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As expressões idiomáticas no ensino do português língua materna e do português língua estrangeira. Uma abordagem pedagógico-didática

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Academic year: 2023

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Universidade de Lisboa Faculdade de Letras

AS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS

NO ENSINO DO PORTUGUÊS LÍNGUA MATERNA E DO PORTUGUÊS LÍNGUA ESTRANGEIRA

Uma abordagem pedagógico-didática

Mestrado em Português como Língua Estrangeira/Língua Segunda

Maria do Rosário Monteiro dos Santos (N.º de estudante: 154779)

Dissertação especialmente elaborada para a obtenção do grau de Mestre, orientada por:

Orientadoras: Profª Doutora Guilhermina Jorge Profª Doutora Catarina Gaspar

2022

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ii

Agradecimentos

Às minhas orientadoras, Professora Doutora Guilhermina Jorge e Professora Doutora Catarina Gaspar, pela disponibilidade, apoio e incentivo constantes;

À Professora Doutora Madalena Teixeira pela motivação, pelo apoio e pela amizade;

A todos os professores pelos percursos de aprendizagem;

A todos os colegas pela partilha de perspetivas;

Aos meus alunos pela colaboração pronta e empenhada;

Ao meu marido pelo apoio incondicional;

Às minhas filhas pelo apoio, compreensão, amor e solidariedade.

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iii

Resumo

Portugal depara-se hoje com uma nova realidade sociocultural consequência, em grande parte, do fenómeno da imigração que coloca à escola portuguesa o desafio de acolher e integrar os alunos migrantes. A sua presença na escola exige uma atenção especial na aquisição/aprendizagem do Português enquanto língua não materna ou língua segunda, por ser esta a língua veicular dos conhecimentos escolares e porque do seu domínio depende a plena integração dos alunos migrantes. Conforme diz o organismo ACIME (Alto Comissário para a Integração de Minorias Étnicas) “trata-se verdadeiramente de um desafio nacional [envolvendo] Estado, Sociedade Civil, Comunidades Religiosas, os próprios imigrantes e as suas associações.” (ACIME, 2004)

Nos últimos anos a conceção do ensino e aprendizagem da língua estrangeira tem passado duma conceção tradicional para uma conceção mais funcional, dando especial ênfase à competência comunicativa. Nesta perspetiva, a aprendizagem de uma língua estrangeira consiste não apenas na aquisição do vocabulário e das regras gramaticais, mas também no uso da língua na realidade social e no conhecimento da cultura. Como afirma Figueiredo (2010:155) “Aprender uma língua estrangeira é aprender a forma de ser, de pensar, de sentir e de agir, isto é, a cultura implícita na língua-meta.” Assim sendo, desenvolver a competência lexical do aprendente, quer ao nível das unidades lexicais, quer ao nível das unidades fraseológicas, é proporcionar recursos para a descodificação de todo o ato comunicativo.

Enquanto professora, tenho tido integrados alunos estrangeiros nas minhas turmas de Português. As dificuldades manifestadas pelos alunos imigrantes e a falta de conhecimentos acerca da sua língua materna pela minha parte, como docente, não só me alertaram para o problema da aquisição do Português como língua não materna, como fizeram crescer em mim a vontade de aprofundar os conhecimentos nesta área.

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iv O presente estudo insere-se no âmbito da Linguística aplicada à aquisição/aprendizagem do Português Língua Materna e do Português Língua Não Materna. Com este trabalho de investigação pretendo aprofundar os meus conhecimentos enquanto professora de Português do 3.º Ciclo do Ensino Básico e dar um contributo para o desenvolvimento da aprendizagem e ampliação do léxico em Língua Portuguesa recorrendo às Expressões Idiomáticas (EIs) de forma a promover a aprendizagem dos alunos que frequentam a escola portuguesa, mas para quem o Português não constitui a língua materna.

Com este estudo pretende salientar-se a importância que a compreensão das EIs desempenha na consciência sociolinguística e como poderá contribuir para o desenvolvimento da competência comunicativa dos alunos de Português Língua Materna (PLM) e de Português Língua Não Materna (PLNM). Visa, por conseguinte, alcançar os seguintes objetivos:

- investigar as dificuldades dos alunos no processo de ensino/aprendizagem face a esta temática;

- apresentar algumas propostas pedagógico-didáticas suscetíveis de serem desenvolvidas no âmbito do ensino-aprendizagem de Português Língua Materna e de Português Língua Não Materna, a fim de ajudar os aprendentes a memorizar os significados das EIs, assim como desenvolver a sua competência comunicativa.

Tendo em conta estes objetivos gerais, procuraremos responder às seguintes questões:

- Em que medida os alunos de PLM e PLNM reconhecem as expressões idiomáticas?

- Quais as dificuldades na apreensão do sentido das EIs de acordo com os contextos?

- Que tipo de exercícios podem ser adotados pelos professores no ensino das EIs?

Palavras-chave: expressões idiomáticas; PLM; PLNM; ensino/aprendizagem.

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v

Abstract

Portugal is currently faced with a new sociocultural reality, largely as a result of the phenomenon of immigration, which poses the challenge of welcoming and integrating migrant students to Portuguese schools. Their presence at school requires special attention in the acquisition/learning of Portuguese as a non-mother language or second language, as this is the vehicle language of school knowledge and because the full integration of migrant students depends on its domain. As the organization ACIME (High Commissioner for the Integration of Ethnic Minorities) says, “it is truly a national challenge [involving] the State, Civil Society, Religious Communities, immigrants themselves and their associations” (ACIME, 2004).

In recent years, the concept of teaching and learning a foreign language has moved from a traditional concept to a more functional one, with special emphasis on communicative competence. From this perspective, learning a foreign language consists not only of acquiring vocabulary and grammatical rules, but also of using the language in social reality and in knowing the culture. As Figueiredo (2010: 155) states,

“Learning a foreign language is learning how to be, think, feel and act, that is, the culture implicit in the target language.” Therefore, developing the learner's lexical competence, both at the level of lexical units and at the level of phraseological units, is to provide resources for the decoding of the entire communicative act.

As a teacher, I have had foreign students integrated into my Portuguese classes.

The difficulties expressed by immigrant students and the lack of knowledge about their mother language on my part, as a teacher, not only alerted me to the problem of acquiring Portuguese as a non-mother language, but also made me want to deepen my knowledge in this area, with the objective of basing my action and contributing with my research to the action that can be developed.

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vi The present study falls within the scope of applied linguistics to the acquisition/learning of PLM and PLNM. With this research work I intend to deepen my knowledge as a Portuguese teacher of secundary education 3rd Cycle of Basic Education and to contribute to the development of learning and expansion of the lexicon in Portuguese using Idiomatic Expressions (IE's), in order to promote the learning of students who attend Portuguese schools, but for whom Portuguese is not their mother tongue.

With this study, we intend to emphasize the importance that the understanding of EI's plays in sociolinguistic awareness and how it can contribute to the development of communicative competence of PLM and PLNM students. It therefore aims to achieve the following objectives:

- to investigate the difficulties of students in the learning process regarding this thematic;

- to present some pedagogical-didactic proposals that can be developed in the context of teaching and learning PLM and PLNM, in order to help learners memorize the meanings of IE's, as well as, develop their communicative competence.

Bearing these general objectives in mind, we will seek to answer the following questions:

- To what extent do PLM and PLNM students recognize idiomatic expressions?

- What are the difficulties in assimilating the meaning of the IE’s according to the contexts?

- What kind of exercises can be adopted by teachers in the teaching of IE’s?

Keywords: idiomatic expressions; PLM; PLNM; teaching/learning.

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vii

Lista de abreviaturas

ACIME – Alto Comissário para a Integração de Minorias Étnicas EI – Expressão idiomática

EIs– Expressões idiomáticas

ELBT - Ensino de Línguas Baseado em Tarefas IE’s - Idiomatic Expressions

LM – Língua Materna LE – Língua Estrangeira L1 – Língua Materna L2 – Segunda Língua

QECR – Quadro Europeu Comum de Referência PLM – Português Língua Materna

PLNM – Português Língua Não Materna PLS – Português Língua Segunda

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viii

Índice de gráficos

Pág.

Gráfico 1 - Nível obtido na disciplina de Português no ano letivo anterior 53

Gráfico 2 - Número de irmãos 54

Gráfico 3 - Agregado familiar 54

Gráfico 4 - Línguas que sabem falar 55

Gráfico 5 - Línguas que utilizam para falar com os amigos 55

Gráfico 6 - Línguas que falam em casa 56

Gráfico 7 - Línguas aprendidas na escola 56

Gráfico 8 - Habilitações literárias dos pais 57

Gráfico 9 - Profissão dos pais 57

Gráfico 10 - Habilitações literárias das mães 58

Gráfico 11- Profissão das mães 58

Gráfico 12 - Resultados dos alunos de nacionalidade portuguesa na 2ª atividade

66 Gráfico 13 - Resultados dos alunos de nacionalidade brasileira na 2ª

atividade

66 Gráfico 14- Resultados dos alunos de nacionalidade portuguesa na 3ª

atividade

73 Gráfico 15 - Resultados dos alunos de nacionalidade portuguesa na 3ª

atividade

73

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ix

____________________________________

ÍNDICE GERAL

_____________________________________

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x

Índice

Agradecimentos ... ii

Resumo ...iii

Abstract ... v

Lista de abreviaturas ... vii

Índice de gráficos ... viii

ÍNDICE GERAL ... ix

INTRODUÇÃO ... 1

Motivação e objetivos do estudo ... 2

Limitações do estudo ... 7

Organização do estudo... 8

Capítulo 1 ... 10

ENQUADRAMENTO TEÓRICO ... 10

1.1. Léxico. Competência lexical. Unidade lexical ... 11

1.2. As Expressões Idiomáticas... 18

1.2.1. Definição ... 22

1.2.2. Características ... 25

1.2.3. Competência metafórica ... 32

Capítulo 2 ... 37

AS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS NA SALA DE AULA E A SUA RELEVÂNCIA ... 37

2.1. AS EXPRESSÕES IDIOMÁTICAS NA SALA DE AULA ... 38

2.2. Relevância dada às Expressões Idiomáticas nos programas e nas metas curriculares de Português e de PLNM ... 43

Capítulo 3 ... 50

METODOLOGIA ... 50

3. 1. População e amostra ... 51

3.2. Questionários sociolinguísticos ... 52

3.3. Materiais pedagógicos e metodologias utilizadas ... 59

3.4. Reflexão sobre os resultados obtidos ... 74

3.4.1. Reconhecimento e características das Expressões Idiomáticas ... 74

3.4.2. Identificação das Expressões Idiomáticas ... 75

Capítulo 4 ... 77

PROPOSTAS DE SUPERAÇÃO (MATERIAIS DIDÁTICOS) ... 77

(11)

xi

4.1. Importância/Riqueza das Expressões Idiomáticas ... 78

4.2. Objetivos ... 80

CONCLUSÃO ... 95

BIBLIOGRAFIA ... 99

ANEXOS ... 105

(12)

1 ____________________________________

INTRODUÇÃO

_____________________________________

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2

Motivação e objetivos do estudo

Portugal, país tradicionalmente de emigração, tem vindo a acolher desde os anos 90 um número crescente de novos imigrantes. Para esta situação concorrem fatores como a economia globalizada, a mobilidade dos cidadãos e os fluxos migratórios.

A imigração deu origem a uma sociedade multicultural, com o dever de proteger o direito à diferença do cidadão imigrante, de fomentar uma coexistência pacífica entre a diferença e, mais ainda, de fazer desta diversidade uma mais valia para a nossa sociedade, numa perspetiva de cooperação global.

Esta sociedade multicultural, constituída por crianças, jovens e adultos, oriundos dos quatro cantos do mundo, que por diferentes motivos escolheram Portugal como país de acolhimento, necessita de se integrar na nova cultura, tal como fios multicolores que enriquecem a trama complexa do enorme tear que é a sociedade atual, pelo ensino da língua e da cultura do país que os acolhe, neste caso Portugal.

O desconhecimento da língua do país de acolhimento constitui um dos maiores problemas dos imigrantes em qualquer parte do mundo. Quando tal acontece, estes ficam numa situação particularmente vulnerável. Neste prisma, o conhecimento da língua de acolhimento, para além de ser um instrumento fundamental para a inclusão, torna-se também uma alavanca para a ascensão social que muitos ambicionam. “A língua é a porta de entrada numa determinada comunidade, política, social e cultural, funcionando como uma chave de acesso ao exercício da cidadania”. (Polónia, 2009:7)

Neste sentido, o domínio mais ou menos profícuo do Português constitui-se como uma ferramenta de combate à exclusão social, flagelo com o qual muitos imigrantes se confrontam.

Esta nova realidade implementou a necessidade do desenvolvimento do ensino do PLE/PLS. As motivações para a aprendizagem do PLE passam, antes de mais e de uma forma geral, por uma necessidade de comunicação com a sociedade e a cultura

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3 que acolhe estes imigrantes, seja por motivos profissionais, académicos ou de lazer, já que é através da comunicação que o indivíduo interage e se socializa, característica intrínseca ao ser humano como ser de caráter iminentemente social.

O Conselho da Europa desenvolveu um conjunto de políticas relacionadas com a aprendizagem das línguas a nível europeu, que culminaram na criação de dois documentos basilares, o Quadro Europeu Comum de Referência e o Portefólio Europeu das Línguas, no sentido de promover e garantir a dignidade dos cidadãos, pondo o enfoque na importância da alteridade e identidade culturais, fomentando através destes valores o entendimento entre os povos.

Cabe à instituição Escola e à sociedade em geral providenciar a inserção desses imigrantes que provêm de várias culturas e que falam outras línguas ou diferentes registos da mesma.

Os professores deparam-se cada vez mais nas escolas portuguesas com alunos cuja língua materna não é o português e confrontam-se com a responsabilidade de acolher essa diversidade e de para ela preparar os cidadãos, reconhecendo o direito à identidade linguística e cultural.

Se por um lado a diversidade de línguas e de culturas se torna enriquecedor para os vários intervenientes do processo ensino/aprendizagem, por outro lado o desconhecimento da língua revela-se um forte inibidor em todo este processo.

Como docente da disciplina de Português numa escola da cidade de Leiria, região que constitui um destino muito procurado pelo fluxo migratório, tenho sentido de muito perto os diferentes rostos desta escola.

No início do século XXI, o Agrupamento de Escolas Dr. Correia Mateus teve de dar resposta à necessidade de assegurar condições de integração no meio escolar e de aprendizagem do Português por parte dos alunos imigrantes. No final da primeira década do ano 2000, frequentavam este Agrupamento 1018 alunos, dos quais 51 eram alunos imigrantes, na maioria provenientes da Ucrânia e da Rússia, mas também alunos oriundos de países como Cabo Verde, França, Lituânia e Moldávia. Tratava-se

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4 de alunos filhos de imigrantes recentemente chegados a Portugal por motivos de reunificação familiar.

Numa fase imediatamente a seguir, a escola acolheu também alunos imigrantes de outras zonas do globo, como a China e o Brasil. Podemos afirmar que, no início da década de 2010, frequentavam este Agrupamento mais de uma dezena e meia de nacionalidades no que diz respeito a alunos estrangeiros, num total de oitenta e oito alunos.

No final da mesma década, 6,5% do total dos alunos deste Agrupamento, correspondente a 79 alunos eram estrangeiros, oriundos de doze diferentes países.

No presente ano letivo, a situação é a seguinte: dos 1326 alunos que frequentam o Agrupamento, 209 (22%) são alunos estrangeiros, distribuídos pelo 1º, 2º e 3º ciclos e Jardim Infantil. Destes 180 (86%) são de nacionalidade brasileira e os restantes são oriundos de países como Angola, Cabo Verde, Espanha, Bulgária, Suíça, Itália, Reino Unido, Venezuela, Argentina, Rússia, Ucrânia e EUA.

Dado o número crescente de alunos estrangeiros que frequenta o Agrupamento de Escolas Dr. Correia Mateus, onde exerço funções docentes, surge a necessidade de criar condições que permitam conhecer e compreender as características dos diversos grupos de imigração e encontrar respostas de ensino-aprendizagem para promover uma socialização mais rápida e uma interação construtiva na escola e na sociedade.

Conforme diz o organismo ACIME (Alto Comissário para a Integração de Minorias Étnicas) “trata-se verdadeiramente de um desafio nacional envolvendo Estado, Sociedade Civil, Comunidades Religiosas, os próprios imigrantes e as suas associações.”

(ACIME, 2004:15)

Como afirma Figueiredo (2010:155) “aprender uma língua estrangeira é também aprender a comunicar-se com ela e saber usá-la em situação real. Logo o objetivo primeiro do ensino de PLE é o desenvolvimento da competência comunicativa na componente linguística, sociolinguística e pragmática”.

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5 A escolha deste tema prende-se com o facto de considerarmos que este conteúdo se tem revelado pouco presente no ensino aprendizagem do Português e pouco explorado do ponto de vista didático, seja no Português Língua Materna, seja no Português Língua Não Materna.

Em contexto de sala de aula, sabemos que raros são os alunos que se apercebem de que o uso de determinadas expressões transporta consigo aspetos sociais, culturais, religiosos ou históricos de um país. Estas expressões são tratadas de forma muito en passant nos manuais, no entanto, parece-nos pertinente a sua valorização, pois

“conhecer as EIs é aceder à cultura de um povo e ampliar a nossa forma de ver o mundo”. (Silva, 2014:12). Demonstramos assim que a aprendizagem de uma LE não tem de ser um processo monótono e mecânico, pelo contrário, estas “formas de dizer”

são o veículo no ato comunicativo do suplemento cultural que ele necessita. As palavras de Guilhermina Jorge corroboram esta nossa perspetiva

“(…) as EIs refletem o movimento, a evolução da língua, as metáforas do passado, os desvios lexicais, sintáticos e semânticos. Estas “palavras» enriquecem a linguagem pelo poder criativo, pelas referências culturais, pelas histórias que encerram”. (Jorge,1997:34)

Para além desta motivação, acrescentemos o interesse pessoal na área das Expressões Idiomáticas que, na nossa opinião, constituem a riqueza cultural e linguística de uma comunidade que partilha os mesmos saberes, as mesmas experiências, os mesmos pontos de vista. As expressões idiomáticas “[…] mantêm intacto o colorido de um povo, constituem uma voz rica de sabedoria que soube imprimir na linguagem a sua identidade.” (Jorge, 2001:216)

O presente estudo insere-se no âmbito da Linguística aplicada à aquisição/aprendizagem do Português. Com este trabalho de investigação pretende-se aprofundar conhecimentos enquanto professora do 3.º Ciclo do Ensino Básico e dar um contributo para o desenvolvimento da aprendizagem e ampliação do léxico em Língua Portuguesa, recorrendo às Expressões Idiomáticas (EIs), de forma a promover a

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6 aprendizagem dos alunos que frequentam a escola portuguesa, incluindo os aprendentes para quem o Português não constitui a língua materna.

Pretende-se também salientar a importância que a compreensão das EIs desempenha na consciência sociolinguística e como poderá contribuir para o desenvolvimento da competência comunicativa dos alunos de Português Língua Materna e dos alunos de Português Língua Não Materna (PLNM) do 3.º ciclo do ensino básico.

Visa, por conseguinte, alcançar os seguintes objetivos:

- investigar as dificuldades dos alunos no processo de ensino/aprendizagem face a esta temática;

- apresentar algumas propostas pedagógico-didáticas suscetíveis de serem desenvolvidas no âmbito do ensino-aprendizagem de Português Língua Materna e Português Língua Não Materna, a fim de ajudar os aprendentes a memorizar os significados das EIs, assim como desenvolver a sua competência comunicativa.

Tendo em conta estes objetivos gerais, procuraremos responder às seguintes questões:

- Em que medida os alunos de PLM e PLNM reconhecem as expressões idiomáticas?

- Quais as dificuldades na apreensão do sentido das EIs de acordo com os contextos?

- Que tipo de exercícios podem ser adotados pelos professores de Português no ensino das EIs?

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Limitações do estudo

As limitações temporais e de recursos humanos associados à investigadora e a situação pandémica que o país atravessou e atravessa colocaram alguns constrangimentos ao desenvolvimento deste estudo.

Essas limitações, designadamente, as temporais, pelo facto de este estudo se encontrar integrado num mestrado, com um período delimitado para a sua realização, impedem o desenvolvimento de um trabalho de investigação que nos atrai e que passaria pela colocação em prática de um programa de intervenção de maior duração.

As mesmas limitações, levaram-nos a mudar a estratégia inicial. Logo numa primeira fase percebemos que não era possível desenvolver o trabalho só com os alunos estrangeiros do Agrupamento de Escolas Dr. Correia Mateus. Apesar de em grande número, muitos são de nacionalidade brasileira, têm, portanto, o Português como língua materna, com as especificidades da variante brasileira, é certo, mas ainda assim o Português.

Pensámos alargar o estudo aos alunos estrangeiros de duas escolas de Leiria (Agrupamento de Escolas D. Dinis e Escola Secundária Afonso Lopes Vieira) e de uma escola da Marinha Grande (Escola Secundária Eng.º Acácio Calazans Duarte).

Logo num primeiro contacto com a Direção destas escolas percebemos que seria uma tarefa muito difícil trabalhar com os alunos devido às medidas sanitárias indicadas pela DGS em contexto de COVID 19. De seguida, a tarefa tornou-se impossível com o confinamento de alunos e professores.

Adaptámos, por conseguinte, a via de delimitarmos o estudo a duas das turmas de 9º ano que leciono nesta escola, num total de 52 alunos, 43 alunos de nacionalidade portuguesa, 7 de nacionalidade brasileira, residentes em Portugal desde 2019, 1 de nacionalidade ucraniana, a residir em Portugal desde 2016, 1 de

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8 nacionalidade italiana, a residir em Portugal desde 2020. E assim constituímos o grupo de estudo com base numa amostra disponível.

Sem a pretensão de apresentar resultados que possam ser generalizados, o estudo pode revelar dificuldades sentidas pelos alunos e orientar estratégias pedagógicas, a partir da compreensão dos resultados encontrados num contexto específico.

Organização do estudo

Para o prosseguimento dos objetivos enunciados, obtenção de respostas às questões de investigação e verificação das hipóteses colocadas, este estudo organiza- se em quatro capítulos.

O Capítulo 1, Enquadramento Teórico, apresenta uma fundamentação teórica sobre o tema. Assim, partindo do geral para o particular, faz-se uma pequena exposição sobre o Léxico e a sua importância no ensino-aprendizagem do Português (Língua Materna e Língua Não Materna) para chegar aos enunciados fixos, mais especificamente as Expressões Idiomáticas. Neste ponto, apresentamos uma breve referência teórica sobre as EIs, dando a conhecer o fator cultural que lhes está indissociavelmente ligado, a sua fixidez (ou relativa fixidez) e a sua componente metafórica.

O Capítulo 2, As Expressões Idiomáticas na sala de aula e a sua relevância, far-se- -á uma breve análise de alguns documentos orientadores do ensino do Português com o objetivo de caracterizar a forma como estes documentos enquadram as Expressões Idiomáticas no processo de ensino/aprendizagem da língua.

O Capítulo 3, Metodologia, apresentamos a caracterização dos participantes, a apresentação dos dados recolhidos através dos questionários sociolinguísticos e a

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9 descrição metodológica pormenorizada das estratégias e atividades aplicadas nos exercícios realizados nas aulas para, em seguida descrever as observações efetuadas e, por fim, efetuar a sua análise.

O Capítulo 4, Propostas de materiais didáticos, propõem-se estratégias de superação alternativas às que foram implementadas nas unidades didáticas e nos exercícios referidos no capítulo 3.

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10

Capítulo 1

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ENQUADRAMENTO TEÓRICO

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1.1. Léxico. Competência lexical. Unidade lexical

O léxico é a janela através do qual um povo vê o mundo

Mário Vilela

As palavras talvez sejam os elementos mais importantes de uma língua, pois fazem referência a tudo o que está à nossa volta, permitindo que nos possamos expressar. Estas são instrumentos que representam a organização do mundo e a vida dos seres humanos, têm valores que não são absolutos, uma vez que as relações humanas estão em constante transformação. Sabendo que as palavras variam de língua para língua, podemos afirmar que cada comunidade linguística possui um léxico.

O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa define léxico como uma

“componente da gramática internalizada do falante que contém todo o seu conhecimento lexical: as palavras que conhece, com a sua pronúncia, significação e as características sintáticas para o seu emprego numa sentença.” (Houaiss, 2007:5010)

Por seu lado, no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, os autores consideram, entre outros pontos que o léxico é

“um conjunto ilimitado e aberto de lexemas (unidades linguísticas com significado que não são divisíveis) disponíveis na língua de uma comunidade ou de um locutor.” (Porto Editora, 2010:972)

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12 Podemos então afirmar que o léxico consiste na totalidade de palavras de uma língua que se vai atualizando no tempo, aberto à entrada de novos vocábulos através de “campos semânticos, empréstimos e formação de palavras (a partir de palavras ou elementos existentes na língua).” (Vilela, 1994:14)

Parece-nos ainda pertinente acrescentar que a estrutura lexical ou o sistema lexical de uma língua traduz a experiência cultural acumulada por uma sociedade através do tempo. Essa experiência é subtil, ocorre sem nos darmos conta, no entanto, à medida que o tempo passa, o léxico de uma comunidade ou de um povo altera-se gradualmente, o que dificulta a tarefa de conhecer a extensão do léxico de uma língua.

Sendo a língua um instrumento de comunicação social e cultural é também um instrumento de estruturação do pensamento que enquadra uma determinada visão do mundo. Desta forma, quando se aprende uma língua estrangeira, aprende-se a forma de ser, de sentir, de pensar e de agir, isto é, a cultura implícita na língua-meta. A compreensão dos dois mundos e das duas culturas, da Língua Materna e da Língua Estrangeira, desenvolve no aprendente uma consciência intercultural. Assim, na aprendizagem de uma língua estrangeira o principal objetivo é o desenvolvimento da competência linguística orientada para a ação considerando “o utilizador e o aprendente de uma língua como atores sociais, que têm de cumprir tarefas (que não estão apenas relacionadas com a língua) em circunstâncias e ambientes determinados, num domínio de atuação específico.” (QECRL:29) Esta abordagem orientada para a ação recorre também aos aspetos cognitivos, afetivos, volitivos que estão implicados no ensino/aprendizagem de uma língua estrangeira.

Esta competência comunicativa abrange o conhecimento declarativo, a capacidade e a competência de uso da língua, com o objetivo de alcançar o modelo linguístico do falante nativo. Por este motivo e de acordo com o QECRL, a competência comunicativa engloba as componentes linguística (que compreende as competências:

lexical, gramatical, semântica, fonológica, ortográfica) sociolinguística (conhecimento e

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13 capacidades no uso social da língua) e pragmática (que inclui as competências discursiva, funcional e de conceção).

Dentro da multicompetência comunicativa destaca-se a competência lexical e sociocultural como uma das vertentes essenciais para um eficaz desempenho no processamento da informação. Declinando a ideia de que a aprendizagem do léxico surge de modo automático e intuitivo, bastando a imersão na língua, e pondo de parte a estratégia da aprendizagem memorística de listas de palavras, cujo resultado é a estigmatização da memorização como processo cognitivo, aceita-se hoje que o recurso a métodos funcionais e comunicativos permite a aprendizagem em contexto de aula de vocabulário intencional e cuja frequência das atividades de processamento da informação determina a retenção de informação nova.

Parece-nos que o recurso ao Ensino de Línguas Baseado em Tarefas (ELBT) poderá possibilitar uma aprendizagem mais eficaz e eficiente, visto que consiste numa abordagem para ensinar línguas segundas ou estrangeiras que envolve os alunos na aprendizagem da língua que usam para executar tarefas e obter informações, refletir e dar opinião.

O ELBT propõe o uso de tarefas como principal componente das aulas de línguas, uma vez que propicia melhores situações para ativar os processos de aquisição dos alunos e promover a aprendizagem da L2. Na execução da tarefa, os alunos envolvem- se numa atividade comunicativa que reflete muito de perto a linguagem utilizada fora da sala de aula. Neste sentido a tarefa implica uma atividade na qual o aluno se implica a fim de conseguir cumprir um objetivo não-linguístico, mas para o qual precisa de um meio linguístico.

A abordagem ELBT procura, por um lado, proporcionar aos alunos uma aprendizagem da língua a partir de contextos reais (as tarefas têm uma clara relação pedagógica com as necessidades comunicativas do mundo real); consciencializar os aprendentes para o facto de a língua variar de acordo com o contexto social, os propósitos e as circunstâncias em que é usada e permite ainda que os alunos, ao trabalharem em conjunto para concluírem uma tarefa, tenham a oportunidade de

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14 interagir. Considera-se que esta interação facilita a aquisição de língua, uma vez que estes têm de trabalhar para se entenderem e se exprimirem.

Estamos, pois, perante uma abordagem que baseia o ensino de língua em tarefas, cujo objetivo é resolver uma situação comunicativa através de uma espontânea troca de sentidos, que tem uma relação com a vida real e a experiência dos alunos, o que desperta o interesse destes e o seu envolvimento na aprendizagem.

O QECR precisa esta contextualização das tarefas, esta situação real de comunicação que funciona como fator de motivação:

“As tarefas pedagógicas comunicativas (ao contrário dos exercícios que dão destaque especificamente à prática descontextualizada de formas) pretendem envolver activamente os aprendentes numa comunicação real, são relevantes (aqui e agora no contexto forma de aprendizagem), são exigentes, mas realizáveis (com manipulação de tarefa, quando necessário) e apresentam resultados identificáveis (e possivelmente outros menos evidentes no imediato). As tarefas deste tipo podem envolver tarefas (intermediárias)

“metacognitivas), ou seja, a comunicação sobre a implementação da tarefa e a língua usada para a realizar.”

(QECR, 2001:218)

Neste contexto de ensino por tarefas, em que se introduz o léxico em situações concretas de uso, trabalha-se vocabulário associado a cada unidade temática por meio de metodologias explícitas que contemplam as diversas etapas do processo, tais como:

a) compreender; b) reter; c) reutilizar; d) reconhecer; e) incorporar; f) produzir. Em cada uma destas etapas, em que se infere o sentido e o valor pragmático da palavra, o aprendente vai construindo um saber sobre a palavra e as expressões de forma a ir dominando um complexo de propriedades, destacando-se, entre elas, os seus valores semânticos metafóricos. No ensino-aprendizagem do léxico, conjugam-se em simultâneo dois aspetos: um de caráter cognitivo e outro de caráter sociocultural. Um

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15 inferencial em que se associam palavras e expressões entre si; outro referencial em que se usa uma palavra projetando as unidades léxicas no mundo real.

Trabalhar a competência lexical visa, também, facultar ao aprendente o acesso a aspetos socioculturais implícitos, quer ao nível das unidades lexicais, quer ao nível da fraseologia desde os níveis de iniciação, de maneira a que o aprendente possa ir descodificando, desde cedo, todo o ato comunicativo. Ora o conhecimento lexical implica a seleção de uma unidade lexical e/ou de uma unidade fraseológica adequada (linguística, sociolinguística e pragmática) a uma determinada situação de comunicação oral ou escrita. A inadequação do uso lexical pode levar a erros de comunicação e ao rompimento de normas e condutas de cortesia. Desta forma, dotar o aprendente de PLE destes conhecimentos e destrezas é aproximá-lo do falante nativo que domina uma grande percentagem de combinações estáveis de que se socorre, quer para adequar a sua comunicação, quer para produzir discursos sem esforço. Na opinião de Molina a competência lexical

“Dicha competência no sólo se refiere a los conocimientos y destrezas (formácion de palabras, relaciones semânticas, valores, etc.) sino tanbién a la organización cognitiva y la forma en que se almacenan estos conocimientos en el lexicón (redes associativas) y a su acessibilidade (activación, evocación y disponibilidad).” (Molina, 2004:491)

A aprendizagem do léxico de uma língua aparece muitas vezes relegada para segundo plano quando comparada com a aprendizagem da gramática. Naturalmente, conhecer as estruturas da língua e as suas regras é importante, mas não é suficiente no momento em que o aprendente é colocado num contexto comunicativo. A este propósito, torna-se pertinente fazer uma distinção entre “palavra” e “unidade lexical”, já que a segunda “é um conceito mais amplo que engloba outros aspetos que devem ser tratados no ensino-aprendizagem do léxico”. (Higueiras, 2009:112) Ainda segundo Higueiras (2009:114) conhecer uma unidade lexical significa saber a sua denotação e referência, o som e a grafia, as estruturas sintáticas em que aparece, as características

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16 morfológicas, as relações paradigmáticas de sinonímia, antonímia e hiponímia, as suas combinações sintagmáticas, o conteúdo cultural, o registo, os usos metafóricos com que é usada e a sua pertinência.

Refere, a este propósito, o QERCL (2001:159) que a competência léxica se compõe não só de elementos lexicais, mas também de elementos gramaticais. Os elementos lexicais podem dividir-se em dois grandes grupos:

1) As expressões fixas - que compreendem as expressões feitas (que incluem as fórmulas de interação social, os provérbios, os arcaísmos), as expressões idiomáticas e expressões fixas iniciadoras de frases e outras combinações formadas por palavras que se utilizam frequentemente juntas, como por exemplo, os verbos com regência preposicional.

2) As palavras isoladas – onde se incluem as palavras das classes abertas, que compreendem os nomes, os verbos, os adjetivos e os advérbios - e os conjuntos lexicais fechados (p. ex.: dias da semana, meses do ano, pesos e medidas, etc.)

Seguindo a mesma linha de pensamento, Molina (2004:791) propõe delimitar as diferentes classes de itens lexicais em cinco blocos: palavras, polipalavras, colocações, expressões fixas e expressões semifixas e aponta algumas estratégias que permitem estudar o léxico tendo em conta as características que devemos saber sobre elas. Num primeiro passo, sobretudo no início do processo, a aprendizagem das unidades lexicais pode acontecer de forma descontextualizada, pois, mais importante do que o contexto, é a importância de fornecer um cotexto, isto é, as palavras com as quais costumam aparecer.

Efetivamente, nos primeiros níveis, a maior parte do léxico refere-se a objetos concretos ou a temáticas específicas que não têm qualquer relação com o contexto em que são apresentadas. Esta abordagem fará algum sentido, porque nesta fase os aprendentes constroem associações simples entre as unidades lexicais que aprendem e não têm ainda capacidade para criarem redes de significado mais complexas, ou seja, a falta de um contexto não trará problemas, desde que nos níveis seguintes a

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17 aprendizagem do léxico seja acompanhada de métodos que permitam a associação a um contexto ou situação.

Num segundo passo, o autor defende que quanto maior é o conhecimento da L2, maior deve ser o contacto com as unidades lexicais e as suas combinações porque implica a capacidade de retenção na sua rede mental de significados. Pertinente é também a inclusão de exercícios que obriguem ao uso de unidades lexicais que já fazem parte do léxico dos alunos há mais tempo. Conhecer uma unidade lexical é saber variadas informações sobre ela e dominar uma língua nos níveis mais avançados é sobretudo um processo qualitativo mais do que quantitativo.

Efetivamente, estas questões associadas à memorização e ao armazenamento do léxico não devem ser descuradas pelo professor de LE, já que são essenciais na aquisição de vocabulário de uma L2. É importante ter também em conta que essas formas de organização mental variam de aluno para aluno, sobretudo no que diz respeito às “características culturais”1 adjacentes à comunidade onde o aluno cresceu e fez a sua escolarização.

Na sequência destas perspetivas, podemos facilmente concluir que o estudo das Expressões Idiomáticas se revela um processo tão complexo e longo como o de qualquer outro conteúdo e a sua abordagem nas aulas de LE, de forma contextualizada e reflexiva, é uma mais-valia não só do ponto de vista da aprendizagem das estruturas da língua, como também dos seus conteúdos culturais.

1 Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas, Capítulo 2, 2.1.2. Competência comunicativa em língua, p. 35 - “Pode também considerar-se que a organização cognitiva do vocabulário e do armazenamento de expressões, etc. depende, entre outras coisas, das características culturais da comunidade ou comunidades nas quais o indivíduo foi socializado e onde ocorreu a sua aprendizagem.”

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18

1.2. As Expressões Idiomáticas

Aucune langue ne peut s’apprendre, ni être décrite, sans elles

Alain Rey

As expressões idiomáticas são formas de expressão próprias de uma língua e refletem a sua riqueza. Através delas, o falante nativo consegue expressar uma certa realidade de forma natural e espontânea, transmitindo, assim, referências culturais da sua comunidade linguística.

Citando Jorge (2001:219)

“conhecer uma língua não é conhecer uma lista alfabetizada e organizada de palavras, pois se assim fosse o dicionário satisfaria essa necessidade, mas sim conhecer múltiplas combinatórias que criam a identidade de uma língua e a sua especificidade”.

A principal dificuldade na comunicação não se situa tanto ao nível das diferenças dos sistemas linguísticos, mas reside, essencialmente, ao nível das experiências e convicções dos sujeitos falantes. Se pensarmos na comunicação entre falantes de diferentes línguas, temos de admitir que as conotações culturais, motivadas por todo um conjunto de experiências coletivas, tais como a história, a civilização, a tradição literária e os estereótipos sociais podem dificultar a compreensão.

Para nos exprimirmos e compreendermos um discurso não basta conhecermos as palavras, é também importante dominar o significado dos grupos de palavras que têm uma forma autónoma e fixa e uma significação figurada. Um falante nativo não tem consciência desta dificuldade, para ele estes recursos linguísticos fluem

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19 naturalmente na sua prática linguística, mas para uma pessoa em fase de aprendizagem de uma língua estrangeira, as construções fixas podem colocar dificuldade e impedir a compreensão.

Cada língua contém um grande número de recursos linguísticos, entre os quais se encontram as expressões idiomáticas, que constituem a riqueza cultural e linguística de uma comunidade que partilha os mesmos saberes, as mesmas experiências, os mesmos pontos de vista. Para nos exprimirmos de forma espontânea e para que o ato de comunicação se cumpra na sua plenitude, um bom domínio destes recursos é muito importante.

“As expressões idiomáticas […] mantêm intacto o colorido de um povo, constituem uma voz rica de sabedoria que soube imprimir na linguagem a sua identidade. […] Conhecê-las implica conhecer o povo, a cultura que lhes deu vida, estabelecer entre elas e os homens relações, conhecer mais profundamente a língua e as suas múltiplas formas de expressividade. Ao exprimir esse saber, o locutor estabelece com o(s) interlocutor(es) um terreno comum partilhado por todos, que visa facilitar a comunicação”. (Jorge, 2001:216)

A língua portuguesa viu surgir nestes últimos anos um importante número de estudos sobre a fraseologia em geral e mais especificamente sobre as expressões idiomáticas. O novo contexto globalizante e a necessidade de acentuar as particularidades intrínsecas à língua e à cultura serão responsáveis por este novo olhar sobre a cultura popular, sobre a língua do povo, salvaguardando, pela diferença, a sua nova identidade.

A fraseologia como subdisciplina da Linguística continua a ser considerada um campo de debates, apesar de nos últimos cinquenta anos vários autores se terem debruçado sobre este tema. O principal obstáculo encontrado no desenvolvimento da fraseologia como disciplina com plenos direitos da linguística tem sido a falta de

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20 consenso entre os investigadores no que respeita ao objeto do estudo da fraseologia e a sua taxonomia.

As investigações sobre a fraseologia remontam ao início do século XIX, sendo o linguista francês de origem suíça, Charles Bally, quem argumentou pela primeira vez a necessidade do estudo científico das combinações fixas de palavras. Para designar esse tipo de combinações, o linguista utilizou o termo unidades fraseológicas que na sua aceção constituíam, juntamente com as séries fraseológicas, o objeto de estudo da fraseologia. Este discípulo e sucessor de Saussure considerou a fraseologia como parte da lexicologia e, embora não tenha proposto critérios rigorosos2 para delimitar os fraseologismos, a sua contribuição seria decisiva para o desenvolvimento ulterior da fraseologia.

Na Europa Ocidental serão publicados novos estudos sobre a fraseologia apenas nos anos setenta e dentro da semântica estrutural.

Foi a Linguística Cognitiva que, a partir dos anos oitenta e especialmente nos anos noventa, conseguiu vitalizar a investigação fraseológica e torná-la uma parte fundamental da gramática da língua.

Em Portugal a investigação dedicada à fraseologia e às expressões idiomáticas, em comparação com os estudos desenvolvidos internacionalmente, não parece ter suscitado o mesmo interesse.

Jorge (2005) refere que no que concerne à fraseologia existem apenas alguns trabalhos pontuais sobre a sintaxe, a morfologia (nomes, advérbios e adjetivos compostos) e sobre a didática.

2 Na conceção de Charles Bally, para delimitar os fraseologismos temos de ter em conta fatores externos (os fraseologismos são unidades constituídas por palavras escritas separadamente; as combinações apresentam uma tópica fixa que não permite a introdução de uma outra palavra na mesma estrutura;

nenhuma palavra da combinação pode ser trocada por outra) e fatores internos, considerados os mais importantes (o fraseologismo corresponde semanticamente a uma palavra, também chamada “termo de identificação”; a perda do significado base das palavras combinadas) (Bally,1995: 67-87)

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21 Um dos trabalhos mais conhecidos sobre a fraseologia portuguesa é o de Rodrigues Lapa, Estilística da Língua Portuguesa, que tem o mérito de ter sido publicado numa altura em que os estudos fraseológicos estavam nos seus primórdios.

Para o autor, a linguagem e especialmente os fraseologismos são governados por duas forças: “a herança passiva e cómoda do passado” e a “criação ativa e por vezes revolta do presente”.

Mais recentemente, destaca-se a atividade de Mário Vilela no campo das fraseologias, encaradas desta vez da perspetiva da linguística cognitiva. Os estudos de Vilela sobre a metáfora em geral e sobre a metáfora conceptual partem dos pressupostos de Lakoff e Jonhson (1980) e têm como denominador comum os estereótipos. As “expressões congeladas” lexicalizam os estereótipos de uma dada comunidade e, de acordo com Vilela, “conhecer uma língua é ter consciência dos seus estereótipos” (2003:249)

Para Vilela a fraseologia representa “as combinações fixas” ou “congeladas” de uma língua que “no sistema e na frase podem assumir a função e o significado de palavras individuais” (2002:160). As fraseologias teriam a função de ampliar o léxico, em especial na “área da expressividade” através de processos de “lexicalização da conceptualização e categorização da nossa experiência quotidiana”. Os campos lexicais onde atuam as fraseologias seriam “as emoções, as atitudes, as interpretações subjetivas, os comportamentos, frequentemente com pendor negativo” (2002:161).

(33)

22

1.2.1. Definição

Existe uma grande variedade terminológica utilizada para definir o termo

“expressões idiomáticas”. Vilela (2002:18) define-as como “uma sequência que não pode ser traduzida literalmente para outra língua, ou seja, não é possível a tradução palavra por palavra”, afirmação que vai ao encontro da definição proposta pelo QECR (2001:159) que define as expressões idiomáticas como metáforas cristalizadas e semanticamente opacas, como por exemplo: Foi sol de pouca dura (= não durou muito tempo); Ele bateu a bota (= morreu). Estas metáforas, segundo Polónia (2009:22) “no caso das expressões idiomáticas, trata-se de um processo que se instaura (…) numa transferência de significado semântico abstrato para um modelo concretamente representável na realidade”.

Refere ainda Vilela (2002:1) que

“as designações do que costuma ser incluído de modo mais ou menos vago em expressões idiomáticas abarca um amplo leque de rótulos cujos núcleos nominais assentam em idioma (idiomatismo), expressão (expressão idiomática, expressão figurada), frase (frases feitas, fraseologismo, fraseologismo verbal/ nominal/ adverbial/ adjetival, frases estereotipadas), grupos (grupos fraseológicos), locução (locução verbal, locução nominal/ adjetiva, locuções figuradas), modo (modo de falar, modismo), sintagma (sintagma fixo) e ainda colocações, lexias complexas, solidariedades lexicais e, por vezes, provérbios e ditados (com as respetivas variantes)”.

Neste sentido, as expressões idiomáticas são compostas por unidades lexicais cujo significado não pode ser depreendido palavra a palavra, mas sim na sua globalidade, caso contrário ficaria incorreto. “Naturalmente, quanto maior for o

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23 distanciamento entre o significado literal e o significado fraseológico, maior será o grau de idiomaticidade de uma fraseologia.” (Malho, 2009:25) Dá-se como exemplo:

vai pentear macacos (= vai incomodar outra pessoa).

Para que se reconheça uma unidade fraseológica como expressão idiomática, além da idiomaticidade, precisamos de observar outras particularidades que a compõem. Xatara (1998) adiantou uma proposta de conceito de Expressão Idiomática como sendo “uma lexia complexa indecomponível, conotativa e cristalizada em um idioma pela tradição cultural” e estabeleceu quatro requisitos básicos

“(…) explicamo-nos sumariamente: lexia complexa porque tem o formato de uma unidade locucional ou frasal; indecomponível porque constitui uma combinatória fechada, de distribuição única ou distribuição bastante restrita; conotativa porque a sua interpretação semântica corresponde a pelo menos um primeiro nível de abstração calculada a partir da soma dos seus elementos sem considerar os significados individuais;

cristalizada porque a sua significação é estável, em razão da frequência de emprego, o que a consagra”. (Xatara, 1998:170)

Esta definição remete para a ideia de que as expressões idiomáticas são unidades ricas da língua totalmente procedentes do quotidiano das pessoas, sendo consagradas pelo uso. São bastante frequentes e o seu uso pode variar muito de geração para geração, pois para usar uma expressão é necessário compreender o seu significado, que não é evidente se esse conhecimento não for partilhado entre os falantes. Para corroborar essa afirmação recordemos a opinião de Ortiz Alvarez:

“As expressões idiomáticas refletem o lado dinâmico da língua, a sua adaptação constante às necessidades comunicacionais do momento, tanto que podem desaparecer logo depois de seu

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24 surgimento, se bem que muitas ficam e se incorporam ao inventário lexical da língua.” (Ortiz, 2000:73).

As ideias de Xatara e Ortiz complementam-se uma vez que ambas consideram as expressões idiomáticas como um recurso linguístico cultural, rico e dinâmico consagrado pelo uso e os seus significados conotativos podem, muitas vezes, direcioná-lo. Daí que, para um estudante compreender como esse léxico especial se constitui na língua, seja necessário que este não se prenda somente às regras e ao léxico.

Posto isto, podemos considerar que as expressões idiomáticas são diversas e variadas que proliferam na língua portuguesa, ou seja, “o acervo de frases feitas ou expressões correntes na língua portuguesa é impossível encerrar num conjunto fechado e estático. A impressionante dinâmica da invenção dessas frases determina tal impossibilidade. E ainda bem, porque assim se revela, mais uma vez, a riqueza imaginativa da língua e o movimento interno que a percorre e transforma.”

(Neves,1999:9).

Podemos inferir, a partir destas referências, que uma EI é uma manifestação espontânea de criatividade, de capacidade de criar imagens e de captar emoções de qualquer língua que não é possível traduzir para outras línguas. É uma expressão cuja interpretação ultrapassa o significado literal e que deve ser entendida globalmente e não pelo sentido de cada uma das suas partes. Uma expressão idiomática pode enriquecer uma frase, dando-lhe força ou subtileza, pode enfatizar a intensidade dos sentimentos de alguém e pode ainda atenuar o impacto de uma declaração austera, com ironia ou humor.

(36)

25

1.2.2. Características

No interior das fraseologias as palavras perdem o seu significado individual e constituem em conjunto um significado novo, transposto, idiomatizado.

Vilela, 2002:172

Seja qual for a definição avançada pelos diferentes autores, as características que se apresentam são, em resumo, a fixação que “consiste na impossibilidade de dissociação de um grupo” e a idiomaticidade que se baseia na construção de um significado “que não resulta do significado dos morfemas.” (Vilela, 2002:73)

Como havia já sido referido por Jorge, partindo da definição de EI como “um signo polilexical,” o seu significado

“não pode ser calculado pelos significados das palavras contidas na expressão e apresenta uma distribuição única ou muito restrita dos seus elementos lexicais. As particularidades das EIs abrangem dois vetores: a forma (um grupo de palavras) e o conteúdo (o sentido idiomático)”. (Jorge, 1997:371)

Vários autores se debruçaram sobre a especificidade deste tipo de construções e demonstraram a proximidade sintática com as construções não idiomáticas. Fraser a este propósito refere que

“(…) there are two main problems which arise in the treatment of idioms within the framework of a transformational grammar.

First is the question of how to represent the meaning of an idiom in the deep structure representation of a sentence.

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26 Inherent in answering this question is one involving the introduction of an idiom into the base P-marker generated by a set of context-free phrase structure rules. Second is the question of how to account for the recalcitrance of idioms to undergo particular syntactic transformations”. (Fraser, 1970)

A fixidez

Como já referimos anteriormente a lexicalização transforma uma combinação livre de palavras numa combinação fixa, coesa e estável, através da convencionalização que o uso e a sistematização provocam. Ainda que as fraseologias retenham muito das características da composição livre, também se distanciam destas pela sua estabilidade sintático-semântica.

Exemplificando segundo Rebelo (2000:29)

a) “Arranjar lenha para se queimar” – Próxima da composição livre3 b) “Mais velho do que a Sé de Braga” - Fraseolexema4

Desta forma, a relativa fixidez das Expressões Idiomáticas comprova-se pela coesão semântica e morfossintática dos seus componentes, cuja estabilidade total ou relativa pode ser comprovada através de testes e operações, que as distinguem das composições livres (Rebelo, 2000:27). Sujeitando as Expressões Idiomáticas a determinadas transformações podemos verificar que elas não perdem a sua gramaticalidade, mas perdem a sua coesão semântica (idiomaticidade).

3 A composição livre regulada pela técnica do discurso “é toda a combinação gerada pelas regras combinatórias jogando com as propriedades sintácticas e semânticas, como, por exemplo, as regras que regulam a relação entre verbos e respectivos complementos” (Vilela, 2002:169/170)

4 “Reservamos a designação de fraseolexema para o tipo de fraseologias que têm uma estrutura semântica e sintáctica completamente fixa” (Rebelo, 2000:66)

(38)

27 Passamos a exemplificar, apoiando-nos em Vilela e Rebelo:

1. A ordem dos constituintes é fixa:

a) “Andar de cavalo para burro”

* “Andar de burro para cavalo”

b) “Deixar correr o marfim”

* “Deixar o marfim correr”

2. Os componentes lexicais e semânticos são fixos:

a) “Amargar a boca”

* “Amargar a língua”

b) “Abrir os cordões à bolsa”

* “Abrir os cordões ao saco”

3. Restrições de adição (adjetival):

a) “Comer que nem um abade”

* “Comer que nem um abade guloso”

b) “Aquilo com que se compram os melões”

* “Aquilo com que se compram os melões maduros”

4. Restrições de supressão (ausência de artigo):

a) “Dar uma mãozinha”

*”Dar mãozinha”

b) “Custar os olhos da cara”

* “Custar olhos da cara”

5. Restrições de relativização:

a) “Dar pérolas a porcos”

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28 * ”As pérolas que (alguém) deu a porcos”

b) “Fazer castelos no ar”

* “Os castelos que (alguém) fez no ar”

6. Restrições de passivização:

a) “Não pregar olho”

* ”O olho não foi pregado (por alguém)”

b) “Dizer para com os seus botões”

* “Para com os seus botões foi dito (por alguém)”

7. Restrições de pronominalização:

a) “Meter uma cunha”

* “Meteu-a”

b) “Surfar uma onda”

* “Surfou-a”

8. Restrições de determinação:

a) “Ser um zero à esquerda”

* “Ser aquele zero à esquerda”

b) “Dar água pela barba”

* “Dar aquela água pela barba”

9. Restrições de intensificação (VILELA, 2002; 189):

a) “Ser música para os meus ouvidos”

* “Ser muita música para os meus ouvidos”

b) “Ficar nas nuvens”

* “Ficar muito nas nuvens”

10. Restrições de indefinição:

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29 a) “Separar o trigo do joio”

* “Separar um trigo do joio”

b) “Ter a papinha toda feita”

* “Ter uma papinha toda feita”

A fixidez das fraseologias tem sido posta em causa, precisamente por se verificar no texto e no discurso uma desconstrução dessa estabilidade, que provoca uma enorme possibilidade de variações, “as variantes usuais ou convencionais”, previstas dentro da norma linguística (Vilela, 2002:174). Nestas mudanças estruturais e ainda no parecer de Vilela, dão-se “mudanças morfológicas e sintáticas parciais de cada um dos componentes (variantes de estrutura fraseológica), mantendo-se sempre o significado e a marca diastrática5 em que se verifica apenas a substituição de elementos estruturais do fraseologismo, como sendo as variantes de sentido estrito.

Vilela (2002:175-178) faz uma avaliação exaustiva das variáveis que algumas Expressões Idiomáticas podem assumir na norma linguística, das quais destacamos algumas:

1. Variantes estruturais de género, com diminutivo e superlativo:

a) “De beiço caído / Beiça caída”

b) “Ter a papa toda feita / papinha toda feita”

c) “Coisa nenhuma / coisíssima nenhuma”

2. Variação entre singular e plural:

a) “Em água/ águas de bacalhau”

b) “Jurar a pé junto / pés juntos”

3. Variação entre diferentes formas de negação e não negação:

a) “Não ter papas na língua / sem papas na língua”

5 É o registo de língua/a situação que condicionam a escolha criteriosa, por parte do enunciador relator, de uma expressão cristalizada.

(41)

30 b) “Medir / não medir as palavras”

4. Variação entre preposições:

a) “Ficar com os olhos em bico / de olhos em bico”

5. Variação em que é possível a antonímia:

a) “Ser boa rés / más rés”

b) “De cabeça caída / levantada”

6. Variação em campo lexical homogéneo:

a) “Dar / deitar / lançar / pérolas a porcos”

b) “Vir com pezinhos de lã / passinhos de lã”

7. Variação de campo lexical heterogéneo:

a) “Comprar / vender / comer / apanhar/ gato por lebre”

b) “Gastar dinheiro à tripa forra / à larga / à farta / às mãos cheias / a rodo”

8. Variação diastrática:

a) “Não ir à bola com alguém” / “não ser santo da sua devoção” / “não ir à missa de alguém”

9. Variação por presença/ausência de elementos actanciais ou por transgressão da combinação livre:

a) “Estar com os olhos em alguém / com os olhos postos em alguém”

b) “Pôr alguém na rua / pôr alguém no olho da rua”

10. Variação de núcleo com fixidez do colocativo:

a) “Estar gagá / xexé / mais para lá do que para cá”

Existem ainda, variações no texto e no discurso que passam por cortes e adições dos respetivos elementos constitutivos e que vêm pôr em causa o congelamento das

(42)

31 Expressões Idiomáticas, vindo a utilizar-se o termo de relativamente fixas por se verificar que elas se desconstroem totalmente por enfatização de quem as utiliza, visando a transmissão da mensagem opinativa (argumentativa) através da expressividade e da emotividade.

Naturalmente, esta questão desvanece-se quando aplicada à Língua Materna porque os falantes fazem uso do seu saber empírico. Contudo, na aprendizagem de uma LE, conhecer tais oscilações torna-se primordial.

Entre as dificuldades com as quais se deparam o professor e o aprendente de uma língua estrangeira, estão as expressões idiomáticas. Sendo expressões cristalizadas e indecomponíveis, cujo sentido e emprego são determinados cultural e convencionalmente, estas não só estão vinculadas à situação de enunciação, como apresentam uma significação que não corresponde à soma dos significados individuais dos seus constituintes.

É também importante observar que

“a aquisição da maioria das combinações idiomáticas se faz de forma não sistemática, em leituras ou conversas, desde que o falante esteja atento a elas. Além disso, esse indivíduo só perceberá que se trata de uma expressão consagrada quando a ouvir repetidas vezes. Então, poderá memorizá-la e utilizá-la quando a situação e o contexto as transformarem num fator específico de eficácia comunicacional”. (Xatara, 1995:200)

(43)

32

1.2.3. Competência metafórica

Através da metáfora a alma vê mais e mais longe.

Aristóteles

Na sequência da noção de unidade complexa conotativa teorizada por Xatara, abordaremos neste capítulo a questão da competência metafórica, já que o ensino/aprendizagem das Expressões Idiomáticas implica a capacidade de analisar e compreender a metaforicidade destas expressões.

Sabendo que existem diferentes definições de metáfora, teremos como base a conceção de que a metáfora é qualquer uso da língua que se distancia do seu significado denotativo.

A visão tradicional da metáfora reservava-lhe um papel “especial” dentro da linguagem: era uma “figura de estilo” um “desvio”, como genericamente as visões estruturalistas a viam. Portanto, a metáfora era tudo menos o funcionamento normal, habitual, da língua da vida do quotidiano.

Lakoff e Johnson são pioneiros ao afirmar que a metáfora está presente na vida do quotidiano, não somente na linguagem, mas também no pensamento e na ação. O maior mérito da obra de Lakoff e Johnson talvez tenha sido o de provar e focar, mais insistentemente que quaisquer outros anteriores a eles, que a metáfora não é algo anormal, mas um fenómeno do viver/falar da vida do quotidiano, não é apenas uma técnica linguística, mas também um processo que se espelha em variadas formas e expressões.

(44)

33 A sua obra Metaphors we live by sublinha, desde o início, que a metáfora é um fenómeno da linguagem do quotidiano:

“metaphor is pervasive in everyday language and thought—

evidence that did not fit any contemporary Anglo-American theory of meaning within either linguistics or philosophy.

Metaphor has traditionally been viewed in both fields as a matter of peripheral interest. We shared the intuition that it is, instead, a matter of central concern, perhaps the key to giving an adequate account of understanding”. 6 (Lakoff; Johnson, 1980)

Esta posição veio deitar por terra a visão da metáfora como figura de estilo usada como ornamento retórico e poético, perspetivando a metáfora como essencial na comunicação humana e como um conceito que abrange várias atividades cognitivas, passando, desta forma, a ter um papel fundamental na organização e funcionamento do sistema concetual humano.

Acrescente-se e ainda citando Lakoff e Johnson (2002:59):

“as metáforas não são meramente fenómenos que devem ser decifrados. De facto, só é possível decifrá-las usando outras metáforas. É como se a habilidade de compreender a experiência por meio da metáfora fosse um dos cinco sentidos, como ver, ou tocar, ou ouvir, o que quer dizer que nós só experienciamos uma boa parte do mundo por meio de metáforas”.

6 a metáfora interpenetra a linguagem e o pensamento quotidianos - evidência que não se encaixava em

nenhuma teoria contemporânea angloamericana sobre o significado, quer na linguística quer na filosofia. A metáfora tem sido tradicionalmente vista, em ambos os campos, como uma questão de interesse periférico. Compartilhamos a intuição de que é, em vez disso, uma questão central, talvez a chave para a explicação mais adequada da compreensão. (Lakoff; Johnson, 1980, p.7, tradução nossa).

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