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Como era na favela? Como é no conjunto?: relações entre propriedades espaciais e modos de uso no caso do reassentamento da Favela do Maruim em Natal/RN

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Academic year: 2021

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CENTRO DE TECNOLOGIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO

FLÁVIA MONALIZA NUNES SECUNDO LOPES

COMO ERA NA FAVELA? COMO É NO CONJUNTO?

Relações entre Propriedades Espaciais e Modos de Uso no Caso do Reassentamento da Favela do Maruim em Natal/RN.

Natal/RN Maio, 2018

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FLÁVIA MONALIZA NUNES SECUNDO LOPES

COMO ERA NA FAVELA? COMO É NO CONJUNTO?

Relações entre Propriedades Espaciais e Modos de Uso no Caso do Reassentamento da Favela do Maruim em Natal/RN.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo (PPGAU) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre.

Linha de Pesquisa: Morfologia, Usos e Percepção do Ambiente Construído.

Orientador: Prof. Dr. Rubenilson Brazão Teixeira Coorientadora: Profª. Drª. Edja Bezerra Faria Trigueiro

Natal/RN Maio, 2018

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Dr. Marcelo Bezerra de Melo Tinôco - DARQ - -CT

Lopes, Flávia Monaliza Nunes Secundo.

Como era na favela? Como é no conjunto?: relações entre propriedades espaciais e modos de uso no caso do reassentamento da Favela do Maruim em Natal/RN / Flávia Monaliza Nunes Secundo Lopes. - Natal, 2018.

148f.: il.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Tecnologia. Departamento de Arquitetura e

Urbanismo.

Orientador: Rubenilson Brazão Teixeira. Coorientadora: Edja Bezerra Faria Trigueiro.

1. Habitação - Dissertação. 2. Forma da arquitetura - Usos dos espaços - Dissertação. 3. Reassentamento de Favelas -

Dissertação. 4. Conjuntos Habitacionais - Dissertação. 5. Favela do Maruim - Natal/RN - Dissertação. I. Teixeira, Rubenilson Brazão. II. Trigueiro, Edja Bezerra Faria. III. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. IV. Título.

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À população do Maruim, hoje no São Pedro. Pessoas que me acompanharam e deram sentido à minha trajetória profissional até então. Obrigada pela disponibilidade e acolhida em todos os tempos.

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A G R A D E C I M E N T O S

À agência CAPES pelo apoio financeiro fundamental para o andamento e conclusão desta pesquisa. Aos meus pais, que por vezes acharam que eu estava “pirando” em largar “tudo” para investir em um sonho maluco, mas por fim entenderam que a realização dele me faz uma pessoa mais feliz a cada dia. Obrigada pelo apoio fundamental em todas as fases da vida. Essa é mais uma, mais um degrau que subo e nada seria possível sem a ajuda de vocês.

À Tiago, meu companheiro, que me ajudou, me ajuda e investe na realização desse sonho junto comigo. Obrigada por sempre acreditar em mim, até mesmo quando nem eu acredito.

Às minhas irmãs, Fábia e Mara, pela força em todos os momentos e por acreditarem que essa era a escolha acertada desde sempre.

Aos meus cunhados, que assim como minhas irmãs, participaram e incentivaram toda esta jornada. Ao meu Orientador, Professor Rubenilson Teixeira, pela dedicação, eficiência e organização. Obrigada por me ajudar a colocar as ideias no papel de maneira mais clara e objetiva. Sua contribuição foi fundamental para minha evolução como pesquisadora.

À minha Coorientadora, Professora Edja Trigueiro, pela dedicação a esta pesquisa (que foi além de uma coorientação comum), pela amizade e por me ensinar a ensinar e evoluir como pessoa, pesquisadora e mulher todos os dias. Nossa convivência quase que diária vai fazer falta e ainda vai deixar saudades.

Às Professoras da minha banca, Amadja Borges e Circe Monteiro, que contribuem para a evolução desta dissertação desde a banca de qualificação com observações preciosas.

À Nalvinha, moradora do Residencial São Pedro, minha companheira de andanças pelos assentamentos desde os tempos de graduação. Sua disponibilidade e companheirismo foram indispensáveis em todos os momentos.

Aos Professores e Professoras do PPGAU e do DARQ que me inspiraram e me ajudaram de alguma maneira na minha passagem pela UFRN: Marcelo Tinôco (in memorian) ajuda fundamental na fase inicial desta pesquisa; Gleice Elali, Amadja Borges, Márcio Valença, Aldomar Pedrini, Dulce Bentes, Clewton Nascimento, Amíria Brasil e Hélio Takashi.

Aos funcionários do PPGAU, Nicolau, Vivi e Seu Mário que me aguentaram por todo esse tempo pedindo café, conversando lorota e implorando por mais prazo. Obrigada pela disponibilidade de sempre, vocês são demais.

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Aos componentes do grupo MUsA; Maria, Andreia, Fabrício, Nicholas, Mauricio, Ítalo, Ugo e Camila; pelo apoio fundamental, disponibilidade, troca de conhecimentos, ajuda e paciência que tiveram comigo durante a convivência.

À Lucy, por toda amizade e disponibilidade para ensinar e estar junto sempre.

Aos colegas alunos do PPGAU e do DARQ, pessoas sempre disponíveis para ajudar, trocar experiências, compartilhar alegrias, angústias e conquistas.

Aos meus amigos que estão além da academia, não vou citar o nome de todos ou poderia estar sendo injusta com alguém, agradeço pela paciência, ajuda e força durante o tempo de realização desta dissertação.

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R E S U M O

Nesta dissertação foram investigadas relações entre forma e usos da arquitetura visando identificar efeitos que alterações morfológicas nos espaços abertos de uso coletivo possam ter exercido sobre modos de uso desses espaços. Especificamente, buscou-se compreender se, e como, usos preexistentes foram modificados após o reassentamento de uma população de uma favela, assentamento orgânico, autoconstruído – Favela do Maruim – para um conjunto habitacional, planejado pelo estado – Conjunto São Pedro. Com base no referencial teórico da Sintaxe do Espaço (HILLIER; HANSON, 1984), partiu-se do pressuposto que a forma da Arquitetura – resultante do arranjo de cheios (massas construídas) e vazios (permeabilidades) – estrutura possibilidades e restrições ao ir e vir estar e enxergar, as quais definem campos potenciais de copresença e movimento de indivíduos no espaço. Neste caso, a hipótese foi de que a natureza morfológica do conjunto é oposta à da favela, sendo assim, alterou tipos de relações espaciais, da micro à macro escala, e possivelmente modificou padrões de copresença, uso do lugar e interação entre os diferentes indivíduos no espaço – moradores locais e estranhos (não locais). O conjunto subverteu a lógica autodefensiva e de proximidade entre os moradores da Favela para um movimento mais similar ao da cidade de maneira global – onde há maior potencial de encontro entre diferentes. A abertura para a cidade aproximou a população reassentada do discurso do medo, da reclusão dentro de casa e da criação de muros e barreiras para o espaço público. Na busca de comprovar a hipótese, foi realizado um estudo comparativo de instâncias potenciais e episódios reais de encontro através da análise dos espaços, e visitas in loco na favela e no conjunto. Técnicas da Análise Sintática do Espaço (ASE) caracterizaram a inserção de cada assentamento na malha da cidade na perspectiva de entender acessibilidades “ao caminhar” e “ao olhar” por meio de instrumentos que exploram relações topológicas e distâncias métricas. Para entender a relação entre a massa construída e a estrutura de espaços abertos foram examinados usos locais e relações entre espaços públicos e privados. Em busca de compreender os usos reais do espaço, foram observados o movimento peatonal e traços físicos do espaço; ainda foram realizadas entrevistas semiestruturadas com a população. Os resultados mostram que a configuração da favela, desordenada e menos integrada ao tecido urbano da cidade, delineava um enclave que diminuía a interface de encontros entre diferentes (moradores e estranhos). Internamente, uma forte hierarquia e coesão entre acessibilidades (local e vicinal “ao caminhar” e “ao olhar”), privilegiava o uso de certos espaços abertos pelos moradores. Estes funcionavam como extensão da casa dos habitantes locais, como pontos de confluência de encontros, passagem de pedestres e de atividades com forte ligação público/privado. O conjunto, por sua vez, com uma ordem de acessibilidade e visibilidade mais homogênea, pouco hierárquica, com ligações público/privado frequentemente interrompidas, ainda que mais integrado à cidade, estimula a interface de encontros entre diferentes, enquanto restringe potenciais encontros entre moradores. Em um esforço de contornar as limitações da forma da arquitetura, moradores persistem em estar nos espaços coletivos do conjunto, ocupação aparentemente consubstanciada na presença dos tapumes, uma vez que estes contribuem para aproximar o conjunto da lógica de enclave da Favela, apartando-o do contínuo espacial da cidade e consolidando barreiras que vem, de resto, se tornando recorrentes na construção de residências em cidades brasileiras nos últimos anos.

Palavras-Chave: Forma da Arquitetura, Usos do Espaço, Reassentamento de Favelas, Conjuntos Habitacionais, Favela do Maruim, Natal.

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A B S T R A C T

This study addresses relations between form and use of architecture with the aim of investigating whether morphological changes regarding open spaces shared by a housing community might have exerted over the way people use those spaces. It aims to shed light on whether and how the reallocation of a self-built organic settlement – Favela do Maruim – to a regularly schemed, state-funded housing estate – Conjunto São Pedro – led to alterations in the way people used common open spaces in their previous environs. Guided by the Space Syntax theory (HILLIER; HANSON, 1984), the investigation approach stems from the assumption, that architectural form - structured by masses (buildings) and voids (permeability) - offer possibilities and restrictions concerning moving, being and seeing, and, therefore, define potential fields of co-presence and movement by individuals in space. The hypothesis underlying the case study was that because the morphological nature of the housing estate diverges from that of the Favela settlement, spatial relations are altered from the micro to the macro scale, thus prompting changes in patterns of co-presence, use of communal areas and interaction among diverse individuals in space – inhabitants, visitors and strangers (insiders and outsiders). In the Housing Estate the self-defensive logic of nearness among residents that existed in the Favela was subverted and replaced by another more similar to that which prevails in the city as a whole, with a higher potential of encounter fields. The less enclosed arrangement appears to threat the resettled population, bringing about the discourse of fear, which enforces reclusion inside an area severed from the public space by walls and barriers. In the search to test the hypothesis, comparative studies of potential and real instances of encounter were carried out by means of spatial analysis and of in loco visits regarding actual use in the Favela and the Housing Estate. Space syntax analysis was applied to quantify the insertion of each settlement in the city grid, in topological and metric distances, to gauge accessibilities “by foot” and “to the eye”. In order to understand the relation between the built mass and the structure of open spaces, local uses and relations between public and private spaces were analysed. To understand the real uses of space, the data gathering process included the observation of pedestrian movement and physical traces of space; and enquiries about the ways people use common areas, by means of semi-structured interviews. The results show that the Favela configuration, disorderly and less integrated with the city urban grid, outlined an enclave that decreased the potential encounter field between insiders and outsiders. Internally, a stronger hierarchy and cohesion concerning diverse accessibility catchment levels (local, vicinal, to the feet or the eyes) privileged the use of certain open spaces by the inhabitants. Those points that showed strong public/private connections, worked as extensions to the houses and as confluence points for encounter, pedestrian flows and activities. In the Housing Estate, on the other hand, a homogeneous, less hierarchical internal structure, with low cohesion concerning accessibility levels, less openings connecting closed/open spaces and higher integration to the city grid, stimulate the interface between insiders and outsiders, whereas restraining the potential encounter field amongst inhabitants. On an effort to overcome the limitations of the architectural spatial form, inhabitants persist on being in the Housing Estate common areas, an occupation apparently consubstantiated by the presence of construction fences that approximates the Estate’s spatial structure to the Favela’s enclave logic, setting it apart from the city continuous space and consolidating barriers, which at any rate, are becoming the norm, concerning residential premises in Brazilian cities.

Key words: Architectural Form, Use of Space, Favela Reallocation, Housing Estate, Favela do Maruim, Natal.

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L I S T A D E F I G U R A S

FIGURA 01: A. Conjunto singapura São Paulo/SP; B. Conjunto cidade de deus Rio de Janeiro/ RJ; C.

Conjunto leningrado natal/RN; D. Conjunto Novo Horizonte (ex favela do detran) Natal/RN. ...24

FIGURA 02: A. Chegada dos hidroaviões em Natal na década de 1940, com destaque para o Maruim; B. Detalhe da placa da colônia de pescadores; C. Canto do Mangue em 1944; D. Ocupações da favela do maruim na década de 1980 ...26

FIGURA 03: Linha de limite do bairro da Ribeira com apontamentos da localização do porto e da favela – conflito fundiário ...27

FIGURA 04: A. Vista aérea maruim; B. Vista do Maruim a partir do rio; C,F.Ruas da favela; D. Conjunto São Pedro; E. Favela sendo demolida; G, H, I. Ruas do condomínio ...32

FIGURA 05: A. divisão da intervenção; B, C, E. imagens do projeto de urbanização; d. moradora no trato de animais ...33

FIGURA 06: Gráficos dos sexos e idades dos chefes de família. ...34

FIGURA 07: Gráficos do número de pessoas por profissão citada e a distribuição por sexo em cada uma delas. ...35

FIGURA 08: Gráficos do número de pessoas em cada faixa de renda e distribuição da renda por sexo. ...36

FIGURA 09: Esquema sobre o referencial teórico da análise espacial do trabalho ...40

FIGURA 10: Abstração do espaço para a sintaxe. ...41

FIGURA 11: Demonstração da aplicação dos grafos no espaço ...44

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FIGURA 13: Esquema sobre possibilidades e restrições com relação à configuração dos vazios ...47

FIGURA 14: Esquema sobre possibilidades e restrições dos cheios ...51

FIGURA 15: Esquema da síntese da análise espacial ...58

FIGURA 16: Mapa de eixos de Natal ...61

FIGURA 17: Mapa axial de Natal (RN) ...62

FIGURA 18: Esquema da síntese da análise da acessibilidade “ao caminhar” a partir dos eixos de movimento para este trabalho...66

FIGURA 19: Definição de espaço convexo/côncavo ...67

FIGURA 20: Esquema da síntese da análise da acessibilidade “ao caminhar” a partir dos espaços convexos. ...68

FIGURA 21: Exemplo da geração e forma de uma isovista ...69

FIGURA 22: Modo de processamento do VGA ...70

FIGURA 23: Esquema da síntese da análise da acessibilidade “ao olhar” para este trabalho ...71

FIGURA 24: Distância entre os assentamentos ...74

FIGURA 25: Foto de 1941 – formação inicial do assentamento / divisão da favela e distribuição de ilhas ...75

FIGURA 26: Gráfico das áreas e números de ilhas do sistema da favela. ...75

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FIGURA 28: Gráfico dos tipos edilícios presentes na Favela do Maruim ...77

FIGURA 29: Maruim E São Pedro no contexto urbano: mapa axial de integração rn...79

FIGURA 30: Tabela com medidas derivadas do mapa axial. ...80

FIGURA 31: Gráfico da correlação entre profundidade média e valor de integraçãohh_rn (derivado do mapa axial) dos três assentamentos ...80

FIGURA 32: Mapa de integração visual (vga) com ruas adjacentes ...82

FIGURA 33: Mapa de integração visual (VGA) assentamentos ...83

FIGURA 34: Sobreposição das acessibilidades “ao caminhar” e “ao olhar” ...85

FIGURA 35: Mapa de interfaces público/privado ...87

FIGURA 36: Simulação do espaço sem tapume. ...88

FIGURA 37: Mapas de uso e ocupação do solo ...90

FIGURA 38: Exemplo do mapa elaborado em campo ...95

FIGURA 39: Observação dos modos de uso na favela ...98

FIGURA 40: Gráfico do número de pessoas por observação no Conjunto São Pedro ...99

FIGURA 41: Gráficos do tipo de pessoas encontradas por observação no Conjunto São Pedro. ...100

FIGURA 42: Médias dos tipos de atividades realizadas no espaço no momento das observações no Conjunto São Pedro ...102

FIGURA 43: Observação da diversidade de pessoas no espaço do conjunto no dia 21/10/2017 sobreposta ao VGA que mostra a medida de integraçãoHH_raioN ...104

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FIGURA 44: Observação da distribuição do movimento e copresença no espaço do conjunto no dia

21/10/2017 sobreposta ao mapa axial que mostra a medida de integraçãoHH_raioN. ...104

FIGURA 45: Observação da diversidade de pessoas no espaço do conjunto no dia 24/10/2017 sobreposta ao VGA que mostra a medida de integraçãoHH_raioN. ...105

FIGURA 46: Observação da distribuição do movimento e copresença no espaço do conjunto no dia 24/10/2017 sobreposta ao mapa axial que mostra a medida de integraçãoHH_raioN. ...107

FIGURA 47: Observação da diversidade de pessoas no espaço do conjunto no dia 27/10/2017 sobreposta ao VGA que mostra a medida de integraçãoHH_raioN. ...108

FIGURA 48: Observação da distribuição do movimento e copresença no espaço do conjunto no dia 27/10/2017 sobreposta ao mapa axial que mostra a medida de integraçãoHH_raioN. ...109

FIGURA 49: Recorrências espaciais de ações de apropriação e vulnerabilidade no espaço da Favela do Maruim ...113

FIGURA 50: Recorrências espaciais de ações de apropriação e vulnerabilidade no espaço do conjunto São Pedro ...115

FIGURA 51: A e B. roupas estendidas na favela / C e D.a recorrência da prática no conjunto ...116

FIGURA 52: Roteiro da entrevista semiestruturada ...118

FIGURA 53: Resultado sobre a utilização dos espaços abertos da favela e do conjunto...120

FIGURA 54: Resultado sobre os tipos de atividades desenvolvidas nos espaços abertos da favela e do conjunto ...121

FIGURA 55: Resultado sobre com quem utilizavam / utilizam os espaços abertos da favela e do conjunto ...122

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FIGURA 56: Resultado sobre a presença de estranhos nos espaços abertos da favela e do conjunto ...123

FIGURA 57: Resultado sobre locais utilizados para desenvolver as atividades para o espaço da favela e do conjunto ...124

FIGURA 58: Resultado sobre o horário que utilizavam os espaços abertos da favela e do conjunto...126 FIGURA 59: Resultado da opinião dos moradores sobre a questão do tapume ...128

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S U M Á R I O

INTRODUÇÃO...17

1. DO MARUIM AO SÃO PEDRO ...21

1.1. Contextualização do Caso de Estudo ...21

1.2. O Caso do Reassentamento do Maruim ...25

1.3. A População Estudada em Números ...33

2. POSSIBILIDADES E RESTRIÇÕES DA FORMA DOS ESPAÇOS ...37

2.1. A Lógica Social do Espaço e as Comunidades Virtuais...37

2.2. Possibilidades e Restrições: a partir dos vazios (permeabilidades) ...40

2.3. Possibilidades e Restrições: a partir dos cheios (barreiras) ...47

2.4. Objeto Espacial: Favela e Conjunto ...51

3. A COMUNIDADE VIRTUAL À LUZ DA ANÁLISE MORFOLÓGICA ...57

3.1. Como Analisar a Comunidade Virtual a Partir da Ótica Morfológica ...57

3.2. Resultados da Análise Morfológica ...72

4. A COMUNIDADE VIRTUAL À LUZ DO ESPAÇO REAL ...92

4.1. Como analisar o Que Fazem ...93

4.2. Resultados: “o que fazem” ...97

4.2.1. Resultados: observação da atividade peatonal ...97

4.2.2. Resultados: observação dos traços físicos do ambiente (apropriação x vulnerabilidade) ...111

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4.4. Resultados: entrevistas semiestruturadas ...119

CONSIDERAÇÕES FINAIS...131

REFERÊNCIAS ...137

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I N T R O D U Ç Ã O

Nesta dissertação investigamos relações entre forma e usos da Arquitetura visando identificar efeitos que alterações morfológicas nos espaços abertos de uso coletivo possam ter exercido sobre modos de uso desses espaços. Especificamente, estudamos se, e como, a mudança de uma favela – assentamento orgânico, autoconstruído – para um conjunto habitacional - planejado pelo Estado – ocasionada por um processo de reassentamento, alterou modos de usos preexistentes nos espaços abertos vivenciados na cotidianidade. Alinhados com o referencial teórico da Lógica Social do Espaço (LSE) (HILLIER; HANSON, 1984) - ou Sintaxe do Espaço (SE) – entendemos a Arquitetura como uma variável independente com implicações na vida das pessoas que a utilizam, sendo assim, é algo a mais que um mero cenário da vida cotidiana, é aspecto intrínseco a cotidianidade ao potencialmente definir, quem se encontra com quem, onde, como e quando. Esse efeito da forma arquitetônica é resultante da justaposição espacial de cheios (massas construídas) e vazios (permeabilidades) que geram campos de possibilidades e restrições para os indivíduos irem, virem, estarem, enxergarem, escolherem caminhos, modos de encontro e esquivanças.

Os assentamentos que compõe o universo de estudo são a Favela do Maruim e o Residencial São Pedro. A Favela, assentamento orgânico, autoconstruído, horizontal, originada em meados da década de 1920, estava localizada no bairro histórico da Ribeira, nas adjacências do Rio Potengi, do Canto do Mangue1 e do Porto de Natal. A localização privilegiada fez dela objeto de um conflito fundiário encabeçado pela Companhia Docas do Rio Grande do Norte (CODERN) (gerenciadora do Porto da cidade), que sempre desejou a posse da área para uma possível expansão da zona portuária. Em 2013, o conflito teve fim com um contrato assinado entre a Prefeitura Municipal de Natal (PMN) e a Caixa Econômica Federal (CEF), o objeto desse contrato foi um conjunto habitacional vertical com 25 edifícios de 8 apartamentos, também localizado no bairro da Ribeira, distante 700m (setecentos metros) do local da favela, que receberia a população reassentada. O conjunto São Pedro2, novo lar da população do Maruim, teve obras financiadas pelo Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) no contexto do Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV) – Faixa 01. A construção foi concluída em

1 Tradicional centro de vendas de pescados da cidade de Natal/RN, localizado entre os bairros da Ribeira e das

Rocas, às margens do Rio Potengi.

2 O conjunto recebeu o nome de São Pedro por se tratar do santo padroeiro dos pescadores, ofício comum entre

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2016, ano que também ocorreu a mudança dos moradores e destinação da antiga área da Favela para a expansão do Porto de Natal.

Partimos do pressuposto de que essa mudança de um assentamento orgânico, horizontal, bottom up, para outro racional, vertical, top down, com relações entre cheios e vazios diferentes da vivenciada anteriormente, impactou a “vida de rua”, parte essencial da cotidianidade da favela. Através de uma pesquisa empírica em outros casos de reassentamento na cidade do Natal/RN, realizada durante a prática profissional da autora deste trabalho enquanto Arquiteta e Urbanista temporária da PMN, foi possível perceber que após a mudança para os novos conjuntos, outros modos de uso e relações com os espaços abertos começavam a emergir, situações que iam de encontro ao que acontecia anteriormente nas favelas. Chamando atenção o esvaziamento das ruas, a depredação do equipamento de uso comum e a construção de muros, por visitantes ou pelos próprios moradores, que passaram a buscar uma apartação entre eles e o espaço aberto do conjunto e da cidade. A partir da pesquisa empírica surgiu a questão que foi o mote inicial para esta dissertação: se, e até que ponto a forma do lugar exerce uma pressão para a ocorrência de mudanças espaciais e de modos de uso dos espaços abertos (ruas locais) nesses casos?

A partir dessa questão, formulamos a hipótese de que a natureza morfológica do conjunto é oposta à da favela, sendo assim, altera tipos de relações espaciais, da micro à macro escala, que possivelmente modificam padrões de copresença, uso do lugar e interação entre os diferentes indivíduos no espaço – moradores locais e estranhos (não locais). O conjunto subverte a lógica autodefensiva e de proximidade entre os moradores da Favela para um movimento mais similar ao da cidade de maneira global – onde há maior potencial de encontro entre diferentes. A abertura para a cidade aproxima a população reassentada do discurso do medo, da reclusão dentro de casa e da criação de muros e barreiras para o espaço público.

A escolha por estudar especificamente o reassentamento do Maruim aconteceu, primordialmente, pela relação estreita da autora deste trabalho com o caso, que foi objeto do seu Trabalho Final de Graduação (TFG) e permeou parte de sua vida profissional enquanto Arquiteta e Urbanista, tendo feito parte da equipe que atuou no levantamento da população que embasou o processo de reassentamento – Como Arquiteta e Urbanista da SEHARPE3 - e colaborou em estudos de possíveis projetos arquitetônicos do novo conjunto – Enquanto Arquiteta e Urbanista autônoma (nesse momento já fora da

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PMN). Além disso, pela possibilidade de estudar e documentar o processo de mudança da população em uma fase inicial de consolidação.

Na busca de confirmar ou refutar a hipótese de trabalho do nosso caso de estudo, objetivamos de maneira geral compreender se, e como, a mudança de natureza morfológica dos espaços abertos – do Orgânico para o Racional4 - está alterando modos de usos e relações com esses espaços preestabelecidos na favela. Para isso propomos um estudo comparativo de forma e usos da favela e do conjunto. O estudo comparativo enquanto método da pesquisa científica nos permite entender regularidades, transformações, possíveis continuidades, semelhanças e diferenças entre os espaços (SHNEIDER; SCHIMITT, 1998). A comparação de uma mesma população em dois momentos espaciais permite fazer o paralelo com foco na morfologia, variável não constante nesse caso. Para isso o estudo foi dividido em algumas etapas que objetivam especificamente:

i. Apreender constâncias e/ou diferenças formais a partir da comparação de propriedades espaciais de acessibilidade, visibilidade, interface entre espaço público/privado e usos do solo em cada uma das situações - favela, conjunto planejado, situação atual - verificando o potencial de cada uma enquanto estruturadora de campos de encontro entre indivíduos, denominados comunidade virtual (HILLIER et al., 1987);

ii. Entender como se davam/dão os modos de uso e a relação dos moradores com o espaço na favela e no conjunto na situação real;

iii. Confrontar os resultados das duas vertentes de trabalho, resultados da análise morfológica x usos do espaço real, na busca de entender a influência da alteração da forma do espaço sobre possíveis modificações no modo de uso e na relação dos moradores com o espaço.

Com base nisso, o trabalho foi estruturado em introdução e mais quatro capítulos. O primeiro capítulo, após esta introdução, intitulado “Do Maruim ao São Pedro”, faz uma breve contextualização do surgimento das favelas, de ações de reassentamento e seus possíveis impactos na vida da população; em seguida, apresentamos o nosso caso, a questão do conflito fundiário e a

4 Acreditando que não há ação inocente na construção de qualquer tipo de ambiente arquitetônico, compreendemos que ambos espaços são derivados de ações racionais, no entanto, por se tratar de um trabalho no qual a forma do espaço é protagonista, devemos ressaltar que entendemos espaços orgânicos como aqueles construídos pela ação pontual dos usuários ao longo do tempo, resultante em uma forma na qual não existe uma ordem aparente, composto por traçados não ortogonais com ilhas de cheios que se voltam para a rua, elemento que, por sua vez, atua como estruturador do sistema; já assentamentos racionais são aqueles derivados de um planejamento profissional que resultam em planos regulares derivados de uma geometria euclidiana que deixam a ideia de ordem explícita.

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mudança para o conjunto; por fim, trazemos alguns números referentes à condição socioeconômica de parte da população.

O segundo capítulo trata de possibilidades e restrições da forma dos espaços; focamos no referencial teórico que guia este trabalho, no estudo da Arquitetura como variável independente que atua na definição de campos de potenciais encontros entre os indivíduos, os quais chamamos de comunidade virtual (HILLIER et al., 1987); destrinchamos essas possibilidades e restrições: a partir dos vazios e dos cheios. Após isso, fazemos uma breve apresentação teórica dos objetos espaciais: favela e conjunto.

O terceiro capítulo apresenta a análise morfológica, explorando potencialidades de encontros entre indivíduos a partir da análise dos atributos dos vazios – análise sintática do espaço, acessibilidades “ao caminhar” e “ao olhar” – e dos cheios - estudo morfológico de interface, variação edilícia e usos do solo - da favela e do conjunto individualmente e em perspectiva comparada.

O quarto capítulo adentra na análise dos usos no espaço real. Nesse ponto analisamos modos de uso e relações da população com o espaço físico construído reais. Para a análise de modos de uso reais fizemos observações dos espaços in loco, especificamente, da atividade peatonal e de traços do ambiente físico destacando recorrências de apropriação/vulnerabilidade; e realizamos entrevistas semiestruturadas com os moradores como metodologia de suporte às limitações que enfrentamos no decorrer da pesquisa.

Por fim, fazemos um arremate das duas partes da pesquisa nas considerações finais, que apresenta resultados da sobreposição de potencialidades dos atributos espaciais e modos de uso reais, explicitando constâncias e diferenças entre as situações da favela e do conjunto.

Sabemos que ações de reassentamentos são multifacetadas e podem ser estudadas em diversas escalas, desde a escala da habitação até escalas maiores. A abordagem sobre impactos locais da modificação dos espaços abertos na vida dos moradores, apresentada neste trabalho, é só um tipo de abordagem sobre essa questão, poderíamos escolher estudá-la a partir de outra (s) escalas e/ou através de uma outra ótica. A opção por nos aprofundar na morfologia dos espaços abertos e em seus efeitos locais sobre modos de uso e relações com o ambiente construído aconteceu por entendemos que esses espaços tem uma grande importância para o funcionamento da vida cotidiana da população (principalmente moradores desses lugares), uma força que não deve ser negada ou deixada em segundo plano em pesquisas da área de Habitação de Interesse Social, ainda que possam existir outras tão importantes quanto. Esperamos que este trabalho possa contribuir para a evolução da discussão acerca de características morfológicas de projetos de conjuntos habitacionais entregues a populações removidas de favela, a fim de minimizar os muitos impactos que a mudança já traz.

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1

D O M A R U I M A O S Ã O P E D R O

Desde pelo menos meados do século XX, estudos sobre favelas e provisão de habitação de interesse social aparecem recorrentemente na literatura. Aspectos sobre contexto de formação, a produção do espaço e a questão da remoção, assuntos tratados aqui, já foram amplamente discutidos por diversos autores (VALLADARES, 2005 [1978]; MARICATO, 2000; VILLAÇA, 2001; BONDUKI, 2002; PASTERNAK, 2008; FERREIRA, 2012). Nessa parte do trabalho faremos uma revisão da literatura, contextualizando e discutindo nosso caso a partir do panorama histórico e morfológico da formação do urbano brasileiro e suas desigualdades historicamente existentes que resultam no nosso objeto principal, a ação do reassentamento.

1.1. Contextualização do Caso de Estudo

As favelas surgem em um contexto de injustiça e descontinuidades sociais, econômicas, culturais. São objetos espaciais que nascem como expressões naturais, inevitáveis para o equilíbrio de um sistema urbano marcado pela instabilidade e pela desigualdade (SOBREIRA, 2003). “Representam uma forma específica (...) não só de substância material, mas, sobretudo, de significado simbólico, como espaço de sobrevivência” (DEFFNER, 2011, p. 119). É um habitat simplificado ao extremo; a opção para quem não são dadas opções; uma arquitetura sem arquitetos que monta seu espaço como é possível, partindo da autoconstrução de um abrigo precário, em terreno ilegal, para posteriormente vê-lo evoluir para uma complexidade espacial e simbólica (PASTERNAK, 2008).

Essa complexidade espacial tem um desenho definido, com características morfológicas próprias que difere a Favela de outros assentamentos urbanos, sejam eles legais ou ilegais. A favela se caracteriza por não seguir o modelo vigente imposto pela urbanização formal do espaço; ocupações fora da legalidade, de elevada organicidade, estruturadas para favorecer relações espaciais entre os moradores (LOUREIRO, 2017)5.

5 O termo favela é estigmatizado e evitado por muitos trabalhos acadêmicos, no entanto, escolhemos utilizá-lo nesta dissertação para referenciar a existência de um objeto morfológico “favela”, explorado por estudos anteriores tais como Sobreira (2003) e Loureiro (2017). Um tipo de ocupação urbana que possui características

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Segundo Lícia Valladares (2005 [1978]), a expressão favela começou a ser atribuída a esse tipo de formação espacial no final do século XIX, quando os combatentes da guerra de Canudos voltaram para o Rio de Janeiro, e sem muitas oportunidades, se instalaram no Morro da Providência, onde era possível encontrar uma planta com mesmo nome, espécie com a qual eles tinham tido contato na Bahia durante as batalhas. O tipo morfológico “favela” é anterior à designação do nome, no entanto, sua proliferação e consolidação acontece apenas no final do séc. XIX, quando o termo é disseminado e passa a ser utilizado recorrentemente para esse tipo de ocupação (VALLADARES, 2005 [1978]; SANTOS, 1980).

De acordo com Ermínia Maricato (2000) a explosão desses assentamentos no final do séc. XIX se deu, principalmente, pela abolição da escravatura e a industrialização nascente no país que consolidou uma população urbana e aumentou consideravelmente a migração campo / cidade. A falta de infraestrutura urbana para absorver essa população, aliada aos baixos salários que recebiam e a uma desigualdade de privilégios arraigada na sociedade brasileira, colaborou para que os mais pobres não tivessem condições de adquirir um imóvel de forma legalizada, dessa maneira, as favelas funcionavam como uma espécie de alojamento de escape.

Durante o sec. XX o problema se agravou, condições de trabalho não melhoraram e a proliferação das favelas no Brasil aumentou “com particular pujança nos núcleos urbanos metropolitanos no período que vai do começo dos anos de 1930 até o final da década de 1950” (SANTOS,1980, p. 24), com destaque para a década de 1940 e o surgimento da Lei do Inquilinato6, resposta ao crescimento demográfico da época, consequência da consolidação industrial do país (MARICATO, 2003).

Em Natal, o processo de proliferação das favelas é acentuado com a chegada das tropas norte-americanas em 1942. Imigrantes e migrantes atraídos pelo progresso e ofertas de emprego, vêm para a cidade, aumentando consideravelmente as médias populacionais (ALMEIDA, 2007). Assim como em outros centros brasileiros, a falta de infraestrutura para receber tal demanda de moradores, acarretou um agravamento dos problemas urbanos já existentes na cidade, incluindo a falta de moradia e alojamentos. A ineficiência do poder público em criar algum tipo de assistência para essa população, espaciais bem definidas (como citamos no corpo do texto - Cap. 1 e Cap. 2), que se assemelham a situação arquitetônica do Maruim.

6 Promulgado em 1942, o decreto-lei do inquilinato, instituía o congelamento dos valores locativos e regulamentava as relações entre proprietários e inquilinos, uma medida de grande alcance que provocou consequências na produção, distribuição e consumo de moradias populares. O congelamento dos aluguéis reduziu drasticamente o lucro dos investidores. Estes, por sua vez, passaram a investir em venda de imóveis. O alto valor das vendas, gerou uma escassez de imóveis compatíveis com as rendas dos trabalhadores e agravou a crise de moradia (BONDUKI, 2002)

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colaborou para a disseminação das ocupações ilegais em terrenos privados ou da União. Como confirma Almeida (2005)

A crise social e econômica se estendeu até os anos de 1950, sendo intensificada pelas diversas secas ocorridas. Em fins dessa década uma outra crise de moradias eclodiu na cidade, resultando no surgimento das primeiras ocupações irregulares com casas precárias no espaço urbano, características do que naquele momento já se denominavam favelas. Percebe-se então, que da mesma forma que na cidade de São Paulo da década de 1940, as favelas que surgiram na capital norte-rio-grandense foram frutos de uma crise habitacional. (ALMEIDA, 2005, p. 106).

Deve-se ressaltar que ocupações desse tipo já existiam em Natal antes da data citada pela autora (estima-se que desde o início do século XX já existissem ocupações consolidadas desse tipo), porém, elas só passaram a ser reconhecidas e documentadas quando se tornaram problemas mais aparentes para a cidade e para as autoridades. Como afirma Almeida (2005):

Apesar de existirem anteriormente em Natal, as habitações precárias só passaram a serem consideradas um “problema urbano” – não somente sanitário –- pelas autoridades, em meados da década de 1950 e início da década de 1960, quando se mostraram um empecilho ao projeto de industrialização proposto pela elite política na época. (ALMEIDA, 2005, p.106)

Em Natal, foram consideradas favelas ocupações irregulares de traçado “espontâneo”, assentamentos sem planejamento profissional, grupos de habitações que não eram condizentes com padrões de beleza e higiene da cidade (ALMEIDA, 2007). Locais indesejáveis que não se encaixavam com a ideia de progresso que permeava o pensamento higienista da época. Representava atraso, remetia à uma cidade pré-industrial indigesta para ideias higienistas vigentes. Almeida (2005) reproduz um trecho de matéria da época (alterado por FERREIRA et al., 2003):

A presença desses “indesejáveis” (FERREIRA et al., 2003 apud ALMEIDA, 2005) também tiveram como efeito o comprometimento da situação de higiene de muitas localidades da cidade, que se encontravam “(...) tristes e [com] sujas taperas (...)” (SANEAMENTO..., 1944, p.04 apud ALMEIDA,2005), dentre elas: Rocas, Alecrim, Morro Branco, Carrasco, Canto do Mangue e Guarita. (ALMEIDA, 2005, p.81). As primeiras ações intervencionistas em favelas florescem desse pensamento higienizador, no qual, arquiteturas “bottom up” (sem arquitetos!), estavam fora da ordem aparente, eram patologias urbanas que precisavam ser eliminadas. Ações de intervenção em favelas passaram a ser comum a partir da segunda metade do século XX (VALADARES, 2005 [1978]). Neste trabalho, focamos nas ações de remoção e reassentamento. Segundo Denaldi (2010) o reassentamento implica na transferência da população para outra área que não a original, essa prática está embasada na produção de novas residências (apartamentos, habitações evolutivas, lotes urbanizados) destinadas aos moradores provenientes dos assentamentos ilegais. O objetivo dessa intervenção é estabelecer uma ordem social e uma cidadania moderna através de um ordenamento físico traduzido em conjuntos de traçado

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ortogonal e residências padronizadas que pouco se assemelham com a estrutura das ocupações orgânicas das favelas (CARDOSO, 2007; PASTERNAK, 2008) (Figura 01).

Figura 01: A. Conjunto Singapura São Paulo/SP; B. Conjunto Cidade de Deus Rio de Janeiro/ RJ; C. Conjunto Leningrado Natal/RN; D. Conjunto Novo Horizonte (ex favela do DETRAN) Natal/RN.

Fonte: A. Website Construbase Engenharia, 2017; B. Website Sala Geo, 2016; C e D. Arcevo da Autora.

Circe Monteiro, pesquisadora da área, afirma em entrevista à RADIS (2013) que apesar das questões negativas que envolvem a infraestrutura do espaço, a favela tem uma dinâmica muito própria, baseada em estratégias de sobrevivência que implicam em redes de solidariedade entre moradores. Isso não é percebido pelos “de fora”. Para ela, os conjuntos projetados para o reassentamento de populações de favelas não conseguem capturar essa complexa dinâmica socioespacial. São de grande pobreza conceitual e de espaço, não atendendo o modo de vida dessas populações e seus hábitos de moradia. Ou seja: agradam “os de fora” mas tendem a lacerar modos de vida preexistentes dos moradores. Edinéia Alcântara e Circe Monteiro (2010) em pesquisa sobre o reassentamento da favela “Abençoada por Deus” para um conjunto planejado pelo governo no Recife/PE, concluem que apesar da satisfação

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da obtenção da casa própria (legalizada), os moradores não ficaram satisfeitos com a falta de opções de lazer e com o desenho do espaço: “o projeto urbanístico pobre com ruas ortogonais e grandes corredores que não oferecem condições de reunião e controle e fazem os moradores se sentirem expostos à entrada de estranhos ao conjunto“ (ALCÂNTARA; MONTEIRO, 2010,p. 6). Essa exposição mina a liberdade da população, que reclama também do aprisionamento, da falta de liberdade e de privacidade.

Em Natal, nos últimos anos, houve uma explosão de construções de conjuntos habitacionais verticais para receber populações reassentadas de favelas, ações impulsionadas pelo financiamento da Faixa 01 do Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV). Essas construções continuam seguindo um padrão racionalista, em sua maioria, instaladas em áreas segregadas que pouco facilitam a vida dos moradores.

Em estudo de pós-ocupação de um desses conjuntos, o Vivendas do Planalto, Tinoco, Bentes Sobrinha e Lima (2016) afirmam que apesar de satisfeitos com a infraestrutura do apartamento, os moradores ressaltam os problemas de segurança e acesso aos equipamentos e serviços, sobretudo, as frágeis relações entre a moradia, os espaços exteriores, e as práticas cotidianas como a ausência de lugares para guardar os animais puxadores de carroça (população com grande número de catadores de lixo em carroça), falta de lugar para coleta seletiva do lixo, ou para atividades básicas do dia a dia de toda família como lavar e estender roupas.

Alcântara (2011, p.11) ressalta que situações de privação como essas podem acarretar doenças psicológicas na população: “Observei um quadro de depressão, doença que os moradores não sabem que têm. Eles relatam tristeza, isolamento social. Nos conjuntos habitacionais, não há lazer. E quando tem, não se pergunta como eles querem essa área”.

O traço comum nessas intervenções decididas de cima para baixo, top down, é que na maioria das vezes o projeto do conjunto ignora solenemente a complexidade de uma vida cotidiana baseada em relações espaciais preexistentes, ocasionando um desmonte da cotidianidade, que precisa ser reestruturada no novo assentamento. No entanto, de que maneira essa reestruturação ocorre? Tentaremos responder essa questão para nosso estudo de caso.

1.2. O Caso do Reassentamento do Maruim

A Favela do Maruim surge e desaparece no contexto de desigualdade, dominação e apreço pela ordem espacial apresentado nos itens anteriores. Formado à margem sul do Rio Potengi, na localidade hoje conhecida como Canto do Mangue, nas adjacências da área portuária de Natal/RN, entre os

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bairros das Rocas e da Ribeira, o Maruim, como é conhecido, tem suas primeiras referências bibliográficas de existência datadas da década de 1940, apesar de alguns registros já aparecerem desde a década de 1920 (como indica a placa da fundação da Colônia de Pescadores José Bonifácio, marco inicial da sua ocupação) (LIMA,2015) (Figura 02). Aparentemente, um grupo de pescadores vislumbrou no terreno vazio, pertencente à União, a possibilidade de se alojarem próximos ao local de trabalho, o Rio Potengi. A partir disso começaram a construir suas casas, montando uma vila ribeirinha, ocupação original da Favela do Maruim (Figura 02). Tinoco, Bentes Sobrinha e Trigueiro (2008) descrevem, a evolução da apropriação:

O terreno, pertencente ao Patrimônio da União, foi sendo ocupado a princípio por casas de taipa e palha, em precárias condições físico-ambientais, tendo sido ignorado seu risco de inundação em função da proximidade com a área de mangue. Inicialmente os moradores eram predominantemente pescadores humildes vindos em geral do interior do Estado, que tinham o rio como fonte de sobrevivência a partir da pesca artesanal. (TINOCO; BENTES SOBRINHA; TRIGUEIRO, 2008, p.169). Figura 02: A. Chegada dos Hidroaviões em Natal na década de 1940, com destaque para o Maruim; B. Detalhe da placa

da Colônia de Pescadores; C. Canto do Mangue em 1944; D. Ocupações da Favela do Maruim na década de 1980

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Alguns registros bibliográficos apontam o Maruim como uma das favelas mais antigas de Natal, juntamente com o Passo da Pátria (também formada à beira do Rio Potengi) (LIMA, 2015). A boa localização na malha urbana fez dela, durante toda sua existência, parte do trajeto do ir e vir de parte da sociedade natalense. O movimento local, ocasionado também pela existência do Porto e pela proximidade com o Canto do Mangue - importante área de comercialização de pescados, e polo sociocultural da cidade - contribuiu para o Maruim ser parte integrante da paisagem urbana de quem por ali passava (EMERECIANO, 2007; TINOCO; BENTES SOBRINHA; TRIGUEIRO, 2008). Bom por um lado, ruim por outro; a visibilidade acentuada sempre a deixou em evidência, porém a aparente desordem espacial aliada a traços de insalubridade contrastavam com anseios sociais gerais que viam o espaço como patologia, sempre o colocando como alvo de possíveis ações de remoção e despejo. Dentre todos os conflitos vivenciados pelos moradores do Maruim ao longo do tempo, destacamos aqui o mais importante: o impasse relativo à questão fundiária com o Porto de Natal. A questão acabou por acarretar a remoção da população, e se deu principalmente devido aos limites físicos que a Favela sempre impôs para uma possível ampliação das atividades portuárias (Figura 03).

Figura 03: Linha de limite do bairro da ribeira com apontamentos da localização do Porto e da Favela – Conflito Fundiário

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A história do Porto de Natal se entrelaça com a do Maruim. Suas obras, iniciadas em 1922, datam do mesmo ano do surgimento da colônia de pescadores José Bonifácio, marco inicial da ocupação da Favela7. De acordo com o próprio Porto (2010):

O projeto inicial do Porto de Natal foi aprovado em 14 de dezembro de 1922, através de decreto. No entanto, só dez anos depois, em 1932, o decreto de número 21.995, assinado pelo presidente Getúlio Vargas, à frente do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, cria o Porto de Natal. No dia 21 de outubro desse mesmo ano o decreto é publicado no Diário Oficial da União, mas a solenidade oficial só ocorreu em 24 de outubro. A obra foi gerenciada pelo engenheiro Hildebrando de Góis que na época chefiava a extinta Inspetoria Fiscal dos Portos, Rios e Canais com sede no Rio de Janeiro. O engenheiro Décio Fonseca foi o primeiro administrador do Porto de Natal. (PORTO, 2010).

O terminal é administrado pela CODERN desde 1983, uma companhia de economia mista com atividades atreladas ao Ministério da Pesca e Aquicultura. Sua área de influência abrange todo o Estado do Rio Grande do Norte, principalmente os municípios de Mossoró, Pau dos Ferros, Areia Branca, Macau e Ceará-Mirim (TINOCO; BENTES SOBRINHA; TRIGUEIRO, 2008).

O Porto de Natal opera em uma área relativamente restrita e, atualmente, de difícil acesso para grandes veículos (caminhões, carretas, etc.). Distante das bordas do tecido urbano. Próximo à área de tombamento histórico, o Porto é comprimido pelo próprio desenho da malha. Suas poucas opções de expansão limitam sua competitividade perante a outros portos maiores da Região Nordeste. Como a CODERN afirma em entrevista ao jornal Tribuna do Norte:

O Porto de Natal tem competitividade limitada, mas busca alternativas para não ser “dragado” pelos grandes terminais da região Nordeste. A localização geográfica privilegiada e a diversidade dos produtos que compõe a pauta de exportações, sozinhos, não fazem do Porto de Natal um terminal de grande potencial competitivo frente àqueles localizados nos estados vizinhos – Pecém (Ceará) e Suape (Pernambuco). A diretoria da Companhia Docas do Rio Grande do Norte (Codern) assegura que o terminal natalense é competitivo, mas reconhece a necessidade de grandes investimentos para ampliar a capacidade de receber embarcações e atrair mais cargas, fator imprescindível à implantação de uma linha de cabotagem. (...). Mas para o Rio Grande do Norte ser interligado aos demais Portos do Brasil, a CODERN precisa implementar outro projeto audacioso, (...): a ampliação da retroárea portuária. (TRIBUNA DO NORTE, 2006).

A ampliação da retroárea ficaria dependente da remoção da Favela do Maruim, o único vizinho adjacente que eles poderiam atacar por não ter a posse da terra. Cerca de 180 famílias que ocupavam

7 De acordo com Teixeira (2015) desde pelo menos meados do século XVIII existiam Portos não oficiais que

faziam da Cidade de Natal um entreposto comercial. Apanhados históricos do autor dão conta que desde o século XIX existia um cais nas proximidades da Rua Tavares de Lira que atuava, junto com outros pontos espalhados pelas margens do Rio Potengi, como facilitador para o comércio entre Natal e outros municípios. Em 1922 começa a construção do Porto oficial da cidade, remanescente até os dias atuais.

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a favela naquela altura precisariam ser removidas para dar espaço à expansão portuária. Fatores complexos que envolvem uma ação de remoção resultaram nos entraves entre CODERN, PMN e população do Maruim que duraram longos anos. Os percalços retardaram, mas não frearam a ação da CODERN em nenhum momento. Em 1997, o Porto fez sua primeira investida documentada na área da favela. Como descreve Lima (2015):

Em 1997 a CODERN solicitou a regularização da área que ocupava e daquela a qual tinha interesse, que corresponde também ao espaço ocupado pela Comunidade do Maruim, à Gerência Regional do Patrimônio da União (GRPU/RN), sem lograr êxito. (LIMA, 2015, p. 65).

O direito à moradia previsto no Art. 6º Constituição Federal de 1988, aliado ao reconhecimento da área nas Leis Municipais e a resolução da Lei de Operação Urbana da Ribeira, nº 4.932/97, Art. 8º prevendo para intervenções em áreas de interesse social, a elaboração de propostas habitacionais aprovadas pelo Conselho de Habitação Municipal, exaltavam a complexidade social, cultural e histórica da ação, o que dificultou a investida do Porto e determinou a falta de êxito nesse primeiro momento.

Autoridades do Porto não desistiram diante da negativa, seguiram pressionando o poder público a criar algum tipo de proposta para a remoção das famílias da área. Diante da pressão, em 2000, surgiu a primeira resposta do Poder Público Municipal:

No ano 2000, a Secretaria Especial de Meio Ambiente e Urbanismo - SEMURB, por meio do Setor de Patrimônio Histórico – SPH, desenvolveu o Projeto Ribeira, de Reabilitação Urbana. Esse projeto englobaria uma série de propostas pontuais para o bairro, que compreendia diversos subprojetos dentre os quais: Largo do Teatro, Urbanização da Praça Augusto Severo e Entorno, e Urbanização do Canto do Mangue, Reassentamento da Favela do Maruim, Projeto de Ampliação do Porto de Natal e Terminal Turístico de Passageiros. Estes dois últimos foram apresentados pela Companhia Docas do Rio Grande do Norte – CODERN (CAVALCANTE e BORGES, 2004, p.13).

A partir de então, as investidas da CODERN passaram a ser mais efetivas. Em 2005 a Companhia encabeça uma nova solicitação da área, desta vez à Superintendência do Patrimônio da União em Brasília-DF com um novo texto:

A ampliação das atividades do porto de Natal necessita da instalação de uma linha da cabotagem e de linha (s) de longo curso de navios porta contêineres para a Europa e para a costa leste os Estados Unidos. Para consolidar a linha de cabotagem é necessária a construção de um armazém com área mínima de 5.000 m2, conforme pleito de armadores, e para viabilizar linha (s) de longo curso precisa-se de uma área mínima de 10.000 m2, para armazenagem e circulação de, no mínimo 400 contêineres, requisitos que dão sustentação a este pleito (Carta DP-337/2005 apud TINOCO; BENTES SOBRINHA; TRIGUEIRO, 2008, p. 182 e 183).

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Em apoio à CODERN, no ano de 2008, A Prefeitura Municipal através do Plano Municipal de Redução de Riscos - PMN8 (2008), decreta a ocupação como sendo de risco moderado, principalmente por se tratar de um local insalubre, com risco de alagamento e invasão da maré, sugerindo que a solução seria a remoção das famílias da área, e o reassentamento dessas em outro local. Em 2013, o Plano Local de Habitação de Interesse Social - PLHIS, encomendado pela Prefeitura reitera o parecer:

O terreno ocupado pelo assentamento configura-se como impróprio à sua consolidação, em virtude de ocupar área de proteção permanente do Rio Potengi e com isso apresentar vulnerabilidade por inundações e alagamentos. (IDESPLAN, 2013, p.310).

O Porto encontrou nessa conjuntura um cenário propício para convencer o poder público e a população que a intervenção era necessária, tendo em vista os condicionantes físicos e a situação de vulnerabilidade social. Em 2009, aconteceu a primeira ação efetiva para a remoção da população da Favela do Maruim, como podemos verificar em uma matéria de 2009 do jornal Tribuna do Norte, redigida pela Prefeita da época, Micarla de Souza:

A favela do Maruim tem representado para Natal dois aspectos negativos de uma mesma realidade: primeiro a de uma comunidade que reúne dezenas de moradias cujas condições não garantem um mínimo de dignidade aos seus habitantes e, segundo, por ocupar uma área que impede a expansão do Porto de Natal, e, por consequência, atrapalha o próprio desenvolvimento da economia local. (...). Agora essa realidade vai mudar. Assinarei nesta terça-feira (10) em Brasília, junto com o presidente Lula, um protocolo de cooperação para que as obras da remoção da Favela do Maruim sejam incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento – PAC. Esse será um marco na conquista da dignidade dos moradores daquela comunidade. (SOUSA, 2009)

Vinte e uma das cerca de 180 famílias (na época) foram reassentadas em diversas Áreas de Natal. O projeto elaborado pela Prefeitura era voltado para a modalidade aquisição: o morador do Maruim escolhia um imóvel regularizado dentro do perímetro urbano de Natal e a Prefeitura, com auxílio da verba Federal, adquiria o imóvel em nome do morador. A iniciativa não deu muito certo, se tornou quase impossível encontrar residências regularizadas pelo baixo valor destinado para aquisição das casas – cerca de 22 mil reais. Diante da dificuldade, mesmo com dinheiro em caixa, a PMN em nome da SEHARPE, recuou e, mais uma vez, a questão voltou a ficar sem solução. Até a entrada de recursos do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) no processo, em 2013.

O PMCMV foi aprovado através da Medida Provisória nº 459, em março de 2009 como resposta à crise mundial de 2008. A intenção era dinamizar a economia do país através de investimentos no ramo da construção civil, fazer o capital girar naquele momento. O plano da primeira fase do programa era

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audacioso, construir um milhão de habitações para a população menos abastada financeiramente, contemplando dentre elas, famílias com renda entre 0 e 3 salários mínimos, que incluíam entidades de luta de moradia e população de favelas nunca privilegiadas em um programa Federal deste porte (FERREIRA, 2012).

O cenário do financiamento de um conjunto pelo PMCMV (Faixa 01) foi a solução para o impasse fundiário que se arrastava por anos entre o Porto e a população da Favela do Maruim. Em 2013 a PMN lançou, junto à CEF, uma proposta de operação conjugada entre os recursos que ainda existiam da ação anterior (dinheiro do PAC) e novos recursos provenientes do PMCMV. A ação teria dois vieses: (i) o primeiro seria a construção de um condomínio de apartamentos, o Residencial São Pedro, no mesmo bairro da Ribeira, com obras completamente financiado pelo PMCMV – Faixa 01 – sem ônus para os moradores (Figura 04); (ii) na área remanescente (onde existia a favela), seriam mantidos os comércios da borda que formam o Canto do Mangue (30% da área), alegando-se que a remoção total seria um prejuízo para a cultura e identidade do Bairro da Ribeira e de Natal. Porém, toda a área habitacional seria removida e destinada para o Porto de Natal (70% da área). Na área remanescente, no Canto do Mangue, ainda seria construído um centro comunitário destinado à população da favela que trabalha com o trato de pescados (Figura 05).

Em 2014, começaram as obras do Residencial São Pedro em uma ação que envolveu a PMN (doação do terreno e fiscalização), a CEF (gerenciador do processo), e uma empresa privada do ramo da construção civil (responsável pela execução da obra). O condomínio é uma réplica do disseminado conjunto habitacional moderno verticalizado, similar à maioria do que se produz pelo PMCMV. Conta com 200 unidades habitacionais, distribuídas em 25 blocos de 4 pavimentos, em um terreno de cerca de 1ha (área similar à da favela).

É indiscutível que a mudança da favela para o conjunto, dotado de toda infraestrutura de serviços urbanos, promove uma melhoria nas condições de salubridade no cotidiano da população; todavia, a mudança espacial também traz um desmonte de algumas situações preestabelecidas que precisarão ser reestruturadas no conjunto. Situações essas, que no caso do reassentamento do Maruim, não contaram com a participação popular; as decisões foram tomadas pelo poder público e impostas à população residente na favela, o que torna o caso ainda mais grave.

Atualmente, a maioria da população encontra-se instalada no conjunto desde julho de 2016, exceto alguns poucos resistentes na área da antiga favela, atualmente praticamente demolida. A área livre foi destinada ao Porto, que já deu o funcionamento desejado. No conjunto já é possível notar os primeiros traços de adaptação da população, no entanto, para a população que passa “pelo lado de fora” ainda não consegue notar esses traços, fato relacionado a permanência do tapume de obras, barreira que

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funciona como uma espécie de muro, aparta o conjunto da rua e impede a plena efetivação do partido arquitetônico pensado para integrar a população da favela ao bairro e à cidade.

Figura 04: A. Vista aérea Maruim; B. Vista do Maruim a partir do Rio; C, F. Ruas da Favela; D. Conjunto São Pedro; E. Favela sendo demolida; G, H, I. Ruas do Condomínio

Fonte: A. SEMURB, 2006 / Editado pela Autora; B, C, F, G, I. Acervo da Autora; D, G, H. Souza, 2016; E. Website Portal Fala RN, 2016.

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1.3. A População Estudada em Números

Este tópico da dissertação apesenta números que traçam um perfil socioeconômico de parte dos moradores reassentados no conjunto São Pedro. As informações, cedidas pela SEHARPE, são parte do relatório inicial do Trabalho Técnico Social9 (TTS), ação que deveria estar ocorrendo no pós-ocupação do conjunto, no entanto, está paralisada devido a entraves burocráticos entre a PMN e CEF. Com a suspensão do TTS, os dados existentes na secretaria e ofertados a esta pesquisa são

9 O acompanhamento social é obrigatório no pós-ocupação de empreendimentos do PMCMV- Faixa 01. A

normativa foi instituída pela portaria Nº 021/2014 do Ministério Das Cidades.

Figura 05: A. Divisão da Intervenção; B, C, E. Imagens do Projeto de Urbanização; D. Moradora no Trato de Animais.

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incipientes, fazendo referência apenas a alguns aspectos relacionados com os chefes das famílias em detrimento de uma ampla visão social da composição familiar. Ainda assim, julgamos interessante apresentá-los, pois delineiam aspectos da vida cotidiana de adultos que compõem a população estudada, grupo que encontramos utilizando os espaços abertos de ambos os assentamentos com maior recorrência (como veremos adiante no cap. 4).

Vale ressaltar que esse panorama foi realizado pouco antes da mudança para o conjunto, quando a população ainda estava na Favela do Maruim, portanto, não são dados atualizados, podendo ter ocorrido algumas mudanças nesse meio tempo. Profissão, idade, renda, estado civil, vendas e trocas de imóveis (ainda que ilegais) que ocorreram após a mudança não foram documentadas pelas Assistentes Sociais.

Segundo as informações, 173 famílias, provenientes da Favela do Maruim, devem estar reassentadas no São Pedro. Dentre elas, 127 são chefiadas por mulheres e 46 por homens (figura 06). As mulheres chefes de família tem uma idade média de 47 anos, assim como os homens.

Figura 06: gráficos dos sexos e idades dos chefes de família.

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Esses chefes de família descreveram exercer 30 diferentes profissões e/ou ocupações, nas quais se destacam: aposentado (a) / pensionista, auxiliar de serviços gerais (ASG), autônomo (a), desempregado (a), do lar (dono (a) de casa), fileteiro (a)10 e pescador (figura 07). Percebemos que as profissões com maior número de pessoas estão relacionadas e/ou dependem do espaço da casa e/ou da rua dos assentamentos. Ressaltamos que mulheres tendem ocupar postos que se desenrolam próximos às residências ou dentro delas, como a ocupação do lar e a de fileteira, diferente das ocupações masculinas, cuja maioria se desenrola longo do local de moradia (figura 07).

Figura 07: gráficos do número de pessoas por profissão citada e a distribuição por sexo em cada uma delas.

Fonte: elaborado pela autora com base em dados fornecidos pela SEHARPE.

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As profissões resultam em uma renda média de R$ 564,18 (quinhentos e sessenta e quatro reais e dezoito centavos) para os chefes de família. Mulheres, por ocuparem, em sua maioria, postos não legalizados ou que não recebem remuneração, possuem uma renda média de R$ 488,85 (quatrocentos e oitenta e oito reais e oitenta e cinco centavos), inferior à média de salários da população do sexo masculino R$ 772,18 (setecentos e setenta e dois reais e dezoito centavos). Notamos que há uma concentração de pessoas de ambos os sexos que ganham salários de até R$ 1500 (mil e quinhentos reais), com algumas exceções (figura 08).

Figura 08: gráficos do número de pessoas em cada faixa de renda e distribuição da renda por sexo.

Fonte: elaborado pela autora com base em dados fornecidos pela SEHARPE.

De maneira geral, é um grupo homogêneo, com perfil coerente com o que exige a normativa da Faixa 01 do PMCMV, faixa que busca atender famílias que ganham até R$ 1.600,00 (mil e seiscentos reais). Evidenciamos, como dado importante, uma maioria de mulheres chefiando famílias e com profissões / ocupações que podem ser exercidas próximas às suas residências. Com algumas exceções (como as empregadas domésticas), resultados apontam que pessoas do sexo feminino desenvolvem atividades profissionais atreladas ao local de moradia, nas residências e/ou nas ruas do assentamento, achado que condiz com resultados desta pesquisa apresentados mais adiante.

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P O S S I B I L I D A D E S E R E S T R I Ç Õ E S

DA F O R M A D O S E S P A Ç O S

Nesta parte do trabalho apresentamos a literatura que utilizamos como base para a construção desta pesquisa, desde o objeto de estudo, passando pelas questões e dúvidas principais, hipótese, até as análises finais. Partimos de um referencial teórico guarda-chuva que nos fornece uma ideia central que enraíza todas as outras. Este aporte principal é o da Teoria da Lógica Social do Espaço (LSE) ou Sintaxe do Espaço (SE). O pressuposto da referida teoria é o de que a arquitetura, compreendida como variável independente, causa efeitos e amolda modos de vida ao criar campos de possibilidades e restrições ao ir, vir, estar, enxergar e encontros dos indivíduos no espaço construído. Neste capítulo nos aprofundamos nesses campos de possibilidades e restrições, a partir da perspectiva de possíveis efeitos derivados de características espaciais dos vazios (das permeabilidades), dos cheios (massas construídas) e das relações entre eles. O ponto inicial é a apresentação da LSE; no segundo momento, exploraremos atributos espaciais dos cheios e vazios e possíveis implicações destes sobre a presença ou não de pessoas no espaço. Por fim, contextualizaremos, com base na literatura morfológica, a favela e o conjunto enquanto objetos espaciais e seus possíveis efeitos na vida das pessoas.

2.1. A Lógica Social do Espaço e as Comunidades Virtuais

A Lógica Social do Espaço (LSE), ou, como popularizou-se, sintaxe do espaço (SE), é uma teoria que estabelece relações entre espaço e sociedade. Tem início a partir da década de 1970 com trabalhos dos pesquisadores da UCL11, Hillier, Leaman e colaboradores. A sistematização dos conceitos, das categorias analíticas básicas e do referencial epistemológico da teoria, foi feita no livro The Social Logic

of Space12, de Bill Hillier e Julienne Hanson, em 1984.

A LSE ou SE nasce em um contexto de crítica ao funcionalismo e à produção científica sem unidade, subdividida em áreas distintas do conhecimento, vigentes naquele momento. Para Hillier e Hanson (1984) as teorias produzidas até então na área de estudo da Arquitetura e do Urbanismo, eram mais

11 University College London

Referências

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