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Estratégias didáticas inovadoras para uma aprendizagem integrada sob a ótica da complexidade e do pensamento ecossistêmico

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Academic year: 2017

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ELUIZA ZANLORENZI

ESTRATÉGIAS DIDÁTICAS INOVADORAS PARA UMA APRENDIZAGEM INTEGRADA SOB A ÓTICA DA COMPLEXIDADE E DO PENSAMENTO

ECOSSISTÊMICO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial à obtenção do Título de Mestre em Ensino-Aprendizagem.

Orientadora: Dra. Maria Cândida Moraes

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Ficha elaborada pela Coordenação de Processamento do Acervo do SIBI – UCB Z31e Zanlorenzi, Eluiza.

Estratégias didáticas inovadoras para uma aprendizagem integrada sob a ótica da complexidade e do pensamento ecossistêmico / Eluiza Zanlorenzi. – 2009.

150 f. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2009. Orientação: Maria Cândida Moraes.

1. Inovações educacionais. 2. Atitude – Mudança. 3. Análise de interação em educação. I. Moraes, Maria Cândida, orient. II. Título.

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Dedicatória: À minha neta, Sophia Rosa

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Agradecimentos

À memória de meus pais, Cléa Dinah Rehder Zanlorenzi e Luigi Zanlorenzi, que me deixaram a maior riqueza que pais podem deixar aos filhos: educação.

Aos meus filhos, Luiz Cláudio Zanlorenzi Pulino e Marcos Vinicius Zanlorenzi Pulino, por acreditarem em mim e me apoiarem durante toda esta jornada.

À minha orientadora, Maria Cândida Moraes, por me ter permitido ver as mesmas paisagens com outros olhos, preparando-me, assim, para uma outra etapa de vida. .

Aos meus amigos pelo carinho e compreensão durante as minhas inúmeras ausências.

Ao Instituto Fátima, que ofereceu todas as condições para que eu realizasse este trabalho.

À Renata Aparecida da Costa M. Aquino, pela generosidade no compartilhamento.

Aos alunos que aceitaram fazer esta jornada comigo, ensinando-me mais do que aprendendo.

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RESUMO

O objetivo deste estudo consistiu em investigar a reação de alunos de um curso de Pedagogia do Distrito Federal diante de estratégias didáticas inovadoras, que priorizam estímulos multissensoriais com a finalidade de favorecer uma aprendizagem integrada, capaz de estabelecer novos significados sobre o mundo ao mesmo tempo em que desenvolve habilidades cognitivo-emocionais, valores e competências. Para tanto, utilizou-se a metodologia da pesquisa-ação, que permitiu a aplicação de três estratégias didáticas em duas classes diferentes: em uma delas, pesquisador e docente confundiram-se; na outra, o pesquisador contou com um professor co-participante da pesquisa. Os instrumentos metodológicos utilizados para observação do processo de aplicação das estratégias foram variados: grupo focal, diário como resultado da observação-participante e vídeos para confirmar os modos de interação em cada turma. Os resultados, analisados a partir dos operadores cognitivos para um pensamento complexo, comprovaram que o componente relacional é o fator mais importante quando se intenta uma mudança no ambiente educacional. Para compreender a dinâmica do processo interacional como um todo, foi essencial perceber as interações como inter-retroações, ou seja, como um constante ir e vir de influências e entender uma classe como um sistema vivo complexo que pensa e age a partir de sua própria sabedoria, já que a aplicação de estratégias inovadoras tanto pode gerar prazer, criatividade, autonomia e comprometimento, quanto pode levar a conflitos. Para maior resultado formativo, recomenda-se ao docente flexibilidade para mudar o rumo da ação, já que estratégias, por si, têm o caráter de incerteza e imprevisibilidade, próprios dos processos humanos presentes no cotidiano escolar e extra-escolar.

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ABSTRACT

The purpose of this study was to survey how students of a Pedagogy course in the Federal District react to innovative didactic strategies prioritizing multisensory stimuli with the aim of promoting integrated learning, which enables students to construct new meanings about the world while also developing their cognitive-emotional skills, values and competences. Employing the methodology of action research, three didactic strategies were applied in two different classes – one in which the researcher played the role of teacher and another where the researcher relied on a teacher co-participant in the research. Varied methodological tools were used for observing implementation of the strategies: focus group, diary of participant observation and videos to confirm the modes of interaction in ech classroom. Results were analyzed from the point of view of the cognitive principles for complex thinking and confirmed that the relational component is the most important one when a change in the educational environment is intended. For understanding the dynamics of the whole interactive process it was essential to realize interactions as inter-retroactions, that is as a permanent ‘going and coming’ of influences, and to realize a classroom as a complex living system that thinks and acts from its own wisdom, one in which implementation of innovative didactic can lead to pleasure, creativity and commitment or to conflicts. For better educational results it is recommended that teachers have flexibility to change the course of the action, since strategies have an uncertain and unforeseeable nature – traits it shares with the human processes that take place in and out of school.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 10

ORIGEM DO PROBLEMA ... 10

PROBLEMA DE PESQUISA... 14

OBJETIVOS ... 18

DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA... 19

JUSTIFICATIVA ... 20

CAMINHOS METODOLÓGICOS ... 22

CAPÍTULO I... 26

1. REVISÃO DE LITERATURA... 26

1.1. COMPLEXIDADE E CONHECIMENTO ... 26

1.2. APRENDIZAGEM E CONHECIMENTO: EPISTEMOLOGIA BIOLÓGICA ... 27

1.3. FORMAÇÃO DE PROFESSORES... 32

1.4. ESTRATÉGIAS DIDÁTICAS ... 35

1.5. CLASSIFICAÇÃO DAS ESTRATÉGIAS... 37

1.5.1. Diálogo analógico criativo... 38

1.5.2. O jogo de representação de papéis ... 42

1.5.3. O erro didático ... 43

CAPÍTULO II ... 46

2. METODOLOGIA... 46

2.1. A PESQUISA-AÇÃO ... 46

2.2. O CONTEXTO ... 49

2.3. OS SUJEITOS... 51

2.4. INSTRUMENTOS - entre o possível e o realizável ... 53

2.5 PROCEDIMENTOS NO USO DAS ESTRATÉGIAS DIDÁTICAS ... 61

2.5.1 Diálogo analógico criativo... 62

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2.5.3 Erro didático ... 67

2.6. ESTRATÉGIAS DE ANÁLISE... 70

CAPÍTULO III... 73

3. ANÁLISE DOS RESULTADOS ... 73

3.1. IMPACTO ... 75

3.1.1. Conceitos prévios ... 75

3.1.1.1. Incentivam a autonomia do aprendiz ... 75

3.1.1.2. Contextualizam o conhecimento, permitindo aprendizagem significativa ... 78

3.1.1.3. Têm flexibilidade para mudar... 80

3.1.2. Impacto na aplicação... 86

3.2. MUDANÇA ... 125

3.2.1. Diálogo analógico criativo... 125

3.2.2. Representação de papéis ... 128

3.2.3. Erro Didático... 131

3.3. DESORDEM ... 136

CAPÍTULO IV... 140

CONSIDERAÇÕES FINAIS... 140

REFERÊNCIAS... 145

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INTRODUÇÃO

ORIGEM DO PROBLEMA

As pesquisas no campo da biologia e da física quântica vêm confirmando a característica da conectividade como inerente a todos os organismos vivos. Nada está separado. Tudo se interliga e se comunica em acoplamento estrutural, influenciando-se mutuamente, criando e recriando novas conexões e novos conhecimentos. Estar vivo é estar em permanente interação com o ambiente, com o objeto, com o contexto.

Sob esse ponto de vista, o conhecimento não é algo que nos é dado, não é algo que está em um mundo exterior acabado (VARELA; THOMPSON; ROSCH, 2003). Nem tampouco está dentro de nós, independente do mundo biológico e cultural à nossa volta. A cognição está condicionada ao fato de se ter um corpo com capacidades sensório-motoras que estão embutidas em um contexto biológico, psicológico e sócio-cultural mais abrangente. O conhecimento é sempre fruto de uma ação ecologizada, que vai se construindo no próprio caminhar.

Já que a subjetividade passa a ter papel decisivo na aprendizagem, a conscientização desse processo único permite visualizar o quanto cada indivíduo é ator de sua própria formação (DELORY-MOMBERGER, 2000). Assim, minha trajetória de vida e os questionamentos filosóficos que foram emergindo das experiências vividas estão na origem deste trabalho, pois o conhecimento vai se construindo a partir do modo como nos relacionamos com o contexto pessoal e histórico-sócio-cultural em que vivemos.

Hoje percebo que comecei a me aproximar de meu objeto de pesquisa ainda criança, no contexto de minha família. Filha de um imigrante italiano que, embora sem escolarização de nível superior, valorizava o estudo e a busca do conhecimento, e neta de uma avó materna que “devorava” e valorizava livros, especialmente os de cunho espiritualista, e sempre presenteava os netos com poesia, cresci percebendo que o conhecimento se fazia muito além dos limites precisos e racionais da escola.

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influenciado. Só percebia neles o quanto sabiam e não conseguia visualizar o que faziam para nos encantar. Não compreendia que por trás do resultado havia um processo no qual vários elementos estavam implicados: eu, o professor com minhas próprias motivações e ideais e o ambiente criado nessa interação.

Realmente, no curso de Letras, meu horizonte intelectual ampliou-se muito. Da leitura de Shakespeare no original ao entendimento do estruturalismo de Saussure, formei-me jovem e cheia de ideais de como cumprir a missão de professora.

O início da trajetória profissional, porém, mostrou-me, muito cedo, a contradição entre o que eu aprendera e a realidade em sala de aula. Muitas vezes, surpreendi-me, atônita, no meu primeiro ano de experiência no magistério, comparando o sucesso que uma amiga, também iniciante como eu, fazia entre os alunos de uma 6ª série e os conflitos que eu tinha com aqueles alunos. Eu havia vivenciado uma história de muito esforço e exigências de disciplina mais rigorosa na busca do melhor desempenho intelectual (cobrança do meu contexto como filha de imigrante), e agora, por contraste, percebia que o rigor e o excesso de exigências sobre o conhecimento não bastavam na interação com uma classe de jovens cheios de energia e curiosidade. E o contraste me era dado por uma profissional que talvez havia chegado ali por caminhos mais suaves e que cultivava a alegria constante no relacionamento com os alunos. Onde eu via rebeldia e resistência, ela via oportunidade para interagir e divertir-se.

A lógica do raciocínio era: se eu estou dando a eles o melhor do que sei e se os alunos são rebeldes e não se interessam e se, por outro lado, sei que, baseada nos valores éticos que recebi, não posso “descontar” minha frustração neles, então esta profissão não serve para mim. Foi assim que, após alguns anos de experiência, utilizei-me de alguns subterfúgios para me afastar temporariamente da carreira de magistério, sem deixar, no entanto, de atualizar-me nas questões educacionais, pois os filhos pequenos impulsionavam-me ao aprimoramento.

Quando retornei à sala de aula, busquei todas as oportunidades que pude para refazer a trajetória, percebendo que a pergunta mais premente era o “como” e não “o quê”. Utilizei-me, intuitivamente, tanto no 1º, como no 2º graus, de soluções criativas e os melhores resultados foram aqueles conseguidos com o uso da poesia, que trouxe o prazer e a alegria à aprendizagem e revelou potenciais desconhecidos dos alunos.

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a partir de estímulos trabalhados em aula, e vê-lo ganhar o segundo lugar em um concurso de poesia na comunidade, foi a grande revelação de que havia outros caminhos e novas possibilidades.

Também foi uma revelação trabalhar de maneira transgressora o texto “Os Lusíadas” no original, criando grupos de leitura para os episódios principais, que tiveram suporte da comunidade não-escolar (pais e avós portugueses) para a redação de peças que foram encenadas à revelia da direção da escola, que não queria “aquela bagunça” no colégio.

Embora a riqueza dessas duas ações que colaboraram para minha confiança em que podia e devia buscar novos rumos às questões relacionadas com a didática, ainda encarava essas ações como momentos fugazes, não percebendo que o sucesso delas estava relacionado ao fato de atenderem a uma complexidade que agora era histórica. Eu e o meu entorno já não cabíamos mais no que Varela e Flores (2007) denominam de Espaço Cartesiano, um espaço em que o homem opera como um agente racional e onde todo crescimento é previsível e lento.

Apesar dos sucessos obtidos, ao sair intuitivamente para um espaço onde o dinamismo e a incerteza emergiam da interatividade entre as partes que compunham aqueles ambientes educacionais, eu ainda não tinha a clareza dos pressupostos teóricos de Bachelard (2000) que já estavam construindo uma nova visão de mundo. Apesar de já ter saído do casulo e experimentado o gosto do ar puro e fresco, ainda acreditava que o espaço cartesiano era dominante e que precisava me adaptar ao ar pesado de sua racionalidade e certezas. Não percebia que o novo espaço podia e devia ser construído: o momento sócio-cultural já estava exigindo essas mudanças, pois o fato de estar conectado em rede demandava, a cada dia, novos saberes que a educação tradicional não conseguia contemplar.

Finalmente, as coisas ficaram mais claras, quando ingressei no ensino superior como docente de Língua Portuguesa. Os momentos de alegria e entusiasmo ficavam agora restritos aos debates e reflexões pertinentes às questões lingüísticas que eram levantadas em classe, pois o ambiente acadêmico parecia exigir mais objetividade e “seriedade”. Mas esses momentos foram, certamente, os mais esperados pelos alunos, pois nesse espaço eles realmente construíam conhecimento a partir das experiências pessoais e permitiam-me também aprender com eles, modificar-me.

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saturado de preocupações didáticas pela própria necessidade de formar bons professores, tanto para os anos iniciais quanto para a educação infantil, que vi meu desconhecimento sobre as questões epistemológicas ligadas ao ato de educar.

Pela necessidade do curso, comecei a desvendar Paulo Freire, como não havia feito anteriormente na graduação em Letras. Tanto a “Pedagogia do Oprimido” como a “Pedagogia da Autonomia” abriram horizontes mais amplos sobre o processo de ensinar e aprender. Entender o homem como um ser inconcluso, perceber a importância do meu papel, não só como professora de Língua Portuguesa, mas uma educadora capaz de intervir no mundo, enriqueceram meu discurso e minha prática mas, principalmente, trouxeram-me dúvidas saudáveis.

Piaget (1981) e Vygotsky (1998) ensinaram-me muito sobre o desenvolvimento da inteligência e sobre a necessidade de interação social para que o aprendizado acontecesse, mas foi nos “Sete saberes necessários à educação do futuro” que compreendi que a incerteza era um fator histórico com o qual teríamos de aprender a viver e que é “nas certezas doutrinárias, dogmáticas e intolerantes que se encontram as piores ilusões; ao contrário, a consciência do caráter incerto do ato cognitivo constitui a oportunidade de chegar ao conhecimento pertinente”(MORIN, 2000, p. 86).

Conforme a visão de Morin, esse cenário de incerteza permanente faz supor a ação ecologizada, que leva em consideração a complexidade da ação, dando espaço ao aleatório, ao acaso, às transformações e correção de rumo que emergem das escolhas feitas. Compreendi, finalmente, que sempre que tivera êxito verdadeiro no meu desempenho profissional (verdadeiro porque fruto do prazer e da satisfação pessoal), eu levara em conta não um programa baseado em ações executadas em um ambiente estável, mas priorizara as certezas e incertezas da situação, relevara a complexidade que emerge naturalmente da ação.

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PROBLEMA DE PESQUISA

Tendo em vista a necessidade de enfrentar os desafios deste milênio, que se impõem a partir de um mundo estruturado em rede, de onde emergem a interconectividade e a conseqüente imprevisibilidade desse interagir estrutural, a quantidade de informações compartimentadas não mais satisfazem as demandas de conhecimento. Tentar resolver os desafios com as ferramentas do indivíduo familiarizado com o espaço cartesiano que, para melhor lidar com os problemas, tenta colocá-los em fila, separados uns dos outros, só contribui para a fragmentação, conduzindo-nos ao passado, conforme ressaltam Varela e Flores (2007).

Demo (2002) adverte que, partindo da pressuposto de que a dinâmica da realidade é não linear, “dificilmente escapamos de apontar para o descompasso entre ontologia e lógica: logicamente falando, não captamos a dinâmica como tal, mas a lógica da dinâmica, ou seja, seus passos e padrões recorrentes, não dinâmicos” (DEMO, 2002, p. 10). Baseado em asserções já aceitas pela Biologia, Demo clarifica que nosso cérebro, por motivo de sobrevivência, ao se deparar com um objeto desconhecido, primeiramente procura rastrear o que há de conhecido naquele padrão e depois o que há de repetitivo. A fragilidade com que nascemos, tornando-nos dependentes dos nossos pais, tanto na questão da segurança quanto na da alimentação (LEWIS; AMINI; LANNON, 2000, apud DEMO, 2002) explica a necessidade de buscar uma certa segurança, percorrendo caminhos já percorridos, contextos comuns.

O fato de o conhecimento científico buscar leis da realidade que se ajustem às leis do pensamento foi conseqüência natural da busca de padrões não-dinâmicos. A necessidade de ajustar a epistemologia ao paradigma linear vigente foi orientando, assim, todo o processo de construção de conhecimento e conseqüentes pesquisas.

A palavra paradigma é tomada aqui segundo o enfoque dado por Kuhn (1994 apud

MORAES, 2004, p. 43). São “modelos, valores, técnicas, padrões compartilhados por determinada comunidade científica” (MORAES, 2004, p. 43). É em torno do paradigma que outros discursos se constroem, permitindo acontecer o que Foucault (apud Demo, 2002) apontou no final do século XX – conjugação de conhecimento e dominação, pois o conhecimento permite decifrar a realidade para dominá-la, não para compreendê-la.

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substituir a “pedagogia das certezas e dos saberes predeterminados” pela “pedagogia das certezas provisórias e das dúvidas temporárias” que são características de uma “pedagogia complexa ou de uma ecopedagogia”(MORAES, 2004, p. 267).

Ao seguir um programa educacional que pressupõe seqüencialidade, certeza e fragmentação nas relações sujeito-objeto, ignora-se que o papel do docente não é apenas o de executor de currículo, mas de investigador-inovador dentro do contexto da aula que, por sua vez, está inserida no contexto institucional e que se encaixa no contexto sociocultural, segundo enfatiza Tejada Fernández (2002b). A consciência disso pressupõe inovação. E o grande paradoxo, conforme aponta Torre (2004), é que precisamos formar para inovar e inovar para formar, ou seja, precisamos colocar o foco na formação dos professores, vendo-os como agentes e sujeitos da transformação.

Os cursos de Pedagogia constituem os espaços essenciais para se implementar essa inovação, entendida aqui no sentido em que Moraes (2004) a utiliza: situações desafiadoras. A importância de se priorizar esse espaço deve-se ao fato de que será o alunado desse curso que futuramente auxiliará crianças desde a mais tenra idade a desenvolverem uma inteligência capaz de enfrentar os desafios do século XXI, que são desafios da complexidade. São esses desafios que nos mostram que a educação “deve promover a `inteligência geral´ apta a referir-se ao complexo, ao contexto, de modo multidimensional e dentro da concepção global” (MORIN, 2000, p. 39, grifo do autor).

A complexidade está presente na construção do conhecimento quando elementos diferentes que constituem o todo de forma inseparável – o econômico, o político, o sociológico, o psicológico, o afetivo e o mitológico - formam um tecido interdependente, onde as partes interagem e inter-retroagem entre si e o todo incessantemente.

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Nesse sentido, o papel do contexto é fundamental. E aqui interessa o termo utilizado por Morin (2000): “ação ecologizada”, isto é, dependente do seu contexto. “Tão logo um indivíduo empreende uma ação, qualquer que seja, esta começa a escapar de suas intenções. Esta ação entra em um universo de interações e é finalmente o meio que se apossa dela, em sentido que pode contrariar a intenção inicial” (MORIN, 2000, p.86). A ecologia da ação deve, portanto, considerar fatores complexos como o aleatório, o acaso, a decisão, a iniciativa, o imprevisto.

Como conseqüência da materialização do aleatório, do incerto e do imprevisto, pode surgir a emergência, algo novo, sem precedentes e sem ser determinado pelo passado, que emerge em um processo auto-organizador, conforme esclarece Moraes (2004). Um conhecimento construído a partir das emergências no processo ensino-aprendizagem exige que se explore o novo, que se reinvente a didática, que se utilizem estratégias didáticas inovadoras. E aqui é preciso estabelecer a diferença que Torre (2002) faz entre estratégia e técnica. Esta implica processos mais padronizados, portanto mais positivistas. As estratégias, por sua vez, têm a característica de serem procedimentos abertos que instauram a dialogicidade fins e meios nos ambientes educacionais e reinstauram o papel do professor como importante agente de mudança, facilitando o desenvolvimento de uma aprendizagem significativa.

O modo multidimensional pelo qual uma “inteligência geral’ deve referir-se ao complexo e ao contexto, conforme a concepção de Morin, vê o ser humano como um ser ao mesmo tempo biológico, psíquico, social, afetivo e racional. “O conhecimento pertinente deve reconhecer esse caráter multidimensional e nele inserir estes dados: não apenas não se poderia isolar uma parte do todo, mas as partes umas das outras” (MORIN, 2000, p. 38).

Para que um processo de aprendizagem integre a multidimensionalidade do ser, e resulte numa aprendizagem significativa, que construa novos conhecimentos sobre a realidade e o mundo, não pode priorizar o verbalismo, nem exigir a participação apenas do ouvido. Todos os sentidos devem concorrer, assim como o intelecto e a intuição, permitindo que não apenas a dimensão biológica, mas a social, cultural, psíquica e espiritual criem novas organizações internas.

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Quando se fala em incorporar o conhecimento, estamos voltando ao que Schopenhauer (apud MORIN, 2000) chamava de o “nó do mundo”, ou seja, a relação entre mente e corpo. No sistema dualista, mente (interior) e corpo (exterior) ficam separados por um abismo que gera o dualismo sujeito-objeto. Essa é a solução simplista, não racional que não aceita a unidade na diversidade como afirma Wilber (2000) e simplifica a visão de homem, fragmentando-o. A solução que prioriza a inteireza do ser é englobar todos os seus aspectos: o organismo biológico – com seu DNA, seus sistemas cerebrais e padrões de comportamento – que interage com o ambiente (os ecossistemas e suas realidades sociais) e a consciência individual – com sua intencionalidade, suas estruturas e seus estados – que interage com a cultura intersubjetiva (nós) e, por sua vez, é influenciada por ela. Por outro lado, a visão de mundo da cultura interage mutuamente com as estruturas sociais, assim como a consciência e o comportamento individual. Ou seja, a relação mente-corpo é, em si, parte de uma estrutura complexa: organismo, ambiente, consciência e cultura evoluem em conjunto: são, ao mesmo tempo, causa e conseqüência uns dos outros.

Ao adotar um projeto interdisciplinar com o intuito de religar saberes e proporcionar a construção de novos conhecimentos, uma instituição educacional está dando um grande passo à frente, mas não está olhando para o indivíduo com um corpo e uma consciência individuais que se relacionam com o ambiente e a cultura. Interessa-se muito mais pelos pólos mais “visíveis” dessa estrutura: ambiente e cultura. São inegáveis os resultados advindos dessa postura, mas é preciso que voltemos o olhar para todas as dimensões do ser, inclusive para o corpo biológico do indivíduo e sua consciência (e seus estados).

Só quando se permite que estados prazerosos, potencializadores de reflexões importantes e significativas, se instaurem na sala de aula, é que se pode exercer uma prática docente que facilite a auto-aprendizagem e processos de desenvolvimento relevantes, porque induz a uma abertura – a abertura própria do organismo vivo em permanente troca dinâmica com o meio onde está inserido. Assim, poderemos libertar mentes e transformar a realidade.

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Ao focalizar os elementos da complexidade e do contexto que, segundo Morin (2000), precisam ser percebidos de modo multidimensional e global por uma “inteligência geral”, estamos considerando-os pressupostos para uma aprendizagem integrada, que, na definição de Moraes e Torre, constitui-se em:

Um processo mediante o qual vamos construindo novos significados das coisas da vida e do que acontece no mundo ao nosso redor, ao mesmo tempo em que melhoramos ou desenvolvemos estruturas e habilidades cognitivo-emocionais, modificamos nossas atitudes, valores e competências, projetando tais mudanças na vida cotidiana, nas relações político-sociais e laborais. E isto baseado em estímulos multissensoriais ou processos intuitivos que nos impactam e nos fazem pensar, sentir e atuar. (MORAES; TORRE, 2004, p. 82)

Uma aprendizagem integrada é, portanto, um fenômeno extremamente complexo, que exige a concorrência de todos os nossos sentidos. As sensações, como nos lembram Moraes e Torre (2004) são os nossos canais informativos. “Cada órgão foi se especializando na captação de tipos de ondas de diferentes frequências. Assim, as ondas mecânicas são percebidas pelo tato, as vibrações acústicas pelo ouvido, as ondas elétricas e térmicas pela pele, as ondas luminosas pela vista” (MORAES; TORRE, 2004, p. 85). Essas percepções, no entanto, só ganham significado e sentido com o concurso da consciência. Assim, as situações pedagógicas mais adequadas para uma aprendizagem integrada são aquelas em que os diferentes sentidos e processos mentais são estimulados e onde “os significados são compartilhados e os sujeitos estão implicados” (ibidem)

A partir das reflexões feitas, a questão que se interpõe à pesquisa é:

Como reagem os alunos de um determinado curso de Pedagogia quando estratégias pedagógicas, baseadas em estímulos multissensoriais, são utilizadas para favorecer uma aprendizagem integrada?

OBJETIVOS

O objetivo geral desta pesquisa é investigar o impacto de estratégias baseadas em estímulos multissensoriais nos processos de ensino e aprendizagem do curso de Pedagogia.

Em termos mais específicos, esta pesquisa pretende:

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- refletir sobre as implicações pedagógicas do uso dessas estratégias;

- investigar as possíveis facilidades e dificuldades na implementação dessas estratégias;

DELIMITAÇÃO DO PROBLEMA

Para poder responder às demandas de tempo e recursos bastante demarcados para a pesquisa, o estudo limitou-se à aplicação de três estratégias básicas – nomeadas e explicadas posteriormente neste trabalho – que serão observadas em dois momentos: no decorrer da aplicação e, posteriormente, avaliando-se o resultado final.

Dentro de um contexto institucional determinado – uma Instituição de Educação Superior do Plano Piloto, em Brasília - foram selecionadas duas disciplinas para aplicação das estratégias: Língua Portuguesa e Organização do Trabalho Pedagógico.

A primeira foi escolhida por fazer parte da grade curricular do primeiro semestre do curso, possibilitando analogias com metodologias didáticas anteriores à inserção do indivíduo na instituição, o que enriqueceu a reflexão final sobre os efeitos produzidos pelo programa de estratégias escolhido.

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JUSTIFICATIVA

Diante das circunstâncias apresentadas, era desejável que o professor dessas turmas não fosse um mero executor do currículo, mas um mediador que interpreta e redefine o conhecimento em função de seu conhecimento prático, permitindo que o currículo cumprisse seu destino de propiciar uma aprendizagem integrada e uma educação integradora.

Para Torre (2002) o perfil docente para o século XXI, visto sob a ótica integradora, deve ser o de um formador inovador e criativo, apto a facilitar o desenvolvimento de todas as potencialidades humanas. Nesse sentido, deve incorporar a inovação para que o currículo se atualize e aqui as estratégias didáticas inovadoras adquirem papel relevante por serem: a) impulsionadoras de mudança; b) envolventes para o aluno que se compromete com o processo de aprender, responsabilizando-se por sua auto-aprendizagem; c) orientadas mais para o papel do aluno do que o do professor; d) polivalentes e adaptadas ao grupo de alunos, conforme a idade, interesses, estilos de ser.

O uso de estratégias didáticas inovadoras por parte do docente contribui para o processo de auto-organização do indivíduo, que está sempre em relação de indissociável interdependência com o meio. Para que haja auto-organização, “é preciso que exista perturbação, desafios, problemas, algo que estimule o organismo e o impulsione a querer atuar, a querer produzir algo diferente e a reorganizar-se sempre que necessário” (MORAES, 2004, p. 255). As transformações acontecem nas trocas, nos diálogos, nas interações interpessoais, fenômenos que estimulam reflexões recursivas sobre pensamentos, sentimentos e ações.

A tentativa de dissociar ação e pensamento, que é própria da visão simplificadora e reducionista do mundo, construiu o espaço onde a escola se estabeleceu. Esse quadro, segundo Bruno (2002, p. 65) está mudando: “Várias áreas têm se dedicado ao estudo das emoções; dentre elas, destacam-se a Neurociência, a Neuroanatomia, a Biologia, as Psicologias clínica, social, discursiva, emocional e a própria Ciência Cognitiva”. Para a pesquisadora, que investigou o papel da linguagem emocional nos estudos telemáticos, os trabalhos de LeDoux (1998) e Maturana (2001) são contribuições científicas importantes para o entendimento das emoções a partir de um enfoque sistêmico. Maturana e Varela (2002) e Maturana e Verden-Zöller (2006)

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claro em uma tomada de decisão. Nossa razão, para fazer uma escolha e os conseqüentes argumentos que a expressam, é embasada pelos pensamentos, mas os motivos que conduzem nossos pensamentos têm raízes presas nas nossas emoções, nos nossos sentimentos, afetos e sistemas de crenças. O “gosto” ou “não-gosto” estão por trás de toda decisão racional: “não há ação humana sem uma emoção que a fundamente como tal e a torne possível como ato” (MATURANA, 2001, p. 13).

Na contramão desse paradigma complexo, que interliga corpo e mente, o espaço escolar estabeleceu-se, ao longo do tempo, como o local onde mais se percebe a fragmentação do processo de interação com o outro/objeto. O enfoque no ensino, no conteúdo, na visão do professor é a prática metodológica ainda comum na maioria de nossas instituições escolares, especialmente nas de nível superior, onde a objetividade pura é pressuposto para sustentar o olhar acadêmico sobre o conhecimento.

Algumas louváveis tentativas têm sido feitas para estabelecer a interdisciplinaridade e transdisciplinaridade com a intenção de promulgar uma educação integrada, mas a ação ainda se ressente da colaboração que o lúdico, a criatividade, o prazer e a alegria podem trazer para uma aprendizagem significativa. A vida acadêmica oferece raros espaços para o sentipensamento, acreditando que sujeito seja separado do objeto, pois desconhece a complexidade do tecido onde estão imersos o eu e o outro, um imbricado de razão, emoção, crenças, hábitos, sentimentos, intuições e valores.

A escolha do tema deve-se, portanto, à necessidade de ampliar as discussões sobre o campo da didática nos ambientes acadêmicos, buscando estratégias capazes de levar a uma aprendizagem integrada, que construa novos significados sobre as coisas e o mundo. Para Torre (2002), a didática deve ser vista como um “campo de processos” e a aprendizagem como transformação formativa, ou seja, transformação cognitiva de atitudes, habilidades e destrezas.

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Para ressaltar a importância de estratégias que estimulem não só a razão, mas também os estados emocionais positivos, a imaginação, a intuição, faz-se necessário lembrar que, se chegamos até aqui, é porque houve um desvio salutar; afinal, “toda evolução é fruto do desvio bem-sucedido cujo desenvolvimento transforma o sistema onde nasceu: desorganiza o sistema, reorganizando-o” (MORIN, 2000, p. 82). Construímos, desconstruímos e reconstruímos nosso modo de viver e agora é preciso construir, desconstruir e reconstruir algumas “verdades” da prática educacional e trabalhar com um ser aprendente, inacabado, em constante “vir a ser”, um sujeito capaz de realizar trocas significativas e frutíferas dentro desse novo sistema, para realizar a finalidade maior de sua existência.

CAMINHOS METODOLÓGICOS

Antes de escolher o método de pesquisa e os procedimentos para abordar o objeto de estudo, é preciso observar se há coerência entre essas escolhas e as concepções ontológicas e epistemológicas e que servirão de embasamento teórico (MORAES; VALENTE, 2008; MORAES, 2008), pois as questões de pesquisa, e aqui nos referimos à pesquisa educacional, não podem ser tratadas isoladamente, como muitas vezes acontece. Na maioria das vezes, foca-se o fenômeno educacional, sem relacioná-lo com o ser humano e sua realidade.

Segundo Sandin Estéban (2003), três perspectivas teóricas vêm constituindo parte do nosso legado filosófico: a positivista, a interpretativa e a sociocrítica. Retomando Crotty (apud

SANDÍN ESTEBAN, 2003, p. 49), a pesquisadora esclarece que perspectiva teórica é a postura filosófica norteia uma pesquisa e que a fundamenta.

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realidade crítico-histórica é construída sobre valores sociais, políticos, econômicos, culturais e éticos e o conhecimento é contextualizado e histórico, afinado com a perspectiva de transformação social e com a construção de modelos sociais. Os métodos qualitativos adequados a essa perspectiva são de caráter dialético-participativo, focando nas interrelações e na descrição detalhada das situações, eventos pessoais e interações.

Mais recentemente, outra perspectiva teórica tem sido proposta por Morin (1995, 1996 apud MORAES, 2008, p. 15) e Moraes (2004). Denominada complexa, conforme terminologia utilizada por Morin e ecossistêmica, de acordo com Moraes, essa perspectiva teórica percebe a realidade como algo dinâmico, difuso, relacional, indeterminado e não-linear. O conhecimento, construído na relação sujeito-objeto, funda-se em base epistemológica complexa, que aceita a natureza múltipla e diversa do sujeito e do objeto estudado e os percebe como ecologicamente indissociáveis e interdependentes. Os métodos qualitativos predominam, mas os qualitativos também podem ter vez, se houver compatibilidade teórica e metodológica para tanto. Os procedimentos passam a se abertos, flexíveis, dinâmicos e passíveis de revisão, já que se assume a incerteza como caráter permanente da busca científica.

Os estudos aqui apresentados, ao procurarem compreender a reação de aprendizes diante de estratégias didáticas inovadoras, buscaram realizar uma mudança no ambiente educacional, o que pode ser mais com complexo do que aparenta inicialmente. Interesses, ideologias, valores, expectativas, resistências e sistema de crenças pessoais, tudo se interpõe, quando se busca a eficácia de uma ação transformadora.

Diante desse quadro, optou-se pela utilização de uma pesquisa de caráter qualitativo, especificamente, pela pesquisa-ação, utilizada no campo educacional, desde 1946, segundo afirma Sandín Esteban (2003). Thiollent (1996) também ressalta que a pesquisa-ação tem por objetivo alcançar ações efetivas, transformações ou mudanças no ambiente social e não deve ser encarada como uma metodologia, mas uma estratégia de pesquisa que agrega vários métodos ou técnicas com a finalidade de se conseguir o arcabouço ideal - dinâmico, participativo e coletivo - para captar a informação.

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realização dos grupos focais aconteceu antes do início da aplicação do programa de estratégias didáticas, para entender conceitos prévios sobre estratégias consideradas produtivas e após a aplicação, para compreender as reações diante do programa.

A observação-participante ocorreu em duas turmas diversas – em uma, pesquisador e observador confundiram-se e em outra, o pesquisador contou com uma professora co-participante da pesquisa. O ambiente de observação, na maioria das vezes foi a sala de aula, mas, quando os procedimentos para a aplicação das estratégias assim o exigiram, o ambiente externo tornou-se o palco para a comunicação externa das estratégias.

Dois diários, um para cada turma, e algumas filmagens foram gerados no decorrer das observações. Todos os dados - entrevistas com os grupos focais, diários e filmagens – foram analisados sob o enfoque dos princípios cognitivos para um pensar complexo, como convém a uma abordagem metodológica não-linear. Esses princípios serão explicitados mais à frente, no capítulo II, que trata do detalhamento da metodologia.

Para facilitar a compreensão do encadeamento lógico do estudo realizado, apresenta-se a seguir a estrutura que compõe este trabalho:

O CAPÍTULO I desenvolve a fundamentação teórica que sustenta esta pesquisa e que é composta pela relação entre Complexidade e conhecimento, a epistemologia biológica da aprendizagem e do conhecimento, os campos teóricos que embasam a formação de professores, o conceito de estratégia didática, a explanação de seus princípios e de sua classificação.

O CAPÍTULO II apresenta a metodologia da pesquisa em si: o conceito de pesquisa-ação e a explicitpesquisa-ação de seu processo que é formatado em espiral de ciclos construídos passo a passo, a relação entre o modelo de pesquisa escolhido e o contexto em que ela aconteceu, a descrição dos sujeitos pesquisados, a exposição sobre os instrumentos utilizados, estabelecendo relação entre o que foi idealizado e o que pôde ser concretizado, a apresentação dos procedimentos utilizados para a aplicação das estratégias didáticas, encerrando com a explanação dos dez princípios que norteiam um pensar complexo e que constituíram os instrumentos para a análise dos resultados.

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só na aplicação, como aconteceu com as duas outras categorias. Para um panorama mais amplo do processo de aplicação do programa, a análise a partir das três categorias criadas abarcou três momentos: a apresentação de cada estratégia, a execução e a comunicação interna e externa, quando houve.

O CAPÍTULO IV apresenta as considerações finais do trabalho, com as devidas conclusões e recomendações a futuros pesquisadores que queiram aventurar-se pelo caminho complexo e enriquecedor das estratégias didáticas.

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CAPÍTULO I

1. REVISÃO DE LITERATURA

1.1. COMPLEXIDADE E CONHECIMENTO

Na perspectiva positivista, a realidade é objetiva, homogênea, fragmentada e previsível e a epistemologia que a explica é de natureza causal, determinista e reducionista. Morin e Le Moigne (2000) ressaltam que, nessa perspectiva, o papel do conhecimento era explicar o visível complexo através do visível simples e, para isso, serviam as leis da matéria. Disjuntavam-se as partes, que passavam a ser os objetos de estudo sobre os quais incidiam leis. Todas as crenças e alicerces mentais eram estruturados sob o paradigma de natureza positivista, onde o conhecimento somente se relacionava com o intelecto humano e os cinco canais sensoriais de captação da realidade.

Em 1934, percebendo o papel da ciência na criação de uma nova realidade, Gaston Bachelard propôs, na obra O Novo Espírito Científico, uma epistemologia não-cartesiana, embasada numa mudança de mentalidade. A proposta, na introdução da obra, era de uma racionalidade aberta, em que o simples não fosse resultado de uma simplificação; para isso seria necessário romper com a idéia de signo como unidade e aceitar a idéia de propriedades complementares na constituição do ser.

Bachelard (2000) já conhecia a Teoria da Complementaridade, proposta, em 1928, pelo físico dinamarquês Niels Bohr, ao observar resultados conceitualmente incompatíveis a partir de diferentes experimentos – em um, a luz mostrava-se como uma partícula, em outro, como uma onda. Não era possível observar a partícula e a onda em um único experimento. Para resolver essa contradição, Bohr percebeu que era necessário um arcabouço mais amplo de conceitos e concluiu que tanto onda como partícula eram complementos necessários na ação da energia eletromagnética.

A partir da Teoria da Complementaridade de Bohr, tudo muda: as coisas não mais se excluem como quer a lógica aristotélica e tanto a biologia, a física, como também as ciências sociais ganham novo impulso. Não há mais como pensar separadamente indivíduo/espécie/, indivíduo/sociedade, sujeito/objeto. Tanto no campo da física como no campo social, a unidade é

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aspectos biológicos, psíquicos, sociais, afetivos e racionais. Também a sociedade constitui-se de muitas dimensões como a histórica, econômica, sociológica, política, religiosa de modo que o conhecimento nem pode isolar uma parte do todo nem as partes umas das outras (MORIN, 2000).

Varela e Flores (2007), valendo-se das contribuições epistemológicas vigentes, denominaram de Espaço Cartesiano a esse período social e histórico que foi construído sob um terreno de certezas, um nicho mental estável, onde o desenvolvimento era previsível, porque as mudanças eram mais lentas. Nesse espaço seguro, os métodos organizavam a vida e os problemas se apresentavam como uma série de pacotes colocados em fila para serem resolvidos. Aprender, nessa conjuntura, era captar um mundo pronto, que nos era dado e pressupunha uma separação epistemológica sujeito-objeto.

O pensamento contemporâneo caminha no sentido oposto: percebe que por trás da aparência simples dos fenômenos há uma complexidade real. A crise da fragmentação, da separação entre os elementos é a crise cartesiana. Com o avanço das ciências, os grandes desafios do planeta começam a ser compreendidos de maneira interconectada e a educação passa a desempenhar um papel central para a superação desses desafios, sendo ela mesma um fenômeno extremamente complexo, que se realiza através da nossa dimensão sensorial, afetiva e intuitiva.

Para se entender a complexidade do conhecimento que a sociedade contemporânea produz, Demo (2002) ressalta que é preciso compreender as características dos sistemas complexos. Uma delas é a dinâmica, um processo que alia componentes formalizáveis e controláveis ao lado de outros incontroláveis e informalizáveis. Dinâmica não se restringe a rotas previsíveis, mas àquilo que é criativo e que avança para o desconhecido.

Dinâmica complexa, portanto, implica não-linearidade, presença do imprevisível, do surpreendente e isso muitas vezes nos parece difícil, pois a característica do ser humano é oscilar entre a tendência ao conforto e estagnação e o movimento criativo e revolucionário. A evolução, porém, não se faz por replicação, mas por re-construção, por re-organização da matéria. Em todo ser vivo, há os mesmos elementos de matéria, organizados mediante processos novos.

1.2. APRENDIZAGEM E CONHECIMENTO: EPISTEMOLOGIA BIOLÓGICA

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de que somos seres vivos, imersos em um determinado ambiente, acoplados a ele, afetou também a visão dos processos educacionais.

Essa constatação gerou uma epistemologia inovadora sobre o que é aprender, que passa agora a ser compreendido como um processo indissociável da vida, surgindo como uma propriedade do sistema nervoso que é exercida enquanto está acoplado ao meio ambiente a partir de uma cooperação global que acontece em todo o sistema.

Para os biólogos chilenos, a linhagem é definida, na evolução histórica, pela conservação de um modo constante de vida, que se sucede de geração para geração; mas todo o resto permanece aberto à mudança. A operacionalidade desse dinamismo deve-se ao que chamam de acoplamento estrutural, que acontece a partir de uma congruência entre organismo e meio. Tal mecanismo caracteriza os sistemas vivos. Este seria fechado em sua dinâmica estrutural, mas aberto ao constante fluxo de matéria, energia e informação que ocorre entre eles e aos processos autopoiéticos organizadores.

Essa dinâmica de abertura, que se faz e refaz constantemente, não comporta o instrucionismo, um fenômeno que se relaciona com a metáfora do tubo, comentada no livro “Árvore do conhecimento”: “Comunicação não é algo que se produz num ponto, é levada por um conduto (ou tubo) e é entregue no outro extremo, o receptor” (MATURANA; VARELA, 2002, p. 218). Ainda segundo a mesma referência, “O fenômeno da comunicação não depende daquilo que se entrega, mas daquilo que acontece com o receptor. E isso é um assunto muito diferente de

transmitir informação” (ibidem, grifo do autor).

E o que acontece com o receptor vai depender das interações relacionadas com as circunstâncias que envolvem o ser vivo e seu meio. Ao interagir com o meio, o organismo desencadeia mudanças em sua própria estrutura. Essa capacidade de transformar-se é o que os biólogos chamam de autopoiésis.

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degraus. Essa experiência mostra que objetos não são vistos pela extração visual das características, mas pela orientação visual da ação.

Essa noção de ação perceptivamente guiada sugere a não-linearidade do conhecimento, pois a percepção é entendida como processo ativo de elaboração de hipótese e não como representação linear de um mundo pré-dado, pois o mundo não é separado de nós. Assmann (2007), retomando a epistemologia biológica, refere-se à morfogênese do conhecimento,

conceituando a aprendizagem não como um processo acumulativo, em que os conhecimentos vão se juntando, mas uma rede complexa, onde os neurônios interagem e criam estados gerais qualitativamente novos no cérebro humano. Nesse sistema dinâmico, quando o aprendizado de algo novo acontece, não é apenas um elemento que se soma aos já adquiridos, mas existe uma re-configuração global de todo o sistema. Assim, uma aprendizagem só será significativa, se produzir uma re-configuração do complexo sistema cérebro-mente o que implica, basicamente, reconhecer a corporeidade do educando.

Aceitar esse ser mundanal, ou seja, a nossa corporeidade, deve ser a condição básica, segundo defende Assmann (2007), para abordar mudanças na educação. Morin já afirmava que a condição humana deveria ser a base da educação do futuro (MORIN, 2000). Assim, na visão complexa e interativa entre ser vivo e ambiente, sujeito e objeto, os sentidos não são apenas as janelas para se fazer conexão com o ambiente, como querem os defensores da teoria da percepção que acreditam que o conhecimento entra de fora para dentro do organismo. Nossos órgãos sensoriais são instrumentos para testar hipóteses, pois, como todo ser vivo, estamos sempre “presumindo coisas” e assim vamos construindo conhecimento. A todo momento, os organismos vivos exercem uma atividade de dentro para fora na interação com o ambiente. O conhecimento, emerge, assim, do sistema nervoso, como uma propriedade auto-organizativa em função do acoplamento com o meio ambiente.

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Varela, em trabalho como discípulo de Maturana (2002), refere-se a esse processo de autoprodução com a palavra grega poiesis. Posteriormente, vai se referir a um sistema autopoiético ou de autoprodução como aquele que “continuamente produz os componentes que o especificam (VARELA; THOMPSON, ROSCH, 2003, p. 2).

Gonzalez Rey (2005), seguindo essa linha de raciocínio, defende o conceito de subjetividade social, rompendo com a idéia comum aos psicólogos de que a subjetividade é um fenômeno individual, para percebê-la como um fenômeno complexo, produzido tanto no nível social quanto individual. Do ponto de vista da subjetividade social, os processos sociais não são externos/objetivos em relação ao indivíduo, mas fazem parte de um sistema complexo, que o indivíduo constitui, ao mesmo tempo em que é constituído por ele. Nesse processo morfogenético de construção e reconstrução da realidade, a emoção é condição para a definição do sujeito, pois a linguagem e o pensamento expressam o estado emocional desse sujeito. Retomando Neuber (2000), Gonzalez Rey lembra que emoções são fenômenos complexos que “possuem um substrato biológico e se constituem enquanto ontologias subjetivas ao longo do desenvolvimento do sujeito, que se dá na interação com o social. São nesse sentido, internas, mas ligam-se de forma não-linear com o espaço social” (NEUBER, 2000 apud GONZALEZ REY, 2005, p. 242-243).

Anteriormente, o biólogo Maturana também apontou a emoção como importante elemento de nossa corporeidade, derrubando o mito de que somos seres racionais:

[...] vivemos em uma cultura que desvaloriza as emoções e não vemos o entrelaçamento cotidiano entre razão e emoção que constitui nosso viver humano e não nos damos conta de que todo sistema racional tem um fundamento emocional. As emoções não são o que chamamos constantemente de sentimentos. Do ponto de vista biológico, emoções são disposições corporais dinâmicas que definem os diferentes domínios de ação em que nos movemos. Quando se muda de emoção, muda o domínio da ação. (MATURANA, 2001, p. 8)

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aprendiz e seu objeto de conhecimento, a dimensão bio-psico-sociogênica a que se refere Assmann (2007) é a base do processo de aprender. Só uma ontologia complexa, que se baseie na multidimensionalidade do ser humano, que o perceba em toda sua inteireza, será capaz de gerar campos operacionais adequados, que dêem espaço para a criatividade, a alegria e resgatem o prazer em aprender.

Csikszentmihalyi e Sawyer (1995), em pesquisa sobre o fluxo criativo, expõem as conclusões tiradas de entrevistas com pessoas motivadas a executar uma atividade por prazer. O que impulsiona essas pessoas é a qualidade da experiência que sentiam quando estavam envolvidas na atividade, a sensação de prazer que isso dava. A experiência de estar em fluxo permite que a atenção fique focada no objetivo, não se deixando levar por distrações; o fracasso passa a não ser uma preocupação, assim como a ansiedade em relação ao julgamento dos outros se dilui. A noção do tempo também se altera devido à implicação cognitivo-emocional do sujeito na atividade que está sendo desenvolvida. De acordo com este pesquisador, esta atividade transforma os indivíduos em seres autotélicos, isto é, sujeitos com capacidade de tomarem suas próprias iniciativas, capazes de encontrarem um fim na própria atividade; o que importa é a busca, não o resultado.

Essa sensação de prazer, de felicidade, que a vivência do processo de fluxo acarreta pode dar sentido ao nosso dia a dia, inclusive na escola. Csikszentmihalyi, no entanto, menciona Platão para considerar o quanto isso parece ser difícil em nossa sociedade. O filósofo grego ensinava que a tarefa mais importante para uma sociedade é ensinar os jovens a encontrar prazer nas coisas certas, mas tanto os pais andam iludidos com modelos superficiais como “a escola geralmente falha quando não ensina quão excitante, quão fascinantemente bela podem ser a ciência ou a matemática; eles ensinam o discurso repetitivo mais do que a aventura” (CSIKSZENTMIHALYI; SAWYER, 1995, p. 125).

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1.3. FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Para mudarmos a situação vigente, precisamos reencantar a educação (ASSMANN, 2007, MORAES; TORRE, 2004). Como afirma Assmann, o professor precisa ter um compromisso ético-político que o leve a colaborar para criar um clima esperançoso, reflexivo e criativo no próprio contexto escolar.

Ao participar de um projeto de mudança no ensino universitário junto com outros educadores na Universidade de Barcelona, Torre (2002) defende que é possível mudarmos essa situação de separação que estimula a briga da cabeça com o corpo, ou seja, desconecta-nos de nossa corporeidade. A mudança deve começar pela formação dos docentes e o conceito de formação, hoje, não pode mais ficar vinculado apenas aos aspectos relacionados à instrução. Formar é preparar para mudanças nas quatro dimensões do ser humano – conhecimento, sentimentos e atitudes, habilidades, vontade ou empenho na realização de tarefas, o que confirma e amplia o conceito sobre os quatro pilares da educação, exposto no relatório da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, elaborado por Jacques Delors para a Unesco (1999). O aprender a conhecer e aprender a fazer que Delors julga indissociáveis no sentido amplo, compõem a dimensão do conhecimento e das habilidades e estão diretamente relacionados com o aprender a ser e aprender a viver juntos, o que exige a conjunção de sentimentos, atitudes e empenho para que tarefas sejam realizadas.

Um grupo de didatas e pesquisadores espanhóis e latino-americanos, formado por Torre, Barrios Ríos, Tejada Fernández, Bordas Alsina, Borja Solé, Tort Raventós, Carnicero Duque, Nuria Rajadell e Núria Serrat participou do Projeto de Estratégias Didáticas Inovadoras para a Formação Inicial de Docentes (EDIFID) e apontou para uma nova proposta didática que facilita as mudanças desejadas: “um modelo de formação integral em seus princípios, em suas aspirações e em suas orientações didáticas” (TORRE; BARRIOS, 2002, p. 12), que foi denominado de ORA (observar, relacionar e aplicar).

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O primeiro modelo ressaltado pelo pesquisador, o de orientação artesanal, era próprio da formação dos artesãos nos grêmios medievais e depois foi largamente explorado na Revolução Industrial. A aprendizagem era feita por imitação do trabalho dos operários qualificados e pelas formas de fazer do professor. Um tempo lento, com habilidades e profissões que passavam de uma geração à outra e se mantinham estáveis, validava as normas pedagógicas. Baseados nesse modelo, os alunos do magistério aprendiam a prática docente tentando imitar profissionais julgados competentes. A inovação não era necessária.

Infelizmente, conforme aponta Tejada Fernández, esse modelo ainda é realidade em algumas classes universitárias ou de ensino médio na Espanha.

O segundo modelo é de orientação academicista e trata o professor como especialista em uma ou várias disciplinas, valorizando o domínio do conteúdo. Como é um modelo de transmissão de conhecimento, as estratégias didáticas girarão em torno do domínio da matéria.

O terceiro é o modelo de orientação técnica, que prioriza não só o conhecimento do conteúdo, mas as habilidades exigidas para o ensino desse conteúdo. Aprender a ensinar passa a ser adquirir princípios e práticas advindas dos estudos científicos sobre o ensino. As estratégias pedagógicas serão baseadas na pesquisa científica e técnica sobre o ensino. A competência do professor é definida pela sua atuação.

O quarto tipo de modelo é o individualista e vê o professor como alguém possuidor de características de personalidade capazes de tomar atitudes que permitam a construção de um clima ideal para a auto-educação e o desenvolvimento do aluno. A função do professor é, então, de facilitador da aprendizagem que deve ser significativa e autodirigida.

Nesse tipo de formação, não há preocupação com condutas especificas, já que o objetivo é o desenvolvimento da personalidade integral do docente, permitindo-lhe ter autoconceito positivo, maturidade pessoal e profissional. Habilita-o a ter flexibilidade de atuação para enfrentar os desafios que terá pela frente.

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O sexto modelo, o social-reconstrucionista, releva o caráter crítico do ensino, vendo-o como uma atividade social dirigida por valores que se traduzem em princípios de procedimento. Ligado ao modelo anterior, este estimula o professor à reflexão crítica sobre sua prática, no intuito de fazê-lo compreender as peculiaridades dos processos de ensino-aprendizagem e o contexto em que esses processos acontecem.

Embora destaque seis modelos, Tejada Fernández alerta que nenhum deles é completo; ao contrário, o ideal é que se complementem. Na obra “Curso de Formação para Educadores”, Torre (2002) resume os modelos em:

a) técnico, de enfoque empírico-positivista, focado na eficácia;

b) interpretativo, focado na tomada de decisões; valoriza a interpretação do que acontece na aula; o professor é um orientador e guia;

c) sócio-crítico, focado nas atitudes críticas em relação a normas, valores, pressões e pautas vindas de cima.

Ressalta, porém, que, para satisfazer as demandas do século XXI, o enfoque deve ser o da interação sócio-afetiva, que é integradora, relacional:

O docente [...] é principalmente um formador inovador e criativo que facilita o desenvolvimento de todas as potencialidades humanas (...) Isto é, um criador de ambientes, climas, situações, contextos, ambientes estimuladores nos quais o discente se implique num processo de auto-aprendizagem. (TORRE; BARRIOS, 2002, p. 81).

Para se chegar à inovação, as estratégias didáticas tornam-se relevantes. Essas estratégias substituem o que antes se chamava de métodos e técnicas. A intenção desse novo enfoque é dar às intervenções didáticas um sentido mais compreensível e adaptativo, já que uma estratégia de inovação é aplicada por pessoas e afeta pessoas, e sua execução nunca será como o previsto, mas deverá adaptar-se aos sujeitos e às condições institucionais, constituindo uma ação ecologizada, onde o determinismo não tem lugar. Ciurana (2005), em texto em que discute a complexidade, já observava que, se pensarmos na natureza humana como criativa e inventiva, não podemos pensar em determinar a história, porque uma contínua criação de sentido torna impossível a previsão.

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estratégia aqui defendido relaciona-se com o modelo de orientação prática descrito por Tejada Fernández (2002), que exige experiência e criatividade.

1.4. ESTRATÉGIAS DIDÁTICAS

O termo estratégia vem do grego (strategía) e remete ao significado de escritório ou comando de um general (strategos=general). Conforme o Dicionário Aurélio (1986), refere-se à

”arte de planejar e executar movimentos e operações de tropas, navios e/ou aviões, visando a alcançar e manter posições relativas e potenciais bélicos favoráveis a futuras ações táticas sobre determinados objetivos”. Por extensão, passou a significar, segundo a mesma referência, “a arte de explorar condições favoráveis com o fim de alcançar objetivos específicos”.

No âmbito educacional, o termo é definido pela UNESCO, em 1979, como combinação e organização do conjunto de métodos e materiais escolhidos para alcançar certos objetivos. A questão da finalidade está bastante clara nessa concepção, implicando ação planejada e seqüenciada.

Este deve ser o ponto de partida: um planejamento. Visto sob o paradigma da complexidade, no entanto, sabemos que é impossível prever todas as variáveis do procedimento, já que serão pessoas aplicando procedimentos sobre outras pessoas. E pessoas que carregam em si a inteireza de suas várias dimensões que se interconectam e se influenciam.

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1. Princípio da comunicação – ativa a essência do processo educativo que é a comunicação conforme os aspectos informativo, persuasivo e emotivo;

2. Princípio da atividade - pautado pelo princípio de Adolf Ferrière, teórico da Escola Nova, que afirma que “somente se aprende aquilo que se pratica” (FERRIÈRE apud RAJADELL, 2001, p. 468);

3. Princípio da individualização ou subjetividade - visualizar o indivíduo como ser único ao qual a aprendizagem deve adaptar-se;

4. Princípio da socialização – permite internalizar uma série de habilidades que permitam adaptar-se à sociedade;

5. Princípio da globalização - torna a realidade perceptível na sua totalidade e não fragmentada, ou seja, trabalha a formação completa de uma pessoa;

6. Princípio da criatividade – facilita a expressão da originalidade de cada indivíduo, de alguns elementos e situações;

7. Princípio da intuição - leva à apreciação de um fenômeno com base nos efeitos que este produz, ou seja, utiliza a intuição. A intuição, segundo Rajadell, pode ser direta e real, quando o objeto de estudo está presente, o que facilita a compreensão do fenômeno, ou pode ser indireta ou virtual, quando o objeto de estudo não está presente fisicamente, mas pode ser compreendido pela imaginação.

8. Princípio da abertura – permite o direito à expressão da diferença tanto pessoal - aspectos cognitivos, afetivos e relacionais do aluno - quanto social, nos aspectos familiares, econômicos, culturais, religiosos, político e do entorno que circunda o aluno.

Os princípios didáticos considerados por Rajadell permitem, como foi visto, uma abordagem ampla e coadunam-se com os propósitos desta pesquisa de fazer emergir os aspectos em que cada estratégia colabora para uma aprendizagem integrada. O olhar atento a esses aspectos pode iluminar a análise das implicações pedagógicas das estratégias aplicadas.

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finalidade de ensinar, formar o leitor. Tiveram essa intenção tanto Hesíodo com sua Teogonia,

quanto Virgílio nas Geórgicas, ou Ovídio, na Arte de amar.

Na Idade Média e no Renascimento, o sentido ainda continua o mesmo, conforme atesta Mallart, ao citar a definição de poesia do Marquês de Santillana: “Que coisa é a poesia [...] senão um fingimento de coisas úteis, encobertas ou disfarçadas com uma roupagem muito bonita?” (ibidem, p. 28). Somente no século XVII, Comênio e Ratke usam o termo didática, emprestado do latim, e mudam o sentido da palavra. Como se lê na Didática Magna, a didática era artifício para ensinar todas as coisas a todos, com rapidez, alegria e eficácia. A palavra caiu em desuso por um tempo, até que foi retomada no século XIX e hoje todos os autores que escrevem sobre didática a definem com algumas variações.

Para Mallart Navarra, “a didática é uma ciência prática, de intervenção e transformadora da realidade”. (ibidem, p. 32). Paulo Freire (2003), na Pedagogia do Oprimido, já afirmava que a palavra verdadeira é práxis, por isso pode transformar o mundo. Se a palavra for separada da ação, será transformada em verbalismo.

Como ciência, a didática tem um objeto de estudo que possui uma dimensão material (quod) e outra formal (quo). O primeiro constitui-se da própria realidade investigada; no caso, o processo de ensino-aprendizagem. O segundo se refere ao enfoque através do qual se vê o objeto-matéria, ou seja, o objeto formal é composto da prescrição de métodos e estratégias eficazes para desenvolver a processo educativo.

Em obra que organizou com Sepúlveda (2001), Rajadell escreve um capítulo em que define a estratégia didática como algo que prevê a atuação seqüenciada do processo de aprendizagem em sua tripla dimensão: a dimensão do saber, centrada na aquisição e domínio de determinados conhecimentos; a dimensão do saber-fazer, que permite que se desenvolvam habilidades para realizar certas ações ou tarefas que depois podem ser modificadas ou transferidas para outros contextos; a dimensão do ser, focada no lado afetivo da pessoa, priorizando a modificação e consolidação de interesse, atitudes e valores. A tarefa aqui – a de aprender a perceber, relacionar e cooperar é muito mais complexa do que reter conhecimentos.

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As estratégias didáticas são classificadas conforme se relacionem com a dimensão do saber, do saber fazer e do ser:

a) dimensão do saber: estratégias para adquirir e/ou desenvolver conhecimentos; 1

b) dimensão do saber fazer: estratégias para adquirir e/ou desenvolver procedimentos ou habilidades;

c) dimensão do ser: estratégias para adquirir e/ou desenvolver atitudes e valores;

As estratégias selecionadas para este estudo desenvolvem todas essas dimensões, mas promovem, especialmente, o desenvolvimento de procedimentos que auxiliam a transição de uma pedagogia de certezas e de reprodução de conhecimento para uma pedagogia propícia para a vivência personalizada do aprender a aprender. “Educar é fazer emergir vivências no processo de conhecimento” (ASSMANN, 2007, p. 32) e o produto da educação passa a ser as experiências de aprendizagem. Essas experiências são a própria base das estratégias de saber fazer, focalizadas como objeto de estudo deste trabalho.

1.5.1. Diálogo analógico criativo

Dialogar é uma forma de entrar no mundo do outro através do logo, da sabedoria, da palavra. Diálogo pressupõe interação social e foi assim que Vygotsky (1998) analisou a linguagem - sob o ponto de vista da capacidade de permitir que o homem faça mediação com o meio ambiente por meio de signos criados pela sociedade e que são devidamente internalizados.

Bakhtin (1992) contribui para a noção de linguagem como processo dialógico quando questiona a tese fundamental de Saussure para quem a língua se opõe à fala, da mesma forma que o social se contrapõe ao individual. Na concepção bakhtiniana, a interação verbal está acima de tudo, já que a palavra se define por uma mão dupla: procede de alguém e se dirige a alguém. “A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se ela se apóia sobre mim numa extremidade, na outra se apóia sobre o meu interlocutor” (BAKHTIN, 1992, p. 149).

Assim, no diálogo não há espectadores, todos são participantes, já que é “uma circulação de mensagens em mão dupla, controlada pelos semáforos dos gestos e da linguagem corporal

1 Embora utilizada pela pesquisadora, a palavra “adquirir” não se coaduna com os princípios defendidos

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(TORRE; BARRIOS, 2002, p. 191). Um diálogo vivo é permeado pela criatividade. Caracteriza-se pela espontaneidade, talento, rapidez de reação, incorporação de informações passadas e criações de cada interlocutor. Nada tem a ver, como afirma Bakhtin, com correção gramatical, pois tanto locutor quanto receptor servem-se da língua não para conformá-la à norma lingüística, mas para enunciá-la ou compreendê-la num contexto específico. “Em suma, trata-se de perceber seu caráter de novidade e não somente sua conformidade à norma(BAKHTIN, 1992, p. 93). Essa abordagem acentua o caráter variável e flexível da linguagem dentro do diálogo.

Todo diálogo pressupõe uma dose de tensão. Na ação intersubjetiva, a organização da subjetividade individual tem um momento permanente de expressão e de confronto. Cada ação do indivíduo dentro de um contexto social corresponde a inúmeras reações de outros integrantes desse espaço, criando-se, no interior desse espaço, zonas de tensão, que podem atuar como momentos de crescimento social e individual ou como momentos de repressão e constrangimento, informa Gonzalez Rey (2005).

O fato é que essa tensão, que Torre chama de tensão diferencial, é o elemento capaz de provocar a mudança, introduzindo novas formas de ver o mundo, de pensá-lo, senti-lo. Por esse caráter transformador, o diálogo pode ser utilizado como estratégia formativa, quando há um propósito em seu uso. Ao introduzir o elemento da imaginação no diálogo real, a linguagem torna-se carregada de teor conotativo, plurissemântico; assim, o diálogo analógico criativo pode tornar-se uma estratégia didática enriquecedora e eficiente, pois permite que a fantasia leve à profunda reflexão sobre conceitos que muitas vezes aparentam ser dialéticos, mas podem ser vistos na sua complementaridade, como exemplifica Torre (2002), com o diálogo entre a Utopia, Realidade e Consciência, lido no encontro Ibero-Americano de Educação, realizado em 1999, em Rosário, Argentina, e validado pelos participantes.

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Nesse período de busca, é necessário um espaço de tempo ocioso e solitário para que as idéias fiquem na incubadora e gerem um insight criativo. Csikszentmihalyi e Sawyer (1995), em pesquisa com mais de 100 indivíduos criativos, ainda atuantes em um determinado domínio e, em geral, com mais de 60 anos, concluíram que uma pessoa sempre ocupada, direcionada para metas e envolvida em trabalho consciente, dificulta o processo de criação, pois a incubação exige períodos de ócio, lazer e envolvimento com atividades triviais, que não exigem grande elaboração mental, como caminhar, dirigir, fazer jardinagem.

O ambiente propício gera a oportunidade para que o subconsciente combine ou selecione idéias que emergem à consciência, constituindo o instante em que os entrevistados definem como experiência “AHA!”. Segue-se, após, a fase que os pesquisadores chamam de elaboração e avaliação, onde se trabalha para que as idéias se tornem úteis à sociedade.

Adeptos da concepção sistêmica de criatividade, Csikszentmihalyi e Sawyer sustentam que a criatividade é sempre definida em relação a um sistema que inclui não apenas o indivíduo, mas fatores culturais e sociais. Mesmo no processo de isolamento da incubação, o indivíduo está integrando a informação que deriva do domínio e do campo. Domínio, para a abordagem sistêmica de criatividade, é o sistema simbólico de regras e procedimentos que definem o comportamento permitido dentro dessa fronteira e campo é constituído por um grupo de especialistas que selecionam uma idéia ou produto para inclusão no domínio. Conforme essa visão, a informação que fica na incubadora mental é processada por um recurso interpsíquico e não apenas intrapsíquico como queria a corrente defensora do individualismo.

Essa visão sistêmica, que considera a criatividade como um fenômeno sociocultural, e que foi abraçada por Csikszentmihalyi, Sternberg, Lubart, Amábile e Simonton (ALENCAR; FLEITH, 2003) interessa mais de perto a esta pesquisa, pelo caráter complexo do processo que valoriza o contexto ecológico onde o indivíduo se insere.

Torre (2002) sugere algumas etapas que devem ser observadas na construção do diálogo analógico criativo:

Referências

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