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DALIANA MEDEIROS CAVALCANTI PERCURSOS DE FORMAÇÃO DE UMA CANTORA LÍRICA EM NATAL, RIO GRANDE DO NORTE

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES CÊNICAS

DALIANA MEDEIROS CAVALCANTI

PERCURSOS DE FORMAÇÃO DE

UMA CANTORA LÍRICA EM NATAL,

RIO GRANDE DO NORTE

NATAL/RN

2020

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2

DALIANA MEDEIROS CAVALCANTI

PERCURSOS DE FORMAÇÃO DE UMA CANTORA LÍRICA EM

NATAL, RIO GRANDE DO NORTE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Artes Cênicas – Stricto Sensu –, Mestrado Acadêmico em Artes Cênicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Artes Cênicas.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Melissa dos Santos Lopes

NATAL/RN 2020

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Cavalcanti, Daliana Medeiros.

Percursos de formação de uma cantora lírica em Natal, Rio Grande do Norte / Daliana Medeiros Cavalcanti. - 2020. 194 f.: il.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas, Natal, 2020.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Melissa dos Santos Lopes.

1. Canto lírico. 2. Corpo-voz. 3. Experiência. 4. Ópera. 5. Teatro. I. Lopes, Melissa dos Santos. II. Título.

RN/UF/BS-DEART CDU 784 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Departamento de Artes - DEART

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FOLHA DE APROVAÇÃO

DALIANA MEDEIROS CAVALCANTI

PERCURSOS DE FORMAÇÃO DE UMA CANTORA LÍRICA EM

NATAL, RIO GRANDE DO NORTE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Artes Cênicas – Stricto Sensu –, Mestrado Acadêmico em Artes Cênicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Artes Cênicas.

Aprovada em: _______ de __________________ de 2020.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________ Prof.ª Dr.ª Melissa dos Santos Lopes

Presidente da Banca – Orientadora Universidade Federal do Rio Grande do Norte

__________________________________________ Prof. Dr. André Carrico

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Membro interno

_______________________________________________ Prof.ª Dr.ª Bárbara Biscaro

Universidade do Estado de Santa Catarina – Membro externo

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4 Dedico esta dissertação a todos as(os) inconformadas(os) que revolucionam este mundo através dos estudos e de reflexões sobre a sociedade e sobre si mesmas(os).

A todas(os) as(os) que desejam sair ou estão saindo da sua zona de conforto, num caminho de incertezas e de busca de novos horizontes, rumo ao conhecimento e o autoaperfeiçoamento, se encontrando, se perdendo e se redescobrindo em cada leitura e experiência acadêmica e/ou empírica.

Dedico, sobretudo, a cada artista que embeleza e/ou incomoda; que está desperta(o) ou dorme nas nossas memórias infantis; que resiste e persiste em sua arte, mesmo em meio às dificuldades.

Dedico esta pesquisa, cara(o) leitora/leitor, a você. A nós.

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5

AGRADECIMENTOS

À minha família, por serem minha base e meu suporte às minhas escolhas e empreitadas, em especial, à minha mãe Célia e ao meu pai Mário, pela vida e pela educação. À minha mãe, dedico um agradecimento mais enfático por sempre estar ao meu lado e me apoiar nas decisões. Sou eternamente grata por isso.

Às minhas irmãs Daniella e Joyce e ao meu cunhado Roberto, por segurarem muita barra em casa para que eu pudesse seguir com minha formação e também por todo o apoio.

À minha tia Célia (in memoriam), pelas alegrias, bondade e todas as experiências contigo. Você foi um exemplo de mulher forte e doce, que resistiu a muitas adversidades, sem reclamar, com toda a sua serenidade e amor ao cuidar de todo mundo ao seu redor. Também te agradeço pelo seu apoio, por todas as vezes que me fez rir ao me imitar cantando lírico e por ser nosso novo e amado anjo da guarda.

À minha avó Zeneide e ao meu avô Francisco, pela vida, amor e carinho.

À minha querida melhor amiga-irmã Lia Braga, por todo o suporte emocional, no processo ao escrever essa dissertação e no processo da vida como um todo. Muito obrigada por tudo o que você me ensinou sobre cultura africana e por ter me despertado para um outro olhar: de que eu, como brasileira, devo buscar mais as culturas que fazem parte do nosso país (negras e indígenas) a fim de tornar a ópera algo mais nosso e com a cara do nosso povo.

Ao meu querido amigo Marcos Leal e minha querida amiga Lila Gomes, por terem me aturado, me escutado e me aconselhado em todos os momentos de dúvidas e angústias.

À minha querida amiga Fátima Leal, mulher admirável, por sempre me apoiar e sempre me orientar na vida e em minhas escolhas, com toda sua expertise.

Às minhas queridas Meninas Superpoderosas Jariny e Cybelle, também pelo apoio, encorajamento e trocas. Todas(os) minhas/meus amigas(os) e familiares, que contribuem para que eu acredite, cada vez mais em mim mesma e resgate minha autoestima, seguindo sempre em frente, tentando ser uma pessoa melhor, em todos os aspectos.

Às/aos queridas(os) cantoras(es) e integrantes da Comissão do Grupo de Ópera Canto Dell’Arte/UFRN, grupo sem o qual eu não teria, sequer, me descoberto como cantora.

Às/aos colegas do Mestrado, que estão na mesma estrada que eu, mas seguindo rumos diferentes e, ainda assim, contribuíram para minhas pesquisas, na recomendação de leituras e diferentes pontos de vista que me fizeram repensar a pesquisa.

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6 À minha orientadora Melissa Lopes, à Profa. Mayra Montenegro e, mais uma vez, à minha irmã Daniella, que foram as pessoas que mais me inspiraram para trilhar um novo caminho para as artes cênicas e mais me encorajaram a fazer esse mestrado (a ideia foi da minha irmã), incorporando o teatro, ainda mais, na minha vida. Vocês foram e são muito importantes para mim. À Melissa, um agradecimento especial por ter me guiado durante todo esse percurso e pelo acolhimento, sempre me tranquilizando e me encorajando neste trajeto.

Às/aos examinadores da banca, a Profa. Bárbara Biscaro e Prof. André Carrico, por todas as contribuições de leitura e escrita desta pesquisa.

À minha professora de canto Cláudia Roberta e ao meu professor Miguelângelo Cavalcanti, que também têm sido grandes incentivadores dos meus estudos e com quem tenho avançado, cada vez mais, em minha técnica de canto, à Profa. Elke Riedel, que foi minha professora de canto durante todo o Curso Técnico e o Bacharelado, à Profa. Maria de Agosto Varella, que foi minha professora de canto antes de ingressar na academia, ao Edson Bruno, meu primeiro professor de canto. Vocês também foram e são muito importantes para mim.

Às professoras Profa. Karynne Coutinho e Melissa Lopes pelas maravilhosas aulas de Poética e Teatro; à Profa. Lucyana Lyra por todas as provocações na disciplina de Performance e Cultura; à Profa. Karenine Porpino, Prof. Adriano Moraes, Profa. Larissa Kelly, Profa. Anna Caldas pelo aprendizado e afetos criados; ao Prof. Maurício Motta pelas provocações dentro e fora da academia e a todas(os) as(os) docentes que, de alguma forma, contribuíram para o desenvolvimento desta dissertação.

Agradeço, por fim, a todas(os) aquelas(es) familiares, amigas(os) e conhecidas(os) que direta ou indiretamente, ajudaram em minhas reflexões sobre a temática desta pesquisa.

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RESUMO

Essa dissertação tem como objetivo a democratização e partilha do conhecimento, através da minha trajetória, enquanto cantora lírica/de ópera, na busca não apenas de um corpo que canta, mas de um corpo que conta, se experimenta, se conhece, se conscientiza e se disponibiliza cenicamente, com o intuito de redimensionar a interpretação das músicas do repertório clássico, especialmente, a ópera. A pesquisa se destina a todas as cantoras líricas/cantores líricos, atrizes e atores e a qualquer pessoa que se interesse pelo tema corpo-voz. Essas experiências serão relatadas por meio de linguagem ensaística, inscrita numa estrutura que combine o texto acadêmico com a escrita musical da ópera, a fim de desenvolver uma polifonia entre essas linguagens e aproximar a(o) leitora/leitor dessa arte, que reúne recursos musicais e teatrais. PALAVRAS-CHAVE: canto lírico, corpo-voz, experiência, ópera, teatro

ABSTRACT

This dissertation aims to democratize and share knowledge, through my trajectory, as a lyric/ opera singer, in the search not only for a body that sings, but for a body that counts, experiences itself, know itself, aware itself and it is available scenically, in order to resize the interpretation of the songs of the classical repertoire, especially the opera. The research is intended for all lyric singers, actresses and actors and anyone who is interested in the body-voice theme. These experiences will be reported through essay language, written in a structure that combines the academic text with the musical writing of the opera, in order to develop a polyphony between these languages and bring the reader closer to this art, that brings together musical and theatrical resources.

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8

Lista de Figuras

FIGURA 01:LIRA DE MADEIRA DE NOVE CORDAS ... 25

FIGURA 02:LIRAS RETRATADAS EM ANTIGO VASO GREGO ... 25

FIGURA 03:LAPINHA ... 45

FIGURA 04:MARIA D’APPARECIDA ... 47

FIGURA 05:CARLOS GOMES ... 48

FIGURA 06:CHIQUINHA GONZAGA ... 49

FIGURA 07:BIDU SAYÃO... 51

FIGURA 08:THEATRO CARLOS GOMES ... 54

FIGURA 09:INFORME DO THEATRO... 54

FIGURA 10:TEATRO ALBERTO MARANHÃO ... 56

FIGURA 11:ELENCO DA ÓPERA NAÇÃO NEGRA BRASIL ... 57

FIGURA 12:O MENTOR ESPIRITUAL ... 57

FIGURA 13:ENTRADA DO CONSERVATÓRIO DE MÚSICA FREDERICO CHOPIN ... 59

FIGURA 14:BELINDA TENTA ALEGRAR DIDO ... 69

FIGURA 15:DIDO 1º ELENCO –PROFA.ÂNGELA ... 70

FIGURA 16:DIDO 2º ELENCO –PROFA.AGOSTO ... 70

FIGURA 17:AFEITICEIRA ... 71

FIGURA 18:AS BODAS DE FÍGARO ... 74

FIGURA 19:OAMOR FALA COM ORFEU ... 79

FIGURA 20:TRIUNFA O AMOR ... 79

FIGURA 21:CAMPOS ELÍSEOS ... 82

FIGURA 22:ORFEU ENFRENTA AS FÚRIAS NO ÉREBO ... 83

FIGURA 23:GARÇONETES E O DIA DOS NAMORADOS... 85

FIGURA 24:CORO CANTANDO ... 87

FIGURA 25:A CHEGADA DO INVESTIGADOR E DOS PMS ... 89

FIGURA 26:AS TRÊS SOPRANOS VENENOSAS ... 90

FIGURA 27:CORO MASCARADO ... 93

FIGURA 28:FINAL DO ESPETÁCULO ... 94

FIGURA 29:SEGUNDA DAMA,BELINDA E DIDO ... 97

FIGURA 30:MAESTRO, SOLISTAS, PIANISTA E CORO ... 99

FIGURA 31:AS GRISETTES ... 101

FIGURA 32:SEGUNDO BLOCO DE 2018 ... 103

FIGURA 33:GUMERCINDA E ROBUSTIANO ... 111

FIGURA 34:ELENCO E ORQUESTRA NO PALCO ... 113

FIGURA 35:COLAS “LANÇANDO SUA MAGIA” ... 123

FIGURA 36:BASTIEN COM O CAJADO DE BASTIENNE... 124

FIGURA 37:CENA DO BALANÇO ... 124

FIGURA 38:O CASAMENTO DE BASTIEN E BASTIENNE ... 124

FIGURA 39:O ELENCO E A ÁRVORE COLORIDA ... 124

FIGURA 40:ELENCO, BAILARINO, PIANISTA E STORYBOARDER ... 135

FIGURA 41:FLORA E OUTRA CORTESÃ ... 142

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Sumário

ABERTURA ... pág. 12

I ATO

(pág. 23) 1. QUINTETO O que é Ópera ... pág. 24 2. CORO

O que é Canto Lírico? ...pág. 25 3. SEXTETO

Mitos sobre a Ópera ... pág. 33 4. QUARTETO

A Origem da Ópera ... pág. 40 5. CORO E TRIO

A História da Ópera no Brasil... ... pág. 42 6. FINAL

A História da Ópera em Natal/RN... ... pág. 52

II ATO

(pág. 62)

7. CORO E SOLO

O Grupo de Ópera Canto Dell’Arte ... ... pág. 63 8. CENA Dido e Eneias I ... pág. 67 9. CENA As Bodas de Fígaro ... pág. 72 10. CORO Orfeu e Eurídice ... pág. 77 11. CORO Amor a la Carte ... pág. 83 12. CORO E SOLO A Morte da Soprano I ... pág. 86 13. CORO A Morte da Soprano II ... pág. 90 14. CORO E SEXTETO Dido e Eneias II ... pág. 94 15. FINAL Notte d’Opera ... pág. 98

III ATO

(pág. 107) 16. DUETO

Al Fin Vence la Mujer …...…. pág. 108 17. TRIO Bastien e Bastienne …………. pág. 113 18. TRIO L’Enfant Prodigue ………….. pág. 127 19. CORO E SOLO La Traviata ………. pág. 134 20. CORO E SEXTETO

Opera Studio do Recife …….. pág. 142 21. RECITATIVO E CENA

Encontro com o Teatro …….. pág. 152 22. RECITATIVO E CORO

Os quatro elementos de Chekov ... ... pág. 167 23. FINAL

A Dança das Intenções ... pág. 174

(11)

Todo pesquisador realiza seu trabalho a partir da sua

própria vida, do seu próprio olhar e do lugar onde se

encontra no mundo. E todo pesquisador é um cidadão

desse mundo circunscrito ao seu tempo histórico e à

sua própria história de vida.

(Sônia Machado de Azevedo, pesquisadora, artista e professora brasileira)

Cada indivíduo depende de suas experiências e

vivências para seu amadurecimento criativo. É dentro

da sua bagagem de experiências que ele tem que

encontrar o material adequado para a sua criação

atual. No estudo que estamos fazendo, essas

experiências e vivências a serem utilizadas são as

corporais e vocais.

(Maria da Glória Beuttenmüller, fonoaudióloga e preparadora vocal brasileira

e Nelly Laport, bailarina, coreógrafa e preparadora corporal brasileira)

(12)

12

ABERTURA

1 Intervalos dissonantes são os que não têm caráter de repouso e exigem resolução sobre intervalos consonantes. Os intervalos dissonantes são 2ªs e 7ªs maiores e menores e todos os intervalos aumentados e diminutos (CARDOSO e MASCARENHAS, 1973, p. 76). (...) seus harmônicos ou suas combinações de sons causam uma sensação dolorosa ao ouvido (MAITLAND, Vol. 1, 1907, p. 707, trad. nossa).

2 “O nome spalla surgiu na Itália baseado no termo "attore di spalla" utilizado no teatro italiano para designar o que chamamos no Brasil de "escada", ou seja, aquele que apoia o ator principal, sobretudo nas cenas cômicas. Na orquestra, o Spalla é quem apoia o músico principal, ou seja, o maestro” (RIBEIRO, 2014). Geralmente, o(a)

spalla é a figura mais importante, depois do maestro e atua como uma espécie de “gerente” da orquestra, não

apenas no auxílio à afinação dos instrumentos, mas na orientação dos músicos, caso tiverem alguma dúvida sobre as indicações do maestro.

(13)

13 Em se tratando de uma ópera, a Abertura ou Overture, como é conhecido o termo em inglês, é o movimento instrumental que dá início à ópera e, tal qual uma introdução de um artigo, pesquisa ou dissertação, sintetiza vários trechos que serão explicados, mais detalhadamente, a posteriori.

Escolhi a palavra traduzida para o português porque é a língua que falamos aqui em Natal/Rio Grande do Norte - Brasil, e a expectativa é de que essa dissertação seja de fácil leitura e entendimento, entretanto, nem todos os termos musicais (como foi o caso da spalla, acima) e títulos de ópera serão traduzidos, pela estranheza sonora que o teatrólogo brasileiro Fernando Peixoto (1985), em seu livro sobre “Ópera e Encenação”, assinala abaixo:

Salvo raríssimas exceções, decidi traduzir os títulos das obras citadas no texto. Permanecem no original aqueles que seria no mínimo estranho traduzir: difícil citar Così fan tutte como Assim fazem todas. Ou, pior ainda, La Traviata como

A Decaída ou coisa parecida. O problema, aliás, remete a outro: salvo

raríssimas exceções as óperas são sempre encenadas em língua original, inclusive para preservar a integração som-palavra, um dos centros nevrálgicos da complexidade do gênero. (PEIXOTO, 1985, p. 12, grifos do autor).

Assim, pretendo escrever essa dissertação de forma ensaística, mesclando elementos da estrutura musical de uma partitura operística com a escrita acadêmica, para que a leitora ou o leitor possam ter noções gerais e poéticas dessa organização por meio da própria arte imbuída na pesquisa, cuja escrita já ensaia uma polifonia, ou seja, um diálogo de linguagens artísticas executadas em conjunto.

A linguagem artística está preenchida de termos e alguns símbolos musicais, teatrais ou poéticos e a cada mudança de fonte (Tekton Pro Cond para Times New Roman, para

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14 ser mais específica), há a transformação de uma cena descrita, a fim de estimular e fecundar o imaginário para o texto acadêmico propriamente dito.

Uma das figuras musicais inseridas nesta dissertação é a barra dupla (

).

Nas partituras musicais, utilizamos esse símbolo quando uma ideia musical (que pode ser tonal ou rítmica) é concluída e damos início a outra, e, nesta direção, usarei a barra dupla no texto para delimitar o final de uma ideia e início de outra, como se minhas palavras fossem música, que mudam de ritmo e tom.

Outro tipo de barra a ser utilizada nesta pesquisa é a chamada “barra de finalização”, caracterizada por uma barra dupla diferente da anterior, que indica quando a ideia maior é

concluída (

]

).

Por último, e não menos importante, utilizarei dois símbolos musicais ao início e ao final desta dissertação - o Da Capo () que significa “da cabeça” que indica que deve-se retornar do início da música (final da dissertação), entretanto, em alguns casos, existe o Segno (

), que significa “sinal” e este símbolo serve para indicar que ao invés de retornar do início, deve-se retornar até onde este sinal está localizado (início da pesquisa).

Utilizo estas figuras musicais, inspirada na tese de doutorado da Profa. Bárbara Biscaro, que nomeia a sessão conclusiva de Ritornello (pequeno retorno), que é outro sinal musical que indica um retorno ao início ou até onde existe a indicação que marca esse retorno e, com isso, o que pretendo dizer é que esta pesquisa não está “fechada em si” e que é sempre uma retomada, que pode sofrer alterações e ornamentações a cada revisita.

As pessoas que desejarem se aprofundar em teoria musical e compreender melhor essa simbologia e outros aspectos poderão iniciar seus estudos, lendo alguns dos livros citados nas referências bibliográficas desta dissertação, tais como PRIOLLI (2006) e CASTAGNA (2008). Outras leituras recomendadas são os livros “Teoria da Música” do Bohumil Med e o “Guia Teórico-Prático para o ensino do ditado musical” de Pozzoli.

Para que essa experiência transborde a visão e atinja, também, a audição, recomendo que consultem essa dissertação em seu formato digital, pois cada link disposto abaixo pode conter algum som e/ou vídeo.

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15 Assim sendo, esta pesquisa tenta trazer um pouco da minha trajetória, enquanto cantora lírica, em especial, uma cantora de ópera, na cidade de Natal, do Rio Grande do Norte, não de forma a me citar como uma referência ou um “exemplo a ser seguido”, ou de apresentar “verdades absolutas” ou, ainda, “fórmulas prontas e mágicas rumo ao sucesso”. O que aponto são os caminhos que trilhei ao questionar minha própria formação, em busca de aperfeiçoamento nessa expressão artística, que se diferencia bastante da formação de uma/um cantora/cantor lírica(o) e/ou de ópera em outros lugares do Brasil ou, ainda, outros países.

Ao falar de minha própria experiência, pretendo provocar ou despertar a percepção que os cantores líricos têm de si mesmos, de modo a refletir sobre nosso estudo e formação enquanto cantoras(es) líricas(os), sempre me referindo ao contexto em que estou inserida, junto a outras(os) cantoras(es) líricas(os): Natal, Rio Grande do Norte, que é uma cidade do Nordeste do Brasil, que vem se fortalecendo e ganhando reconhecimento no cenário musical, em termos de formação musical, mas que ainda não possui um cenário forte, em termos de ópera.

Quando falo de experiência, utilizo os conceitos do pedagogo e filósofo espanhol, Jorge Bondía Larrosa, que a define esse termo como algo que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca (LARROSA, 2002, p. 21).

A experiência seria o modo de habitar o mundo de um ser que existe, de um ser que não tem outro ser, outra essência, além da sua própria existência corporal, finita, encarnada, no tempo e no espaço, com outros. E a existência, como a vida, não pode ser conceitualizada porque sempre escapa a qualquer determinação, porque é, nela mesma, um excesso, um transbordamento, porque é ela mesma possibilidade, criação, invenção, acontecimento. (...) E a experiência é o que é, e além disso mais outra coisa, e além disso uma coisa para você e outra coisa para mim, e uma coisa hoje e outra amanhã, e uma coisa aqui e outra coisa ali, e não se define por sua determinação e sim por sua indeterminação, por sua abertura. (LARROSA, 2014, p. 43-44).

Dentro desta definição de experiência como “algo que nos passa”, acho importante citar que uma das características que tem me acompanhado, desde a infância, é o fato de ser tímida e como isso afeta o meu fazer artístico.

Este perfil fez com que eu quisesse “me esconder” das pessoas... Fez com que o volume da minha fala fosse sempre baixo... Fez com que meus gestos fossem sempre pequenos e “para dentro”... Fez com que eu olhasse as pessoas de baixo para cima, sempre me colocando numa posição de “olhar inferior” (durante a adolescência. Hoje, isso não acontece tanto), se prolongou até os 20 e poucos anos e esse modo de agir interfere no meu modo de ser/estar no palco, quando canto e/ou interpreto.

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16 Assim, a defesa natural do tímido é se isolar e se calar para evitar o contato – e o confronto – com outras pessoas. E aí o tímido começa a ficar altamente emocional em suas reações, criando um mundo particular em que a regra básica é “Ninguém me entende”. Quanto mais isolado o tímido se torna, menos confiança vai adquirir em si mesmo. Essa insegurança levará gradativamente à dificuldade para decidir o que fazer. O passo seguinte é a perda da autoestima. E daí em diante, tudo só vai ladeira abaixo (GEHRINGER, 2019, p. 24-25).

Tente imaginar, cara(o) leitora/leitor: até eu encontrar caminhos e possibilidades para destravar este corpo (que ainda está em processo), quantas e quantas vezes eu não perdi a oportunidade de cantar, antes mesmo de me descobrir cantora, porque tinha vergonha de levantar a mão e dizer que sabia cantar aquela música...? Quantas e quantas vezes eu não deixei de levantar a mão e tirar uma dúvida, em sala de aula, por medo das minhas colegas me ridicularizarem...? Quantas e quantas vezes eu não perdi oportunidades de emprego, antes de definir a arte como minha profissão, porque as pessoas sempre buscam pessoas seguras e extrovertidas e veem a introversão e a quietude como um defeito...? Quantas e quantas vezes eu não deixei de amar por não ter coragem de dizer às pessoas como eu me sinto em relação a elas...? Por medo da rejeição... Medo do ridículo... Medo e apenas medo, que me acorrentam e me prendem tal como um animal selvagem num zoológico...

Nesta perspectiva do que me passa, falarei sobre meu ingresso nesse universo artístico, que se deu através do Grupo de Ópera Canto Dell’Arte, um Projeto de Extensão da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), no final de 2005, onde iniciei como participante da comunidade externa à instituição e, consequentemente, também contarei sua história, uma vez que o encontro com o grupo fez com que nossas histórias se fundissem e se confundissem até os dias atuais.

O impacto mais significativo deste encontro foi a minha busca pela formação acadêmica a nível Técnico, em 2011, e na Graduação, em 2013, ambas com habilitação em Canto Lírico.

Isso fez com que eu questionasse não apenas a própria formação que obtinha dentro da instituição, mas ao tipo de espetáculo que estava apresentando dentro do Dell’Arte, bem como à instrução que era transmitida às cantoras e aos cantores do grupo, oriundos dos mais diversos tipos de áreas do conhecimento e muitas(os) delas(es), inclusive, vêm de fora da universidade, e por fim, em como eu era antes de entrar no grupo.

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17 Essas inquietações me levaram a enxergar uma lacuna interpretativa que precisava ser preenchida: me faltava a expressividade cênica, componente apontado por muitas(os) professoras(es) de canto, dentro da academia e nos masterclasses, cursos e festivais fora da cidade que frequentava, juntamente com as(os) encenadoras(es) com quem tive contato nesses eventos.

Ao me encontrar nessa arte e ouvir destas(es) mestras(es) o que faltava para desenvolver meu trabalho, recorri rapidamente ao Curso de Licenciatura em Teatro, da UFRN. Num primeiro momento busquei as aulas de Expressão Corporal e posteriormente os componentes de Expressão Vocal. O contato com o Teatro começou de forma tímida mas aos poucos fui me sentindo tão à vontade e ao mesmo tempo tão instigada a pesquisar mais que, decidi ingressar no Mestrado em Artes Cênicas, em 2018, e não no Mestrado em Música. Este é o percurso que escolhi para sanar as minhas inquietações, criar outras, lidar com minha timidez e me desenvolver profissionalmente.

Nesta perspectiva de busca por novos trajetos, tenho, como objetivo, a conscientização de nosso posicionamento enquanto profissionais das artes cênicas(os), uma vez que nós, cantoras líricas e cantores líricos, em especial, de ópera, temos que ressignificar nosso corpo para interpretar as personagens que cantamos. A própria definição da ópera, encontrada em muitas publicações, menciona que se trata de “um espetáculo teatral majoritariamente cantado”.

A ideia é que nos reconheçamos como cantoras-atrizes e cantores-atores e que tenhamos autonomia o suficiente de construir nossa própria cena, especialmente em momentos de recitais e em ocasiões onde não exista alguém para nos dirigir e mesmo que exista, é importante que tenhamos alguma independência e consciência do nosso corpo, a ponto de nos tornarmos compositoras(es) de partituras cênicas3, a partir das partituras musicais do repertório

que estamos estudando.

Essa ideia de uma cantora lírica e um cantor lírico, com participação ativa e independente na construção de suas personagens não é novidade. Era uma das intenções do

3 A partitura cênica é uma espécie de roteiro, de forma a orientar a atriz/o ator sobre seus deslocamentos e/ou movimentos que ela(e) tem que realizar, em um determinado momento da cena. Esta forma de pensar a ação auxilia, especialmente para quem está iniciando seus estudos cênicos, mas este recurso também é essencial para o trabalho de muitas(os) atrizes/atores profissionais.

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18 ator, diretor e pedagogo russo, Constantin Stanislavski (1863-1938), que começou a pensar sobre esse assunto quando se deparou com o núcleo artístico da Ópera de Bolshoi.

Havia uma grande importância no uso do “sistema” de Stanislavski na ópera. Primeiramente, é claro, aproximar os cantores de outra realidade de representação, onde o cantor passava a ser verdadeiramente um cantor-ator, que possui mais autonomia e independência e que passa por um processo criativo e uma construção de sua personagem (SANTOLIN, 2013, p. 52, grifo da autora).

Desta forma, a direção cênica não era mais responsável por ditar cada passo e/ou movimento, gesto que a cantora-atriz ou o cantor-ator teria que executar em uma determinada ópera. Mas ao contrário, despertar nessas(es) artistas um mergulho em seu trabalho por meio de uma investigação prática que pudesse ir além da potência vocal que eles já possuíam.

Assim, esta dissertação pretende se pautar em alguns destes aspectos que foram problematizados por Stanislavski e a partir deles, refletir e analisar como a proximidade destas duas linguagens artísticas, música e teatro, vem sendo fundamentais no meu processo de aprendizado enquanto cantora lírica e de ópera.

Neste contexto, o I Ato desta dissertação pretende apresentar alguns conceitos referentes a Ópera e contextualizar de forma sintética sua história, para que o(a) leitor(a) possa compreender melhor como esta arte chegou à cidade de Natal/RN.

Já o II Ato descreve como se deram as montagens operísticas que o Grupo de Ópera Canto Dell’Arte realiza, até os presentes dias.

O III Ato, por sua vez, parte de minha experiência com a ópera em montagens da academia, em cenas de cursos e eventos que realizei fora da cidade e, por último, trata do encontro com o teatro e dos exercícios que mais me atravessaram e me auxiliaram nessa conscientização corporal e criação cênica.

Para atingir os objetivos didáticos e democráticos descritos nos parágrafos anteriores, pretendo estabelecer uma maior proximidade com as pessoas que leem esse estudo, através da escrita em primeira pessoa, me inserindo no texto como pesquisadora e sujeito pesquisado, revelando os prós e contras que encontrei, durante a sua realização, sob a ótica de quem sugere e experimenta os caminhos.

Além desta forma de escrita em primeira pessoa, em alguns momentos, pretendo me comunicar diretamente com a leitora e o leitor, tratando-a(o) como segunda pessoa do singular e do plural e, às vezes, na primeira pessoa do plural, assim como algumas figuras da literatura também faziam em suas obras, como por exemplo, o escritor brasileiro Machado de

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19 Assis, em sua célebre obra “Dom Casmurro”4, na expectativa de diminuir, mais ainda, essa

distância entre pesquisadora e leitor(a), bem como a distância entre a ópera e a comunidade. Tudo o que fazemos, em esfera macro ou micro, é político e, neste contexto, não há como escrever esta dissertação sem refletir sobre os tempos atuais e é na fonte Calibri que trago anotações, traduções de música, poemas e outras referências para refletirmos sobre esses temas. O primeiro deles é da cantora, pianista e ativista afro-americana, Nina Simone:

O dever do artista é refletir o seu tempo, com isso que me preocupo!

Eu acho que essa é a verdade dos pintores, escultores, políticos, em suas escolhas.

Eu escolhi refletir o tempo e as situações em que me encontro, isso para mim, é o meu dever.

E nesse momento crucial de nossas vidas, quando tudo é tão desesperador e tentamos sobreviver a cada dia, não tem como não se envolver, jovens brancos e negros sabem disso e é por isso que estão tão envolvidos com política.

Nós vamos moldar e mudar esse país ou ele não será nem modelado nem receberá forma alguma. Eu não acho que há uma escolha. Como ser artista e não refletir sua época? Pra mim essa é a definição de um artista!

O período em que nos encontramos hoje é de uma tentativa política de diminuir, intimidar e calar artistas, educadoras(es), mulheres e minorias étnicas.

Nesta perspectiva, reflito sobre o meu lugar de fala diante desta arte, de origem europeia, me posicionando enquanto uma artista, educadora e mulher, de etnia latina/hispânica e reflito sobre este fazer artístico, sob a ótica de alguém que habita um país colonizado, que ainda tem o pensamento de considerar tudo o que veio do “velho continente” como algo de qualidade superior e de maior status.

Assim sendo, como atitude inicial de descolonização e apropriação desta expressão artística, sinto-me no dever, enquanto mulher brasileira, de buscar referências que não apenas

4 Em seu famoso clássico da literatura brasileira, “Dom Casmurro”, o autor estreita a relação com o leitor, por meio de formas de tratamento em segunda pessoa como “caro leitor”, “leitor amigo”, “leitor meu amigo” e descreva ações/pensamentos que ele imagina que o leitor possa ter, como “a leitora, que ainda se lembrará de minhas palavras” ou “A leitora, que é minha amiga e abriu este livro com o fim de descansar da cavatina de ontem para a valsa de hoje”.

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20 contemplem autores do sexo masculino e brancos, que dominam as pesquisas, e sim, que também contemplem mulheres, artistas nacionais, locais e de outras etnias além da branca.

Outros aspectos políticos que atravessam essa dissertação é o diálogo estabelecido, primeiramente, com as leitoras, através da antecipação dos substantivos femininos e a inserção dos masculinos em parênteses ou posposto, na escrita e a citação de pesquisas, realizadas por mulheres, no referencial bibliográfico, a fim de dar visibilidade e valorização às mulheres artistas e pesquisadoras.

Pretendo, sobretudo, valorizar as mulheres educadoras e artistas que contribuíram muito para minha formação artística, no canto e no teatro e que incentivaram a continuar o meu percurso.

Não obstante, desejo conectar saberes, conhecimentos e experiências, tratando-os com igual importância, num âmbito acadêmico tão sectário e disciplinar; dar vez e voz ao Projeto de Extensão Grupo de Ópera Canto Dell’Arte, onde boa parte de seus integrantes não são da Universidade e falar de como desenvolvi no grupo e como ele contribuiu na minha formação enquanto cantora lírica.

Devido ao fenômeno mundial de elitização da ópera e ao caráter amador do Dell’Arte, compreende-se que o fazer artístico e formação deste grupo é bem atípico, se compararmos com grandes companhias profissionais de ópera, em escala global e por isso, é importante relatar seu diferencial inclusivo e deselitizador.

Desta maneira, escrevo este trecho da Abertura, na perspectiva de tratar a escrita como uma obra de arte e não apenas como uma pesquisa acadêmica, compreendendo a beleza não apenas como um caráter estético, mas como um elemento que depende da perspectiva de quem observa, escuta e/ou se afeta, de alguma forma.

Apesar do foco dessa dissertação ser na formação de cantoras líricas e cantores líricos, pretendo que este estudo também sirva para qualquer pessoa interessada em atuação para Ópera ou que tenha interesse no campo do corpo-voz.

Assim, essa pesquisa é uma tentativa de reunir linguagens artísticas, que são muitas vezes ensinadas separadamente, quando o que se pede, na ópera, é justamente a união desses conhecimentos.

Por fim, esse texto pode ser uma espécie de iniciativa que pode auxiliar uma jornada de descobertas, para quem quer experimentar essa arte, uma vez que na cidade de Natal não existe essa formação específica.

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21 Esse é o caminho que eu escolhi.

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22

Infelizmente, a ópera já foi considerada chata.

Obviamente, se for mal cantada, pode ser muito chata.

Mas também é a maneira no qual eu me expresso

melhor. É o meu mundo, se preferir. Eu me sinto

elevada sobre tudo. É o meu jeito de me expressar e

dar, talvez... Dar talvez ao público uma ilusão de algo

melhor na vida.

(Maria Callas [soprano], cantora de ópera grega)

Pois viver deveria ser - até o último pensamento e

derradeiro olhar - transformar-se.

(Lya Luft, escritora e tradutora brasileira)

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23

I ATO

Para compreendermos o cenário da ópera em Natal, Rio Grande do Norte, é necessário entender alguns conceitos à respeito da temática, que não serão apresentados como “verdades absolutas e inquestionáveis”, mas como princípios norteadores desta pesquisa, que se propõe a uma reflexão crítica e autocrítica sobre os fenômenos em questão.

5 Nome popularmente dado ao vocalize de vibração bilabial. Esse exercício pode ser vozeado ou não vozeado e é popularmente chamado assim, pela semelhança com a brincadeira do “besourinho” que os bebês fazem, quando vão aprendendo sons e gestos com os adultos.

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24

%

Nº 1. O que é Ópera?

A pesquisadora de óperas italianas Gloria Staffieri define a ópera como uma palavra de campo semântico complexo e não unívoco. De modo geral, este termo se refere a um tipo de espetáculo teatral que se manifesta, principalmente, através da música e do canto (STAFFIERI, 2015, p. 17, trad. nossa).

A musicóloga americana Carolyn Abbate escreveu, junto com o musicólogo inglês Roger Parker, o livro “Uma História da Ópera: os últimos quatrocentos anos” e a definem como um tipo de teatro no qual a maioria ou todos os personagens cantam durante a maior parte do tempo ou o tempo todo. Nesse sentido, é muito óbvio que ela não seja realística, e com frequência, no decorrer de seus mais de quatrocentos anos de história, tem sido considerada exótica e estranha (ABBATE e PARKER, 2015, p. 16).

A ópera é, mais do que qualquer outra coisa, um ramo do teatro, e as pessoas que ficam em casa ouvindo-a em gravações não estão apreciando a ópera de forma completa. Para apreciar o seu impacto total é preciso assistir um espetáculo ao vivo (DIGAETANI, 1986, p. 73).

As três referências dos quatro autores citados acima são unânimes em considerar a ópera como um gênero teatral cantado e com base nisto, é importante que as pessoas que atuem neste tipo de espetáculo tenham conhecimento nas técnicas do canto lírico.

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Nº 2. O que é Canto Lírico?

O estilo de canto possui esse nome porque, historicamente, o termo é derivado da lira, que era o instrumento que servia de acompanhamento ou suporte à voz, que cantava as formas mais curtas de poesias entre os gregos antigos (MAITLAND, 1907, Vol. II, p. 793, trad. nossa).

Figura 01: Lira de madeira de nove cordas

Fonte: Slow Mood6

Figura 02: Liras retratadas em antigo vaso grego

Fonte: Música e Adoração7

Apesar desse tipo de canto não ser mais acompanhado por lira, unicamente, a denominação permaneceu, de modo a diferenciar do canto popular que, atualmente, é mais próximo à fala.

A professora de canto e fonoaudióloga Diana Goulart (2012) cita algumas diferenças presentes nesses estilos de canto:

Intensidade

Lírico: Precisa de grande volume ou potência vocal; a voz deve alcançar toda

a platéia, mesmo cantando junto com uma orquestra sinfônica, sem usar microfone.

Popular: O microfone permite uma emissão no nível da fala, com

naturalidade. O cantor regula o volume através da sua emissão vocal e também através do equipamento (microfone).

Qualidade vocal

Lírico: Existem cânones (“padrões”) já estabelecidos que devem ser

respeitados, de acordo com cada tipo de voz.

Popular: O conceito de “boa voz” é mais flexível, e valoriza um estilo pessoal,

uma voz que se identifique, uma “marca”.

6 Disponível em: <https://goo.gl/Z3gaHh>. Acesso em: 22 de Jul. de 2018.

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26 Articulação e dicção

Lírico: Segue regras que às vezes tornam a pronúncia artificial e difícil de

entender. Pode-se, até certo ponto, distorcer um fonema em favor da melhor emissão musical.

Popular: A letra deve ser dita como na fala, com clareza, naturalidade e sem

distorções na pronúncia, para que seja compreendida imediatamente. Extensão

Lírico: As composições frequentemente têm grande extensão, e tendem a

explorar as regiões extremas das vozes. Busca-se o virtuosismo vocal, o desafio técnico; o cantor deve demonstrar todos os seus recursos.

Popular: Nem sempre é necessária uma grande extensão vocal. Entre as

cantoras, parece haver certa tendência a rejeitar os agudos (principalmente no registro de cabeça) e valorizar a voz grave; uso da voz “mista” (mistura as ressonâncias de cabeça e peito).

Vibrato

Lírico: Sempre presente, exceto em alguns poucos estilos de música antiga,

que o usam apenas como ornamento. A partir do Barroco, o vibrato caracteriza uma voz treinada.

Popular: Depende do estilo; pode estar ausente, presente em alguns pontos

específicos (finais de frases, ou em alguns ataques) ou em toda a canção. É um recurso expressivo opcional.

Classificação vocal (soprano, tenor etc.)

Lírico: É o primeiro passo para se construir um repertório. Existem músicas

escritas para cada tipo de voz, e esta intenção do autor tem que ser respeitada. Veja mais sobre este assunto na pergunta 17.

Popular: A escolha do repertório é feita pelo gosto pessoal, e a tonalidade da

peça é modificada para se adequar à tessitura do cantor. A classificação perde importância: o que conta é mostrar uma voz interessante, pessoal, marcante, que o ouvinte possa identificar.

Liberdade, Criatividade, Improvisação

Lírico: Procura ser fiel à intenção original do autor, respeitando todas as

indicações da partitura, como tonalidade, melodia, ornamentos, dinâmica etc. O cantor não pode improvisar.

Popular: Procura a novidade, o surpreendente, a releitura; espera-se sempre

ouvir uma versão diferente da que já foi feita. É desejável que o cantor coloque na canção a sua “marca”, criando variações rítmicas e melódicas (GOULART, 2012, on-line, grifos da autora).

Portanto, em observância a essas diferenças, pode-se perceber que o canto lírico é um estilo de canto que requer muito estudo, para saber como dar corpo e volume à sua voz, a ponto dela preencher todo o espaço; como explorar as regiões mais agudas e mais graves que você possui, da forma mais saudável possível, dentro da sua classificação vocal; como fazer um

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27 vibrato8 com uma boa técnica e não fazer um vibrato artificial; quais as vogais e consoantes que melhor se ajustam ao trecho que você for cantar, dependendo da região (grave ou agudo), tempo, idioma, etc; estudar os estilos e os períodos das peças que vocês está cantando, para não cantar uma ária de ópera do Barroco, da mesma forma que se canta uma ária de ópera do Romantismo, entre outras coisas.

Para estudar, desenvolver e aprender os recursos enumerados acima, as cantoras líricas e os cantores líricos devem saber o tipo de voz que possuem e essa classificação vocal é definida pelo timbre.

O timbre é conhecido como “a cor do som”, é a identidade do som, que nos permite distinguir uma fonte sonora de outra. Dois sons de mesma altura, duração e intensidade, podem ser distinguidos se seus timbres forem diferentes. Por exemplo, se uma mesma nota for tocada por um violino, depois por um piano e em seguida por uma flauta, podemos identificar os três sons distintamente, como vindos de fontes diferentes, graças ao timbre, embora tenham frequência (altura) e amplitude (intensidade) similares (SOUZA, 2012, p. 42).

O timbre seria o equivalente à nossa “impressão digital sonora”, uma vez que nosso corpo-voz é único e, mesmo assim, dentro dos padrões de classificação vocal estabelecidos no canto lírico, nem todo timbre vocal é fácil de definir e, quando iniciei meus estudos de canto, na época e durante muitos anos, o meu causou dúvidas entre muitas professoras e professores.

Neste sentido, a cantora de ópera e professora Helene (2017) explica o porquê: “(...) Com os instrumentos musicais essa distinção é bem mais clara do que no canto, já que um oboé é um oboé por ter uma característica física (como é construído, sua madeira, etc) e um som característico. Claro que entre o oboísta e outro haverá sempre uma diferença no som tirado do instrumento, mas seu timbre será sempre de oboé com pequenas diferenças timbrísticas, que podemos chamar de cores.

No canto, a coisa fica bem mais complicada, pois o instrumento do cantor não foi comprado pronto e precisa ser construído. Grande parte dessa construção envolve a composição do som produzido, manipulando as estruturas do trato vocal para produzir um conjunto de harmônicos selecionados (além da alteração na amplitude desses harmônicos e também no envelope sonoro que envolve a onda criada, mas por uma escolha didática mencionarei apenas os harmônicos). Isso não quer dizer que absolutamente tudo poderá ser construído. Uma parte dos harmônicos de cada pessoa é totalmente relacionado ao corpo que ela possui e não poderá ser manipulada. São estes harmônicos que vão nos permitir identificar quando é um determinado cantor que está cantando e não outro ao ouvir a sua voz. Mas algumas alterações nesse corpo podem (embora não obrigatoriamente) alterar esses harmônicos 8 Vibrato (palavra do italiano que significa “vibrado”) é quando a(s) nota(s) vibra(m) e é um recurso não apenas ornamental, mas de ênfase à palavra ou sílaba, quando a nota é sustentada e, especialmente, em final de frases. No canto lírico, o vibrato é um recurso quase obrigatório, resultado de uma boa técnica vocal e a voz “lisa”, muitas vezes, é considerada uma voz tensa ou com uma técnica em fase inicial de desenvolvimento.

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28 nativos: gravidez, aumento ou perda significativa de peso, calcificação de cartilagens, etc (HELENE, 2017, on-line).

Ou seja, diferentemente de um instrumento, que já está pronto para ser tocado, a nossa voz é o resultado de um processo em constante construção, o que torna difícil uma classificação imediata num primeiro contato com a cantora ou o cantor, muitas vezes, especialmente, se forem iniciantes e se possuírem um timbre que cause dúvida nas pessoas que estão escutando e classificando a voz.

Há vozes que são fáceis de classificar, desde o primeiro momento e vozes que não são. Para classificar a voz, é necessário ouvir a cantora e/ou o cantor, num primeiro momento e assim, classificamos a voz de acordo com o que é possível perceber naquele instante e, em seguida, é feito um acompanhamento vocal para observar como essa voz se desenvolve. Depois de alguma prática de estudo, a voz adquire consistência e só então, é possível fazer uma classificação mais precisa. Esse último exemplo foi o meu caso.

Portanto, para se classificar uma voz, deve-se considerar o seguinte: • Timbre pessoal;

• Comprimento e espessura das pregas vocais – alguns otorrinolaringologistas especialistas em voz conseguem classificar uma voz avaliando o tamanho e a forma das estruturas do aparelho fonador de um cantor através da laringoscopia. Quanto mais experientes forem esses médicos, maior a chance de acerto (lembram-se dos otorrinos que eu recomento? Leia neste post), porém eu já os indaguei várias vezes sobre onde achar as referências sobre isso... Livros? Artigos? Nada. A razão para que não exista literatura científica sobre isso é que a natureza é muito mais criativa do que podemos imaginar e a quantidade de variações e combinações entre essas variações é muito grande para tornar possível um estudo que defina realmente como é o aparelho fonador de uma determinada voz. Tudo o que temos então são generalizações, como: pessoas de baixa estatura, com ossatura pequena, e pregas vocais mais curtas e estreitas normalmente possuem vozes mais leves, pessoas com pescoços largos e laringe proeminente possuem vozes graves, e etc. Como com toda generalização, esteja preparado para as inúmeras exceções.

• Forma e volume das cavidades de ressonância – os bons otorrinos avaliarão, para sua sugestão de classificação vocal, além das pregas vocais e da laringe, todas as cavidades de ressonância.

• A tessitura (útil) e a extensão – a tessitura útil é a região entre a mais grave e a mais aguda nota que um cantor consegue cantar com qualidade e eficiência vocal (notas que saem de vez em quando com certeza não entram como tessitura útil). Já a extensão engloba todas as notas que um cantor consegue produzir sem levar em conta a qualidade e a eficiência vocal;

• Locais das passagens – são as notas onde a voz passa de um registro para outro (no post sobre registros tem até uma tabelinha, dê uma olhada aqui) (Dinville apud Helene, 2018, on-line, grifos da autora).

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29 O segundo e terceiro itens, citados pela professora, exigem um equipamento específico para visualizar a anatomia da(o) cantora/cantor, mas, como nem sempre eles dispõem desses aparatos, eles observam os demais itens, que são percebidos através da escuta da voz da(o) aluna(o).

Quando comecei, a dúvida que existia era devido à grande extensão vocal que possuía, para graves e agudos e pouco volume, na época, o que dificultava a identificação do brilho da minha voz e a falta de técnica para o canto lírico, então, durante muitos anos, não sabia se era mezzo-soprano ou soprano.

As classificações vocais gerais são:

• Vozes agudas = soprano (feminina) e tenor (masculina);

• Vozes médias = mezzo-soprano (feminina) e barítono (masculina); • Vozes graves = contraltos (feminina) e baixo (masculina).

Existem ainda as vozes masculinas que cantam no registro feminino. No caso dos contratenores, a região em que eles cantam equivale à região das mezzo-sopranos e/ou contraltos e no caso dos sopranistas, equivale à região das sopranos.

Se estiver acessando esta dissertação em formato digital, recomendo que clique neste link9, onde poderá escutar essas vozes.

Além das classificações, temos as subclassificações vocais, que seriam como um sobrenome ou uma especificidade vocal, que surgiram a partir do Romantismo. As mais utilizadas são:

• Leggero: voz que tem por tendência a dinâmica piano, tendo dificuldades para executar dinâmicas em fortíssimo, costuma ter timbre suave, leve, delicado, cristalino, etc.

• Lírico: a principal característica dessa voz é a capacidade de transitar por todas as dinâmicas, tendo dificuldade em se manter apenas em extremos como apenas no pianíssimo ou no fortíssimo, costuma ter timbre romântico, envolvente, etc.

• Dramático: voz que tem por tendência a dinâmica forte, tendo dificuldades para executar dinâmicas em pianíssimo, costuma ter timbre metálico, escuro, agressivo, etc (HELENE, 2018 on-line).

Há, ainda, subclassificações como spinto (que seria uma voz intermediária entre o Lírico e o Dramático), Soprano Falcone (uma soprano que também pode cantar papeis de

9 Vídeo “An introduction to opera’s voice types” (uma introdução aos tipos de voz na ópera), com cantoras e

cantores do Royal Opera House, uma casa se ópera mundialmente famosa, situada em Londres. A ordem das vozes que aparecem no vídeo é: baixo, barítono, tenor, mezzo-soprano, contratenor e soprano.

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30 mezzo-soprano), Soprano Absoluta (soprano que pode cantar qualquer papel), Baixo Profundo (o baixo cujo timbre brilha mais em notas muito graves), Soprano Soubrette (uma jovem soprano lírica), entre outras, entretanto, não me estenderei explicando todas, pois sempre surgem subclassificações novas e nem todas(os) as(os) estudiosas(os) estão de acordo com a existência e a definição de todas elas.

No meu caso, em particular, comecei a participar do Grupo de Ópera Canto Dell’Arte, como comunidade externa à UFRN, no final de 2005, e por necessidade do grupo, entrei no naipe de contraltos e depois de alguns anos, ingressei no Curso Técnico de Música com Habilitação em Canto, em 2011 e em 2013, iniciei a graduação no Bacharelado em Canto Lírico, ambos pela UFRN e durante todos esses anos de grupo e na academia, não havia um consenso sobre minha voz: ora me classificavam como mezzo, ora me classificavam como soprano.

Isso influenciou na escolha do meu repertório, pois minha classificação era frequentemente alterada, especialmente, quando ia para os masterclasses e comuniquei à minha professora de canto a minha frustração em não saber mais o que cantar, pois a cada masterclass, alguma/algum professora(professor) “emitia um parecer diferente”, então, a solução que encontramos, para não jogar todo o meu repertório fora, foi trabalhar peças que tanto sopranos quanto mezzo-sopranos pudessem cantar, numa região médio-aguda.

Essa incerteza só chegou ao fim em 2014, durante a participação em alguns cursos e masterclasses fora da cidade.

Meu timbre/tipo vocal é o de uma Soprano Lírica, mais especificamente, o de uma Soprano Lírico Plena ou, como dizem em inglês, Full Lyric Soprano, que é um timbre um pouco mais escuro e de maior volume que o de uma soprano lírica, mas não tão volumoso quanto uma soprano spinto.

Certa vez, em 2012, me disseram que eu tinha “um pezinho no spinto” e em 2014, no 36º CIVEBRA10, a cantora belgo-grega Ismini Giannakis, num primeiro momento, pensou

que eu era spinto, assim como ela própria, mas ao me ouvir em outros dois momentos, concluiu que eu era mesmo uma soprano lírica.

10 O 36º CIVEBRA - Curso Internacional de Verão da Escola de Música de Brasília é um curso de aperfeiçoamento em Música, realizado pela Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, que ocorreu entre os dias 14 a 25 de janeiro de 2014, no CEP - Escola de Música de Brasília e na ESAF – Escola de Administração Fazendária.

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31 Ainda em 2014, durante o III Opera Studio de Recife11, os professores Marcelo Ferreira e o coach Vitor Philomeno me definiram como soprano lírico pleno e foi nessa ocasião que tomei conhecimento dessa especificidade do “Pleno”, confirmando o que a Profa. Ismini havia me falado.

Foi também no III Opera Studio de Recife que aprendi o que é fach:

Além das características vocais, outras devem ser levadas em conta ao se nomear parte de uma classificação vocal (ou de um fach, termo alemão para isso que engloba todas as características descritas por Kloiber12 acima). Conforme suas capacidades vocais (tessitura útil, habilidade ou não de fazer coloraturas, ou frases em legato, dinâmicas, etc), seu timbre, seu volume, seu desempenho cênico e em algumas situações seu porte físico. Entendendo que essa subclassificação é uma técnica de venda, uma forma de se comunicar com o seu contratante, fica fácil entender como, por exemplo, o mesmo cantor canta determinado fach em um país e outro em outro. Em situações assim, a voz (variações anatômicas + técnica) permite que o cantor de venda em mais de um fach e, dependendo do gosto do freguês, ele vai colocar uma das subclassificações possíveis dentro da sua própria voz. Quando um cantor deixa de pertencer a um fach e vira apenas seu próprio sobrenome, como Callas, Pavarotti, Netrebko, etc, ele chegou a um momento da carreira onde os contratantes já o conhecem e não precisam mais de uma classificação vocal para enquadrá-lo. É muito comum inclusive, nessa fase da carreira, que os cantores cantem papeis que não fazem sentido um com o outro, dentro de fach nenhum (HELENE, 2018, on-line, grifos da autora).

Ao ter ciência sobre esse termo, percebi que saber a classificação vocal e o fach é imprescindível para uma cantora ou um cantor lírico, não só em termos de manter uma boa saúde e longevidade vocal, mas porque a definição de repertório e de personagens depende desta informação.

Existem algumas críticas das cantoras-atrizes e dos cantores-atores em relação a essa divisão por fach, uma vez que limitam o repertório, entretanto, considero que esse sistema não seja visto como algo “inquebrantável”, como outras pessoas do meio defendem e sim, como um guia de personagens onde a voz brilhará mais, podendo ela, de vez em quando, experimentar alguns personagens de fächer (plural de fach) um pouco mais leves e/ou um pouco mais pesados.

11 O Opera Studio do Recife é um curso avançado que visa a qualificação de cantoras(es) líricas(os) profissionais e pianistas (coaches), especialmente no que tange aos aspectos específicos da linguagem da ópera.

12 A frase que ela cita em alemão, com uma tradução no rodapé do seu site/blog, diz: “a nomenclatura elementar das vozes: soprano, alto, tenor e baixo com as vozes intermediárias: mezzo-soprano na voz feminina e barítono na voz masculina, caracteriza apenas o registro vocal. Para a prática nos palcos, os tipos individuais de voz adquirem uma divisão, com as vozes em termos de sua qualidade, seu tamanho e volume, bem como as habilidade vocais e o desempenho cênico sendo subdivididos em Fächer.” (tradução livre) Obs.: fächer é o plural de fach.

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32 Tendo essas definições em vista, é importante discorrer, brevemente, sobre o repertório do canto lírico – ele é composto por canções brasileiras, lieder (canções alemãs), canción (canções espanholas), chanson/melodie (canções francesas), sem falar nas peças sacras, ária de concerto, oratórios, cantatas, etc.

Como podem ver, é um repertório muito vasto e não vou entrar em detalhes sobre cada um deles, pois não é o foco dessa dissertação. Estou apenasincluindo essas informações para explicar que todo cantor de ópera é um cantor lírico, mas nem todo cantor lírico é um cantor de ópera. Ou seja, todo cantor de ópera se utiliza das técnicas do canto lírico para interpretar seus personagens, mas nem todo cantor lírico se identifica com o repertório da ópera, por escolhas pessoais da cantora e do cantor.

A maioria dos gêneros do repertório do canto lírico, citados acima, são considerados Música de Câmara, que é o nome aplicado a todo tipo de música que é especialmente encaixada para performance num cômodo, diferente da música de concerto, ou música dramática, ou música orquestral, ou outros tipos que requerem muitos artistas e grandes espaços para um grande volume de som (MAITLAND, 1907, Vol. I, p. 495, trad. nossa).

Já que a Música de Câmara não necessita de um grande número de músicos ou de uma grande massa sonora, os gestos e movimentos que o cantor lírico apresenta nesse tipo de repertório, geralmente, também são menores do que os gestos e movimentos de uma ópera.

O teatro de câmara, como a música de câmara (expressão na qual o termo é calcado), é uma forma de representação e de dramaturgia que limita os meios de expressão cênicos, o número de atores e de espectadores, a amplitude dos temas abordados (PAVIS, 2008, p. 381).

Devido ao grande número de informações musicais apresentadas acima, em muitos cantos do mundo, as cantoras e os cantores de ópera concentravam seus esforços no estudo vocal, porém, em meados do século XX aos dias de hoje, houve uma maior demanda cênica na ópera e isso foi, inclusive, um fator impulsor de grandes divas, reconhecidas até hoje, como a soprano grega Maria Callas e a soprano australiana Joan Sutherland.

A cantora-atriz e pesquisadora brasileira Rosane Farraco Santolin explica esse fenômeno de valorização da arte teatral em sua dissertação, defendida em 2013:

O século XX foi o século do ator. A partir deste, também pode-se dizer que foi o do diretor. Dentro dessa perspectiva de experiências e pesquisas sobre a natureza criadora do artista <aqui, ela se refere a Constantin Stanislavski>, sentiu-se a necessidade de também aprofundar a interpretação e a vivência dos cantores e suas personagens na ópera. Era de se esperar que, diante das mudanças e novas perspectivas no processo criativo e na postura do ator diante do seu papel, da peça e de toda a encenação, a ópera, por ser uma modalidade

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33 artística encenada, também fosse atingida. A importância dessa fase de mudanças está na experimentação e nas pesquisas voltadas para a construção da personagem e no desenvolvimento profundo do ator em seu corpo-mente, colocando-o como centro do trabalho teatral. E, com isso, mudando definitivamente (nos trabalhos que se seguiram) fundamentos da prática teatral (SANTOLIN, 2013, p. 38-39, grifo nosso).

Assim, a partir da minha experiência, pretendo abordar exercícios que estimulem a prática teatral, no II Ato, por meio da sensibilização corporal das cantoras líricas e dos cantores líricos, para que elas(es) possam adequar e desenvolver esses gestos ao repertório que interpretarem.

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Nº 3. Mitos sobre a Ópera

Por ser um espetáculo oriundo da Europa e, especialmente, quando se trata de países colonizados, a visão que têm do que vem de lá é visto como superior, algumas pessoas do meio da ópera gostam de ser taxativas e se apropriam de alguns conceitos, como se fossem inquestionáveis, mas não existem verdades absolutas.

Hoje compreendo que a minha escolha nasceu de uma desconfiança: desconfiança de verdades absolutas quando se fala de trabalho vocal para a cena, desconfiança de termos dados no vocabulário ao se referir à voz, como naturalidade, inteligibilidade, verdade e eficácia (BISCARO, 2015, p. 10).

É importante tomar cuidado com algumas afirmações que fazem e com essas “verdades inquestionáveis” mencionadas por alguns profissionais da área.

Se, por um lado, algumas pessoas se sentem elitizadas por “conhecerem ópera”, outras pessoas que não conhecem fazem generalizações que, nem sempre, correspondem à realidade dos profissionais da arte.

Eis alguns desses comentários a que me refiro:

1) “é dom”: talvez, esse seja um dos mitos mais comuns que ouvimos de pessoas que admiram trabalhos artísticos em geral, mas não. Não é dom, pois ninguém nasce cantora lírica e/ou cantor lírico, transforma-se e isso é conseguido através de estudo e prática, como, praticamente, tudo na vida.

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2) “a compreensão do texto não é tão importante na ópera”: por ser um teatro cantado, a relação entre texto e música variou muito.

Diz-se muitas vezes que a ópera, sendo essencialmente um teatro cantado, envolve uma batalha entre palavras e música. Óperas inteiras foram escritas sobre essa suposta batalha (ABBATE e PARKER, 2015, p. 16-17).

A autora e o autor, em questão, exemplificaram uma das mais famosas óperas sobre essa batalha, chamada “Prima la musica, dopo le parole” (Primeiro a música, depois as palavras) de Antonio Salieri, rival do famoso Wolfgang A. Mozart, estreada em 1786, no Palácio de Schönbrunn, em Viena, Áustria.

Na superfície, esse sentido de contínua competição pode parecer estranho: as palavras, afinal, proveem a história básica; a música então adiciona a essa história impacto e aura. Embora não seja de admirar que poetas de ópera e compositores às vezes discutam entre si (por uma razão: o relativo prestígio de suas profissões mudou muito no decorrer dos séculos), eles precisam um do outro e sempre precisaram (ABBATE e PARKER, 2015, p. 17).

Portanto, quando afirmarem essa “certeza absoluta” questione e questione-se: de que época estamos falando? Do final do período Barroco, onde as peças eram cheias de coloraturas? Da reforma que Glück fez, dando mais organicidade ao texto? Do belcanto, no início do Romantismo, onde o que reinava era a virtuosidade vocal, em detrimento do texto? Ou do Verismo, ainda no Romantismo, cujo texto estava vinculado ao drama e onde foram retirados todos os ornamentos belcantistas?

3) “a ópera é um espetáculo elitista”: de que contexto estamos falando? De que época? Do período Barroco, em que as óperas eram escritas para festividades da nobreza ou do Classicismo, onde as óperas eram escritas pensadas na acessibilidade, logo, era para todos?

É fato que a ópera é uma expressão artística vinda da Europa e mesmo no século XXI, ainda estamos sob uma perspectiva eurocêntrica, isto é, de que “tudo o que vem desse continente é bom e é chique” e isso confere algum status para pessoas de um país colonizado por esse continente, que são vistas como exóticas, excêntricas e/ou finas/ricas, mas a verdade é que a ópera, desde sua criação, no Barroco, era feita PARA os nobres, mas nem sempre, POR nobres.

De fato, a maioria dos musicistas gozava de pouco prestígio social, em boa parte dos períodos relacionados anteriormente e tem sido assim até os dias de hoje – poucas(os) são aquelas(es) que ganham fama e renome mundial, portanto, existe uma visão bem equivocada à

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35 respeito daquelas(es) que executam a música clássica de forma geral. Elas(es) dificilmente pertencem à elite.

Como estamos falando no contexto de uma cidade como Natal/RN, no Nordeste do Brasil, nos dias atuais (século XXI, 2019), onde pouca gente conhece ópera, a probabilidade de uma/um musicista clássica(o) pertencer às classes dominantes e mais abastadas é bem pequena, pois não há um mercado forte e atuante, nem uma boa remuneração aos profissionais da área.

Se o sentido do termo “elitista” for em relação ao pouco acesso que as pessoas têm a esse tipo de espetáculo, em âmbito mundial, houveram épocas em que as(os) cantoras(es) de ópera eram muito conhecidos e eram visto como estrelas. Para citar um exemplo mais recente, não havia ninguém que não soubesse quem era Maria Callas na década de 50.

Outros exemplos ainda mais recentes são o tenor italiano Luciano Pavarotti, que popularizou a ópera e o repertório erudito, ao cantar com cantoras(es) populares. A soprano espanhola Montserrat Caballé também ficou mundialmente famosa e contribuiu para essa popularização após cantar com o astro Freddy Mercury, da banda de rock Queen.

4) “só tem gorda(o) cantando ópera”: nem sempre foi assim.

Na citação em que fala sobre fach, mais acima, a professora Helene lembra que, em algumas situações, além do tipo vocal, a equipe de produção da ópera também vai averiguar o seu porte físico. No próprio século XX, para citar como exemplo, houveram cantores que se destacaram pela impressionante técnica vocal (Ex: Luciano Pavarotti, Renata Tebaldi, Montserrat Caballé, etc) e alcançaram a fama, mesmo que seus corpos não correspondam à visão imposta, socialmente, de um herói ou uma mulher bela e sensual.

Em contrapartida, houveram outras cantoras de enorme destaque por suas habilidades como atrizes e por terem o physique du rôle correspondente aos personagens que iriam interpretar, como foi o caso da mundialmente famosa Maria Callas. Tal combinação de competências artísticas garantiram seu apelido de La Divina e o status de cantora de ópera mais famosa do século XX.

Todavia, para perder peso e se enquadrar às exigências físicas requisitadas pelas casas de ópera, na época, Callas se submeteu a um regime drástico, no qual ingeria-se ovos de tênia (parasita popularmente conhecido como “solitária”). Mais informações sobre o funcionamento dessa dieta na matéria citada abaixo.

Também no início do século passado, uma dieta inusitada fez enorme sucesso. O regime previa a ingestão de tênias (ou solitárias) para emagrecer. A cantora

Referências

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