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Pejotização: a contratação entre empresas como fraude à legislação trabalhista e suas consequências jurídicas, sociais e econômicas

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

BACHARELADO EM DIREITO

JOSÉ CAZUZA LIBERATO OLIVEIRA SIEBRA

PEJOTIZAÇÃO: A CONTRATAÇÃO ENTRE EMPRESAS COMO FRAUDE À LEGISLAÇÃO TRABALHISTA E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS, SOCIAIS

E ECONÔMICAS

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JOSÉ CAZUZA LIBERATO OLIVEIRA SIEBRA

PEJOTIZAÇÃO: A CONTRATAÇÃO ENTRE EMPRESAS COMO FRAUDE À LEGISLAÇÃO TRABALHISTA E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS, SOCIAIS E

ECONÔMICAS

Monografia de Conclusão de Curso apresentada à Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito do Trabalho.

Orientador: Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior.

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

S571p Siebra, José Cazuza Liberato Oliveira.

Pejotização: a contratação entre empresas como fraude à legislação trabalhista e suas consequências jurídicas, sociais e econômicas / José Cazuza Oliveira Siebra. – 2016.

70 f. ; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2016.

Área de Concentração: Direito do Trabalho.

Orientação: Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior.

1. Contrato de trabalho – Brasil. 2. Direito do trabalho - Brasil. 3. Fraude. 4. Contratos. I. Marques Júnior, William Paiva (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.

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JOSÉ CAZUZA LIBERATO OLIVEIRA SIEBRA

PEJOTIZAÇÃO: A CONTRATAÇÃO ENTRE EMPRESAS COMO FRAUDE À LEGISLAÇÃO TRABALHISTA E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS, SOCIAIS E

ECONÔMICAS

Monografia de Conclusão de Curso apresentada à Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Direito do Trabalho.

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Profa. Dra. Beatriz Rêgo Xavier

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Profa. Msc. Fernanda Cláudia Araújo da Silva

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A Deus, o Criador de tudo, meu tudo em todo tempo.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter me dado o privilégio de ter uma família magnífica, que me ensinou valores que seguirão comigo pelo resto dos meus dias, na busca da consecução dos meus sonhos e de um mundo mais justo.

Aos meus pais, Antônio Iremar Siebra Oliveira e Maria Aparecida Liberato Oliveira, exemplos de retidão e honestidade, pelo apoio incondicional e abnegado que têm prestado a mim, especialmente nos momentos mais difíceis de minha vida.

Ao meu irmão, Antônio Vinícius Liberato Oliveira Siebra, por compreender minhas noites de estudo a atrapalhar seu sono e pelas palavras de incentivo e irmandade que tanto me estimulam.

Aos meus tios e padrinhos, Emar de Oliveira Lima e Josefa Siebra de Lima, por vibrarem com as conquistas da minha vida e pelo afeto e carinho.

À minha namorada, Angelita Lívia da Silveira Brito, que me acompanha há tempos, por suas palavras de incentivo e pelo seu companheirismo.

À Universidade Federal do Ceará, em especial à Faculdade de Direito, nossa querida Salamanca, por ter me proporcionado momentos únicos de alegria e por ter contribuído, significativamente, com a minha formação pessoal e jurídica.

Ao Professor Doutor William Paiva Marques Júnior a quem devoto grande estima, por ter aceitado a empreitada de ser meu orientador, o que fez com maestria, e pela dedicação e amor que oferta ao que faz, seja como professor, seja como coordenador do curso de Direito.

Às professoras participantes da banca examinadora, Professora Doutora Beatriz Rêgo Xavier e Professora Doutoranda Fernanda Cláudia Araújo da Silva pelo tempo e pela atenção dispensados à avaliação do meu trabalho.

Aos colegas de turma, que me acompanharam por longos cinco anos, em especial aos amigos Hipólito Lima Torres Portugal, Pedro Henrique Nunes Farias, Augusto Oliveira da Silva Neto e Rafael Cavalcante Pinheiro Gonçalves, por dividirem comigo momentos de angústia, de reflexão e de alegria das vidas acadêmica e pessoal.

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“LUTA. Teu dever é lutar pelo Direito. Mas, no dia em que encontrares o Direito em conflito com a Justiça, luta pela Justiça.”

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RESUMO

A partir da década de 1980, com o esgotamento do modelo econômico adotado, o mercado de trabalho brasileiro passou a apresentar sinais de desestruturação, com o aumento do desemprego e do trabalho informal. Essas alterações são acompanhadas por uma série de políticas que buscam reduzir os direitos e garantias da classe trabalhadora em busca de uma maior competitividade econômica. Nesse contexto, surgem formas de precarização das relações de trabalho, como é o caso da pejotização. O presente trabalho propõe-se a analisar, através de pesquisas doutrinária e jurisprudencial, o fenômeno da pejotização na esfera trabalhista e as suas repercussões socioeconômicas. Primeiramente, apresenta-se a evolução histórica do Direito do Trabalho no Brasil e no mundo, com ênfase na Europa, desde o seu surgimento até o momento em que apareceu a pejotização. Depois, realiza-se o estudo do fenômeno da pejotização, explicando-se pormenorizadamente as características dessa fraude à contratação e analisando-se a sua viabilidade jurídica, com uma abordagem do Projeto de Lei no 4.330/2004. Em seguida, faz-se uma análise do tratamento jurisprudencial dado ao tema, com ênfase nos julgados dos Tribunais Regionais do Trabalho e do Tribunal Superior do Trabalho. Conclui-se, com a análise das consequências jurídicas e socioeconômicas provocadas pela pejotização.

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ABSTRACT

Since 1980s, with the exhaustion of the adopted economic model, the Brazilian labor market began to show signs of disintegration, with the rising of unemployment and informal work. These changes are followed by a series of policies that seeks to reduce the rights and guarantees of the working class of greater economic competitiveness. In this context, some precarization forms of labor relation appear, such as pejotização. This paper proposes to examine, through doctrinal and jurisprudential research, pejotização phenomenon in labor and its socioeconomic repercussions. First, it presents the historical evolution of Labor Law in Brazil and in the world, from its inception up to the moment pejotização comes. Then it carries out the study of the phenomenon pejotização, explaining in detail the characteristics of this fraud to hiring and analyzing its legal viability, with an approach of the bill number 4.330/2004. After that, there is an analysis of the jurisprudential treatment of the theme, emphasizing the trial of cases of The Regional Labor Courts and The Superior Labor Court. It finishes analyzing the legal and socio-economic consequences caused by pejotização.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

OIT CLT

Organização Internacional do Trabalho Consolidação das Leis Trabalhistas CF/88 Constituição Federal de 1988

CNPJ Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas INSS Instituto Nacional do Seguro Social PJ MEI OJ TST FGTS CTPS Pessoa Jurídica Microempreendedor Individual Orientação Jurisprudencial Tribunal Superior do Trabalho

Fundo de Garantia por Tempo de Serviço Carteira de Trabalho e Previdência Social OMC JCJ IAPs CAPs IAPC IAPB IAPI CNI

Organização Mundial do Comércio Junta de Conciliação e Julgamento Institutos de Aposentadoria e Pensões Caixas de Aposentadoria e Pensões

Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Comerciários Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Bancários Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários Confederação Nacional da Indústria

ANAMATRA Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho PED

IBGE TRTs SFH CCB

Pesquisa de Emprego e Desemprego

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística Tribunais Regionais do Trabalho

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ... 11

2. DIREITO DO TRABALHO: UMA CONSTRUÇÃO HISTÓRICA NO MUNDO E NO BRASIL ... 14

3. FLEXIBILIZAÇÃO DAS RELAÇÕES TRABALHISTAS E SURGIMENTO DA PEJOTIZAÇÃO ... 22

3.1 Medidas Flexibilizadoras das Relações Trabalhistas no Brasil ... 26

3.2 Medidas Flexibilizadoras no Setor Público ... 268

4. O INSTITUTO DA PEJOTIZAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO ... 31

5. VIABILIDADE JURÍDICA DA PEJOTIZAÇÃO – PROJETO DE LEI NO 4.330/2004: PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES TRABALHISTAS E INÍCIO DA LEGALIZAÇÃO DA FRAUDE À LEGISLAÇÃO TRABALHISTA ... 40

6. ANÁLISE JURISPRUDENCIAL: O POSICIONAMENTO DO PODER JUDICIÁRIO ANTE A PEJOTIZAÇÃO ... 55

7. CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS, ECONÔMICAS E SOCAIS DA PEJOTIZAÇÃO ... 60

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 66

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1. INTRODUÇÃO

Desde os primórdios, o homem realiza, de alguma forma, trabalho, entendido como a medida do esforço feito pelos seres humanos para a consecução de um fim. Assim, de acordo com essa perspectiva, o homem trabalha quando caça, pesca, planta e até mesmo quando guerreia. Por isso é que se diz que o trabalho é inerente ao homem.

O Direito do Trabalho, entretanto, não se confunde com o trabalho. Aquele surgiu para regulamentar este, o que só foi possível quando todos os sujeitos da relação trabalhista adquiriram direitos.

Durante muito tempo, os trabalhadores foram vistos como coisas, objetos a serviço de seus proprietários, não possuindo nenhum direito. Com o passar do tempo, essa situação foi se modificando, de modo que a classe trabalhadora foi, paulatinamente, adquirindo direitos e se fortalecendo em torno de um propósito comum de valorização da mão-de-obra. A Revolução Industrial provocou inúmeras mudanças socioeconômicas que incentivaram a substituição dos trabalhos escravo, servil e corporativo pelo assalariado, servindo como marco inicial do Direito do Trabalho.

Com o intuito primordial de equilibrar as forças na relação trabalhista, em busca de um mercado de trabalho mais justo e saudável, o Direito do Trabalho, desde a sua concepção, passou por inúmeras fases de desenvolvimento, que contribuíram gradativamente para o amadurecimento da ciência justrabalhista, buscando compatibilizar os interesses do capital com as necessidades da classe trabalhadora.

No Brasil, a evolução do Direito do Trabalho refletiu em grande parte o que ocorreu no mundo, sobretudo na Europa, embora a concomitância de um governo ditatorial (Era Vargas) com a fase de institucionalização do ramo justrabalhista tenha reduzido o grau de maturidade da ciência jurídico-trabalhista brasileira, contribuindo com a prevalência de normas rígidas, que dificultavam a negociação entre as classes patronal e operária, e excessivamente intervencionistas, o que traria consequências negativas décadas à frente.

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trabalhista, que atuariam como novas opções de combate ao desemprego e como meio de reprimir o momento recessivo da economia.

Nesse contexto flexibilizador, criaram-se novas formas de contratação da mão-de-obra, alternativas ao vínculo empregatício. Ao reduzirem direitos trabalhistas, essas novas formas de contratação buscavam diminuir os custos produtivos para o empregador em troca da formalização de postos de trabalho. Assim, surgiram o trabalho temporário, o trabalho a tempo parcial, a terceirização, o cooperativismo, etc. Aproveitando-se desse momento flexibilizador, o capital foi além e criou formas de contratação sem nenhuma regulamentação legal, constituindo, em verdade, fraudes à legislação trabalhista, como é o caso da chamada pejotização.

Nesse contexto, a temática do presente trabalho volta-se para uma modalidade fraudulenta de contratação da mão-de-obra denominada de pejotização, situação em que um trabalhador pessoa física é induzido a constituir uma pessoa jurídica para ser contratado ou para manter a prestação laboral realizada até então. Dessa forma, ocorrerá uma relação interempresarial, regulada por normas de Direito Civil, afastando-se a incidência de direitos e garantias trabalhistas.

Os principais objetivos desse estudo são esclarecer o que seria a pejotização e apontar as consequências dessa prática nas relações trabalhistas e no contexto socioeconômico.

Em relação à metodologia de pesquisa adotada, optou-se pelo método de abordagem indutivo, utilizando-se como técnica de coleta de dados as pesquisas bibliográfica e jurisprudencial. Em relação à pesquisa jurisprudencial, buscou-se analisar acórdãos dos Tribunais Regionais do Trabalho das Primeira, Terceira, Quarta, Quinta e Sexta Regiões e do Tribunal Superior do Trabalho ligados à temática da pejotização. Ademais, buscou-se apoio bibliográfico em obras de autores consagrados do Direito do Trabalho, em trabalhos científicos sobre o tema, em dicionários jurídicos e em sites da internet.

O trabalho está estruturado em seis capítulos. No primeiro capítulo, faz-se um estudo acerca da evolução histórica do Direito do Trabalho, desde o seu surgimento até o momento que propiciou o aparecimento da pejotização. No segundo capítulo, analisam-se as condições de flexibilização das normas trabalhistas que permitiram o surgimento das

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abordando-se a sua definição e suas características. No quarto capítulo, faz-se uma análise da viabilidade jurídica da contratação entre empresas. No quinto, aborda-se o tratamento jurisprudencial dispensado à temática. Finalmente, no sexto capítulo, analisam-se as consequências jurídicas, econômicas e sociais da pejotização.

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2. DIREITO DO TRABALHO: UMA CONSTRUÇÃO HISTÓRICA NO MUNDO E NO BRASIL

O trabalho é inerente ao homem1. Desde a Antiguidade, o homem busca, incessantemente, meios para a satisfação de suas necessidades cotidianas. Nessa época, não existia o trabalho como conhecemos na contemporaneidade, existindo, na realidade, uma constante luta pela sobrevivência. O homem primitivo era movido pela necessidade de satisfazer a fome e assegurar sua defesa pessoal, o que lhe levava a caçar, a pescar e a lutar contra o meio físico, contra animais e até mesmo contra seus próprios semelhantes.

Somente depois de muito tempo é que surgiriam o sistema de trocas e o modelo de utilização, em proveito próprio, do trabalho alheio. Nas diversas fases da história da humanidade, sempre será possível encontrar uma divisão social entre os que trabalham e os que se utilizam do labor alheio. Sempre que esta relação esteja presente, estaremos diante de uma relação de trabalho lato sensu.

Portanto, é um erro imaginar que a relação de trabalho é exclusividade das sociedades modernas. A organização do trabalho humano passou por inúmeras fases, intimamente relacionadas à organização econômica da sociedade.

O trabalho escravo foi o modelo laboral que predominou durante a Antiguidade e surgiu como forma de desagregação primitiva da comunidade tribal. As primeiras sociedades escravagistas surgiram em Roma e na Grécia, onde os escravos, além de trabalharem nos afazeres domésticos, passaram a dedicar-se à agricultura, ao artesanato, à mineração e à navegação.

O trabalhador era o escravo e o patrão era o senhor. O escravo era considerado um objeto, um meio para consecução de um fim, não possuindo nenhum direito; era propriedade do dominus. Essa condição perdurava, indefinidamente, até a morte do escravo ou até que este

não tivesse mais serventia como instrumento de trabalho.

Nesse período, não há motivos para se falar em salário como contraprestação aos serviços prestados, pois o escravo não vendia a sua força de trabalho, sendo, na realidade, vendido juntamente com a ela.

1 Segundo Maurício Godinho Delgado (2015, p.298), embora a palavra trabalho seja ampla, possui uma delimitação inquestionável: “refere-se a dispêndio de energia pelo ser humano, objetivando resultado útil (e não

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Na Idade Média, predominou o trabalho servil. Os servos tinham que trabalhar para os senhores feudais em troca de proteção política e militar. A diferença para o trabalho escravo estava basicamente no fato de que o servo não era uma propriedade do senhor feudal, não podendo, em regra, ser vendido como mercadoria. Nesse período, o trabalhador não estava mais vinculado ao senhor, mas à terra que ele próprio cultivava.

Ainda na Idade Média, pouco a pouco, o trabalhador foi deixando de ser objeto para ser tratado como pessoa, muito embora seus direitos subjetivos ainda fossem bastante limitados. Entre os séculos XI e XIII, ocorreu um crescimento da produção agrícola, gerando um excedente de produtos. Em consequência, observou-se um crescimento populacional, que, por sua vez, contribuiu para o deslocamento da população para as cidades.

Surgiram as corporações de ofício, associações que reuniam os mestres de ofício, proprietários de oficinas artesanais que desenvolviam atividades no mesmo ramo de atividade econômica. Cada corporação tinha um estatuto próprio, com normas regulamentadoras da relação de trabalho, cujo objetivo era estabelecer uma estrutura hierárquica, regular a capacidade produtiva e padronizar a técnica de produção.

As corporações de ofício mantinham com os trabalhadores uma relação hierárquica que se destinava mais à consecução de seus próprios interesses do que à proteção dos operários. Essa estrutura corporativa representou o embrião da sociedade industrial.

O Direito do Trabalho propriamente dito surge com a sociedade industrial e com o trabalho assalariado. Até então, não fazia sentido falar em Direito do Trabalho, uma vez que não estavam consolidadas as premissas mínimas para a existência da categoria básica do ramo justrabalhista, a relação de emprego. Segundo Delgado (2015, p.110):

Se a existência do trabalho livre (juridicamente livre) é pressuposto histórico-material para o surgimento do trabalho subordinado (e, consequentemente, da relação empregatícia) não há que se falar em ramo jurídico normatizador da relação de emprego sem que o próprio pressuposto dessa relação seja estruturalmente permitido na sociedade enfocada.

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Apesar das aparências, as manufaturas reais, primeiras concentrações industriais, não refletiram as formas modernas de produção e de assalariamento a elas associadas. Baseavam-se no privilégio e contradiziam as liberdades de trabalho e de concorrência. Somente durante o século XIX é que ocorre a consolidação do assalariamento, tendo a fábrica como local para instalação dessa relação salarial, embora ainda em condições muito precárias.

A partir do seu surgimento, com a Revolução Industrial, muitos autores, como Delgado (2015, p.99), dividem o Direito do Trabalho em quatro fases. Ressalte-se que a divisão e a denominação das fases são meramente didáticas, de modo que muitas das características atribuídas a uma fase também eram observadas em outras, em maior ou menor intensidade.

A primeira fase ficou conhecida como fase das manifestações incipientes ou esparsas, que vai de 1802, com a edição da Peel’s Act (Lei de Peel), diploma legal inglês que disciplinou o trabalho dos aprendizes paroquianos nos moinhos, até 1848, com a publicação do Manifesto Comunista. Essa fase caracterizou-se pelo surgimento de leis destinadas exclusivamente à redução da violência e da exploração empresarial sobre mulheres e menores. O espectro jurídico-trabalhista ainda era disperso e sem autonomia, não traduzindo-se ainda como um conjunto jurídico de normas.

A segunda fase do Direito do Trabalho é a da sistematização e consolidação desse ramo jurídico. Seu marco inicial é, além do Manifesto Comunista, em 1848, o movimento cartista, na Inglaterra, e a Revolução de 1848, na França. A Constituição do México de 19172 também foi de grande importância para essa fase evolutiva do Direito do Trabalho, uma vez que foi a pioneira no tratamento dos direitos sociais. Esta fase se estende até 1919, com a criação da OIT (Organização Internacional do Trabalho), e a promulgação da Constituição de Weimar. Nessa fase, a ação do movimento operário e a atuação do Estado interagiram reciprocamente, dando origem a um ramo jurídico próprio, que mescla a visão estatal com um amplo espaço para atuação das pressões advindas da classe operária.

A terceira fase, que se inicia logo após o término da Primeira Guerra Mundial, é conhecida como fase da institucionalização ou oficialização do Direito do Trabalho. Nesta

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fase, o Direito do Trabalho passa a ser um ramo jurídico inteiramente integrado à estrutura e à dinâmica institucionalizadas da sociedade civil e do Estado. Ocorre a constitucionalização do Direito do Trabalho e a legislação trabalhista esparsa ganha autonomia e consistência no universo jurídico.

A quarta fase da evolução histórica do Direito do Trabalho é a fase de sua crise e posterior transição, tendo como marco inicial o final da década de 1970. Uma conjunção de fatores marcou essa fase: de um lado, a crise do petróleo, que não foi solucionada rápida e satisfatoriamente pelos então dirigentes e abalou profundamente as estruturas econômicas mundiais. De outro, uma profunda renovação tecnológica, que reduziu drasticamente os postos de trabalho, sobretudo na indústria.

Nesse contexto, consolidou-se em importantes países, mediante vitórias eleitorais marcantes (Margaret Thatcher, na Inglaterra, em 1979; Ronald Reagan, nos Estados Unidos, em 1980; Helmut Kohl, na Alemanha, em 1982), um pensamento oposto ao defendido pelo Estado do Bem-Estar Social3. No centro desse novo pensamento de desregulamentação das políticas sociais e de regras jurídicas limitadoras da economia, encontrava-se o Direito do Trabalho, o que levou a uma crescente flexibilização das normas justrabalhistas existentes.

No Brasil, a Lei Áurea, em 1888, embora não tenha nenhum caráter justrabalhista imediato, pode ser tomada como marco inicial simbólico do Direito do Trabalho nacional, visto que eliminou (ainda que formalmente) dos contextos jurídico e social a escravidão, meio de produção incompatível com o novo ramo jurídico especializado, e estimulou a incorporação da relação de trabalho ao meio produtivo e social da época.

Far-se-á, mais uma vez, uma divisão meramente didática das fases históricas do Direito do Trabalho no Brasil, com base em Delgado (2015, p.111), para facilitar a compreensão da evolução do ramo justrabalhista em nosso país.

A primeira fase do Direito do Trabalho brasileiro pode ser identificada como fase das manifestações incipientes ou esparsas. De acordo com Ferrari, Nascimento e Filho (2011), essa fase é caracterizada por um Direito do Trabalho mais liberal, pelos primeiros protestos

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em busca de melhores condições para os trabalhadores e pela regulamentação de uma tímida legislação trabalhista.

Em meio à esparsa legislação trabalhista da época, destacam-se o Decreto Legislativo no 1.637, de 1907, que possibilitou a criação de sindicatos profissionais e sociedades cooperativas, o Decreto Legislativo no 1.162, de 1890, que deixou de considerar a greve como um ilícito penal, mantendo como crime apenas os atos violentos praticados durante o movimento grevista e, principalmente, a Constituição Republicana de 1891, que em seu artigo 72, parágrafo 244, firmou a liberdade de exercício de qualquer profissão moral, intelectual e industrial.

O segundo momento ficou conhecido como fase da institucionalização do Direito do Trabalho e teve início no ano de 1930, juntamente com o governo de Getúlio Vargas. O traço marcante desse período é a intervenção excessiva do Estado na regulamentação e fiscalização das questões trabalhistas.

Em um cenário onde a atividade econômica brasileira era, inicialmente, pautada na cafeicultura e o Estado adotava um modelo político cada vez mais intervencionista, houve a estruturação do modelo justrabalhista brasileiro. Segundo Delgado (2015, p.114), a influência do modelo então adotado seria notada, pelo menos, até a promulgação da Constituição de 1988.

Foi nessa época que surgiu o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio5. Oficializou-se a estrutura sindical única, submetida ao reconhecimento estatal (sindicalismo oficial)6, de modo que os sindicatos não tinham a função de representar os interesses das

4 Art.72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

§ 24. É garantido o livre exercício de qualquer profissão moral, intelectual e industrial.

5 A criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, em 26 de novembro de 1930, foi uma das primeiras iniciativas do governo revolucionário implantado no Brasil no dia 3 daquele mesmo mês, sob a chefia de Getúlio Vargas. O "Ministério da Revolução", como foi chamado por Lindolfo Collor, o primeiro titular da pasta, surgiu para concretizar o projeto do novo regime de interferir sistematicamente no conflito entre capital e trabalho. Até então, no Brasil, as questões relativas ao mundo do trabalho eram tratadas pelo Ministério da Agricultura, sendo, na realidade, praticamente ignoradas pelo governo.

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classes trabalhadora e patronal, servindo, em verdade, como órgão técnico-consultivo e de cooperação do Estado.

Em 1932, foram criadas as Comissões Mistas de Conciliação e as Juntas de Conciliação e Julgamento (JCJs), esboços da atual Justiça do Trabalho, que só viria a ser criada em 1939, através do Decreto-lei no 1.237. Também em 1932, foi criada a Carteira Profissional (atual CTPS) para os trabalhadores do comércio e da indústria, maiores de 16 anos.

O Estado atuou fortemente na regulamentação do horário de trabalho, com a fixação de uma jornada de trabalho de oito horas diárias para os trabalhadores do comércio e da indústria, e na normatização do trabalho feminino, com a proibição do trabalho noturno e com a previsão de isonomia salarial entre homens e mulheres.

O setor previdenciário também experimentou grande evolução durante esse período. Em 1934, foram criados os IAPs (Institutos de Aposentadoria e Pensões), que incorporaram progressivamente as antigas CAPs (Caixas de Aposentadoria e Pensões)7, beneficiando toda uma categoria profissional e não só os empregados de determinada empresa. Com o passar dos anos, várias categorias passaram a aderir a esse sistema, caso dos comerciários (IAPC), dos bancários (IAPB) e dos industriários (IAPI).

Segundo Carvalho (2002, p. 114), os recursos para manutenção dos IAPs (Institutos de Aposentadoria e Pensões) possuíam três origens: o governo, os patrões e os trabalhadores. Todos os IAPs (Institutos de Aposentadoria e Pensões) concediam aposentadoria por invalidez e pensão para dependentes, com os Institutos mais desenvolvidos, como o dos bancários, concedendo outros benefícios como aposentadoria por tempo de trabalho, auxílio médico-hospitalar e auxílios para os casos de doença, de morte e de parto.

Apesar dos avanços em busca de uma identidade, a legislação trabalhista ainda era produzida de forma heterogênea, com cada profissão possuindo uma regulamentação própria. Esse modelo era falho, pois algumas profissões, sem a devida organização necessária, ficavam

sendo compreendido como órgão colaborador deste.

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à margem da proteção trabalhista oferecida às categorias organizadas. Buscando sanar essa deficiência, as normas trabalhistas até então existentes foram reunidas, dando origem à Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), legislação que, mesmo com algumas modificações, continua em vigor até os dias atuais.

Como se pode notar, a evolução do Direito do Trabalho brasileiro foi bastante influenciada pelo período varguista e, ao contrário do que ocorreu com a maioria dos países de índole capitalista, o ramo justrabalhista não atingiu, pelo menos durante esse período, a maturidade democrática essencial ao seu aprimoramento. Durante muito tempo, esse modelo excessivamente intervencionista influenciou as relações trabalhistas brasileiras.

Segundo Rodrigues (1974, p.95):

Um dos fatos que chama atenção na história do sindicalismo brasileiro é a extraordinária persistência do tipo de sindicato esboçado após a vitória de Vargas e completado durante o Estado Novo. Atribui-se sua criação à influência das doutrinas fascistas então em moda, principalmente à Carta do Trabalho italiana. No entanto, depois de 1945, com a chamada redemocratização do país, o modelo de organização sindical que parecia ter sido uma imposição artificial da ditadura varguista (sob influência fascista) não sofreu alterações que afastassem sua essência.

A terceira fase do Direito do Trabalho brasileiro teve como marco inicial a promulgação da Constituição de 1988. A “Constituição Cidadã” trouxe inúmeros avanços democráticos, que influenciaram o ramo justrabalhista, contribuindo para a redução do intervencionismo estatal e para a flexibilização das relações trabalhistas, bem como ampliou a competência da Justiça do Trabalho e fortaleceu o Ministério Público do Trabalho. Foi nesse contexto de flexibilização que surgiu o instituto da pejotização.

Apesar da redução do intervencionismo estatal no Direito do Trabalho e da consequente flexibilização das relações trabalhistas, muitos dos institutos antidemocráticos então vigentes foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988. Nesse sentido, tem-se a manutenção da contribuição sindical obrigatória (artigo 8º, IV, da CF/88), da unicidade e do sistema de enquadramento sindicais (artigo 8º, II, da CF/88)8.

8 Art. 8º - É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: (...)

II - é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;

(...)

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De acordo com Delgado (2015, p.117):

A evolução política brasileira não permitiu (...) que o Direito do Trabalho passasse por uma fase de sistematização e consolidação, em que se digladiassem (e se maturassem) propostas de gerenciamento e solução de conflitos no próprio âmbito da sociedade civil, democratizando a matriz essencial do novo ramo jurídico.

Mesmo após a redemocratização, com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e a intensificação da flexibilização das normas trabalhistas, o Direito do Trabalho brasileiro ainda mantém alguns traços de controle estatal, reflexo do período varguista, época em que surgiu a principal legislação sobre o tema, a CLT, e, como dito anteriormente, da inexistência de uma fase dialética que permitisse o amadurecimento da matriz essencial do então novo ramo jurídico. Essa legislação excessivamente interventiva traria consequências negativas ao Direito do Trabalho brasileiro, sendo utilizada pelo capital como argumento favorável à precarização de direitos trabalhistas.

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3. FLEXIBILIZAÇÃO DAS RELAÇÕES TRABALHISTAS E SURGIMENTO DA PEJOTIZAÇÃO

O mercado econômico global é bastante dinâmico e está cada vez mais interligado. Decisões tomadas por um único agente econômico afetam, rapidamente, os demais, acirrando cada vez mais a disputa entre os países e, consequentemente, entre as empresas. A evolução tecnológica e um cenário econômico recessivo contribuem ainda mais para o aumento da competitividade.

Atualmente, grande parte das empresas existentes no mercado é multinacional. Essas empresas se instalam nos países em que as condições sejam mais favoráveis ao lucro e onde a mão-de-obra tenha o menor custo, uma vez que o custo do trabalho tem repercussão direta no preço dos produtos.

Nesse acirrado cenário econômico mundial, a necessidade de sobressair-se alcançou o Direito do Trabalho, de modo que o excesso de intervenção estatal e o protecionismo exacerbado das normas trabalhistas começaram a ser questionados. Surgiu a necessidade de flexibilização das normas trabalhistas para atender às exigências do mercado.

Segundo Martins (2009, p.13):

(...) a flexibilização das condições de trabalho é o conjunto de regras que tem por objetivo instituir mecanismos tendentes a compatibilizar as mudanças de ordem econômica, tecnológica, política ou social existentes na relação entre o capital e o trabalho.

Portanto, a flexibilização das normas trabalhistas caracteriza-se pela redução da rigidez de alguns dispositivos legais trabalhistas, conferindo papel de destaque às negociações coletivas, mas mantendo-se um mínimo necessário à proteção e à dignidade do trabalhador.

Segundo Delgado (2015, p.122), são absolutamente indisponíveis os direitos revestidos por uma tutela de interesse público, por constituírem um patamar civilizatório mínimo. A flexibilização desses direitos fere a dignidade humana e afronta a valorização mínima deferível ao trabalho humano (artigos 1º, III e IV, e 170, caput, da CF/88)9. Assim

9 Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...)

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

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sendo, seriam absolutamente indisponíveis, por exemplo, o pagamento de salário mínimo, as normas de saúde e segurança do trabalho, a anotação da CTPS (Carteira de Trabalho e Previdência Social).

Ainda segundo Delgado (2015, p.220), são relativamente indisponíveis os direitos trabalhistas que traduzam interesses individuais ou bilaterais simples, que não caracterizam um padrão civilizatório mínimo socialmente estabelecido. Portanto, as parcelas relativamente indisponíveis poderiam ser objeto de negociação coletiva (não de renúncia, obviamente), desde que não tragam efetivo prejuízo ao empregado (artigo 468 da CLT)10. Nesse sentido, tem-se, como exemplos, a modalidade de salário a ser paga ao longo da prestação laboral (salário fixo versus salário variável), a prestação ou não de horas extras e a adoção ou não de

modelos de compensação de horas extras. Nesse sentido, tem-se:

RECURSO DE REVISTA. SUMARÍSSIMO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL (por violação dos artigos 93, IX da CF/88, artigo 832 e 853 da CLT). Não se admite recurso genérico, porquanto não há como conhecer os fundamentos pelos quais se pretende modificar o julgamento. Recurso de revista não conhecido. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE (aponta contrariedade às Súmulas 80 e 289 do TST, violação dos artigos 191 e 194 da CLT). A admissibilidade do apelo revisional interposto contra acórdão proferido em procedimento sumaríssimo está restrita à demonstração de violência direta ao texto constitucional ou de contrariedade a Súmula de Jurisprudência Uniforme desta Corte, nos termos do § 6º do art. 896 da CLT. Recurso de revista não conhecido. DESCONTOS SALARIAIS PREVISTOS EM CLÁUSULA DE ACORDO COLETIVO RELATIVO À COMPENSAÇÃO DE HORAS PARADAS (aponta violação do artigo 7º, VI e XXVI da CF/88, artigo 462 da CLT e divergência jurisprudencial). A intenção do legislador constituinte foi de garantir a prevalência das convenções e acordos coletivos, admitindo-se a flexibilização, salvo nas hipóteses em que os direitos estão expressamente assegurados na Constituição Federal ou em que a matéria é relativa à saúde e segurança do trabalhador, o que não é a hipótese dos autos, porquanto notoriamente versa sobre direito disponível. Assim, tem-se como

assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional;

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade; IV - livre concorrência;

V - defesa do consumidor;

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego;

IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.

(25)

válidas disposições albergadas na norma coletiva, no sentido de que as horas recebidas sem contraprestação de trabalho devem ser compensadas, quando da extinção do contrato de trabalho, mediante descontos no TRCT, em razão da força negocial autônoma que a elas se encontra condicionada. Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR: 1818002120085080005 181800-21.2008.5.08.0005, Relator: Renato de Lacerda Paiva, Data de Julgamento: 15/06/2011, Segunda Turma, Data de Publicação: DEJT 24/06/2011) (Grifou-se)

Os Tribunais têm ratificado o entendimento doutrinário de ser possível a flexibilização de direitos trabalhistas por meio de negociação coletiva, desde que tais direitos sejam disponíveis, ou seja, não tutelem garantias de interesse público. Nesse sentido, tem-se:

TERCEIRIZAÇÃO. FLEXIBILIZAÇÃO. ATIVIDADE-FIM DO TOMADOR. A flexibilização no campo do trabalho, historicamente, tem sido uma reivindicação empresarial identificável com uma explícita solicitação de menores custos sociais e maior governabilidade do fator trabalho. Para a concretização desse pleito, reclama-se uma flexibilidade normativa, que poderá ser atingida sob o prisma legal, regulamentar e convencional(SALA-FRANCO, Tomás. El debate sobre políticas de flexibilidad laboral y el derecho del trabajo. Revista Jurídica do Trabalho. Ano I, n. 03, out/dez de 1988. Salvador/Lisboa, p. 82), mas assegurando-se garantias mínimas ao empregado. O grande desafio que se enfrenta é determinar o ponto de equilíbrio entre uma flexibilização sensível às preocupações legítimas das empresas e uma legislação que impeça um retrocesso ao antigo arrendamento de serviços, norteado pela autonomia da vontade, que foge completamente dos ideais de justiça social. Constitui modalidade de flexibilização a terceirização disciplinada pela Súmula 331 do TST, cujo inciso I considera inadmissível delegar tarefas canalizadas para a atividade-fim da empresa, salvo o trabalho temporário. Nestes casos, impõe-se o reconhecimento da relação de emprego diretamente com o tomador de serviços. (TRT-3 - RO: 01146201002203003 0001146-55.2010.5.03.0022, Relator: Convocado Antonio G. de Vasconcelos, Sétima Turma, Data de Publicação: 14/06/2011 13/06/2011. DEJT. Página 129. Boletim: Não.) (Grifou-se)

No Brasil, como em outras países capitalistas, o excesso de intervenção estatal dificulta a competitividade das empresas nacionais no mercado global, reduzindo a geração de empregos formais e aumentando o clamor por uma flexibilização das normas trabalhistas.

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Em nosso país, a flexibilização das relações trabalhistas ganhou força no início da década de 1990. Mas, um pouco antes, essa tendência já podia ser notada, possuindo, inclusive, previsão constitucional, como se extrai, por exemplo, da análise do artigo 7º, incisos VI, XIII e XIV, da Constituição Federal de 198811. Nesse sentido, tem-se:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE 1. CTVA. REAJUSTE SALARIAL DE 5%. NORMA COLETIVA. É cediço que o Acordo Coletivo de Trabalho tem força obrigatória no âmbito da empresa que o firmou, regendo os contratos individuais de trabalho dos empregados representados pela entidade sindical, a teor do artigo 7º, XXVI, da Constituição Federal. A autocomposição, portanto, deve ser prestigiada, pois as partes, de forma livre e legitimamente, negociaram direitos de seu interesse. A Constituição Federal, inclusive, por meio de seu artigo 7º, VI, XIII e XIV, admite a flexibilização das normas trabalhistas mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho para reduzir salários, jornada de trabalho e turnos de revezamento superiores a seis horas, o que só vem reforçar a autonomia coletiva por meio de concessões mútuas. Nesse contexto, não há como se afastar a validade do acordo coletivo que expressamente excluiu a incidência do reajuste de 5% sobre a parcela (TST - ARR: 1473007920095040012, Relator: Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 22/09/2015, Quinta Turma, Data de Publicação: DEJT 02/10/2015) (Grifou-se)

Delgado (2015, p.120) reforça esse entendimento afirmando que:

De fato, logo após o surgimento da Carta Magna de 1988, fortaleceu-se no país, no âmbito oficial e nos meios privados de formação da opinião pública, um pensamento estratégico direcionado à total desarticulação das normas estatais trabalhistas, com a direta e indireta redução dos direitos e garantias laborais.

Para Carvalho (2010), a flexibilização das relações trabalhistas está fundada na redução da intervenção estatal nos conflitos entre capital e trabalho e em uma maior autonomia dos trabalhadores e das entidades sindicais. A fim de se alcançar a flexibilização das normas trabalhistas, o neoliberalismo se vale de uma majoração do alcance da autonomia da vontade das partes, princípio que rege os contratos civis, e, também, da diminuição da heteronomia12, que é característica das relações de trabalho subordinado.

11 Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)

VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo; (...)

XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva. (Grifou-se)

(27)

Foi nesse contexto de flexibilização das relações trabalhistas, em busca de maior competitividade econômica, que foram regulamentadas formas de contratação menos rígidas, como, por exemplo, o trabalho temporário, o trabalho a tempo parcial e a terceirização, que foram seguidas por outras formas de contratação sem regulamentação, que constituem, na verdade, fraudes à legislação trabalhista, caso da pejotização. Segundo Carelli (2010), essas novas formas de contratação ficaram conhecidas como atípicas, em contraposição ao modelo de contrato típico, que, no Direito do Trabalho brasileiro, é a relação de emprego.

Para Reimann (2002), os contratos atípicos, com a crise econômica, com o crescente desemprego e com o acirramento da competitividade na busca por novos mercados econômicos, passam a adquirir relevância como modelo de ocupação e de trabalho, de modo que, futuramente, a relação típica de trabalho tende a ser a que hoje denominamos de atípica.

Ressalte-se, entretanto, que a flexibilização não se confunde com a desregulamentação das relações trabalhistas, tendo em vista que a desregulamentação implica na supressão de normas regulamentadoras estatais, afastando-se a proteção conferida por estas ao trabalhador, de modo que os atores da relação de emprego passam a dispor livremente das condições contratadas, sem serem asseguradas as mínimas garantias necessárias à manutenção da dignidade humana e do bem-estar social do trabalhador.

Embora a flexibilização das normas trabalhistas se mostre necessária frente ao cenário econômico mundial, tal flexibilização não pode atingir direitos indisponíveis que foram arduamente conquistados pela classe operária ao longo do tempo. Portanto, deve-se preservar um mínimo necessário à dignidade humana do trabalhador, devendo serem abolidas práticas que busquem fraudar a legislação trabalhista, a exemplo da pejotização.

3.1Medidas Flexibilizadoras das Relações Trabalhistas no Brasil

No Brasil, a flexibilização do Direito do Trabalho ganhou força na década de 1990, com a abertura da economia brasileira ao mercado globalizado. Essa flexibilização tem como principais causas a revolução tecnológica, a recessão econômica e a reestruturação produtiva, constituindo-se, segundo a ideologia neoliberal, em um dos principais instrumentos de combate ao desemprego.

(28)

adquirem posição de destaque na agenda do Governo. Essas ideias são disseminadas pela Administração Pública, ganhando a simpatia até mesmo de parcela do sindicalismo, que passa a acreditar que a flexibilização de direitos trabalhistas possa assegurar maiores ganhos aos trabalhadores.

Em 1996, a CNI (Confederação Nacional da Indústria) passa a pressionar o Congresso Nacional em busca da aprovação de projetos de lei considerados prioritários para a indústria, encaminhando ao legislativo federal um documento intitulado “Custo Brasil –

Projeto de Desregulamentação”, propondo a criação de comissões extrajudiciais para a resolução dos dissídios trabalhistas individuais.

Contratos flexíveis e redução dos encargos sociais passaram a ser encarados como a solução para diminuir o custo da mão-de-obra, incentivar a contratação, formalizar o mercado de trabalho e combater o desemprego, que passou a ser relacionado à falta de qualificação da classe operária.

O governo de Fernando Henrique Cardoso encampou a pauta da flexibilização das normas trabalhistas. Entretanto, nos primeiros anos do referido governo, pouco foi feito nesse sentido, pois foram priorizadas as reformas administrativa e previdenciária.

Em 1998, o aumento do desemprego no país é utilizado para intensificar o combate às leis de proteção do trabalho e justificar o avanço da flexibilização de normas trabalhistas. Neste cenário, foram criados inúmeros contratos de trabalho atípicos, reunidos em um pacote de combate ao desemprego que foi lançado para viabilizar a reeleição de Fernando Henrique Cardoso.

Nesse contexto, a Lei no 9.601/1998 possibilitou a instituição de contratos de trabalho por prazo determinado, independentemente da ocorrência das situações previstas no parágrafo 2º do artigo 443 da CLT13 (Consolidação das Leis Trabalhistas), em qualquer atividade da empresa ou do estabelecimento, para admissões que representem um acréscimo no número de empregados.

13 Art. 443 - O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito e por prazo determinado ou indeterminado.

(...)

§ 2º. O contrato por prazo determinado só será válido em se tratando:

a) de serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo; b) de atividades empresariais de caráter transitório;

(29)

O caráter flexibilizador da referida legislação é nítido, de modo que os contratantes poderão estipular, através de negociação coletiva, as indenizações que serão devidas em caso de rescisão antecipada do contrato de trabalho por prazo determinado, não se aplicando, portanto, as normas previstas nos artigos 479 e 480 da CLT14 (Consolidação das Lies Trabalhistas). A Lei no 9.601/1.998 também afasta a aplicação do artigo 451 da CLT15 (Consolidação das Leis Trabalhistas), além de prever a redução das alíquotas de contribuição previdenciária e do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço).

Ainda no contexto de flexibilização das normas trabalhistas, a Medida Provisória no 1.726/1998 previu a suspensão do contrato de trabalho por um período de 2 a 5 meses, de modo que o empregado não seria considerado como desempregado e teria seu retorno ao trabalho assegurado após o prazo estipulado para suspensão, quando poderia ser demitido. Foram criados o trabalho a tempo parcial e o banco de horas através da Medida Provisória no 2.164-41/2001, que acrescentou o parágrafo 2º ao artigo 59 da CLT16 (Consolidação das Leis Trabalhistas).

3.2 Medidas Flexibilizadoras no Setor Público

No segundo governo de Fernando Henrique Cardoso (1999-2002), as medidas relacionadas à flexibilização das relações trabalhistas ocorreram, primordialmente, no serviço público e no Poder Judiciário. Entre essas medidas, destaca-se a Lei no 9.801/1999, que possibilitou a demissão de servidores públicos estatais para a redução de despesas e a extinção dos cargos vagos em decorrência da exoneração, sendo vedada a criação de outro cargo, emprego ou função com atribuições iguais ou assemelhadas pelo prazo de quatro anos.

14 Art. 479 - Nos contratos que tenham termo estipulado, o empregador que, sem justa causa, despedir o empregado será obrigado a pagar-lhe, a título de indenização, e por metade, a remuneração a que teria direito até o termo do contrato.

Art. 480 - Havendo termo estipulado, o empregado não se poderá desligar do contrato, sem justa causa, sob pena de ser obrigado a indenizar o empregador dos prejuízos que desse fato lhe resultarem.

15 Art. 451 - O contrato de trabalho por prazo determinado que, tácita ou expressamente, for prorrogado mais de uma vez passará a vigorar sem determinação de prazo.

16 Art. 59 - A duração normal do trabalho poderá ser acrescida de horas suplementares, em número não excedente de 2 (duas), mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de trabalho.

(...)

(30)

Destaque-se, também, a Medida Provisória no 1.887-46/1999, convertida na Lei no 9.849/1999, que ampliou os períodos de contratação e de prorrogação de contratos por prazo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público. Por fim, destaquem-se a Lei no 9.962/2000, que permitiu que o pessoal da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional fosse contratado e regido pela CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), e a Lei no 10.331/2001, que regulamentou o artigo 37, X, da Constituição Federal de 198817, condicionando o reajuste salarial dos servidores públicos federais dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da União, das autarquias e das fundações públicas federais à previsão nas despesas orçamentárias.

No Poder Judiciário, foram extintos os juízes classistas18 através da Emenda Constitucional no 24/1999 e foram instituídas, por meio da Lei no 9.958/2000, as Comissões de Conciliação Prévia com a atribuição de tentar conciliar os conflitos individuais de trabalho antes de sua judicialização.

Posteriormente, foram retomadas as iniciativas que tentavam flexibilizar os artigos 7º (direitos dos trabalhadores) e 8º (organização sindical) da Constituição Federal de 1988 por meio de emendas constitucionais. Essas tentativas de aprovação de emendas constitucionais para alteração do texto constitucional encontravam óbice no quórum qualificado de 3/5 dos parlamentares e na votação em dois turnos em cada casa do Congresso Nacional.

A solução encontrada para superar esse empecilho foi a alteração do artigo 618 da CLT19 (Consolidação das Leis Trabalhistas) por meio do Projeto de Lei no 5.483/2001, cuja intenção era permitir que as condições de trabalho ajustadas mediante negociação coletiva prevalecessem sobre o disposto em lei, desde que não contrariassem a Constituição Federal de

17 Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices

18 Juiz classista é o juiz leigo, não togado, ou seja, não necessariamente formado em Direito, que é escolhido pelos sindicatos de trabalhadores e de empregadores para um mandato temporário na Justiça do Trabalho.

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1988 e as normas de segurança e de saúde do trabalho. A proposta tramitou em caráter de urgência, sendo aprovada, em dezembro de 2001, na Câmara dos Deputadas, mas foi retirada da pauta do Senado Federal e arquivada no início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

O pensamento liberal conseguiu encontrar no Brasil, especialmente na década de 1990, um terreno fértil para a implantação de medidas flexibilizadoras, que tinham como justificativa a formalização dos postos de trabalho e o combate ao desemprego crescente. Foi nesse cenário de flexibilização das relações trabalhistas que começaram a surgir formas atípicas de contratação, amparadas na recente legislação flexibilizadora, como é o caso da terceirização, do trabalho em tempo parcial, do estágio, etc.

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4. O INSTITUTO DA PEJOTIZAÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO

Sob o pretexto de modernização das relações trabalhistas e de formalização dos postos de trabalho é que surgiu uma nova modalidade de fraude à legislação trabalhista denominada de pejotização.

A palavra pejotização, consolidada pela doutrina e pela jurisprudência, é um neologismo derivado da sigla PJ, utilizada para se referir à pessoa jurídica. Logo, o trabalhador que constitui uma pessoa jurídica com a finalidade de prestar serviços a um empregador, ocultando uma relação empregatícia sob o véu de um contrato comercial, passou a ser identificado pelas expressões “pejota” e “pejotizado”. Essa modalidade fraudulenta de contratação da mão-de-obra também ficou conhecida como contratação entre empresas,

empresa do “eu sozinho”, tendo em vista que o serviço é prestado por uma só pessoa, pejutização e personificação de encomenda.

Os contratos de trabalho atípicos são aqueles que, surgidos majoritariamente com a flexibilização das relações trabalhistas, buscam reduzir a intervenção estatal em prol de uma maior autonomia negocial entre os atores da relação trabalhista, de modo que os operários são levados a abrir mão de alguns direitos e garantias trabalhistas disponíveis em troca de contrapartidas voluntariamente negociadas.

Os contratos de trabalho atípicos são os que preveem a redução dos direitos e garantias trabalhistas quando comparados com a relação de emprego (contrato típico). Esses contratos podem ter ou não normatização legal, de modo que, quando não possuem regulamentação, constituem uma fraude à legislação trabalhista, como é o caso da pejotização. Para alguns estudiosos, a pejotização foi regulamentada através da Lei no 11.196, publicada em 21 de novembro de 2005, e, portanto, não constituiria mais, a partir de então, fraude à legislação trabalhista. Esse não é, entretanto, o posicionamento que vem sendo adotado pela maior parte da doutrina e pelo Judiciário brasileiros, como se demonstrará a seguir.

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relativamente nova20 forma de contratação, através da qual o empregador impõe ao obreiro, como condição de admissão ou de permanência no trabalho, a constituição de uma pessoa jurídica, simulando formalmente uma situação jurídica de natureza civil.

Enquanto no Direito Civil a legislação em matéria contratual tem caráter supletivo, no Direito do Trabalho, as normas contratuais assumem uma posição de destaque, ao posso que a autonomia da vontade atua de forma complementar. Invertem-se, portanto, as posições.

A constituição de uma pessoa jurídica, desde que dentro dos limites e finalidades legalmente previstos, representa a consecução de um direito garantido pelo ordenamento jurídico brasileiro, de modo que nem todas as contratações entre pessoas jurídicas serão fraudulentas, mas somente aquelas que visem ocultar uma relação empregatícia sob o manto de um contrato civil para esquivar-se do cumprimento das obrigações trabalhistas.

A relação de trabalho refere-se, de forma ampla, a todo vínculo jurídico que envolva uma obrigação de fazer consubstanciada em um labor humano, abrangendo, assim, as relações de trabalho autônomo, de trabalho avulso, de trabalho voluntário, de emprego, dentre outras. A relação de emprego é, portanto, espécie do gênero relação de trabalho.

Embora seja apenas uma das espécies da relação de trabalho, a relação de emprego tornou-se, especialmente nos últimos duzentos anos, com a consolidação do modelo capitalista, a modalidade mais importante de contratação laborativa. Essa relevância socioeconômica e as particularidades de sua dinâmica jurídica fizeram com que o Direito do Trabalho se estruturasse majoritariamente em torno da relação de emprego, de modo que essa espécie de contratação da mão-de-obra é a que confere maior proteção ao trabalhador.Nesse sentido, tem-se:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. 1. VÍNCULO DE EMPREGO CONFIGURADO. PROFISSIONAL CONTRATADO MEDIANTE PEJOTIZAÇÃO (LEI Nº 11.196/2005, ART. 129). ELEMENTOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO EVIDENCIADOS. PREVALÊNCIA DA RELAÇÃO EMPREGATÍCIA. A relação empregatícia é a principal fórmula de conexão de trabalhadores ao sistema socioeconômico existente, sendo, desse modo, presumida sua existência, desde que incontroversa a prestação de serviços (Súmula 212, TST). A Constituição da República, a propósito, elogia e estimula a relação empregatícia, ao reportar a ela, direta ou indiretamente, várias dezenas de princípios, regras e institutos jurídicos.Em consequência, possuem

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caráter manifestamente excetivo fórmulas alternativas de prestação de serviços a alguém por pessoas naturais, como, ilustrativamente, contratos de estágio, vínculos autônomos ou eventuais, relações cooperativadas, além da fórmula apelidada de pejotização. Em qualquer desses casos, além de outros, estando presentes os elementos da relação de emprego, esta prepondera, impõe-se e deve ser cumprida. No caso da fórmula do art. 129 da Lei nº 11.196, de 2005, somente prevalecerá se o profissional pejotizado tratar-se de efetivo trabalhador autônomo ou eventual, não prevalecendo a figura jurídica como mero simulacro ou artifício para impedir a aplicação da Constituição da República, do Direito do Trabalho e dos direitos sociais e individuais fundamentais trabalhistas. Trabalhando a Obreira cotidianamente no estabelecimento empresarial e em viagens a serviço, com todos os elementos fático-jurídicos da relação empregatícia, deve o vínculo de emprego ser reconhecido (art. 2º, caput, e 3º, caput, CLT), com todos os seus consectários pertinentes. Note-se que o TRT deixa claro, a propósito, a presença da subordinação jurídica em todas as suas três dimensões (uma só já bastaria, como se sabe), ou seja, a tradicional, a objetiva e a estrutural. (TST - AIRR: 6393520105020083 639-35.2010.5.02.0083, Relator: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 19/06/2013, Terceira Turma, Data de Publicação: DEJT 21/06/2013) (Grifou-se)

A pejotização é, portanto, uma forma de contratação fraudulenta da mão-de-obra, imposta pelo empregador ao obreiro para desvirtuar a relação de emprego através da constituição de uma pessoa jurídica, encobrindo, assim, os elementos fático-jurídicos caracterizadores do vínculo empregatício (trabalho realizado por pessoa física, com pessoalidade, alteridade, onerosidade, subordinação e habitualidade) e afastando, consequentemente, os direitos e garantias trabalhistas decorrentes do mesmo. Dessa forma, torna-se imperioso discorrer um pouco sobre esses elementos caracterizadores da relação de emprego e sobre o modo como cada um deles é impactado pela pejotização.

Ressalte-se, antes, que, para existir uma relação de emprego, é necessária a coexistência de todos os elementos caracterizadores da mesma, de modo que a inobservância de um deles já é suficiente para afastar o vínculo empregatício. Nessa peculiaridade é que se apoia a pejotização, ao tentar disfarçar a presença dos elementos caracterizadores da relação de emprego para, consequentemente, afastar a existência do vínculo empregatício. Entretanto, como veremos a seguir, o referido disfarce pode ser desconstituído através de uma análise criteriosa dos elementos caracterizadores da relação de emprego e pela aplicação de princípios trabalhistas.

Da combinação dos conceitos de empregador e empregado, previstos respectivamente nos artigos 2º e 3º da Legislação Consolidada21, extraem-se os elementos

21 Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

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caracterizadores da relação de emprego, quais sejam: trabalho realizado por pessoa física, com pessoalidade, habitualidade, onerosidade, alteridade e subordinação.

O trabalho deve, portanto, ser prestado por um trabalhador pessoa física, destinatário da tutela conferida pelo Direito do Trabalho brasileiro. Martins (2012, p.101), refletindo a previsão contida no artigo 3º da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), afirma que “...não existe contrato de trabalho em que o trabalhador seja pessoa jurídica, podendo

ocorrer, no caso, prestação de serviço, empreitada, etc”. Em relação à essa característica da relação de emprego, a pejotização, com o intuito de camuflar a existência de um vínculo empregatício, cria duas realidades paralelas: uma fática, em que o obreiro continua a prestar serviços ao empregador através de sua personalidade física, e outra jurídica, em que formalmente a prestação de serviços é feita através de uma empresa.

A relação de emprego é personalíssima, infungível em relação ao obreiro, tendo em vista que a contratação do empregado pelo empregador é feita com base em qualidades e características pessoais daquele e o contratante só pode exigir a prestação de serviços daquele que escolheu como empregado. Assim sendo, se a pejotização fosse uma contratação lícita entre duas empresas, a empresa contratada poderia prestar os serviços utilizando qualquer um de seus empregados, inclusive substituindo qualquer um deles, quando lhe fosse conveniente. Entretanto, na pejotização, embora juridicamente a contratação ocorra entre duas empresas, é o empresário contratado (“pejota”) quem irá prestar os serviços pessoalmente, de modo que a pessoalidade subsiste no contexto fático.

Na relação empregatícia, o empregado presta seus serviços com habitualidade ao empregador, possuindo uma jornada de trabalho a cumprir. Em uma relação contratual entre duas empresas não é necessário que haja habitualidade. A empresa contratada, via de regra22, presta seus serviços de acordo com um planejamento elaborado por ela própria. Na pejotização, embora o contrato se dê entre duas pessoas jurídicas, o empresário contratado (“pejota”) se submete a um controle de jornada feito pelo contratante, como ocorre com os outros empregados regularmente contratados.

Outra característica do vínculo empregatício é a onerosidade, segundo a qual a prestação de serviços por parte do empregado deve corresponder a uma contrapartida

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remuneratória por parte do empregador. Na pejotização, a contraprestação remuneratória paga

ao trabalhador “pejotizado” é invariável, o que, em regra, não aconteceria numa contratação lícita entre empresas, de modo que a contraprestação variaria de acordo com a quantidade de serviços prestados. Portanto, na prática, o “pejota” continua a receber salário, como acontece em uma típica relação empregatícia.

Embora na pejotização o empresário contratado (“pejota”) também receba uma contrapartida pelos serviços prestados e, em alguns casos, essa contrapartida seja até superior à que receberia se a contratação ocorresse através de uma relação de emprego, o “pejota”

acaba abrindo mão de muitos direitos trabalhistas (férias anuais acrescidas de um terço constitucional, décimo terceiro salário, abono salarial, etc), que, se forem contabilizados, o colocam em uma situação bem mais desvantajosa do que a de um empregado típico, regularmente contratado. Além disso, o trabalhador “pejotizado” ainda tem que arcar com os encargos inerentes à abertura e à manutenção da empresa, suportando os riscos decorrentes da atividade empresarial.

Para o empregador, quanto à onerosidade, ainda que remunere melhor o trabalhador “pejotizado” do que o empregado típico, a pejotização mostra-se bem mais vantajosa, pois não precisará arcar com nenhum direito trabalhista e nem com os encargos legais decorrentes da contratação típica.

A alteridade, característica do vínculo empregatício, relaciona-se com os riscos da atividade empresarial, que devem ser suportados exclusivamente pelo empregador. Na pejotização, entretanto, como o “pejota” constitui uma pessoa jurídica para viabilizar ou manter a contratação, é ele quem arca com os riscos de atuação da empresa constituída. Todavia, em relação à empresa contratante, o trabalhador “pejotizado” não assume nenhuma responsabilidade pelos riscos inerentes ao seu funcionamento, assim como ocorre em uma relação de emprego típica.

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A subordinação, enquanto elemento caracterizador do vínculo empregatício, corresponde, de maneira genérica, à sujeição do empregado às ordens do empregador, que dirige e orienta a prestação dos serviços. Grande parte da doutrina costuma citar quatro tipos de subordinação.

A subordinação técnica está relacionada à posição do empregador de coordenador técnico dos serviços prestados por seus empregados. Entretanto, essa subordinação pode ser relativizada em algumas situações nas quais o empregado é especialista na atividade desenvolvida, possuindo mais conhecimento do que o próprio empregador.

A subordinação econômica decorre da dependência do empregado em relação ao seu trabalho, sua fonte de subsistência. Na pejotização, o “pejota” não é detentor do capital e

dos meios de produção, que são fornecidos pela empresa contratante. Dessa forma, surge uma dependência econômica do obreiro em relação ao empregador, haja vista ser o serviço prestado de forma exclusiva, tendo os ganhos, em verdade, natureza salarial, servindo como contraprestação ao labor prestado.

Em decorrência da subordinação econômica, surge a subordinação social, que diz respeito à dependência que o obreiro tem em relação ao seu trabalho para poder arcar com seus compromissos sociais, não laborais.

Por último, tem-se a subordinação jurídica, que é decorrente do contrato de trabalho e sujeita o empregado às ordens do patrão na condução da atividade laboral. Foi a subordinação jurídica que foi a escolhida pelo legislador brasileiro para caracterizar a relação de emprego. Assim sendo, em uma relação de emprego, o empregado encontra-se juridicamente subordinado às ordens do empregador, o que não ocorre num contrato comercial entre duas empresas, de modo que cada uma delas conserva sua autonomia para contratar da maneira que melhor lhe convir.

Assim, através da pejotização, o prestador de serviços se tornaria, juridicamente, um trabalhador parassubordinado23, passando a dirigir sua atividade e deixando a subordinação para trás. Na prática, entretanto, isso não ocorre e a subordinação persiste.

Referências

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