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O novo tribunal do júri no Brasil: aspectos históricos, ção e inovações trazidas pela lei nº 11.6892008

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FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

ROSSANA WELLYN CARVALHO SAMPAIO

O NOVO TRIBUNAL DO JÚRI NO BRASIL:

ASPECTOS HISTÓRICOS, CONSTITUCIONALIZAÇÃO E

INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI Nº 11.689/2008

(2)

O NOVO TRIBUNAL DO JÚRI NO BRASIL:

ASPECTOS HISTÓRICOS, CONSTITUCIONALIZAÇÃO E

INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI Nº 11.689/2008

Trabalho de Conclusão de Curso

submetido à Faculdade de Direito da

Universidade Federal do Ceará, como

requisito parcial para obtenção do grau

de Bacharel em Direito.

Área de concentração: Direito Penal.

Orientador: Prof. Samuel Miranda

Arruda.

(3)

O NOVO TRIBUNAL DO JÚRI NO BRASIL:

ASPECTOS HISTÓRICOS, CONSTITUCIONALIZAÇÃO E INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI Nº 11.689/2008

Trabalho de Conclusão de Curso submetido à Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito em conformidade com os atos normativos do MEC e do Regulamento de Monografia Jurídica aprovado pelo Conselho Departamental da Faculdade de Direito da UFC. Área de concentração: Direito Penal.

Aprovada em: ____/____/______.

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________ Prof. Dr. Samuel Miranda Arruda (Orientador)

Universidade Federal do Ceará - UFC

_________________________________________________ Janaína Sena Taleires (Mestranda)

Universidade Federal do Ceará - UFC

_________________________________________________ Ana Karoline dos Santos Pinto (Mestranda)

Universidade Federal do Ceará - UFC

(4)

O sucesso nasce do querer, da determinação e da persistência em se chegar a um objetivo. Mesmo não atingindo o alvo, quem busca e vence obstáculos, no mínimo, fará coisas admiráveis.

(5)

Agradeço a Deus, pelo amor incondicional e por me proporcionar a oportunidade

de me formar no curso de Direito, na Universidade Federal do Ceará, instituição esta de

notório reconhecimento nacional, dando-me forças para superar obstáculos inesperados e

dificuldades diárias.

Agradeço à minha mãe, que renunciou momentos marcantes de sua vida para se

dedicar à inigualável criação e educação de seus três filhos, proporcionando-me sempre o

estudo em excelentes escolas particulares e, ainda mais, que nenhum material escolar me

faltasse, conscientizando-me da importância dos estudos na formação de pessoas que almejam

vencer na vida.

Agradeço ao meu pai e aos meus irmãos, André Victor e Davi, pela atenção e

cuidados constantes, e aos meus inúmeros e queridos amigos, em especial à Auri Tabosa, à

Clívia Pinheiro, à Darlane Portela, à Érica Pessoa, à Hanna Morais, à Irene Pessoa, à Karina

Fontenele, à Lívia Maia, à Lívia Mesquita, à Marcella Pires, à Mariana Holanda, à Natália

Uchôa, à Pollyana Torres, à Raquel Matos, à Vanessa Kerlen, ao Gilberto Campêlo, ao

Jucelino Silva e ao carinhoso e prestativo José Célio Fonteles, os quais me auxiliaram na

obtenção do conhecimento necessário para o desenvolvimento do tema, demonstrando grande

paciência com as minhas alterações de humor, ajudando-me com o empréstimo de livros,

fornecimento de dicas e informações atuais sobre pontos do presente trabalho de conclusão de

curso.

Agradeço, por fim, ao Professor Dr. Samuel Arruda, que, sempre muito atencioso,

acompanhou a evolução do meu trabalho e me deu minuciosa orientação durante o

(6)

Esta monografia trata de um instituto denominado Tribunal do Júri, partindo do estudo da sua

evolução histórica, seguindo pela análise das dificuldades encontradas para sua

constitucionalização no Brasil e em alguns países do mundo, depois abordando a

aplicabilidade efetiva dos seus Princípios Constitucionais definidos na Constituição Federal

de 1988 e finalizando com a abordagem das principais alterações produzidas pela Lei

11.689/2008 em pontos importantes de seu procedimento. A instituição do Júri Popular tem

como berço a Inglaterra e, no Brasil, floresceu em 1822, durante o período imperial, para o

julgamento tão-somente dos crimes da imprensa. O texto constitucional, no Artigo 5º, inciso

XXXVIII, reconhece o Tribunal do Júri como cláusula imutável e assegura a Plenitude de

Defesa, o Sigilo das Votações, a Soberania dos Veredictos e a Competência para Julgamento

dos Crimes Dolosos Contra a Vida, reafirmando a possibilidade de uma revisão criminal. O

reconhecimento constitucional do Tribunal do Júri consagra duas grandes conquistas do

Estado Democrático de Direito: a participação do cidadão comum na Administração da

Justiça e a garantia ao acusado de um julgamento imparcial pelos seus pares. Dessa forma,

neste trabalho foi feita uma análise minuciosa da história do instituto, de cada princípio a ele

atrelado (observando a proteção dispensada ao juslibertatis do indivíduo contra os abusos no exercício do poder repressivo do Estado e sua correlação com o Direito Processual Penal,

instrumento normativo usado para aplicação de sanções punitivas de tendências autoritárias e

totalitárias) e da reforma realizada pela Lei 11.689/2008. Também se abordou a competência

mínima do Tribunal Popular para julgar os crimes dolosos contra a vida, a possibilidade de

sua ampliação pela legislação infraconstitucional e a questão do foro por prerrogativa de

função em conflito com a competência do Júri. Por meio do método dedutivo de abordagem,

partindo do geral para o particular, analisou-se os aspectos históricos e jurídicos do

julgamento do indivíduo pelo Júri Popular, com alicerce numa pesquisa bibliográfica,

doutrinária, comparada e jurisprudencial.

Palavras-chave: Tribunal do Júri. Constitucionalização. Princípios constitucionais expressos.

(7)

This monograph is an institute called the jury from the study of their historical development,

followed by analysis of the difficulties encountered in their constitutionalization in Brazil and

some countries of the world, after addressing the applicability of its effective Constitutional

Principles set out in the Constitution 1988 and ending with the approach of the main changes

produced by the Law 11.689/2008 on important points of your procedure. The institution of

the Jury has the birthplace of England and in Brazil, flourished in 1822, during the imperial

period, to judge merely the crimes of the press. The Constitution, in Article 5, paragraph

XXXVIII, recognizes the jury as a clause unchanged and ensure the Fullness of Defense, the

secrecy of votes, the sovereignty of the verdicts and Competency for trial of crimes against

life, reaffirming the possibility of a criminal review. The constitutional recognition of the jury

establishes two major achievements of the democratic state: the participation of ordinary

people in the Administration of Justice and guarantee the accused a fair trial by their

peers. Thus, this work was done a thorough analysis of the history of the institute, each

principle tied to it (looking at the protection afforded to jus libertatis the individual against abuses in the exercise of repressive state and its correlation with the Criminal Procedural

Law,regulatory tool used to apply punitive sanctions authoritarian and totalitarian tendencies)

and the reform carried out by Law 11.689/2008. It also raised the minimum competency of

the People's Court to try crimes against life, the possibility of its enlargement and the

constitutional legislation matter for the prerogative of a function in conflict with the

jurisdiction of the Jury.Through deductive method of approach, from the general to the

particular, we analyzed the historical and legal judgment of the individual by Jury, with a

foundation of literature, doctrinal and jurisprudential compared.

Keywords: Jury. Constitutionalization. Constitutional principles expressed. Law

(8)

1 INTRODUÇÃO ... 9

2 ASPECTOS HISTÓRICOS... 11

2.1 No Brasil ... 11

2.2 No Mundo ... 16

3 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO JÚRI ... 25

3.1 Plenitude de defesa e Amplitude de defesa ... 26

3.2 Sigilo das Votações ... 29

3.3 Soberania dos Veredictos ... 30

3.4 Competência para Julgamento x Prerrogativa de função ... 33

4 PRINCIPAIS INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI Nº 11.689/2008 ... 39

4.1 Procedimento Especial Trifásico ... 40

4.1.1 Juízo de Formação da Culpa ... 41

4.1.2 Juízo de Preparação do Plenário ... 43

4.1.3 Juízo de Mérito: Julgamento em Plenário ... 44

4.2 Simplificação da Quesitação ... 48

4.3 Requisitos para ser jurado... 50

4.4 Extinção do protesto por novo Júri ... 53

4.5 Supressão do Libelo Acusatório ... 56

4.6 Julgamento sem a presença do réu ... 57

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 58

REFERÊNCIAS ... 61

(9)

1 INTRODUÇÃO

O Tribunal do Júri, instituto este secular e florescente, nascido na Inglaterra

depois que o Concílio de Latrão aboliu as ordálias e os juízos de Deus, guarda até hoje sua

origem mística.

O Júri, levado ao continente europeu como reação à magistratura das monarquias

absolutistas, perdeu seu aspecto político depois que o Judiciário adquiriu experiência em face

do Executivo, sendo apreciado por seu aspecto técnico.

Salienta G. Lattanzi que o problema do Júri não é mais político, pois a história

contemporânea e recente demonstra a possibilidade de subserviência dos jurados ao poder político. E acrescenta que “não é o Júri quem tutela as liberdades dos cidadãos, mas sim o regime democrático”.

Nélson Hungria afirma, categoricamente, que cessaram as condições pelas quais o

Júri deva ser incluído entre as garantias constitucionais, pois os juízes togados passaram a vir

do seio do próprio povo, de que emana, conceitualmente, a sua autoridade. Tornaram-se,

dessa forma, cidadãos do povo e, nos governos democráticos, é em nome dele que distribuem

a justiça.

Em entendimento contrário e majoritário na doutrina, Guilherme de Souza Nucci

defende ser o Júri direito e garantia humana fundamental formal, merecendo ser respeitado,

especialmente no que concerne aos princípios constantes das alíneas do Art. 5º, inciso

XXXVIII, da CF/88. O seu caráter formal não elimina a situação jurídica de figurar no rol dos

direitos e garantias individuais do mencionado Art. 5º. O Poder Constituinte Originário ali o

inseriu. Todavia, não devem o operador do Direito e o legislador ordinário lesar o seu status e

as regras constitucionais que o regulam.

No Brasil, o caminho percorrido pela instituição do Júri de 1822 até os dias atuais

assemelha-se a uma Guerra Santa, nas palavras James Tubenchlak. Isso porque ora avançara,

ora fora compelido a recuar, ora sofrera deformidades e alterações em sua competência

(10)

No presente trabalho de conclusão de curso, debruçar-nos-emos, no primeiro

capítulo, sobre a análise dos aspectos históricos desse místico instituto do Tribunal do Júri,

bem como sobre as dificuldades encontradas para a sua constitucionalização no Brasil e em

alguns países do Mundo, dando um enfoque em suas características atuais na Constituição da

República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88).

No segundo capítulo, faremos uma abordagem cuidadosa sobre os princípios

constitucionais explícitos que norteiam o Tribunal do Júri, enumerados estes no artigo 5º,

XXXVIII, da CF/88, e da sua aplicação efetiva, face à violência existente em nossa sociedade

caracterizada pela barbárie presente nos crimes dolosos contra a vida, bem como da sua

competência para o julgamento desses crimes, salientando também questões concernentes ao

foro privilegiado e à prerrogativa de função prevista constitucionalmente.

No terceiro capítulo, comentaremos, ponto a ponto, as principais alterações que a

Lei 11.689/2008 inseriu em aspectos relevantes da configuração atual do Júri no direito

brasileiro, modificando a quesitação, os requisitos para ser jurado, extinguindo o libelo

acusatório e o protesto por novo Júri, estabelecendo um procedimento especial trifásico, todas

estas mudanças em plena conformidade com o que preceitua nossa Carta Magna.

No anexo, por derradeiro, faremos uma análise esquematizada do procedimento

atual seguido pelo Júri no Brasil, em consonância com o Código de Processo Penal brasileiro,

de forma a tornar mais fácil a compreensão do mesmo.

Dessa forma, quanto à viabilidade da pesquisa, tem-se que esta é perfeitamente

viável, haja vista ser satisfatório o material disponível sobre o tema na doutrina e na

jurisprudência, além de ser fácil o acesso aos sítios eletrônicos para que se atente à abordagem

do tema no Brasil e no mundo. No desenvolvimento deste trabalho, portanto, utilizou-se a

(11)

2 ASPECTOS HISTÓRICOS

O Tribunal do Júri nada mais é que o retrato de certa sociedade no tempo. Ele fixa

seus pilares na imoralidade dos delitos, que variaram de acordo com o período histórico, com

os acontecimentos, com os direitos e com os méritos do poder.

Dessa forma, é válido iniciarmos este trabalho traçando o perfil histórico desse

Tribunal Popular, descrevendo sua evolução, tanto no Brasil, quanto no Mundo, a fim de

facilitar a compreensão deste instituto que está consagrado em nossa Carta Constitucional de

1988 como direito individual e garantia fundamental.

2.1 No Brasil

O nascedouro do Tribunal do Júri no Brasil remonta ao ano de 1822. Nesse

contexto, o Júri espalhava-se pela Europa, dando ares de direito individual do homem contra

os abusos de seus governantes (em outras palavras, o próprio Estado), chegando ao Brasil pela

mesma via, já que a política colonialista da época impunha ao Príncipe Regente, D. Pedro,

que seguisse as orientações de sua metrópole, ou seja, Portugal, a qual sofria, em

contrapartida, com as imposições feitas pelos ingleses.

Em 1215, a Inglaterra resgatou o até então obscuro instituto do Júri, trazendo-o ao

seu apogeu com a assinatura da Magna Carta, conhecida por Magna Charta Libertatum seu Concordiam inter regem Johannen at barones pro concessione libertatum ecclesiae et regni angliae (Grande Carta das liberdades, ou Concórdia entre o rei João e os Barões para a outorga das liberdades da Igreja e do rei Inglês).

Assim, observa-se que não houve dificuldades para que a instituição do Júri fosse

implantada nas terras brasileiras, visto que Portugal, nosso colonizador, era subserviente, em

muitos aspectos, à Inglaterra, que foi a grande responsável pelo espraiamento do Júri pela

Europa continental, facilitando para que este penetrasse na maioria dos sistemas jurídicos do

mundo ocidental e se transformasse num símbolo de democracia e de liberdade pública.

Entretanto, o Júri iniciou sua existência no Brasil com sua competência limitada

(12)

época parcialidade suficiente a justificar o Tribunal Popular do Júri como salvaguarda dos

direitos individuais do povo brasileiro.

Todavia, mesmo chegando ao Brasil por ares europeus, contaminado por ideais de

justiça pensados por filósofos estrangeiros e alicerçado nos direitos fundamentais, o Júri

estabilizou-se, inicialmente, nas terras da colônia portuguesa, de maneira diversa. A doutrina

nacional, em verdade, nunca soube explicar e motivar suficientemente a razão da criação e,

consequentemente, da permanência do Tribunal do Júri no Brasil, visto que fora instituído de

forma desvirtuada dos padrões europeus, embora tenha sofrido influência direta dos mesmos.

A Constituição de 1824 estendeu-o ao julgamento das causas cíveis e criminais,

muito embora nunca houvesse, efetivamente, julgado quaisquer dessas causas. Todavia, com

o advento do Código de Processo Criminal do Império, editado em 1832, atribuiu-se à

instituição a competência para o julgamento de quase todas as infrações.

ALMEIDA JUNIOR1 destaca a observação feita pelo Príncipe Regente do Brasil quando da edição da Carta de 1824:

Procurando ligar a bondade, a justiça e a salvação pública sem ofender a liberdade bem entendida da imprensa, que desejo sustentar e conservar, a que tanto bem tem feito à causa sagrada da liberdade brasileira, criava um tribunal de juízes de fato composto de vinte e quatro cidadãos [...] homens bons, honrados, inteligentes e patriotas, nomeados pelo Corregedor do Crime da Costa e Casa, que, por esse decreto, fosse nomeado juiz de direito nas causas de abuso de liberdade de imprensa; nas províncias, que tivessem Relação, seriam nomeadas pelo ouvidor do crime e pelo de comarca, nas que a não tivessem. Os réus poderiam destes vinte e quatro recusar dezesseis; os oito restantes seriam suficientes para compor o conselho de julgamento, acomodando-se sempre às formas mais liberais e admitindo-se o réu a justa defesa. E porque dizia o príncipe – as leis antigas a semelhante respeito são muito duras e impróprias das ideias liberais dos tempos que vivemos, os juízes de direito regular-se-ão, para imposição da pena, pelos artigos 12 e 13 do tít. II do Decreto das Cortes de Lisboa, de 4 de junho de 1821. Os réus só poderiam apelar, dizia o Príncipe, para minha real clemência. Este decreto estava referendado pelo ministro José Bonifácio de Andrade e Silva.

WHITAKER2 acrescenta:

Foi a Lei de 18 de junho de 1822 que, em nosso país, criou o Júri somente para os delitos de liberdade de imprensa, restrição mantida no decreto de 22 de novembro de 1823. A Carta Constitucional do Império veio consagrá-lo como um dos ramos do

1

ALMEIDA JUNIOR, João Mendes de. O processo criminal brasileiro. 4ª. ed., vol. 1, Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos S/A, 1959, p. 150 -151.

(13)

Poder Judiciário, dando-lhe atribuição para, em matéria de fato, decidir tudo quanto no cível quanto no crime fosse discutido.

Esta informação histórica é referendada por Magarinos Torres apud MOSSIN:

Prevalecia na maior parte do Estado o critério da enumeração legal dos crimes da competência do Júri, predominando o espírito de que essa devesse ser a jurisdição geral e ordinária, em que havia de caber a matéria deles e os mais graves, reservando-se para a justiça togada aqueles de apuração mais dependente de provas técnicas, documentais e os de pequena significação social. Assim era em Minas Gerais, em São Paulo, no Estado do Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul, etc.

Dos excertos transcritos, constata-se que houve período em que os Estados

podiam legislar sobre matéria processual concorrentemente com a União, desde que não

houvesse contrariedades, em observância ao critério da hierarquia de normas. Nesses

procedimentos em matéria processual, fora incluído, logicamente, o processo penal do Júri,

surgindo os Códigos de Processo Penal dos Estados que legislavam matérias ligadas ao Júri.

Em nosso país, a iniciativa da criação do Tribunal do Júri, frise-se, coube à Casa

Legislativa do Rio de Janeiro, a qual sugeriu ao Príncipe Regente, na data histórica de

04.02.1822, a criação de um “Juízo de Jurados”. Tal sugestão fora atendida em 18 de junho do mesmo ano e foram criados, por lei, os “Juízes de Fato”, que tinham competência restrita ao julgamento dos chamados crimes de imprensa. Esses 24 juízes deviam ser homens bons,

honrados, inteligentes e patriotas e eram nomeados pelo Corregedor e pelos Ouvidores do

Crime. O único recurso cabível contra suas sentenças era a apelação direta ao Príncipe.

Posteriormente, a Lei que tratava sobre o abuso da liberdade de imprensa, editada em 20.09.1830, organizou o Júri de forma mais específica, prevendo o “Júri de Acusação” e o “Júri de Julgação”, este último também denominado “Júri de Sentença”. O Código de Processo Criminal do Império, nascido em 1832, por iniciativa do Senador Alves Branco, estabeleceu o número de 23 jurados para a composição do “Júri de Acusação”, e de 12 jurados, para a do “Júri de Sentença”.

Os requisitos exigidos para o exercício da função de Jurado eram basicamente

três: ser eleitor, possuir bom senso e probidade. Excluídos, por decorrência lógica, estavam

(14)

secretários dos governos das províncias, comandantes das armas e dos corpos de primeira

linha. A instituição do Júri no Brasil ganhou os contornos que sempre possuiu o Júri nos

países da common Law.

No ano de 1841, com a edição da Lei 261, houve a supressão do “Júri de Acusação”. A organização da lista de jurados passou a ser de competência dos delegados de polícia; a formação da culpa e a sentença de pronúncia foram atribuídas também às

autoridades policiais e aos juízes municipais, visto que estes ratificavam a pronúncia. Ainda

aos juízes municipais, fora deferido o julgamento do contrabando, e, aos juízes de direito, o

julgamento dos crimes funcionais.

A Lei 562, de 02.07.1850, retirou da competência do Tribunal Popular o

julgamento dos delitos de moeda falsa, roubo, homicídio nos municípios de fronteira do

Império, resistência, tirada de preso e bancarrota.

A Lei 2.033, de 20.09.1871, extinguiu a possibilidade das autoridades policiais

participarem da formação da culpa nos crimes comuns, pronunciando réus, voltando o Júri a

ter competência ampliada.

O Decreto 848, de 11.10.1890, criou o Júri Federal, no contexto da proclamação

da República brasileira. A Lei 515, de 03.11.1898, alterou a competência do Júri Federal,

retirando-lhe a possibilidade de apreciar os delitos de moeda falsa, contrabando, peculato,

falsificação de estampilhas, selos, adesivos, vales postais e outros.

Com a manutenção do Júri, mesmo após o fim do período imperial, a primeira

Carta Magna republicana, de 24.02.1891, elevou a instituição ao nível de garantia individual

em seu lacônico artigo 72, §31 - “É mantida a instituição do Júri” -, o que deu ensejo a uma

gama de discussões em plenário.

Nas palavras de Frederico Marques3, a instituição do Júri, no Brasil, sofrera um duro golpe com a promulgação do Decreto-lei Nº 167, de 05.01.1938, mas a Constituição de

1946, restabelecendo a soberania dos veredictos, imprimiu de novo ao Júri suas características

3

(15)

clássicas e tradicionais. Ressalte-se que a Constituição de 1937, a “Polaca”, foi silente a seu

respeito.

O artigo 141, §28, da Constituição brasileira de 1946, assim dispunha:

É mantida a instituição do Júri, com a organização que lhe der a lei, contanto que seja sempre ímpares, os números dos seus membros e garantidos o sigilo das votações, a plenitude de defesa do réu e a Soberania dos Veredictos. Será obrigatoriamente de sua competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

MARQUES4 teceu uma análise sintética sobre o artigo acima transcrito:

O art. 141, §28, tem um sentido ultraliberal, mas sem confundir-se com o desregramento que alguns, a toda força, querem que impere nos julgamentos do Júri. De acordo com este dispositivo, mantida a instituição do Júri, deferido ficou ao legislador ordinário estruturá-la juridicamente. A este, porém, opuseram-se limitações que se referem à organização e forma de funcionamento do Tribunal, e à sua competência. Quanto à organização, vedado está à lei instituir o conselho julgador com número par de membros; quanto à forma de funcionamento, não podem as normas que regulamentarem o Júri cercear o direito de defesa, nem estabelecer julgamentos descobertos. Em relação à competência: a) os crimes dolosos contra a vida são ratione materiae, da atribuição privativa, quanto ao seu julgamento, ao Tribunal do Júri; b) não cabe aos tribunais superiores ou a qualquer outro órgão judiciário, em relação à competência funcional, conhecer dos veredictos soberanos do Júri, para, como judicium rescisorium, reformá-los em grau de recurso. Observadas essas limitações, pode, portanto, o legislador ordinário regulamentar o Júri como lhe parecer mais acertado.

Dessa forma, a Constituição de 1946 inseriu o Júri dentre as garantias individuais,

o que se reflete na sua própria estrutura, alicerçada na Soberania dos Veredictos. A

Constituição de 1967 também manteve a instituição do Júri, com sua competência para

julgamento de crimes dolosos contra a vida.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso XXXVIII, voltou a

reconhecer a Soberania dos Vereditos, que havia sido suprimida da Carta de 1967, em virtude

da Emenda 01/69. O instituto do Júri Popular, portanto, foi conservado em seu texto, visando

à efetivação da justiça, com competência idêntica a da Constituição de 1946, que seja, o

julgamento de crimes dolosos contra a vida.

As regras de processamento do Júri estão previstas no Código de Processo Penal

brasileiro (Decreto-Lei 3.689, de 03 de outubro de 1941), em seus artigos 406 a 497, os quais

sofreram alterações recentes em virtude do advento da Lei 11.689, de 09 de junho de 2008,

(16)

que alterou todos os dispositivos do referido Código referentes ao Tribunal do Júri,

conferindo-lhes nova redação. São os aspectos importantes desta reforma que analisaremos no

terceiro capítulo do presente trabalho.

2.2 No Mundo

A origem histórica do Tribunal do Júri no mundo é duvidosa. Alguns autores

afirmam que a origem da instituição se deu no Egito, na época em que Moisés orientava seu

povo hebreu (ou judeu) a seguir o que ditava o grande livro, o famoso Pentateuco, utilizando

seus preceitos na formação da culpa e no julgamento de seus compatriotas.

No Pentateuco, havia previsão para o julgamento de causas consideradas

complexas, como suspeita do marido sobre a castidade da esposa, casos de derramamento de

sangue em que tivesse havido disputas, e certos casos em que se levantasse uma acusação de

revolta contra um homem, mas em que a evidência não fosse clara, ou mesmo fosse suspeita. Nas situações elencadas, eram escolhidos homens “capazes, tementes a Deus, homens de verdade”, que odiassem a avareza, para a decisão acerca do delito, dizia Deuteronômio.

Nas palavras de Carlos Eduardo Melo da Rocha5,

Na sociedade hebraica, embora o magistrado estivesse vinculado ao sacerdote e, portanto, as decisões não fossem totalmente imparciais, dava-se grande importância ao Júri, então caracterizado pelo Conselho dos Anciãos. Desenvolveu-se a ideia de julgamento dos réus pelos seus pares, utilizando métodos orais, exigindo ampla publicidade e atribuindo liberdade ao acusado para defender-se. Garantia-se, também, a autenticidade dos testemunhos e o direito de o acusado, preso, não sofrer interrogatório.

Na civilização da Mesopotâmia, o direito era regulado pelo famigerado Código de

Hamurábi. Baseado na Lei de Talião (“olho por olho, dente por dente”), o referido código era

exibido de maneira ostensiva à população e abrangia matérias de todos os ramos do direito.

No caso de ocorrência de delitos contra a vida, o julgamento do(s) criminoso(s) era presidido

5 Em seu trabalho de conclusão do curso de Direito, na Universidade Federal do Ceará, intitulado A Reforma do

Código de Processo Penal: Os Novos Procedimentos do Tribunal do Júri (2008, p. 10 -17), o acadêmico

(17)

pelo monarca, o qual analisava o fato e aplicava a pena em conformidade com a Lei de Talião,

que não tolerava desculpas, nem explicações para erros.

Uma observação curiosa é o fato de que o julgamento segundo a Lei de Talião não

concedia tratamento igualitário aos que figuravam no banco dos réus, visto que o Código

cominava aplicações diferenciadas para cada envolvido, dependendo da classe social a que

pertenciam. Dessa forma, não se vislumbrava, na época, o respeito aos princípios da

imparcialidade e da plenitude da defesa, princípios estes fundamentais na contemporaneidade.

Os Evangelhos, segundo Aécio Moura e Silva6, repassavam uma noção do que

poderia ser um embrião à instituição do Júri, quando, no julgamento de Jesus Cristo, Pôncio

Pilatos delegou a decisão de crucificação ao povo que estava reunido no Sinédrio:

E convocando Pilatos os principais dos sacerdotes, e os magistrados, e o povo, disse-lhes: “haveis-me apresentado este homem como pervertedor do povo, e eis que, examinando-o na vossa presença, nenhuma culpa, das que o acusais, acho neste homem. Nem mesmo Herodes, porque a ele vos remeti, e eis que não tenho feito coisa alguma digna de morte. Castigá-lo-ei, pois, e soltá-lo-ei”.

[...]

Falou, pois, outra vez Pilatos, querendo soltar a Jesus. Mas eles clamavam em contrário, dizendo: Crucifica-o, crucifica-o. Então ele, pela terceira vez, lhes disse: ‘Mas que mal fez este? Não acho nele culpa alguma de morte. Castigá-lo-ei, pois, e soltá-lo-ei. Mas eles instavam com grandes gritos, pedindo que fosse crucificado. E os seus gritos, e dos principais dos sacerdotes, redobravam. Então Pilatos julgou que devia fazer o que eles pediam’.7

Na Grécia, o regime de tribunais era subdividido em dois importantes órgãos: a

Heliéia e o Areópago. Ricardo Vital de Almeida8 discorre sobre estes órgãos em sua

dissertação de mestrado:

6 Em seu trabalho de conclusão do curso de Direito na Universidade Federal do Ceará, intitulado O Tribunal do

Júri sob o aspecto constitucional da Soberania (2008, p. 12 -13), o acadêmico Aécio Moura e Silva transcreve

um trecho do julgamento de Cristo no qual Pôncio Pilatos delega a decisão da crucificação ao povo que se encontrava reunido no Sinédrio, tratando-se, em verdade, de uma ideia muito primitiva de Júri, pois a decisão partiu não como um ato judicial propriamente dito (acusação, instrução, decisão), mas como cumprimento de um costume da época, consistente em libertar um malfeitor por ocasião da Páscoa.

7

Bíblia de Estudo Aplicação Pessoal. N. T. Evangelho segundo Lucas, cap. 23, versículos 13-16 e 20-24. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida, versão revista e corrigida (RC), edição de 1995. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus, 2004, p. 958.

8

O Júri no Brasil – aspectos constitucionais – Soberania e democracia social. “Equívocos propositais e

(18)

O Areópago e a Heliéia marcaram os primeiros tempos da instituição do Júri, sendo aquele constituído por antigos arcontes, e competente para o julgamento de crimes envolvendo práticas sanguinárias, e este composto por centenas (e, algumas vezes, milhares) de julgadores do povo, todos cidadãos optimo jure, que se pronunciavam, após a tese defensiva, e de acordo com uma subjetiva e parcial apreciação da prova, ou seguindo aquilo que considerasse mais apropriado. Com o passar do tempo, as decisões do Areópago tornaram-se revisáveis pela Heliéia, como se esta fosse um “órgão” jurisdicional recursal. De forma semelhante ocorria em Esparta, onde os Éforos (juízes do povo) detinham competência análoga a dos Heliastas.

Dessa forma, enquanto o Areópago se encarregava do julgamento de crimes de

sangue, ou seja, crimes de homicídio premeditado, envenenamento e incêndio, segundo os

ditames da consciência de seus componentes, a Heliéia era composta por cidadãos de notório

saber jurídico, os quais decidiam, após ouvir a defesa do réu, segundo sua íntima convicção.

Neste ponto, surgem indícios da influência desses órgãos no atual contorno do Tribunal do

Júri no Brasil.

Em Roma, o processo penal se dividiu em três períodos: o processo comicial, o

acusatório e o da cognitio extra ordinem. Na República romana, a transição entre a cognitio e

accusatio deu origem à chamada justiça centurial. A organização jurisdicional romana girava em torno das quaestiones perpetuae, que era um órgão composto inicialmente por patrícios, visto que os plebeus vieram a integrar a atividade jurisdicional tempos depois.

Este órgão era presidido por um quaestor, sendo composto por 35 a 75 membros, e respeitava os princípios da oralidade e da publicidade nas decisões. Este quaestor, além de organizar e sortear os membros da quaestiones perpetuae, ainda pronunciava o resultado do julgamento.

No sistema romano, qualquer cidadão (pessoa com mais de 30 anos) poderia

exercer o direito de acusação, com exceção dos incapazes (mulheres), escravos e dos indignos

(pessoas reprováveis, às quais fora cominada a pena de infâmia). Com a acusação por parte de

um cidadão, o quaestor verificava os pressupostos de procedibilidade e os critérios de competência. Se o fato constituísse crime, a acusação era formalizada por meio de uma

(19)

Nas palavras de Franklin Roger Alves Silva9, a eleição dos membros do judices jurati (tribunal julgador) se dava por meio dos Senadores, cavaleiros e, posteriormente, entre os cidadãos, observadas as condições morais, sociais e econômicas, podendo haver recusas

imotivadas pelas partes. Após, era designada data para audiência, que seria dirigida pelas

partes e assistida pelo quaestor e pelo iudices, e, na qual, eram realizados debates e produzidas as provas.

A sentença era formalizada pelo quaestor, não se admitindo nenhuma modalidade de recurso a ser interposto, pois as decisões eram proferidas pelo próprio povo, não havendo,

à época, órgão competente para a apreciação. Tempos depois, a provocatio ad populum, espécie de recurso, julgado por populares, que revisava as decisões do cônsul, teve sua

competência delegada ao quaestor, visto que a reforma das decisões do cônsul trazia um certo desprestígio.

TUBENCHLAK10 afirma que a instituição do Tribunal do Júri, mercê de suas características conceituais e estruturais altamente polêmicas, viu-se debatida e questionada

através dos séculos, remanescendo a discussão até os dias atuais. Seus incontáveis fiéis e

defensores, digladiando-se com um sem-número de fogosos opositores, revelam o significado

de salutar batalha jurídico-política sobre o aperfeiçoamento da causa democrática.

MARQUES11 aduz que, com efeito, o Tribunal do Júri teve por berço a Inglaterra. Depois que o Concílio de Latrão aboliu as ordálias e os juízos de Deus, em 1215, espargiu-se

o Júri, pelas mãos da Revolução Francesa, por numerosos países, notadamente da Europa12,

simbolizando vigorosa forma de reação ao absolutismo monárquico, vale dizer, um

mecanismo político por excelência13, malgrado com supedâneos místicos e religiosos, ainda

presentes na fórmula do juramento do Júri inglês, onde há expressa invocação de Deus.

Na preleção de Hélio Tornaghi14, apoiando-se em Manzini,

9

SILVA, Franklin Roger Alves. História do Tribunal do Júri – Origem e evolução no sistema penal brasileiro. Museu da Justiça, Rio de Janeiro, 2005.

10

TUBENCHLAK, James. Tribunal do Júri – Contradições e Soluções, 5ª. ed. São Paulo: Saraiva, 1991, p.3.

11 MARQUES, José Frederico. A Instituição do Júri: volume I. São Paulo: Saraiva, 1963, p.3. 12

José Frederico Marques (1963, ps. 4 - 5) anota que, entre os países da Europa, a Holanda e a Dinamarca não acolheram o Júri, ressaltando igual repulsa na Argentina, apesar da existência de previsão legal.

(20)

O Júri moderno teve sua origem na Inglaterra, mas o instituto dos jurados se encontrava no direito processual romano. Oudot o pretende para a França: já meio séculos antes de Henrique II a instituir a Inglaterra em 1187, tínhamos nós em França uma assissa. Karamsin o reivindica para a Rússia, e Repp para a Escandinávia. Os ingleses, não só o reclamam com unhas e dentes, mas até vão mais longe e afirmam não o haverem trazido os normandos para o solo britânico. Ele já existiria ali antes da conquista; Guilherme já o teria encontrado lá.

MAGARINOS TORRES, no seu Instrução para Jurados, citado por ARY

AZEVEDO FRANCO, também alinha-se com aqueles que consideram ter tido a instituição

do Júri origem na Inglaterra. Elogiando o tribunal que ele presidia no Rio de Janeiro, então Capital da República, dizia que “[...] a antiga instituição, virtualmente inglesa, que se impôs à adoção do mundo civilizado pelo conceito filosófico sobre o crime, variante com os tempos e

lugares, também criou raízes no Brasil; e, discutida, embora, quanto ao seu funcionamento, foi sempre defendida como garantia suprema das liberdades cívicas”.

O escritor Ronaldo Leite Pedrosa15 afirma que, no artigo 48, da Magna Charta de 1215, pode ser vislumbrada com facilidade a espinha dorsal do júri, pelo qual obtiveram os

ingleses a garantia de que qualquer súdito somente seria julgado pelos próprios concidadãos, e não mais pelos prepostos do rei. “Ninguém poderá ser detido, preso ou despojado de seus bens, costumes e liberdades, senão em virtude de julgamento de seus pares segundo as leis do país”, diz o citado dispositivo da Charta Magna.

Nas palavras de Camila Aranda dos Santos16, na América do Sul, não há

composição análoga ao Júri brasileiro, desconhecendo-o totalmente a Argentina, e,

ressalvando-se eventual e evidentemente, alguns países que prevêem procedimentos penais

que privilegiem a oralidade, mas que não se revestem de uma maior semelhança com o nosso

Júri.

Nos Estados Unidos, ocorre, por vezes, um conflito entre a legislação federal e a

estadual –um “caos impenetrável”, que melhor se assemelha ao modelo que concebemos, os

Trial Juries, com sua composição de 12 jurados, tendo como nota distintiva mais marcante a necessidade da votação unânime e a inexistência da “incomunicabilidade entre os jurados”, bem como do “sigilo das votações”, razão pela qual se dá exatamente o contrário: o voto é revelado.

15 PEDROSA, Ronaldo Leite. Direito em História, Imagem Virtual, Nova Friburgo, 4ª edição, 2000. 16

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Nos Estados Unidos, acrescenta PEDROSA17,

Essa milenar instituição ganhou relevo especial, com uma composição de doze jurados para, simbolicamente, lembrar os doze apóstolos, devendo a decisão ser tomada sempre por unanimidade, podendo os jurados sempre confabular para chegarem a um veredicto: culpado ou inocente.

A Holanda desconhece a instituição do Júri, e a Espanha, que o houvera

suprimido em 1936, apenas recentemente (após 1995) deu-lhe contornos, pois a Constituição

espanhola de 1978, em seu artigo 125, previu certa participação dos cidadãos na distribuição

da Justiça.

Na Bélgica, os 12 jurados deliberam sobre a culpabilidade antes de reunirem-se

com três magistrados para decidirem a pena a ser aplicada. Esse mesmo sistema está em vigor

na legislação da Dinamarca, que prevê o Júri dentro de um “Tribunal Correcional”. Em

contrapartida, na Inglaterra, encontramos 12 como o número de jurados, enquanto na Escócia

este número sobe para 15. Todavia, no Reino Unido, a variedade na forma de procedimentos é

tamanha que se torna impossível qualquer simples comparação.

Na Suécia, o “tribunal de escabinados” (namnd) somente existe para os delitos de imprensa, tal como ocorria no Brasil quando da outorga da Constituição de 1824. Na Suíça, a

seu turno, cada grupo de pequenas cidades ou vilas (canton) tem seu próprio procedimento.

De forma exemplificativa, podemos mencionar o Canton de Genebra, composto por 12

jurados e três magistrados, que formam o Tribunal Criminal de Valais.

Na Alemanha, o Júri tradicional foi suprimido no ano de 1925, instituindo-se o “escabinado”, com a figura dos assessores, sendo que dois jurados são eleitos por quatro anos e tomam assento ao lado de três magistrados. O Tribunal de Instância (Amtsgertich) tem uma

composição variável: para julgamento de delitos com pena máxima até três anos, ele é

composto por dois escabinos (cidadãos comuns); já no que tange ao julgamento de delitos

mais gravosos, compõe-se de dois escabinos e dois juízes, mas há crimes julgados por dois

escabinos e três magistrados.

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A França, no ano de 1941, suprimiu definitivamente o Júri tradicional para instituir o sistema escabinado (Court d’ Assises), constituído por três juízes e nove cidadãos, com ausência de debates entre as partes, com competência exclusiva para o julgamento de

crimes mais graves. Já na Itália, funciona o giudici popolari, composto por dois juízes e seis

cidadãos.

Na Argélia, vigora o Código Processual da Argélia, tirado do sistema francês,

tendo previsão expressa em seu artigo 258 de um Tribunal Criminal composto por três

magistrados e quatro “assessores jurados”, sorteados para uma sessão trimestral. No

Marrocos, existia uma composição de Júri similar, até que a Lei editada em 28.09.1974 suprimiu os “assessores jurados” para fins de substituí-los por magistrados, que compõem as “ Câmaras Criminais do Tribunal de Apelação”, restando descaracterizado, portanto, o instituto do Júri.

No que concerne ao continente asiático, a Coréia do Sul não possui tal instituição.

Já o Japão o ignora, mesmo seu sistema judiciário sendo muito próximo do adotado nos

Estados Unidos, onde o Tribunal do Júri é emblemático. Encontramos ainda, ressalte-se,

formas assemelhadas ao Júri no Canadá, na Áustria, na Austrália, na Grécia, na Noruega, na

Nova Zelândia e, de forma similar, como escabinado, na Europa Oriental (Bulgária, Polônia,

Rússia, dentre outros).

Com o reconhecimento do Tribunal do Júri na Constituição brasileira de 1988, alinhado entre as instituições nacionais, no Título II (“Dos Direitos e Garantias Fundamentais”), a responsabilidade aumenta ao abordá-lo. Nas palavras de Edilson Mougenot Bonfim18,

O júri de hoje é mais técnico, perdendo espaço aquela antiga prática de apenas queimarem-se "uns fogos de vistas" aos jurados, que engalanava, empavonavam, floreavam com palavras, "a forma pela forma", mas cujo conteúdo era pouco esclarecedor, paupérrimo mesmo. Daqueles que sofriam de "eloqüência canina", como dizia Ápio. O perigo, hoje, por outro lado, é colocar o tecnicismo jurídico de tal modo,à outrance, exageradamente, que os jurados-leigos não o compreendam, desvirtuando o sentido da fala do orador. Se é verdade que os juradoshabituésde Júri têm lá algum conhecimento do jargão técnico, não menos verdade que à maioria cada palavra tem o som novidadeiro, virginal, que tanto pode revelar um conteúdo como escondê-lo, suprimindo a idéia que deveria revestir, ou mitificando-a,

18BONFIM, Edilson Mougenot. No tribunal do júri: a arte e o ofício da tribuna, crimes emblemáticos,

(23)

deturpando-lhe o sentido, a íntima significação. Podem, mesmo, tomar o significante pelo significado: "o réu é culpado...logo seu crime é culposo".

Ionilton Pereira do Vale19 sintetiza, de forma valorável, as características do Tribunal do Júri no Brasil:

O certo é que o Tribunal do Júri é um órgão especializado da Justiça comum estadual e federal que, com suas vicissitudes, pratica uma espécie de justiça por vezes inadmissível ao jurista de formação: a justiça popular, democrática e realizada pelos próprios pares, sendo impensável a sua supressão, visto que se trata de autêntico direito humano fundamental material, inserido como está nas chamadas cláusulas pétreas. Encontramos as seguintes características do Tribunal do Júri: a) os juízes são tirados do povo; b) decidem por íntima convicção (jurados) e por meio do livre convencimento motivado (Juiz-Presidente); d) há divisão de trabalho entre o jurado e o Juiz-Presidente; e) tutela o direito de liberdade, visto que se encontra no artigo 5º, XXXVIII, da Constituição Federal; f) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida: homicídio doloso, simples, privilegiado ou qualificado; g) é um órgão especial da justiça comum, estadual e federal; e h) é um órgão colegiado heterogêneo e temporário. São integrantes do Tribunal do Júri um Juiz de Direito, que é o presidente, vinte e cinco jurados sorteados entre os alistados anualmente, e o Conselho de Sentença, em número de sete jurados.

Guilherme de Souza Nucci20, com entendimento majoritário na doutrina, dividiu o Júri – em conceitos autônomos, porém interligados - em direito humano fundamental e

garantia humana fundamental. Cada um deles, por sua vez, divide-se em material e formal.

Direitos humanos fundamentais materiais são os essenciais à existência humana,

como pessoas individualizadas, cuidadas e respeitadas pelo Estado desse modo, podendo

viver em liberdade, sem restrições. Sem tais direitos, o ser humano não estaria inserido em um

Estado Democrático de Direito. Já os direitos humanos fundamentais formais são posições

subjetivas dos indivíduos, previstas como tais na Constituição, ainda que não sejam

fundamentais à sua existência, ou a qualquer outro direito considerado básico ou necessário.

Exemplo é o direito de não ser criminalmente identificado, caso já tenha identificação civil

(Art. 5º, LVIII, da CF/88).

As garantias humanas fundamentais materiais são salvaguardas instituídas pelo

Estado para fazer valer um direito humano fundamental. Sem elas, o direito individual pode

perecer (no caso do Júri, a plenitude da defesa). As garantias formais são as que constam do

19 VALE, Ionilton Pereira do. Princípios Constitucionais do Processo Penal na visão do Supremo Tribunal

Federal. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2009, p. 394-395).

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texto constitucional e, se forem extraídas, não implica no perecimento de um direito humano

fundamental material, ou seja, são salvaguardas de política legislativa (ninguém pode ser

preso, por exemplo, senão em flagrante delito, ou por ordem escrita e fundamentada de

autoridade competente).

A explicação de Guilherme de Souza Nucci é clarividente: o Estado declara a

vida, pois esta preexiste dentro do próprio direito; porém, o Estado estabelece a garantia à

ampla defesa aos acusados em geral.

Destarte, torna-se evidente a conclusão de que o Júri é direito e garantia humana

fundamental formal, merecendo ser respeitado, especialmente no que concerne aos princípios

constantes das alíneas do Art. 5º, inciso XXXVIII, da CF/88. O seu caráter formal não elimina

a situação jurídica de figurar no rol dos direitos e garantias individuais do mencionado Art. 5º.

O Poder Constituinte Originário ali o inseriu. Todavia, não devem o operador do Direito e o

legislador ordinário lesar o seu status e as regras constitucionais que o regulam.

No capítulo que segue, falaremos detidamente sobre os princípios constitucionais

que norteiam o Tribunal do Júri, ressalvando sua importância e sua aplicação no direito

(25)

3 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO JÚRI

Para Paulo Bonavides21, princípios são verdades objetivas, nem sempre

pertencentes ao mundo do ser, senão do dever-ser, na qualidade de normas jurídicas, dotadas

de vigência, validez e obrigatoriedade.

Os princípios constitucionais são aqueles que guardam os valores fundamentais da

ordem jurídica, condensando-se bens e valores considerados fundamentos de validade de todo

o sistema jurídico. Consoante o pensamento de CANOTILHO22,

[...] a Constituição é, [...] uma lei, configurando a forma típica de qualquer lei, compartilhando com as leis em geral um certo número de características (forma escrita, redação articulada, publicação oficial etc). Mas também, é uma lei diferente das outras: é uma lei específica, já que o poder que a gera e o processo que a veicula são tidos como constituintes, assim como o poder e os processos que a reformam são tidos como constituídos, por ela mesma; é uma lei necessária, no sentido de que não pode ser dispensada ou revogada, mas apenas modificada; é uma lei hierarquicamente superior – a lei fundamental, a lei básica – que se encontra no vértice da ordem jurídica, à qual todas as leis têm de submeter-se; é uma lei constitucional, pois, em princípio, ela detém o monopólio das normas constitucionais.

Dessa forma, é válido destacar que há princípios constitucionais expressos e

implícitos, como também há princípios processuais penais expressos e implícitos. Neste

trabalho, voltar-nos-emos à análise dos princípios constitucionais explícitos, referentes ao

Tribunal do Júri, enumerados no artigo 5º, XXXVIII, da Constituição, a seguir transcrito:

Art. 5º, XXXVIII, da CF/88 - É reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;

José Afonso da Silva23 afirma que

A inserção do Tribunal do júri no capítulo relativo aos direitos e garantias fundamentais e no capítulo relativo aos direitos e deveres individuais e coletivos

21 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 11ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 229. 22 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Fundamentos da Constituição. Coimbra: Almedina, 1991, p. 40, apud

ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de Princípios Constitucionais. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 100.

(26)

constitui garantia jurisdicional penal, protegendo o indivíduo contra atuações arbitrárias [...] E acrescenta: “a garantia de julgamento pelo tribunal do júri nos crimes dolosos contra a vida e, ainda mais, com as garantias subsidiárias da plenitude da defesa, do sigilo das votações dos jurados e da soberania dos veredictos (inc. XXXVIII), significa dizer que “outro tribunal não pode reformar o mérito da decisão do júri; pode anular o processo por vício de forma, não mudar o mérito do julgamento”.

NUCCI24 salienta a importância dos princípios constitucionais, pois um ordenamento coerente parte destes princípios para interpretar e aplicar as normas

infraconstitucionais, e não o oposto.

Infelizmente, no Brasil, tem sido hábito de operadores do Direito dar

aplicabilidade quase absoluta ao disposto no Código de Processo Penal e leis especiais

correlatas, desprezando-se o disposto na Constituição Federal. Age-se como se a lei ordinária

fosse mais importante que a norma-princípio constitucional, o que se trata de uma inverdade,

bem como afronta a supremacia constitucional. A seguir, detalharemos os princípios

constitucionais relativos ao Tribunal do Júri.

3.1 Plenitude de defesa e Amplitude de defesa

Em poucas palavras, a plenitude da defesa simboliza a impossibilidade de o réu

ser julgado sem a devida assistência de defensor constituído ou nomeado.

Tomando-se a capacidade técnica do defensor como capacidade postulatória,

ter-se-á inegável sua indisponibilidade, não sendo ela uma mera faculdade ao acusado, pois é

essencial ao processo25:

A defesa, no processo penal, apresenta-se sob dois aspectos: defesa técnica e autodefesa. A primeira é, sem dúvida, indisponível, na medida em que, mais do que garantia do acusado, é condição de paridade de armas, imprescindível à concreta atuação do contraditório e, consequentemente, à própria imparcialidade do juiz.

Nas palavras de Karla Karênina Andrade Carlos Cavalcante26, é a defesa técnica,

em verdade, que assegura a observância do princípio constitucional da ampla defesa e do

24 NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri, 2ª. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011, p. 24.

25 GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; MAGALHÃES FILHO, Antônio. Op. Cit. p.

(27)

contraditório, os quais, em não sendo atendidos, acarretam a nulidade do processo; daí sua

indisponibilidade.

Compõe-se a autodefesa de direito de audiência, que é a possibilidade que tem o

réu de influir na formação do juízo do magistrado, durante o interrogatório, e direito de

presença, compreendendo, este último, como se depreende do próprio nome, a possibilidade

de o réu se fazer presente a todos os atos processuais27.

A autodefesa complementa a defesa técnica e, segundo MIRABETE28, consiste na

participação do réu em quase todos os atos do processo, inclusive com a possibilidade de

apresentar alegações, como no interrogatório.

O novo interrogatório realizado em plenário não pode se limitar simplesmente à

reprodução de interrogatório anterior, observadas as mudanças efetuadas pela Lei

10.792/2003. O contraditório consiste, portanto, em manifestar-se a defesa depois da

acusação, podendo recusar até 03 (três) jurados sem motivação.

O Supremo Tribunal Federal, inclusive, com base nesta importante característica

do Júri Popular, já decidiu pela não ocorrência da preclusão, em havendo malferimento do

disposto na Constituição Federal, em referência à plenitude da defesa.

No caso concreto, entendeu o Supremo Tribunal Federal que, em sobrevindo

condenação por excesso doloso punível, deve o julgamento continuar, impondo-se a

indagação, aos jurados, de todos os outros quesitos, relativos à legítima defesa, quer de

terceiros (ex persona), quer da honra própria do acusado (in persona)29.

26 CAVALCANTE, Karla Karênina Andrade Carlos. A defesa técnica em plenário do Tribunal do Júri. p. 16-

17, Monografia em Direito – Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2002. 27 Nesse sentido, o HC 67.755-o-sp, DJU 11.09.92, p. 14.714, da 1ª Turma do STF.

28

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal. 10ª Ed.rev. e atual. São Paulo, Atlas, 2000. p. 338.

(28)

A autodefesa, ressalte-se, não apresenta indisponibilidade, característica

fundamental para a defesa técnica, sendo faculdade ao réu renunciá-la. Esta dispensabilidade,

frise-se, é tão-somente para o réu: o juiz não pode dispensar a autodefesa, pois, se o fizer,

ocorre o cerceamento da autodefesa, o que pode acarretar no sacrifício de toda a defesa do

acusado.

É válido esclarecer ainda que o direito à ampla defesa foi incorporado pela

Constituição Federal de 1988 como corolário do princípio do devido processo legal, que

protege duplamente o indivíduo ao assegurar-lhe o respeito às disposições normativas pelo

Estado e à plenitude da defesa, plenitude esta que, consoante o insigne professor Alexandre de

Moraes30, consiste no direito à defesa técnica, à publicidade do processo, à citação, à

produção ampla de provas, ao direito de ser processado e julgado por juiz competente, direito

aos recursos, à decisão imutável e à revisão criminal.

Cumpre trazer a lume a consideração de LIEBMAN31:

O poder de agir em juízo e o de defender-se de qualquer pretensão de outrem representam a garantia fundamental da pessoa para a defesa de seus direitos e competem a todos, indistintamente, pessoa física e jurídica, italianos [brasileiros] e estrangeiros, como atributo imediato da personalidade e pertencem, por isso, à categoria dos denominados direitos cívicos.

Ainda no tocante à amplitude da defesa, o professor Flávio Cardoso32 explica e

conclui:

É no processo penal, todavia, que a ampla defesa recebe uma forma toda própria, distinta da que normalmente possui nos demais tipos de processo – ou seja, nos processos civil e administrativo. Tal garantia, na persecução criminal, envolve o direito do acusado à defesa técnica e à autodefesa. Quando, na Constituição, se assegura a ampla defesa, entende-se que, para a observância desse comando, deve a proteção derivada da cláusula constitucional abranger o direito à defesa técnica durante todo o processo e o direito à autodefesa. A primeira consiste no direito à assistência profissional no curso do procedimento, seja por advogado constituído ou defensor público, e tem por características essenciais a indisponibilidade e a efetividade – o processo penal proíbe o patrocínio meramente contemplativo ou aparente. Já a segunda, a autodefesa – confere ao acusado o direito de, pessoalmente, exercer atos típicos de defesa, independentemente de possuir capacidade postulatória, e é marcada, principalmente, pelo seu caráter disponível.

latitude do cerceamento de defesa, não pode comportar preclusão, pelo fato de a defesa não ter, no momento próprio, feito qualquer protesto” (HC 73.124, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 19.04.1996).

30 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 5ª ed. rev. São Paulo, Atlas, 1999. p. 112. 31

LIEBMAN, Enrico Tullio. Manuale di Diritto Processuale Civile. 3. Ed. Milano, Giuffrè, 1973, v. 1/10. 32Em aula ministrada no dia 06 de maio de 2011, na disciplina de processo penal do curso Damásio, o

(29)

3.2 Sigilo das Votações

Este princípio reside no fato de decidir o jurado de forma sigilosa, não podendo,

após o sorteio, comunicar-se com outrem, nem emitir opinião sobre o processo (Art. 458, §1º,

do CPP). Pode, em contrapartida, formular perguntas à testemunha (Arts. 467 e 468, do CPP),

indagar sobre ponto dos autos referidos pelas partes e, terminados os debates, pedir

esclarecimentos acerca das questões de fato.

O formato das cédulas de votação também representa uma forma de assegurar o

sigilo das respostas dos jurados, visto que são feitas de papel opaco, sendo facilmente

dobráveis e recolhidas de forma a resguardar a decisão de cada jurado.

Em recente publicação na Internet, no site de relacionamento Facebook33,

Guilherme de Souza Nucci comenta o princípio em estudo, conforme transcrito a seguir:

JÚRI E SIGILO DAS VOTAÇÕES. A partir da edição da Lei 11.689/2008, tivemos alteração na forma de votação dos jurados em sala secreta. No júri, decide-se por maioria de votos. São sete jurados. Logo, ao atingir o quarto voto (pelo "sim" ou pelo "não"), encerra-se a votação, proclamando-se o resultado do quesito por maioria de votos. Com isso, preserva-se o sigilo, afinal, se a votação tiver sido unânime, ninguém ficaria sabendo. Adotei essa posição expressamente no meu livro Tribunal do Júri. Há posição em sentido contrário, pretendendo seja o resultado total divulgado (4 x 3 ou 6 x 1 ou 7 x 0 etc.). Recentemente, o STF adotou a nossa posição.

Como já comentamos em capítulo anterior, nos Estados Unidos, ocorre, por vezes,

um conflito entre a legislação federal e a estadual – um “caos impenetrável”, que melhor se

assemelha ao modelo que concebemos, os Trial Juries, com sua composição de 12 jurados, tendo como nota distintiva mais marcante a necessidade da votação unânime e a inexistência da “incomunicabilidade entre os jurados”, bem como do “sigilo das votações”, razão pela qual se dá exatamente o contrário: o voto é revelado.

Na Inglaterra, da mesma forma que nos EUA, é permitido que o Conselho de

Sentença converse entre si. Os jurados, ao se reunirem secretamente, discutem abertamente

entre si sem serem vigiados, e buscam o consenso, não sendo possível a comunicação com o

público.

(30)

Muitos opõem-se à tal contrariedade ao sigilo das votações, pois defendem a

possibilidade de jurados mais articulados e astutos exercerem influência sobre os demais e

alterarem o convencimento dos mesmos acerca da existência do crime, dos indícios de autoria

e da própria culpabilidade do(s) acusado(s). Nesse caso, em verdade, não existiria um

consenso entre jurados, mas sim a sobreposição de opiniões mais fortes sobre as demais.

Uadi Lammêgo Bulos34, analisando o princípio constitucional em tela, afirma que,

através do sigilo das votações, a opinião dos jurados fica imune às interferências externas,

protegendo-se a livre manifestação do pensamento. Mesmo os jurados formulando perguntas,

nos momentos de dúvidas, e indagando sobre as dúvidas surgidas na leitura dos autos ou na

exposição dos fatos pela defesa técnica, a proteção ao segredo da votação não se desfigura. Na

sala secreta, através da distribuição de cédulas para coletar os votos, o vetor constitucional

processual penal do sigilo das votações é alvo de observância rigorosa, a fim de resguardar a

decisão dos jurados.

3.3 Soberania dos Veredictos

A soberania dos veredictos, nas palavras de Ionilton Pereira do Vale35, resulta na impossibilidade de os juízes togados substituírem os jurados em suas decisões, o que,

contudo, não exclui a recorribilidade de suas votações, por meio da apelação, ou do protesto

por novo júri, e, até mesmo, a revisão criminal, visto que não tem caráter absoluto, assim

como todos os direitos fundamentais, justificando o seu controle pelo Poder Judiciário. Nesse

sentido, é válida a transcrição do seguinte julgado:

“A soberania dos veredictos do Júri – não obstante a sua extração constitucional – ostenta valor meramente relativo, pois as manifestações decisórias emanadas do Conselho de Sentença não se revestem de intangibilidade jurídico-processual. A competência do Tribunal do Júri, embora definida no texto da Lei Fundamental da República, não confere a esse órgão especial da Justiça comum o exercício de um poder incontrastável e ilimitado. As decisões que dele emanam expõem-se, em consequência, ao controle recursal do próprio Poder Judiciário, a cujos Tribunais compete pronunciar-se sobre a regularidade dos veredictos. A apelabilidade das decisões emanadas pelo Júri, nas hipóteses de conflito evidente com a prova dos autos, não ofende o postulado constitucional que assegura a soberania dos veredictos deste Tribunal Popular” (HC 68.658, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 26.06.1992).

34

Constituição Federal Anotada, Editora Saraiva, São Paulo, 2002, 4ª ed., p.202.

35 VALE, Ionilton Pereira do. Princípios Constitucionais do Processo Penal na visão do Supremo Tribunal

(31)

Em contrapartida, MARQUES36 aduz:

Já com a soberania absurda do Júri o mesmo não se verifica, visto que as suas deficiências são congênitas e constitucionais. Não há reforma capaz de melhorar o Júri enquanto seus veredictos forem soberanos, porquanto o Júri no Brasil é deficiente como em toda a parte, visto que ninguém se improvisa em julgador do dia para a noite. O próprio Júri inglês, que não pode ser acoimado de complacente para os criminosos, quem nos garantirá ser o órgão que a justiça penal exige? Para julgar não basta o bom senso, nem tampouco o rigorismo com o delinquente. A tarefa é muito mais vasta e complexa e requer, por isso, amadurecimento e reflexão baseada em conhecimentos científicos bem sedimentados.

No entanto, a análise do princípio da soberania dos veredictos é algo simples e, ao

mesmo tempo, complexo. Nas palavras de NUCCI37, é algo simples, se levarmos em conta o óbvio: o veredicto popular é a última palavra, não podendo ser contestada, quanto ao mérito,

por qualquer tribunal togado. É, entretanto, complexo, na medida em que se vê o desprezo à

referida supremacia da vontade do povo em grande segmento da prática forense.

Muitos tribunais togados não têm vergado, facilmente, à decisão tomada pelos

Conselhos de Sentença. Alguns magistrados procuram aplicar a jurisprudência da Corte onde

exercem suas funções, olvidando que os jurados são leigos e não conhecem – nem devem,

nem precisam – conhecer a jurisprudência predominante em tribunal algum.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, NUCCI salienta que, se a participação

popular no Judiciário, por meio do Júri, é tão enaltecida por muitos como mecanismo do

exercício da cidadania numa autêntica democracia, deve-se respeitar a decisão proferida, em

homenagem à soberania dos veredictos. E Ricardo Vital de Almeida38, em sua tese de mestrado, acrescenta: “patrimônio da cidadania e garantia fundamental, a soberania plena dos veredictos do Júri está acima de quaisquer pretensas justificativas que possam permitir sua negação”.

36

MARQUES, José Frederico. A Instituição do Júri: volume I. São Paulo: Saraiva, 1963, p.08.

37 NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri, 2ª. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011, p. 30-31. 38

ALMEIDA, Ricardo Vital de. O Júri no Brasil – aspectos constitucionais – Soberania e democracia social.

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