O sentido da Filosofia Medieval
Ricardo da Costa (Ufes)
www.ricardocosta.com
Um dedicado grupo de discípulos estuda uma lição com seu mestre – repare nos olhos de todos: tanto os do
O sentido da Filosofia Medieval no Hortus
deliciarum (c. 1180)
da abadessa Herrada de Hohenbourg
Mosteiro de Saint-Odile (Alsácia)
A rainha Filosofia traz sob a cabeça uma grande coroa com três cabeças, que
representam a Ética, a Lógica e a Física (segundo Platão, as três partes do ensino da Filosofia). Em suas mãos, a Filosofia tem um imenso rolo de papel, no qual se lê: “Toda sabedoria vem de Deus; somente os sábios podem fazer o que desejam”.
Ao seus pés, diante de púlpitos, estão Sócrates e Platão, considerados os
A
Gramática
tem um livro e um látego (chicote de cordas) em sua mão direita, e diz: “Por mim, todos podem aprender o quesão as palavras, as sílabas e as cartas”.
A
Retórica
tem um estilete e duas tabuinhas, e diz: “Graças a mim, orgulhoso orador, teus discursosA
Dialética
, com a mão direita, aponta para um interlocutor, e coma outra segura a cabeça de um cachorro, e afirma: “Meus
argumentos são rápidos como os latidos de um cachorro”.
A
Aritmética
tem um tipo de ábaco, e afirma: “Baseio-me nos números e discrimino o que existeA
Geometria
, com régua ecompasso, diz: “Examino as terras com exatidão”.
A
Música
toca uma harpa – outros instrumentos estão juntos dela (uma lira e um pequeno órgão) – ediz: “Eu ensino minha arte com a ajuda de uma variedade de
Por fim, a
Astronomia
tem uma lupa (ou um tipo de espelho) em sua mão esquerda, e aponta para as estrelas: “Eu tenho meunome dos corpos celestes e prevejo o futuro”.
No grande círculo exterior há quatro versos: “A Filosofia ensina as artes por sete ramos. Investiga os segredos dos elementos e
Fora do círculo, na parte inferior, o que está excluído do âmbito da
Filosofia: quatro homens (poetas e magos), sentados diante de
púlpitos. Como o texto indica, são guiados por espíritos maus e impuros, e o que vem deles são contos, fábulas, frívolas poesias ou
receitas de magia.
Os maus espíritos estão representados por pássaros negros, em oposição à pomba branca, símbolo do Espírito Santo. Eles estão em
“O Jardim das delícias estava pensado, conforme escreveu Herrada em sua Introdução, para informar e deleitar suas monjas, e ajudá-las a
progredir no serviço de Deus (...) é um fascinante exemplo do considerável nível que a capacidade intelectual e artística das
mulheres podia alcançar em uma abadia favorecida pela segurança e as riquezas que obtinha de suas residentes, membros do nível mais
rico e culto da população.”
Cristianismo e Filosofia
Rafael Ramón Guerrero(Univ. Complutense de Madrid) No princípio era o Logos
e o Logos estava com Deus e o Logos era Deus.
No princípio, ele estava com Deus. Tudo foi feito por meio dele
e sem ele nada foi feito.
O que foi feito nele era a vida, e a vida era a luz dos homens; e a luz brilha nas trevas,
mas as trevas não a apreenderam. (Jo, 1, 1-5)
Eu, a Sabedoria, moro com a sagacidade, e possuo o conhecimento da reflexão. O temor de Iahweh odeia o mal.
Detesto o orgulho e a soberba, o mau caminho e a boca falsa.
Cristianismo e Filosofia
– “O cristianismo tenta aliviar o homem de sua miséria nessa vida, mostrando-o qual é a causa dessa miséria e mostrando-onde está mostrando-o remédimostrando-o”;
– Trata-se de uma nova versão do ‘conhece-te a ti mesmo’;
– Dependência e libertação: “O homem é instado a descobrir dentro de si o
homem religioso, um homem que não é cidadão, nem indivíduo, nem sequer
homem, mas um ser cuja razão de ser está na dependência que tem de Deus. Mas se trata de uma dependência que é, por sua vez, libertação, porque depender de Deus é algo que libera o homem de seu próprio jugo, de suas próprias
dependências, fazendo-o reconhecer que seu verdadeiro destino é o de elevar-se até Deus”.
– “O cristianismo se apresentou como uma nova paideia, como uma forma de
humanismo, que consistia em preparar homens capazes de amar a Deus, de amar aos demais homens em Deus, e de amarem a si mesmos. A fé cristã, ao ter como fim essencial aumentar no homem o amor, tratou de fazer inteligível essa mesma fé partindo do amor, o que significou, de alguma maneira, o rechaço do