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O ensino de Física para estudantes surdos

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Academic year: 2021

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Texto

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE MESTRADO NACIONAL PROFISSIONAL EM ENSINO DE FÍSICA COORDENAÇÃO NACIONAL: SOCIEDADE BRASILEIRA DE FÍSICA

ERCÍLIA JULIANA MARCIANO DE OLIVEIRA

O ENSINO DE FÍSICA PARA ESTUDANTES SURDOS

Natal/RN 2019

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ERCÍLIA JULIANA MARCIANO DE OLIVEIRA

O ENSINO DE FÍSICA PARA ESTUDANTES SURDOS

Texto da Dissertação submetida ao Programa de Mestrado Nacional Profissional em Ensino de Física (MNPEF), da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, campus de Natal, como parte final dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ensino de Física. Este texto contempla modificações recomendadas pela Banca Examinadora por ocasião da defesa.

Orientador: Prof. Dr. Ciclamio Leite Barreto

Natal/RN 2019

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Aprovada pela Banca:

Prof. Dr. Ciclamio Leite Barreto Departamento de Física/ CCET/ UFRN

Prof. Dr. Carlos Alberto dos Santos

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte Campus Central – Natal

Prof. Dr. Milton Schivani Alves Departamento de Física/ CCET/ UFRN

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Central Zila Mamede Oliveira, Ercília Juliana Marciano de.

O ensino de Física para estudantes surdos / Ercília Juliana Marciano de Oliveira. - 2019.

123f.: il.

Dissertação (Mestrado)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Escola de Ciências e Tecnologia (ECT), Mestrado Nacional Profissional em Ensino de Física, Natal, 2019. Orientador: Dr. Ciclamio Leite Barreto.

1. Ensino de Física - Dissertação. 2. Estudantes surdos - Dissertação. 3. Libras - Dissertação. I. Barreto, Ciclamio Leite. II. Título.

RN/UF/BCZM CDU 53:376

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“Todo mundo é um gênio. Mas se você julgar um peixe pela sua habilidade de subir em árvores, ele viverá o resto de sua vida acreditando que é um idiota.” Albert Einstein

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AGRADECIMENTOS

A DEUS pelo dom da vida, pelas vezes que me protegeu durantes as viagens semanais para assistir as aulas, me ajudando a realizar este trabalho.

Ao meu orientador por toda paciência e compreensão durante esses anos. Por todos os conselhos e ânimo para que eu chegasse até o fim. Por ser sempre acessível e disponível, me orientando sempre da melhor maneira possível.

Aos meus pais e familiares por todo o apoio que me deram durante essa difícil caminhada, me trazendo a Natal para assistir as aulas sempre que necessário. Ao meu marido que sempre buscou me incentivar.

As escolas em que trabalhei e trabalho, por organizar os horários e tornar essa jornada possível.

Aos meus colegas de curso com quem criei laços e que apoiaram uns aos outros. Ao corpo docente e coordenação deste mestrado, pelo empenho e compromisso com a qualidade do curso.

Aos meus colegas de trabalho que me incentivaram e me ajudavam quando necessário.

Aos membros da banca examinadora que, por ocasião da defesa desta dissertação, deram contribuições valiosas, as quais incorporei nesta versão final.

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RESUMO

A Constituição da República Federativa do Brasil afirma (Art. 205 e Art. 206) que a educação é um direito de todos e dever do Estado e da família, e que deve haver igualdade de acesso e permanência na escola. Assim, os alunos com necessidades especiais devem estar inseridos no contexto escolar e usufruir de pleno gozo de todos os direitos do aluno sem deficiência. Pensando nisso, foi feita uma sondagem entre alguns professores da rede pública estadual do Rio Grande do Norte sobre o ensino de física para alunos surdos. Esta pesquisa constatou que boa parte desses professores não possuem conhecimentos necessários para estabelecer comunicação com os seus alunos, o que influencia de forma direta na qualidade do ensino ministrado. Além disso, eles acham difícil encontrar materiais adequados que possam minimizar este problema. O presente trabalho traz uma proposta para amenizar essa situação. Trata-se do desenvolvimento de aulas numa perspectiva bilíngue que podem ser aplicadas na sala de aula junto com os alunos ouvintes ou indicadas a estes alunos para que sirvam de suporte ao estudo em casa. O principal recurso para este trabalho foca na produção de videoaulas para todos os alunos, com narração em língua portuguesa para os ouvintes e execução em LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais – para os alunos surdos. A produção dessas videoaulas considera relevantes os momentos pedagógicos essenciais, conforme amplo conhecimento na literatura especializada da pesquisa em ensino de física.

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ABSTRACT

The Constitution of the Federative Republic of Brazil states (Art. 205 and Art. 206) that education is a right of everyone and the duty of the State and of the family, and that there must be equality of access and permanence in school. Thus, students with special needs must be inserted in the school context and enjoy the full enjoyment of all the rights of students without disabilities. Thinking about this, a survey was conducted among some teachers of the state public network of Rio Grande do Norte on the teaching of physics for deaf students. This research found that many of these teachers do not have the necessary knowledge to establish communication with their students, which directly influences the quality of teaching taught. In addition, they find it difficult to find suitable materials that can minimize this problem. This work presents a proposal to mitigate this situation. It is the development of lessons from a bilingual perspective that can be applied in the classroom with the listening students or given to these students some support to study at home. The main resource for this work focuses on the production of video lessons for all students, with narration in Portuguese for listeners and performed in LIBRAS – Brazilian Sign Language – for deaf students. The production of these video lessons considers relevant the essential pedagogical moments, according to the ample knowledge in the specialized literature of the research in physics teaching.

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9 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ... 13 2 JUSTIFICATIVA ... 20 3 OBJETIVOS ... 21 4 REVISÃO DA LITERATURA ... 22

4.1 BREVE COMENTÁRIO SOBRE A INCLUSÃO ... 22

4.2 DISPOSITIVOS LEGAIS ... 24

4.3 O QUE DIZ A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA ... 27

4.3.1 A lei e o ensino de alunos surdos...28

4.4 A SURDEZ E OS PROCESSOS COGNITIVOS... 32

4.5 USO DA LIBRAS NA EDUCAÇÃO DE ALUNOS SURDOS ... 35

4.6 USO DA LIBRAS NO ENSINO DE FÍSICA ... 37

4.7 AS SALAS DE RECURSOS MULTIFUNCIONAIS ... 38

4.8 O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO ... 43

4.9 O INTÉRPRETE DE LIBRAS ... 44

5 METODOLOGIA ... 46

5.1 APLICAÇÃO DO QUESTIONÁRIO DE SONDAGEM ... 47

5.2 AULAS EM VÍDEO – UMA PERSPECTIVA VISUAL-GESTUAL ... 51

5.2.1 POR QUE UMA VERSÃO BILINGUE? ...52

5.3 OS ROTEIROS DE GRAVAÇÃO DAS SEQUÊNCIAS DE ENSINO ... 52

5.3.1 Organização do vídeo ...53

5.4 OS ESPELHOS ... 54

5.4.1 O ESPELHO PLANO ...54

5.4.2 O ESPELHO ESFÉRICO ...55

5.4.3 UTILIZAÇÃO DOS ESPELHOS NO DIA A DIA ...58

5.5 PLANO DE AULA ... 59

5.6 TESTE DE SONDAGEM PRÉ-AULA ... 61

5.7 TESTE DE SONDAGEM PÓS-AULA ... 61

6 O PRODUTO ... 62

6.1 SUGESTÃO NA CONSTRUÇÃO DO PRODUTO ... 62

6.2 METODOLOGIA ... 66

7 RESULTADOS ESPERADOS E OBTIDOS, DISCUSSÃO E CONCLUSÃO ... 67

7.1 RESULTADOS OBTIDOS ... 68

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7.1.2 Sobre a aplicação do produto ...70

7.1.3 Aplicação do experimento ...72

7.1.4 Sobre o pós-teste ...74

8 CONCLUSÃO ... 79

REFERÊNCIAS ... 80

ANEXO 1 – Questionário... 83

ANEXO 2 – PRODUTO EDUCACIONAL ... 87

ANEXO 3 – AUTORIZAÇÃO DO USO DE IMAGEM DO INTÉRPRETE... 1223

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Sala tipo I Fonte: Manual de Orientação: Programa de Implantação de

Sala de Recursos Multifuncionais (MEC, 2010, p. 32) ... 39

Figura 2 - Especificação da sala tipo II. Fonte: Manual de Orientação: Programa de Implantação de Sala de Recursos Multifuncionais (MEC, 2010, p.33) ... 39

Figura 3 - Sala de Recursos Multifuncionais (SRM) Fonte: https://especialdeadamantina.wordpress.com/2012/11/12/implantacao-das-salas-de-recursos-multifuncionais/ ... 40

Figura 4 - Estante de Livros ... 41

Figura 5 - Estante de Jogos ... 41

Figura 6 - ... 41

Figura 7 - Máquina para datilografar textos em Braile ... 42

Figura 8 - Computador ... 42

Figura 9 - Teclado com autorrelevo ... 42

Figura 10 - Conhecimento em Libras ... 47

Figura 11 - Comunicação com o aluno ... 48

Figura 12 - Ensino do conteúdo nas aulas ... 48

Figura 13 - Dificuldade de encontrar simulações ... 50

Figura 14 - Utilidade de materiais apropriados para alunos com surdez ... 50

Figura 15. Vídeo disponível no YouTube, acesso através do Link: <https://youtu.be/Lli7fuojczM>. ... 54

Figura 16. Fonte:< https://descomplica.com.br/blog/fisica/resumo-espelhos-esfericos/> Acesso em: 05 mar de 2019. ... 55

Figura 17. Imagem produzida por um espelho esférico convexo. Fonte: <https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/fisica/formacao-imagens-espelhos-esfericos.htm> Acesso em: 05 mar de 2019. ... 56

Figura 18. Objeto antes do centro de curvatura. Fonte: <https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/fisica/formacao-imagens-espelhos-esfericos.htm> Acesso em: 05 de mar de 2019. ... 56

Figura 19. Objeto no centro de curvatura. Fonte: <https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/fisica/formacao-imagens-espelhos-esfericos.htm> Acesso em: 05 de mar de 2019. ... 57

Figura 20. Objeto entre o centro de curvatura e o foco. Fonte: <https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/fisica/formacao-imagens-espelhos-esfericos.htm> Acesso em: 05 de mar de 2019. ... 57

Figura 21. Objeto posicionado em cima do foco. Fonte: <https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/fisica/formacao-imagens-espelhos-esfericos.htm> Acesso em: 05 de mar de 2019. ... 58

Figura 22. Objeto posicionado entre o foco e o vértice do espelho côncavo. Fonte: <https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/fisica/formacao-imagens-espelhos-esfericos.htm> Acesso em: 05 de mar de 2019. ... 58

Figura 23 - Fonte da imagem: <http://infravermelho8.rssing.com/chan-35794232/all_p2.htm> ... 62

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Figura 24. Fonte da imagem:

<http://if.ufmt.br/eenci/artigos/Artigo_ID440/v12_n8_a2017.pdf> ... 62

Figura 25 - Construção do slide de apresentação ... 63

Figura 26 - Inserir - Áudio - Gravar Áudio... 64

Figura 27 - Intérprete traduzindo as informações do vídeo ... 64

Figura 28 - Livro que ensina sinais de conceitos físicos em Libras ... 65

Figura 29 - Conceitos físicos e seus sinais em Libras ... 66

Figura 30 - Aplicação do pré-teste ... 70

Figura 31 - Aplicação da vídeoaula traduzida em LIBRAS ... 71

Figura 32 - Alunos surdos observando a concha (Espelho Côncavo e Convexo) ... 72

Figura 33 - Alunas observando a concha e questionando sobre as diferentes imagens produzidas ... 73

Figura 34 - Alunos surdos comparando a imagem produzida por um espelho plano com as produzidas pela concha de feijão... 74

Figura 35 - Intérprete ajudando na tradução das perguntas do teste do pós aula .... 75

Figura 36 - Resultado da questão 1 do teste pós-aula ... 75

Figura 37 - Resultado da questão 2 do teste pós-aula ... 76

Figura 38 - Resultado da questão 3 do teste pós-aula ... 76

Figura 39 - Fonte da imagem: http://infravermelho8.rssing.com/chan-35794232/all_p2.html ... 77

Figura 40 - Resultado da questão 4 do teste pós-aula ... 77

Figura 41 - Fonte da imagem: <http://if.ufmt.br/eenci/artigos/Artigo_ID440/v12_n8_a2017.pdf> ... 78

Figura 42 - Resultado da questão 5 do teste pós-aula ... 78

Figura 7. Aplicação do pré-teste ... 102

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1 INTRODUÇÃO

Relato de Experiência

Durante a graduação no curso de Física, pagamos a disciplina de Libras, mas sabemos que não são seis meses estudando uma língua que vai nos tornar proficientes. Outra coisa é que a disciplina abriu sim a discussão sobre a questão da inclusão, porém ela não nos ensinou nem nos preparou para o que enfrentaríamos em sala de aula. Ou seja, o que fazer com o meu aluno, como agir, como adaptar as atividades. Foi a experiência do dia a dia, os erros e acertos que iam moldando a nossa prática.

Em 2015, na Escola Estadual Capitão Mor Galvão, localizada na cidade de Currais Novos na região do Seridó do estado do Rio Grande do Norte, em uma turma de segundo ano do Ensino Médio, vivenciei uma experiência que muito mudou o meu modo de pensar. Na sala me deparei com um aluno que tinha a deficiência auditiva desde que nasceu. O que me chamou a atenção nele foi a determinação e compromisso com que levava seus estudos no dia a dia. Sempre estudioso, participava das aulas, tirava suas dúvidas, fazia suas tarefas e apresentava resultados positivos nas provas da disciplina. Muitas vezes, estava entre os alunos com as maiores notas da sala.

Outra coisa que me chamava a atenção, era a forma como os colegas de sala interagiam com ele. Alguns alunos aprenderam a falar Libras o que me ajudava demais em sala. Quando o intérprete não estava presente, os colegas faziam a ponte necessária para a comunicação entre nós.

Diante do desafio de ensinar Física para adolescentes, que muitas vezes não compreendem a importância da escola em suas vidas, sempre buscava mostrar a aplicação dos conteúdos no cotidiano, percebendo assim que eles passavam a se interessar mais pela disciplina e pelos debates em sala de aula. Utilizava também as redes sociais, na época grupos no Facebook, para postar curiosidades, listas de exercícios, enquetes com perguntas valendo nota e vídeo aulas que complementassem seus estudos em casa.

Sempre percebia que um dos primeiros a acessar o grupo era o aluno surdo. Sempre comentava, curtia e visualizava as publicações postadas. Foi aí que tive a ideia de

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procurar vídeos em Libras ou com legendas em português para que ele pudesse visualizar esses vídeos complementares. Para minha surpresa não encontrava esse tipo de material. Quando achava um vídeo em Libras, não havia uma legenda em português. Como uma professora ouvinte ia saber se aquele conteúdo estava de acordo com o que vinha cobrando dos alunos? Como saber se não haveria erros conceituais ou não no vídeo? Como saber se era viável compartilhar esse vídeo com meu aluno surdo se eu não domino a língua Libras?

A minha atitude (ação afirmativa) de sempre o incluir nas aulas, de parar e me voltar para ele, perguntar se estava compreendendo bem o assunto, também chamou a atenção da turma. Certa vez, um aluno disse que achava interessante a forma como eu tratava os alunos inclusos, porque os demais professores não tinham a mesma preocupação como, por exemplo, se os meninos estavam acompanhando a aula. Atualmente, o aluno citado cursa Libras na universidade federal e pretende ser professor universitário.

Essa vivência me fez refletir sobre a minha prática e sobre como a inclusão é tratada de fato no chão da escola. Não basta falar sobre inclusão, a escola é um espaço democrático e que precisa viver a inclusão. Neste trabalho, será discutido sobre a inclusão de alunos surdos e trará uma sugestão de como fazer uma aula inclusiva.

1.1 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O TRATAMENTO DISPENSADO ÀS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA AO LONGO DA HISTÓRIA

De acordo com Correia (2010), na Antiguidade, no início da Era Cristã, mais precisamente em Roma, era proibido matar crianças de forma intencional, mas tornava-se permitido perante a lei caso a mesma nascesse com alguma deficiência física. Quando alguém decidia não matar, elas eram abandonadas à própria sorte, criadas, muitas vezes, por escravos ou pessoas pobres para que, quando crescessem, fossem exploradas. Uma das explorações mais comuns era a esmola, prática que se tornou muito rentável. Tempos depois, elas passaram a ser tratadas como bobas e eram usadas para trabalhos simples, humilhantes ou iam para o circo.

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Na Grécia Antiga, cultuavam-se os corpos perfeitos e esculturais. Todos aqueles que não se encaixavam nos padrões do que seria belo, deveriam ser escondidos em locais secretos.

Segundo Silva (1987), em Esparta, toda criança que nascia era levada para ser avaliada por uma comissão. Aquelas que apresentassem qualquer defeito não eram devolvidas aos pais. Eram levadas para um local, chamado de Apothetai, um abismo onde seriam arremessadas para a morte.

Com o cristianismo, no fim da Antiguidade, o deficiente passa a ser considerado um ser humano como outro qualquer e, por isso, não poderia ser abandonado ou maltratado. Mas, com o aumento das grandes cidades, a população passou a se descuidar dos hábitos de higiene. Foi neste período que a Europa foi devastada por doenças e epidemias advindas da sujeira a que as pessoas estavam expostas. A falta de saneamento também contribuiu para que a peste bubônica, a hanseníase, a difteria, entre outras, se alastrassem, dizimando um grande número de pessoas. A população, sem o devido conhecimento, passou a acreditar que tudo isso seria sinal da ira de Deus, assim como as crianças que nasciam com deficiência.

De acordo com Pessotti (1984), a primeira instituição voltada para abrigar deficientes, no caso, deficientes mentais, surgiu na Bélgica, no século XIII, onde os mesmos faziam pequenos favores. A legislação sobre como cuidar dos deficientes, principalmente dos seus bens, veio através do rei Eduardo II na Inglaterra, chamada “De Praerogativa Regis”, por volta de 1300. Devido aos valores morais pregados pelo cristianismo, a caridade deveria ser praticada com os deficientes. Estes, por terem alma, deveriam ser bem cuidados. Parte dos seus bens eram gastos para trazer um pouco de conforto e dignidade.

Na idade média, o sentimento que se pregava era de caridade e castigo. Sempre que o deficiente fugia do que era considerado moral deveria ser castigado. O intuito era salvar a alma do mal. Para diminuir os maus tratos, o clero indicava o confinamento. Mesmo que, muitas vezes, isso gerasse abusos e promiscuidade, atendia aos ensinamentos cristãos. Segregar passava a ser sinônimo de caridade, pois eram ofertados a alimentação e o abrigo, assim como o cuidado para que a alma não se desviasse.

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No século XVI, Cardano e Paracelsus, ambos médicos, defenderam a ideia de que a deficiência mental seria um problema médico, hereditário ou congênito. Diante disso, essas pessoas não poderiam ser educadas ou reeducadas. Com essa visão, as decisões sobre o futuro da pessoa com deficiência deveriam ser tomadas com base na medicina e não mais pela igreja.

No século XVII, organizações religiosas, como as Irmãs de Caridade e São Vicente de Paulo, começaram a oferecer assistência a essas pessoas, em forma de confinamento, não mais apenas através de cuidados. No mesmo período, em 1650, em Londres, a anatomia do cérebro humano é descrita pela primeira vez por Thomas Willis. Este afirma que os problemas mentais seriam causados por alterações no órgão. Seu trabalho ajuda na mudança da visão social, por meio do qual é abandonada a visão religiosa, dando lugar a fatos científicos.

John Locke traz uma nova visão sobre a mente humana. O autor, em sua obra de 1690, Essay, desperta a ideia de que a mente é como uma página em branco, e que a experiência seria responsável por preencher essas páginas, ou seja, isso caberia ao ensino. A sua Teoria do Conhecimento e Aprendizagem influenciou outros estudiosos, sendo precursora do primeiro programa de Educação Especial, de origem por volta de 1800, através de Jean Itard.

Itard foi um médico e cirurgião reeducador de surdos, bem como o fundador da otorrinolaringologia. Dedicou sua vida a inúmeros trabalhos sobre a gagueira, educação oral e audição. Trabalhando em um asilo de “surdos-mudos”, ele se dedicou aos estudos de educação oral, gagueira e audição. Além disso, trabalhou com Victor, o selvagem de Aveyron, uma criança de 12 anos achada no meio dessa floresta, localizada no sul da França.

Nesta mesma época, Charles Michel Eppée, por volta de 1770, em Paris, funda a primeira instituição de “surdos-mudos”. Ele reconheceu que a psicologia de uma pessoa que é deficiente auditiva não é a mesma que a de uma pessoa ouvinte. Eppée inventou o método de sinais, para complementar o alfabeto manual. Seu trabalho influencia outros, incentivando a abertura de novos institutos pelo mundo.

Apesar da evolução na forma de olhar as pessoas com deficiência e da criação de institutos, a maioria das pessoas ainda não tinha acesso às informações que cercavam o assunto, como a sua causa, a forma adequada de educar essas pessoas

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com limitações. Para muitos, ser deficiente, “incapacitado”, era uma condição imutável. (MAZZOTTA, 1999).

Os primeiros movimentos para mudar esse quadro e levar o atendimento aos deficientes, começaram na Europa, mais tarde se expandindo para outros países. No Brasil, um olhar mais atento para com as pessoas com deficiência física tem seu início na época do Brasil Império, em 1800, na cidade de São Paulo. Nessa época, foi criada uma instituição especializada, mas particular. Em 1824, a primeira Constituição do Brasil previa educação primária e gratuita para todos; entrementes, aqueles que possuíam incapacidade física ou moral não tinham direitos políticos.

Em 1854, foi criado, no Rio de Janeiro, o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, chamado atualmente de Instituto Benjamin Constant (IBC)1. Em 1857, surge, na mesma cidade, o Instituto dos Surdos-Mudos, que existe até hoje, nomeado como Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES).1 Este último foi criado no Rio de Janeiro por Dom Pedro II. A iniciativa partiu do Ernesto Hüet e seu irmão. Começou a funcionar com o atendimento a dois alunos, e era voltado à educação literária e ao ensino profissionalizante, com oficinas de sapataria e encadernação, pautação e douração, para meninos de 7 a 14 anos. (MAZZOTTA, 1999).

Em 1883, foi realizado o Congresso de Instrução Pública, no qual se discutiu sobre a educação das pessoas com deficiência e o tema “Sugestão de Currículo e Formação de Professores para Cegos e Surdos”.

No final do século XIX, as escolas eram escassas, os índices de analfabetismo eram altos, logo, a dificuldade para se investir na escolarização de pessoas com necessidades especiais era imensa. Alguns brasileiros tiveram iniciativa própria, inspirados pela experiência de outros países, e começaram a ter interesse no atendimento especial. Porém, a sua inserção na política educacional brasileira só

1 O Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines), órgão do Ministério da Educação, tem como missão institucional a produção, o desenvolvimento e a divulgação de conhecimentos científicos e tecnológicos na área da surdez em todo o território nacional, bem como subsidiar a Política Nacional de Educação, na perspectiva de promover e assegurar o desenvolvimento global da pessoa surda, sua plena socialização e o respeito às suas diferenças.

O Instituto Benjamin Constant (IBC) é um centro de referência nacional na área voltada à deficiência visual. Para saber mais: http://www.ibc.gov.br/o-ibc

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ocorreu por volta de 1950.

O início do trabalho de integrar os alunos deficientes auditivos no ensino regular, se dá pelo Instituto Santa Terezinha2, considerado de alto conceito pela área de Educação Especial. O mesmo foi fundado em 1929, em Campinas, por duas freiras brasileiras que receberam especialização no ensino de crianças surdas em Paris. Posteriormente, o instituto foi transferido para a cidade de São Paulo. Mantido por uma Congregação de Irmãs, foi reconhecido como de utilidade pública municipal, estadual e federal, mantendo convênios com estas esferas.

Em 1872, apesar de a população de cegos girar em torno de 16.000 e a de surdos, em torno de 12.000, o Instituto Benjamin Constant e o Instituto Nacional de Educação de Surdos tinham poucos alunos matriculados: 35 no primeiro e 17 no segundo, respectivamente. No entanto, a iniciativa de criação destas instituições possibilitou a ampliação da oferta de atendimento a esses deficientes, em todos os anos subsequentes. (CORREIA, 2010, p. 35)

É importante se ter em mente que a comunidade surda merece respeito. Não é o número significativo de alunos que precisa ser atendido que vai justificar os trabalhos a serem desenvolvidos. Mesmo que seja apenas um aluno surdo, este merece ter acesso aos direitos que os demais cidadãos também desfrutam. Talvez seja pelo fato do número de alunos surdos presentes nas salas de aula não ser tão alto, geralmente um por turma, que a maioria dos educadores não desperte para esta questão.

A tentativa de incluir esta comunidade na sociedade já vem de muito tempo, como falado anteriormente. Mesmo assim, este tema ainda é um tabu. Nem todos os possíveis interessados conhecem a trajetória, conquistas e leis que são direcionadas para eles. Nem todos os educadores sabem trabalhar com estes alunos.

Neste século XXI, com a oferta de cursos superiores ou especializações em LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais – já é possível perceber a presença de profissionais dentro da escola para auxiliar esses alunos, além dos concursos que já vêm abrindo

2 Instituto Santa Terezinha é uma escola especializada no Ensino Médio para surdos. Foi fundado em

abril de 1929 na cidade de Campinas/SP pelas irmãs da Congregação de Nossa Senhora do Calvário. O instituto tem se organizado conforme a filosofia bilíngue, buscando desenvolver o cognitivo-linguístico dos seus alunos. Para saber mais: http://www.institutosantateresinha.org.br/sobre-nos/

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novas dessas vagas. Mas isso não isenta os demais profissionais da escola da sua responsabilidade de ensinar e buscar meios de contribuir para a qualificação desses alunos.

Neste trabalho, buscamos cobrir as questões fundamentais envolvidas neste problema, até chegar à questão do ensino de física. O capítulo 4, da fundamentação teórica, começa introduzindo a necessidade de se produzir materiais voltados para a educação especial, visando cumprir o que está na Constituição Federal, bem como nos acordos mundiais. Fica claro que é um direito das pessoas com deficiência ter acesso a uma educação de qualidade, sendo dever do Estado garantir esse acesso e permanência. Ainda na fundamentação, é abordado até que ponto a deficiência no sistema auditivo interfere nos processos cognitivos do indivíduo, e como os teóricos defendem o desenvolvimento do pensamento.

No subcapítulo sobre o uso da LIBRAS na educação de alunos surdos, é tratada a importância do uso da língua da comunidade surda no processo de ensino aprendizagem. No subcapítulo seguinte, comenta-se sobre as salas de recursos multifuncionais e sua importância para os alunos com deficiências, bem como é exposto para o leitor deste trabalho o que se pode encontrar nessas salas. Em seguida, o trabalho aborda um pouco sobre o atendimento educacional especializado, quem pode realizar esse trabalho e um pouco de como ele acontece.

Para o capítulo da metodologia, é comentado sobre uma pesquisa inicial feita com professores da rede regular de ensino do estado do Rio Grande do Norte, mostrando sobre a realidade desses professores diante de alunos com deficiência auditiva. Em seguida, é descrito como o produto educacional está sendo desenvolvido, quais recursos e planos de aulas deverão ser utilizados.

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2 JUSTIFICATIVA

Em muitas escolas do interior do estado do Rio Grande do Norte o quadro de professores não consegue ser preenchido. Em alguns casos, há professores que completam sua carga horária em uma mesma escola lecionando diversas disciplinas, pois não há quem as assuma. Não é raro encontrarmos profissionais formados em Matemática lecionando a disciplina de Física.

A situação se torna ainda mais grave quando entra no âmbito da educação para alunos com necessidades especiais. Algumas escolas nem possuem o profissional de Atendimento Educacional Especializado, apesar de possuírem muitos alunos com deficiências. O resultado dessa realidade é que esses alunos passam pela escola sem ter sequer a chance de desenvolver suas potencialidades. Alguns saem da escola completamente analfabetos, sendo incapazes de exercer seus direitos como um cidadão como, por exemplo, conseguindo um emprego.

O professor que assume esse desafio, de ensinar uma disciplina para alunos com necessidades especiais sem qualquer formação específica para isso, se depara com diversos obstáculos e se sente desestimulado a buscar novas metodologias diante do insucesso da sua prática de costume.

A necessidade de prover um apoio ao professor de física do ensino médio no que diz respeito a sua interação com alunos com deficiência auditiva nos leva a pensar em uma metodologia de apoio, que seja simples e capaz de suprir um pouco dessa realidade tão difícil.

Pensamos em auxiliar os professores através da produção de recursos didáticos associados, que se constitua em um material de complemento na formação dos jovens surdos estudantes do ensino médio. O professor(a) poderá, além de utilizar tais recursos em sala de aula, indicá-los e disponibilizá-los aos alunos em geral para que possam utilizá-los como complemento dos seus estudos em casa. Caso desenvolva interesse em produzir seus próprios recursos didáticos, o professor(a) encontrará no produto educacional desta dissertação damos indicações do percurso a ser seguido para a produção de videoaulas utilizando Libras para prover conteúdos de Física.

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3 OBJETIVOS

3.1 OBJETIVO GERAL

Este trabalho tem como objetivo desenvolver um produto educacional que venha auxiliar professores de física no ensino da disciplina para alunos surdos.

3.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

 Analisar as dificuldades dos professores das escolas estaduais do Rio Grande do Norte, pertencentes à 9ª Direc – Diretoria Regional da Educação e da Cultura, no ensino de física para alunos surdos;

 Discutir sobre metodologias e estratégias eficientes no ensino de física ministrado a esses alunos;

 Desenvolver um produto que possa auxiliar professores no ensino de física a alunos com surdez;

 Aplicar e avaliar em projeto piloto este produto na sala da 2ª série do Ensino Médio.

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4 REVISÃO DA LITERATURA

4.1 BREVE COMENTÁRIO SOBRE A INCLUSÃO

Nos dias atuais, cada vez mais se fala sobre diversidade.

Diversidade significa variedade, pluralidade, diferença. É um substantivo feminino que caracteriza tudo que é diverso, que tem multiplicidade. Diversidade é a reunião de tudo aquilo que apresenta múltiplos aspectos e que se diferenciam entre si, ex.: diversidade cultural, diversidade biológica, diversidade étnica, linguística, religiosa etc. (SIGNIFICADO DE DIVERSIDADE, 2017)3

Sendo assim, entende-se que cada ser humano tem o seu jeito de ser, de se expressar, aptidões e dificuldades que lhe são peculiares. Podemos encontrar muitos exemplos na história de pessoas que, mesmo com limitações físicas, foram capazes de trazer importantes contribuições, seja na ciência, nas artes, na arquitetura, nas engenharias, etc.

Ludwig van Beethoven ficou surdo quando já era adulto. Mesmo após adquirir sua deficiência, foi capaz de compor grandes sinfonias. Uma delas, a Nona Sinfonia, foi declarada pela Unesco como patrimônio mundial.

Stephen Hawking, aos 17 anos, descobriu em 1962, no mesmo ano em que se formou em Física, que possuía uma doença degenerativa, a esclerose lateral amiotrófica. Todavia, continuou seus estudos, chegando a ocupar a cadeira que foi de Isaac Newton na Universidade de Cambridge e sendo capaz de dar intensiva contribuição à pesquisa relacionada à cosmologia e às origens do Universo.

Medeiros (2002), em artigo publicado na revista Física na Escola, intitulado Entrevista com Kepler, conta a história real de um menino que era apaixonado pelos astros, porém, ao adquirir varíola quando pequeno, teve sua visão prejudicada. Com isso,

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dedicou-se a estudar o que outros astrônomos observavam. Ele via o cosmos através dos olhos da Matemática (MEDEIROS 2001, p. 3).

Johannes Kepler é um dos vários exemplos em que pessoas com limitações físicas fizeram a diferença e mudaram a história. Seus estudos contribuíram para que novos conhecimentos pudessem se desenvolver, como a Teoria da Gravitação de Isaac Newton.

Quantos “Keplers” estamos perdendo pela segregação? Quantas contribuições estão sendo deixadas de lado porque esses alunos não estão inseridos de verdade no sistema educacional? Diante disso, deve-se ter em mente que o acesso ao conhecimento não pode ser voltado apenas a um grupo seleto de pessoas. A escola é um ambiente em que todos que desejarem ter acesso a uma educação de qualidade devem ter o seu lugar garantido. A diversidade não pode ser um motivo de exclusão. É contraditório quando se imagina que o sistema educacional garante o acesso do aluno com deficiência, mas não garante a sua permanência, continuidade, nem o real acesso ao ensino. Esse aluno de fato está aprendendo? A forma como esse aluno está sendo avaliado é igual ao do aluno que não possui limitações físicas? Existe justiça, caso essa forma seja igual? Se a escola é lugar de diversidade, no final do ano, aquele aluno que não atingiu o total de pontos da mesma forma que os demais, passará para a série seguinte também? Muitos são os questionamentos.

Ligada a sociedades democráticas que estão pautadas no mérito individual e na igualdade de oportunidades, a inclusão propõe a desigualdade de tratamento como forma de restituir uma igualdade que foi rompida por formas segregadoras de ensino especial e regular. (MANTOAN, 2007, p. 16).

O fato é que se evidencia que a educação brasileira não está sendo feita para todos. Ao observar as escolas, pode-se constatar que os alunos que possuem deficiência física ainda não têm acesso a uma educação de qualidade. O mesmo pode estar sendo privado do sonho de conseguir se qualificar na sua profissão de escolha, chegando ao mercado de trabalho sem as devidas competências, mas principalmente, saindo da escola sem estar devidamente preparado para a vida.

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garantir esse acesso. Apesar de leis que incentivam as mudanças do sistema, ainda existem muitos obstáculos, e o principal deles é a falta de vontade. Já são muitos os trabalhos que apontam como devem ser feitas essas mudanças.

A inclusão de pessoas com deficiência se resume a um grande desafio, seja pela falta de profissionais qualificados para fazer o adequado acompanhamento desses alunos, pela falta de disciplinas ou conteúdos programáticos que se refiram ao tema de necessidades especiais, investimentos em salas de Atendimento Educacional Especializado (AEE), falta de material adequado tanto para o discente como para o docente, dentre tantos outros fatores.

Cada vez mais é necessário que os educadores se qualifiquem de forma que possam atender a todas as pessoas que desejarem aprender. A instituição deve se adequar para receber seus alunos. De acordo com Mantoan (2007),

A educação como espaço disciplinar, mas também inter, trans e multidisciplinar, em que as fronteiras entre os distintos campos do conhecimento se entrecruzam e, muitas vezes, se tornam difusas, solicita cada vez mais dos profissionais que nela atuam a capacidade de dialogar e transitar por caminhos insólitos e desconhecidos. (MANTOAN, 2007, p. 7).

A desculpa de que os profissionais da educação não possuem qualificação profissional não cabe mais. Incluir o aluno com deficiência não é apenas matriculá-lo na escola. Vai muito além disso.

4.2 DISPOSITIVOS LEGAIS

Ao longo dos anos, a forma como a sociedade vem olhando para os jovens com deficiências físicas está mudando, graças a acontecimentos e pessoas que tiveram a iniciativa de fazer a diferença. Políticas públicas estão sendo aperfeiçoadas com o intuito de garantir o acesso e permanência desse jovem na escola. É certo que muita coisa ainda precisa ser feita, mas algumas conquistas já podem ser destacadas.

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Fazer valer o direito à educação para todos não se limita a cumprir o que está na lei e aplicá-la, sumariamente, às situações discriminadoras. O assunto merece um entendimento mais profundo da questão de justiça. A escola justa e desejável para todos não se sustenta unicamente no fato de os homens serem iguais e nascerem iguais. (MANTOAN, 2007, p. 16)

Adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos do Homem4 foi o primeiro e importante marco. Mesmo não sendo o primeiro texto do gênero, seu objetivo é garantir os direitos dos homens. Ela não se caracteriza como lei, mas é utilizada como norte para tomada de decisões da comunidade internacional, servindo como forte base moral. Segundo ela, é direito de todas as pessoas o acesso à educação.

Outro encontro que merece destaque foi a Convenção sobre os Direitos da Criança5, que ocorreu em 20 de novembro de 1989, sendo ratificada no Brasil em 24 de setembro do ano seguinte. No Art. 1º, é definida como criança todo ser humano menor de 18 anos de idade, a menos que ela consiga, dentro das leis, a maioridade antes. No quinto princípio, além de expor os direitos dos portadores de necessidades especiais, também deixa clara a responsabilidade dos educadores de valorizar esses indivíduos como seres pertencentes à sociedade.

Em 1994, a UNESCO realizou a Conferência Mundial de Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade6. O intuito do encontro foi trazer a discussão sobre o tema, aprofundando-a, e problematizar as causas que levam à exclusão escolar. Seu principal objetivo foi promover a educação para todos. Com base nesse encontro e no que foi refletido, surge, através do documento (Declaração de Salamanca e Linha de Ação Sobre Necessidades Educativas Especiais), a proclamação de que a escola é o

4 Declaração Universal dos Direitos do Homem pode ser encontrada no site da Unicef.

https://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10133.htm Acesso: 20/04/2018 às 10:11.

5 Convenção sobre os Direitos da Criança: Considerada como o instrumento de direitos humanos mais

aceito na história universal, ratificado em 196 países. Pode ser encontrado no site da Unicef (https://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10120.htm)

6 Conferência Mundial de Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade: foi uma

conferência realizada entre 7 e 10 de junho de 1994, em Salamanca na Espanha. Promovida pelo governo espanhol em colaboração com a Unesco. Teve como resultado a Declaração de Salamanca, documento que trata de políticas e princípios para a área de necessidades educativas especiais.

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meio de combate às causas dessas exclusões.

A Declaração de Salamanca7 e Linha de Ação sobre Necessidades Educativas Especiais (UNESCO, 1994) afirma que “O princípio fundamental desta “Linha de Ação” é de que as escolas devem acolher todas as crianças, independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas e outras. (MEC/SECADI, 2015, p. 3).

Nesta, ficou acordado o empenho da comunidade mundial em garantir que este direito seja atendido, independentemente das diferenças e particularidades de cada cidadão, ficando assim os Estados intimados a garantir que a educação de pessoas com deficiência faça parte do sistema educativo.

Em 1999, ocorreu a Convenção da Guatemala8, sendo promulgada no Brasil, pelo Decreto nº 3.956/2001, a qual firma que

[...] as pessoas com deficiência têm os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que as demais pessoas, definindo como discriminação com base na deficiência toda diferenciação ou exclusão que possa impedir ou anular o exercício dos direitos humanos e de suas liberdades fundamentais. Este decreto tem importante repercussão na educação, exigindo uma reinterpretação da educação especial, comprometida no contexto da diferenciação, adotado para promover a eliminação das barreiras que impedem o acesso à escolarização. (MEC/SECADI, 2015, p. 4)

O primeiro instrumento brasileiro voltado para o atendimento educacional à pessoa com deficiência aparece com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDBEN), em 1961, a Lei nº 4.024/61. Esta fundamenta o direito dos “excepcionais” à educação, de preferência no sistema de ensino geral. Dez anos depois, a lei nº 5.692/71, a nova versão da LDBEN, em seu Art. 9, altera a anterior definindo um “tratamento especial”

7 Declaração de Salamanca: documento elaborado na Conferência Mundial de Necessidades

Educativas Especiais, sendo considerado um dos principais que visam a inclusão social. O objetivo é o fornecimento de diretrizes básicas que ajudem a formular e reformar políticas e sistemas da Educação.

8Convenção da Guatemala: ocorreu em 28 de maio de 1999, com o intuito de favorecer a integração

na sociedade de pessoas com deficiências físicas, assim como prevê a eliminação de todas as formas de discriminação contra essas pessoas.

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para todos os estudantes que apresentem “deficiências físicas, mentais, (...)”.

O problema com essas duas leis é que, até então, não se falava de um sistema de ensino que fosse capaz de atender as particularidades dos estudantes, colocando-os como excepcionais, ou seja, crianças e jovens fora do comum. Além disso, o processo de aprendizagem acontecia em classes especiais, o que causava uma exclusão desse aluno do meio social.

Em 1973, o MEC cria o Centro Nacional de Educação Especial (CENESP), proporcionando assistencialismo e gerenciando a educação especial no país. Todavia, não se falava ainda em políticas públicas para o acesso ao ensino universal. Tudo se resumia a ações isoladas promovidas pelo Estado. Somado a isso, o que existia era uma integração do aluno, ou seja, cabia a este se adaptar ao sistema educacional. Pensando no bem de todos e na universalização do ensino, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 205, estabelece que a Educação seja, além de um dever do Estado, um direito de todos, “garantindo o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho”. No artigo 206, estabelece a igualdade de condições para o acesso e permanência do aluno na escola. Já no artigo 208, garante como dever do Estado a oferta do atendimento especializado, preferencialmente na rede regular de ensino.

Surge, a partir daí, a “inclusão” desse aluno no sistema, ou seja, este deve compreender a necessidade de ações para que o referido aluno não seja excluído do processo da aprendizagem.

Os diversos estudos já realizados no campo da inclusão mostram que está ocorrendo uma mudança cultural e social. Várias já foram as modificações feitas na própria legislação, bem como nas práticas pedagógicas. Entrementes, ainda há uma necessidade de se reestruturar as escolas para receber esses alunos com necessidades especiais.

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A Constituição da República Federativa do Brasil, de 19889, no seu Título II dos direitos e garantias fundamentais, Capítulo I dos direitos e deveres individuais e coletivos, diz em seus artigos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, (...).

Em seu capítulo III, complementa:

Art. 205 A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

No Art. 206, fica determinado que o ensino deve ter como base alguns princípios, como o da igualdade do acesso e permanência, a liberdade de aprender e a garantia do padrão de qualidade, por exemplo.

É dever do Estado garantir o atendimento especializado aos alunos que possuem deficiências físicas, preferencialmente na rede regular de ensino, como aponta o Art. 208. Além disso, o aluno deve ter o direito de acesso aos níveis mais elevados de ensino segundo a capacidade que cada um carrega.

Também é dever do Estado garantir o transporte, a alimentação, bem como o material didático-escolar.

No seu Art. 214, ela cita que as ações do poder público devem conduzir a erradicação do analfabetismo, bem como o atendimento escolar de forma universal, melhoria na qualidade de ensino, para que o aluno tenha uma formação adequada também para o mercado de trabalho.

4.3.1 A lei e o ensino de alunos surdos

A lei 8069/90 foi tomada como base para a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Em seu Capítulo IV, o Art. 54 aponta que é dever do Estado garantir à

9 Constituição Federal de 1988 As leis citadas acima poderão ser consultadas neste link:

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criança e ao adolescente o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, de preferência na rede regular de ensino. O mesmo artigo ainda aborda a questão do atendimento que se dá em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade. (BARBOSA, 2007, p. 48). Para a autora, esse atendimento, sendo iniciado tão cedo, permite ao aluno a inclusão desde o início de suas vidas.

A lei de Diretrizes e Bases de 1996, em seu Capítulo V – Educação Especial – estabelece que

Art.58° Entende-se por educação especial, para os efeitos dessa Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.

§1° Haverá, quando necessário, serviços especializados, na escola regular, para as peculiaridades da clientela da educação especial.

§2° O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular. (BARBOSA, 2007, p.48)

Entende-se, a partir desse artigo, que o aluno deve se matricular de preferência na rede regular de ensino, e que esta deverá oferecer o atendimento educacional especializado. Caso não seja possível esse atendimento na escola em que o aluno se matriculou, este poderá receber um atendimento em classes ou escolas especiais.

Art.59°. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais:

I-currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específica, para atender às suas necessidades; II- terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados;

III- professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para o atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;

IV- educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive, condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação superior com os

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órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artísticas, intelectual ou psicomotora;

V- acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.

(BARBOSA, 2007, p. 49)

O Art. 59 aponta que os sistemas de ensino devem proporcionar técnicas e métodos para os alunos com Necessidades Educacionais Especializadas (N.E.E.), que possam melhorar a sua condição de estarem inseridos no sistema regular de ensino, ao mesmo tempo atendendo às necessidades dos estudantes. Assegura, ainda, que os alunos devem ser acompanhados por professores que possuam uma formação voltada ao ensino especializado, para que possam promover sua integração. O Art. 59 deixa claro que os sistemas de ensino devem promover a educação, proporcionando ao aluno especial o desenvolvimento das suas potencialidades para que possam exercer sua cidadania e estejam aptos para o trabalho e sua integração na sociedade.

A lei n° 10.436/2002 10 reconhece a LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais – como a língua utilizada pela comunidade surda brasileira.

Art. 1º- É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS – e outros recursos de expressão a ela associados.

Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS – a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constitui um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil.

Art.2° Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e difusão da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS – como meio de comunicação objetiva e de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil.

(BRASIL, apud BARBOSA, 2007)

10Lei n° 10.436/2002, de 24 de abril de 2002 disponível em:

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Para Barbosa (2007), o Art. 1º reconhece a LIBRAS como o meio de comunicação oficial da comunidade surda, dando-lhe, em seu parágrafo único, o status de língua. No Art. 2º, fica claro que a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS – deve ser apoiada e divulgada, além de ser promovida a sua difusão. Esta é o meio de comunicação e utilização das comunidades surdas e, por isso, deve ser garantida também a acessibilidade do uso da mesma. Este artigo permite ao aluno surdo usar a LIBRAS como sua língua oficial, inclusive dentro do sistema de ensino no qual está inserido, seja ele especial ou não.

Art.4° O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais, municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e superior, do ensino da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, conforme a legislação vigente.

Parágrafo único. A Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS não poderá substituir a modalidade escrita da Língua Portuguesa. (BRASIL, apud BARBOSA, 2007)

Deve-se garantir que a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, utilizada pelas comunidades surdas do Brasil, seja difundida e aceita como o principal meio de comunicação deles. Logo, é necessário que sejam oferecidos cursos de formação voltados para a Educação Especial, seja no nível médio ou superior, fazendo parte, inclusive, dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN. Porém, segundo o Art 4º do capítulo V, a LIBRAS não poderá substituir a modalidade escrita da língua portuguesa. O Decreto 5626/2005, que regulamenta a Lei n° 10.436/2002, se dirige à educação do aluno com surdez. Em seu capítulo IV, Art. 14, afirma que as instituições federais de ensino deverão, obrigatoriamente, proporcionar a estes alunos o acesso à comunicação, informação, conteúdos curriculares etc., em todos os níveis, etapas e modalidades da educação, desde a educação infantil até o ensino superior.

No mesmo artigo, fica ainda estabelecido que estas instituições deverão garantir o atendimento educacional especializado (A.E.E.), promovendo também cursos de formação para professores, uso e ensino de LIBRAS, o ensino da Língua Portuguesa como segunda língua para alunos surdos. (BRASIL apud BARBOSA, 2007).

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No seu Art. 1511:

Para complementar o currículo da base nacional comum, o ensino de LIBRAS e o ensino da modalidade escrita da Língua Portuguesa, como segunda língua para alunos surdos, devem ser ministrados em uma perspectiva dialógica, funcional e instrumental, como:

I - atividade ou complementação curricular específica na educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental; e II - áreas de conhecimento, como disciplinas curriculares, nos anos finais do ensino fundamental, no ensino médio e na educação superior.

4.4 A SURDEZ E OS PROCESSOS COGNITIVOS

Diversos estudiosos vêm pesquisando sobre como o pensamento e a cognição dos sujeitos que possuem deficiência auditiva se desenvolvem. É claro que, se a criança não consegue ter acesso a uma língua para que possa interagir com o mundo a sua volta, a sua cognição será formada com sérios problemas. Estes indivíduos estarão muito aquém daqueles que crescem interagindo com tudo ao seu redor. Ou seja, se a criança tiver essa interação, os processos de aquisição da linguagem podem ocorrer de maneira similar à de uma criança ouvinte. (MELO; et al., 2015)

Esses estudos indicam que a linguagem não serve apenas como uma ponte de interação, mas é fundamental para a construção do pensamento, bem como o desenvolvimento cognitivo e psíquico do indivíduo. Além disso, a linguagem é utilizada para que o ser humano expresse esse pensamento, bem como os seus sentimentos, fazendo do mesmo um sujeito social. (MELO; et al., 2015)

É fato que a linguagem está presente em nosso cotidiano, sendo utilizada para a comunicação, aprendizagem, expressão dos sentimentos e dos pensamentos. As pesquisas sobre como essa ferramenta humana influencia na cognição vêm gerando diversas teorias.

11 O Art. 15º Pode ser encontrado no link:

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Na visão inatista, a evolução psicológica seria algo herdado, ou seja, genético. Cabe ao mundo exterior apenas facilitar ou limitar essa evolução. Mas a capacidade de raciocínio, de compreensão, seria algo biológico que a criança carrega desde o nascimento. Ou seja, todas as crianças podem desenvolver a capacidade da linguagem, desde que seja exposta a ela, podendo ser amadurecida com as experiências vividas pelo indivíduo no decorrer da sua vida. Cabe o entendimento aqui de que a exposição à língua pode se dar de forma oral-auditiva ou gestual-visual. (MELO; et al., 2015)

Uma crítica a esta teoria se dá pelo fato da aprendizagem depender do desenvolvimento da criança, pois sabe-se que nem todas aprendem do mesmo jeito, ou na mesma quantidade ou qualidade. Nessa visão, valoriza-se a individualidade, o potencial de cada um.

A Teoria do Gerativismo, proposta por Noam Chomsky, baseia-se no fato de que, a partir de um conjunto de regras, o indivíduo possa criar um número infinito de sequências. “A língua é uma estrutura de formas e conceitos baseada num sistema de regras que determinam suas inter-relações, arranjos e organização. Mas essas matérias-primas finitas podem se combinar para resultar num produto infinito”. (CHOMSKY apud MELO et al.,2015, p. 93).

Goldfeld (2002), baseado nas ideias de Vygotsky, registra:

O cérebro humano é extremamente flexível e se adapta as diferentes circunstâncias. Assim, a espécie humana é a que se apresenta menos pronta ao nascer, porém seu desenvolvimento irá depender do que o ambiente fornecer, pois essa flexibilidade do cérebro vai se adaptando e vai funcionando de um determinado jeito. (VYGOTSKY apud MELO et al. 2015, p.95)

Para que as crianças possam entender o significado das palavras, símbolos e, assim, adquirir novos conhecimentos, é necessário que haja interação destas com o meio que as rodeia. Assim, podem assumir valores e papeis sociais.

Para Lev Vygotsky, o indivíduo e o meio em que ele existe estão interligados, portanto, um modifica o outro. Segundo Melo; et al., (2015), o pensamento e a linguagem estão conectados. O primeiro diz respeito à capacidade que o ser humano tem de resolver

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situações, tomar decisões; e o segundo trata da manifestação desse pensamento. Através dela, os indivíduos interagem entre si trocando experiências, saberes, construindo-se. Por meio dessa troca, o caráter do homem se forma.

A influência do meio externo é de suma importância para a aquisição da linguagem e constituição do sujeito, pois determina como este irá aprender as informações e significados do mundo de forma ativa e plena, de modo que este sujeito se torne capaz de dialogar com sua própria subjetividade através de sua aprendizagem e do modo de ver o mundo. (MELO; et al., 2015, p. 95).

De acordo com Piaget, a criança precisa da interação com o meio e com outros indivíduos para que o seu desenvolvimento evolua de forma gradativa e o seu aprendizado se consolide. Em sua teoria da epistemologia genética, ele afirma que o indivíduo deve passar pelos estágios de desenvolvimento para que os processos, tanto linguísticos, como cognitivos, possam se desenvolver.

Segundo Santana (2007), Piaget é um dos autores que defende que a linguagem é parcialmente relacionada com a cognição. É “graças à linguagem que a criança se torna capaz de evocar situações do passado e de se liberar do espaço próximo e do presente. Por essa razão, tende-se a acreditar que a linguagem é a fonte do pensamento” (SANTANA, 2007, p. 205). A autora aponta ainda que, para Piaget, o pensamento existe antes da linguagem, sendo capaz de transformá-la de forma profunda, e que ajuda a atingir suas formas de equilíbrio por meio de esquematizações mais desenvolvidas e de abstração mais móvel.

Melo; et al. (2015) aponta que, segundo a teoria gerativista de Chomsky, nas crianças surdas o desenvolvimento da linguagem não depende da fala e audição, visto que se trata de um fenômeno mental. Logo, não é exatamente a ausência da audição, mas a falta de estímulos para a comunicação e interação com o mundo que irá gerar problemas cognitivos e emocionais. Em muitos casos, a própria família não consegue se comunicar de forma eficiente com o surdo.

Na escola, no convívio social, em casa, o surdo enfrenta o desafio de conviver com os ouvintes que, por não terem domínio da língua de sinais ou não terem a facilidade de se comunicar com gestos, acabam simplificando essa troca de informações. Para

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Poker (2002), essas interações com os ouvintes acabam acontecendo com a omissão de informações complexas, dados concretos, redução de fatos, não permitindo a troca de ideias e não estimulando a argumentação.

Ratificando as ideias anteriores, o maior problema para os surdos não é a deficiência em si, mas as privações às quais a sociedade acaba os submetendo. Se eles tiverem as oportunidades de desenvolver suas potencialidades, assim como as pessoas que não possuem deficiências, eles também desenvolverão os seus potenciais. Poderão estar incluídos em uma sociedade e poder exercer a sua cidadania como todos os demais cidadãos.

Segundo Santana (2007), quando o aluno alcança proficiência na língua, ele apenas está repassando uma informação com mais qualidade, ou seja, o fato de o aluno não ter uma língua não interfere na sua cognição.

A comunicação total também se enquadra nessa concepção, com o adendo de aceitar a língua de sinais, o português sinalizado e qualquer outra forma de comunicação que o surdo possa utilizar. Não há qualquer reflexão a respeito da “natureza” da linguagem, pois ela só é vista como sistema comunicacional, do qual os falantes são codificadores e decodificadores. A aquisição da linguagem não mudaria, assim, os processos cognitivos. (SANTANA, 2007, p. 210)

4.5 USO DA LIBRAS NA EDUCAÇÃO DE ALUNOS SURDOS

A Língua de Sinais, defendida por L’Epée, era vista como um complemento. Os surdos deveriam aprender a língua do seu país de origem. O Oralismo, defendido por Sicard, passou a ser utilizado no Instituto Nacional de Surdos-Mudos na França, segundo Moura (2000). Isso se deu devido à intervenção do Estado, que defendia que os surdos deveriam desenvolver a fala para aprender a Língua Francesa, integrando o surdo na comunidade ouvinte. Essa escolha do Oralismo ao invés da metodologia gestual, foi um dos motivos da decadência do instituto, pois havia dúvidas quanto a sua eficácia. Todos os alunos que não conseguiam aprender por essa metodologia eram considerados com incapacidade intelectual (MOURA, 2000).

Ainda segundo Moura (2000), em 1880 ocorreu o Congresso de Milão. O intuito era enfatizar as desvantagens do uso da Língua de Sinais na educação dos alunos surdos.

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Dentre os países que participaram (Bélgica, Canadá, Estados Unidos, Grã-Bretanha, Rússia e Suécia), apenas os Estados Unidos se mostrou contra o uso da metodologia do Oralismo, sugerindo a combinação da Língua de Sinais com a Oral. Estava presente também um único surdo para defender a Língua de Sinais como instrumento de comunicação da comunidade surda, bem como a sua educação. O Oralismo foi implantado e utilizado no século XIX e no começo do século XX. O Instituto para Surdos aplicou essa metodologia com suas crianças e verificou o quão ineficaz era, obtendo resultados que foram insatisfatórios (MOURA, 2000).

No Brasil, o método Oralista foi implantado no Instituto de Surdos-Mudos localizado no Rio de Janeiro, no século XX. Como ocorreu na Europa, os resultados não foram promissores. Só depois de muitas tentativas, que resultaram no total fracasso, o Instituto toma a iniciativa de seguir outros países (Alemanha, Estados Unidos e França), passando a pesquisar sobre os benefícios de se utilizar a Língua de Sinais (MOURA, 2000). Conhecido atualmente como INES, o Instituto Nacional de Surdos reconhece como metodologia eficaz o Bilinguismo.

O Bilinguismo é uma proposta metodológica que permite o acesso a duas línguas no contexto escolar. O aluno surdo tem como primeira língua, LIBRAS, podendo ser o Português, a língua oficial do país em que vive, ofertado como a segunda língua. Em alguns países, como a Venezuela, o uso do bilinguismo mostrou bons resultados no que diz respeito a uma melhor aprendizagem dos alunos.

Para a filosofia do Bilinguismo, a surdez é apenas uma diferença e não uma deficiência, logo, o surdo é capaz de realizar diversas tarefas, incluindo a comunicação com a comunidade ouvinte (MOURA, 2000).

Segundo Gonçalves & Festa (2013), mesmo que existam obstáculos, o aluno surdo deve ser incluso e ter as mesmas oportunidades que os alunos ouvintes, cabendo aos professores reconhecer as necessidades e elaborar metodologias e estratégias de ensino que sejam adequadas para a aprendizagem dos mesmos. Os professores devem criar as condições necessárias para que a aprendizagem aconteça de forma efetiva e que a inclusão seja uma realidade.

Um ambiente de colaboração em que as atividades são compartilhadas entre surdos e ouvintes, é o ideal para que

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aconteça o processo de inclusão, pois assim estarão sendo respeitadas e aceitas as diferenças individuais. A partir disso, vê-se a necessidade de refletir sobre uma didática flexível que ofereça o mesmo conteúdo curricular e que respeite as especificidades do aluno surdo sem perda da qualidade do ensino e da aprendizagem. (CARVALHO & BARBOSA apud GONÇALVES & FESTA, 2013).

Os professores devem se responsabilizar pelo aprendizado do aluno surdo, elaborando metodologias que sejam efetivas para as necessidades do discente. No entanto, parte dos professores prefere seguir ministrando as aulas tradicionalmente sem promover nenhuma mudança nesse quadro (GONÇALVES & FESTA, 2013). Uma outra metodologia que vem aparecendo como desejável para o ensino de alunos surdos é a Pedagogia Surda. Nessa perspectiva, o professor a ensinar também é surdo. Sendo assim, o aluno teria, desde o ensino infantil, aulas ministradas em LIBRAS por esses professores. Entrementes, esta metodologia é um desafio que está muito longe de ser vencido, principalmente no Brasil. O número de professores surdos qualificados para esta tarefa é muito pequeno, bem como o número de professores ouvintes que sejam fluentes em LIBRAS (KALATAI & STREIECHEN, 2012).

4.6 USO DA LIBRAS NO ENSINO DE FÍSICA

Vargas (2011) desenvolveu uma pesquisa na cidade de Campo Grande/MS sobre o ensino de física para alunos surdos. Como na maioria das escolas do país, muitos professores não sabem LIBRAS, o que torna necessária a presença de um intérprete na sala de aula. Uma das dificuldades mais observadas é a confusão que os alunos surdos fazem com alguns conceitos por não existirem sinais que expressem os fenômenos físicos de forma correta.

Pereira & Mattos (2017) apontam a precariedade de pesquisas que envolvam o tema “Ensino de Física para Alunos Surdos”, bem como a falta de professores qualificados para ensinar os conteúdos conceituais específicos (tais como manipulação de equações, elaboração e interpretação de gráficos e a compreensão dos fenômenos físicos), além da falta de material adequado para esse público. Ademais, mostram a importância e urgência do desenvolvimento de propostas educacionais que atendam essas necessidades, para que os alunos tenham a oportunidade de desenvolver as

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suas capacidades.

A escassez de símbolos específicos para os conceitos e fenômenos físicos também é um ponto que dificulta. A participação do intérprete no planejamento das aulas e a interação deste com o professor é imprescindível, haja vista que, em algumas situações, deve haver uma adequação da linguagem para o aluno. É o intérprete quem fará a ponte entre as duas línguas, o Português e a LIBRAS (PEREIRA & MATTOS, 2017).

Corrêa & Almeida (2017), em seu trabalho, trazem uma análise do material disponível no YouTube para o aprendizado dos alunos surdos. Para elas, o uso do livro didático, que é escrito em Português, limita a compreensão desses alunos. Sendo assim, o uso de materiais que possam auxiliar no ensino e que sejam confeccionados em LIBRAS, poderia ser mais eficaz.

Analisando vários tipos de vídeos, as autoras apontam que aqueles produzidos em uma perspectiva bilíngue poderiam ser utilizados em sala inclusiva, ajudando na divulgação da Língua de Sinais e aproximando os alunos surdos dos alunos ouvintes. O uso dessa metodologia favorece o surdo, uma vez que ele aprende através de uma língua visual-gestual. Além disso, os vídeos podem ajudar o aluno a ser mais independente nos estudos, principalmente em situações em que não há um intérprete disponível (CORRÊA & ALMEIDA, 2017).

4.7 AS SALAS DE RECURSOS MULTIFUNCIONAIS

A sala de recursos multifuncionais é um espaço dentro da própria escola que está dotado de equipamentos, recursos de acessibilidade, além de materiais pedagógicos utilizados pelos profissionais da sala para o desenvolvimento da escolarização dos alunos com necessidades educativas especiais, inclusive alunos surdos.

O MEC possui o Programa de Implantação das Salas de Recursos Multifuncionais, buscando um atendimento a esses alunos com qualidade. É destinado às escolas das

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redes estaduais e municipais de educação, desde que os alunos estejam registrados no Censo Escolar MEC/INEP.12

Existem salas do tipo I e do tipo II. As salas do tipo I contêm os seguintes itens:

Figura 1 - Sala tipo I Fonte: Manual de Orientação: Programa de Implantação de Sala de Recursos Multifuncionais (MEC, 2010, p. 32)

A sala do tipo II, além de conter os recursos da sala tipo I, contém os recursos de acessibilidade para alunos com deficiência visual.

Figura 2 - Especificação da sala tipo II. Fonte: Manual de Orientação: Programa de Implantação de Sala de Recursos Multifuncionais (MEC, 2010, p.33)

12 Fonte: < http://portal.mec.gov.br/implantacao-de-salas-de-recursos-multifuncionais > Acesso: 01

Referências

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