, a reafirmação do direito, sendo necessária para dirimir o desequilíbrio resultante da prática do delito.

Afirma Cezar Roberto Bitencourt15 que

Em suma, a principal virtude das teorias absolutas de caráter retribucionista reside no estabelecimento de limites à imposição de pena, como garantia do indivíduo frente ao arbítrio estatal. As teorias retribucionistas incorreram, no entanto, num mesmo equívoco teórico, qual seja, confundir a questão relacionada com o fim geral justificador da pena (legitimação externa), isto é, por que castigar, que não pode ser outro senão um fim utilitário de prevenção de crimes no futuro, com a questão relacionada com a distribuição da pena (legitimação interna), ou seja, quando castigar, que, olhando para o fato passado, admite uma resposta retributiva, como garantia de que a condição necessária da pena é o cometimento de um crime.

Alguns escritores, como Luigi Ferrajoli16, entendem que as teorias retributivas da

pena acabam dando legitimidade a regimes autoritários e ditatoriais, pautados em um direito penal máximo. É importante destacar, contudo, que tais teorias também deixaram contribuições garantistas, expressas na necessidade de que as penas fossem pautadas nos princípios da culpabilidade e da proporcionalidade, por exemplo.

13 FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: Teoria do Garantismo Penal. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 236.

14 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: Causas e alternativas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 110.

15 Idem. Tratado de Direito Penal: Parte Geral 1. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 141-142.

(21)

Assim, para esta teoria, embora não se questionasse os fins utilitários da pena, esta só poderia ser aplicada de modo proporcional ao mal cometido e sempre se justificando como uma retribuição necessária ao autor da infração culpável.

2.2.2 Teorias relativas

As teorias relativas são também conhecidas como preventivas ou, ainda, como utilitaristas, pois, em contraposição às teorias absolutas ou retributivas, elas entendem que a pena deve ser aplicada como meio de prevenção para que o delito não volte a ocorrer e não como mera retribuição a uma infração.

Segundo entendimento de Cezar Roberto Bitencourt17,

As teorias relativas da pena apresentam considerável diferença em relação às teorias absolutas, na medida em que buscam fins preventivos posteriores e fundamentam-se na sua necessidade para a sobrevivência do grupo social. Para as teorias preventivas, a pena não visa retribuir o fato delitivo cometido e sim prevenir a sua comissão. Se o castigo ao autor do delito se impõe, segundo a lógica das teorias absolutas, quia peccatum est, somente porque delinqüiu, nas teorias relativas a pena se impõe ut nepeccetur, isto é, para que não volte a delinqüir.

Cabe destacar que as teorias preventivas dividem-se em dois grupos, um que trata da prevenção geral e outro que aborda a prevenção especial. E ambos retratam a natureza das

prestações da pena em seus sentidos positivo e negativo, conforme se passa analisar adiante.

2.2.2.1 Prevenção Geral

As teorias da prevenção geral estão voltadas para a coletividade, possuindo uma dimensão mais ampla. Elas visualizam a pena como uma forma de intimidar a prática de delitos futuros pelos demais membros da sociedade, e, ainda, como um meio de mostrar ao coletivo social a força normativa do Estado, reforçando, assim, a confiança da comunidade na validade e na vigência do ordenamento jurídico-penal, responsável pela tutela dos bens jurídicos mais fundamentais.

Conforme ensina Bitencourt18,

As teorias da prevenção geral têm como fim a prevenção de delitos incidindo sobre os membros da coletividade social. Quanto ao modo de alcançar este fim, as teorias

17 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: Causas e Alternativas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

(22)

da prevenção geral são classificadas atualmente em duas versões: de um lado, a prevenção geral negativa ou intimidatória, que assume a função de dissuadir os possíveis delinquentes da prática de delitos futuros através da ameaça de pena, ou predicando com o exemplo do castigo eficaz; e, de outro lado, a prevenção geral positiva que assume a função de reforçar a fidelidade dos cidadãos à ordem social a que pertencem.

Pautada na idéia de ameaça e intimidação que a imposição e execução da pena possa causar na sociedade, a teoria da prevenção geral negativa não conseguiu justificar a aplicação da sanção penal. Alguns críticos alegam que, se a finalidade da pena para esta teoria é incutir medo aos demais cidadãos, não se está respeitando o princípio da culpabilidade, e a

punição do delinquente se restringiria apenas a uma ação de intimidação.19

A prevenção geral positiva, que confere às penas a finalidade de integração social, de modo a incutir no coletivo apenas o conformismo com as normas impostas pelo Estado, também recebeu críticas. Os opositores a esta teoria alegam que a mesma não se importa com valores morais intrínsecos ao direito, pois visualiza a pena somente como um meio de

autoconservação do sistema político, restringindo, portanto, a amplitude de sua finalidade.20

2.2.2.2 Prevenção Especial

A teoria da prevenção especial, que ganhou maior desenvolvimento após a segunda metade do século XIX e no século XX, voltou sua atenção para o autor do delito

punível. Sobre esta teoria, afirma Luigi Ferrajoli21 que:

O projeto disciplinar encontra-se quase sempre articulado, na literatura correcionalista, segundo ambas as finalidades da prevenção especial, vale dizer, aquela positiva da reeducação do réu e aquela negativa da sua eliminação ou neutralização, as quais, frise-se, não se excluem entre si, mas concorrem, cumulativamente, para a definição do objetivo da pena enquanto fim diversificado e depende da personalidade, corrigível ou incorrigível, dos condenados.

Esta teoria tem como maior finalidade evitar que a transgressão normativa volte a ser praticada pelo mesmo delinquente, sendo tal fim alcançado por meio da correção e ressocialização do indivíduo. Não objetiva, portanto, intimidar a coletividade e não constitui mera retribuição do fato praticado.

Os adeptos à teoria da prevenção especial preferem falar em medidas em vez de penas, alegando que a utilização do termo “pena” implica em um conceito geral de igualdade,

19 SHECAIRA, Sérgio Salomão; CORRÊA JUNIOR, Alceu. Teoria da Pena. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

20 FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: Teoria do Garantismo Penal. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.

(23)

enquanto “medida” indica que o infrator é um sujeito perigoso e deve ser tratado de forma

diferente, de acordo com a sua periculosidade.22

Esta teoria recebe várias críticas, entre elas está a de que, se o objetivo da pena é reeducar o infrator de modo que ele não volte a delinquir, abre-se margem para punições por

tempo indeterminado, deixando o cidadão ao arbítrio do jus puniendi do Estado, o qual seria

legítimo até que a correção definitiva do delinqüente fosse alcançada.

Além disso, são feitas ferrenhas oposições à idéia ressocializadora, conforme

explica Shecaira23:

Há delinqüentes que por si só não carecem de ressocialização, aos quais é possível um seguro diagnóstico de não reincidência (ex. homicidas passionais). Destarte, como justificar a imposição da pena nestas situações, se a justificativa da ressocialização não está presente; e como deixar de punir tais delinqüentes, apenas pela prescindibilidade de readaptação social do agente? A prevenção especial, além disso, pode representar uma idéia absolutista, arbitrária, ao querer impor uma verdade única, uma determinada escala de valores e prescindir da divergência, tão cara às modernas democracias.

Apesar das críticas, é importante destacar que a teoria da prevenção especial

trouxe inúmeras contribuições, como as que se referem ao caráter mais humanista atribuído à pena, pois, no momento de sua aplicação são consideradas particularidades intrínsecas a cada delinqüente, avaliando-se agravantes e atenuantes da conduta criminosa e, assim, possibilitando uma melhor individualização da sanção penal.

2.2.3 Teoria mista

A teoria mista, também chamada de unificadora, tentou agrupar os pontos mais importantes das concepções retributivas e preventivas, formando uma teoria una. De acordo com seus defensores, tais teorias separadamente não conseguem abranger a complexidade das situações que importam ao Direito Penal, necessitando, assim, de uma teoria que melhor se adeque a pluralidade funcional da pena.

Das teorias retributivas, usa-se a idéia de que a pena representa uma retribuição pelo delito praticado, mas que a mesma deve ser aplicada de forma justa. Devem ser considerados os princípios da culpabilidade e da proporcionalidade no momento de cominar

22 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: Causas e Alternativas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

(24)

uma sanção ao delinqüente, de modo que a pena imposta não ultrapasse os limites de

responsabilidade decorrentes do delito praticado.24

Já das teorias preventivas, empresta-se a idéia de que a pena deve servir como um meio de ressocialização do delinquente, de modo que, através da aplicação da sanção penal, o condenado não volte a cometer novos delitos.

É importante destacar que a teoria mista não ficou livre de críticas. Alguns pensadores, como Claus Roxin, afirmam que tal teoria representa apenas uma justaposição das concepções anteriores, não sendo suficiente para fundamentar um direito penal mínimo, pois, o que, de fato, ocorre é uma ampliação do âmbito de aplicação da pena. Além do mais, alega-se a impossibilidade de compatibilizar a teoria retributiva, que nega um fim à pena, com

a teoria preventiva, a qual visualiza uma finalidade.25

Diante disso, Roxin propõe uma nova teoria, que ficou conhecida como unificadora dialética. Segundo Roxin, o Direito Penal moderno deve conciliar as exigências do Estado de Direito com as do Estado Social, de modo a proteger a sociedade e a liberdade dos cidadãos frente à reação do Estado e, ainda, conservar a possibilidade de reintegração social.26

De acordo com Roxin, a melhor política criminal deve tentar conciliar a prevenção geral, a prevenção especial voltada à integração social e, ainda, a limitação da pena em um Estado de Direito. Em sua teoria, a culpabilidade e as necessidades preventivas integram conjuntamente a responsabilidade, e devem coexistir no momento de impor uma pena, servindo, inclusive, como suas limitadoras.

Para ele, o castigo deve ser aplicado na medida da culpabilidade e das exigências preventivas. A pena nunca pode ser imposta sem culpabilidade, nem superar sua medida. Além do mais, mesmo que esteja presente a culpabilidade, ela só poderá ser aplicada se

houver necessidade de castigo por razões preventivas.27

Segundo lições de Cezar Roberto Bitencourt28,

As consequências alcançadas por Roxin são, em grande medida, adequadas no momento de individualização judicial da pena ; contudo é criticável o esvaziamento

24 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral 1. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2014. 25 ALENCAR, Livia Teixeira de. O Sistema Penitenciário Brasileiro e a Ressocialização do Preso. 2010. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) - Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará.

26 ROXIN, Claus. La Evolución de la Política Criminal, el Derecho Penal y el Processo Penal. Valencia: Tirant lo Blanch, 2000.

27 Ibidem.

(25)

que sua postura produz no conteúdo material da culpabilidade, relativizando a importância desta na determinação da medida da pena. Por que se somente uma pena justa, adequada à culpabilidade, permite cumprir com a finalidade preventivo-geral, o que autoriza deduzir tanto a necessidade como a possibilidade de prevenção é a culpabilidade enquanto fundamento da pena.

Cabe salientar que, após a concepção proposta por Roxin, surgiram modernas teorias sobre a pena, as quais compõem as chamadas teorias sociológicas, dentre elas, pode-se citar a da prevenção geral positiva limitadora.

Bitencourt29 afirma que esta teoria defende a idéia que a prevenção geral precisa

ser utilizada como meio de limitar o poder punitivo estatal, de modo que a pena, sendo aplicada em seus sentidos intimidatórios e limitadores, não deixe de lado a concepção advinda da prevenção especial, principalmente no que concerne à ressocialização do delinquente. Desse modo, seriam respeitados os direitos fundamentais do cidadão, que devem servir como fundamento de qualquer Estado Democrático de Direito.

2.3 A execução da pena no Brasil

O Brasil, por ser reconhecidamente um Estado Democrático de Direito, tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana, garantindo-se a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no País diversos direitos considerados fundamentais, reservando-se, inclusive, a tais direitos e garantias fundamentais um Título próprio na Constituição Federal.

É importante destacar que o art. 5º, §2º, da Constituição Federal brasileira

estabelece que “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros

decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em

que a República Federativa do Brasil seja parte”30, constatando-se, portanto, que o rol de

direitos previstos explicitamente é meramente exemplificativo, não havendo prejuízo para criação e proteção de outros.

Na área penal, são inúmeras as garantias constitucionais existentes, dentre elas pode-se ressaltar a vedação que é feita à prática de tortura e a tratamentos desumanos ou degradantes (art. 5º, III); a necessidade de previsão legal do crime e de sua respectiva pena (art. 5º, XXXIX); a importância de que haja a individualização da pena (art. 5º, XLVI); a vedação às penas de morte, salvo em caso de guerra declarada (art. 5º, XLVII, a), às de caráter

29 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: Causas e Alternativas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

(26)

perpétuo (art. 5º, XLVII, b), às de trabalhos forçados (art. 5º, XLVII, c), às de banimento (art. 5º, XLVII, d) e cruéis (art. 5º, XLVII, e); e, ainda, deve ser garantido o respeito à integridade

física e moral dos presos (art. 5º, XLIX).31

A execução penal no Brasil, que é eminentemente judicial, deve, portanto, respeitar todas as garantias e direitos constitucionalmente e legalmente previstos, sempre se fundamentando no devido processo legal para que, assim, as finalidades da pena sejam alcançadas de forma satisfatória.

2.3.1 O ideal ressocializador

Ao discorrer sobre a evolução da pena, constatou-se que, ao longo do tempo, ela adquiriu novas finalidades e deixou de ser meramente retributiva para tornar-se também preventiva, abrangendo a prevenção geral e especial.

Ao aplicar a pena, busca-se não só punir a prática do delito cometido, mas também prevenir para que ele não volte a ocorrer, gerando, na sociedade, o exemplo e, no condenado, o tratamento, objetivando consequentemente sua ressocialização.

A finalidade da execução da pena deve ser acima de tudo a reeducação do infrator e sua reinserção na sociedade, de forma a evitar a reincidência. Sobre isso, Alexis Couto de Brito32 afirma:

A Execução Penal precisa começar pela individualização, lastreada na Constituição Federal e legislação penal. Por meio de um devido processo legal, ser conduzida não com vistas ao passado, já tratado no processo de conhecimento, mas mirando o futuro, o retorno do condenado à sociedade.

Importante destacar que na própria Lei de Execução Penal em seu art. 1º consta como seu objetivo “efetivar as disposições da sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”33, ressaltando, assim, o caráter ressocializador que a pena deve possuir.

Apesar das boas intenções da lei, a realidade se manifesta de modo diverso, e o ideal ressocializador, por vezes, não é alcançado. O que se constata, na verdade, é um sistema prisional superlotado, que não oferece condições estruturais adequadas para que haja a

31 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 15 mar. 2015.

32 BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

33 Idem. Lei 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em <

(27)

reeducação do condenado, o qual, por vezes, retorna ao convívio em sociedade especialista na prática de novos crimes.

Para Bitencourt34, esse ideal ressocializador que é tão almejado com a aplicação

de uma pena privativa de liberdade não passa de um mito, de uma falácia, pois é impossível ressocializar um indivíduo para a sociedade quando este, na verdade, é retirado do próprio convívio social e posto em um ambiente de reclusão, no qual ele precisa se adaptar às próprias regras internas da prisão para poder sobreviver, saindo, muitas vezes, com mais experiência na criminalidade do que quando entrou.

O que se observa, de fato, é uma grande crise da pena de prisão, já que os presídios não dispõem das condições mínimas necessárias para que ocorra a efetiva ressocilização do apenado, representando, na realidade, um grande meio para a formação de criminosos, reforçando a perpetuação de valores negativos da personalidade e representando uma verdadeira violação aos direitos humanos dos presos.

Ademais, essa ressocilização encontra empecilhos criados pela própria sociedade que normalmente associa a imagem do condenado a um eterno criminoso, mesmo que ele já tenha cumprido sua pena, dificultando, assim, que ele consiga trabalhar de forma honesta e

manter a sua sobrevivência e de sua família.

Ainda tratando sobre o importante papel que a sociedade exerce para a efetivação

da ressocialização, Anabela Miranda Rodrigues35 sustenta que

A insuficiência da participação da sociedade na tarefa de reinserção social do indivíduo é outro dos fatores que em grande parte contribui para que os resultados não sejam tão proveitosos quanto seria desejar. O tratamento é muitas vezes concebido como da exclusiva responsabilidade do pessoal ou da própria administração penitenciária descurando-se o papel do público. Ora, a própria idéia de reinserção social implica uma reconciliação entre o delinquente e a sociedade e um esforço mútuo indispensável para que um tratamento “institucional” não seja votado ao fracasso.

Merece destaque ainda o pensamento de Raúl Cervini36, segundo o qual “em uma

sociedade pouco afeita a reconhecer sua responsabilidade na gestação de condutas desviantes,

que tenta esconder isolando seus membros “indesejáveis”, é muito difícil que alguém possa

readaptar-se.”

34 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: Causas e Alternativas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

35 RODRIGUES, Anabela Miranda. A posição jurídica do recluso na execução da pena privativa de

liberdade: seu fundamento e âmbito. São Paulo: IBCCrim, 1999.

36 CERVINI, Raúl. Os Processos de Descriminalização. 2. ed. rev. da tradução. São Paulo: Editora Revista dos

(28)

Essa situação também é favorecida e ampliada pela atuação da mídia, que, ao fazer reportagens sobre crimes já ocorridos e cujas penas, inclusive, já foram devidamente cumpridas, reavivam, na memória dos telespectadores e do próprio condenado, lembranças que este, na verdade, quer esquecer.

Constata-se que, por vezes, a pena em vez de ressocializar acaba estigmatizando o agente eternamente com o título de ex- presidiário, sendo necessária não só a criação de mediadas públicas que dêem maior assistência ao egresso, mas também que a própria sociedade passe a olhar o indivíduo, que já cumpriu sua pena, não como um criminoso e sim como um alguém que precisa de uma oportunidade para recomeçar.

2.3.2 O estigma de criminoso e a reincidência

Quando a ressocialização não é alcançada, acarreta, muitas vezes, a reincidência

do agente na prática de novos delitos. De acordo com o art. 63 do Código Penal37 vigente,

“verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior.”.

Constata-se que o Brasil adotou a chamada reincidência ficta, que, para se configurar, basta que exista condenação penal anterior e que a mesma já tenha transitado em julgado, sendo desnecessário, portanto, que o agente já tenha cumprido a pena. Assim, não haverá reincidência se, na época em que foi cometido o segundo crime, a sentença relativa ao primeiro delito ainda era passível de recurso.

Importante ressaltar que, conforme explica Mirabete, como a lei fala apenas em crime anterior, não haverá reincidência pela prática de um novo crime quando a primeira

sentença condenatória irrecorrível se referir a uma contravenção.38

Vale frisar, contudo, que a Lei de Contravenções Penais traz em seu art. 7º uma regra própria em relação à reincidência, a qual será reconhecida quando o agente pratica uma contravenção após o trânsito em julgado da sentença que o tenha condenado por qualquer crime no Brasil ou no estrangeiro, ou, ainda, por motivo de contravenção cometida em território brasileiro.39

37 BRASIL. Decreto-Lei nº 2848, de 7 de Dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm >. Acesso em 20 mar. 2015.

38 MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato N. Manual de direito penal, volume 1: parte geral, arts. 1º a 120 do CP. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

(29)

Além do mais, há duas hipóteses em que uma condenação anterior não produz

reincidência, conforme determina o Código Penal40 vigente:

Art. 64 - Para efeito de reincidência:

I - não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação;

II - não se consideram os crimes militares próprios e políticos

Sobre este instituto, importante contribuição foi dada pela teoria do labelling

approach, também chamada de teoria da rotulação social ou etiquetagem, que surgiu no início da década de 60, e que deslocou sua atenção para a delinquência secundária, a qual decorre da estigmatização gerada pela condenação criminal.

Essa teoria mostra sua importante contribuição para a análise criminológica ao centrar a atenção no modo como a rotulação que é feita pela sociedade ao ator do delito geram circunstâncias que dificultam que ele leve adiante as rotinas normais da vida cotidiana,

favorecendo que ele pratique ações tidas como anormais. 41

Segundo Becker42,

Todos os grupos sociais fazem regras e tentam, em certos momentos e em algumas circunstâncias, impô-las. Regras sociais definem situações e tipos de comportamento a elas apropriadas, especificando algumas ações como “certas” e proibindo outras como “erradas”. Quando uma regra é imposta, a pessoa que presumivelmente a infringe pode ser vista como um tipo especial, alguém de quem não se espera viver de acordo com as regras estipuladas pelo grupo. Essa pessoa é encarada como um outsider.

Percebe-se, assim, que de acordo com essa teoria, a partir do momento que uma regra imposta é quebrada por um determinado indivíduo, este passa a ser visto pelos demais membros da coletividade como alguém que não merece confiança para viver em grupo, criando uma espécie de estigmatização do agente, que acaba encontrando dificuldades em reintegrar-se ao meio social e, em decorrência de tal processo, encontra no mundo do crime o

único meio de subsistência.

Sobre esse processo de estigmatização, Sérgio Salomão Shecaira43 afirma que

A decorrência lógica da criminalização de condutas e da persecução penal não é outra que o surgimento de um processo estigmatizante para o condenado. A pena

40 BRASIL. Decreto-Lei nº 2848, de 7 de Dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm >. Acesso em 20 mar. 2015.

41 BECKER, Howard Saul. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. Tradução de Maria Luiza X. de Borges.

1. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2008. 42 Ibidem, p. 15.

(30)

atua como geradora de desigualdades. Ela cria uma reação dos círculos familiares, de amigos, de conhecidos, que acaba por gerar uma marginalização no âmbito do mercado de trabalho e escolar. Levar uma conduta desviada para a esfera da reprovação estigmatizante tem uma função reprodutora do sistema de controle social. O que é uma conduta social desviada, o mais das vezes cometida por um agente primário, transforma-se pela repercussão que encontra na sociedade em face da pena, em uma carreira delitiva permanente e irreversível.

Constata-se que a repressão punitiva, em especial quando se trata de uma pena privativa de liberdade, acarreta uma rotulação do indivíduo e consequentemente gera

criminalizações secundárias, ou seja, reincidência.

É importante destacar que a formação desse estigma de criminoso recebe grande contribuição da mídia, que, mesmo após o condenado cumprir sua pena, insiste em veicular notícias relacionadas ao ato delituoso.

Para diminuir os índices de reincidência, torna-se necessário, portanto, a criação de mecanismos que facilitem sua reintegração ao convívio social, de modo a amenizar os contrastes existentes entre a vida no cárcere e a vida na sociedade aberta.

Além do mais, a redução nos índices de criminalidade será de fato alcançada quando o governo voltar sua atenção para investimentos na área da educação, pilar estrutural para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária, permitindo que o cidadão trilhe caminhos honestos e não veja o crime como um meio de sobrevivência.

Sobre isso, Cesare Beccaria afirmou, em seu livro Dos Delitos e das Penas, que “o

meio mais seguro, mas ao mesmo tempo mais difícil de tornar os homens menos inclinados a praticar o mal, é aperfeiçoar a educação.”44

2.3.3 O instituto da reabilitação

A imposição de uma pena, mesmo depois de cumprida, gera diversas

consequências para o condenado, inclusive de ordem social e moral. Assim, a reabilitação é um instituto jurídico que objetiva garantir ao condenado o gozo de determinados direitos atingidos pela condenação, de modo a facilitar sua reinserção na sociedade.

De acordo com Romeu Falconi45,

O conceito de reabilitação criminal deve estar, entre outras coisas, comprometido com um critério honesto e sincero de solidariedade. Aquele que recorre ao Estado, pleiteando a reabilitação, deixa transparecer uma clara intenção de viver em paz com

44 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. Tradução de Paulo M. Oliveira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011. p. 121.

(31)

seus iguais, seus pares. Então, por que não acreditar nessa primeira e espontânea manifestação de reconciliação social? É como se o reabilitado quisesse dizer: “chega de contendas; chega de perseguições”.

A reabilitação se revela como um instituto autônomo, sendo disciplinada em um Capítulo próprio no Código Penal, nos artigos 93 a 95. Está disciplinada, ainda, nos artigos 743 a 750 do Código Processo Penal, vigorando neste caso o que não contrariar o disposto no Código Penal.

Ela pode ser utilizada independentemente de qual tipo de pena tenha sido aplicada - privativa de liberdade, restritiva de direitos ou multa- revelando-se como um verdadeiro direito do sentenciado.

É importante salientar que, para requerer a reabilitação, é necessário possuir capacidade postulatória, e o juízo competente para apreciar o pedido é sempre o de primeira instância, ou seja, o que julgou o processo de conhecimento. Além do mais, o condenado deve satisfazer os requisitos elencados no art. 94 do CP, dentre eles estão o decurso do prazo de dois anos contados do cumprimento ou extinção da pena imposta e a demonstração de bom

comportamento.46

A reabilitação tem como objetivo garantir ao condenado o sigilo do processo e de

sua condenação, e ainda, poderá atingir os efeitos da condenação previstos no art. 92 do CP47,

sendo vedada, contudo, a reintegração na situação anterior nos casos estabelecidos pelos

incisos I e II do artigo mencionado.48

Para facilitar o sigilo quanto ao processo e a condenação penal, além do instituto

da reabilitação, foi previsto no artigo 202, da Lei de Execução Penal49, que, após o

cumprimento da pena, o crime não poderá constar de qualquer certidão, salvo quando for necessária para instruir processo pela prática de nova infração penal ou outros casos estabelecidos em lei.

46 BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

47 Art. 92 - São também efeitos da condenação: I - a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo:

a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública;

b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos. II - a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos à pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado;

III - a inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para a prática de crime doloso.

Parágrafo único - Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença.

48 BRASIL. Decreto-Lei nº 2848, de 7 de Dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em <

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848.htm >. Acesso em 17 mar 2015.

(32)

De acordo com Rogério Greco50, é bem mais vantajoso recorrer ao art. 202 da Lei de Execução Penal do que aguardar o decurso do prazo de dois anos previsto como requisito para requerer reabilitação, ensejando, assim, uma verdadeira inaplicabilidade prática do art. 93 do Código Penal, pois o art. 202 da LEP regula a mesma situação sem ter a necessidade de esperar transcurso de tempo, constituindo-se como um instituto muito mais benéfico e menos burocrático para o ex-apenado.

Guilherme de Souza Nucci51, compartilhando a mesma ideia de Greco, afirma que

o art. 202 da LEP acabou esvaziando a função da reabilitação, não sendo mais necessário ao condenado recorrer a este instituto para apagar os registros criminais em sua folha, ao menos para fins civis, objetivando, assim, preservar de forma mais célere o processo de reintegração do egresso à sociedade.

Já é pacífico, no Superior Tribunal de Justiça, o entendimento segundo o qual as anotações concernentes a inquéritos policiais e ações penais não farão parte da Folha de Antecedentes Criminais, nem de certidão extraída dos livros do juízo, nas hipóteses em que ocorrer a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva, arquivamento, absolvição ou reabilitação. Contudo, os referidos dados não podem ser excluídos dos arquivos

do Instituto de Identificação, já que, em virtude, da regra prevista no art. 748 do Código de

Processo Penal52, tais informações podem ser requisitadas pelo Juízo Criminal.53

Além do mais, mesmo para os casos de condenação definitiva e cumprida, ou, ainda, de prescrição da pretensão executória, em que a parte interessada não tenha feito o pedido de reabilitação, o sigilo da Folha de Antecedentes para fins civis é assegurado pelo art.

202 da Lei n.º 7.210/84.54

Percebe-se, portanto, que o próprio ordenamento jurídico brasileiro busca proteger a intimidade do condenado, de modo a garantir o sigilo em relação à condenação pela prática do crime e, assim, facilitar a sua ressocialização após o cumprimento da pena.

50 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. Parte Geral. 15 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2013. p. 668. 51 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 7. ed. rev. atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p. 363.

52 Art. 748. A condenação ou condenações anteriores não serão mencionadas na folha de antecedentes do reabilitado, nem em certidão extraída dos livros do juízo, salvo quando requisitadas por juiz criminal.

53 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n. 37503/SP. Quinta Turma. Relator: Ministra Laurita Vaz. Brasília,11 fev 2014. Diário da Justiça Eletrônico. Brasília, 22 fev.

2014. Disponível em: <

https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=33511632&num_re gistro=201200612672&data=20140228&tipo=91&formato=PDF> Acesso em 25 abr. 2015

(33)
(34)

3. NOÇÕES PRELIMINARES SOBRE O DIREITO AO ESQUECIMENTO

Há bastante tempo, o direito ao esquecimento é discutido na Europa e nos Estados Unidos. Já, no Brasil, apesar da existência de produções doutrinárias na área, tal direito ganhou maior visibilidade recentemente, tornando-se tema de muitos debates quando finalmente foi invocado em decisões do Superior Tribunal de Justiça.

3.1 Análise conceitual

Inicialmente, é importante ressaltar que o a nomenclatura “direito ao esquecimento” não é uniforme, sendo também conhecido como “direito de ser deixado em paz” ou o “direito de estar só”.

Essa diferenciação terminológica também se verifica ao analisar outros idiomas.

Em inglês, por exemplo, utiliza-se a expressão right to be forgotten, já em alemão usa-se o

termo Recht auf Vergessenwerden ou, diferentemente, Recht auf Vergessen e em espanhol

utiliza-se a nomenclatura derecho al olvido, não havendo correspondência exata com o que se

usa no Brasil.55

Para melhor analisar o campo de abrangência do direito ao esquecimento, torna-se fundamental diferenciá-lo de outros dois direitos que são: o de ser deixado em paz e o de

apagar dados pessoais. Segundo Rodrigues Júnior56, tais direitos, por vezes, são tratados como

sinônimos, pois as diferenças entre eles são bastante sutis.

O direito de ser deixado em paz está relacionado com o direito que o indivíduo tem de ter protegida a sua vida privada em face da atuação de repórteres, fotógrafos,

paparazzi ou de qualquer pessoa que faça uso de aparelhos tecnológicos para a gravação ou reprodução de imagens e sons. É importante ressaltar que essa proteção pode ser mitigada quando a própria pessoa autoriza ou quando esteja relacionada com o exercício de uma função pública.

Quanto ao direito de apagar dados pessoais, Rodrigues Júnior57 ressalta que

A ideia de apagar símbolos, registros, imagens, monumentos e textos históricos não é algo novo. Muitos tiranos, ditadores e revolucionários, tão logo chegaram ao

55 RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Não há tendências na proteção do direito ao esquecimento. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2013-dez-25/direito-comparado-nao-tendencias-protecao-direito-esquecimento#_ftn1>. Acesso em 24 mar. 2015.

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poder, trataram de destruir ou recontar a história. Na Revolução de 1789, estátuas dos reis franceses, placas e monumentos do Antigo Regime foram deitados abaixo. No período soviético, a técnica de eliminação da imagem e dos registros históricos de personagens políticas caídas em desgraça pode ser observada pela comparação de fotografias anteriores e posteriores à demissão ou à execução de comissários do povo, militares e assessores políticos. O fascismo de Mussolini tentou reescrever a História com a mudança do calendário e com a eliminação de referências a determinados indivíduos.

O direito de ter os dados pessoais apagados está relacionado à possibilidade que é dada à pessoa de excluir informações privadas e que foram expostas ao público, mas que não são de interesse popular.

Cabe ressaltar que essa exposição de informações ficou muito mais intensa com a popularização do uso da internet, pois a facilidade e a rapidez em expor a vida de outras pessoas tornou-se muito maior. Além do mais, com o desenvolvimento dos motores de busca, todas as informações disponibilizadas no mundo virtual podem ser facilmente acessadas, fazendo com que aumente o número de interessados a terem seus dados apagados.

Agora, voltando a atenção especificamente para o direito ao esquecimento,

importante contribuição conceitual é feita por Salo de Carvalho58 que, ao realizar uma análise

do pensamento nietzschiano, afirma que:

Na concepção de Nietzsche, o esquecimento é uma força inibidora positiva e ativa, não correspondendo a uma força inerte, cuja qualidade seria a de impedir que determinadas experiências penetrassem na consciência humana. O esquecimento atuaria como o guardião da porta da consciência, o zelador da ordem psíquica. A força viva produzida pelo esquecimento possibilitaria à humanidade condições de felicidade, pois bloquearia os efeitos da presentificação do passado.

O esquecimento atua como uma proteção psicológica, um filtro da memória para situações que aconteceram, mas que não se deseja relembrar no presente, permitindo ao indivíduo construir um futuro sem marcas de acontecimentos passados, cujas recordações acarretariam sofrimento particular e, até mesmo, dificuldades de socialização.

Como o Direito é dinâmico, outros direitos vão surgindo de acordo com a necessidade de tutelar novos bens jurídicos, sempre objetivando uma maior proteção da dignidade da pessoa humana.

Assim sendo, o direito ao esquecimento nasce como um dos meios de garantir tal dignidade, de forma a proteger o indivíduo da divulgação pública de acontecimentos passados, que, mesmo sendo verídicos, possam acarretar grande sofrimento ou transtornos quando relembrados.

Referências

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