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Reajuste e revisão dos contratos de concessão dos serviços públicos de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário MESTRADO EM DIREITO DO ESTADO

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUCSP

Percival José Bariani Junior

Reajuste e revisão dos contratos de concessão dos serviços públicos de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário

MESTRADO EM DIREITO DO ESTADO

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUCSP

Percival José Bariani Junior

Reajuste e revisão dos contratos de concessão dos serviços públicos de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário

MESTRADO EM DIREITO DO ESTADO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito do Estado, área de concentração Direito Administrativo, sob a orientação da Profª. Dra. Dinorá Adelaide Musetti Grotti.

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Banca Examinadora

_______________________________________________

_______________________________________________

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Percival e Elza, pelo amor incondicional e pelos exemplos de vida, dignidade e honestidade.

Aos meus irmãos Rogério e Marcel, pelo companheirismo e cumplicidade. À minha esposa, Juliana, pela compreensão, pela paciência e por completar e dar sentido à minha vida.

Aos meus sobrinhos, Elisa, Daniel e Rafaela, por me fazerem acreditar em um mundo melhor.

Aos meus sogros Adaulto e Vera, pelo carinho inestimável.

Aos meus cunhados e cunhadas, Parra, Ana Luiza, Junior, Natália e Débora, pelo estímulo à conclusão desse trabalho.

Aos primos Carlos e Paula, a quem tenho como irmãos.

Ao amigo Augusto Dal Pozzo, por acreditar em mim, por ser o maior incentivador de minha trajetória profissional e acadêmica e pelas discussões e contribuições que só engrandeceram esse trabalho.

Ao amigo João Negrini, exemplo de profissional responsável e dedicado, pela parceria e por compartilhar sonhos e objetivos.

Ao Dr. Araldo Dal Pozzo, pelo conhecimento jurídico invejável, pela sobriedade e retidão de caráter e pela incansável disposição.

Ao amigo Renan Facchinatto, pela simplicidade brilhante, pela bondade de espírito e por suprir, com competência ímpar, minha ausência no escritório.

Ao Gabriel Chagas, Leonardo Alvarenga, Silvia Abud e Estevam Pallazzi, pelo esforço e comprometimento diário com a vida profissional e acadêmica, que me servem de estímulo para seguir em frente.

A todos meus companheiros de Dal Pozzo Advogados, Milton, Beatriz, Camilla, Steban, Gabriel Malta, Marcella Marques, Marcella Mangullo, Sofia, Jean, Thessalia, Marcia, Walkiria, Cristina e Aline, que contribuíram, cada um de seu jeito, para que esse trabalho fosse finalizado.

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RESUMO

A Lei Nacional de Saneamento Básico – LNSB (Lei nº 11.445/07) estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico e para a política federal de saneamento básico, e, entre outras atividades, disciplina a forma de prestação dos serviços públicos de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário, fixando um novo modelo pautado pelo planejamento, regulação e prestação adequada dos serviços, o que incentivou a utilização da concessão como forma de implementar esses serviços essenciais. O plano de saneamento básico e o estudo de viabilidade técnica e econômico-financeira são os dois principais documentos que servem de norte para a estruturação do modelo da concessão, uma vez que estabelecem as metas e os investimentos necessários para alcançá-las e definem a remuneração do concessionário e o prazo para amortização dos investimentos. Esses parâmetros técnicos e econômicos iniciais compõem o equilíbrio econômico-financeiro da concessão, que deve ser preservado durante toda a prestação dos serviços, sendo que o reajuste periódico das tarifas e as revisões ordinária e extraordinária do contrato são os instrumentos que mantêm inalterada a relação de equivalência entre as obrigações recíprocas assumidas pelas partes, nos exatos termos disciplinados em contrato. Partindo da análise do regime jurídico dos serviços públicos e dos elementos que compõem o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão, o presente trabalho tem por objeto analisar os mecanismos previstos na legislação infraconstitucional brasileira para preservar esse equilíbrio nos contratos de concessão dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário, buscando compatibilizar o direito dos usuários de receber um serviço adequado e os direitos do concessionário.

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ABSTRACT

The National Law on Basic Sanitation - (LNSB in Portuguese - Law nº 11.445/07) establishes the national guidelines for basic sanitation, for the federal policy of basic sanitation and, among other activities, disciplines how public supply services for potable water and sanitary depletion should be provided, setting a new model regulared by an appropriate planning on how to provide these services, which has encouraged the use of a concession as a way of implementing them. The two main documents are the basic sanitation plan and the study for technical and financial economic viability which serve as a guide for the structuring of this concession model, since they establish all goals and necessary investments to reach it and, also, define the concessionaire's wages and the deadline for the amortization of the investments. These initial technical and economical parameters set the financial economic balance of the concession, which must be preserved throughout the services provided, since the tariff's periodical readjustments and the ordinary and extraordinary reviews of the contract are the instruments that keep the relation of equivalence for reciprocal obligations between both parts unaltered, in the exact terms disciplined in contract. From the analysis of the juridical regime of public services and elements that compound the financial economic balance of the concession contracts, this paper aims at analysing the mechanisms forseen in the Brazilian infra-constitutional legislation to preserve the balance in the public services concessional contracts for water supply and sanitary depletion, seeking to make the users rights to receive an appropriate service and the concessionaires rights compatible.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 10

1. OS SERVIÇOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA POTÁVEL E ESGOTAMENTO

SANITÁRIO 14

1.1. A trajetória dos serviços de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário no

Brasil 14

1.2. A disciplina legal dos serviços de saneamento básico 20

1.2.1. A natureza jurídica dos serviços de abastecimento de água potável e esgotamento

sanitário: serviços públicos 20

1.2.2. Dos princípios que regem os serviços públicos de abastecimento de água e

esgotamento sanitário na Lei Nacional de Saneamento Básico 24

1.2.2.1. Notas introdutórias 24

1.2.2.2. Dos princípios na Lei Nacional de Saneamento Básico 29

2. O CONTRATO DE CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA POTÁVEL E ESGOTAMENTO SANITÁRIO E SEU

EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO 35

2.1. Noções de contrato administrativo de concessão comum de serviços públicos 35

2.2. Aspectos gerais do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão comum

de serviços públicos 38

2.3. O dever de planejar e o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão dos serviços públicos de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário 41

2.3.1. Necessidade de planejamento 41

2.3.2. O plano de abastecimento de água e esgotamento sanitário 43

2.4. Estudo de Viabilidade Técnica e Econômico-Financeira 48

3. O REAJUSTE DAS TARIFAS DOS CONTRATOS DE CONCESSÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA POTÁVEL E

(8)

3.1. O reajuste de tarifas como instrumento de reequilíbrio dos contratos de concessão dos

serviços públicos de água e esgoto 54

3.2. A periodicidade dos reajustes 59

3.3. A data de referência para a aplicação de reajustes 64

3.4. A fixação de índices e fórmulas de reajuste 67

3.5. O procedimento para aplicação de reajustes 73

4. A REVISÃO DOS CONTRATOS DE CONCESSÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS

DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA POTÁVEL E ESGOTAMENTO SANITÁRIO 81

4.1. A distinção entre reajuste e revisão 81

4.2. O fundamento legal da revisão ordinária ou periódica dos contratos de concessão 83

4.3. A revisão ordinária dos contratos de concessão de abastecimento de água e esgotamento

sanitário e o compartilhamento dos ganhos 87

4.3.1. A revisão ordinária na Lei Nacional de Saneamento Básico 87

4.3.2. O compartilhamento de ganhos 91

4.3.2.1. A eficiência do concessionário e a proporção em que os ganhos devem ser

compartilhados entre as partes 94

4.3.3. A periodicidade da revisão ordinária 101

4.3.4. O procedimento da revisão ordinária 104

4.3.4.1. Introdução 104

4.3.4.2. O procedimento 107

5. A REVISÃO EXTRAORDINÁRIA DOS CONTRATOS DE CONCESSÃO DE

ABASTECIMENTO DE ÁGUA E ESGOTAMENTO SANITÁRIO 113

5.1. A noção jurídica do instituto 113

5.2. As áleas extraordinárias e o compartilhamento de riscos 116

5.3. As principais áleas extraordinárias dos contratos de concessão dos serviços públicos de

abastecimento de água e esgotamento sanitário 126

5.3.1. A alteração unilateral do contrato 126

5.3.2. O fato do príncipe 129

(9)

5.3.4. Teoria da imprevisão 135

5.3.5. Sujeições imprevistas, caso fortuito e força maior 137

5.4. O procedimento da revisão extraordinária 138

CONCLUSÃO 141

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INTRODUÇÃO

De acordo com o último levantamento do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento Básico – SNIS, do Ministério das Cidades, realizado no ano de 2010, pouco mais de 90% da população brasileira é atendida pelos serviços de abastecimento de água e aproximadamente 50% pelos serviços de esgotamento sanitário, sendo que apenas 35% de todo o volume de esgoto gerado é devidamente tradado antes de ser lançado na natureza1.

Inconteste, portanto, que o Brasil ainda está muito distante de atingir a meta de universalização do acesso aos serviços públicos de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário. E enquanto houver algum cidadão brasileiro sem o acesso a esses serviços públicos essenciais, nossa República continuará descumprindo um de seus fundamentos estatuídos no art. 1º da Constituição Federal de 1988: a dignidade da pessoa humana.

Não obstante tal realidade desoladora, a preocupação com o saneamento básico não é recente em nossa história. Os primeiros investimentos realizados no setor são contemporâneos à chegada da família real portuguesa no Brasil, nos idos de 1808. E ao longo dos últimos dois séculos, o Estado se empenhou em elevar os investimentos e ampliar o acesso da população aos serviços, contudo, como se percebe pelos dados mais recentes do SNIS, não logrou êxito nesse mister, muito em virtude da ausência de uma política pública bem definida e de um planejamento adequado.

Na década de 1990, inspirado pelos ideais neoliberais difundidas pelas grandes economias mundiais e pelas instituições financeiras multilaterais (FMI, BID, Banco Mundial), o Estado brasileiro iniciou um processo de desestatização, alienando bens e direitos e delegando a prestação de serviços públicos à iniciativa privada, relegando o Estado ao papel de regulador, cuja atuação devia apenas garantir o livre funcionamento do mercado.

Na esteira desse processo, em 1995 foi editada a Lei de Concessões (Lei nº 8.987/95), com o objetivo de regulamentar o art. 175 da Constituição Federal e

1 O SNIS apresenta os valores médios dos índices de atendimento para todo o conjunto de prestadores de

serviços participantes do levantamento no ano 2010, distribuídos segundo as regiões geográficas e a média do

Brasil. O estudo completo está disponível em

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disciplinar a delegação da prestação de serviços públicos ao particular. Com o advento dessa lei, surgiram os primeiros projetos de concessão dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário, viabilizando, assim, a realização de vultosos investimentos, os quais, nesse novo modelo, ficavam a cargo do particular.

No entanto, a falta de uma política pública ainda atravancava o desenvolvimento do setor e o incremento dos investimentos. Com vistas a atacar esse problema estrutural, o Governo Federal, após discussão com a sociedade, editou, em 2007, a Lei nº 11.445, a denominada Lei Nacional de Saneamento Básico, que estabeleceu as diretrizes para o setor e impôs a universalização como meta a ser atendida.

Importante observar que, segundo a Lei nº 11.445/07, os serviços de saneamento básico compreendem: (i) abastecimento de água potável; (ii) esgotamento sanitário; (iii) limpeza urbana e manejos de resíduos sólidos; e (iv) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas.

A presente dissertação, contudo, se dedica exclusivamente aos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, tendo em vista que a concessão é um instituto que se amolda perfeitamente às características desses serviços, em especial porque são fruíveis singularmente e remunerados diretamente pelos usuários por meio de tarifas.

Ademais, por razões de ordem técnica, os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário são interdependentes, de forma que são tratados, na maioria das vezes, em conjunto, qualquer que seja a forma de prestação.

Não se ignora o fato de que também é cabível a utilização das Parcerias Público-Privadas, nas modalidades concessões administrativas e patrocinadas, para a delegação da prestação desses serviços públicos ao particular, contudo, a concessão comum é o instituto utilizado com maior frequência e com relativo sucesso.

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fiscalização da execução contratual também foi objeto de disciplina legal, conferindo-se um papel de destaque à entidade reguladora.

A nova disciplina legal dos serviços, combinada com as disposições da Lei de Concessões e, principalmente, com a vontade política, criou as bases para a realização de novos investimentos no setor de saneamento básico, visto que, sem o aporte de grande volume de recursos, não é possível atingir a meta de universalização dos serviços.

E com vistas a dar cumprimento às diretrizes legais, a concessão dos serviços voltou a ser uma alternativa viável para o Poder Público, em especial quando não há recursos suficientes para atender às necessidades da população. Da mesma forma, com regras mais claras, os particulares também se sentiram atraídos a realizar os investimentos necessários e serem remunerados pela prestação dos serviços.

Ocorre que o sucesso da concessão depende de um planejamento bem realizado, a fim de garantir a prestação de um serviço adequado e o atingimento das metas, e da demonstração da viabilidade econômico-financeira do projeto, de forma que a remuneração prevista seja suficiente para amortizar os investimentos realizados, custear toda a prestação e conferir lucro ao concessionário.

Não obstante, é imprescindível que o equilíbrio econômico-financeiro do contrato seja preservado durante todo o prazo da concessão e isso só é possível com a fixação de regras e procedimentos claros sobre o reajuste periódico das tarifas e sobre as revisões ordinárias e extraordinárias.

O presente trabalho visa, exatamente, perquirir os institutos do reajuste de tarifas e da revisão dos contratos de concessão dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário, considerando as disposições constitucionais pertinentes e, principalmente, as Leis nº 11.445/07 e nº 8.987/95. Pretende-se analisar, também, a repartição de riscos nesse tipo de contrato e as hipóteses ensejadoras da revisão extraordinária dos contratos.

Assim, para a consecução desse escopo, no primeiro capítulo é apresentada a trajetória dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Brasil, bem como demonstrada a sua natureza jurídica de serviços públicos, submissão a um regime especial, consagrador de princípios e regras específicos, conforme, inclusive, disciplinado na Lei nº 11.445.

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adequadamente a prestação dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário, destacando-se a importância do plano e do estudo de viabilidade técnica e econômico-financeira, no qual deve constar as diretrizes a respeito do reajuste e da revisão contratual.

O reajuste das tarifas, desde a noção jurídica do instituto até os procedimentos e definições que devem figurar no edital e no contrato, é objeto de estudo no terceiro capítulo.

O quarto capítulo é dedicado à revisão ordinária dos contratos de concessão dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário. A Lei Nacional de Saneamento Básico foi pioneira ao prever, expressamente, a revisão ordinária como instrumento para a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, de forma que esse ineditismo enseja um exame minucioso dos fundamentos legais desse instituto e de suas consequências. No mesmo sentido, a análise da eficiência do concessionário e a possibilidade de compartilhamento dos ganhos são questões ainda controversas na doutrina e na jurisprudência e são aqui enfrentadas.

A seguir, o quinto capítulo trata da revisão extraordinária dos contratos de concessão dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário e dos riscos envolvidos na contratação, sendo que as principais áleas que podem ocorrer nesses tipos de contrato e a forma de discipliná-las no contrato também são objeto de estudo.

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1. OS SERVIÇOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA POTÁVEL E ESGOTAMENTO SANITÁRIO

1.1. A trajetória dos serviços de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário no Brasil

No Brasil, desde o período colonial até a primeira metade do século XIX, as políticas públicas voltadas à saúde sanitária eram ignoradas pela Corte Portuguesa, que priorizava apenas a exploração do território e a solidificação de seu domínio sobre as terras descobertas.

No início do século XIX, o abastecimento de água resumia-se à sua coleta feita diretamente nas fontes, ficando sob a responsabilidade das vilas e povoados a distribuição aos integrantes das sociedades urbanas, que ainda se encontravam em formação. Somente durante o século XIX é que se iniciou uma precária estruturação da distribuição de água e coleta de esgoto.

Com o crescimento populacional decorrente da chegada da família real portuguesa em 1808, houve um aumento da demanda por abastecimento de água e coleta de esgoto, que acabou por ensejar, por parte do governo central, a implementação das primeiras políticas voltadas ao saneamento básico. Datam desse período as primeiras obras de infraestrutura para distribuição de água à população.

A chegada dos imigrantes europeus, aliada ao início do processo de instalação de fábricas e indústrias na região sudeste, sobretudo na cidade de São Paulo, desencadearam um intenso processo de urbanização, que motivou a criação das primeiras companhias empresariais de saneamento básico.

Nesse contexto histórico, em 1877 foi criada a Companhia Cantareira, empresa privada que passou a deter a concessão para implantação da infraestrutura sanitária e do serviço de distribuição de água e coleta de esgoto na Cidade São Paulo. Foram também feitas concessões à iniciativa privada dos sistemas de abastecimento de água nas cidades de Porto Alegre, Fortaleza, Recife, Belém e São Luís, embora tais serviços ficassem adstritos a uma restrita parcela de usuários.

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pelos programas criados, dado que os serviços beneficiavam apenas os centros urbanos e uma reduzida e abastada parcela populacional. Ademais, o caráter restrito dos serviços concedidos à iniciativa privada motivou o governo a encampar grande parte das concessões delegadas.

Tal fato representou uma mudança nas políticas de saneamento básico, na medida em que os Estados, ao reconhecerem sua ineficiência na solução dos problemas do setor, passaram a recorrer à União a fim de obterem recursos humanos e financeiros capazes de estabelecer uma política de saneamento básico satisfatória.

Dessa maneira é que, de forma a suprir as falhas das concessões, os serviços de saneamento básico passaram a ser gradativamente prestados pelo poder público, pois a centralização na prestação dos serviços de saneamento básico mostrava-se a maneira mais adequada de conter as epidemias de febre amarela e de peste e de fomentar políticas estatais de saúde pública.

Teve, assim, início uma acentuada intervenção estatal no setor, com o intuito de estender os serviços de saneamento básico às áreas ainda não atendidas. Foram criadas diversas repartições federais incumbidas de construir ou ampliar as redes de saneamento, que posteriormente seriam repassadas aos Municípios e Estados, que as operariam de maneira suplementar às concessões existentes.

Em razão da incapacidade de investimento por parte das concessionárias, em 1940 foi criado o Departamento Nacional de Obras de Saneamento – DNOS, que, além de extinguir diversas concessões, acabou por atribuir aos Municípios a responsabilidade pela prestação dos serviços de saneamento básico.

Face a essa atribuição, os Municípios criaram autarquias, os Departamentos de Água e Esgoto (DAEs) ou Serviços Autônomos de Água e Esgoto (SAAEs), que recebiam subsídios por parte dos governos estaduais e federal para prestarem os referidos serviços.

Esse novo panorama das políticas sanitárias conferiu ao governo federal um papel ativo de agente fiscalizador da atuação municipal e estadual e não de prestador do serviço, como se pretendia inicialmente.

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possibilidade dos serviços serem autossustentáveis, considerando a remuneração tarifária.

A despeito de todos os avanços obtidos durante a década de 1940, os anos cinquenta foram marcados por inúmeras críticas acerca da morosidade dos Municípios na prestação de serviços em função da vinculação e dependência às políticas nacionais de saúde pública.

Tal constatação ensejou uma desvinculação dos serviços de saneamento básico das políticas de saúde, de maneira a se conferir uma maior autonomia ao primeiro, o que acarretou um fortalecimento da atuação municipal nesse setor, bem como uma consolidação dos modelos de gestão implementados pelos Serviços Autônomos de Água e Esgoto.

Na década de 1960 houve a criação do Fundo Nacional de Financiamento para Abastecimento de Água e do Grupo Executivo de Financiamento que, juntos, atenderam a apenas 21 cidades com obras de abastecimento de água.

Objetivando o aperfeiçoamento dos planos e programas criados na década de 19602, em 1971 foi lançado o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA), que previa que

os Estados implementassem em seus Municípios sistemas de abastecimento de água e esgoto, com a obrigatoriedade da criação da Companhias Estaduais de Saneamento Básico (CESBs) às quais foram concedidos os sistemas de saneamento urbano, condição sine qua non para que os Municípios recebessem recursos financeiros da União.3

O objetivo do governo federal com a criação do PLANASA era extirpar as carências existentes no âmbito do saneamento básico nacional, buscando a autossustentabilidade financeira para seu desenvolvimento e aperfeiçoamento. Sua meta consistia em expandir o fornecimento de água potável a 80% da população urbana e os serviços de esgotamento a 50% da mesma parcela populacional. Para tanto, foram criadas 27 companhias estaduais de saneamento básico (CESBs), que passaram a prestar os serviços de abastecimento de água em grande parte dos Municípios.

2 Entre 1964 e 1970 vários planos de governo foram estabelecidos: Plano Decenal 1967/76, Plano Estratégico de

Desenvolvimento para 1967/70, Metas e Bases para Ação do Governo de 1969.

3 Dinorá Adelaide Musetti Grotti. A evolução jurídica do serviço público de saneamento básico. In: José Roberto

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Mesmo tendo conseguindo obter significativos avanços na expansão dos serviços de abastecimento de água e coleta de esgoto, o plano não conseguiu acompanhar o crescimento populacional e uma parcela considerável da população permaneceu alijada dos serviços.

Em 1975, o aumento da demanda pelos serviços de tratamento e coleta de esgoto sanitário ensejou uma revisão do PLANASA, dado que o repasse de verbas às companhias era insuficiente para eliminar os déficits do setor.

Esses fatores, atrelados à recessão econômica dos anos 1980, culminaram em um severo abalo no modelo de gestão do PLANASA, que se deteriorou ainda mais com extinção do Banco Nacional de Habitação – BNH, que exercia uma função fiscalizadora sobre o desenvolvimento das diretrizes nacionais para o saneamento básico.

Assim, o quadro político e econômico da época exauriu o PLANASA e comprometeu a sua continuidade, de tal forma que em 1992 ocorreu a sua extinção por intermédio da Resolução nº 076/92 do Conselho Curador do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.

Após a extinção do PLANASA, o governo se limitou a lançar medidas ineficazes e desarticuladas, em uma demonstração aparente de que o setor de saneamento básico carecia de uma nova legislação tendente a acompanhar e atender aos novos anseios da sociedade.

Ciente da relevância do problema, o Governo Federal, comandado à época pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, editou diversas leis esparsas que foram importantes para a reestruturação do saneamento básico no país, sem, no entanto, fixar uma regulamentação específica uma regulamentação específica para o setor. Dentre os avanços obtidos destaca-se a promulgação da Lei de Concessões e da Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos.

Não se deve olvidar de que o Projeto de Lei nº 53/91 tentou implementar uma política nacional de saneamento básico, mas, segundo as razões apresentadas no veto presidencial de 1995, seu teor buscava apenas e tão somente restabelecer o PLANASA à luz de um cenário constitucional diferente.

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Financiamento a Concessionários Privados de Saneamento (FCP/SAN), que almejava

financiar concessionários privados de saneamento, visando à implantação de empreendimentos destinados ao aumento da cobertura dos serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário e à reciclagem de ativos do FGTS, oriundos de empréstimos concedidos anteriormente para investimentos pelo setor público e transferidos, através do processo de concessão dos serviços, ao operador privado.4

Posteriormente, em acordo firmado em 1999 com o Fundo Monetário Internacional – FMI, o Governo Federal se comprometeu a implementar e acelerar um programa de desestatização5, em especial por meio de concessão dos serviços

de abastecimento de água e esgotamento sanitário, desenvolvendo programas e projetos “no sentido de tornar as companhias estaduais atraentes à iniciativa privada”6.

Com vistas a dar cumprimento a esse acordo com o FMI, sobreveio o Projeto de Lei nº 4.147/2001, que se propunha a instituir diretrizes nacionais para o saneamento básico. Dentre outras determinações, previa que a titularidade dos serviços de interesse local fosse repassada ao Estado, de forma a reunir condições para a desestatização.

A eleição de Luiz Inácio Lula da Silva em 2002 introduziu um novo viés à política de saneamento básico, que passou a ser conduzida de maneira bastante distinta: a desestatização do setor deixou de ser uma prioridade e se iniciou uma fase de elaboração de estudos para implementação de instrumentos mais adequados para se alcançar a tão almejada universalização.

4 Item 1 do Anexo da Resolução nº 267, de 12 de outubro de 1997, do Conselho Curador do FGTS, que aprovou

a criação do Programa de Financiamento a Concessionários Privados de Saneamento (FCP/SAN).

5 O temo desestatização foi aqui utilizado no sentido que lhe foi conferido pela Lei Federal nº 9.491, de 09 de

setembro de 1997:

“Art. 2º [...]

§1º Considera-se desestatização:

a) a alienação, pela União, de direitos que lhe assegurem, diretamente ou através de outras controladas, preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores da sociedade; b) a transferência, para a iniciativa privada, da execução de serviços públicos explorados pela União, diretamente ou através de entidades controladas, bem como daqueles de sua responsabilidade.

c) a transferência ou outorga de direitos sobre bens móveis e imóveis da União, nos termos desta Lei.”

6 MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, SECRETARIA DE RECURSOS HÍDRICOS. Caderno Setorial de

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O Poder Executivo Federal, então, envidou esforços e promoveu a retirada do PL 4.147/2001 da pauta de votações, demonstrando que a forma de organizar o setor, com preferência para medidas de desestatização da prestação dos serviços, não seria endossada.

Ademais, a impossibilidade dos bancos públicos financiarem as concessões já existentes e a interrupção de financiamento para novas concessões ajudaram a comprovar que a desestatização não era prioridade do Governo Federal e que o fortalecimento da gestão pública seria o caminho para a universalização dos serviços.

Motivado por esses ideais e de posse de um estudo que demonstrava: (i) o baixo crescimento nos índices de cobertura do serviço na década anterior, (ii) o não cumprimento das metas de universalização traçadas e (iii) a desigualdade na prestação dos serviços, sobretudo no que concerne às áreas rurais, o Governo Federal criou o Ministério das Cidades, que passou a ser o responsável pela condução das políticas de desenvolvimento urbano.

Dentro da organização do novo Ministério, houve a criação da Secretaria Nacional de Saneamento, que ficou incumbida de avaliar e implantar uma nova política nacional de saneamento, que acompanhasse as demais políticas de desenvolvimento urbano e rural, bem como assegurasse o acesso universal aos serviços de saneamento básico.

Amparado pelas novas estruturas estatais, dedicadas quase que exclusivamente à questão do saneamento básico, o governo conferiu uma nova dinâmica ao setor, retomando os investimentos que se encontravam estagnados desde 1998, em razão da política de superávit primário adotada pelo governo anterior, e criando o Grupo de Trabalho Interministerial – GTI, que buscou fomentar a integração das iniciativas de saneamento que estavam dispersas em diversos órgãos do Governo Federal.

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Não obstante a tentativa governamental de reorganizar o setor dentro da própria estrutura da Administração e com isso viabilizar uma gestão inteiramente estatal, acabou-se, em verdade, incentivando a iniciativa privada a prestar os serviços de saneamento básico.

Após as inúmeras tentativas de se promulgar um conjunto de normas aptas a orientar a implementação e o gerenciamento de um sistema de saneamento básico condizente com o desenvolvimento econômico e social do país e diante dos entraves encontrados dentro da própria Administração, notadamente no que se refere à obtenção e repasse de verbas capazes de viabilizar os projetos idealizados, houve, dentro do Governo Federal, o consenso de que a alternativa seria buscar na iniciativa privada os recursos e a experiência necessários para a concretização de um novo sistema de saneamento básico.

Assim, veio à lume a Lei Federal nº 11.445/07, que estabeleceu as novas diretrizes nacionais para o saneamento básico, incluindo sob essa disciplina os seguintes serviços: (i) abastecimento de água potável; (ii) esgotamento sanitário; (iii) limpeza urbana e manejos de resíduos sólidos; e (iv) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas.

Referido diploma legal procurou estabelecer um regime jurídico para o setor, com ênfase no planejamento das políticas públicas e na fiscalização da prestação dos serviços, objetivando alcançar a tal almejada universalização, sem olvidar, contudo, a qualidade dos serviços e o direito dos usuários.

1.2. A disciplina legal dos serviços de saneamento básico

1.2.1. A natureza jurídica dos serviços de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário: serviços públicos

Não se pode iniciar um estudo do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, à luz das disposições da Lei nº 11.445, de 05 de janeiro de 2007, a Lei Nacional de Saneamento Básico, que estabelece as diretrizes nacionais do setor, sem antes discorrer, ainda que de forma sucinta, a respeito da noção de serviço público.

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estudos em diversas partes do mundo, principalmente na França, por vezes realçado como atividade estatal das mais relevantes, por outras vezes relegado ao segundo plano, como noção ultrapassada e irrelevante para os dias atuais.

Segundo Dinorá Adelaide Musetti Grotti, “atribui-se a Rousseau o uso originário da expressão serviço público. Em um texto do Contrat Social, assinala Meilán Gil, a expressão aparece pela primeira vez, abrangendo qualquer atividade estatal.”7 Não

obstante, foi na França que se criou e se desenvolveu toda a teoria geral atinente aos serviços públicos, elaborada a partir da jurisprudência do Conselho do Estado, recolhida e sistematizada por juristas de renome.

O arresto “Blanco” do Tribunal de Conflitos da França, de 1873, é considerado o marco inicial da noção de serviço público, que, na ocasião, foi utilizada como fundamento do direito administrativo e como critério de repartição de competências entre as jurisdições administrativa e comum, sendo certo que quando a questão envolvia serviço público era a jurisdição administrativa que possuía competência para apreciá-la.

É a partir dessa jurisprudência que se desenvolve, no primeiro terço do século XX, a teoria do serviço público, capitaneada por Léon Duguit e Gaston Jèze, mentores intelectuais da denominada Escola do Serviço Público, também chamada de Escola Realista ou de Bordeaux.

Com base no realismo jurídico e inspirado na ideia de “solidariedade” de Émile Durkheim, Duguit cria uma teoria do Estado cujo fundamento é o serviço público, que legitima e limita a atuação estatal. Até então, o eixo metodológico do Direito Público baseava-se na ideia de soberania e foi o pensamento de Duguit que procurou substituí-la pela noção do serviço público.

Para Duguit, o serviço público constituiu-se em uma obrigação dos governantes, com vistas a garantir a solidariedade social. O Estado, portanto, passa a ter deveres a serem cumpridos, conciliando-se a noção de obrigações positivas e negativas.

Nessa esteira, a concepção de serviço público de Duguit possui caráter nitidamente sociológico, pois, para o autor, os serviços públicos não são detectados a priori, mas emergem naturalmente da sociedade, de acordo com as necessidades percebidas em razão da interdependência social.

(22)

Já Gaston Jèze, discípulo de Duguit, sustenta uma noção jurídica de serviço público, aduzindo que este se presta a atender necessidades de interesse geral, observados os procedimentos de direito público. Surge aqui, portanto, a ideia de um regime jurídico de Direito Público, o qual deve orientar os serviços públicos.

Ainda no início do século XIX, Maurice Hauriou, fundador da denominada Escola Institucional, divergia de Duguit e Jèze e caracterizava o Estado pelo “poder público”, afirmando que o serviço público é o objetivo a ser alcançado e o poder público é o meio utilizado para tanto.

O serviço público era concebido, assim, como uma das atividades exercidas pela Administração para o cumprimento de suas missões e atendimento das necessidades da população, não se caracterizando como fundamento do poder do Estado.

Como síntese das ideias dessas duas Escolas, que representam a teoria clássica do serviço público, pode-se concluir que a definição de serviço público reúne três elementos: (i) intervenção de uma pessoa pública; (ii) satisfação de uma necessidade de interesse geral; e (iii) submissão a um regime jurídico específico.

Desde o surgimento da noção de serviço público até os dias de hoje, muito tem se discutido a respeito da crise dessa noção. O certo é que o serviço público ainda é noção fundamental no Direito Brasileiro, tanto que, em nosso país, possui expresso assento constitucional e configura uma das principais atividades desenvolvidas pelo Estado a fim de alcançar os objetivos traçados no artigo 3º de nossa Constituição Federal.

Para os fins do presente trabalho, adota-se o conceito de serviço público de Celso Antônio Bandeira de Mello, por entendermos ser esse que, de maneira mais precisa, enunciou os requisitos que o caracterizam:

Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhes faça as vezes, sob um regime de Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais -, instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo. 8

(23)

O conceito adotado estabelece uma série de requisitos necessários para caracterizar uma determinada atividade como serviço público. São eles: o requisito subjetivo, o requisito objetivo ou material e o requisito formal.

Para que se possa concluir que os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário tem natureza jurídica de serviços públicos, faz-se necessário investigar, nesse passo, se preenchem os requisitos acima referidos.

Para preenchimento do requisito subjetivo exige-se que a atividade em questão esteja sob o domínio do Estado. Nesse sentido, consoante o disposto no inciso XX, do artigo 21 da Constituição Federal, compete à União instituir diretrizes para o setor de saneamento básico. Ao exercer sua competência constitucional, com a edição da Lei 11.445/07, a União, a despeito de não estabelecer a unidade federativa específica que seria a titular do serviço, inequivocamente alocou-o nas mãos do Estado.

No que tange ao critério objetivo ou material, é imperioso destacar o seu triplo desdobramento: (i) presença de um interesse geral ou coletivo; (ii) que a atividade ofereça uma utilidade ou comodidade para a coletividade e (iii) que seja fruível singularmente pelo administrado.

Os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário encontram-se umbilicalmente ligados ao interesse geral disposto na Constituição Federal concernente à proteção à saúde pública. Não paira qualquer dúvida acerca da importância que essas atividades representam e, justamente por serem essenciais, o Estado as coloca sob sua tutela.

Também não pode ser colocada em xeque a comprovada utilidade ou comodidade que representa para o cidadão a prestação dos aludidos serviços. E aqui já se está a examinar a segunda condição imposta pelo requisito objetivo. Trata-se, realmente, de um grande benefício oferecido à coletividade, uma efetiva vantagem concedida ao cidadão, que recebe em sua residência, empresa ou indústria, água para suas mais comezinhas necessidades e tem seu esgoto coletado por uma rede estruturada.

(24)

No que concerne ao critério formal, examinando com exatidão o regime jurídico dos serviços de fornecimento de água e esgotamento sanitário, desde sua concepção constitucional e principalmente em face das emanações trazidas pela Lei de Saneamento a seu respeito, é pacífico concluir que ele se encontra submetido ao regime jurídico de direito público.9

Nesse sentido, as lições de Augusto Neves Dal Pozzo:

É justamente pela importância que se confere à atividade no meio social, qualificando-a como serviço público, que o Estado a coloca sob a égide de um regime jurídico especial, caracterizado pela existência de prerrogativas e sujeições peculiares, instituídas especificamente para a proteção dos interesses coletivos: o regime de direito público.10

Em síntese, verifica-se que os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário preenchem os critérios que qualificam uma determinada atividade como serviço público, sendo essa, portanto, a sua natureza jurídica. Por essa razão, encontram-se submetidos ao influxo do regime jurídico que norteia atividades com esse qualificativo.

1.2.2. Dos princípios que regem os serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário na Lei Nacional de Saneamento Básico

1.2.2.1. Notas introdutórias

A Lei Nacional de Saneamento Básico enuncia em seu art. 2º uma série de normas que ela própria denomina normas de princípios.

Conquanto não se deseje nesta oportunidade um aprofundamento no tema dos Princípios Gerais de Direito – dada a necessidade de uma longa digressão – é importante fixarmos algumas notas introdutórias ao tema, para depois enfrentarmos a questão tendo em vista a positivação de certos princípios específicos feita pela referida Lei.

9 Essa observação restará ainda mais clarificada adiante, quando do exame desse regime jurídico, que prevê,

inclusive, a incidência de princípios jurídicos específicos, todos eles corolários dos princípios que conformam os serviços públicos e o regime jurídico administrativo.

(25)

Partindo-se da distinção entre regras e princípios proposta por Robert Alexy11,

verifica-se que para o autor regras e princípios fazem parte do gênero “norma jurídica”, porque ambos indicam que algo “deve ser”, preenchendo o requisito deôntico necessário para caracterização de uma norma, traduzindo uma prescrição de conduta que se pode caracterizar a partir de um mandamento, uma permissão ou uma proibição.12

Princípios e regras, portanto, são espécies de normas jurídicas. Princípios não são, por conseguinte, meras diretrizes interpretativas que indicam o caminho a ser trilhado pelo operador do Direito para buscar o real significado da norma. Princípios são normas e, como tais, aptas a conferir direitos públicos subjetivos aos seus destinatários, oponíveis individualmente e aplicáveis independentemente da existência de uma regra.

Ademais, preleciona o autor que os princípios se distinguem das regras porque aqueles determinam que algo deve ser feito na maior medida possível, diante das possibilidades fáticas e jurídicas existentes. Trata-se do conceito de mandamento de otimização (Optimierungsgebote), sem o qual qualquer distinção entre regras e princípios, nos moldes propostos por Alexy, será infrutífera13.

O ponto decisivo para a distinção entre princípios e regras é que os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandamentos de otimização, que estão caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus e que a medida devida do seu cumprimento não apenas depende das possibilidades fáticas, senão também das jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras opostos.

Ao contrário, as regras são normas que podem ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida, então se há de fazer exatamente o que ela exige, nem mais nem menos. Portanto, as regras possuem determinações no âmbito do fático e juridicamente possível. Isto significa que a diferença entre regras e princípios é qualitativa e não de grau. Toda norma ou tem uma regra ou um princípio.

11 Ressalte-se que, dentre as várias teorias sobre o tema (como a de Dworkin e a de Humberto Ávila), optamos,

no texto, por aquela exposta por Robert Alexy, por nos parecer adequada à exposição que aqui se faz. Ressalte-se, também, que esta distinção não é unânime na doutrina, como, aliás, praticamente nenhuma teoria estrutural de normas jurídicas, mas se revela adequada para compreensão das premissas de que parte esta dissertação. 12 Robert Alexy. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 85-90.

(26)

Esta é a noção fundamental por trás do conceito de mandamentos de otimização: enquanto a regra, uma vez válida – e isso deve ser determinado a partir dos pressupostos de validade estabelecidos pela Teoria Geral do Direito –, deve ser obedecida, isto é, deve implicar um comportamento humano positivo (obrigação), negativo (proibição) ou numa possibilidade de agir ou deixa de agir (permissão), aos princípios não podem ser imputados os critérios de validade ou não, pois a sua forma específica da aplicação é a ponderação. Em outras palavras, não se pode aferir a validade de um determinado princípio.

Uma vez normatizado – explícita ou implicitamente – o princípio indica que algo deve ser feito na maior medida possível, conforme dito, dentro das possibilidades fáticas e jurídicas existentes.

Os conflitos entre regras se resolvem a partir dos critérios tradicionais de solução das antinomias: hierárquico (lex superior derogat legi inferiori), cronológico (lex posterior derogat priori), e de especialidade (lex specialis derogat generali).14 Assim, havendo duas normas absolutamente incompatíveis entre si, necessariamente, uma delas haverá de ser válida e a outra, a contrario sensu, será tomada como inválida, ao menos para aplicação naquele caso concreto.

Imagine-se, por exemplo, que um determinado condomínio estipule em seu regramento estatutário que “após as 19h00 não é permitido o uso da piscina”. Tem -se um enunciado do qual, a priori, -se podem extrair dois comandos normativos: um proibitivo (“é proibido o uso da piscina após as 19h00”) e um permissivo (“antes das 19h00 é permitido o uso da piscina”).

Suponha-se que esse mesmo regramento disponha que “aos sábados, domingos e feriados, o uso da piscina é liberado até às 20h00”. Uma primeira leitura indica a existência de uma antinomia. Um dispositivo estabelece que o uso da piscina é permitido somente até às 19h00, todavia, outro dispositivo de igual hierarquia dispõe que o uso da piscina, nos mencionados dias, é permitido até às 20h00. Tem-se, aqui, uma antinomia sanável pelo critério da especialidade. A segunda norma é uma exceção à primeira. Conclui-se, portanto, que ambas as regras são válidas e vigentes, mas a segunda constitui uma cláusula de exceção à primeira. Por esse critério, apesar de vigente e válida para a ordem normativa do

14 Maria Helena Diniz. Conflito de normas: de acordo com o novo código civil, 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008,

(27)

condomínio em questão, a primeira regra não é aplicável nas hipóteses excepcionais previstas pela segunda regra.

Imagine-se, ainda, que nesse mesmo condomínio, haja uma regra com o seguinte teor: “pessoas estranhas ao condomínio, ainda que autorizadas pelos condôminos, não poderão estacionar seus carros nas vagas disponibilizadas no interior do condomínio” e, nesse mesmo regramento, haja outro enunciado em sentido contrário: “pessoas estranhas ao condomínio somente poderão estacionar seus carros nas vagas disponibilizadas no interior do condomínio se forem autorizadas pelos condôminos”. Tem-se aí uma situação de incompatibilidade insanável pela via da cláusula de exceção. Assim, obrigatoriamente, uma das normas – ou ambas – haverá de ser considerada inválida, pelos critérios hierárquico ou cronológico.

Os conflitos entre regras, em suma, resolvem-se pelos critérios de aferição da validade das normas jurídicas. Contudo, os conflitos entre princípios não são assim: eles não se resolvem a partir de critério de validade simplesmente porque princípios não são válidos ou inválidos diante de outros antagônicos, nem mesmo constituem cláusulas de exceção.

As colisões de princípios devem ser solucionadas de maneira totalmente distinta. Quando dois princípios entram em colisão – tal como é o caso quando segundo um princípio algo está proibido e, segundo outro princípio, está permitido – um dos princípios tem que ceder ante o outro. Mas, isto não significa declarar inválido o princípio desprezado nem que o princípio desprezado tenha que introduzir uma cláusula de exceção.

O que se sucede é que, em certas circunstâncias, um dos princípios precede ao outro. Em outras circunstâncias, a questão da precedência pode ser solucionada de maneira inversa. É isto que se quer dizer quando se afirma que nos casos concretos os princípios têm diferentes pesos e que prima o princípio com maior peso. Os conflitos entre regras são levados a termo na dimensão da invalidez; a colisão de princípios – como só podem entrar em colisão princípios válidos – tem lugar mais além da dimensão de invalidez, na dimensão do peso.15

(28)

Assim, Alexy propõe que o critério para solução de colisões entre princípios está relacionado às chamadas relações condicionadas de precedência, que decorre necessariamente da estruturação dos princípios como mandamentos de otimização.

Alexy propõe, para solucionar a colisão entre princípios, uma lei de colisão, que imprime maior clareza ao conceito de relações condicionadas de precedência:

Se o princípio P1 tem precedência em face do princípio P2 sob as condições C: (P1 PP2) C, e se do princípio P1, sob as condições C, decorre a consequência jurídica R, então, vale uma regra que tem C

como suporte fático e R como consequência jurídica: C → R.16

Merece destaque o fato de que a maioria da doutrina constitucionalista e da filosofia do direito defende que, para se utilizar a concepção de princípios na visão alexyana, tem-se que romper com a tradicional conceituação dos princípios jurídicos a partir de sua fundamentalidade, generalidade, abstração ou outro critério semelhante.

Reiterando, princípios não são meras diretrizes interpretativas que irradia em todas as normas jurídicas seu significado, mas, ao contrário são as próprias normas jurídicas.

No entanto, como princípios se caracterizam pelo mandamento de otimização, na medida em que deve sempre buscar sua maior aplicabilidade, entende-se ser consonante a teoria alexyana com a concepção clássica de princípio, visto que a partir do momento que se deve buscar sempre de forma cada vez melhor a aplicação do princípio, não se pode negar que este é o mandamento nuclear do sistema jurídico.

Nessa linha, reconhece-se como pertinente a definição de princípio de Celso Antônio Bandeira de Mello, em que apenas um estudo desatento da teoria de Alexy poderia consigná-la como excludente e discordante. Assim princípio consiste no

mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.17.

16 Idem. Ibidem, p. 99.

17 Celso Antônio Bandeira de Mello. 29.ed. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2012. p.

(29)

Nas palavras de Dinorá Adelaide Musetti Grotti “o regime jurídico de cada instituto sedimenta-se a partir de um conjunto de princípios e regras que lhe dão identidade e que, congregados, dão-lhe especificidade e singularidade”.18 Nesse

sentido, para se entender os serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário, faz-se mister estudar os princípios que os norteiam.

1.2.2.2. Dos princípios na Lei Nacional de Saneamento Básico

Tendo em vista a natureza pública dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, seu regime jurídico é orientado, inicialmente, pelos princípios contidos no art. 6º, da Lei de Concessões, que disciplina o art. 175 da Constituição Federal e determina que serviço adequado é aquele que satisfaz “as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas”19.

Não obstante, a Lei Nacional de Saneamento Básico, prescreve, no seu artigo 2°, os princípios fundamentais que regem os serviços públicos de saneamento básico, os quais complementam as disposições da Lei de Concessões e conformam o regime jurídico específico dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Esses princípios são assim identificados:

(i) universalização do acesso; (ii) integralidade;

(iii) adequação à saúde pública e à proteção do meio ambiente; (iv) disponibilidade;

(v) adoção de métodos, técnicas e processos que considerem as peculiaridades locais e regionais;

(vi) articulação com as políticas de desenvolvimento urbano e regional, de habitação, de combate à pobreza e de sua erradicação, de proteção ambiental, de promoção da saúde e outras de relevante interesse social voltadas para a melhoria da qualidade de vida, para as quais o saneamento básico seja fator determinante;

(vii) eficiência e sustentabilidade econômica;

18 Dinorá Adelaide Musetti Grotti. O serviço público e a Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros, 2003. p.

254-255

19 Sobre os princípios gerais dos serviços públicos verificar: Augusto Neves Dal Pozzo.

(30)

(viii) utilização de tecnologias apropriadas, considerando a capacidade de pagamento dos usuários e a adoção de soluções graduais e progressivas;

(ix) transparência das ações, baseada em sistemas de informações e processos decisórios institucionalizados;

(x) controle social;

(xi) segurança, qualidade e regularidade; e

(xii) integração das infraestruturas e serviços com a gestão eficiente dos recursos hídricos.

i) Universalização

O princípio da universalização enuncia que o serviço de saneamento básico deve ser colocado, efetivamente, à disposição de todos, para que todos os usuários possam de fato, independente da situação social, ter acesso ao serviço.

Luiz Henrique Antunes Alochio defende, com razão, que o termo universalidade é diferente do termo generalidade. Isso porque o primeiro necessita, para sua concretização, da efetividade do acesso ao serviço público, ao passo que ao segundo basta “a criação do serviço”, independente de seu acesso.20

Ressalta-se que o princípio da universalidade embasaria a concessão de eventuais subsídios, assim como obstaculizaria a administração pública em suspender o fornecimento do serviço, alegando inadimplência.

ii) Integralidade

O princípio da integralidade foi descrito no próprio inciso II do artigo 2° da Lei Nacional de Saneamento Básico nos seguintes termos: “integralidade, compreendida como o conjunto de todas as atividades e componentes de cada um dos diversos serviços de saneamento básico, propiciando à população o acesso na conformidade de suas necessidades e maximizando a eficácia das ações e resultados”.

O saneamento básico envolve diversas atividades, não se restringindo apenas ao abastecimento de água e esgotamento sanitário, mas incluem outros serviços como limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos.

20 Luiz Henrique Antunes Alochio. Direito do saneamento: introdução à Lei de Diretrizes Nacionais de

(31)

Nesse sentido, o princípio da integralidade imputa um poder-dever à Administração Pública em não se limitar a uma dada atividade, privilegiando um serviço em detrimento de outro. Se isso ocorrer, haverá clara ofensa à lei.

Isso é de suma importância, na medida em que a Lei Nacional de Saneamento Básico nada mais é do que a concretização do direito fundamental à saúde, nos termos do art. 196 da Constituição Federal. Em nada adianta prover água e esgoto, sem um sistema de limpeza urbana eficiente, a fim de evitar doenças e moléstias.

Destarte, para existir um serviço público de saneamento básico eficiente, faz-se necessária a concretização de todas as atividades nele compreendidas.

iii) Adequação à saúde pública e à proteção do meio ambiente

Este princípio sedimenta a preocupação do legislador com o meio ambiente equilibrado e com a saúde dos usuários. Assim, o mesmo é um vetor ao administrador público na gestão dos serviços de saneamento básico, na medida em que de nada adiantaria, por exemplo, colocar o aterro sanitário em área de reserva ambiental, ou, ainda, em área próxima de escola ou de hospitais.

Nesse sentido, a efetivação do serviço público de saneamento ambiental deve se atentar para a questão da saúde pública e para proteção do meio ambiente.21

iv) Disponibilidade de serviços de drenagem e de manejo das águas pluviais

Esse princípio decorre, indubitavelmente, de uma situação concreta que assola quase todas as cidades urbanas, que convivem com enchentes em períodos chuvosos. Daí a necessidade do Legislador tornar expresso, como princípio, a obrigatoriedade da disponibilidade dos serviços de drenagem e de manejo das águas pluviais.

Provavelmente, o que motivou o legislador foi a falta de estrutura jurídica para o Poder Público cobrar, de alguma forma, dos usuários a concretização deste serviço, o que, por óbvio, o deixa relegado ao segundo plano.

21“A prestação dos serviços de saneamento (água, esgoto, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos) deverá

ser realizada de forma a não ser atentatória à saúde pública ou ao meio ambiente. Para os que conhecem minimamente a realidade de uma infinidade de sistemas de manejo de saneamento a céu aberto, que implantam o tratamento de esgoto sanitário ao lado de nascentes, ou sobre lençóis freáticos, ou mediante o depósito de lixo lado a lado com áreas residenciais, e demais aberrações atentatórias à salubridade e ao meio ambiente, faz-se plausível a preocupação do legislador em tornar patente, enquanto princípio do saneamento, o necessário manejo

(32)

v) Adoção de métodos, técnicas e processos adequados às peculiaridades locais e regionais

Este princípio enuncia que não há uma regra própria para a efetivação do serviço público de saneamento básico. Às vezes, haverá a necessidade do serviço público ser prestado no âmbito regional, com a criação da região metropolitana, outras no âmbito local, dependendo das especificidades de cada localidade, ou por meio de convênios públicos, nos quais dois entes federados se reúnem para a prestação de determinado serviço.

vi) Articulação com as políticas de desenvolvimento urbano e regional, de habitação, de combate à pobreza e de sua erradicação, de proteção ambiental, de promoção da saúde e outras de relevante interesse social voltadas para a melhoria da qualidade de vida, para as quais o saneamento básico seja fator determinante

A política de saneamento básico não pode ser instaurada isoladamente, mas, ao contrário, deve ser estruturada de forma articulada com outras políticas públicas. E isso é de suma importância, na medida em que não se pode criar, por exemplo, uma política habitacional sem pensar no serviço de saneamento básico.

Os índices de doenças têm forte ligação com o nível do serviço público de saneamento básico. Pensar uma política para diminuir as doenças e para promover a saúde pública, perpassa, indubitavelmente, pelo estudo do acesso ao serviço de saneamento básico a toda população.

vii) Eficiência e sustentabilidade econômica e viii) Utilização de tecnologias apropriadas, considerando a capacidade de pagamento dos usuários e a adoção de soluções graduais e progressivas.

O princípio da eficiência e sustentabilidade econômica já está previsto no artigo 37 da Constituição Federal, aquele de forma expressa e, este último, como decorrência daquele. Com efeito, o serviço deve ser prestado de forma eficiente, levando em consideração o custo e o benefício envolvido.

(33)

O Administrador Público deve, ao estruturar o serviço de saneamento básico, atentar para a sustentabilidade econômica do projeto, sem se descurar do princípio da universalidade e integralidade.

ix) Transparência das ações

O princípio da transparência das ações consiste no próprio princípio da publicidade, nos termos do art. 37, caput, da Constituição Federal, e enuncia que todos os atos atinentes à gestão do serviço público de saneamento básico sejam publicados, visando dar ciência a todos os cidadãos.

Por óbvio, não havia qualquer necessidade desta previsão na Lei, visto que o princípio da publicidade dos atos decorre da própria noção de Estado Democrático de Direito. No entanto, talvez seja interessante a redundância, já que em municípios menores muitos investimentos são realizados priorizando áreas nobres da cidade e se antes o gestor público tinha o dever de dar publicidade dos motivos que o fizeram escolher o local de maior investimento, consoante o mandamento constitucional, agora ele tem a obrigação legal.

Isso é de suma importância no real estado da justiça brasileira, na medida em que o Supremo Tribunal Federal não admite, em sede de recurso extraordinário, questionamentos quanto à violação da Constituição Federal, o que aconteceria se, em última instância, o usuário ajuizasse uma ação em face do poder público para conhecer os motivos da escolha administrativa. Agora, ao menos, há claramente um fundamento para se ajuizar o recurso especial no Superior Tribunal de Justiça.

Assim, em termos práticos não houve qualquer alteração do direito dos usuários em saber o motivo da alocação dos investimentos em saneamento básico, mas, em relação ao processo, pode-se afirmar que houve um determinado avanço.

x) Controle Social

Esse princípio decorre da própria noção de Estado Democrático de Direito e do fundamento da República Federativa do Brasil, estampado no parágrafo único do artigo 1°, que prevê: “todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

(34)

interposição da ação popular para anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio público, histórico e cultural (art. 5°, LXXIII); do direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder (art. 5º, XXXIV, a).

No entanto, ao prever este princípio, a Lei Nacional de Saneamento Básico descreveu, claramente, uma das formas de efetuar o controle social, como a obrigatoriedade do Poder Público em realizar audiência e consulta pública previamente à publicação do edital, nos casos de concessão, sob pena de nulidade do contrato (art. 11, inciso IV).

xi) Segurança, qualidade e regularidade

O serviço de saneamento básico deve observar a segurança do usuário, não podendo utilizar-se de produtos que não sejam tecnicamente reconhecidos e que possam, mesmo remotamente, causar algum tipo de dano ao cidadão. Na mesma linha, o serviço de saneamento básico deve ter qualidade assegurada.

Em relação à regularidade, Luiz Henrique Antunes Alochio defende, no nosso entender de forma correta, que

a lei não fala em ininterrupto, preferindo a expressão 'regularidade'. [...] a alusão à simples regularidade nos adverte de que a prestação do saneamento não nasce do nada; demanda algumas condições climáticas, demanda respeito ao ambiente e, mais do que isso, exige uma utilização responsável do consumidor [...] logo, o prestador de serviços não será responsabilizado se a 'continuidade' dos serviços não puder ser mantida por força de uma 'irregularidade' que não se deva ao próprio serviço ou seu prestador.22

xii) Integração com a gestão eficiente dos recursos hídricos

Como os recursos hídricos são afetados pelo resultado final do serviço de saneamento básico, a gestão e infraestrutura de ambos devem ser utilizadas de forma integrada, visando otimizar o serviço e não prejudicar os recursos hídricos, que cada vez mais são escassos.

22 Luiz Henrique Antunes Alochio. Direito do saneamento: introdução à Lei de Diretrizes Nacionais de

(35)

2. O CONTRATO DE CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA POTÁVEL E ESGOTAMENTO SANITÁRIO E SEU EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO

2.1. Noções de contrato administrativo de concessão comum de serviços públicos

O regime jurídico que disciplina o serviço público atribui sua titularidade ao Estado, sendo ela personalíssima e intransferível. Todavia, por força do disposto no artigo 175, da Constituição Federal, permite-se que a prestação do serviço público seja delegada, transitoriamente, por meio de contrato, para o particular.

Para tanto, é necessário, conforme dicção do citado dispositivo constitucional, que seja instaurado o competente processo licitatório, ao cabo do qual será selecionada a proposta mais vantajosa para delegação, ao particular, da prestação daquele serviço.

O resultado desse processo é a celebração do respectivo contrato administrativo de concessão de serviço público, que tem por objetivo principal transferir ao particular a prestação do serviço público, mas preservando nas mãos do Estado as competências de fiscalização e regulamentação.

Celso Antônio Bandeira de Mello, ao analisar o instituto da concessão, o define como uma relação jurídica complexa, sendo inadequada sua classificação como simples contrato.23 O debate é deveras instigante, no entanto, para o propósito deste

trabalho, adota-se a nomenclatura contrato administrativo para se tratar de contrato de concessão de serviço público, haja vista que esse é o tratamento conferido pela legislação pátria.

A adoção deste critério, inclusive, encontra fundamento histórico. Antes de ser sancionada a Lei Federal nº 8.987/95, a regulamentação dos contratos de concessão de serviço público era matéria afeta à Lei Federal nº 8.666/93, por meio das normas contidas no artigo 124. Note-se que esta norma menciona as concessões e permissões como “contratos”.

Com o advento da Lei Federal nº 8.987/95, a regulamentação da prestação de serviço público por particulares também foi tratada como espécie de contrato

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