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O conflito entre um tratado internacional e uma norma interna brasileira

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UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

DIOGO LUIZ MAROSKI

O CONFLITO ENTRE UM TRATADO INTERNACIONAL E UMA NORMA INTERNA BRASILEIRA

Ijuí (RS) 2013

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O CONFLITO ENTRE UM TRATADO INTERNACIONAL E UMA NORMA INTERNA BRASILEIRA

Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DECJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

Orientador: MSc. Marcelo Loeblein dos Santos

Ijuí (RS) 2013

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Agradeço a minha mãe, ao meu pai e a minha irmã que forneceram o apoio necessário para que eu pudesse realizar a faculdade da forma mais tranquila possível.

Agradeço ao meu orientador Marcelo Loeblein dos Santos que me demonstrou na prática ser imprescindível sua orientação.

Agradeço aos amigos, aos colegas de faculdade, colegas de trabalho e aos parentes que me ajudaram durante a faculdade.

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negligencie, que os mil deuses do país de Hatti e os mil deuses do país do Egito lhe deem boa saúde e façam que viva ele, sua casa, seu país e seus servos.”

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Este trabalho aborda a questão do conflito entre o direito internacional e o direito interno do Brasil. No início, a soberania dos Estados é estudada. O trabalho, em seguida, apresenta a norma interna, o processo legislativo no Brasil, o acordo internacional, a elaboração dos tratados e a ratificação. Depois, a monografia esclarece as teorias dualista e monista e discute a relação entre os tratados e a ordem jurídica interna do Brasil, os acordos internacionais no âmbito da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados e no âmbito da Constituição Brasileira de 1988. Finalmente, a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o tema e a opção pela teoria monista, a jurisprudência e a visão da doutrina jurídica.

Palavras-chaves: Norma interna. Soberania. Teorias dualista e monista. Tratados internacionais.

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This work addresses the issue of the conflict between international law and the Brazil’s domestic law. At the outset, the sovereignty of states is studied. The work then models the municipal law, Brazil's legislative process, international agreement, treaty-making and ratification. After, the monography clarifies the theories dualist and monist and discusses the relationship between treaties and the domestic legal order of Brazil, the international agreements within the Vienna Convention on the Law of Treaties and within the Brazilian Constitution of 1988. Finally, the Supreme Federal Court’s decision on the theme and the option of the monist theory, the jurisprudence constante and the view of the legal doctrine and the conclusion.

Keywords: International agreement. Monist and dualist theories. Municipal law. Sovereignty.

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INTRODUÇÃO ... 8

1 AS NOÇÕES DE SOBERANIA, NORMA INTERNA E TRATADO INTERNACIONAL ... 10

1.1 A Soberania dos Estados ... 10

1.1.1 A Soberania do Brasil ... 14

1.2 As Normas Internas e o Processo Legislativo ... 16

1.2.1 O Processo Legislativo no Brasil ... 17

1.2.2 A Norma Interna no Brasil ... 21

1.3 Os Tratados Internacionais e o Processo de Formação ... 23

1.4 O Conflito e as Teorias de Solução: Teorias Dualista e Monista ... 28

1.4.1 A Teoria Dualista ... 29

1.4.2 A Teoria Monista ... 30

1.4.2.1 A Primazia do Direito Interno ou Monismo Nacionalista ... 31

1.4.2.2 A Primazia do Direito Internacional ou Monismo Internacionalista ... 31

1.4.2.3 A Teoria Conciliatória ou Monismo Moderado ... 31

2 O CONFLITO ENTRE UM TRATADO INTERNACIONAL E UMA NORMA INTERNA BRASILEIRA ... 33

2.1 A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados ... 33

2.2 Os Tratados Internacionais na Constituição Federal de 1988 ... 39

2.2.1 A Alteração trazida pela Emenda Constitucional 45/2004 ... 42

2.3 A Posição do Supremo Tribunal Federal ... 45

2.3.1 A Decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 80.004-SE .. 45

2.3.2 Algumas Decisões do Supremo Tribunal Federal Acerca da Matéria ... 47

2.4 Algumas Considerações Doutrinárias ... 49

CONCLUSÃO ... 56

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INTRODUÇÃO

A globalização torna mais próximas as diferentes partes do planeta e a interdependência atinge a todos. Com a intensificação das relações a nível mundial e a se perceber que as decisões nacionais já são politicamente tomadas a se avaliar o contexto mundial contemporâneo, percebe-se que o Brasil, soberano que é para criar sua própria legislação, também o é para negociar acordos com outros Estados no que for de seu interesse.

Ou ao se pensar na possibilidade de ocorrer conflito entre o tratado internacional assinado pelo Brasil e as normas internas brasileiras, ou ao se ver perante isso num processo nas esferas judiciárias nacionais, percebe-se imediatamente existir este problema a ser questionado e resolvido: quando uma norma interna vai de encontro a um tratado internacional em que o Brasil é signatário, aquela ou este prevalece? E a soberania dos Estados, como permanece?

Essas questões levantadas colocam o conflito entre norma interna e tratado internacional na ordem do dia e qualquer estudante das ciências jurídicas pode se defrontar com uma situação em que terá que escolher entre dois regulamentos a se contradizerem e terá que chegar a uma conclusão, pois o Direito não passa incólume aos fatores associados ao mundo, ciência humana que é, aliás, deve acompanhar os desdobramentos da história para não se dissociar da sua função de regular as relações sociais. Então, justifica-se a escolha deste tema para a pesquisa devido à necessidade atual, e que aparentemente aumentará, de se compreender as relações internacionais e internas no que se refere à solução do conflito das leis nacionais com os acordos exteriores.

Buscar-se-á, principalmente em nível brasileiro, verificar o que são as partes envolvidas nesse conflito, as normas internas e os tratados internacionais, como é o processo

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de formação delas pelos estados e como podem vir a ser confrontar. Caso isso ocorra, como estão a doutrina e a jurisprudência a avaliar a questão e quais são as soluções que o Direito está a entregar para a resolução dessa situação na prática.

O método escolhido para este trabalho é o de pesquisa de obras que versem sobre o tema, ou que tenham relação, e da legislação e da jurisprudência pertinentes. Começa-se por avaliar a soberania dos Estados, as normas internas e o processo legislativo no Brasil, os tratados internacionais e o processo de formação de tais documentos. A seguir, analisam-se as teorias monista e dualista, que trazem explicações entre os contrastes entre norma interna e tratado internacional para, em seguida, abordarem-se o conflito tema desta monografia, a legislação, a doutrina, a jurisprudência e o posicionamento do Supremo Tribunal Federal.

Como dito num dos parágrafos anteriores, a soberania é essencial para dar a representatividade necessária ao Estado para que crie suas próprias leis e procure outros para executar tratados a nível mundial, então, avaliar-se-á se esse é um item que está sendo levado em consideração e quais são as implicações para o Brasil conforme a decisão escolhida para a resolução das controvérsias entre as leis nacionais e as convenções feitas com outras nações.

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1 AS NOÇÕES DE SOBERANIA, NORMA INTERNA E TRATADO INTERNACIONAL

O conflito é composto por um lado pela norma interna e pelo outro, o tratado internacional. Compreender como surgem tais é necessário para o melhor entendimento das relações de atrito que pode ocorrer, porém, antes de se partir para o estudo desses, faz-se necessário estudar algo que está no surgimento dos dois institutos citados, que é a soberania.

Encontra-se na doutrina também essa opinião. Conforme Piloni (2004, p. 11) a solução para o conflito entre norma interna e tratado internacional é algo que não se encontra resolvido no nível internacional nem no nível nacional e que ainda está a ser estudado, principalmente o entendimento acerca do que são as partes envolvidas nessa lide: a norma interna e o tratado internacional

Mas não bastam só as noções sobre essas leis que conflitam entre si. De acordo com Piloni (2004, p. 11), o quanto a soberania está a ser violada está no cerne de toda a questão. A ação de saber sobre o conceito, as características e a visão atual que se tem da norma interna e do tratado internacional deve ser complementada com a mesma ação acerca da soberania e das teorias que a doutrina já apresentou sobre o conflito.

1.1 A Soberania dos Estados

A soberania não tem um conceito unânime. De acordo com Piloni (2004, p. 12), a definição foi alterando com o passar do tempo com observações dentro de mesmos períodos acerca do que é isso, mas as conceituações já feitas possuem âmago senão igual, quase. Essencialmente, pode-se voltar para o próprio conhecimento semântico adquirido no processo de formação linguística e se deduzir a ideia de que algo soberano é o antônimo de algo subordinado, então, quem detém soberania é alguém que não se subordina a outros. A partir disso, passam a surgir as alterações nessa ideia que se posicionam a se detalhar mais a extensão dos limites do conceito no que se refere à amplitude da soberania, às formas como ela se efetiva.

Estados detêm soberania. Esses entes se apresentam num patamar acima de toda a estrutura de poder existente para um povo morador de um espaço, a última instância numa

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sequência finita de esferas governamentais as quais os cidadãos não podem ultrapassar. Esse ente independente não necessariamente ignora ou nega a existência de outros equivalentes, mas tem a si como autônomo nos aspectos territoriais, populacionais e governamentais, cabendo ao ser estatal as únicas decisões sobre essas coisas ao fim, ao contrário do que ocorre com outras circunscrições, como no Brasil com os estados e os municípios, que também têm território, populações e governos, mas se subordinam à União, a pessoa que se posiciona no encerramento superior. De acordo com Rezek (2011, p. 259):

Identificamos o Estado quando seu governo — ao contrário do que sucede com o de tais circunscrições – não se subordina a qualquer autoridade que lhe seja superior, não reconhece em última análise, nenhum poder maior de que dependam a definição e o exercício de suas competências [...].

A necessidade de se garantir a autonomia do Estado se apresenta como tentativa para a continuidade da existência e do poder dessa instituição, acima de ameaças internas e externas, frente aos próprios cidadãos e frente aos outros países. Em situação hipotética, se existisse um único Estado no mundo, justificar-se-ia a soberania perante os nacionais para se evitar golpes vindos do interior.

A princípio, a ideia era da determinação da soberania como algo absoluto, supremo diante dos outros e que agia de forma ilimitada. A tese da autonomia do Estado continuou presente, mas paulatinamente até hoje, a visão de que os governos nacionais não podem se movimentar de maneira desenfreada e se combinar com outros ou se subordinar em nenhum aspecto de sua existência foi sendo questionada e substituída por limites mais estreitos na atuação da independência estatal. De acordo com Piloni (2004, p. 12) e Albuquerque (2004, p. 97), pode-se dizer que o pensamento acerca da soberania é mais flexível agora que no passado.

Desde a fase aristotélica na filosofia, importantes figuras do pensamento humano se debruçaram acerca do tema da soberania até chegar aos contornos atuais, mas foi a partir da Idade Moderna que se passou a dar sistematização ao assunto. Matos e Siqueira (2010, p. 3) relacionam que o primeiro foi Jean Bodin no século XVI que determinou ser a soberania perpétua e sem limites menores aos dados por duas barreiras: Deus e a natureza. Nessa época, o absolutismo passou a se fortalecer na Europa e esses pensamentos iam ao encontro do sistema em que o governante detinha todo o poder. Mas mesmo nesse período, pode-se

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verificar que Jean Bodin já dispunha que caso quem detivesse o poder firmasse acordos com outros, deveria respeitá-los, pois se não o fizesse, descumpriria as leis do divino e do natural.

Ainda conforme Matos e Siqueira (2010, p. 3) durante o século XVII, Thomas Hobbes desenvolveu a ideia que a soberania estatal advém dos súditos que abrem mão de parte de sua liberdade e a entregam para o governo que a partir desse momento possui soberania sem limites e que jamais restaura para os cidadãos esse poder que lhe foi concedido. Duzentos anos depois, Georg Jellinek definiu que a soberania independentemente de concedida por Deus, pela natureza ou pelo homem, é a característica que o Estado detém de autodeterminação e de decidir ao que se obriga e para isso pode desenvolver um ordenamento jurídico que posteriormente limitará a ação do próprio governo que o criou.

Há ainda também críticas a todas essas conceituações e até teoria que nega a existência da soberania. Matos e Siqueira (2010, p. 4) ainda apontam que o francês Léon Duguit foi um especialista em direito administrativo e levantou comentários que apontam falhas nas lucubrações dos pensadores do Direito que o precederam. Primeiramente, ele disse que o Estado para ser realmente soberano se determina obedecendo somente a própria vontade e age ilimitadamente para tal feito, pois se encontra uma proibição para proceder de forma irrestrita e se submete, não se está diante de uma situação de soberania limitada, pois isso não existe mas sim ante um momento de subordinação, e quem em algum momento se rebaixa, não tem supremacia. Além disso, quanto à gênese, a única possibilidade de incontestabilidade possível da soberania é que a fonte dela seja de ordem além da matéria, o próprio divino, o que na prática não ocorre, pois não há ordenações provadas de seres metafísicos a conceder independência e se assim fosse, isso daria poder total a quem governasse o Estado, pois quem o contestasse, enfrentaria uma força mais poderosa que qualquer arma humana já desenvolvida, e mesmo quando se diz que são os cidadãos que concedem a soberania, não há como sempre determinar que a vontade coletiva é superior a vontade individual, então, novamente se vê uma forma de opressão de todo um grupo sobre um indivíduo que pode querer não optar em conceder parte de suas liberdades para a constituição do Estado. Voltando a contestação acerca de existir soberania limitada, Georg Jellinek cogita que se é próprio governo que cria o ordenamento jurídico e o revoga, se porventura houver leis que impedem a completa autodeterminação, pode-se simplesmente extingui-las e criar outras que vão ao encontro das intenções estatais, então, ninguém que produz, modifica e cessa as próprias normas está realmente submetido a elas.

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Matos e Siqueira (2010, p. 4) dizem que a partir das definições de Hermann Heller, passa-se a verificar uma aproximação maior ao conceito atual mais aceito de soberania. Ele basicamente atrela a questão da autonomia com a temática da jurisdição, pois ter o Estado a última decisão ao final de uma sequência de várias instituições, assim a ser a mais alta instituição em um território, é o que define esse ente como soberano, pois cria as suas normas internas e em entre essas, decide quais são as competências que chama para si e quais as que dispensa. Depois, verificou-se que se assim feito, pode um governo aprovar um tratado internacional e depois deixá-lo de cumprir por o documento não combinar com a característica de soberania do Estado. Essas questões levaram ao surgimento de doutrinas a explicar o porquê dos conflitos entre norma interna e tratado internacional, nas quais até Kelsen se posicionou pela supremacia do direito internacional sobre o nacional, o que será melhor detalhado posteriormente.

Como dito, pode-se verificar que durante o passar dos anos, a opinião dos juristas e as legislações foram gradualmente evoluindo, o que deixou espaço para que os conceitos de soberania fossem se transformando até chegar às propostas atuais em que a soberania é compreendida como algo que tem existência e que se mostra flexivelmente constituída: em alguns momentos é mais limitada, em outras situações é irrestrita. De acordo com Piloni (2004, p. 17) a atuação da autodeterminação dos Estados está a ocorrer nestes tempos de formas diferentes nas esferas nacionais e nas internacionais, por exemplo, no plano interno a soberania é apresentada como incontestável e intransponível para as pessoas que habitam certo território, mas no plano externo, as várias soberanias estatais atuantes no mundo acabam por se limitar umas as outras, pois cada um respeita a independência alheia, sendo essa inclusive uma forma de governos conseguirem aliados e de evitar ataques externos em troca do comprometimento de também não agredirem os seus equivalentes.

Na sequência desse raciocínio, nota-se que nessa totalidade de várias nações a terem suas autodeterminações reconhecidas, há hoje a aceitação de que a soberania no ambiente interno deve ser mais rígida do que aquela a ser chamada no ambiente internacional, pois assim se preserva a ordem nacional e a mundial, já que o governo domesticamente pode exercer sua função de maneira mais incontestável pelo povo, o que torna menos perturbadas as relações dentro do país; e exteriormente respeita e não se afronta na presença de outros governos com independência reconhecida que diante de um ataque poderão responder de forma equivalente, o que desestabiliza o cenário político em regiões ou em todo o planeta. A

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soberania está a se mover do campo da ciência política e se mostra cada vez mais sob o ângulo tido pelo Direito, o que não significa que essa migração será completa no futuro. De acordo com Albuquerque (2004, p. 97):

Deste modo, a soberania é hoje cada vez mais encarada, não em sede de política mas de Direito; e refere-se cada vez mais à estruturação das relações entre diferentes ordens jurídicas; é um poder jurídico que tem de coexistir com outros poderes jurídicos.

Piloni (2004, p 18) ainda diz que a soberania se caracteriza pela unicidade, pela indivisibilidade e pela inalienabilidade, qualificações que tem aplicação atualmente e que já foram elencadas por Jean Bodin ao estudar o tema há mais de quatrocentos anos. A primeira característica é a que ordena que a supremacia para ocorrer tem de ser fixada na soberania de alguém, sobre algum lugar frente a todos os outros, pois não há como ocorrer no mesmo espaço duas soberanias. A segunda característica é uma consequência da primeira, pois como a soberania é uma, não pode ser repartida, pois assim haveria duas soberanias sobre o território e se dissiparia a característica da singularidade, então o que pode ocorrer é a delegação de atribuições por parte do poder soberano a segmentos, a instituições, e, principalmente, aos Poderes, mas jamais a divisão da supremacia de um Estado em várias porções soberanas. A terceira característica vem a complementar a primeira e a segunda, pois a soberania para ser como é, além de única e íntegra, tem que ser inalienável, pois ao ser cedida, passada para outrem, começa a pertencer a alguém o que deve de ninguém ser, então, dar a soberania é o mesmo que extingui-la, pois a existência dela está vinculada ao fato de não poder ser tomada por quem for.

1.1.1 A Soberania do Brasil

O Brasil, como Estado que é, estabeleceu a soberania como um dos fundamentos sobre os quais se assenta a sua existência, juntamente com a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. A importância de tal característica basilar é tal que se apresenta no princípio do texto da Constituição Federal Brasileira de 1988, que é a lei de maior vulto em todo o ordenamento brasileiro. Essa soberania brasileira se estende não somente ao território terrestre, mas também a uma faixa de zona marítima que circunda o litoral brasileiro, além do espaço aéreo sobre esse solo e esse mar, além de particularidades aplicáveis a embarcações, a aeronaves e a

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outros prédios governamentais no exterior. No nível da União, constituem órgãos representantes e garantidores da soberania o Presidente da República, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, cada um no topo de um dos Poderes reconhecidos constitucionalmente.

O caput do art. 1º da Constituição Federal define o Brasil como Estado Democrático de Direito e no seu parágrafo único define que a emanação do poder parte do povo que o exerce de forma indireta mediante representantes ou diretamente. De acordo com Albuquerque (2008, p. 98), pode-se concluir que constitucionalmente está definido que a soberania, que está vinculada a ideia de poder, da república brasileira tem sua gênese na população nacional e não em entidades acima do Estado ou no Direito que nesse caso apenas ordena legalmente a vontade dos cidadãos de concederem tal instrumento para o governo nacional.

Conforme Carvalho (2008), politicamente independente desde 1822, a soberania brasileira foi nos próximos anos a esse fato sendo reconhecida por outros Estados, a começar pelos Estados Unidos em 1824 que isso fez sob a orientação de que a América devia pertencer aos americanos, conhecido esse raciocínio e os desdobramentos como Doutrina Monroe. A anterior metrópole, Portugal, só veio a aceitar a independência em 1825, após a Inglaterra ter agido como mediadora entre a nova nação e o governo português e de ter sido acordado que a ex-colônia brasileira pagaria uma indenização de £2,000,000 (dois milhões de libras esterlinas), que era uma quantia que o Brasil não tinha e, para efetuar o pagamento, pegou um empréstimo com a própria Inglaterra para repassar a Portugal. Tal fato iniciou a dívida externa brasileira e, até hoje, de forma mais arrefecida na última década, levou a discussões acerca da soberania prática brasileira não ser existente, pois o país politicamente é autônomo, mas na realidade depende de outras nações a quem deve dinheiro e que interferem na vontade do país.

De qualquer forma, na ordem mundial existente, o Brasil se apresenta e é reconhecido como soberano e mantém uma grande rede mundial de missões diplomáticas e consulares a abranger mais de uma centena de países e relações diplomáticas com todos os Estados Membros da Organização das Nações Unidas e, fora dessa organização, mantém embaixada e fortes laços com a Santa Sé, além de relações estabelecidas com os Estados não amplamente reconhecidos da Palestina, do Kosovo e de Taiwan. A soberania do Brasil não está a ser questionada, pode-se dizer, praticamente desde o reconhecimento por Portugal da autonomia

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brasileira no século XIX, o que facilita o trânsito brasileiro nas organizações internacionais e a realização de tratados internacionais com outras nações e organismos internacionais.

1.2 As Normas Internas e o Processo Legislativo

Como dito anteriormente, os Estados detêm soberania e com o Brasil não é diferente e soberano que é, pode delegar funções e assim o faz. Pode-se superficialmente falar na existência de alguém a governar e a administrar, o Executivo, de alguém a julgar consoante as normas, o Judiciário, e de alguém a exerce a função legislativa, o Legislativo, e esses três seres são independentes e harmônicos entre si, criando um sistema de peso e contrapesos com o objetivo principal de não concentrar poderes demais nas mãos de apenas poucos. Tal divisão do exercício estatal, no caso brasileiro, prevê-se no art. 2º da Constituição Federal, e as atribuições estão nessa mesma lei, no Título IV, arts. 44 a 135, e do primeiro artigo dessa enumeração até o art. 75, trata-se do que cabe ao Legislativo.

O Brasil tem a função legislativa no âmbito de todos os componentes da organização político-administrativa. Em nível da União a atribuição conferida ao Poder Legislativo é exercida por um ente governamental chamada Congresso Nacional, que é bicameral, constituído pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. As duas câmaras representam coisas diferentes: os deputados são agentes do povo e atualmente são 513 eleitos por voto proporcional para legislaturas que têm a duração de quatro anos e o número de mandatos são proporcionalmente distribuídos de acordo com a população dos estados medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE, garantindo-se o mínimo de oito vagas e o máximo de setenta por unidade da federação; os senadores são delegados dos 26 estados e do Distrito Federal e existem três cadeiras para cada um desses 27 entes, totalizando 81, que são eleitos para mandatos de oito anos.

De acordo com Piloni (2004, p. 24) vale salientar que o Poder Legislativo tem a atribuição também de fiscalizar e as chamadas funções atípicas que são administrar e julgar, mas como já escrito aqui, superficialmente analisando, o Congresso Nacional tem a função legislativa nos temas que competem ao nível federal regular e é essa atividade a que será melhor pesquisada neste momento. O exercício dessa atribuição pelos eleitos não é feito de maneira desregulada nos Estados Democráticos de Direito, é exercida de acordo com regulamentos previamente estabelecidos em lei que ao serem seguidos, almeja-se dirigir para

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a devida credibilidade as regras aprovadas nas câmaras do Poder Legislativo. Isso é nomeado como processo legislativo.

1.2.1 O Processo Legislativo no Brasil

O processo legislativo é a organização de uma série de procedimentos postos numa sequência a ser seguida, um rito processual, com a intenção de formular os tipos de leis. Por ser um processo, faz parte do Direito Processual e ao criar regras, é o próprio Direito a elaborar as normas que o norteiam. Essa maneira de formulação de leis é própria dos Estados Democráticos de Direitos e também se encontra no Brasil. De acordo com Lemos (2008, p. 1):

O processo legislativo é uma exigência do Estado de Direito, não devendo ser considerada válida uma espécie normativa sancionada sem, necessariamente, ter percorrido todos os passos previstos pela Constituição. Partindo a Constituição como vértice do ordenamento jurídico, todas as demais espécies normativas são dela diretamente decorrentes. Essa idéia encontra guarida no art. 59 da CF/88 que prevê a elaboração de emendas à Constituição, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções.

O autor acima traz a essência do que é o processo legislativo e destaca a presença disso neste país. O respeito à constitucionalidade e ao processo legislativo é fundamental para que a norma interna passe a ser eficaz e que oriente o agir do Direito. É a própria Constituição Federal no Brasil, entre os artigos 59 a 69, que regula a produção de normas que sejam válidas.

É interessante notar quais são as etapas que fazem parte do processo legislativo que quando ocorre do começo ao fim de forma ordinária, sem exceções que dispensem uma das etapas, de acordo com Piloni (2004, p. 32-41), principia com a iniciativa legislativa, passa-se para a fase de emendas, as votações, as sanções ou os vetos e se encerra com a promulgação e a publicação da lei. Resumidamente, explicação a seguir de cada uma dessas fases.

A iniciativa legislativa é o ponto de partida do processo, o equivalente à petição inicial do processo judicial. Trata-se do ato de trazer um projeto de lei à discussão. Não são todas as pessoas que possuem a prerrogativa de desencadearem esse ato e dentre as autorizadas, esses também não possuem a prerrogativa de desencadearem quaisquer atos e de acordo com

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Machado (2010, 15) “a iniciativa consiste na apresentação de uma proposição por um agente competente. No caso das leis, os agentes competentes são listados no art. 61 da Constituição”. Cita a Constituição Federal no art. 61 quem são essas pessoas: qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, o Presidente da República, o Supremo Tribunal Federal, os Tribunais Superiores, o Procurador-Geral da República e os cidadãos. Exemplos de atribuições exclusivas de uma pessoa são as tidas também no art. 61 da Constituição Federal, no §1º, que relata o que só possível de iniciativa legislativa pelo Presidente da República como a as leis que venham a estabelecer a fixação ou que estipulem a modificação dos efetivos das Forças Armada. Outra figura interessante é a possibilidade de participação dos cidadãos que podem propor leis por meio das iniciativas populares, previstas no art. 14 da Constituição Federal e reguladas pela lei 9.709/1988, em que 1% dos nacionais com autorização para votar devem recolher assinaturas em pelo menos cinco estados, no mínimo 0,3% dos eleitores de cada uma dessas unidades da federação, a favor da aprovação de uma lei.

Conforme Piloni (2004, p. 36), o Congresso Brasileiro é composto por duas casas: a Câmara dos Deputados e o Senado Federal; ou seja, no Poder Legislativo do Brasil impera o bicameralismo. Conforme Machado (2010, p. 16), “os projetos são apreciados na Casa onde foram apresentados (casa iniciadora). Caso aprovados, são enviados à outra Casa (casa revisora). Ainda conforme Piloni (2004, p. 36), sobre os papéis da casa iniciadora e da casa revisora, instrui ela que comissões dentro de cada câmara do Congresso Nacional analisam os projetos de leis:

Antes de anunciar o voto, há uma série de análises feitas por comissões técnicas e por debates em plenário. Há a comissão técnica justamente porque os membros das duas casas são representantes do povo e, não necessariamente, grandes conhecedores do direito. Desta forma, para evitar que entre em vigor uma lei eivada de vícios constitucionais ou de outra natureza, submete-se o projeto à comissão técnica, que dirá se está ele em acordo ou desacordo com a lei.

As emendas são as novas colocações que são atribuídas às iniciativas legislativas que surgem, então, conforme Machado (2010, p. 17). Ainda conforme esse mesmo autor, o projeto inicial pode vir a ser alterado anteriormente a colocação para votação pelos parlamentares. Partes do texto podem ser modificadas, excluídas e também pode ocorrer de novas partes virem a ser incluídas. Isso é necessário em decorrência da própria construção democrática em

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que quem tem interesse na aprovação da lei tenta fazer passá-la sem alterações e quem tem interesse na reprovação da lei tenta bloquear ou torná-la mais próxima das próprias intenções.

Ainda conforme Machado (2010, p. 18), a votação ocorre no momento em que as câmaras devem se pronunciar acerca da iniciativa legislativa. Como os deputados são porta-vozes do povo e os senadores representantes dos estados e são cidadãos que sabem coisas e desconhecem outras, existem comissões técnicas no Congresso Nacional que devem dar suporte acerca do tema em questão para os parlamentares e verificar se não há vícios no projeto a serem sanados e se o mesmo está de acordo com a constitucionalidade. Além desses, há os debates no plenário em que os representantes podem expressar suas opiniões a respeito do que está a ser votado. Se aprovado nas duas casas conforme o tipo de maioria necessário, o projeto é encaminhado para a Presidência da República.

A sanção ou o veto são respectivamente a aprovação ou a reprovação dada pelo Presidente da República ao projeto de lei que lhe foi apresentado e aprovado pelo Congresso Nacional. De acordo com Piloni (2004, p. 10), depois de recebido, conforme os parágrafos do art. 66 da Constituição Federal, há o prazo de quinze dias para a sanção ou o veto e se nada for feito no prazo, considera-se tacitamente sancionado. Observa-se que existe a possibilidade de veto parcial do projeto, mas essa parte não sancionada não pode ser menor que a integralidade do texto de um artigo, de um parágrafo, de um inciso ou de uma alínea. Além disso, o Presidente da República não tem poder de veto sem justificativa do motivo que o fez, devendo apresentar o porquê em 48 horas para o Presidente do Senado Federal. Ainda há a apreciação, em sessão conjunta, do veto no prazo de trinta dias a partir do recebimento no Congresso Nacional e se a maioria absoluta derrubá-lo, o projeto é enviado para a promulgação mesmo sem a sanção presidencial. Acerca da sanção, Piloni (2001) (apud SILVA, 2010, p. 38) diz o seguinte:

Sanção é, pois, a adesão do Chefe do Poder Executivo ao projeto de lei aprovado pelo Poder Legislativo. Pode ser expressa ou tácita. Aquela ocorre se o Presidente emite o ato de sanção assinando o projeto. A outra se dará se, recebido o projeto para sanção, o Presidente silencia (não o assina) durante os quinze dias subseqüentes; na verdade, uma quinzena de dias úteis para harmonizar o disposto no §3º com o §1º do art. 66, pois que este último dá quinze dias úteis para vetar.

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A última fase são a promulgação e a publicação. A promulgação é um ato pelo qual se atesta a ocorrência da lei e que foi seguido o processo legislativo corretamente e se comunica a todos o surgimento da norma e o conteúdo que ela porta. Mas a promulgação precisa da publicação para ser tida como válida, pois se a promulgação atesta a criação e o texto da nova norma, isso terá que ser certificado, o que é feito pela publicação, que conforme Machado (2010, p. 18), “a lei deve ser dada a conhecer por todos os interessados, mediante sua publicação”.

Além das fases, há ainda de se ressaltar mais uma vez que o processo legislativo nem sempre é igual, pois há situações em que os procedimentos adotados diferem para se adaptarem a necessidade de determinada iniciativa legislativa. Nos três parágrafos seguintes enuncia-se a pesquisa que Piloni (2004, p. 41-43) fez a dizer que no Brasil o processo legislativo tem três tipos de procedimentos, o ordinário, o sumário e os especiais, diferentes uns dos outros.

Na maior parte das vezes adota-se o rito ordinário, em que todas as cinco fases acima descritas ocorrem, então há a apresentação do projeto, a análise das comissões sobre a viabilidade legal, os debates no plenário em que os porta-vozes dos diferentes segmentos sociais do país podem se apresentar diante do fato que se intenciona em virar lei e se reprovado nas votações, o projeto é arquivado, e se aprovado, passa para a sanção ou veto presidencial.

O procedimento sumário é de exclusiva solicitação do Presidente da República em casos em que compreender que há urgência para a aprovação da lei e está previsto no art. 64 da Constituição Federal. Cada casa, a começar pela Câmara dos Deputados, terá 45 dias para analisar e votar o projeto e caso o Senado o emende, volta para os deputados o votarem em dez dias.

Já acerca dos procedimentos legislativos especiais, como o próprio nome diz, são excepcionais, reservados a situações em que as particularidades de certos regulamentos jurídicos não possibilitam a permissão para que o conteúdo seja efetivamente observado pelo Congresso Nacional da forma como se esperaria se fossem utilizadas as determinações dos procedimentos ordinário ou sumário. Essas leis tão singulares, que exigem um procedimento específico para elas, geralmente são reguladoras de temas que podem suscitar polêmicas ou

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alterar severamente outras partes do ordenamento jurídico que com elas mantêm relação, sendo exemplo disso as leis financeiras, as leis delegadas, as medidas provisórias, as leis complementares e, com maior destaque, as emendas constitucionais, já que essas interferem diretamente na lei magna e, consequentemente, na diretriz de todo o ordenamento jurídico nacional.

1.2.2 A Norma Interna no Brasil

Como visto, leis têm o porquê de surgirem. Em locais onde o esquema democrático está implantado, essa gênese é precedida por discussões sobre a necessidade e a viabilidade da implantação, em que os inúmeros segmentos da sociedade, o governo e os cidadãos, por eles próprios ou mediante representantes, tentam chegar a uma conclusão. Os debates dentro do processo legislativo, previstos nos parlamentos e nas comissões encarregadas das formulações, e as articulações políticas são parte da produção da democracia e isso ajuda que a lei não se dissocie do meio em que está. Ao tratar da norma no Direito Romano, nisto que é válido ainda para a norma interna contemporânea, discorreu Nóbrega (2011, p. 65):

O caráter jurídico de uma norma, enfim, deve ser encontrado já na instituição, a qual não poderia atribuir tal caráter à norma, se não possuísse, ou seja, se a instituição não fosse identificada com o próprio direito.

Resumidamente, as normas internas são o conjunto de regras que regulam o funcionamento da sociedade dentro da área de abrangência de cada nação. A norma interna, vista no singular é a unidade da qual se constitui o Direito em dado território que tem soberania para ser um Estado, a própria instituição que cria e regula o Direito do qual se utiliza, de acordo com Rezek (2011, p. 194), pois possui as competências legislativa, administrativa e jurisdicional.

No Brasil, a partir do momento em que a ocorrência da publicação no Diário Oficial, se assim for determinado no momento da publicação, passa já a vigorar a norma, mas costumeiro que haja um prazo entre a publicação e o início da vigência da lei que se chama vacatio legis em que a lei existe, mas ainda não vige, sendo esse um processo de adaptação para que a população se prepare para as novas regras que a partir de certo momento passarão a ser de cumprimento obrigatório. A Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, doravante LINDB, o Decreto-Lei nº 4.657/1942, que até 2010 era chamada de Lei de

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Introdução do Código Civil, doravante LICC, aborda esse hiato. De acordo com Cavalcante (2008, p. 3):

O prazo da "vacatio legis" ou vacância da lei, é de quarenta e cinco dias, para aplicação da norma no Brasil e de três meses para o exterior. Somente será aplicado tal prazo se não houver prazo especial. No caso do território nacional, a lei entra em vigor simultaneamente em todo o Brasil. Finalmente, podemos inferir que a lei publicada transcorrida o período da vacância da lei, a mesma entra em vigor e vincula a todos, tendo em conta seu poder coercitivo. A Lei de Introdução ao Código Civil é bastante clara neste assunto, pois entendeu o legislador do alcance a todos da norma, não podendo ninguém, se escusar do não conhecimento da norma.

Durante o período de vigência de uma lei, em princípio, ela deve ser aplicada até que ocorra a modificação ou a revogação, como previsto no art. 2º da LINDB. Dentre as possibilidades de revogação, essa pode ser parcial ou total e ocorre de diferentes formas.

Dentre as formas, de acordo com Lisboa (2008, p. 28), de revogação total pode-se citar a ab-rogação e a sub-rogação: na ab-rogação a nova lei revoga totalmente a anterior sem substituir o texto e na sub-rogação a nova lei revoga totalmente a anterior com a troca do texto. Dentre as formas de revogação parcial pode-se citar a derrogação e a modificação: na derrogação a nova lei revoga parcialmente a anterior sem substituir o texto e na modificação a nova lei revoga parcialmente a anterior com a troca do texto. Aproveita-se o ensejo para destacar que a compreensão das formas de fim de aplicabilidade de uma lei são importantes ao se analisar o efeito que o tratado internacional pode deter sobre a vigência de uma norma interna.

Interessante também é destacar, ainda conforme Lisboa (2008, p. 27), que no Brasil as leis tendem a legislar sobre casos futuros e não retroagem para punir os fatos ocorridos antes de sua vigência. Da mesma forma, caso haja conflito entre a lei anterior e a lei posterior no tempo, prevalece a que for mais benéfica, geralmente, para a parte mais fraca na lide, fatos que também são observados na aplicação dos tratados internacionais frente às normas internas.

Outra característica a ser abordada acerca das normas internas no Brasil é que elas são variadas em tipos. A máxima de todas as leis é a Constituição Federal, conforme Menezes (2012), que é o norte para a qual todas as outras se voltam. Em seguida vêm as emendas

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constitucionais e os tratados internacionais que versem sobre direitos humanos e que foram aprovados no Congresso Nacional. Na sequência, do topo para base, na redação do art. 59 da Constituição Federal, aparecem as leis complementares, as leis ordinárias, as medidas provisórias, as leis delegadas, os decretos legislativos, as resoluções, os decretos e as portarias.

Se há hierarquia prevista em leis para as normas internas é esse um debate sobre o qual a doutrina se debruça e há divergências nas conclusões. Menezes (2012) noticia que parte da doutrina não concorda que haja hierarquia porque todas as normas têm sua validade na Constituição Federal; já outra parte entende que a própria Constituição Federal estabelece a lei complementar como norma para elaboração, redação, alteração e consolidação das leis por essa ser a redação do parágrafo único do art. 59 e ao citar o rol trazido nesse artigo, acerca da prevalência de cada tipo normativo, conclui Menezes (2012) que “dentro de cada conjunto desses, não há uma verdadeira hierarquia, mas sim, uma verdadeira separação de competência pela matéria a ser tratada”.

Dentre a questão da hierarquia, sempre se levanta o questionamento se no conflito entre normas internas expedidas por entes distintos da federação têm as federais supremacia sobre as estaduais e essas sobre as municipais. Esse tipo de conflito não se resolve a colocar os constituintes da República em pé de superioridade frente uns aos outros, mas se observa a quem a Constituição Federal prevê a atribuição de legislação sobre a matéria em questão e a qual cabe o direito, vale a norma expedida.

1.3 Os Tratados Internacionais e o Processo de Formação

O acordo é um ato de vontade entre sujeitos que se combinam em algo. Os tratados internacionais são momentos em que os Estados optam por colocar os próprios interesses em acordo com os interesses de outros países. Criam-se documentos em que há comprometimento dos governos nacionais com aquilo que foi assinado. Na verdade, são momentos que o Estado pode abrir mão de parte de sua soberania para se comprometer com algo que ele considere válido, mas essa cessão de parcela da própria autonomia é possível em razão de que os Estados têm independência para decidir até se fazem isso. Eis um conceito de tratado internacional de acordo com Rezek (2011, p. 38):

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Tratado é todo o acordo formal concluído entre pessoas jurídicas de direito internacional público, e destinado a produzir efeitos jurídicos. Na afirmação clássica de Georges Scelle, o tratado internacional é em si mesmo um simples instrumento; identificamo-lo por seu processo de produção e pela forma final, não pelo conteúdo.

Além desse conceito, também é possível salientar uma definição do que seja tratado de acordo com a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (1969, p. 1):

1. Para os fins da presente Convenção:

a)“tratado” significa um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação específica.

Como se pode observar, o importante para a definição do que seja o tratado internacional é ele ser um mecanismo pelo qual os diversos Estados podem decidir efeitos jurídicos conjuntamente, e não é propriamente a forma final do expediente e o processo de elaboração, tal como ocorre com a norma interna brasileira, que dita que o documento é um tratado internacional válido.

Já acerca de conteúdos, os tratados internacionais podem tratar dos mais diversos assuntos, conforme Rezek (2011, p. 11), como serviço diplomático, questões marítimas, solução pacífica de litígios entre Estados até temas mais prosaicos como como a classificação de sinais indicativos da procedência de produtos do gênero alimentar.

Já quanto à aplicação prática do tratado internacional no Brasil, o Decreto Legislativo é uma exigência legal para que seja efetivada a promulgação do acordo feito pelo governo. Essa é a proposta defendida pela corrente majoritária. De acordo com Fraga (2001, p. 127).

No sistema jurídico brasileiro, o tratado internacional, regularmente concluído, é uma fonte de direito, expressamente prevista na Constituição, produzida com a colaboração externa, ao lado de outras, emanadas, apenas, de órgãos internos. A sua promulgação é consequência desse fato constatado e, ao contrário do que se pensa, não é, apenas, prática que se estabeleceu, mas exigência constitucional implícita. Não tem o efeito de transformá-lo em direito interno, mas tão-só o de conferir-lhe força executória. Ao aplicar a norma convencional, o Poder Judiciário aplica o próprio tratado (Direito Internacional) e não o direito nacional (o produzido, apenas, pelos órgãos internos) em que, supostamente se tenha transformado por via do decreto de promulgação.

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O tratado passa a ter vigor no Brasil após o Decreto Legislativo surgir a fazer a promulgação, então, por exemplo, pode-se apresentar o Decreto Legislativo 496/2009 que aprovou a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Conforme Piloni (2004, p. 44), há a necessidade do Decreto Legislativo para que ocorra a internalização do tratado no ordenamento jurídico brasileiro, pois de outra forma o acordo internacional não terá força executória. E ao se depreender da citação de Fraga citado por Piloni (2004, p. 44), a corrente majoritária defende que apesar da necessidade do decreto legislativo para o tratado internacional valer no Brasil, ao se aplicar o tratado é uma norma internacional, e não interna, que está a ser executada.

Conforme Piloni (2001, p. 46), a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados divide em quatro etapas a composição dos tratados internacionais, do início até passarem a vigorar no ordenamento jurídico nacional. Em princípio, há as conversações que levarão ao acordo, a concordância do governo com o texto e a seguinte assinatura, a concordância dos parlamentares que o ratificam e consequentemente, o país se torna signatário. Essa convenção não trata do caso brasileiro especificamente e da questão do Decreto Legislativo, então, essas fases internas de discussões nas câmaras do Legislativo, a maneira como se deve fazer a sanção do Executivo, a promulgação, a publicação, variam de país para país.

De acordo com Piloni (2004, p. 47) a primeira fase, a das negociações preliminares, se constitui dos esforços políticos, diplomáticos, entre os representantes autorizados legalmente por seus países para negociarem em nome desses governos. O número de participantes pode variar, ocorrendo acordo bilaterais em que há dois signatários, acordos multilaterais em que há mais de dois signatários.

Ainda de acordo com Piloni (2004, p. 47) as negociações bilaterais, normalmente, partem do recebimento de uma nota diplomática que um governo envia para outro com os motivos que devem levar a conversações acerca de um tema. As negociações podem ocorrer no território das partes ou pode ser escolhido um campo neutro em outro país, sendo que isso geralmente ocorre quando o terceiro serve de intermediário ou os países não têm representações nos territórios uns dos outros. Quanto ao texto, pode ser redigido no idioma em que os países querem, o que no caso brasileiro, como pode ser verificado pelos acordos assinados nos últimos anos, geralmente é feito em português e em inglês, ou em português e em francês. Ambas as versões são igualmente autênticas e é comum que se eleja uma das

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versões como prioritária para elucidar discordâncias, dúvidas que surjam ao se analisar as duas versões. Já a questão do território e dos idiomas já começa a se tornar mais complexa em caso de acordos multilaterais, pois há mais interesses envolvidos, às vezes também organismos internacionais que atuam como intermediários, ou é reunião de cúpula convocada pelos próprios países ou por uma entidade internacional.

Decididas essas questões, vai-se para as negociações propriamente ditas e que podem resultar em um tratado com o texto muito diferente pelo que era proposto no projeto, pois provavelmente o acordo só será assinado se ambos os governos concordarem com o que está escrito. De acordo com Rezek (2011, p. 67)

Já vimos que nenhuma negociação bilateral chega a bom termo sem que o texto convencional, em cada uma de suas palavras, tenha parecido convir a ambas as partes. Num quadro coletivo, o ideal do assentimento unânime é de tanto mais difícil conquista quanto maior o número de Estados pactuantes.

Como se percebe, é necessária a concordância de todos para que o acordo venha a ter signatários. Basicamente o texto terá um preâmbulo que antecipa as pretensões das partes, a seguir das normas do texto e se houver, anexos.

A partir daí, ainda de acordo com Piloni (2004, p. 47-57) passa-se a assinatura feita pelo representante, o que não vincula o país ao tratado, apenas demonstra que há aceitação do texto da maneira como está escrito e que as negociações estão encerradas. A assinatura serve como uma fase de transição entre a elaboração do tratado e a transformação dele numa parte do ordenamento jurídico nacional ou reconhecido como legalmente aplicável através da ratificação em nível interno. Não é incomum que um país assine um acordo e não o promulgue e jamais venha a aplicar o que consta nas normas do acordo internacional.

Quanto às pessoas que tem representatividade para realizar tais atos, o artigo 7º da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados informa que para alguém ser considerado incumbido de tal função deverá deter plena autorização para isso. Ainda esse mesmo artigo diz que se “a prática dos Estados interessados ou outras circunstâncias indicarem que a intenção do Estado era considerar essa pessoa seu representante para esses fins e dispensar os plenos poderes”, podem esses não serem exigidos. Ainda, em decorrência da função são tidos como representantes de Estado, sem necessitarem de apresentação de plenos poderes os

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chefes de governo, chefes de Estado, ministro das relações exteriores para qualquer ato relativo a tratados internacionais; chefes de missão diplomática para adoção de texto de tratado; e os representantes de Estado em conferência ou organização internacional para adoção de texto de tratado negociado no âmbito desses eventos ou instituições.

Conforme Piloni (2004, p. 63), no Brasil, os tratados vêm a ser ratificados pelo Executivo, sendo um ato desse poder, mas antes são precedidos de análise no Congresso Nacional que verifica se concorda com a vinculação do país ao texto. Apesar de existirem situações em que a assinatura já vincula o Estado ao tratado, ou que a adesão a um tratado provoca esse efeito, sendo essas formas previstas na Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados no art. 11, que permite aos Estados decidirem por tal maneira de manifestação de obrigação ao tratado, o sistema brasileiro de processo democrático privilegia a análise pelo parlamento e não somente a concordância do Executivo, pois isso vai ao encontro da ideia constitucional de não existir concentração de poder e de que as decisões a nível legal não devem caber a apenas alguns. Para complementar tal ideia, Fraga (2001, p. 56) diz que “aprovado o tratado assinado pelo Executivo, o Congresso dá seu assentimento para que se conclua o ato internacional, ao mesmo tempo que exterioriza, é evidente, sua aquiescência a matéria nele contida”.

Além da ratificação, deve haver a troca nos tratados bilaterais e o depósito nos tratados multilaterais dos instrumentos de ratificação entre os Estados. Conforme Piloni (2004, p. 55), pode ocorrer, por exemplo, de um acordo bilateral ser negociado, assinado, aprovado pelo parlamento e ratificado pelo Executivo num país signatário e não ocorrer o mesmo com a outra parte, então, um Estado se vincula e outro não, o que torna inviável a aplicabilidade do acordo, então, após as ratificações terem ocorrido, os Estados se reúnem e trocam entre si os seus instrumentos de ratificação e mantêm a guarda desses papéis como prova da vinculação da outra parte ao tratado internacional. Em caso de acordos multilaterais, tais instrumentos são depositados sob a custódia de algum organismo internacional ou de algum Estado escolhido.

Mas a assinatura de um tratado ou a ratificação pode não ser acompanhada com a aceitação de todo o texto. No Brasil, de acordo com Piloni (2004, p. 59), dá-se a esse procedimento o nome de reserva, o que permite que um Estado não seja obrigado a abdicar de se tornar signatário em algum acordo que seja do seu interesse apenas por não concordar na totalidade com o conteúdo, então, pode se obrigar somente com aquilo que for de sua vontade.

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Entretanto, não é sempre que isso é possível, pois a própria Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados no art. 19 prevê que caso o tratado dite que não são permitidas reservas aos signatários, ou que essas são inviáveis devido à natureza do acordo, ou que essas não podem ser formuladas acerca de alguns aspectos do acordo, não há como elaborar reserva. A própria Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados no Brasil só foi promulgada quarenta anos após a sua formulação e ainda com reservas aos artigos 25 e 26 que não eram de interesse do Brasil e tratavam de aplicação provisória e vigência dos tratados.

Nas seções anteriores, foram apresentados posicionamentos de como no Brasil ocorre a vinculação a tratados internacionais, a ratificação pelo Executivo e a aprovação pelo Legislativo, e quanto a esse último, cabe ainda salientar, conforme Piloni (2004, p. 55), que é na sequência da promulgação do Decreto Legislativo, em que se aprova o tratado internacional para a publicação no Diário Oficial, que se dá a ratificação do tratado pelo Executivo. Geralmente nos tratados bilaterais ocorre então a troca de informações entre as embaixadas dos signatários, ou entre as missões de ambos na Organização da Nações Unidas, por iniciativa de qualquer uma das partes, para que ocorra a troca de instrumentos. Também pode haver, após o encerramento dos procedimentos a nível nacional, uma cerimônia especialmente para esse fim. No caso de tratados multilaterais, como já dito, prevalece o depósito em entidades internacionais que assumam esta custódia, com Mazzuoli (2001, p. 96) a citar a Organização das Nações Unidas e a Organização dos Estados Americanos como exemplos.

1.4 O Conflito e as Teorias de Solução: Teorias Dualista e Monista

Em princípio, os acordos firmados em nível internacional deveriam convergir para as regras próprias dos signatários, mas às vezes aquelas vão de encontro a estas e questionamentos surgem, como exemplifica Fraga (2001, p. 3), acerca da relação entre o Direito Internacional e o ordenamento jurídico de cada Estado. Dentre os questionamentos, discute-se se essa relação entre a norma interna e o tratado internacional ocorre entre ramos de uma única estrutura ou entre duas estruturas legais distintas e, se a resposta é positiva quanto a pertencerem norma interna e tratado internacional a ordenamentos jurídicos apartados, poderiam esses dois aspectos do Direito interagirem entre si de forma pacífica ou surgiriam choques a serem resolvidos.

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Ainda conforme Fraga (2001, p. 3), esses raciocínios são atuais, pois cada vez mais o Brasil se apresenta no cenário internacional e se vê diante da possibilidade de se tornar signatários de mais acordos, pois suas relações internacionais se tornam mais intensas concomitantemente com o fortalecimento do atual regime democrático brasileiro.

Tanto Fraga (2001), como Rezek (2011), assim como Nóbrega (2011) trazem em suas obras sobre Direito Internacional várias orientações oferecidas pela doutrina quanto ao conflito entre norma interna e tratado internacional, tendo-se inclusive pensadores que tem a afirmar que não há a existência deste conflito e outros contrários que dizem que esse atrito ocorre. Aliás, Rezek (2011, p. 127) diz que “descentralizada, a sociedade internacional contemporânea vê cada um dos seus integrantes ditar, no que lhe concerne, as regras de composição entre o direito internacional e o de produção doméstica”. Destacaram-se duas grandes correntes nessa questão: a teoria dualista e a teoria monista.

1.4.1 A Teoria Dualista

De acordo com Fraga (2001, p. 4) a teoria dualista foi primeiramente exposta pelo jurista e filósofo do Direito Heinrich Triepel e encontrou acolhida em vários lugares e em várias mentes, como na Itália por Dionisio Anzilotti, mas atualmente são minoritárias as vozes que defendem esse raciocínio. Basicamente coloca a legislação internacional e a nacional em patamares tão distintos que não há possibilidade de ocorrência de conflito. De acordo com Nóbrega (2011, p. 238):

A construção jurídica dualista acerca da relação entre Direito Internacional e Direito Estatal parte da concepção de separação entre estas duas esferas jurídicas distintas , cujas respectivas normas possuiriam fontes jurídicas e regulariam relações sociais diferentes. Consequentemente, não haveria conflitos entre tais normas jurídicas e a possível comunicação entre as referidas ordens jurídicas dependeria da observação de determinadas condições.

Como se pode observar, essa teoria separa de tal maneira as legislações produzidas em âmbito internacional das de âmbito nacional que é improvável o conflito, pois cada uma atua em determinadas situações na qual a outra consequentemente não vige. Assemelha-se ao que ocorre na hierarquia das leis brasileiras, já explicada anteriormente de forma mais sucinta, pois não se atribui superioridade a uma lei estadual frente a uma municipal por um ente

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federativo ser de nível superior ao outro, como se o nível internacional fosse maior que o nacional, mas se discute a aplicação de uma lei por causa da prerrogativa de legislação sobre certa questão, então, a quem cabe administrar tal fato é que produz a lei eficaz. Se ao município cabe o regime jurídico dos seus próprios servidores, não é o estado que legisla sobre o assunto, então, se um fato é atribuído pelos Estados à jurisdição de um organismo internacional mediante um tratado, não são as leis nacionais que regulam o que for pertinente a isso.

1.4.2 A Teoria Monista

De acordo com Fraga (2001, p. 6) como a oposição à teoria dualista começou a aumentar em decorrência de ser perceptível a existência do conflito entre norma interna e tratado internacional, apesar da teoria a dizer que na realidade esse atrito é apenas uma falsa impressão, Kelsen iniciou então a apresentação de uma teoria que explicasse diferentemente a relação entre as leis nacionais e os acordos estrangeiros. A teoria monista prega que todo o sistema, internacional e nacional, forma um único sistema em que as normas se relacionam hierarquicamente entre si. De acordo com Fraga (2001, p. 7):

A teoria monista foi construída sob o princípio da subordinação, em razão do qual todas as normas jurídicas se acham subordinadas entre si, numa ordem rigorosamente hierárquica. Imediatidade das normas internacionais em relação ao direito interno, divergências de grau e não de essência entre um ramo e outro ramo do Direito, opção imperiosa por uma das ordens conflitantes são, também, pontos doutrinários do monismo.

Essa teoria une a legislação internacional a nacional, pois entende que um país ao se tornar signatário de um tratado, traz para o seu ordenamento essa legislação que passa a valer como se sua fosse e os conflitos que essa lei venha a ter com outras normas, resolve-se tal como quando ocorrem conflitos entre duas normas internas. A opção de como se escolherá a legislação superior depende de como a hierarquia entre elas for organizada, pois aos tratados internacionais poderá ser dado, tal como dito nas hipóteses, tratamento inferior às normas internas, superior, igualitário com algum tipo das leis nacionais, enfim, o que leva a se falar respectivamente em sistema monista com primazia de direito interno, sistema monista com primazia do direito internacional e sistema monista moderado.

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1.4.2.1 A Primazia do Direito Interno ou Monismo Nacionalista

De acordo com Fraga (2001, p. 7), essa teoria monista defende a superioridade do direito nacional frente ao internacional, sendo que o Estado é o único executor das normas, então, livremente determina a aplicação das suas próprias leis internas e estabelece a maneira de cumprir as próprias obrigações internacionais, até pelo fato de não existir nenhuma entidade superior a ele que vai exigir o cumprimento de atribuições determinadas num pacto estrangeiro.

Além disso, a defesa do fundamento puramente constitucional dos órgãos competentes a quem cabe a obrigação de representar o Estado na elaboração de tratado, traz ainda a desvantagem que se houvesse uma situação em que a constituição fosse revogada, ocorreria a invalidação de todos os tratados internacionais que passaram a vigorar durante a vigência da Carta Magna anterior.

1.4.2.2 A Primazia do Direito Internacional ou Monismo Internacionalista

De acordo com Fraga (2001, p. 8), essa teoria monista defende a superioridade do direito internacional frente ao nacional. Então, se o Estado celebrou um tratado internacional, não pode desdizer o que está feito e essa teoria ainda se presta a justificar a inviabilidade que é um governo assinar um tratado para depois internamente criar normas que o inviabilizem.

A crítica feita a essa teoria é que a legislação internacional pode vir a enfraquecer a soberania do Estado, pois os representantes não têm sempre o conhecimento de todo o ordenamento jurídico nacional e poderão estar a invalidar leis aplicáveis e socialmente aceitáveis por outras que poderão não encontrar aplicação prática naquele momento no território do país signatário.

1.4.2.3 A Teoria Conciliatória ou Monismo Moderado

O monismo moderado surgiu, de acordo com Piloni (2004, p. 69), como uma teoria conciliatória dentro da teoria monista. Percebe-se que trata o ordenamento internacional e o ordenamento jurídico nacional como parte de um único todo e que dá às legislações oriundas de tratados internacionais um tratamento igualitário a determinado tipo de lei interna

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conforme o conteúdo sobre o qual versa o acordo. É o sistema que está a ser aplicado pelo Supremo Tribunal Federal no Brasil.

Assim, não há, como se diz, descumprimento pelo tratado da norma interna se aquele é classificado em grau superior a esta, pois, na verdade, está tacitamente invalidada a norma, já que as duas leis fazem parte de um único sistema. Se o tratado está localizado em grau inferior a norma, invalidada está a aplicação do acordo na resolução das lides. Além disso, vê-se que é uma teoria basicamente conciliatória, pois permite que conforme o caso vê-seja ou o pacto internacional ou a norma nacional superior ao outro, sem o radicalismo como se verifica nos dois outros tipos de teorias monistas apresentadas.

Parafraseando a passagem já transcrita de Rezek (2011, p. 127), no mundo atual, cada estrutura nacional está a lidar com o conflito entre norma interna e tratado internacional como pensa que lhe é mais apropriado, ou através da adoção da teoria dualista ou da teoria monista em uma de suas facetas. Documentos que ajudam a basear a tomada de decisão de resolução dessa lide, como a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, existem e cada nação tem suas leis e sua constituição ou equivalente, e com o Brasil não é diferente, portanto, pode-se fazer a seguir uma avaliação da situação brasileira.

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2 O CONFLITO ENTRE UM TRATADO INTERNACIONAL E UMA NORMA INTERNA BRASILEIRA

Uma questão importante para o Direito Internacional é como se dão as relações desse com as normas internas de cada país. Não somente por ser essa uma questão de importância teórica relevante, mas também por ter aplicabilidade prática, conforme dito por Nóbrega (2011, p. 90). Às vezes, o tratado internacional entra em atrito com a legislação pátria, ou é a norma interna posterior à vigência do acordo que o contradiz, então, a compreensão dessa problemática é salutar para a resolução das lides em que se confrontam os ordenamentos nacionais contra os tratados internacionais.

De tão relevância prática se tornou a questão que a nível internacional, conforme Fraga (2001, p. 33), mais de uma centena de Estados se fizeram presentes em Viena em 1969 a fim de se criar um documento que elucidasse, em nível internacional, diretrizes mais claras para a resolução dessa questão.

Ainda conforme Nóbrega (2011, p. 9), deve-se levar em conta as legislações nacionais e a forma como se relacionam com os tratados internacionais, pois “a aplicabilidade prática do referido tema deve-se ao fato de este envolver a questão do tratamento constitucional ao Direito Internacional”. Em suma, isso significa que se deve avaliar o que a constituição de cada país fala sobre o tema, então, ao se tratar do Brasil, deve-se avaliar a Constituição Federal de 1988.

2.1 A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados

Conforme Amin e Costa (2010, p. 1) (apud REZEK, 1982, p. 1-18), o direito internacional público foi por muito tempo essencialmente costumeiro, com regras que eram de alcance geral e não se encontravam transcritas para o papel. Em 1949, surge a Comissão de Direito Internacional da Organização das Nações Unidas com o objetivo reunir de forma codificada esse regime consuetudinário de direito internacional e o fez por dezesseis anos. Após esse período, a Comissão enviou o texto final para a Assembleia-Geral das Nações Unidas que achou por bem convocar uma conferência para debater o trabalho. Esse evento ocorreu em duas fases, em 1968 e em 1969, em Viena e resultou na Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados.

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