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O significado de cuidados paliativos aos enfermeiros que atuam em neonatologia

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FERNANDA DE CASTRO DE OLIVEIRA

O SIGNIFICADO DE CUIDADOS PALIATIVOS PARA

ENFERMEIROS QUE ATUAM EM NEONATOLOGIA

CAMPINAS 2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Enfermagem

FERNANDA DE CASTRO DE OLIVEIRA

O SIGNIFICADO DE CUIDADOS PALIATIVOS PARA ENFERMEIROS

QUE ATUAM EM NEONATOLOGIA

Dissertação apresentada à Faculdade de Enfermagem da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Mestra em Ciências da Saúde, na Área de Concentração: Enfermagem e Trabalho.

ORIENTADORA: Profa. Dra. Elenice Valentim Carmona

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA FERNANDA DE CASTRO DE OLIVEIRA

E ORIENTADA PELA PROFA. DRA. ELENICE VALENTIM CARMONA.

CAMPINAS 2015

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Dedico este trabalho a toda equipe de enfermagem que tão brilhantemente realiza seu trabalho cuidando de pacientes em situações delicadas e, muitas vezes, no limite da vida. Em especial aos enfermeiros que trabalham em neonatologia que foram objetivo desse estudo.

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Agradeço primeiramente ao meu Senhor e Salvador Jesus Cristo, o qual tem demonstrado seu amor por mim em cada detalhe da minha vida. Que me presenteou com a oportunidade de realizar este estudo, me capacitando para realizá-lo.

À minha família, meus pais e minha irmã, por todo apoio e investimento ao longo de toda a minha vida acadêmica e profissional. Vocês são responsáveis pelo meu crescimento e por eu ter conseguido chegar onde estou.

À minha grande amiga e parceira Jéssica, que me apresentou o estudo em cuidados paliativos, me ajudou a idealizar e escrever este projeto antes mesmo de existir a possibilidade de se tornar uma dissertação de mestrado.

À profa. Dra. Elenice, minha querida orientadora, por ter confiado no meu trabalho, me incentivado e compartilhado comigo suas experiências e conhecimento. E por ter sido não somente uma orientadora, mas se tornado uma amiga.

À profa. Dra. Ana Regina, nossa co-orientadora, por meio da qual tive as primeiras idéias sobre o cuidado paliativo e por compartilhar tanto o seu conhecimento em CP, como em pesquisa qualitativa.

Aos meus amigos e parceiros de trabalho, por dividirem comigo essa experiência tão enriquecedora de atuar em neonatologia e por aceitarem participar dessa pesquisa.

As enfermeiras Cristiane, Aline e Lídia, que tanto me ajudaram possibilitando trocas de folga ou de turno de trabalho.

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meu namorado Gustavo e meus tios Bene e Carlos.

E a todos que direta ou indiretamente me incentivaram e auxiliaram para que esse trabalho se realizasse e finalizado.

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Este estudo teve como objetivo compreender o significado de Cuidados Paliativos para os enfermeiros que atuam em neonatologia. Trata-se de um estudo exploratório e descritivo, com abordagem qualitativa. A investigação foi realizada em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal de um hospital público de ensino, no Estado de São Paulo. Os sujeitos da pesquisa foram nove enfermeiras desta unidade, que cuidam de neonatos internados sem perspectiva de cura. Os dados foram coletados por meio de entrevista semi-estruturada, realizada individualmente, e analisados sob a perspectiva da fenomenologia, com apoio do referencial teórico de Martin Heidegger. Da análise temática emergiram quatro categorias: “Emoções frente ao Cuidado Paliativo Neonatal”, “Confrontando os Cuidados Paliativos e a Morte”, “Vivendo o Desamparo”, “Cuidando do recém-nascido e família”. Os resultados mostram a carência de uma formação voltada também aos aspectos subjetivos do cuidado. As enfermeiras trazem ainda a necessidade de suporte institucional, seja por cursos de capacitação ou pela existência de ambientes e ações que possam cuidar do profissional. Verifica-se ainda a importância da mudança de paradigmas relacionados à morte e ao processo de morrer.

Descritores: Cuidados paliativos, Cuidados de enfermagem, Unidades de Terapia

Intensiva Neonatal, Pesquisa qualitativa.

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This study aimed to understand the meaning of palliative care for neonatal nurses. It is an exploratory and descriptive study with qualitative approach. The research was developed at a Neonatal Intensive Care Unit of a public teaching hospital, in São Paulo State, Brazil. Subjects were nine nurses who care for neonates with no prospect of cure. Data were collected through semi-structured interview, individually, and analyzed from the perspective of phenomenology, supported by theoretical framework of Martin Heidegger. Four categories emerged from nurses´ reports: "Emotions on Neonatal Palliative Care ", "Confronting Palliative Care and Death", "Living the Helplessness", "Taking care of the newborn and its family." Results showed lack of professional education related to subjective aspects of care. Nurses also mentioned needs of institutional support, either by training courses or opportunities of receiving care. The data bring the importance of changing paradigms related to death and dying process.

Descriptors: Palliative care, Nursing care; Intensive Care Units, Neonatal;

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1. Introdução ... 12

1.1. O interesse pelo tema ... 12

1.2. Cuidado de enfermagem ao recém-nascido de risco e família ... 13

1.3. Cuidados Paliativos ... 16

1.3.1 Definições e princípios ... 16

1.3.2. Breve histórico ... 18

1.3.3. Cuidados Paliativos em Neonatologia ... 21

2. Objetivos ... 23

3. Percurso Metodológico ... 24

3.1. Apresentação da pesquisa qualitativa fenomenológica ... 24

3.1.1. A fenomenologia existencial de Martin Heidegger ... 25

3.2. Cenário do estudo ... 28

3.3. Participantes do estudo ... 29

3.4. Acesso aos participantes ... 30

3.5. Processamento e análise dos dados ... 31

3.6. Aspectos éticos ... 33

4. Apresentação e Discussão dos Resultados ... 34

4.1. Emoções frente ao cuidado paliativo neonatal ... 34

4.1.1. Paradoxo de emoções coexistindo no cuidado ... 34

4.1.2. Frustração e Tristeza ... 38

4.1.3. Sentindo-se enlutado ... 42

4.2. Confrontando os cuidados paliativos e a morte ... 45

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4.2.3. Racionalização ... 49

4.2.4. Identificação Projetiva ... 51

4.3. Vivendo o desamparo ... 54

4.3.1. Falta de formação profissional ... 54

4.3.2. Falta de protocolo ... 56

4.3.3. (In)Compreendendo o cuidado paliativo ... 58

4.3.4. Acolhendo o profissional ... 60

4.4. Cuidando do recém-nascido e família ... 63

4.4.1. Dificuldade de lidar com a família ... 64

4.4.2. Empatia pelos pais ... 66

4.4.3. Lidando com a esperança dos pais ... 69

4.4.4. Cuidado Humanizado ... 70 5. Considerações Finais ... 75 6. Referências ... 77 7. Apêndices ... 81 7.1. Apêndice I ... 81 7.2. Apêndice II ... 84 8. Anexos ... 85 8.1. Anexo I ... 85 8.2. Anexo II ... 86 8.3 Anexo III ... 88        

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1.

Introdução

1.1. O interesse pelo tema

O interesse por Cuidados Paliativos (CP) surgiu em 2011, ano em que participei de um grupo de estudo em CP na Faculdade de Enfermagem, com a Profa. Dra. Ana Regina Borges Silva. No final do mesmo ano, participei de um curso em CP oferecido pela Sociedade de Medicina e Cirurgia de Campinas (SMCC). Assim, pude me aproximar ainda mais do tema, o que intensificou meu interesse.

Em abril de 2012, iniciei minha atuação como enfermeira de uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), surgindo a oportunidade de desenvolver um projeto de pesquisa junto aos enfermeiros que atuam nessa área. Esse projeto foi amadurecido e repensando durante o ano de 2012. Assim, em 2013, com a participação da Profa. Dra. Elenice Valentim Carmona na pós-graduação, inscrevi-me no processo seletivo para o Mestrado em Enfermagem, uma vez que a professora em questão participa da linha de pesquisa “Processo de Cuidar em Saúde e Enfermagem” e está vinculada ao tema de “Assistência de Enfermagem ao Recém-Nascido de Risco e Família”. Portanto, alguém que poderia acolher meu projeto e me acompanhar neste processo de aprendizagem e investigação.

Após a aprovação no processo seletivo, iniciei o desenvolvimento do estudo e a busca de conhecimentos que pudessem contribuir para o meu desenvolvimento pessoal, para minha atuação em neonatologia, bem como colaborar com outros enfermeiros e com a equipe de saúde. Estes, como eu, deparam-se com recém-nascidos que estão fora de possibilidade terapêutica curativa, uma vez que o cuidar é inerente a todo o ciclo vital, o que inclui o processo de morrer, e que nem sempre é possível alcançar a cura.

Percebi, ao longo da experiência profissional pessoal, a dificuldade dos profissionais em lidar com o processo de morte, pois muitos o encaram como fracasso diante das doenças e não encontram espaço nas instituições de saúde para discutir o assunto. As minhas próprias angústias e esta observação desencadearam o interesse

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em desenvolver este estudo, visando desvelar qual é a compreensão de enfermeiros neonatais sobre CP.

1.2. Cuidado de enfermagem ao recém-nascido de risco e família

O cuidado em enfermagem está associado à manutenção da vida, à assistência nas necessidades do paciente e estabelecimento do conforto, procurando-se sempre oferecer cuidado de boa qualidade, mesmo quando não há possibilidade terapêutica de cura e de continuidade da vida (Furtado et al., 2011; Aguiar et al., 2006; Souza et al., 2005).

O cuidar do ser humano deve abranger todos os seus aspectos: físico, mental, social, psicológico e espiritual, desde o nascimento até a morte. Tal cuidado é o que norteia a Enfermagem, mesmo antes de ser instituída como profissão, em 1860, por Florence Nightingale, e é caracterizado pela atenção com que o profissional assiste ao paciente, ajudando-o em suas necessidades, buscando atendê-lo com interesse, dedicação e zelo. Na enfermagem, o cuidado aproxima-se da idéia do humanismo, o que se caracteriza por colocar-se no lugar do outro, proteger, promover e preservar a humanidade, ajudando a pessoa a encontrar significado em sua existência, mesmo em momentos de dor, sofrimento e doença. É auxiliar o indivíduo no desenvolvimento do autoconhecimento e autocuidado, mantendo a harmonia interna, independente dos conflitos externos. É um agir solidário tanto na vida quanto na morte (Furtado et al., 2011; Aguiar et al., 2006; Souza et al., 2005).

Independentemente dos avanços tecnológicos em saúde, a morte muitas vezes é inevitável e os profissionais de saúde usualmente encontram barreiras emocionais para lidar com tal processo. Para mascarar essa dificuldade e amenizar a sensação de fracasso, buscam ater-se à instalação de equipamentos de suporte vital, manobras de reanimação cardiopulmonar, entubação, entre outros, mesmo quando o paciente encontra-se com prognóstico fechado, ou seja, fora de condições terapêuticas curativas. Portanto, enquanto o processo de morrer for encarado como algo horrendo e

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estigmatizado, não será possível atender ao paciente em todas as suas necessidades em tal contexto. Situações relacionadas à impossibilidade terapêutica curativa e ao processo de morrer não são abordadas suficientemente no período de graduação em Enfermagem e as habilidades para lidar com elas são desenvolvidas pelos profissionais ao longo da vivência de trabalho. Contudo, conforme encontrado em literatura, os enfermeiros consideram importante o preparo profissional para lidar com tais situações (Furtado et al., 2011).

Apesar das barreiras existentes em lidar e aceitar a morte, as pessoas apresentam menor dificuldade quando este processo ocorre na fase de envelhecimento do paciente. Quando acontece no período neonatal, os profissionais de saúde e a família são grandemente confrontados (Caroça, 2009).

O período neonatal compreende desde o nascimento até o 28º dia de vida, no qual o recém-nascido (RN) passa por diversas adaptações fisiológicas e anatômicas. Quando ele apresenta prematuridade (nascimento antes de 37 semanas de idade gestacional) e/ou baixo peso (peso de nascimento abaixo de 2500g), malformações ou patologias principalmente dos sistemas cardiovascular, respiratório, gastrintestinal ou neurológico, são considerados de risco ou graves, o que faz com que necessitem de recursos humanos e tecnológicos específicos. Entretanto, apesar de tais recursos, dependendo da gravidade, a morte é inevitável (Bueno et al., 2007). Com isso, atualmente está sendo amplamente discutido, sob o ponto de vista ético, até que ponto recursos tecnológicos devem ser empregados em RN gravemente enfermos, uma vez que apenas postergam a morte.

RN vulneráveis, que precisam de hospitalização, abalam completamente a estrutura familiar, pois se trata de algo muito diferente do idealizado pelos pais: receber um RN saudável e levá-lo para casa. Quando um casal engravida, há toda uma preparação para o recebimento do bebê em casa, dando continuidade à família. As situações de prematuridade, malformações e doenças congênitas e, principalmente, a morte interrompem essas expectativas. Assim, a família vivencia sentimentos intensos, dentre eles culpa, medo e ansiedade. Com isso, ressalta-se a importância de inserir os

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pais no contexto da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), auxiliá-los a vivenciar o processo de hospitalização e morte, facilitando a aceitação dos pais frente ao inevitável. Para tanto, faz-se necessário ter uma equipe de saúde capacitada para acolhê-los e conversar sobre suas dúvidas a respeito da evolução clínica do bebê, de forma clara e objetiva. Ao longo deste processo, precisam entender como, onde e por que os RN morrem. Ou ainda, substituir a idéia do bebê sonhado pela do bebê real (Bueno et al., 2007; Souza, 2011).

Dados encontrados no sistema de informação DataSUS evidenciam que a mortalidade neonatal precoce (do nascimento até o sexto dia de vida) no Brasil, mudou de 13,8 mortes para cada 1000 nascidos vivos em 2000, para 9,2 em 2008. Já a taxa de mortalidade neonatal tardia, foi de 3,7 mortes por 1000 nascidos vivos em 2000 para 2,8 em 2008. Percebe-se que a taxa de mortalidade neonatal no país decresceu, mas o decréscimo pode estar fortemente ligado aos avanços tecnológicos e científicos que adiam a morte de RN sem possibilidade de cura (Bueno et al., 2007; Brasil, 2012).

Uma vez que os pacientes atendidos na UTIN necessitam de cuidados de alta complexidade e apresentam, frequentemente, risco iminente de morte, cada vez mais a perspectiva dos CP tem sido discutida e introduzida neste contexto de assistência, pensando-se em oferecer atendimento individualizado ao RN fora de possibilidades terapêuticas curativas e sua família. Tal perspectiva de CP inclui o cuidado àqueles que vivenciam doenças que levam a um quadro de cronicidade, bem como o risco de morte. Busca-se diminuir o desconforto físico do RN, bem como o emocional e espiritual da família, respeitando crenças e valores existentes. Quando necessário e possível, também cabe à equipe a reabilitação desse paciente, promovendo sempre a qualidade de vida, para que assim ele possa viver com suas limitações (Caroça, 2009; Bueno et al., 2007; Calasans e Amaral, 2013; Santana 2009).

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1.3. Cuidados Paliativos

A palavra “paliativa”, pallium, é originada do latim, com o significado de manto, proteção, utilizada na área da saúde para designar os cuidados prestados a pacientes fora de possibilidade terapêutica de cura. Nos últimos anos, o processo de viver se prolongou exponencialmente e a morte pode vir a ser um processo prolongado em anos ou décadas, visto que doenças mortais tornaram-se crônicas. Isto faz com que pacientes fora de possibilidade de cura permaneçam nos hospitais, recebendo tratamento inadequado, pois o foco continua sendo a cura e a recuperação, mesmo quando tais possibilidades não existam mais. Em função da falta de conhecimento dos profissionais de saúde, esses pacientes acabam passando por procedimentos desnecessários, exagerados ou insuficientes, uma vez que a equipe de saúde não se atenta para o sofrimento causado pela dor ou por outros sintomas. Dessa maneira, o CP traz a reflexão sobre a conduta que deve ser tomada frente à finitude humana, apontando para o equilíbrio entre o conhecimento científico-tecnológico e o cuidado humanizado que visa resgatar a dignidade da vida e da terminalidade, com a possibilidade de se morrer em paz (Hermes e Lamarca, 2013; ANCP, 2009).

1.3.1 Definições e princípios

A Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu, em 1990 e com redefinição em 2002, CP como o cuidado prestado a pacientes que não respondem mais à medicina curativa, mas com necessidades para o controle da dor e de outros sintomas físicos, problemas psicossociais e espirituais, com objetivo de proporcionar melhor qualidade de vida a esses pacientes e sua família (ANCP, 2009).

Portanto, todos os pacientes que recebem o diagnóstico de doenças graves, progressivas e incuráveis, que ameacem a vida, deveriam receber uma abordagem paliativa de cuidado. Na medicina curativa o médico é o responsável maior pelo cuidado, sempre com a idéia de perseverar e não dar-se por vencido. Já na medicina

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paliativa, o paciente é o soberano e o foco passa a ser a dignidade humana, enfatizando a relação existente entre paciente, família e profissional da saúde. Além da dignidade humana, os CP visam proporcionar qualidade de vida desde o diagnóstico da doença, durante o seu desenvolvimento, no processo de morrer, na morte do paciente; o que abrange ainda o período de luto para familiares que precisam ser lembrados e assistidos, por meio da atuação de uma equipe multidisciplinar (ANCP, 2009).

É importante lembrar que quando trabalhamos com CP, alguns conceitos são revistos, pois ao contrário de se pensar em terminalidade, considera-se que o paciente tem uma doença que coloca sua vida em risco. É afastada a idéia de que não há mais nada a fazer, mas que existe uma possibilidade de terapêutica não curativa. Dessa forma, os princípios de CP estão compreendidos em: promover o alívio da dor e de sintomas desagradáveis; afirmar a vida e considerar a morte um processo normal desta; não acelerar nem adiar a morte; integrar os aspectos psicológicos e espirituais no cuidado ao paciente; oferecer um sistema de suporte que possibilite ao paciente viver tão ativamente quanto possível até o momento da sua morte; oferecer sistema de suporte para auxiliar os familiares durante a doença do paciente e o luto; melhorar a qualidade de vida e influenciar positivamente o curso da doença; iniciar o mais precocemente possível o cuidado paliativo, juntamente com outras medidas de prolongamento da vida e incluir todas as investigações necessárias para melhor compreender e controlar situações clínicas estressantes (ANCP, 2009).

Além do despreparo profissional ou da resistência dos profissionais a aderir ao paradigma do cuidar de pacientes fora de proposta de cura, bem como a falta de iniciativa das universidades em incluir a temática no curso de graduação ou pós-graduação, as principais dificuldades encontradas na prática dos CP no Brasil são: a inserção dos CP na atenção básica; o tamanho continental do país; a resistência médica para liberação do atestado de óbito em domicílio; a diferença de acesso aos sistemas de saúde; a logística da dispensação dos medicamentos de alto custo, bem como o armazenamento e distribuição daqueles de uso restrito, utilizados para o controle da dor (Hermes e Lamarca, 2013; ANCP, 2009; Sales et al., 2009).

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A proposta dos CP em incluir a ação de uma equipe multidisciplinar visa a atenção que deve ser dada ao paciente em todas as suas necessidades: física, mental, espiritual e social. Pois, quando uma esfera funciona mal, todas as outras são afetadas. Sendo assim, é fundamental que toda a equipe esteja entrosada entre si e com as necessidades do paciente, podendo assim realmente contribuir para sua melhora (Hermes e Lamarca, 2013).

1.3.2. Breve histórico

Ao mesmo tempo em que os CP são uma realidade vivenciada por muitos pacientes nas instituições de saúde, ainda são desconhecidos por muitos profissionais que trabalham com pacientes em fase terminal. Isso porque são cuidados ainda recentes no país e pouco abordados nos cursos de graduação (Hermes e Lamarca, 2013), como mencionado anteriormente.

Apesar de descrito desde a antiguidade, o CP contemporâneo teve seu início no século passado, em 1967, com DameCecilySaunders, enfermeira, assistente social e médica, após fundar o HospiceSt. Christopher, em Londres: local destinado a pacientes adultos com doenças terminais, tendo-se a perspectiva da morte como um processo natural e o cuidado realizado de forma a não adiar a morte, mas promover alívio da dor e de diversos sintomas que advém da doença, além de ajudar a família no processo de luto (Furtado et al., 2011; Hermes e Lamarca, 2013; Pessini e Bertachini, 2005).

Após cuidar de um doente com câncer avançado, Saunders teria se conscientizado das necessidades dos pacientes em processo de morte. A partir daí voltou-se à causa da qual se tornaria uma líder: os cuidados dos pacientes em fase avançada de doença, dedicando-se a difundir a ideia de uma nova forma de assistência à fase final de vida. Assim, trabalha, a partir dos anos 60, do século XX, reivindicando a necessidade de desenvolvimento de uma medicina direcionada a essa etapa da vida e da doença, que mais adiante será denominada de medicina paliativa, centrada no controle da dor e dos sintomas destes doentes (Menezes, 2004).

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Cecily Saunders associa-se a políticos, advogados e à igreja com o objetivo de integrar os cuidados aos doentes fora de possibilidade de cura ao sistema nacional de saúde da Inglaterra, bem como difundir a necessidade de formação dos profissionais na área médica com conhecimentos específicos. Desta forma, movimentos de protesto contra o abandono dos moribundos pelo sistema de saúde inglês foram se expandindo e, em 1985, foi fundada a Associação de Medicina Paliativa da Grã-Bretanha e Irlanda e, a Inglaterra foi o primeiro país a reconhecer, em 1987, a Medicina Paliativa enquanto especialidade médica (Menezes, 2004).

Vale ressaltar que já existiam outros hospices com o objetivo de cuidar de pessoas em processo de morte. O primeiro uso da palavra com este significado deu-se em Lyon, na França em 1842, por Madame Jeanne Garnier, que fundou vários

hospices. No entanto, o St. Cristopher’s Hospice foi o primeiro a integrar pesquisa,

ensino e assistência em CP, agregando cuidados domiciliares, apoio às famílias no curso da doença e seguindo no pós-morte do paciente com atendimento especializado ao luto. Este modelo de assistência causou impacto nos Estados Unidos, que em 1974 por meio do Connecticut Hospice, passa a oferecer serviços de home care com equipes multidisciplinares e, também, com voluntários, mas sem leitos de internação hospitalar de retaguarda. Outros serviços foram criados nos Estados Unidos, Canadá, no continente europeu e na América Latina (Santos 2011).

No Brasil CP inicia-se por iniciativa exclusiva dos profissionais, que atuavam cuidando de pacientes oncológicos. Uma das primeiras iniciativas de formação de serviço foi com a Dr.ª Miriam Martelete, em 1983, no Hospital das Clínicas de Porto Alegre (RS), seguidas por outras iniciativas ao longo do período como a criação do Serviço de Cuidados Paliativos do Instituto Nacional do Câncer (INCA), no Rio de Janeiro, em 1986. Em 1997 criada a Associação Brasileira de Cuidados Paliativos, em São Paulo, e, em 2005 a Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), outros hospitais públicos e privados vem oferecendo diversas formas de prestação de CP (Santos 2011).

Por meio da ANCP avançou a regularização profissional do paliativista no país, estabeleceu-se critérios de qualidade para os serviços de CP, definição dos conceitos

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sobre o que são CP levando a discussão para o Ministério da Saúde, Ministério da Educação, Conselho Federal de Medicina (CFM) e Associação Médica Brasileira (AMB). Participando ativamente da Câmera Técnica sobre Terminalidade da Vida e Cuidados Paliativos do CFM, colaborando na elaboração de duas resoluções importantes que regulam a atividade médica relacionada a esta prática. Em 2009, pela primeira vez na história da medicina no Brasil, o Conselho Federal de Medicina incluiu em seu novo Código de Ética Médica, os Cuidados Paliativos como princípio fundamental (ANCP, 2015).

O CP voltado ao paciente pediátrico corresponde a período mais recente: em 1982, também na Inglaterra, foi instalado o primeiro hospice infantil. Três anos depois, foi inaugurado o primeiro serviço de CP pediátricos dentro de uma Unidade Pediátrica, no St. Mary’s Hospital, em Nova York. A partir daí, observa-se um crescimento no interesse pela temática, reforçado pela necessidade frente ao aumento de situações clínicas que levam crianças a necessitarem deste tipo de cuidado (Calasans e Amaral, 2013; Namachivayam et al., 2010).

A introdução de novas tecnologias e tratamentos, o aumento do número de Unidades de Terapia Intensiva Pediátricas e Neonatais, além do aprimoramento profissional, vem permitindo a sustentabilidade da vida de diversas crianças em situações, até então, consideradas inviáveis. O que aumenta o número de pacientes pediátricos com doenças crônicas e sequelas graves, dependentes de tecnologia, sem possibilidade de cura e com reduzida expectativa de vida (Namachivayam et al., 2010; Piva et al., 2005). Há poucos anos, o CP tanto para adultos como para crianças era pensado somente para aqueles com doenças oncológicas (ANCP, 2009).

Nesta perspectiva de cuidado, o enfermeiro e sua equipe devem instrumentalizar-se de forma a garantir que o paciente em CP, bem como a sua família, tenha um processo de morte “tranquilo” e com dignidade, uma vez que o profissional da enfermagem é peça fundamental nos CP, pois sua formação está na arte do cuidar (Furtado et al., 2011; Hermes e Lamarca, 2013; Pessini e Bertachini, 2005).

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1.3.3. Cuidados Paliativos em Neonatologia

Com a facilitação do processo de viver por meio da evolução tecnológica e terapêutica, cada vez mais as UTIN recebem bebês prematuros, gravemente enfermos ou malformados. Porém, muitos deles estão em condições incompatíveis com a vida e, não raro, a morte é inevitável: aproximando assim o começo e o final da vida. Portanto, é imprescindível que os profissionais neonatais estejam devidamente preparados para cuidar do bebê e de sua família, para não adotar medidas desnecessárias de prolongamento da vida, frente à dificuldade em lidar com a perda do RN. Todavia, nessas situações de morte, deve-se atentar tanto para o conforto do bebê quanto da família (Souza, 2011; Costa et al., 2009).

O cuidado paliativo para crianças, segundo a OMS envolve o cuidado ao corpo, mente e espírito e o apoio aos familiares, desde o momento que a doença é diagnosticada. O diagnóstico de uma doença que ameaça a vida do bebê pode ser feito antes do seu nascimento, durante a gestação. Sendo assim, o cuidado paliativo neonatal pode iniciar em diversas fases de atendimento: pré-natal, sala de parto, UTIN e ambulatório de seguimento. Contudo, o profissional deve lembrar que os cuidados, paliativo e curativo, precisam ser complementares, e não excludentes ou incompatíveis (Souza, 2011; Costa et al., 2009).

O que norteia o cuidado paliativo neonatal são os seguintes cuidados: cuidados básicos de enfermagem; aquecimento do RN; alimentação enteral, quando possível, ou na impossibilidade, fazer uso da hidratação intravenosa; manter suporte respiratório já iniciado; tratamento sintomático; analgesia de acordo com as escalas de dor utilizadas; sedação se outras medidas de conforto não forem suficientes; antibioticoterapia e anticonvulsivantes. A decisão para a inclusão de um RN em CP ou não deve ser criteriosa, sendo proposta pelo médico do bebê, mas decidida pela equipe junto aos pais. Muito embora, ao pensar na decisão dos pais, perceber se esta está embasada nas vontades e desejos próprios ou no interesse do melhor cuidado para a criança (Souza, 2011; Costa et al., 2009).

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O cenário de minha prática e das minhas inquietações, a UTIN, possui desde fevereiro de 2002 um Grupo Interdisciplinar em Cuidados Paliativos em Neonatologia (GCPN), o qual coordena e realiza ações de CP. Assim, essa convivência ampliou meus questionamentos quanto a este cuidado junto aos neonatos e famílias, levando-me a buscar compreender como se dá a atuação dos enferlevando-meiros frente à impossibilidade de cura dos bebês, bem como desvelar quais são os sentimentos que afloram nestes profissionais ao longo do cuidado aos bebês que estão em processo de morte, após uma existência tão breve.

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2.

Objetivos

Este estudo teve como objetivo compreender o significado de Cuidados Paliativos para os enfermeiros que atuam em neonatologia.

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3.

Percurso Metodológico

3.1. Apresentação da pesquisa qualitativa fenomenológica

Os meus questionamentos em relação ao fenômeno – enfermeiros neonatais que atuam em CP – levaram-me a buscar um modo de pesquisa em que pudesse compreender o significado dos CP prestados por esses enfermeiros, a partir de suas experiências. Esse caminho direcionou-me à modalidade da pesquisa qualitativa e à Fenomenologia como caminho metodológico.

Assim, a pesquisa consistiu em uma investigação do tipo descritiva e exploratória com abordagem qualitativa fenomenológica, pois esta possibilita identificar os significados das experiências humanas e suas características, tais como são narradas pelos sujeitos e interpretadas pelo investigador. O desenvolvimento do estudo sob essa abordagem justifica-se na intenção de buscar a compreensão do ser humano, ou seja, dos enfermeiros em seu cotidiano vivencial (Triviños, 1992). Ou seja, a compreensão das vivências e significados dos CP para o enfermeiro que atua na área de neonatologia.

A pesquisa qualitativa caracteriza-se por se preocupar com a realidade que não pode ser quantificada e por aprofundar-se “no mundo dos significados das ações e relações humanas” (Minayo, 1994). Assim, desejou-se o aprofundamento da experiência que é vivida pelos enfermeiros neonatais no cenário de sua prática assistencial e que correspondem a um espaço mais profundo das relações, dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.

Uma das características da pesquisa qualitativa é que oferece ao pesquisador a possibilidade de captar a maneira pela qual os indivíduos pensam e reagem frente às questões focalizadas. Proporciona, também, ao pesquisador: conhecer a dinâmica e a estrutura da situação sob estudo, do ponto de vista de quem a vivencia; investigar fenômenos subjetivos, complexos e únicos; melhor compreensão da distância entre o conhecimento e a prática, pois auxilia na compreensão dos sentimentos, dos valores,

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das atitudes e dos temores das pessoas, explicando suas ações diante de um problema ou situação. Seu material principal “é a palavra que expressa a fala cotidiana” (Ludke e André,1986; Minayo e Sanches, 1993). Nesta abordagem metodológica, a tarefa do pesquisador é tentar ver o pesquisado segundo seus próprios termos, cabendo-lhe revelar o que é particular e, assim, distanciar-se de uma abordagem comparativa.

Considera-se incontestável a contribuição da fenomenologia para a pesquisa em enfermagem, uma vez que a tendência desta é a de retomar e considerar o homem em seu todo, não mais isoladamente, em partes, mas de modo holístico (Praça e Merighi, 2003). Assim, acredita-se que ao proporcionar aos enfermeiros neonatais, que vivenciam o cuidado, a oportunidade de expressarem-se acerca do significado de suas experiências, pode-se olhar para o mundo dos sujeitos em sua totalidade, buscando apreender a realidade vivida.

A Fenomenologia, o movimento fenomenológico, nasceu como reação ao positivismo, que considerava válido somente o fenômeno empiricamente pesquisado e mensurado. Objetiva a investigação direta e a descrição de fenômenos que são experienciados pela consciência, sem teorias sobre a sua explicação causal e tão livre quanto possível de pressupostos e preconceitos (Praça e Merighi, 2003). O Método fenomenológico é um processo de aprendizado e de construção do significado da experiência humana por meio de diálogo intensivo com pessoas que estão vivenciando a experiência. O pesquisador tem como meta compreender o significado da experiência à medida que esta é vivida pelo participante. Assim sendo, a fenomenologia procura interrogar a experiência vivida e o significado que o sujeito atribui, ou seja, procura não priorizar o objeto e/ou sujeito, mas centrar-se na relação sujeito-objeto-mundo (Praça e Merighi, 2003).

3.1.1. A fenomenologia existencial de Martin Heidegger

Martin Heidegger foi um filósofo e teólogo alemão nascido em 1889 e falecendo em 1976. Teve grande contribuição para a filosofia contemporânea, sendo um dos

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principais pensadores sobre as condições do ser humano. Aristóteles e Husserl foram influenciadores de seus pensamentos: o primeiro por ser fundador da teoria do Ser enquanto Ser; o segundo por ter iniciado o método fenomenológico. Heidegger afirma que a fenomenologia é o pensamento que se transforma e, consequentemente, permanece; e corresponde àquilo que deve ser pensado, sendo o caminho para o entendimento do Ser, que é o objeto da investigação ontológica (o Ser enquanto Ser). Heidegger buscava o sentido do ser e criticava a influência que a Europa vinha sofrendo. Influencia esta exercida pela União Soviética e Estados Unidos, países preocupados mais ao fazer que ao ser (Lopes, 1996; Souza, 2014).

A fenomenologia de Heidegger procura engrandecer o ser em suas particularidades (Gonzalez et al, 2012). Dentre inúmeras obras publicadas, em 1927, Heidegger publica sua principal obra: Ser e Tempo, na qual aborda a questão do sentido do Ser, que havia caído no esquecimento, segundo o autor (Souza, 2014).

Fenômeno é aquilo que é mostrado e a forma como ele é mostrado, o modo de ser do ser humano e sua experiência, sempre localizada no tempo e no espaço. A fenomenologia existencial permite que o homem faça suas escolhas nos limites da facticidade da sua existência, isto é, o ser humano é capaz de analisar, desvendar, avaliar e ponderar suas vivências. É um processo de descoberta que depende da interpretação do pesquisador e sua abertura para a compreensão das vivências do

ente, a partir do seu relato, mantendo-se neutro durante o desvelamento do fenômeno

(González et al, 2012; Sales, 2009). “Ente significa o que é, algo que está sendo, modo das coisas serem, o que eu consigo ‘falar’ sobre, é também como nós mesmos somos” (Souza, 2014: 69).

O ser-aí descrito por Heidegger é o sujeito que possui a oportunidade de indagar-se e procurar o significado do ser-sendo no mundo, compreendendo a experiência vivida, é o lugar onde o ser se revela (Gonzáles et al, 2012; Souza, 2014). O homem questiona-se pelo seu ser e tem uma relação direta consigo mesmo. Assim, o

ser-aí passa a ser compreendido a partir da possibilidade de existir e ser ele próprio. O ser-aí pode ser definido também como um ser-no-mundo, não no sentido geográfico,

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entes que a ele se apresentam. Significa que o homem e suas vivências são um todo. É

a forma do homem de existir e se relacionar com o mundo, ora envolvido no mundo do ‘nós’, ora envolvido em seu próprio mundo (Souza, 2014).

Em sua forma de relacionar-se com o mundo, encontramos o homem como o

ser-com, uma vez que o mundo é sempre compartilhado, portanto encontramos o ser-aí

no ser-no-mundo-com-os-outros, mesmo quando o relacionamento não está diretamente ligado a outros, ou os outros são dispensados, ou ainda quando se acredita não precisar do outro, ainda assim o ser-aí consiste num ser-com (Souza, 2014).

Dessa maneira, a pesquisa qualitativa fenomenológica heideggeriana busca compreender o ser-no-mundo, ou seja, o homem e suas vivências e o significado que ele dá a essa experiência (Souza, 2014). Heidegger, em seus pensamentos, relaciona o cuidado com a vivência do ser humano, dizendo que enquanto o homem existir e estiver no mundo, está e será mantido no cuidado, ou seja, o cuidado é uma peculiaridade do ser humano, inerente a sua existência. No entendimento de Heidegger, “o profissional de saúde tem o seu ‘ser-aí’ envolvido com o

‘ser-que-está-doente’, e a partir do momento que assumo o cuidado do paciente, passa a ‘ser-com-o-outro’, e essa relação sempre afeta, de alguma maneira, a sua existência. Para cada

experiência, o ser-no-mundo pode manter-se aberto ou fechado para vivenciá-las (González, 2012: 812).

O ser-no-mundo da pesquisa em questão, ou seja, o ser-enfermeiro, o qual está situado nesse mundo e encontra-se com outros sujeitos e coisas, vivenciando, dessa forma, experiências com o ser-com-os-outros: o enfermeiro que atua numa Unidade de Terapia Intensiva Neonatal cuidando de RN que estão sob CP. Relaciona-se também com os pais e familiares desse RN e com a equipe multiprofissional atuante. O

ser-enfermeiro é existir, é vivenciar juntamente aos outros entes o que significa cuidar de

RN que estão fora de possibilidade terapêutica de cura?

Assim, optou-se por adotar o referencial fenomenológico existencial proposto por Martin Heidegger, como o caminho para a compreensão do significado de CP para o

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3.2. Cenário do estudo

O cenário da pesquisa está relacionado ao ambiente no qual o fenômeno acontece (Souza, 2014). O cenário do presente estudo foi uma UTIN de atendimento regionalizado, inserida em hospital público destinado a assistência à saúde, ensino e pesquisa. Tal hospital é referência em assistência à saúde de mulheres e RN, oferecendo atendimento em nível terciário nas áreas de ginecologia, obstetrícia e neonatologia, situado no interior do Estado de São Paulo. Este hospital é mantido com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) e da Universidade na qual está inserido.

A unidade neonatal compreende um total de 30 leitos divididos em cuidados intensivos e semi-intensivos, que prestam cuidados a neonatos graves. O atendimento é regionalizado e a medida que o RN passa a necessitar de um atendimento secundário, e não mais terciário, é encaminhado à cidade de origem através da referência e contra-referência. A unidade conta com uma equipe multidisciplinar composta por médicos, fonoaudiólogas, fisioterapeutas, assistente social, psicóloga e a equipe de enfermagem. Os enfermeiros somam um total de 34 profissionais (uma diretora de enfermagem, três supervisoras e 29 enfermeiros assistenciais, divididos entre os plantões da manhã, tarde e noite).

As entrevistas ocorreram em local privativo da própria Unidade Neonatal ou no Banco de Leite Humano. Apenas a primeira entrevista ocorreu em uma sala do Centro Obstétrico. O período de coleta de dados foi de 26 de outubro de 2014 a 18 de janeiro de 2015.

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3.3. Participantes do estudo

Os participantes desta pesquisa foram nove enfermeiras1 assistenciais que

atuam na UTIN do referido hospital, com um período de atuação na área que variou de um ano e seis meses a 18 anos. Assim, foram escolhidos nomes de pedras preciosas para nomear as participantes, uma vez que estas são valiosas e bonitas, do mesmo modo que o trabalho realizado por esses profissionais. Tal escolha relacionou-se também quanto às apresentações dessas pedras, ora duras, ora frágeis, igualmente aos resultados obtidos quanto às diversidades de significados presentes nesse fenômeno: o cuidado paliativo aos neonatos, assunto que será abordado no próximo capítulo. Dessa maneira, as enfermeiras foram identificadas como: Esmeralda, Diamante, Ágata, Ametista, Rubi, Cristal, Quartzo, Safira e Jade.

Por tratar-se de pesquisa qualitativa, o número de participantes foi determinado no transcorrer das entrevistas, em função de seus conteúdos, isto é, a partir do momento em que se percebeu que os discursos eram suficientes para responder às indagações da pesquisadora e os dados tornaram-se repetitivos ou não acrescentavam fatos novos aos anteriormente obtidos, parou-se de incluir participantes. O que se denomina ponto de saturação, fazendo com que a coleta dos depoimentos seja encerrada. Neste tipo de pesquisa o critério numérico é a preocupação menos relevante, já que não interessa ao pesquisador a quantidade de informantes ou perfil amostral de uma população de sujeitos, mas uma amostragem que reflita as múltiplas dimensões da realidade estudada (Fontanella et al., 2011).

A seleção das participantes apoiou-se em critérios discutidos com docentes com experiência clínica e de pesquisa nas áreas de neonatologia e CP. Assim, foram incluídas enfermeiras assistenciais com experiência de atuação na UTIN por, no mínimo 12 meses. Foram excluídas aquelas que, por ocasião da coleta dos dados, estavam em licença médica, férias ou outro tipo de afastamento do trabalho.

                                                                                                                         

1 Foram entrevistados profissionais de ambos os sexos, mas optou-se pelo gênero feminino por ser este o predominante na profissão e desta forma assegurar ainda mais o anonimato.

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3.4. Acesso aos participantes

Após obtenção do consentimento para a realização do estudo junto à instituição em questão e, posteriormente, do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), foi realizado contato com a Diretora da Divisão de Enfermagem (DIVEn). Isto com o objetivo de apresentar a pesquisa, seus objetivos e discutir qual seria a melhor estratégia para convidar as enfermeiras a participarem do estudo em questão. Foi feito o convite aos profissionais que atuam na unidade neonatal e, à medida que foram respondendo positivamente, as entrevistas foram realizadas. Houve apenas uma profissional que se recusou a participar, alegando não se sentir à vontade em entrevistas.

Foi acertado previamente com cada profissional entrevistada o horário adequado para realização desta abordagem, sendo de escolha de todas o próprio horário de turno de trabalho. Teve-se cuidado para que a coleta de dados não interferisse nas atividades profissionais da unidade em questão. Assim, as entrevistas foram realizadas em momento em que a assistência aos neonatos não foi prejudicada.

Para as enfermeiras que atuam na UTIN, a participação neste trabalho se limitou na realização de uma entrevista individual, que foi gravada conforme a permissão de cada participante, após a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) – Apêndice I.

O instrumento de coleta de dados (Apêndice II) apresentou questões norteadoras, referentes ao foco de investigação: compreender o significado de CP para os enfermeiros que atuam em Neonatologia. O roteiro de entrevista foi adaptado do trabalho de Silva (1997) para contemplar tal objetivo.

Os dados foram coletados por meio da técnica de entrevistas individuais semi-estruturadas, que foram gravadas em áudio. Segundo Triviños (1992), a entrevista é um dos principais meios que o investigador dispõe para obter dados. As entrevistas livres e semi-estruturadas são as mais importantes para o enfoque qualitativo,

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oferecendo todas as perspectivas possíveis para que o informante tenha a liberdade e a oportunidade necessárias, enriquecendo a investigação.

Após a coleta de dados, as entrevistas foram transcritas integralmente pela pesquisadora, preservando idéias, sequência e linguagem utilizada pelas enfermeiras para a análise.

No início de cada entrevista buscou-se criar um ambiente favorável para que a participante pudesse falar livremente sobre o assunto, com prévio esclarecimento sobre o objetivo do trabalho. Nesse primeiro momento foi conversado sobre o TCLE, deixando mais uma vez a participante à vontade para a participação, sendo garantido o anonimato. Nesse momento, houve uma enfermeira que optou em não participar da pesquisa, mesmo tendo aceitado o convite inicialmente, para a qual foi garantido que não teria qualquer prejuízo pela sua desistência..

Para todas também foi comunicado o uso que a pesquisadora faria dos dados. Para Ludke e André (1986), tais cuidados são essenciais em pesquisa qualitativa para que a entrevista flua livremente e reflita a realidade numa atmosfera de interação e reciprocidade.

3.5. Processamento e análise dos dados

Após a transcrição, foram realizadas leituras atentas e criteriosas de cada um dos depoimentos das enfermeiras, primeiramente buscando identificar o sentido global da experiência vivenciada. A entrevista de cada enfermeira foi identificada por meio de códigos (nomes fictícios), para facilitar o retorno ao depoimento na íntegra, quando necessário. Esses nomes, como já citado anteriormente, foram nomes de pedras preciosas.

O passo seguinte foi selecionar das informações contidas nos depoimentos os aspectos comuns que emergiram com maior destaque, ou seja, as similaridades e diferenças dos conteúdos. Assim, foram agrupados os trechos das entrevistas com

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conteúdos convergentes e divergentes que continham aspectos relevantes para a discussão do assunto. Posteriormente, foram identificados os temas que representavam a idéia central de todos os trechos ali contidos, que foram apresentadas na construção dos resultados e desta forma desvelaram o fenômeno (Souza, 2014).

Posteriormente, ocorreu análise desses temas, que foram interpretados por meio da análise de conteúdo, esta entendida como um procedimento que tem como objetivo analisar os significados expressados e ocultados contidos em uma determinada mensagem e favorecer a interpretação e inferências do pesquisador com base nos dados das entrevistas, considerando um dado referencial teórico (Bogdan e Biklen, 1994), que neste estudo foi a fenomenologia existencial de Martin Heidegger.

Para melhor compreensão do fenômeno, os significados vivenciados pelas participantes do estudo, optou-se por adotar um caminho específico na análise dos dados que consistiu em:

Realizar uma leitura global do conteúdo de cada relato de forma a se aproximar do conteúdo, sem que houvesse qualquer interpretação inicialmente, apenas com um entendimento geral do que estava exposto;

A seguir foi realizada a releitura do texto, de forma a buscar o significado de CP individualmente, mantendo esses relatos em evidência para posterior avaliação; Num terceiro momento, optou-se por agrupar os trechos que eram convergentes

(que traziam aspectos semelhantes) e divergentes (que traziam aspectos peculiares, que apareciam em apenas um ou em poucos relatos)

Após a separação dos discursos, estes foram agrupados em categorias, que possibilitaram a formação de quatro categorias e suas subcategorias. Para tal construção, foram selecionados os discursos que melhor representavam-nas; Em seguida, com as quatro categorias formadas e os discursos separados,

interpretou-se as categorias e se buscou na literatura artigos e livros que servissem de apoio para a discussão dos dados. Dentre eles, é fundamental ressaltar o referencial filosófico utilizado: “Ser e Tempo”, de Martin Heidegger, que possibilitou o desvelar do fenômeno.

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3.6. Aspectos éticos

O projeto foi submetido à avaliação da Comissão de Pesquisa da instituição onde os dados foram colhidos, sendo aprovado (Anexo II). Após isto, foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), com Parecer de número 710.334 - (Anexo III). Após as referidas aprovações, foi iniciada a coleta de dados. As participantes receberam esclarecimentos sobre os objetivos do estudo e procedimentos envolvidos, bem como o TCLE (Apêndice I). A participação ocorreu após a leitura, compreensão e assinatura do TCLE pela profissional, que recebeu uma cópia do mesmo.

Tais procedimentos cumprem as recomendações relativas aos aspectos éticos em pesquisas envolvendo seres humanos, contidos na Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.

Vale ressaltar que, todas as informações que pudessem identificar as participantes foram mantidas sob sigilo, porém as enfermeiras estavam cientes de que os resultados serão divulgados em eventos e publicações científicas, preservando sempre sua identidade (Oliveira et al., 2007).

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4.

Apresentação e Discussão dos Resultados

A partir da escuta atenta, leitura minuciosa e criteriosa dos discursos das depoentes, foi possível apreender qual é o significado de CP para as enfermeiras que atuam em neonatologia, lembrando que o ser-enfermeira recebe e mantém relações a todo o momento com outros entes, sejam eles a equipe multiprofissional, o RN e sua família; e este mesmo ser traz consigo informações e vivências: desde sua percepção do mundo, suas formações, sentimentos e emoções. Tais significados foram identificados e agrupados em quatro categorias:

“Emoções frente ao cuidado paliativo neonatal”; “Confrontando os cuidados paliativos e a morte”; “Vivendo o desamparo” e

“Cuidando do recém-nascido e família”.

4.1. Emoções frente ao cuidado paliativo neonatal

Ao dar voz às enfermeiras, que cuidam dos recém-nascidos prematuros vivenciando situações limítrofes entre a vida e morte, um misto de emoções que acompanham o ato de cuidar emergiram como expressão de sua subjetividade, tais como alegria, tristeza e preocupação por parte dos pais e familiares de seus pequenos pacientes.

4.1.1. Paradoxo de emoções coexistindo no cuidado

Nos discursos das enfermeiras percebe-se que ora sentimento de impotência ora sentimento de onipotência permeia a narrativa de sua experiência em cuidar de recém-nascidos sem proposta terapêutica curativa, como se pode constatar nos trechos a seguir:

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(...) “Impotência. Eu acho que é impotência. De você não poder fazer nada, parece que é um... Não um trabalho jogado fora (...) mas a gente sempre quer ver o bebê saindo bem né?! (...) Essa sensação de impotência por não conseguir fazer com que ele saia saudável daqui.” (Diamante)

“Eu me sinto, assim, de mãos atadas porque eu não posso fazer nada pra essa criança melhorar, é diferente de quando você pode intervir. (...) É como se alguém amarrasse as minhas mãos e falasse: não, você não vai fazer nada.” (Cristal)

“Às vezes você acaba cuidando muito de uma criança, (...) às vezes já esgotou todas as possibilidades, (...) o que tinha que ser feito né, da parte da ciência, humana, religiosa, então você (...) se sente fraco e impotente diante daquela coisa, daquela realidade que não tem o que fazer.” (Safira)

Apesar de todos os avanços tecnológicos, muitas vezes o controle da situação

“foge das mãos” do profissional que cuida do paciente e isso faz com que o mesmo

olhe para suas limitações, percebendo sua impotência enquanto ser humano e sentindo-se co-responsável pela manutenção da vida da criança. Esse sentimento parece comprometer sua competência (Aguiar et al., 2006). A impotência foi observada em todos os discursos das participantes.

A morte potencializa o sentimento de impotência profissional, pois o torna vulnerável à realidade na qual não se tem definida a maneira de agir com o paciente e com a família (Alencar et al., 2005). Encarar a finitude de um cuidado que não resultará em cura, mas necessário ao RN e família ao longo desse processo, levou as enfermeiras desse estudo a sentirem-se impotentes.

Isso corrobora com o que a literatura aborda: os profissionais de saúde são preparados e formados para cuidarem do ser humano no sentido de promover a reabilitação e a cura. Quando isso não ocorre, o sentimento de impotência se instala

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(Aguiar et al., 2006; Alencar et al., 2005). Essa impotência pode ocasionar sofrimento ao profissional levando-o a pensar no que deixou de fazer para que a vida ou saúde do paciente fosse mantida (Costa e Lima, 2005).

A impotência é, por vezes, confrontada com a fantasia da onipotência, portanto é primordial que a profissional busque o autoconhecimento e reveja seus conceitos de existência para encarar a morte como um processo natural (Aguiar et al., 2006).

Muitas profissionais associam os sentimentos de impotência e frustração não somente ao cuidado prestado, mas à fragilidade de sua existência, o que pode levar a momentos de reflexão sobre a própria finitude ou de seus familiares, além de vivenciarem constantemente o desafio de preservarem a vida (Alencar et al., 2005).

Em Heidegger (Heidegger, 2012), no entanto verifica-se que a existência anônima cotidiana é uma fuga à morte

“Os pais, eles não tem a noção, não tem o conhecimento que a gente tem, eles não sabem o que vai acontecer com a criança, enquanto nós, como profissionais, sabemos o que vai acontecer.” (Cristal)

“Porque se eu for pensar que eu estou cuidando pela última vez, que ele vai morrer daqui a pouco ou que eu estou cuidando ali, tudo o que eu estou tentando fazer, que eu acho que vai ser para o bem (pausa)... De repente outro plantão vem e não vai fazer igual ou amanhã a mãe em casa não vai fazer: porque não vai ter dinheiro, ou não vai ter estrutura, não ter técnica pra fazer, não vai ter com quem dividir aquilo... Aí eu prefiro não pensar.” (Esmeralda)

“Que ele (o bebê) não vai sair daqui ou se sair vai ser pra outro lugar (outro hospital) e do outro lugar a gente sabe que vai a óbito. (...) Você fala: como assim morreu? Não, espera aí, eu sabia que ia morrer, né?! Mas assim, o fato de ter ficado tanto tempo com a gente, chegar lá e durar tão pouquinho tempo, você fica meio... (...)” (Diamante)

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“Às vezes vai pra casa de um jeito que não é o jeito que a gente idealizou que fosse” (Esmeralda)

Muitas vezes, o sentimento despertado nas profissionais, que pode estar relacionado à própria formação intervencionista e curativa ou ao despreparo para lidar com o ser morrendo, é o desejo de ser herói. Assim, acabam sentindo-se onipotentes, com o sentimento de que cuidam melhor do que outros profissionais e, até, melhor que a própria mãe da criança. Observo, no cotidiano que, muitas vezes, a equipe, não considera as habilidades da mãe como também, as vêem desprovidas de vários pré-requisitos, que acreditam ser necessários para cuidar do RN. O sentimento de onipotência foi citado por três enfermeiras.

Contudo, a assistência tecnicista que permite o prolongamento da vida do paciente, prolonga também o seu sofrimento, bem como dos familiares e, não raramente, do próprio profissional, uma vez que a onipotência contribui para o aumento da frustração e sentimento de fracasso quando não é possível salvar a vida do paciente. Nesse contexto, acredita-se que enquanto a morte for encarada como um desafio a ser superado e sua presença como um insucesso profissional, o sofrimento irá existir. Assim, é necessário que o profissional consiga respeitar a autonomia do paciente e sua família, despindo-se de sua autonomia (Shimizu, 2007; Guiterrez, 2005).

A onipotência, entretanto, não é antagônica a impotência, e sim um disfarce desta última: uma defesa contra o seu possível aparecimento. A onipotência pode prejudicar a assistência prestada, pois não reconhece a autonomia e individualidade do paciente e família, reafirmadas acima. Para tanto, é preciso que a relação existente entre o profissional de saúde e o paciente seja de igual para igual, limitando-se apenas ao fato de que o profissional estudou e apresenta conhecimentos que possibilitam cuidar do outro naquela situação terapêutica, mas quem sabe das reais necessidades é o próprio paciente, ou no caso dos RN, a família (Martins, 2004).

Observando as emoções que o cuidado aos RN suscita, a enfermeira desvela o significado que atribui em estar com RN e sua família no mundo do cuidado, onde o

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existir enquanto profissional se dá em presença destes, caracterizando-se pelo envolvimento existencial entre o cuidador e o ser cuidado.

4.1.2. Frustração e Tristeza

A Tristeza e a frustração aparecem associadas em todos os discursos:

(...) “Eu não vejo como uma coisa feliz no final, uma coisa boa, que motiva, que anima, vejo mais como um lado meio apagado assim do cuidado da gente (...) não consigo (pausa) pensar num, num final feliz. (...) Em alguns, você se apega mais, outros você não quer muito ver, não quer muito ter notícias, porque te entristece, te decepciona (...) eu não vejo assim muitos sentimentos bons. (...)Ter uma esperança... e aí parece que todos os caminhos que são tomados, eles não levam muito a lugar nenhum” (Esmeralda)

“Nem sempre tem né? (Bebês em cuidados paliativos), no caso, mas quando tem, eu acho triste né? (...) Triste pra gente que ta cuidando e triste pra família, triste pro pai, pra mãe, pra família né? (...) Dizer que não fico triste, eu vou estar mentindo, eu fico muito abalado e triste. (...) Eu me sinto frustrado porque depois de tanta batalha, tanta luta, né? Pra saber que... (...) não teve resultado nenhum.” (Safira)

“É bastante frustrante porque você já sabe que ele não vai ter um prognostico, você já sabe que ele não vai sair dali e é triste pra gente isso, é ruim você ter essa noção.” (Diamante)

Tristeza é definida como um estado afetivo em que há desalento, desânimo, falta de alegria, prevalecimento da melancolia. Enquanto frustração é o estado de um indivíduo quando impedido por outrem ou por si mesmo de atingir a satisfação em algo: não concretizar algo como o esperado (Houaiss e Villar, 2009). Assim, a tristeza e a

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frustração encontradas nos relatos das enfermeiras podem estar associadas ao

sentimento de perda. Isto porque, frequentemente, o RN permanece por muito tempo internado na unidade ou pelo fato do profissional somente ver o cuidado paliativo como um lado negativo do seu cuidado (Aguiar et al., 2006).

Percebe-se por esses relatos que as enfermeiras não aceitam ou desconhecem o significado dos CP, bem como não reconhecem a morte como um processo natural, o que pode estar relacionado não só à ausência desses conteúdos na formação profissional, mas também com sua história de vida. Pois sendo ser-para-a-morte, conforme afirma Heidegger (2012) o ser humano vive no cotidiano negando a finitude. A morte faz parte da vida e o ser humano tem consciência de que é mortal, mas geralmente encara a morte como um acontecimento longínquo e que só se dá com os outros e não consigo mesmo.

Desta forma, a morte do RN vem lembrar a enfermeira sua mortalidade. Creio que se torna necessário buscar meios para alterar este paradigma relacionado ao cuidado dispensado ao RN sem possibilidade terapêutica de cura, seja pela cronicidade ou pela morte iminente.

A morte, que compreende a última etapa da vida, e o morrer, entendido como um processo, são temas evitados em nossa cultura. Visto que é considerado tabu e envolto em crenças e valores que geram angústia e expõem a vulnerabilidade das pessoas.

Creio que pensar ou falar sobre morte, terminalidade, ocasione tamanho desconforto por ser um acontecimento que não pode ser evitado, que foge ao controle. A morte faz parte da existência tanto quanto o próprio nascimento, porém diferentemente deste que trata do início da vida, a morte limita a vida (Alencar et al., 2005). Assim, a forma com que o profissional de saúde se relaciona com o tema precisa ser repensada, mas isso tem ficado em estado de latência.

Falar de morte e vida é refletir sobre questões que suscitam dúvidas e causam angústias relacionadas ao que é subjetivo ou objetivo, concreto ou abstrato, racional ou irracional, sensitivo, corporal ou espiritual e traz sentimentos de perda e luto. Na maioria das vezes, o ser humano não está preparado para lidar com essas questões ou mesmo pensar sobre elas (Alencar et al., 2005).

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Dentro dos hospitais, percebe-se que o planejamento do cuidado está sempre voltado para o restabelecimento e cura, não havendo, muitas vezes, espaço para vivenciar o processo de morrer, considerado um fracasso É raro encontrarmos um planejamento para o fim da vida, mesmo frente a doenças sem possibilidade de cura. É como se o ser humano pudesse alcançar a imortalidade; isso para que o próprio profissional evite pensar e refletir, consciente ou inconscientemente, sobre a possibilidade da própria morte ou daqueles que fazem parte de sua relação afetiva (Alencar et al., 2005).

Elisabeth Kübler-Ross, foi uma psiquiatra e escritora influente mundialmente com seu trabalho junto aos pacientes com doenças terminais, estudando a partir da década de 60 sobre morte e o processo de morrer. Ela afirma que os seres humanos precisam aprender a viver e não somente passar pela vida, realizando aquilo que desejam hoje e não esperando pelo amanhã. Por meio de um pensar sobre a morte de maneira mais amigável e não invisível ou inexistente; a autora diz que não precisa esperar ficar frente à morte para começar a vivê-la. Ela nomeou os sentimentos que permeiam o processo de morrer compreendido em cinco momentos: negação e isolamento, raiva e cólera, barganha ou regateio, depressão e, por último, aceitação (Alencar et al., 2005).

Esses sentimentos que foram nomeados de fases do morrer não são estanques, e não apenas o paciente e a família estão expostos a eles, mas os profissionais que cuidam de pessoas também passam por algumas ou todas essas fases, portanto considero primordial que as enfermeiras apropriem-se deste conhecimento para poderem refletir e discutir o cuidado que dispensam aos pacientes.

De qualquer forma, é importante que a morte seja compreendida como um processo e não um resultado final, pois se o paciente for compreendido em todo o seu contexto social, histórico e familiar, o cuidado nesse momento estará voltado para suas reais necessidades e as da família (Alencar et al., 2005).

Atualmente, a morte está inserida no contexto hospitalar, impedindo que os familiares estejam presentes no decorrer do processo devido às normas institucionais. Além disso, os profissionais procuram tornar a morte invisível, como se verifica no discurso de algumas enfermeiras do presente estudo. Essa supressão pode ser vista

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até mesmo pela troca do termo morte por outros que a representam como ‘parada cardíaca ou respiratória’, porque dentro das instituições ela é vista como um fracasso profissional ou da própria instituição, deixando de ser um processo natural, mas trazendo sentimentos negativos e por isso devendo ser ocultada (Alencar et al., 2005; Aguiar et al., 2006).

O luto, a dor, o sofrimento e o cuidar de paciente fora de proposta terapêutica curativa são situações vivenciadas durante a carreira profissional. Isso pode acarretar diversas manifestações nos indivíduos que atuam diretamente no cuidado, o que pode intensificar-se quando esse cuidar está direcionado a RN, crianças e pacientes jovens (Costa e Lima, 2005). As falas a seguir demonstram o sofrimento das enfermeiras no exercício do seu ofício:

“Eu tento prevenir a situação (o sofrimento). (...) Quando eu não consigo, por algum motivo aquilo me escapa e aí eu estou sofrendo, eu já me vinculei um pouco mais. (...) Aí não tem jeito, eu acho, aí eu sofro mesmo” (Esmeralda)

“Isso dói. (...) Lógico que dá vontade de chorar. Já teve vez assim que você não aguenta né?! Você tem que, assim, ser muito forte. Eu falo forte porque eu acho que forte é diferente de fria, entendeu?” (Diamante)

“Qualquer envolvimento acaba em sofrimento.” (Ágata)

Se os sentimentos vivenciados não forem reconhecidos e expressos, seja por meio de fóruns de discussão e acompanhamento profissional no interior da instituição de saúde, seja por meio de preparo profissional adequado na graduação e pós-graduação, podem acarretar esta dificuldade em lidar com o sofrimento e pensar em seu significado, o que irá repercutir tanto na saúde física e mental do profissional quanto na assistência de enfermagem prestada.

Assim, os relatos das enfermeiras mostram que o cuidado paliativo, o processo de morte e o morrer são assuntos que as colocam em contato com sentimentos

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desagradáveis, levando-as a desenvolverem mecanismos de defesa, como “não pensar sobre o assunto”, interferindo diretamente no cuidado prestado ao RN e família, pois ao me distanciar para apreender o significado destas falas percebo que existe uma carência de conhecimento atualizado sobre essas questões, que permanecem ocultas por crenças e valores pessoais, em detrimento do conhecimento científico.

O dia-a-dia da enfermeira no processo de cuidar é constituído de desafios, incertezas, ou seja, por momentos considerados árduos, dos quais não se tem percepção da dimensão enquanto estudantes de graduação. Se não há espaço nas instituições de saúde para reflexão, discussão, compartilhamento de emoções, mecanismos de defesa são criados para se evitar sofrimento e dor. Os sentimentos com os quais não se consegue lidar são, muitas vezes, considerados sinônimos de fraqueza, vulnerabilidade, instabilidade emocional, ou até mesmo motivo para questionar a competência profissional em nossa sociedade. Portanto, negando o sofrimento, a profissional acredita proteger-se de entrar em contato com emoções consideradas negativas, assim como de ter seu desempenho exposto e questionado.

4.1.3. Sentindo-se enlutado

As profissionais podem também vivenciar uma espécie de luto, quando o bebê recebe alta hospitalar e elas deixam de acompanhar sua história:

“Eu já vi criança que aqui começou como paliativo e depois vai embora pra casa e você vê... (...) A gente não tem muito retorno. Não sei o prognóstico dele depois e toda a evolução como ficou.” (Ametista)

“O que a gente não consegue acompanhar é o depois, né? Como está a evolução dessa criança... Mas você vê que a mãe levou o filho pra casa: que isso é o que ela queria.” (Rubi)

Referências

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