• Nenhum resultado encontrado

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2019

Share "PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL"

Copied!
114
0
0

Texto

(1)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA

DE SÃO PAULO

MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL

MAIRA GOULARDINS GOMES

Família e Violência Doméstica contra Crianças e

Adolescentes: um desafio para a Política de Assistência Social

(2)

MAIRA GOULARDINS GOMES

Família e Violência Doméstica contra Crianças e

Adolescentes: um desafio para a Política de Assistência Social

(3)

MAIRA GOULARDINS GOMES

Família e Violência Doméstica contra Crianças e

Adolescentes: um desafio para a Política de Assistência

Social.

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Serviço Social, sob a orientação da Profa. Dra. Marta Silva Campos

(4)
(5)

AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, José Roberto e Rosa Maria, à minha irmã, Marília, e ao meu namorado, Luciano, pelo apoio incondicional e por TUDO que fazem por mim todos os dias.

À minha Tia Vera, amiga e parceira da minha construção pessoal e profissional.

Aos meus amigos, tanto os de perto quanto os de perto do coração, que tanto me incentivam para buscar meus sonhos.

Às minhas colegas do CREAS de São João da Boa Vista – SP, parceiras de todas as horas e guerreiras na luta contra a violência e a favor da construção de uma cultura de paz para todas as famílias.

Aos colegas do Conselho Tutelar de São João da Boa Vista – SP, por partilharem da mesma batalha diária, para que crianças e adolescentes tenham uma vida sem violência.

À CAPES, que me proporcionou a realização do sonho de cursar e concluir meu Mestrado.

Às amigas do Programa de Pós Graduação em Serviço Social: Aline Lima, Amanda Machado dos Santos, Edna Lima e Nina Garcia. Obrigada pela parceria nesta fase da minha caminhada!

Aos professores do Programa de Pós Graduação em Serviço Social, pela alegria do convívio, do aprendizado, da discussão e do conhecimento crítico. Adorei ter aulas com os autores que conheci durante minha formação e minha trajetória profissional. Isso não tem preço!

Aos professores que participaram de meu Exame de Qualificação: Ademir Alves da Silva e Viviane Guerra. Possibilitaram-me novas ideias e discussões pertinentes a respeito da temática em pauta.

(6)

“Onde reina a violência, o único recurso é a violência. Onde vivem os homens, o auxílio só pode vir dos homens”.

(7)

RESUMO

GOMES, Maira Goulardins. Família e Violência Doméstica Contra Crianças e Adolescentes: um desafio para Política de Assistência Social. 2013.

A VDCA é uma realidade presente em nosso país e, para seu enfrentamento, necessitamos de ações interdisciplinares e intersetoriais, objetivando o rompimento do ciclo perverso intergeracional perpetuado por ela. O SUAS, através da Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais, propõe um serviço que tem como público alvo situações de violação de direitos e abarca, entre sua demanda, a VDCA: o PAEFI. Partimos da hipótese de que a Política de Assistência Social sozinha não dará conta da complexidade do fenômeno em pauta. Para verificá-la, estabelecemos como objetivo geral analisar a operacionalização do PAEFI no atendimento às famílias nas quais existe a problemática da VDCA, no município de São João da Boa Vista – SP. Para a realização da referida análise, apropriamos-nos dos seguintes objetivos específicos: identificar o papel que a família ocupa nos dias atuais dentro da Política de Assistência Social, através de um pequeno resgate histórico; definir a VDCA, apresentando suas modalidades, sintomatologia, características familiares e consequências; analisar a estrutura, o processo de trabalho e o produto das ações realizadas pelo PAEFI, em termos de eficiência e eficácia. O processo teórico-metodológico foi construído baseado em um resgate histórico da perspectiva da família, considerando também a contextualização da VDCA e das políticas públicas de atendimento a este fenômeno. A pesquisa foi realizada no CREAS de São João da Boa Vista, com as famílias atendidas no ano de 2011, que vivenciaram situações de violação de direitos, através da ocorrência da VDCA, através da análise de dados coletados e também de observações realizadas no acompanhamento direto da implantação e contexto do PAEFI. O estudo aponta que o serviço previsto para atendimento da problemática da VDCA, enquanto Política de Assistência Social, sozinho, não é capaz de romper o referido fenômeno e que o serviço PAEFI, da maneira como é atualmente executado, não está sendo efetivo e eficaz no alcance de seus objetivos. A partir dos dados coletados, podemos perceber que o serviço PAEFI é executado com recursos humanos insuficientes e não capacitados. O público alvo não está bem definido na prática e as notificações não atendem nem à maioria das vítimas de VDCA. Não existe nenhum tipo de ação preventiva e sensibilização da rede socioassistencial e da população quanto a esta problemática. A qualidade dos registros deixa a desejar, não existe planejamento das ações, o período de acompanhamento é insuficiente segundo a literatura, a adesão não é atingida em todos os seus níveis, embora a metodologia de trabalho proposta pelo PAEFI deste município consiga ser seguida, na maioria das situações. As famílias acompanhadas continuam vitimizando suas crianças e/ou adolescentes, mesmo frequentando o PAEFI; poucas apresentam mudanças em seu padrão de relacionamento e aprendizagem de conteúdos referentes à violência, o que mostra que o serviço não está sendo efetivo.

(8)

ABSTRACT

GOMES, Maira Goulardins. Family and Domestic Violence Against Children and Adolescents: a Challenge for Social Policy. 2013.

The VDCA- Domestic Violence against Children and Adolescents - is a present reality in our country and for its resolution, we need interdisciplinary and intersectoral actions, aiming to break the intergenerational vicious cycle perpetuated by it. The SUAS – Unified Social Assistance System - por extenso, through the National Typification Services Sócioassistenciais proposes a service's target audience situations of violation of rights and includes among its demand, VDCA: the PAEFI - Protection Service and Specialized Care to Families and Individuals. The assumption is that the Social Assistance Policy alone will not account for the complexity of the phenomenon in question. To check it out, set aimed at analyzing the operationalization of PAEFI in caring for families in which there is the problem of VDCA, in the city of São João da Boa Vista – São Paulo, Brazil. To make such analysis, we appropriate the following specific objectives: to identify the role that the family occupies today within the Social Assistance Policy, through a short historical review; define VDCA presenting its modalities, symptomatology and family characteristics consequences; analyze the structure, working process and the product of actions taken by PAEFI in terms of effectiveness and efficiency. The theoretical and methodological process was built based on a historical perspective of the family, also considering the context of public policy and VDCA service to this phenomenon. The survey was conducted in CREAS - Reference Center Specialized Social Assistance – located in São João da Boa Vista, the families met in 2012, who experienced rights violations through the occurrence of VDCA, by analyzing collected data and also by observations made in direct monitoring of and deployment of context PAEFI. The study indicates that the services provided to meet the problem of VDCA within Social Assistance Policy alone can’t break the above phenomenon and the service PAEFI, the way has been executed, didn´t proved to be effective and efficient in order to achieve its objectives.. From the data collected, we can see that the service PAEFI runs with insufficient human resources and not trained. The targeted audience is not well defined in practice and notifications do not meet even the most victims of VDCA. There is no type of preventive action and awareness of the social assistance network and the public regarding this issue. The quality of the records is weak, there is no action planning, follow-up period is insufficient according to the literature, compliance is not achieved at all levels, although work methodology proposed by PAEFI in this city can be followed in most situations. Even attending the PAEFI and with the professional follow-up, families continue victimizing their children and / or adolescents: few changes in their present relationship pattern and learning content related to violence, shows that the service is not being effective.

(9)

LISTA DE GRÁFICOS

(10)

LISTA DE TABELAS

TABELA 1 – Tipo de direito violado e sua distribuição por gênero (Sipia) ... 37

TABELA 2 - Modalidade de VDCA - Incidência Pesquisada – Brasil... 38

TABELA 3 - Porte dos municípios e capacidade de atendimento ... 66

TABELA 4 - Composição da equipe técnica ... 67

TABELA 5 – Tipo de Violência atendida pelo PAEFI, no ano de 2011 ... 81

TABELA 6 - Faixa Etária e Sexo das vítimas de Violência Intrafamiliar atendidas pelo PAEFI, no ano de 2011... 83

TABELA 7 - Faixa Etária e Sexo das vítimas de Violência Intrafamiliar atendidas pelo PAEFI, no ano de 2011... 84

TABELA 8 - Autores de Violência Intrafamiliar atendida pelo PAEFI, no ano de 2011 ... 85

TABELA 9 Equipe Técnica que executou o PAEFI, durante o ano de 2011, no CREAS lócus da pesquisa ... 86

TABELA 10 - Equipe de Referência do CREAS, de acordo com o porte do município, segundo o MDS ... 87

TABELA 11 Famílias e vítimas de Violência Física encaminhadas ao PAEFI, no ano de 2011 – adesão e não adesão ... 89

(11)

LISTA DE SIGLAS

ABTH Associação Brasileira Terra dos Homens

ABRAPIA Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção a Infância e Adolescência APAE Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais

CPI Comissão Parlamentar de Inquérito

CRAS Centro de Referência da Assistência Social

CREAS Centro de Referência Especializado da Assistência Social ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

LACRI Laboratório da Criança, Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo LOAS Lei Orgânica da Assistência Social

MDS Ministério do Desenvolvimento Social

MPAS Ministério de Previdência e Assistência Social

OMS Organização Mundial de Saúde

ONG Organização não governamental

PAEFI Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos

PAF Plano de Atendimento Familiar

PBF Programa Bolsa Família

PETI Programa de Enfrentamento do Trabalho Infantil PNAS Política Nacional de Assistência Social

SAGI Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação

SEADE Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados e Estatísticas SEAS Secretária de Assistência Social

SGD Sistema de Garantia de Direitos - formado pelas Delegacias, Conselhos Tutelares, Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e Centros de Defesa

SIPIA Sistema de Informação para Infância e Adolescência, da Secretaria de Direitos Humanos do Governo Federal

SUAS Sistema Único da Assistência Social UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância

(12)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 14

1 FAMÍLIA: ONTEM, HOJE E SEMPRE? ... 18

1.1 Família: síntese de sua construção histórica ... 18

1.1.1 Origens e mudanças remotas... 18

1.2 Família: Transformações recentes ... 23

1.3 Família e Política de Assistência Social: qual o foco ... 29

2 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES: UMA REALIDADE SEM RETOQUES ... 36

2.1 Modalidades, sintomatologia, características familiares e consequências ... 40

2.1.1 Violência Sexual ... 41

2.1.2 Violência Física ... 43

2.1.3 Violência Psicológica ... 46

2.1.4 Violência Presencial ... 48

2.1.5 Violência Fatal ... 49

2.1.6 Negligência ... 49

2.2 Violência Física: educa-se através da violência? ... 51

2.3 Intervenção profissional em situações de VDCA: qual é o caminho possível? ... 58

3 O ATENDIMENTO À QUESTÃO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO BRASIL ... 61

3.1 Iniciando o trabalho: primeiras formas de institucionalização do atendimento à Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes ... 61

3.2 Vinculação à Política Nacional de Assistência Social e atenção gradativa a projetos e programas de atendimento a VDCA ... 64

3.2.1 CREAS: a “casa” – lugar em que o atendimento à VDCA deve acontecer ... 64

3.2.2 Relações entre o CREAS e os Programas e Diretrizes Específicos de Atendimento a Crianças e Adolescentes Vítimas de VDCA: antes do PAEFI ... 68

3.3 O PAEFI: previsão de funcionamento e possibilidades de atendimento às situações de violação de direitos em todo o território nacional ... 70

3.3.1 Caracterização geral ... 70

(13)

3.4 O PAEFI real: conhecendo e analisando o serviço desenvolvido pelo CREAS de São

João da Boa Vista – SP ... 75

3.5 Respostas da Pesquisa-Base para a Análise do Trabalho realizado, no âmbito da VDCA, pelo CREAS lócus da pesquisa: estamos alcançando o resultado esperado? ... 79

3.5.1 Metodologia utilizada ... 79

3.5.2 A pesquisa: achados e análise ... 81

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 102

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 105

(14)

INTRODUÇÃO

O interesse pelo estudo da problemática da Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes surgiu nesta pesquisadora, desde a época da faculdade, mas cresceu a partir de 2005, quando iniciei minha trajetória profissional, no Programa Sentinela em São João da Boa Vista – SP, onde trabalhamos por um ano e seis meses.

Em 2009, com a implantação, no município, do Centro de Referência Especializado da Assistência Social, fui a assistente social escolhida para trabalhar nesse equipamento, tornando-me responsável pela execução dos serviços socioassistenciais previstos na Proteção Social Especial de Média Complexidade.

Inicialmente, o CREAS atendia a crianças e adolescentes vítimas de abuso e exploração sexual e suas famílias. Com a implantação do PAEFI, em novembro de 2010, ampliou-se o atendimento a todos os tipos de VDCA: física, sexual, psicológica e negligência.

O PAEFI prevê o trabalho com as crianças e adolescentes vítimas e suas famílias, objetivando o rompimento do ciclo da violência e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, através de acompanhamento familiar.

Considerando minha prática profissional, percebo que o PAEFI trabalha cotidianamente com situações de VDCA, ocorridas no presente ou no passado. Crianças e adolescentes, com sintomas e consequências de situações específicas, que envolvem: risco de revitimização e morte, questões familiares peculiares e que necessitam de ações efetivas e eficazes que possibilitem o rompimento do ciclo intergeracional da violência e a construção de novos padrões de relacionamento familiar, voltados para o fortalecimento de laços e vínculos, proteção e cuidado entre todos os seus membros. Criamos estratégias e buscamos aplicá-las, avaliá-las e recriá-las a partir da prática.

As famílias acompanhadas apresentam dificuldades de adesão ao serviço e também de seguimento das orientações técnicas, pois as situações de violência estão fortemente enraizadas no próprio núcleo familiar. Romper com as mesmas significa desconstruir dinâmicas instaladas e existentes há muitas gerações, significa romper com uma “cultura familiar”.

(15)

Nathálias, que se apresentam com seus direitos violados e que não têm sua situação solucionada, pois as ações direcionadas nem sempre alcançam os resultados esperados.

São quebra-cabeças com partes perdidas que, muitas vezes, não serão encontradas. Avaliando minha prática profissional, percebo que o serviço PAEFI é executado com diversas limitações, prejudicando o alcance de suas finalidades.

A equipe interdisciplinar é incompleta e reduzida, o que prejudica o acompanhamento sistemático das famílias atendidas e a maioria dos técnicos não tem acesso à capacitação profissional referente à problemática da VDCA, comprometendo o pleno entendimento da complexidade do fenômeno. Além das questões referentes a recursos humanos e ao conhecimento teórico dos processos de trabalho, o alto índice de demanda também cria obstáculos à eficácia das ações desenvolvidas.

Considero, ainda, a dificuldade das famílias em usufruir do serviço oferecido. As que são encaminhadas, seja pelo SGD, por outros serviços pertencentes a outras políticas públicas (Saúde, Educação, entre outras) e/ou por procura espontânea, muitas vezes, não conseguem vislumbrar a necessidade do acompanhamento oferecido. Até mesmo boicotam todas as ações direcionadas a elas, não seguindo orientações, faltando aos atendimentos agendados, não permitindo visitas domiciliares e até não aderindo ao próprio PAEFI.

A teoria me coloca que a VDCA traz muitas consequências para a vida de suas vítimas e que uma das alternativas para romper seu ciclo perverso e estabelecer novos padrões de relacionamento familiar é através do desenvolvimento de ações interdisciplinares e intersetoriais, sistemáticas e continuadas.

Na prática profissional, surgem inquietações que me questionam: o trabalho realizado pelo PAEFI pode romper o ciclo da violência nas famílias? A política de Assistência Social com seus equipamentos é suficiente para o atendimento das famílias nas quais existe a problemática da VDCA? Quais são as ações direcionadas às famílias em que a VDCA acontece? E a eficiência e a eficácia?

Considerando esta realidade, delimitei, como objetivo geral, analisar a operacionalização do PAEFI no atendimento às famílias nas quais existe a problemática da VDCA, no município de São João da Boa Vista – SP.

(16)

estrutura, o processo de trabalho e o produto das ações realizadas pelo PAEFI, em termos de eficiência e eficácia.

Como universo da pesquisa, tomei o CREAS de São João da Boa Vista – SP, que executa o serviço PAEFI. Trabalhei com os dados referentes às sessenta e duas famílias, com vitimização no âmbito da VDCA, atendidas no ano de 2011, identificando as modalidades notificadas, por sexo e faixa etária das vítimas. Tracei, também, o perfil dos autores, por sexo e modalidade praticada. A análise do serviço prestado foi realizada tanto a partir da caracterização da estrutura institucional disponível e do conhecimento do processo de trabalho adotado, como da visualização do produto das ações, frente à natureza das demandas. A ponderação foi feita mediante indicadores estabelecidos de seu grau de resolutividade.

Para apresentar os elementos teóricos e empíricos essenciais ao desenvolvimento da análise e aprofundamento do tema, o texto está dividido em quatro partes básicas.

No primeiro capítulo, destinado aos estudos da família, assumo uma perspectiva histórica, tratando da análise sobre seu surgimento e estabelecimento ao longo dos tempos até os dias atuais. Daí derivo as questões referentes aos primeiros modelos familiares, à forma como a criança passou a fazer parte da família, ao surgimento de modelos teóricos e diferentes concepções atuais sobre a mesma, que são aspectos essenciais, para compreensão da situação e das possibilidades atuais de trabalho com famílias.

Abordo, paralelamente, as formas como a Política de Assistência Social focaliza a família na atualidade e quais as consequências da visão, hoje dominante, em relação aos serviços propostos como básicos para o atendimento da demanda de proteção social pública em geral.

No segundo capítulo, estudo a VDCA, apresentando, com base na revisão bibliográfica disponível, suas modalidades, sintomatologias apresentadas, características familiares e consequências. Trabalho, ainda, a questão da aceitação da violência física como forma de educar e a necessidade de intervenção profissional para que o ciclo violento seja rompido.

(17)

de elaboração desta Dissertação, como das observações realizadas no acompanhamento direto de sua implantação e contexto.

Enfim, o mais importante metodologicamente é dizer de onde falo. A partir da execução do PAEFI. De dentro, da linha de frente.

Lido com a dúvida e a insegurança profissional, que vem com a ausência de uma política de capacitação técnico-operativa: a básica, a especial e a continuada. E que faz mais falta quando se opera e se decide num serviço novo, integrante de um sistema recente, em plena construção de seus padrões.

Trabalho cotidianamente com famílias que vivenciam os vários tipos de violência e visualizo as carências existentes nas políticas públicas que prejudicam o alcance de objetivos estabelecidos. Tento equilibrar extremos: alto índice de demanda e necessidade emergente de acompanhamentos sistemáticos. Luto diariamente para “reconstruir” direitos.

Conheço o que é previsto pela normatização, como ela realmente se estabeleceu na prática; sigo suas mudanças e imagino outras, sem muito pessimismo, mas em caráter de urgência.

Apresento, portanto, neste estudo, os conhecimentos que utilizo para embasar minha prática profissional e o resultado da pesquisa realizada, porque acredito que, quanto mais os profissionais estiverem capacitados, os serviços preparados e o SUAS fortalecido, mais crianças e adolescentes conseguirão viver em lares com formas de relacionamento diferentes daquelas que permitem sua vitimização constante.

(18)

1 FAMÍLIA: ONTEM, HOJE E SEMPRE?

1.1 Família: síntese de sua construção histórica

Estamos no século XXI, no ano de 2013.

Para aprofundar a compreensão da temática da família, entretanto, é necessário recuar no tempo. Deparamos-nos com diversas opiniões, algumas de teóricos, e outras do próprio senso comum, defendendo a ideia de que a família deixou de existir ou, então que ela, para se manter, deve sempre buscar o enquadramento em um modelo: o nuclear burguês (formado por pai, mãe e filhos), considerado ideal para formação de indivíduos saudáveis.

1.1.1 Origens e mudanças remotas

Para realização deste estudo, trabalhamos com autores que realizam um resgate histórico do surgimento da família.

Segundo Therborn (2006), devemos considerar que ela é a instituição social mais antiga e mais disseminada de todas.

Engels (2010) que, em livro publicado em 1884, ocupou-se de seu “surgimento” e de sua evolução, relacionada à origem da propriedade privada e do Estado, traz que ela se organizou a partir de um modelo bastante divergente da família nuclear.

Até 1860, a história da família era contada a partir da religião, que considerava o patriarcalismo sua forma de organização mais antiga. Essa história tinha influência romana, visto que foram eles os inventores da denominação família, para definir um grupo de pessoas em que o homem dominava a mulher, os filhos e os escravos, tendo poder de vida e de morte sobre todos eles.

(19)

maternidade, pois as mulheres se relacionavam com parceiros diversos. Existiam três estados de “relacionamento”: a poligamia, a poliandria e a monogamia. Os estados se modificam à medida que o homem aprimora sua relação com a produção material.

Ele relata, ainda, que a família se desenvolveu ao longo de três períodos históricos: 1) selvagem, em que o homem coletava o que está pronto na natureza para seu sustento); 2) barbárie, a partir do começo da prática da agricultura e da pecuária, com aumento da produção e do trabalho humano e 3) civilização, caracterizada pela introdução da escrita, da fundição, da complexificação do trabalho humano, da indústria e da arte.

Correspondendo a estes três períodos, desenvolveram-se os modelos familiares: família consanguínea: relaciona-se entre si, não ocorrendo incesto entre pais e filhos; família panaluana: irmãos não podem mais relacionar-se sexualmente, estabelece-se a relação de parentesco entre sobrinhos e primos, os matrimônios são realizados por grupos, surgem as gens, o parentesco continua determinado pela linhagem materna e começam a surgir as proibições em relação ao casamento consanguíneo, devido ao estabelecimento da ordem social e religiosa; família sindiásmica: inicia-se o matrimônio por pares, a fidelidade é cobra-da somente cobra-da mulher, o parentesco continua determinado pela linhagem materna e já existe a divisão sexual do trabalho como primeira forma dessa divisão. Com a união de homens e mulheres como casais, é ressaltada a figura do pai e o surgimento de riquezas pertencentes à família.

As mudanças introduzidas pela família sindiásmica possibilitaram o surgimento da família monogâmica, que é, segundo Engels, característica da civilização: a mulher e os filhos passam a ser propriedade do homem, que deve acumular cada vez mais bens e riquezas (força de trabalho, meios de produção, escravos etc). A monogamia tem como objetivos o domínio do homem na família e a procriação de filhos cuja paternidade seja indiscutível, para herdar os bens e as riquezas adquiridos. Inicia-se um novo período, caracterizado pela união de um casal com filhos, que passam a ter seu parentesco identificado através da linhagem paterna.

(20)

A primeira divisão do trabalho é a que se fez entre o homem e a mulher para a procriação dos filhos... O primeiro antagonismo de classes que apareceu na história coincide como desenvolvimento do antagonismo entre homem e mulher na monogamia; e a primeira opressão de classes, com a opressão do sexo feminino pelo masculino. A monogamia foi um grande progresso histórico, mas, ao mesmo tempo, iniciou, juntamente com a escravidão e as riquezas privadas, aquele período, que dura até nossos dias, no qual cada progresso é simultaneamente um retrocesso relativo, e o bem-estar e o desenvolvimento de uns se verificam às custas da dor e da repressão de outros. É a forma celular da sociedade civilizada... (ENGELS, 2011, p.87)

A monogamia não é fruto de amor ou de dedicação familiar, mas sim de condições econômicas que objetivam a concentração e a transmissão de riquezas para membros das mesmas famílias: o homem domina a mulher e a família individual é vista como unidade econômica da sociedade (ENGELS, 2011, p. 221). Ela, juntamente com a produção mercantil, a divisão social do trabalho e as trocas entre os indivíduos, vem marcar o pleno desenvolvimento da civilização.

Engels (2011) assinala que a evolução das organizações familiares acompanhou a evolução da economia, que caminhou de uma economia doméstica praticada de modo comunista (propriedade comum fruto de trabalho pessoal e coletivo) para a propriedade privada dos meios de produção (riquezas distribuídas nas mãos de poucos).

A presença essencial da monogamia, no modelo detectado por Engels (2011), será retomada por Ariès (2011) em 1981, em perspectiva teórica distante do autor, introduzindo uma discussão de bastante interesse para este trabalho: o lugar da criança na família.

Diz ele que, com o estabelecimento da monogamia como nova forma de relacionamento familiar, entre os séculos XV e XVIII, inicia-se para a família um movimento de assumir-se como “lugar afetivo” e modificar suas relações internas com a criança, processo esse que irá finalizar-se entre o fim do século XVIII e início do século XIX.

O autor escreve, com base na situação da França, e afirma que tais mudanças ocorreram de maneira profunda, embora tenham se instalado lentamente.

Até o século XV, crianças, a partir de sete anos, eram entregues por seus pais a outras famílias, pois lá aprendiam tudo o que era necessário para viver. Esse fenômeno era comum a todas as classes sociais, pois os pais, segundo o autor, acreditavam que seriam mais bem servidos pelas crianças de outra família, que não a sua.

(21)

adquirida através do serviço doméstico, consistia em conhecimentos, experiências e valores morais, referentes à vida cotidiana e direcionados a todas as crianças, que eram partícipes do mundo dos adultos.

De modo geral, a transmissão dos conhecimentos de uma geração a outra era garantida pela participação familiar das crianças na vida dos adultos... As cenas cotidianas constantemente reuniam crianças e adultos ocupados em seus ofícios... Em toda a parte onde se jogava ou brincava, mesmo nas tavernas mal-afamadas, as crianças se misturavam aos adultos. Dessa maneira elas aprendiam a viver, através do contato de cada dia (ARIÉS, 2011, p. 230-231).

Dentro da linha de análise do autor, a família, anteriormente ao século XV, tinha um caráter social e moral, e não se preocupava com o estabelecimento de vínculos afetivos. Os filhos que saíam para a aprendizagem nem sempre retornavam para a família, mas eram importantes, pois os pais consideravam que estes fariam algo pelo bem comum da sociedade (ARIÉS, 2011, p. 231).

A partir do século XV, a aprendizagem, através do contato cotidiano, passa a ser substituída pela inclusão escolar, como uma tentativa de afastar as crianças do mundo adulto, com o objetivo de preservar as características peculiares desta fase de desenvolvimento e como uma preocupação dos pais, buscando estabelecer contatos mais próximos com seus filhos. Assim, a família aproxima-se e concentra-se em torno da criança, surgindo o sentimento de família e o sentimento da infância.

No século XVII, com a responsabilização dos pais pela educação e proximidade com os filhos, inicia-se o estabelecimento de vínculos afetivos entre os membros do grupo familiar, o que possibilita a organização dos pais para ter os filhos cada vez mais próximos.

Esse fenômeno comprova uma transformação considerável da família: esta se concentrou na criança, e sua vida confundiu-se com as relações cada vez mais sentimentais dos pais e dos filhos. Não será surpresa para nós descobrir que esse fenômeno situa-se no mesmo período em que vimos emergir e desenvolver uma iconografia da família em torno do casal e das crianças (ARIÉS, 2011, p. 233).

Cabe ressaltar que a escolarização não atingiu imediatamente a todas as famílias, cujas crianças continuaram a ser educadas segundo a antiga prática da aprendizagem. A maioria das meninas era educada em casa e os meninos, se fossem de classe média, iam para escola; se fossem da nobreza ou artesãos, eram educados conforme as antigas práticas de aprendizagem.

(22)

civilização moderna, de base escolar, que se institui e se consolida a partir da escolarização dos indivíduos.

As mudanças vislumbradas na família trazem novos desafios, entre eles, a questão da predileção pelo filho mais velho ou pelo escolhido, objetivando a transmissão e preservação do patrimônio familiar. Essa situação perdurou até o final do século XVIII, quando por conta da instauração de um novo código civil e de uma mudança nos padrões morais da sociedade, estabeleceram-se direitos iguais entre todos os filhos.

Outro fato importante na sinalização da vinculação afetiva dos pais para com os filhos, foi a passagem dos bebês para a residência dos pais. Os recém-nascidos eram entregues, primeiramente, para cuidados de amas de leite, a fim de serem amamentados. Esta entrega ocasionava alto índice de mortalidade infantil, pois a higiene e os cuidados dispensados aos bebês eram bastante precarizados. Em meados do século XVIII, os bebês continuavam sendo amamentados pelas amas, mas permaneciam residindo com seus familiares, o que sinalizava mudanças na qualidade dos vínculos (ARIÉS, 2011).

Com a difusão da medicina, nas últimas décadas do século XVIII, surgiu a preocupação dos médicos pelos cuidados com a primeira infância, devido ao alto índice de mortes. A partir daí, publicações, guias e dicionários sobre como cuidar dos bebês, continham orientações, inclusive, relacionadas à higiene, objetivando orientar as famílias. A doutrina médica e os conselhos educativos possibilitaram a alimentação dos bebês por leite animal, o que permitiu a vigência dos cuidados familiares, ocasionando o término da prática das amas de leite (DONZELOT, 1980).

A família também se modifica no sentido de que, primeiramente, as relações estabelecidas na casa eram todas públicas, sem nenhuma intimidade para os membros do grupo familiar. Não existia separação entre a vida profissional, privada e social. Tudo acontecia no coletivo, na vida em sociedade: vivia-se em salas, lugar em que tudo se realizava.

No século XVIII, a família começou a se separar da sociedade e a limitar a casa como um espaço de vida particular, passando a ter os cômodos diferenciados (quarto, sala, cozinha, banheiro etc.) e possibilitando o surgimento da intimidade, da discrição e o estabelecimento do isolamento do grupo familiar.

(23)

1.2 Família: Transformações recentes

As modificações que possibilitaram o surgimento da família moderna, a partir da medieval e da predominante no século XVII, não atingiram todas as camadas sociais concomitantemente. Foi um processo lento e gradual, que alcançou universalidade somente em meados do século XIX.

As revoluções políticas, sociais e econômicas, ocorridas a partir do século XVIII, possibilitaram a industrialização, o surgimento do Estado e a consolidação da burguesia.

Essas transformações ocasionam o êxodo rural na direção das cidades, com mudanças de parte da população para a cidade para trabalharem nas fábricas, modificando, assim, a forma de viver de toda sociedade.

A família que, primeiramente, vivia em agrupamentos, passa a tornar-se cada vez mais intimista, vivendo agora em pequenos grupos. Surge, assim, no século XIX, a família nuclear burguesa, formada por pai, mãe e filhos: o modelo ideal. Viver com poucos membros possibilitava maior mobilidade, o que era prioritário no sistema industrial.

Segundo Gueiros (2002), na segunda metade do século XIX, a modernização e o movimento feminista possibilitaram novas mudanças na família: o casamento por escolha dos parceiros, com base no amor romântico, com separação entre sexo e amor; questiona-se o patriarcalismo e modificam-se os papéis do homem e da mulher no casamento.

Apontando no mesmo sentido, Parsons (1980), na década de 1950, analisando a sociedade dos EUA, identifica uma família constituída por poucos membros e com relações mais distantes da família extensa, apresentando um processo de mudanças profundas: grande proporção de divórcios, mudanças na antiga moralidade e diminuição das taxas de natalidade. O autor coloca que nas sociedades primitivas havia grande influência e participação dos membros da família extensa no grupo familiar e que, atualmente, o Estado, as igrejas, as empresas, as universidades e as associações profissionais, têm exercido esta influência.

(24)

No modelo apresentado por Parsons (1980), a família é uma unidade solidária e a forma como estabelece seus vínculos, é influenciada pelo sistema ocupacional. As necessidades antes eram satisfeitas no grupo familiar, agora acontecem em outros canais, inclusive no mercado. O homem é o único membro que participa do sistema produtivo, que possui um papel ocupacional, acessando funções geradoras de posição e de renda para a família. A mulher possui funções no ambiente doméstico como esposa, mãe e administradora da casa.

O referido autor conceitua a família e seu funcionamento, a partir de uma conexão interrelacional, tendo esta como funções básicas: a socialização primária dos filhos e a estabilização das personalidades adultas de ambos os sexos.

Parsons (1980) apresenta uma família “especializada” a serviço do capital, com inserção social “rasa”, com funções pré-determinadas para homens e mulheres e como um modelo ideal a ser seguido. Ele reapresenta a família nuclear burguesa, como um modelo encontrado nos EUA, buscando generalizá-lo e normalizá-lo para os países do Ocidente capitalista, não considerando outros arranjos familiares já existentes como outras possibilidades de convivência em família.

Therborn (2006) coloca que, no século XX, a família apresentou mudanças em todo o mundo: a erosão do patriarcado, a instalação mundial do controle da natalidade, o declínio natural de algumas populações, o sexo e o casamento com novos “modelos”, influenciados pela revolução sexual e pela parceria informal.

O patriarcado, segundo Therborn (2006), tem uma história de declínio no século XX, influenciado por diversos fenômenos ocorridos em todo o mundo, entre eles, o avanço da tecnologia. A Declaração dos Direitos Humanos (1968) vem selar esse declínio, pois coloca fim aos poderes e privilégios especiais de pais e maridos, através da proclamação da igualdade de gênero, que ocasiona rupturas em todas as partes do planeta.

O casamento apresentou momentos de crescimento e outros, de declínio. Esse fenômeno foi, primeiramente, estimulado pela industrialização e pelo desenvolvimento econômico, que ocorreu em todo o mundo. Com as crises econômicas, ele apresentou momentos de declínio, chegando novamente a um alto patamar em alguns continentes do globo, após a nova estabilização do modelo econômico vigente.

(25)

Therborn (2006), comparando as 03 (três) variáveis tratadas aqui, encontra aspectos comuns: mudanças padronizadas pelo sistema familiar, ocorridas em tempos desiguais e não sincronizadas em ondas sistemáticas ocorridas em todo o globo. Concluindo que as mudanças familiares no século XX não foram evolucionárias nem unilineares.

Consideramos que o que diferencia a família que “vivenciamos” hoje é a não existência de um modelo ideal, como foi anteriormente, a família nuclear burguesa.

Embora a família continue sendo objeto de profundas idealizações, a realidade das mudanças em curso abalam de tal maneira o modelo idealizado que se torna difícil

sustentar a idéia de um modelo ‘adequando’. Não se sabe mais, de antemão, o que é

adequado ou inadequado relativamente à família...Enfim, a família contemporânea comporta uma enorme elasticidade (SARTI, 2005, p. 25).

Como resultado de diversas mudanças, convivemos, na atualidade, com uma multiplicidade de formas de convívio em grupo, envolvendo diversos membros, que se unem por laços de consanguinidade, de afeto, de convivência ou, até mesmo, de obrigações mútuas, e esta união é considerada família.

A família pode ser pensada como um grupo de pessoas que são unidas por laços de consanguinidade, de aliança e de afinidade. Esses laços são constituídos por representações práticas e relações que implicam obrigações mútuas. Por sua vez, estas obrigações são organizadas de acordo com a faixa etária, as relações de geração e de gênero, que definem o status da pessoa dentro do sistema de relações familiares (BRASIL, 2006, p. 24).

A família hoje “aceita” formar-se, reformar-se e reorganizar-se novamente, se esta situação for necessária. Trata-se de uma construção histórica, que muda ao longo do tempo, influenciada por questões sociais, econômicas, políticas, tecnológicas, jurídicas e culturais, e que não precisa seguir necessariamente um modelo. Surge uma enorme diversidade de arranjos familiares, gerando famílias sem modelos, nem tradicionalismos. Este rompimento com o modelo nuclear não significa o fim da família, mas que, mesmo com modificações, ela continua ocupando um lugar de destaque, visto que é o lócus potencialmente produtor de sociabilidades, de ligações afetivas, de relações de cuidado e de vivências cotidianas.

Entendemos por família a célula do organismo social que fundamenta uma sociedade. Locus nascendi das histórias pessoais, é a instância predominantemente

(26)

Convivemos com famílias que são diferentes, são dinâmicas, não seguem modelos préconcebidos e exercem suas funções de cuidado e socialização, independente de seu arranjo ou de seu formato. Elas possuem seus significados, suas crenças, seus mitos, suas regras, seus valores, suas obrigações, seus limites, seus direitos e seus papéis e continuam existindo, dentro de suas particularidades e de sua universalidade.

Considerando que a família se modifica e se influencia por aspectos socioculturais, econômicos e históricos, sabemos que, desde o seu surgimento, ela apresentou modificações em sua organização, em seu funcionamento, na divisão de papéis, nas relações de gênero, no lugar que os filhos ocupam e nas formas de vinculação entre seus membros.

Quanto ao Brasil, nas Constituições Federais, temos que a família, o Estado e a sociedade são os responsáveis pelo cuidado e bem estar de seus membros. A Constituição Federal de 1988 mantém esta focalização, reforçando que a família, considerada base da sociedade, deve ter proteção social do Estado. A lei a define como a comunidade formada pelos pais ou um deles e seus descendentes, sem necessidade de casamento e, ainda, considera o homem e a mulher com os mesmos direitos e deveres e todos os filhos iguais, sendo eles biológicos ou adotivos, conforme art. 5º e 226º a 230º da citada Constituição (BRASIL, 1988).

Fonseca (2004), comentando as dificuldades culturais relacionadas à acelerada transição da família, especialmente a partir dos anos da década de 1960, afirma que as pessoas cujas famílias se diferenciavam do modelo tido como ideal, eram vitimizadas através de julgamentos morais, que as consideravam ineficazes por serem diferentes, no limite, incompetentes. Tal modelo era considerado inerente à raça humana e necessário para o desenvolvimento sadio de toda e qualquer pessoa.

Atualmente, observa-se, em certos setores da sociedade, o discurso da família como algo que se encontra em “grande desordem”, pois passou por mudanças que a levaram à fragmentação em diversos arranjos familiares, diferentes do modelo anteriormente considerado ideal: a família nuclear burguesa. Cabe, entretanto, considerar que os referidos arranjos familiares devem ser respeitados e reconhecidos como potencialmente capazes de cuidar, proteger e socializar seus membros, pois a família é capaz de cumprir suas “funções” independentemente da forma como se organiza.

(27)

pessoas do mesmo sexo, famílias monoparentais, adoção por homossexuais e constantes rompimentos de laços conjugais.

A família está em constante transformação e evolução a partir da relação recíproca de influências e trocas que estabelece com o contexto. As mudanças nas configurações familiares estão diretamente relacionadas ao avanço científico e tecnológico bem como às alterações vividas no contexto político, jurídico, econômico, cultural e social no qual a família está inserida (BRASIL, 2006, p. 29).

Tais mudanças não ocorreram de forma linear, igualitária, massiva e homogênea, em todos os espaços do planeta, por isso não podemos deixar de considerar a historicidade, a temporalidade e a cultura, como componentes essenciais. Consideramos que a família é uma construção social, histórica e cultural, e tais aspectos influenciam em sua diversidade, criando muitas variações decorrentes da cultura, da religião, das classes sociais, dos valores, das normas, da economia e das condições de vida (sociais, emocionais, econômicas, territoriais etc).

Na verdade, família é uma construção sócio-cultural que se transforma, agregando elementos novos, que se libera de outros e que altera no tempo e no espaço os seus modelos e atitudes, fatores que contribuem para o que se chama de definições de família (TERRA DOS HOMENS, 2002, p. 06).

Podemos perceber que a família, na contemporaneidade, vem se libertando de tradições históricas e culturais, como o modelo nuclear e está se desenvolvendo de maneira mais espontânea, tendo, como marca disto, a diversidade na composição dos grupos familiares.

A família, hoje, possui uma gama inesgotável de variações e defini-la pode levar ao erro de excluir outras formas de organização familiar existentes. Família hoje é diversidade, são famílias.

A família é o espaço indispensável para a garantia da sobrevivência e da proteção integral dos filhos e demais membros, independentemente do arranjo familiar ou da forma como vem se estruturando. É a família que propicia os aportes afetivos e, sobretudo, materiais necessários ao desenvolvimento e bem estar dos seus componentes. Ela desempenha um papel decisivo na educação formal e informal, é onde se aprofundam os laços de solidariedade. É também em seu interior que se constroem as marcas entre as gerações e são observados valores culturais (GOMES e PEREIRA, 2005, p. 32).

(28)

matriz do processo civilizatório. É a influência mais poderosa para o desenvolvimento da personalidade e do caráter das pessoas (SZYMANSKI, 2000).

A partir da convivência cotidiana, a família estabelece seus vínculos e compartilha um modo de vida. A aceitação dentro do grupo familiar se faz importante para que seus membros, depois, possam pertencer a outros grupos.

As mudanças já identificadas e apontadas por Therborn (2006), em termos mundiais, para a família contemporânea, vêm, entretanto, ocorrendo também no Brasil. Segundo dados do Censo 2000, sua estrutura e composição estão se diferenciando: o país apresenta crescimento no número de divórcios, diminuição dos índices de casamentos formais, redução do número de filhos que passam a ser gerados a partir do desejo de tê-los, aumento das famílias monoparentais e, também, dos conflitos intergeracionais.

Do ponto de vista que interessa a este trabalho, é indispensável ressaltar que, apesar dessas transformações, no Brasil, a família continua mantendo sua forte responsabilidade de cuidado, de proteção e de socialização de seus membros.

Podemos dizer que, na realidade, a família vem sendo pressionada a aumentar sua atenção a essa tarefa, pois o Estado financia hoje apenas o que é mais necessário, deixando de disponibilizar recursos para implantação e funcionamento de serviços de cobertura universal na resposta às demandas da população. Serviços e benefícios passam a ser focalizados e privatizados, tornando-se responsabilidade da sociedade civil.

A partir do aumento da influência da política neoliberal, nos anos de 1990, a desresponsabilização do Estado, nesse sentido, foi crescente.

Na outra ponta, acentuou-se a cultura da responsabilização dos indivíduos e famílias por seu próprio bem-estar, proposta que se torna, entretanto, cada vez mais inviável com o impacto da competitividade capitalista sobre a sociabilidade geral. No âmbito público e privado, incluindo as próprias organizações familiares, o individualismo se instaura de forma a corroer os vínculos e a solidariedade do cuidado, enfatizando a independência e a realização individual.

(29)

1.3 Família e Política de Assistência Social : qual o foco?

As políticas públicas, a partir dos anos 1990, têm declarado adotar como foco o fortalecimento da família, descobrindo e desenvolvendo potencialidades individuais e coletivas, com o objetivo de que ela se responsabilize pelo que o Estado vem se desresponsabilizando (MIOTO et al, 2007).

A família contemporânea continua mantendo sua responsabilidade de cuidado, de proteção e de socialização de seus membros, mas, no Brasil, segundo dados do Censo 2000, vem se diferenciando: apresenta crescimento no número de divórcios, diminuição dos índices de casamentos formais, redução do número de filhos que passam a ser gerados a partir do desejo de tê-los, aumento das famílias monoparentais e, também, dos conflitos intergeracionais. Mudanças apontadas, também, por Therborn (2006), identificadas em todo o globo terrestre.

Segundo Campos (2012), dados recentes do Brasil (IBGE, CENSO-2010, in O ESTADO DE SÃO PAULO), confirmam o levantado no ano 2000: 55% dos domicílios compostos por casal com filhos, embora seja esta uma taxa em declínio, pois a cifra de 2000 foi de 63%. Cresceram, é verdade, situações que, no médio e longo prazo, farão provavelmente erodir essa taxa de casais com filhos por domicílio: a união consensual (sem formalização religiosa ou civil) cresceu de 28.6% do total em 2000, para 36,4%, majoritariamente declarada por pessoas “sem religião” e disseminando-se mais pelo território, sem vincular-se, como anteriormente, a estratos mais pobres. A queda de casados no civil e no religioso caiu de 49,4% a 42,9%. A mudança no número de divorciados no ano foi de 1,7% a 3.1% em 2010.

Em termos de agrupamentos por domicílio, registram-se, nos vinculados por parentesco, 16,3% dos casais com filhos, habitando com enteados, conformação que o IBGE denomina “famílias reconstituídas” 1.

Trabalhando na contagem da população por domicílios, o Instituto registra 15,4% deles (“8,3 milhões de famílias”2) com “mais de um núcleo e abrigando agregados”, que ele

1 É a primeira vez que o IBGE faz a contagem desagregada de enteados.

2 O Relatório trabalha com a ideia de “famílias secundárias”, que vivem como agregadas de uma “família

principal”. O arranjo é em parte devido à falta de renda, pois 1/5 das secundárias não a têm e também por certas

situações como as das filhas-mulheres com referência à família principal, solteiras ou separadas, com filhos;

também “por vontade própria”. O fato está sendo considerado sinal do grande déficit habitacional, em estudo

(30)

chama de “famílias conviventes” (distribuídas dentro do país, com vantagem na Região Norte, seguida da Nordeste). Dado em ascensão em relação a 2000, quando era de 13,9%.

Os resultados sobre a taxa de fecundidade são bastante eloquentes. Enquanto a média nacional, de 1,86 filhos por mulher, projetada em 2011, está abaixo da taxa de reposição da população, e indica, se mantida ou ultrapassada, a queda de crescimento geral a partir de 2030, os valores por faixas de renda apresentam muita variação: entre as mulheres em famílias com renda per capita de até ¼ do salário mínimo, têm 3,9 filhos em média. Em relação à instrução e renda da mãe, aquelas consideradas pobres e sem estudo, detêm taxas muito acima dos 2,1 calculados como necessários à reposição: são – podemos dizer - celeiro do crescimento vegetativo do país. No grupo das mulheres com curso superior, a média de filhos é mais baixa: 1,14. Elas também têm filhos mais tarde, entre os 30 e 34 anos, contra os 20 a 24 das mais pobres e com menor escolaridade. Não são as que sustentarão a queda populacional.

Constatamos, também, a influência da política neoliberal, que provoca mudanças nas organizações familiares, tanto em seu âmbito privado, quanto público: os membros do grupo familiar estão individualistas, buscando sua realização pessoal independente da relação vincular estabelecida; e o Estado, que tem a responsabilidade pela proteção social das famílias, vem se desresponsabilizando e responsabilizando os indivíduos e famílias por seu próprio bem estar.

O Estado, hoje, financia apenas o que é mais necessário, descuidando-se dos serviços universais que passam a ser focalizados, privatizados e de responsabilidade da sociedade civil. Neste quadro de transformações societárias na contemporaneidade, vivemos um momento de ausência de políticas de proteção social à população, principalmente direcionadas às camadas sociais de baixa renda, como resultado do retraimento do Estado, que cria alternativas privatistas para solucionar a questão (GUEIROS, 2002).

Para que a família seja responsável pela proteção social de seus membros, é indispensável que ela possa ser amparada e tenha garantia de suporte para cumprir com as funções que lhe são delegadas. É necessário que ela possa contar com políticas públicas suficientes que a auxiliem a ser protetiva, cuidadora e socializadora. As famílias precisam ser cuidadas para poderem cuidar:

(31)

assistência social, também encontrará condições propícias para bem desempenhar as suas funções afetivas e socializadora, bem como para compreender e superar suas possíveis vulnerabilidades (BRASIL, 2006, p. 27).

Percebemos, atualmente, que a complementariedade família – Estado, é cada vez mais tênue e que as famílias vêm sendo sobrecarregadas, pois não existem serviços suficientes oferecidos pelas políticas públicas para auxiliá-las no cumprimento de seu papel social e legal, de cuidado de todos os seus membros, independente do ciclo de vida.

Nesta análise, a política de assistência social brasileira oferecida pelo Estado, desde o seu surgimento e ao longo do século XX, sempre teve um caráter imediatista e sem recursos financeiros suficientes. Sua história é marcada por ações fragmentadas, que possuem alvos específicos e caráter meramente assistencialista. Eram práticas eventuais, pontuais, emergenciais e sem continuidade, marcadas pelo caráter pontual e de favor.

É apenas com a Constituição de 1988, que a Saúde, a Educação desde a pré-escola e a Assistência Social, adquirem mais claramente caráter de direito; nos dois primeiros citados, universal. A Assistência Social passa a integrar a Seguridade Social como política pública, junto à Saúde e à Previdência Social, compondo o sistema de proteção social brasileiro e tornando-se política social não contributiva, um direito a quem dela necessitar (TEIXEIRA, 2009).

Em 1990, foi instituído o ECA, que garante à criança e ao adolescente, em vários artigos, o acesso às políticas sociais. Em 1993, foi aprovada a LOAS, que prevê a universalização dos direitos sociais, de forma descentralizada e participativa, a fim de garantir a autonomia das esferas do governo, afirmando também a responsabilização do Estado com a proteção social às famílias, no sentido da garantia do atendimento às suas necessidades básicas. A LOAS vem fortalecer a inclusão da Assistência Social no campo dos direitos, como política pública de responsabilidade estatal (COUTO, YASBEK e SILVA E SILVA, 2010).

(32)

Cabe ressaltar que a família sempre esteve presente no cenário das políticas sociais. Os governos brasileiros, conforme cita PEREIRA (2010), sempre se beneficiaram da participação autonomizada e voluntarista da família na provisão do bem-estar de seus

membros e, conforme o ideário neoliberal que vem regendo nossa economia, a sociedade e a família devem partilhar, com o Estado, responsabilidades que antes pertenciam ao poder público. De acordo com as referidas orientações, o que vêm mudando são as exigências relacionadas à família, que passa a ser responsável pelo cuidado e proteção de seus membros. Esta mesma família vem passando por diversas modificações, ao longo dos anos, e necessita de cuidados múltiplos, para poder cuidar. “Para a família prevenir, proteger, promover e incluir seus membros é necessário em primeiro lugar, garantir condições de sustentabilidade para tal.” (TEIXEIRA, 2009, p. 259).

A responsabilização do Estado pela assistência e proteção à família, prevista na Constituição Federal e fortalecida no Estatuto da Criança e do Adolescente e na LOAS, ocorre contando com a participação da própria família em sua proteção. Com isso, o Estado se retrai e a garantia de direitos sociais, através de políticas públicas universais, fica comprometida. As políticas públicas passam a ser focalizadas em quem mais necessita e o mercado torna-se o responsável pela provisão de bem-estar (MIOTO, 2010).

A Política de Assistência Social se propõe a trabalhar com famílias em um foco “diferenciado”, utilizando-as como público privilegiado e parceiro da política, a partir de 1999, com a 1ª. Versão da PNAS, embora consideremos que a assistência social sempre contou com a família para desenvolver suas ações.

Considerando a conjuntura apresentada, após 10 anos de promulgação da LOAS, na IV Conferência Nacional de Assistência Social (Brasília – DF, 2003), foi apontada como decisão principal, a construção e implementação de um sistema único e descentralizado da assistência social, o SUAS, requisito essencial para dar efetividade à assistência social como política pública e materializar suas diretrizes.

A assistência social como política pública de direitos de cidadania e dever do Estado, (...) implica possibilidade de ampliar o alcance da cidadania e da proteção

social, para uma lógica contrária à contributiva, e à ‘cidadania regulada’, pela

(33)

Com o objetivo de construir o redesenho da política de assistência social na perspectiva do SUAS, foi reelaborada, em 2004, a PNAS, com contribuições do poder público e da sociedade civil. Ela busca a materialização do que está previsto na LOAS e na Constituição Federal de 1988: a assistência social como política pública, inserida no campo da Seguridade Social e do Sistema de Proteção Social Brasileiro.

A PNAS-2004 vai explicitar e tornar claras as diretrizes para efetivação da Assistência Social como direito de cidadania e responsabilidade do Estado, apoiada em um modelo de gestão compartilhada pautada no pacto federativo, no qual são detalhadas as atribuições e competências dos três níveis de governo na provisão de atenções socioassistenciais, em consonância com o preconizado na LOAS e nas Normas Operacionais (NOBs) (COUTO, YASBEK e RAICHELIS, 2010, p. 38).

A PNAS coloca a necessidade de articulação da assistência social com outras políticas públicas, para enfrentamento das questões sociais e tem como objetivos:

Prover serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social básica e ou especial para famílias, indivíduos e grupos que dela necessitem; contribuir com a inclusão e a equidade dos usuários e grupos específicos, ampliando o acesso aos bens e serviços sócioassistenciais básicos e especiais, em áreas urbana e rural, e; assegurar que as ações no âmbito da Assistência Social tenham centralidade na família, e que garantam a convivência familiar e comunitária (BRASIL, PNAS, 2004).

A referida política hierarquiza as proteções sociais a serem oferecidas em: básica e especial. A proteção social básica tem como objetivos prevenir situações de risco, por meio do desenvolvimento de potencialidades, aquisições e fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. A proteção social especial irá trabalhar “com indivíduos e grupos que se encontram em situação de alta vulnerabilidade pessoal e social, decorrentes do abandono, privação, perda de vínculos, exploração, violência, entre outras”. (COUTO, YASBEK e RAICHELIS, 2010, p. 43).

Ela está dividida em média complexidade (famílias e indivíduos com seus direitos violados, mas cujos vínculos familiar e comunitário não foram rompidos) e alta complexidade (famílias e indivíduos com vínculos rompidos).

(34)

Após a aprovação da PNAS, em 2004, seguiu o processo de construção e regulamentação do SUAS, em 2005.

A implantação do SUAS vem reafirmar o que já está proposto na LOAS: um sistema descentralizado e participativo, com a primazia do papel do Estado como principal agente construtor e implementador das bases operacionais necessárias à realização dos serviços socioassistenciais.

O referido sistema considera a precedência da gestão pública da política e tem como eixos: o alcance de direitos socioassistenciais pelos usuários; a matricialidade sociofamiliar; a territorialização; a descentralização político-administrativa; o financiamento partilhado entre os entes federados; o fortalecimento da relação democrática entre Estado e sociedade civil; a valorização e o compromisso com a presença do controle social; a participação popular/cidadão usuário; a qualificação de recursos humanos; a informação, o monitoramento, a avaliação e a sistematização de resultados.

O SUAS está voltado à articulação em todo o território nacional das responsabilidades, vínculos e hierarquia, do sistema de serviços, benefícios e ações de assistência social, de caráter permanente ou eventual, executados e providos por pessoas jurídicas de direito público sob o critério de universalidade e de ação em rede hierarquizada e em articulação com iniciativas da sociedade civil (COUTO et al., 2010, p. 38).

O SUAS regula e organiza os elementos essenciais da PNAS, implantando serviços voltados para o fortalecimento das famílias, com o propósito de protegê-las e apoiá-las, mais uma vez usando-as como instrumento de proteção social.

O SUAS propõe ações na Política de Assistência Social, que se aproximem do cotidiano das famílias; conheçam as realidades e os riscos a que estão expostas e desvendem as possibilidades/limites no embate com as expressões da questão social.

A proposta dos serviços sugeridos pelo Sistema Único é que trabalhem com as famílias, como sujeitos de direito, reconhecendo as diferenças, respeitando as diversidades, superando preconceitos, conhecendo a realidade social, desmistificando a ideologia de família como núcleo natural e padronizado, entendendo fragilidades e reconhecendo sua luta pela sobrevivência, objetivando superar as ações fragmentadas, segmentadas e setorizadas.

(35)

Ressaltamos, ainda, que o SUAS mescla essa tendência familista com outra vigente na atualidade: a tendência protetiva que afirma que a família tem condições de cuidar e proteger desde que tenha sua proteção assegurada através das políticas públicas. Assim, trabalhamos com uma nova proposta, “um novo modelo de assistência social fundado no mix público/privado na provisão social” (TEIXEIRA, 2009, p. 256). E:

As famílias sofrem as repercussões das contradições da sociedade capitalista e as imposições do neoliberalismo às políticas públicas estatais. O processo de concentração de renda, o aumento da pobreza e o acirramento das desigualdades sociais aumentaram a situação de vulnerabilidade das famílias, o que exige estratégias mais complexas entre seus membros para garantir a satisfação de suas necessidades básicas mais urgentes para a sua sobrevivência. Essa situação não permite que as famílias se reproduzam e se protejam com dignidade. Portanto, a capacidade de cuidado e de proteção dos grupos familiares com os seus membros, depende diretamente, da proteção que eles receberam ou não do Estado, mas também dos valores culturais e princípios éticos que os norteiam (MIOTO, SILVA e SILVA, 2007, p. 07).

Constatamos que o novo sistema, que está sendo implementado na política de assistência social, objetiva implantar serviços que protejam a família e a auxiliem na proteção de seus membros. A Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais (2009) vem para estabelecer quais serviços socioassistenciais devem ser desenvolvidos pela proteção social básica e quais pela proteção social especial, em todo o território nacional.

Conforme previsto na PNAS, a normatização supracitada mantém a tendência familista/protetiva da Política de Assistência Social, utilizando-se da família como parceira na execução e nos resultados a serem alcançados pelos serviços.

Considerando que este estudo tem como tema Família e VDCA como um desafio para a Política de Assistência Social, nosso foco será o serviço da Proteção Social Especial de Média Complexidade que tem, entre seu público alvo, crianças e adolescentes vítimas de VDCA e suas famílias: o PAEFI.

(36)

2

VIOLÊNCIA

DOMÉSTICA

CONTRA

CRIANÇAS

E

ADOLESCENTES: UMA REALIDADE SEM RETOQUES

Para realizarmos este estudo, partiremos do pressuposto de que a violência é um problema do presente e do passado, pois, segundo muitos estudos, não existe nenhuma sociedade na qual ela não tenha ocorrido.

Segundo Minayo (1994), desde sempre, o homem se preocupa em entender o fenômeno da violência a fim de preveni-la e eliminá-la da vida social.

A autora define que se trata “de um complexo e dinâmico fenômeno biopsicossocial, mas seu espaço de criação e desenvolvimento é a vida em sociedade”.

Adorno (1998) se refere à questão da violência, colocando que:

Ao mesmo tempo em que ela expressa relações entre classes sociais, expressa também relações interpessoais (...) está presente nas relações intersubjetivas que se verificam entre homens e mulheres, entre adultos e crianças, entre profissionais de categorias distintas. Seu resultado mais visível é a conversão de sujeitos em objeto, sua coisificação (ADORNO, 1998 apud GUERRA, 2001, p. 31).

Falar de violência é falar de desigualdade, de dominação, de relacionamento desigual, de opressão, de crueldade.

Quando há o propósito de discutir “Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes”, falamos da violência que vitimiza seres em condição peculiar de desenvolvimento, que faz desses sujeitos, objetos.

Tratando da VDCA, verificamos que esta modalidade de violência faz vítimas, crianças e adolescentes, no mundo e em nosso país, e, infelizmente, está longe de ser desprezível.

Segundo estimativas do UNICEF (2005), ela atinge anualmente entre 500 (quinhentos) milhões e 1.500 (hum mil e quinhentos) bilhões de crianças e adolescentes. Em pesquisa realizada por esse órgão das Nações Unidas, em 2005 – 2006, 86% (oitenta e seis) das crianças entre 02 (dois) e 14 (catorze) anos, que viviam em 37 (trinta e sete) países, foram vítimas de violência física e psicológica.

(37)

Em relação à ocorrência de violação de direitos no Brasil, segundo dados do SIPIA, entre janeiro de 1999 e maio de 2004, 209.786 (duzentos e nove mil, setecentas e oitenta e seis) crianças e adolescentes foram vítimas de situações de violação de direitos, classificadas segundo tabela abaixo:

TABELA 1 – Tipo de direito violado e sua distribuição por gênero (Sipia)

T 1 - Tipo de direito violado e sua distribuição por gênero (Sipia)

Direito Violado Fatos Masculino Feminino

Convivência familiar e comunitária 107700 55949 51751

Educação/Cultura/Esporte/Lazer 35282 20943 14339

Liberdade, Respeito, Dignidade 51595 25471 26124

Profissionaliação e Proteção no Trabalho 4773 3240 1533

Vida e Saúde 10436 5815 4621

Total 209786 111418 98368

Fonte: Unicef (2005).

Imagem

TABELA 1  –  Tipo de direito violado e sua distribuição por gênero (Sipia)
TABELA 2 - Modalidade de VDCA - Incidência Pesquisada - Brasil
TABELA 3 - Porte dos municípios e capacidade de atendimento  Porte dos municípios e capacidade de atendimento  Porte do Município  Capacidade de Atendimento  Pequeno Porte I, II e
TABELA 4 - Composição da equipe técnica  Municípios  Capacidade  de  Atendimento/ Acompanham ento  Equipe de Referência Porte Nível de Gestão  Pequeno  Porte I e II e  Médio Porte  Gestão inicial,  básica ou plena  50 casos  (famílias/  indivíduos)  1 Coor
+7

Referências

Documentos relacionados

b) Nos lotes classificados como sucatas aproveitáveis ou sucatas aproveitáveis com motor inservível (motor suprimido): empresas do ramo do comércio de peças

[r]

Y dije “por cuestiones propiamente modernas”, porque prefiero entender que en ese punto en el que la filosofía comienza a explicitar el problema de su teoricidad (el cogito

Fundamentando-se na teoria das representações sociais, em especial a abordagem estrutural proposta por Abric (1994, 1998, 2003), os resultados obtidos demostraram que

CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS INICIAL DESATIVADA 542 RIO DO ANTÔNIO IBITIRA REGISTRO CIVIL COM FUNÇÕES NOTARIAIS INICIAL DESATIVADA 543 RIO DO ANTÔNIO SEDE REGISTRO

23 - A eleição dos membros da Diretoria far-se-á de forma trienal entre os associados, em Assembléia Geral, na forma deste Estatuto e do Regulamento Eleitoral dele

apropriadas para representar e armazenar tais dados, ou seja, fazer o projeto conceitual do banco de dados.. Programador

Suponhamos que num dado instante a fonte emite um campo eléctrico com um máximo de amplitude (crista da onda). Nos instantes seguintes são emitidos, sucessivamente, campos