Redesenho
da cidade através da arquitetura:
formas modernas em Londrina/PR
Dafne Marques de Mendonça
Salvador,2012 v.1
Redesenho
da cidade através da arquitetura:
ormas modernas em Londrina/PR
f
Prof° Dr° Marco Aurélio Andrade de Filgueiras Gomes Orientador:
Salvador
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo, Faculdade de Arquitetura, Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.
Faculdade de Arquitetura da UFBA - Biblioteca
M357 Mendonça, Dafne Marques de.
Redesenho da cidade através da arquitetura: formas modernas em Londrina/PR / Dafne Marques de Mendonça. 2012.
259 f. : il.
Orientador: Prof. Dr. Marco Aurélio Filgueiras Gomes.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Arquitetura, 2012.
1. Arquitetura Londrina (PR) Séc. XX. 2. Arquitetura moderna -Urbanização - Londrina (PR). Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Arquitetura. II.Gomes, Marco Aurélio Filgueiras. III. Título.
Há muitas pessoas a quem agradecer por esta etapa concluída. Deixo aqui registrado algumas delas que, de alguma maneira, contribuíram diretamente ao longo do período de realização da pesquisa e sem as quais não imagino como conseguiria os resultados atingidos.
Agradeço primeiramente à minha família, minha mãe Ivone, meu pai José e minha irmã Ariadne, por todo o apoio incondicional, o carinho e a paciência ao longo de todo o percurso. Sem vocês, nada seria possível.
Ao Thiago, pela compreensão e incentivo. Suas palavras sinceras e amáveis foram fundamentais, especialmente nos momentos de dúvida, assim como as conversas arquitetônicas e a parceria nas pesquisas em campo.
Ao meu orientador, Professor Marco Aurélio Andrade de Filgueiras Gomes, pelo privilégio de ter sido sua orientanda, por todos os ensinamentos e por ter acreditado na pesquisa, mesmo quando os caminhos desta se perdiam ou se desviavam.
Aos membros que integraram as bancas e que também foram parte imprescindível da pesquisa: O Professor
participou da fase inicial durante o CECRE/ UFBA,
no qual fui sua aluna. A Professora me acolheu, juntamente com
a Professora Anna Beatriz Ayrosa Galvão, no Núcleo DOCOMOMO/ UFBA, onde tanto aprendi e vivenciei. Carol, você não imagina como me realizava nas reuniões de sextas-feiras sobre a preservação da arquitetura modernista, muito obrigada pela oportunidade. A Professora , que apesar de não a ter conhecido pessoalmente antes, já a conhecia através de seus textos precisos, tornando uma honra tê-la como parte desta etapa.
À Silvandira que, com paciência e destreza, estendeu a mão amiga quando se fazia necessário.
Às minhas amigas que considero irmãs de coração, Virgínia e Aline. Mesmo longe, vocês estiveram sempre perto. Não há mais caminhada sem levar vocês comigo.
E por último, mas não menos importante, agradeço aos colegas conquistados no mestrado, Andrea, Fernanda, Sérgio e Gustavo. Devo a vocês os melhores dias da minha vida baiana . Obrigada pela amizade, cumplicidade e companheirismo. Lembro com saudades tudo que vivemos juntos e quero mais!
Luiz Antônio Fernandes Cardoso, além da contribuição ao longo da
pesquisa, quando a idéia do tema surgiu
Ana Carolina Bierrenbach
Nelci Tinem
Na primeira metade do século XX, os produtos de arquiteturas modernas esbarram muitas vezes nas definições espaciais e formais já estabelecidas nas cidades existentes, onde legislação, divisão cadastral e aspectos culturais influenciam na possibilidade de propor inovações e de distanciamento da forma convencional de pensar arquitetura e cidade. Esta questão se coloca como pano de fundo para a pesquisa, onde a cidade de Londrina/ PR apresenta-se como objeto de estudo. Para isto, arquiteturas modernas são classificadas e diferenciados os aspectos de modernidade presentes no cenário urbano brasileiro
. Estas arquiteturas modernas podem ser ilustradas através da polarização de dois modelos: o , como o título empregado para agrupar uma série de manifestações de estética moderna, mas ainda presos a relações convencionais de implantação na cidade existente e a arquitetura modernista, que visa o rompimento. As intenções desta última extrapolam apenas o desejo de reconfigurar a forma arquitetônica. O real interesse é repropor a cidade em seus aspectos considerados retrógrados e herdados de períodos anteriores. Isto pode ser confirmado quando são observados os discursos dos primeiros Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna que criticam a “rua-corredor” e a arquitetura ditada pela forma e não como resultante da funcionalidade de uma planta. Se a busca pela inovação é a principal intenção da arquitetura modernista, este intento se viabiliza de modo mais pleno em áreas de expansão, ou seja, distantes da cidade existente, e em grandes programas como habitações coletivas, complexos esportivos, campus universitário, clubes, centros cívicos etc. O caso de Londrina se torna paradigmático do cenário arquitetônico difuso de modernidades arquitetônicas e urbanísticas em curso no período. Por ser cidade nova, localizada no interior do Norte do estado do Paraná e fundada em 1929, portanto, fruto do século XX, poderia ser considerada local propício para o florescimento de propostas inovadoras mas, assim como nos centros consolidados das demais cidades, a divisão cadastral, a legislação e aspectos culturais já induzem uma forma de implantação e relação dos edifícios com a cidade. A legislação local será um grande incentivo no processo de renovação e ao mesmo tempo uma aliada para a permanência do existente. Em Londrina, assim como em outras localidades, os princípios que regem o Movimento Moderno, tais como: a planta como geradora da forma, os cinco pontos d nova arquitetura propostos por Le Corbusier, a verticalização, a tentativa de tornar os térreos espaços de uso coletivo e a disposição assimétrica dos edifícios sob um fundo neutro, são reinterpretados e reinventados para conseguirem se materializar, dadas as limitações. O entendimento presente na pesquisa, ao considerar a arquitetura do Movimento Moderno como transformação do espaço urbano, potencializa as intenções do discurso modernista e permite estabelecer novos parâmetros para a preservação e discussão acerca deste patrimônio. Como resultado, a pesquisa também valoriza a apresenta exemplares londrinenses sob a ótica de que estes incorporam intenções presentes em arquiteturas modernistas nacionais e internacionais do período.
Arquitetura moderna. Movimento Moderno. Patrimônio. Londrina (PR). através de alguns exemplares
Art Déco
status quo
In the first half of the twentieth century, the products of modern architectures often collide in spatial and formal definitions already established in existing cities where law, cadastral division and cultural aspects influence the possibility to propose innovations and distancing the conventional way of thinking about architecture and city. This question arises as a background for the research, and the city of Londrina, located at Paraná State, presents itself as an object of study. For this, through some examples, modern architectures are classified and aspects of modernity are differentiated in Brazilian urban setting. These modern architectures can be illustrated through the polarization of two models: the Art Deco, as the title used to group a series of demonstrations of modern aesthetics, but still attached to conventional city and modernist architecture, which aims breaking the conventions. The intentions of modernist architecture extrapolate the desire to only reconfigure the architectural form. The real interest is to repurpose the city aspect considered retrograde and inherited from previous periods. This can be confirmed when observing the speech of the first International Congress of Modern Architecture which criticize the "rue-corridor" and architecture dictated by the form and not as a result of the functionality of a floor plan. If the quest for innovation is the main intention of modernist architecture, this intent is made possible more fully in areas of expansion, ie, away from the existing city, and in large programs such as collective housing, sports complexes, university campus, civic centers etc. Londrina, as a case study, becomes paradigmatic because demonstrates the diffuse architectural and urban modernity in course at the period. Being a new city, located within the North of Paraná state and founded in 1929, therefore, the fruit of the twentieth century, Londrina could be considered a more suitable place for the flourishing of innovative proposals but, as well as consolidated centers of other cities, the urban division, legislation and cultural aspects induce a traditional form of urban insertion of buildings in the city. In Londrina, as elsewhere, the principles governing the Modern Movement, such as the plant as a generator of form, the Le Corbusier five principles of architecture, the vertical forms, the intention of making the ground floor a collective space and the use of asymmetric arrangement of buildings on a neutral background, are reinterpreted and reinvented to become real, given the constraints. The understanding presented in this research, which considers the architecture of the Modern Movement as transformation of urban space, enhances the intentions of the modernist discourse and allows to establish new parameters for the preservation and discussion of this heritage. As a result, the research also shows and valorizes Londrina´s examples from the perspective that these incorporate intentions present in national and international modernist architecture of the period.
Modern architecture. Modern Movement. Heritage. Londrina (PR).
Introdução 09
CAPITULO
1
Hibridismo e arquiteturas modernas: modelos de modernidade 23
1.1 Moderno, modernismo, modernidade, modernização novo, modernista e
modernizante: uma definição 24 1.2 Pluralidade de modernidades na primeira metade do século XX 27 1.2.1 O antagonismo entre propostas arquitetônicas e urbanísticas 33 1.2.2 A modernidade de aparências: o Art Déco 43 1.2.3 A modernidade de ruptura: o Movimento Moderno 52 1.2.3.1 A arquitetura modernista brasileira 67 1.2 A relação da arquitetura com a cidade nos modelos de modernidade 77
CAPITULO
2
O redesenho como intenção: arquitetura para transformar a cidade 88
2.1 A necessidade de repropor a cidade 89 2.1.1 Propostas de Le Corbusier e o redesenho 90 2.1.1.1 Le Corbusier e a arquitetura modernista brasileira 105 2.1.2 Os CIAM´s e o redesenho 108 2.1.2.1 A planta como geradora do projeto e a nova implantação 121 2.1.3 O vazio como espaço projetado 126 2.1.3.1 A disposição assimétrica equilibrada de volumes 131 2.1.3.2 A dissolução da fronteira entre o público e o privado 135 2.1.3.3 Superquadras de Brasília: a perda da quadra tradicional 148 2.1.4 A verticalização como símbolo de modernidade 154 2.1.4.1 O modelo verticalizado de Louis Sullivan 156 2.1.4.2 O modelo verticalizado modernista 160
2.2 Categorias de implantação da arquitetura moderna em áreas consolidadas e de
expansão
Apropriações de modernidades e releituras: o caso de Londrina 176 3.1 O sentido de moderno no contexto local 177 3.1.1 A arquitetura das décadas de 1930 e 1940 174 3.1.2 O incentivo a verticalização e a nova arquitetura na década de 1950 188 3.1.2.1 As galerias comerciais e a loggia: novas rotas de percolação 198 3.1.2.2 Ousadias de João Batista Vilanova Artigas e Carlos Cascaldi 225 3.2 Shangri lá o bairro jardim: paradoxo da modernidade 235 3.3 Catálogo de edifícios quanto ao redesenho 237 FICHA 1: Edifício Sahão (1950): junto ao alinhamento com pilotis térreos 242 FICHA 2: Edifício Alaska (1961): junto ao alinhamento com loggia térrea 243 FICHA 3: Conjunto Edifício Autolon, Confeitaria Caloni e Cine Ouro Verde (1950) 244
CAPITULO
4
Formas modernas e espaço urbano: considerações finais 246
Bibliografia e fontes de pesquisa 252
Introdução
Ao longo das primeiras décadas do século XX, são várias as arquiteturas de características modernizantes que se manifestam. O Movimento Moderno desponta no final da década de 1920 e pretende ser o único a ter para si o adjetivo de arquitetura moderna do novo século. No Brasil, é neste período que se intensifica a expansão urbana nas cidades brasileiras e criação de novas no interior. A ruptura com o período colonial – deflagrada com a independência do país, fim da escravidão e do sistema de sesmaria – propicia a necessidade de novos modelos urbanos para as cidades existentes, assim como, para as novas a serem criadas. A cidade de Londrina, objeto de estudo da pesquisa, localiza‐se ao Norte do Estado do Paraná (figura 2), e é fruto deste contexto efusivo: cidade nova, projetada e implantada em 1930 pela Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP) ela passa, entre as décadas de 1930 a 1960, por diferentes fases na busca de sua modernização espacial e arquitetônica. A vinculação entre campo e cidade ainda é estreita nas cidades‐novas e, ao mesmo tempo, o desejo pelo moderno é latente.É importante ter em mente que a condição de porção remotamente conhecida da faixa mais interiorana do país se faz presente, no discurso, até as primeiras décadas do século XX, especialmente na bibliografia da época quando aborda a questão das terras localizadas na região pioneira. A chamada zona, franja ou região pioneira se define como os territórios pouco ocupados localizados mais ao oeste da costa litorânea de parte da região sul e centro‐sul do Brasil. São várias as cidades que, ao longo do processo, recebem a alcunha de “boca do sertão”, definindo‐se como último ponto avançado em áreas remotamente ocupadas. (figura 1)
FIGURA 1: Mapa que indica os níveis de ocupação do território brasileiro em 1950: primeira hachura, ocupação concentrada; segunda hachura, ocupação dispersa; e terceira hachura, ocupação extremamente dispersa. Nota‐se que o oeste paulista e norte do Paraná localizam‐se na área de “ocupação concentrada”, sinalizando o processo de ocupação intenso pelo qual passa no período Fonte: JAMES e SPEDIÃO, 1960, p.772. FIGURA 2: Mapa localizando o Paraná no Brasil e Londrina no Paraná Fonte: Própria autora, 2009.
A ocupação do norte do Paraná é consequência das experiências no oeste paulista , porém condicionada pelas circunstâncias proporcionadas pelo território na outra margem do rio Paranapanema. A forma como se dá a presença de terra roxa – solo fértil para a agricultura – é um importante fator que evidencia como as condições encontradas na nova área a ser explorada, acarretam nas diferenças entre a ocupação nos dois Estados. No interior de São Paulo, o derramamento deste tipo de solo fértil se dá de forma esparsa, com pequenas manchas distantes entre si, já no norte do Paraná, concentra‐se em um único ponto. Isto permite – e pode justificar – a proposta de uma ocupação planificada de maior dimensão encontrada no norte paranaense. O oeste paulista, ao contrário, é retalhado em diferentes pontos de ocupação que ocorrem simultaneamente e de forma autônoma.
A Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP) é subsidiária da Brazil Plantation
Sindicate, firma inglesa dedicada ao plantio e à exploração de algodão. Em 1925, esta adquire do
governo do Estado do Paraná, uma área total de 515.000 alqueires e implanta – a partir das experiências já consolidadas, aliadas ao conhecimento dos técnicos da Companhia – uma rede de cidades dispostas linearmente, ao longo da linha de trem, e vinculadas à zona rural.
A ocupação orientada por uma Companhia Colonizadora, como são chamadas na época, representa uma nova etapa no processo de ocupação do interior do país. Em um primeiro momento do ciclo cafeeiro, são os grandes fazendeiros e proprietários de terras, associados ou não a outros, quem destinam uma porção de suas posses para a criação de um patrimônio leigo para ser loteado e servir ao abastecimento local. A grande monocultura prevalece neste período
1
Autores ressaltam o aspecto da região pioneira paranaense ter íntima relação com a paulista. Sobre isto Monbeig (1945) salienta que o lado paranaense mesmo que “pertença administrativamente ao Estado do Paraná – não deixa de ser de fato uma região da economia paulista” (p.11). Nilo Bernardes (1952) excetua a região pioneira do restante do Paraná e a coloca mais próxima às características paulistas, tanto pelas questões econômicas como pela presença maior de migrantes se comparado aos imigrantes, estes, mais numerosos na colonização das outras regiões do Estado. Mas vale destacar que os imigrantes constituem importante contingente populacional na área, e foram responsáveis ou pela criação ou ocupação de cidades e patrimônios. Só em relação ao norte do Paraná, os japoneses tiveram participação considerável nos assentamentos; Rolândia e Heimtal recebe alemães; Warta foi estabelecida por imigrantes poloneses; Colônia Concórdia pelos eslavos de origem romena, etc.
juntamente com a figura do dono da terra que dita leis e dá as ordens no local (DEFFONTEAINES, 1944; 1945). As cidades criadas pelas Companhias não se vinculam mais diretamente a um grande fazendeiro, como na primeira fase do ciclo cafeeiro e, sim, são terras adquiridas por empresa ou grupo de particulares. Estes assumem a responsabilidade pelo parcelamento e venda e se ocupam tanto pela área urbana como rural. Seu lucro está baseado no retalhamento da grande propriedade em glebas menores para a venda.
A entrada para o norte do Paraná se dá através da extensão da linha férrea de Ourinhos/SP. A primeira cidade implantada é Londrina, com ocupação iniciada em 1929, tornando‐se o local da sede da Companhia nos primeiros anos. A CTNP estabelece como diretriz para a implantação das cidades uma hierarquia entre os núcleos. Os mais importantes são implantados de forma equidistante e entremeados por outras ocupações hierarquicamente menores. As cidades “destinadas a se tornarem núcleos econômicos de maior importância seriam demarcadas de cem em cem quilômetros, aproximadamente” e entre elas, “distanciados de 10 a 15 quilômetros um do outro, seriam fundados os patrimônios, centros comercias e de abastecedores intermediários” (COMPANHIA, 1977, p.77). Ao redor das áreas urbanas, determina‐se a implantação de “cinturões verdes”, cuja função era constituir “uma faixa dividida em chácaras que pudessem servir para a produção de gêneros alimentícios de consumo local” (COMPANHIA, 1977, p.77‐78). À medida que se afasta do núcleo urbano as glebas aumentam de dimensão.
Em 1943 – devido à Segunda Grande Guerra e à exigência do governo pela nacionalização das empresas – a CTNP foi colocada à venda e comprada por um grupo paulista composto por funcionários da até então Companhia inglesa, passando a chamar‐se Companhia
Melhoramentos Norte do Paraná (CMNP). Esta fase inaugura a criação de dezenas de novas
cidades, dando continuidade ao eixo de expansão linear e às diretrizes de hierarquia estabelecidas na fase CTNP.
De acordo com Yamaki (2003), ao todo, são criados setenta e oito núcleos urbanos, sendo que cinquenta e oito são implantados pela Companhia e vinte fundações de particulares. Entre todas as ocupações, quatro são os núcleos hierarquicamente maiores implantados: Londrina (1930), Maringá (1947), Cianorte (1953) e Umuarama (1955).
FIGURA 3: Localização das quatro cidades pólo implantadas pela CTNP (Londrina, Maringá, Cianorte e Umuarama). Ourinhos é a porta de entrada à região pelo lado paulista
Fonte: da autora sobre base Google Earth <www.googleearth.com>, acesso em Abril de 2009.
…Para cada uma destas pequenas cidades está estabelecido um plano exato de urbanismo, que já se nota em aplicação em Londrina. É claro que não se deve esperar achar aí os últimos confortos; as ruas são cuidadosamente traçadas; nas grandes chuvas, porém, a lama avermelhada as cobre; as casas são de construção extravagante, entretanto a higiene é perfeita; o problema do abastecimento de água potável foi resolvido sem grandes dificuldades, a encosta sobre a qual está construída a cidade facilita o escoamento das chuvas e evita a estagnação das águas com seus consequentes perigos. A declividade do terreno e a umidade trazem como consequência a construção sobre estacas da maioria das habitações; umas sessenta construções em tijolos escapam à necessidade das estacas; e dão a Londrina um aspecto de cidadezinha bem estabelecida e com futuro garantido [...]. Mas o fato é que a função essencial destes centros é de ser o mercado de abastecimento e de exportação para o grande número de pequenos lavradores invisíveis pelo fato de estarem espalhados dentro da mata. (MONBEIG, 1945, p.12).
Na fase nacional da Companhia (pós‐1943) é quando se dá a implantação do maior número de núcleos e constitui‐se, com isto, momento em que a importância dada à configuração das cidades se reveste de um novo enfoque se comparadas com as surgidas durante a primeira fase. Este fato pode ser atribuído à distância temporal entre estes dois momentos – pois a urbanização aumenta sua relevância progressivamente ao longo das décadas
– como também, às incertezas iniciais do sucesso do empreendimento. Nas cidades da primeira fase inglesa os traçados são menos complexos em relação às cidades seguintes, mas, mesmo assim, não completamente descuidados quanto às questões estéticas. Na fase CMNP, a malha urbana busca se assentar melhor ao sítio, tornando‐se, em alguns casos, uma condicionante direta do traçado como é o exemplo de Maringá e Cianorte, ambas com desenho de autoria de Jorge Macedo Vieira e, portanto, mais relacionadas ao ideário cidade‐jardim. (figuras 4 e 5)
As cidades novas da zona pioneira, como representantes do mundo civilizado em locais até então remotos, adquirem também a função de tornarem‐se chamarizes de futuros compradores. Sua imagem deve ser convidativa e passar a impressão de ser dotada dos melhores aspectos dos grandes centros e da vida moderna. Esta é uma tarefa difícil dada as distâncias e os poucos recursos, mas é imprescindível para garantir o sucesso dos loteamentos – juntamente com a qualidade da terra e as facilidades de escoamento da produção. FIGURA 4: Planta figura‐fundo de Londrina de 1939 FIGURA 5: Maringá, projeto de 1943, de autoria de Jorge Macedo Vieira, representa uma nova fase de criação de cidades pela Companhia Fonte: YAMAKI, 2003. . Fonte: PUPO, 1948. O projeto de Londrina é do engenheiro Alexandre Rasgulaeff (YAMAKI, 2008), contratado pela companhia. Em 1929, inicia‐se a ocupação implantação da cidade, sendo que o núcleo urbano só se torna município em 1934. A proposta é em malha xadrez interrompida pela elipse
central onde está localizada a Catedral, no ponto mais elevado do traçado, e ladeada por praças. O eixo rodoviário corta em diagonal a malha xadrez e contorna a elipse e, o eixo ferroviário, está em paralelo a este. FIGURA 6: Fotografia de Londrina mostrando as praças (em verde) adjacentes às principais edificações posicionadas estruturando um eixo: a Catedral e Estação Ferroviária FIGURA 7: Aerofoto de 1949 de Londrina, detalhe na elipse central do traçado onde está a Catedral ladeada pelo Bosque e pela Praça da Bandeira. Próximo à Estação ferroviária, no centro superior da imagem, está a Praça Rocha Pombo Fonte: Pró´pria autora, 2011, sobre base “A Pioneira”, 1952. Fonte: Yamaki, 2003.
Ao longo da primeira metade do século XX, a cidade de Londrina é reconstruída três vezes (YAMAKI, 2008): a primeira fase pioneira ocorre nas décadas iniciais de ocupação quando a cidade é construída em madeira; uma segunda fase é iniciada ao final da década de 1930 e vigente ao longo de toda a década de 1940, onde as edificações em madeira são progressivamente substituídas por sobrados em alvenaria de arquitetura déco e residências em estilo eclético e, uma terceira fase, cujo início se dá ao final da década de 1940 e ao longo da década de 1950 e 1960, onde se almeja implantar a arquitetura modernista à realidade local. Cada fase reflete também o progresso econômico da cidade, sendo a última, o momento de maior pujança econômica decorrente da alta do café (SUZUKI, 2007) que faz o gabarito de altura dos edifícios atingirem mais de 20 pavimentos.
Todo este processo de renovação toma curso na atual área central da cidade, ou seja, aproximadamente entre os limites do Plano inicial proposto pela CTNP (figuras 4, 7 e 8).
Inicialmente, a expansão urbana – além dos limites da CTNP – se dá sobre a área de “cinturão verde” que circunda o plano inicial. Esta expansão é feita com o prolongamento da malha xadrez para formar, principalmente, novos bairros residenciais. Nestes, se mantêm a técnica construtiva da madeira como principal meio de construção. Uma nova concepção para os bairros residenciais é introduzida a partir do convite à Prestes Maia em 1950 para a elaboração de um plano urbanístico de expansão para a cidade. O plano introduz o bairro‐jardim em Londrina e, com isso, o centro passa a ser um setor dentro de um planejamento em maior escala, cuja verticalização e o uso comercial ou misto residencial/comercial tornam‐se suas características principais. FIGURA 8: A dimensão do núcleo inicial da cidade (em roxo) projetado pela CTNP nos dias atuais Fonte: Própria autora, 2011, sobre base IPPUL, 2005. Ao mesmo tempo em que Prestes Maia é chamado para Londrina, o arquiteto Vilanova Artigas, importante nome na história do modernismo brasileiro, é convidado para inserir edifícios na área central. Esta aí uma situação paradoxal da arquitetura e urbanismo londrinense
que refletem, em menor escala, uma realidade também recorrente nos grandes centros: o urbanismo moderno e arquitetura modernista estão, na maioria das vezes, desvinculados.
A transição da cidade em madeira para a cidade déco não exige alterações significativas no traçado inicial de Londrina, pois é uma arquitetura que se acomoda ao local e, portanto, de mais fácil assimilação (COELHO, 2000). A prática comum adotada pelas construções em madeira é implantar edifícios comerciais junto às divisas e alinhamentos e, os residenciais, isolados no lote. Esta concepção é idêntica para a arquitetura déco, apenas alterando‐se o material construtivo em madeira pela alvenaria.
Mas a transição da cidade déco para a modernista é menos tranquila, pois a arquitetura do Movimento Moderno, ao almejar romper com as práticas urbanísticas e arquitetônicas vigentes, nega a cidade tradicional e, assim, exige uma nova espacialidade, desvinculada dos elementos morfológicos tradicionais, tais como, as quadras e lotes. Este espaço inovador é a condição ideal para a nova arquitetura, porém não é a realidade das cidades na primeira metade do século XX. Os modelos urbanísticos modernos são, neste período, majoritariamente de influência Beaux Arts ou vinculados ao ideário cidade‐jardim. Para comprovarmos esta condição é só pensarmos no Plano Agache para o Rio de Janeiro ou no projeto da cidade de Goiânia.
Sendo assim, a concretização da proposta do Movimento Moderno, só consegue ser materializada – e ainda, muitas vezes, parcialmente – em áreas afastadas, como novos bairros, ou então em conjuntos arquitetônicos de grande porte, como universidades, clubes, etc. Nas cidades consolidadas, ou com planos que ainda flertam com a concepção tradicional de cidade, a possibilidade de materialização da arquitetura do Movimento Moderno está vinculada à tentativa de acomodar os pressupostos modernistas às realidades locais encontradas e, assim, tornando‐se o compromisso com o redesenho do espaço urbano uma de suas características fundamentais. Desse modo, a arquitetura – ou seja, o conjunto de edifícios em sua relação com o espaço urbano e público em cidades pré‐estabelecidas – torna‐se o instrumento modernista da
mudança em áreas consolidadas. Este é o caso de Londrina e reflete a sua terceira fase de reconstrução.
Desta forma, o cenário arquitetônico londrinense, como objeto de estudo da pesquisa, reflete a complexidade e os paradoxos intrínsecos à primeira metade do século XX e, a partir desta condição que lhe é própria, torna‐se o veio condutor para a seleção das temáticas abordadas na dissertação. O ponto central do estudo é expresso pelo título: a questão do
redesenho das cidades proporcionado pela arquitetura. Com este intuito, direciona os esforços
no sentido de definir o que caracteriza o redesenho de áreas consolidadas – considerando esta como uma das intenções chave do Movimento Moderno – e quais são as formas e motivações para a sua realização, concepção e materialização. Esta abordagem é relevante para permitir a ampliação do entendimento da arquitetura modernista não como uma simples imposição de novas propostas em espaços urbanos existentes, mas sim, e muitas vezes, tentativas de adaptação e acomodação de idealizações ao plano real.
A segunda parte do título, as formas modernas encontradas em Londrina/PR, reflete o intuito de compreender a complexidade do objeto, onde diferentes propostas de modernidade se sobrepõem em um mesmo espaço e tempo adquirindo, muitas vezes, características híbridas. Esta condição heterogênea do senso de modernidade não parece ser uma particularidade londrinense e, sim, a condição “padrão” na primeira metade do século XX. A pesquisa debruça‐ se em estabelecer um entendimento para as arquiteturas modernas na primeira metade do século XX, através de revisão bibliográfica e estudos a partir de exemplares. Dois modelos de modernidade são considerados dominantes: a arquitetura déco, considerando o hibridismo como a qualidade chave desta definição, e a arquitetura modernista, ou seja, a arquitetura vinculada ao Movimento Moderno internacional. Neste sentido, uma questão importante se evidencia: qual modernidade Londrina almeja construir dada a sua distância dos grandes centros, ausência de parque industrial significativo (a não ser o relacionado à agroindústria) e a
sua configuração espacial a partir de elementos morfológicos tradicionais? Para responder a este questão, o esforço de relacionar a realidade londrinense a situações de outras cidades do país torna possível compreender as limitações encontradas localmente, assim como, destacar as tentativas de estabelecer similaridades com o proposto em outras localidades. Desta forma, o objeto de estudo é tratado não como um fenômeno isolado, mas como parte de um contexto.
Com isto, os objetivos da pesquisa podem ser resumidos nos seguintes tópicos e ilustrados no quadro 1:
Demonstrar a complexidade do objeto de estudo como reflexo da complexidade presente na primeira metade do século XX, onde diferentes manifestações de modernidade se sobrepõem e coexistem;
Contribuir para a ampliação do entendimento da arquitetura modernista enquanto estratégia de redesenho do espaço urbano;
Identificar, caracterizar e categorizar as estratégias de redesenho em áreas consolidadas e de expansão e rebatê‐las na área central de Londrina. QUADRO 1: Organograma com os objetivos da pesquisa Fonte: da autora, 2011.
A metodologia baseia‐se na revisão da literatura acerca dos temas importantes para a pesquisa, assim como dos principais discursos adotados pelos personagens e publicações da época quanto a estabelecer o valor de moderno e o desejo de ruptura com a cidade tradicional. Para rebater os conceitos teóricos ao plano “real” e arquitetônico, é feita uma leitura de exemplares nacionais e internacionais, com o objetivo de categorizá‐los em sua interação com o espaço urbano. Esta pesquisa é, portanto, baseada em publicações e revistas nacionais e internacionais que tratam sobre o tema, assim como observações em campo. Compreende‐se o risco decorrente da seleção de um número restrito de exemplares para a ilustração da pesquisa, deixando‐se outros de fora. Dessa forma, ao longo dos capítulos, a escolha e organização dos exemplos considerados relevantes procuram não ser organizados apenas em termos cronológicos, mas, principalmente, pela proximidade conceitual ou de intenção com o respectivo assunto abordado e, assim, deixar margem para que outros possam ser incluídos. O estudo de caso, devido à maior proximidade do pesquisador com o objeto, torna‐se não apenas um rebatimento de conceitos teóricos abordados nas outras seções, mas uma possível ampliação dos mesmos a partir de uma realidade palpável, cujos agentes que o condicionam e balizam são passíveis de identificação.
O recorte temporal percorre o início do século XX até a década de 1960, portanto, são abrangidos, em menor ou maior grau, os anos iniciais de gestação de arquiteturas modernas e o fortalecimento da arquitetura modernista. A cidade de Londrina localiza‐se no decorrer desta linha do tempo com ocupação iniciada a partir da década de 1930 e, na década de 1960, encontra‐se no declínio de seu apogeu econômico decorrente do ciclo cafeeiro. Como o que se quer compreender é a interação da arquitetura com o espaço urbano local, a área central da cidade, por ser onde os processos de renovação se sobrepuseram ao longo das décadas, é a escolhida para aprofundamentos e análises (figura 8).
Os temas relevantes para a pesquisa são distribuídos em quatro capítulos e suas respectivas seções. Na sequência, são resumidamente apresentados os principais objetivos de cada capítulo:
Capítulo 1 – Hibridismos e arquiteturas modernas: modelos de modernidade
Apresenta a primeira metade do século XX como palco para uma diversidade de modernidades e arquiteturas híbridas, sendo o termo “moderno” empregado como adjetivo para caracterizar o que é dotado de novidade. Dois modelos de modernidade tornam‐se dominantes: a de aparências (Art Déco) e o de ruptura (Movimento Moderno), esta dualidade sintetiza duas condições de relação com a cidade, a primeira que adapta a arquitetura “moderna” à cidade tradicional e a segunda que propõe o seu redesenho. O antagonismo entre propostas arquitetônicas e urbanísticas no período, também é tema abordado, assim como o hibridismo presente nas arquiteturas do período. Capítulo 2 – O redesenho como intenção: arquitetura para transformar a cidade A nova arquitetura exige uma nova cidade. O redesenho é definido e caracterizado como o rompimento com a cidade tradicional através da arquitetura. As propostas modernistas primam por estabelecer estratégias de viabilizar este ideal através da célula mínima, posteriormente dos agrupamentos das mesmas, e assim, transformar toda a cidade. São abordados temas como os CIAM´s, Le Corbusier, a dissolução da fronteira entre o público e o privado, o vazio como espaço projetável e a verticalização. Quanto a este último, dois modelos de verticalização são apresentados: o norte‐americano e o modernista, ambos com diferentes estratégias, mas modelos recorrentes na arquitetura brasileira. Ao final do capítulo, e a partir dos conteúdos do capítulo 1 e 2, uma categorização de tipos de implantação e relação de arquitetura com a cidade é proposta a partir de exemplares encontrados no Brasil.
Capítulo 3 – Apropriação de modernidades e releituras: o caso de Londrina
A cidade de Londrina é fruto do contexto de uma modernidade híbrida e diversificada. Os modelos de modernidade são assimilados e reinventados para se obter a imagem modernizante almejada pela sociedade ao longo da primeira metade do século XX. Limitações culturais, legislativas, econômicas e técnicas inviabilizam muitas das propostas de redesenho, mas algumas são atingidas, mesmo que parcialmente. O capítulo visa defini‐los a partir do conteúdo abordado nos capítulos anteriores. Ao final do capítulo, a partir de três edificações londrinenses, é proposta uma ficha síntese, que exemplificam três diferentes estratégias de redesenho encontrados na cidade. Capítulo 4 – Formas modernas e espaço urbano: considerações finais Este capítulo encerra a pesquisa e busca relacionar as conclusões atingidas ao longo da pesquisa e possíveis direcionamentos futuros para a mesma.
1.1 Moderno, modernismo, modernidade, modernização, novo, modernista e modernizante: uma definição
O termo moderno é empregado como adjetivo abrangente para definir qualquer manifestação, obra ou objeto que se diferencie do existente, do antigo ou do tradicional.
A possibilidade de atribuição de um valor moderno a um objeto perpassa a sua comparação como algo antigo, portanto, para o primeiro existir é necessária a existência do segundo. A atitude perante o antigo, pode ser tanto de referência como de desprezo e descrédito, oscilando a forma de abordagem a cada época (LE GOFF, 2003). Por exemplo, na arte Neoclássica a atitude é de referência à antiguidade clássica como modelo ideal a ser imitado, assim como parece ter sido, de certa forma, no Renascimento e no Barroco. Já nas vanguardas artísticas iniciadas a partir da virada do século XIX, a postura é de aversão às tradições e a tudo relacionado a ela. Porém, moderno não é o mesmo que novo, apesar de estarem relacionados. Este último define uma condição diferente: se o moderno necessita do antigo para se contrapor, o novo “é uma ausência de passado” (LE GOFF, 2003, p. 179), algo que surge imaculado, resultante de um esquecimento. Ao buscar a oposição ao antigo, o moderno baseia‐se na novidade, na criação de uma transformação inédita que inevitavelmente se torna ultrapassada ao ser superada por algo mais atual: “o novo está por definição destinado a se transformar no seu contrário, no não‐mais‐ novo, e o moderno passa consequentemente a designar um intervalo de atualidade cada vez mais restrito” (DOURADO, 1997, p. 144). Atualmente, o entendimento do tempo não mais como algo cíclico e sim como algo linear – cujo início se dá com o Iluminismo – privilegia o moderno, ou seja, a constante negação do que o antecede de forma a se atingir o novo.
Esta condição torna o espaço temporal entre o novo e o antigo, cada vez mais curto. A relação moderno/antigo percorre a cultura ocidental desde a Idade Média ao século XIX (LE GOFF, 2003), mas é apenas neste último que o embate ganha valores de oposição. Isto se dá a partir da consciência de modernidade. Baudelaire é considerado o primeiro a empregar o termo no artigo de 1863 “Le peintre de la vie moderne”1. O escritor francês dá a palavra um significado
de transitório, de atual, de fugaz e de moda, definindo‐o como algo que só é perceptível no presente e só faz sentido ao seu tempo. A partir do momento que se compreende o presente como dotado de uma particularidade própria que não pode ser desprezada ou sublimada – a guisa de valores ideais – o abismo entre moderno e antigo se abre.
[...] A modernidade é o transitório, o fugaz, o contingente, a metade da arte, cuja outra metade é o eterno e o imutável. Houve uma modernidade para cada pintor; a maioria dos belos retratos remanescentes dos tempos passados apresenta costumes de sua época. Eles são perfeitamente harmoniosos, porque o costume, o penteado e até o gesto, o olhar e o sorriso (cada época tem seu porte, seu olhar e seu sorriso) formam um todo de uma vitalidade completa. Esse elemento transitório e fugaz, cujas metamorfoses são tão freqüentes, não pode ser desprezado ou ignorado. Suprimindo‐o, caímos forçosamente no vazio de uma beleza abstrata e indefinível [...] (BAUDELAIRE, 2004, p. 127).
Já o termo modernismo, está relacionado a três movimentos de naturezas distintas, sendo elas, literária, artística e religiosa e a intenção de ruptura permeia todos os modernismos (LE GOFF, 2003). Nas artes, o modernismo é frequentemente empregado para incluir sob a mesma égide diversos movimentos estéticos do início do século XX e que se pautam principalmente, na rejeição das tradições acadêmicas e ao modelo clássico. Já o conceito de
modernização, pressupõe o domínio ou a superioridade de um modelo perante outro existente,
de modo a este ser substituído pelo primeiro, seja através da força ou pela imposição de sua preponderância.
QUADRO 2: Definições dos termos: moderno, modernismo, modernidade, modernização e novo
Fonte: Própria autora, 2011
A arquitetura do Movimento Moderno é moderna, parte do modernismo do século XX, por buscar declaradamente se opor as tradições e aos “estilos” empregados pelo Ecletismo, ou seja, escolhe um passado a qual se opor. Portanto, sendo moderna, se opõe ao antigo, mas almeja tornar‐se o novo. No caso brasileiro, o contraditório fato da arquitetura do Movimento Moderno florescer ao mesmo tempo em que há uma preocupação quanto à preservação de um determinado passado como representativo e digno da nação, talvez seja um reflexo da exigência da modernidade para a produção do novo.
Para esta pesquisa, ao se tratar da arquitetura do Movimento Moderno se adota o termo
arquitetura modernista e quando empregado arquitetura moderna refere‐se à definição mais
dilatada do termo que incorpora outras possibilidades arquitetônicas modernizantes.
QUADRO 3: Significados adotados na pesquisa para modernizante e modernista
Fonte: Própria autora, 2011
1.2 Pluralidade de modernidades na primeira metade do século XX
O final do século XIX ao início do século XX configurou‐se como um momento de mudanças no contexto social, político e econômico. O crescimento das cidades em detrimento da vida no campo, a intensificação da produção industrial para a massa, o encurtamento das distâncias através dos novos meios de transporte, a eclosão dos conflitos mundiais e lutas pela hegemonia no mundo, são alguns dos acontecimentos que marcaram a transição do século XIX para o XX e as primeiras décadas do novo século. Este ambiente tumultuado sinalizou a diversidade de um período fundamental para qualquer compreensão da atualidade. Nas artes e na arquitetura os discursos dos diferentes “ismos” e a resistência às mudanças dos grupos conservadores, são razões que motivam e fomentam as principais discussões da época.
Nos movimentos artísticos a busca por formas de expressão que negam a partir de diferentes estratégias, os modelos do passado como referência, já se evidencia nos séculos XVIII e XIX, através do Romantismo que adota novas técnicas pictóricas e novas temáticas. No final século XIX, se fortalece o desejo de libertação dos cânones clássicos e “revolucionar radicalmente as modalidades da arte” (ARGAN, 1992, p. 185). Este processo se intensifica nas vanguardas, até a perda do objeto figurativo, alcançada primeiramente com o impressionismo na virada do século XIX para o XX e levado ao extremo pela arte abstrata, dadaísmo e tantas outras correntes vanguardistas. A crítica ao espaço pictórico estático é tema abordado pelo cubismo, e a exaltação da estética da máquina passa a fazer parte da apologia do futurismo.
Na arquitetura, as experiências artísticas das vanguardas são assimiladas e reelaboradas em aspectos construtivos. O Art Nouveau, que revoluciona e influencia e arquitetura e o design da virada do século, apresenta sinais de desgaste no início do século XX e novas propostas buscam suplantar sua hegemonia.
Mas ao mesmo tempo em que se configuram rupturas, o rompimento completo não é almejado por algumas correntes arquitetônicas do período, entre elas, pode‐se citar o Ecletismo e o Art Déco. Estas tendências não se encerram com o advento do Movimento Moderno no final da década de 1920, mas sim, muitas vezes, ainda são vigentes até a década de 1940. Na verdade, entre cerca de 1890 e a década de 1920, surgiram inúmeras posições que apresentavam a “modernidade” como o seu principal atributo, até o momento em que, em 1920, finalmente se chegou a um consenso amplo. Pelo menos, isso é o que alguns profissionais e defensores queriam que seus contemporâneos acreditassem. Assim, eles investiram esforços consideráveis para diferenciar as características do “Estilo Internacional” [...]. Eles defendiam que essa era a arquitetura realmente autêntica do século vinte. Outros avanços contemporâneos eram convenientemente desconsiderados e tudo feito para “se rebocar” diferenças e preservar a fachada de uma frente unificada. (CURTIS, 2008, p. 12)
Neste sentido, no início do século XX, podem ser identificadas várias tendências arquitetônicas em desenvolvimento, cada uma em busca da modernidade sintetizadora dos novos tempos. Como já destacado na seção 1.1, o termo moderno – especialmente quando empregado na primeira metade do século XX – é adjetivo usado para definir qualquer forma diferente, atual ou recente que se oponha ao existente, ao tradicional ou ao senso comum. O artigo de Renato Anelli (in GUERRA, 2010a), ao pesquisar a recepção da mídia impressa quando da inauguração dos cinemas na cidade de São Paulo na década de 1930, conclui que independente de adotarem uma estética em “estilo” exótico (egípcio, inca, mourisco, marajoara, etc.) são todos eles considerados modernos, indistintamente:
A vontade de ser moderno, entendido como uma diferenciação do que é arcaico, passa por uma valorização estética das manifestações da técnica e da urbanidade, de maneira semelhante ao futurismo, que glorifica a velocidade e a destruição daquilo que é velho. Nesse processo tudo que é novo se torna igualmente moderno, Todos os cinemas foram saudados pela imprensa na sua inauguração como modernos, fosse qual fosse o seu estilo[...] (ANELLI in GUERRA, 2010a, p. 264, grifo nosso).
Na Revista Acrópole – publicação de São Paulo que circulou ao longo dos anos 1938 a 1971 com distribuição em várias capitais e cidades do país – nos números referentes às décadas iniciais até 1940, entre os temas abordados estão os “estilos” como protorenascença, florentino,
marajoara, entre outros. Ao mesmo tempo, há artigos a favor da “arquitetura moderna” de filiação racionalista e exemplares de linhas ecléticas, neocoloniais e art déco e são todos igualmente adjetivados como modernos em páginas seguintes. À parte da discussão sobre os mecanismos de seleção das obras a serem publicadas na revista, o interessante é notar a possibilidade de uma convivência entre tendências – que atualmente podem ser consideradas contrárias – em uma mesma publicação, o que só atesta uma heterogeneidade de formas modernas sendo produzidas e que dividem um mesmo espaço.
FIGURA 9: Acima, imagens do Cine Metro (aspecto externo e interno) e abaixo fotografias do Edifício Esther, projeto de Álvaro Vital Brasil, ambos em São Paulo/SP e contemporâneos
Fonte: Acrópole, maio‐1938, p. 45, 47 e 55
A revista Acrópole de maio de 1938 ilustra esta situação: no início da revista há uma matéria sobre o Cine Metro, descrito como “construcção em concreto armado, a fachada é simples e sóbria, linhas horizontaes e verticaes”, cuja forma, de acordo com a reportagem, segue o padrão internacional adotado pelo estúdio Metro Goldwin Meyer (proprietária do imóvel). Já ao final da publicação, há o memorial do Edifício Esther, localizado em São Paulo, dos arquitetos Álvaro Vital Brasil e Adhemar Marinho com clara alusão à Le Corbusier onde se afirma ter sido a forma resultado direto da planta através da busca por soluções de maior funcionalidade. Ambos os edifícios materializam intenções modernas e atestam a diversidade de modernidades de uma época em ebulição. (figura 9)
As exigências por uma maior simplificação de formas onde primasse a ortogonalidade, limpeza de ornamentos e definição clara de volumes, tornam‐se itens a serem considerados relevantes no campo da arquitetura de forma a limpá‐las de excessos e de formas de difícil execução. Os arquitetos Charles Rennie Mackintosh, Otto Wagner e Josef Hoffmann estão entre os que já repercutem esta tendência no início do século XX (figura 10 e 11). Os conflitos mundiais e o período entre guerras acentua ainda mais esta exigência nas décadas de 1920 e até a década de 1930 (MALLGRAVE, 2005), quando a demanda por habitação, faz a necessidade de construções de execução mais rápida aumentar exponencialmente. Isto justifica o grande número de propostas modernas ocorrerem neste período, principalmente, nos países diretamente envolvidos nos conflitos. É neste contexto que o Movimento Moderno se fortalece e assume para si a pretensão de ser a arquitetura moderna adequada ao momento onde o caráter funcional, economia, standartização e rapidez tornam‐se as qualidades que a qualificam como a arquitetura ideal para tal intento.
O cenário europeu composto por uma profusão de tendências não é diferente do encontrado no Brasil no início do século. Nas cidades brasileiras é notável a presença de uma
arquitetura que não se encaixa nas intenções difundidas pelo Movimento Moderno e onde adornos geometrizados, composições volumétricas imbricadas e formas aerodinâmicas são considerados como significativas para representar uma tendência particular. Ou então há arquiteturas que conseguem viabilizar, mas apenas parcialmente, intenções modernizadoras difundidas pelas vanguardas artísticas e propostas modernistas, caso das obras de Gregori Warchavchik e Flávio de Carvalho na década de 1920 no Brasil. FIGURA 10: Palais Stoclet em Bruxelas (1905) de Josef Hoffman FIGURA 11: Casa de Chá “The Willow Tea Rooms” em Glasgow (1902‐1904) de Rennie Mackintosh Fonte: < http://www.greatbuildings.com/buildings/ Stoclet_Palace.htm>, acesso em Mai. 2011 Fonte: < http://www.greatbuildings.com/ buildings/The_Willow_Tea_Rooms.html>, acesso em Mai. 2011
Para Castriota (1997) a arquitetura na virada do século no Brasil pode ser dividida em três grandes blocos com intenções modernizadoras: historicismo oitocentista, o modernismo art
nouveau e art déco e o movimento moderno vanguardista. Ainda para o autor, entre os
diferentes blocos não há uma seqüência, como se um substitui‐se o outro, mas sim “vamos encontrar muitas vezes convivendo lado a lado variantes da atitude moderna” (CASTRIOTA, 1997, p. 180). Portanto, são tendências que “correspondendo a diferentes resultados formais, produzem inusitadas justaposições temporais e espaciais” (ibidem, p. 180). A justaposição de
tendências torna alguns exemplares bastante híbridos e de complexa definição estilística, a não ser que se aceite ser ele fruto de várias tendências sobrepostas.
O modernismo nouveau/déco e o de vanguarda, por serem tendências modernas, negam os referenciais passadistas, ao contrário do historicismo oitocentista, representado especialmente pelo ecletismo. Dessa forma, as correntes de intenções modernas constituem‐se em estratégias inovadoras frente aos desafios de uma época, cada qual ao seu modo. Ambos são reflexos dos conflitos mundiais e da industrialização e conseqüente urbanização que, somados, geram a demanda por novas construções e a necessidade de novos equipamentos e espaços nas cidades.
[...] enquanto a arquitetura das vanguardas é incensada pela historiografia e amplamente documentada e discutida, o Déco é visto até a pouco tempo, como uma variante sem maior importância para a compreensão da arquitetura brasileira, sendo na maioria das vezes relegado ao esquecimento. (CASTRIOTA, 1997, p. 179)
A tendência Déco no Brasil, frequentemente serve para reunir uma diversidade de manifestações que não se encaixam dentro do esquema proposto pelas vanguardas ou pela tendência modernista, já que esta última apresenta aspectos específicos difundidos internacionalmente.
Coelho (2000) considera o Art Déco como uma vertente da modernidade presente nas cidades brasileiras na primeira metade do século XX. Outra tendência identificada pelo autor é definida como arquitetura alemã, ou seja, a arquitetura de caráter racionalista. A diferença entre as duas é que enquanto a primeira “ocorre de forma mais integrada culturalmente, sem as usuais conceituações de rupturas” (ibidem, p. 26) o que lhe confere maior aceitação popular e a faz funcionar “como um elemento de transição entre a tradição e as propostas racionalistas” (ibidem, p. 26), a segunda já almeja o engajamento social e o desejo de constituir‐se em um movimento com princípios estabelecidos que a universalizam.
A grande diferença está também na concepção de espaço necessária para a realização das propostas modernizantes. O Art Déco se acomoda a cidade existente, enquanto as tendências de vertentes vanguardistas e modernista exigem uma nova espacialidade para se materializarem. Apesar da chave da diferenciação entre as propostas modernistas e déco estar na relação da arquitetura com a cidade, esta equivalência entre forma urbana e a intenção arquitetônica nem sempre foi possível na primeira metade do século XX, sendo o mais corrente a desconexão entre a arquitetura e o traçado urbano, especialmente nas cidades já consolidadas. A discrepância entre ideais e condições reais, vai resultar em um hibridismo formal e na dualidade de tendências nas cidades, no período ou então é possível identificar o compromisso com a arquitetura modernista ou vanguardista, em algumas obras que buscam estratégias para conseguir viabilizar o intento, apesar de o espaço urbano existente apresentar limitantes.
Sendo assim, a dualidade entre propostas modernistas e déco pode caracterizar as possibilidades arquitetônicas modernizantes nas primeiras décadas XX. A diferença entre ambas é devido à primeira pretender levar adiante o desejo vanguardista de mudar a cidade e, já a segunda, relaciona‐se mais a uma intenção de estabelecer uma transformação epidérmica que confere aparência moderna aos edifícios.
1.2.1 O antagonismo entre propostas arquitetônicas e urbanísticas
Quando observada a produção do espaço urbano das cidades brasileiras nas décadas iniciais do século XX, encontram‐se pontos antagônicos ou personagens de tendências consideradas atualmente opostas, trabalhando ao mesmo tempo na construção das cidades. Esta condição reforça o cenário encontrado no período onde o desejo de mudança do Movimento Moderno ou das vanguardas não consegue se materializar plenamente.
FIGURA 12: Plano Agache para a cidade do Rio de Janeiro de 1930 Fonte: GOMES (org.), 2009 FIGURA 13: Maquete (imagem acima) e planta (imagem baixo) dos blocos denteados (a redent) da Ville Radieuse de Le Corbusier, 1930 Fonte: MONTEYS, 2005 No Rio de Janeiro há a presença de Le Corbusier em 1929, quase ao mesmo tempo em que Alfred Agache chega à cidade a convite do prefeito para “realizar um plano de expansão,
embelezamento e remodelação” (PINHEIRO, 2009, p. 119). Le Corbusier é membro e um dos fundadores dos Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (CIAM), instaurados um ano antes enquanto Agache “é herdeiro da tradição Beaux‐Arts” e do “Movimento City Beautiful” (ibidem, p. 119). Dessa forma, enquanto Le Corbusier exige a reconfiguração da cidade, Agache propõe plano onde se perpetua o modelo rua‐corredor. (figura 12 e 13) O Plano de Remodelação de Alfred Agache2 para a cidade do Rio de Janeiro, então capital federal do Brasil, é editado em 1937 e, apesar de não executado totalmente, apresenta aspectos condizentes com os valores de modernidade almejados no período, como o ordenamento viário da cidade, a verticalização, zoneamento e diretrizes para a implantação dos edifícios de modo a criarem‐se espaços mais salubres e funcionais. Mas, a modernidade proposta por Agache não vai de encontro aos princípios almejados pelo Movimento Moderno no período, a ponto de Le Corbusier considerar o plano como “lixo agáchico” (SEGAWA, 2002, p.91) em carta endereçada à equipe brasileira que conduzia os trabalhos para a Sede do Ministério da Educação e Saúde (antigo MES, atual MEC).
O aspecto do plano de Agache a qual Le Corbusier se refere na crítica ofensiva ao proposto pelo urbanista francês ancora‐se no fato da legislação resultante do mesmo obrigar a implantação de edifícios alinhados aos limites dos lotes, sem espaçamentos entre as torres, tornando os miolos das quadras locais reservados aos ocupantes dos edifícios. Mesmo nos edifícios verticais que – seguindo as recomendações de implantação do Plano Agache – formam galerias térreas para pedestres ou loggia´s, estas ocorrem através da projeção do volume edificado sobre o passeio, ou seja, são externas aos limites do lote privado (figuras 14, 15 e 16). FIGURA 14: Av. Presidente Vargas, Rio de Janeiro/ RJ, edifícios com
galerias térreas e implantação avançando sobre o passeio 2 Donat Alfred Agache (1875‐1959), urbanista francês “que vinha se notabilizando na França desde 1910, em assuntos urbanísticos” (SEGAWA, 2002, p. 25) , elabora planos para o Rio de Janeiro, Belo Horizonte (consultoria para o prefeito JK no final dos anos 1930), Porto Alegre (desenho do Parque Farroupilha em 1935), Curitiba (Plano Diretor em 1943), etc.
FIGURA 15: Vista aérea de trecho da Av. Presidente Vargas, Rio de Janeiro/ RJ, edifícios formando rua‐corredor
FIGURA 16: Rua Heitor de Melo, Rio de Janeiro/RJ, com as galerias térreas e avanço dos edifícios sobre o passeio Fonte: Google Earth – Google Street View <www.googleearth.com>, acesso em Jun. 2011 Os princípios do Movimento Moderno pretendem radicalizar com a propriedade privada do solo quando em torres verticais, tornando os térreos locais para a fruição coletiva, além disso, o distanciamento entre as torres e em relação à via pública é defendido como soluções mais salubres e econômicas de implantação do que os que mantêm os edifícios ainda contínuos uns aos outros. No Plano Agache o lugar da praça pública é claramente definido e delimitado pelo espaço privado construído ao redor e esta relação, entre arquitetura e espaço público, resulta
em uma concepção espacial estática diferente do espaço com inúmeras possibilidades de percolação da Ville Radieus, e idealizada em 1930 por Le Corbusier (figura 13). Nesta, o público e o privado se confundem e as vias de percolação e tráfego não são barreiras para o desenvolvimento livre do espaço privado, representado pelo edificado, a ponto de ambos coexistirem em um mesmo lugar, mas em planos diferentes, através do uso de pilotis. FIGURA 17: Edifício da Bauhaus em Dessau na Alemanha, projeto de Walter Gropius de 1929 Fonte: < http://www.greatbuildings.com/buildings/Bauhaus_Dessau.html>, acesso em Mai. 2011 Walter Gropius em 1929 no projeto para o Edifício da Bauhaus em Dessau já emprega a confusão entre arquitetura e urbanismo proposta por Le Corbusier na Ville Radieuse através da colocação de um edifício ponte sobre a via, e assim interligando duas quadras segregadas inicialmente pelo espaço público. Esta solução é bastante adotada em conjuntos residenciais construídos no entre‐guerras na Alemanha. (figura 17)
Se considerada a arquitetura do Movimento Moderno como uma das tendências dominantes a partir de final de 1930 no Brasil que progressivamente assume cada vez mais hegemonia nas cidades, o descompasso entre os princípios do urbanismo modernista e do que é construído nas cidades, ainda se encena, décadas depois, na cidade de Londrina no interior do Paraná. Em 1950, o arquiteto Vilanova Artigas e o urbanista Prestes Maia são chamados – praticamente ao mesmo tempo – para apresentarem propostas para a cidade a título de lhe