• Nenhum resultado encontrado

Sumário. Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 12/17.5JBLSB

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2022

Share "Sumário. Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 12/17.5JBLSB"

Copied!
22
0
0

Texto

(1)

Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 12/17.5JBLSB Relator: RAUL BORGES Sessão: 19 Julho 2019 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: HABEAS CORPUS

Decisão: INDEFERIDA POR MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA A PROVIDÊNCIA DE HABEAS CORPUS

AUDIÊNCIA PRISÃO PREVENTIVA EXCESSO DE PRISÃO

PRINCÍPIO DA ACTUALIDADE ACUSAÇÃO NOTIFICAÇÃO

Sumário

I - A providência de habeas corpus tem a natureza de remédio excepcional para proteger a liberdade individual, revestindo carácter extraordinário e urgente «medida expedita» com a finalidade de rapidamente pôr termo a situações de ilegal privação de liberdade. No caso de prisão ilegal, nas situações extremas de abuso de poder ou erro grosseiro, patente, grave, na aplicação do direito, descritas nas três alíneas do n.º 2 do art. 222.º do CPP.

II - Na dicotomia data da prolação da acusação (ou decisão instrutória ou condenação em 1.ª instância) e data da notificação da acusação (ou da decisão instrutória ou da condenação em 1.ª instância), como elemento aferidor da determinação do momento relevante para se estabelecer o marco que importa ter em atenção na definição do dies ad quem do prazo de duração máxima de prisão preventiva, é de ter como correcta a opção pela data em que é

elaborada a acusação (ou a decisão instrutória ou a condenação em 1ª instância).

III - De acordo com o princípio da actualidade, é necessário que a ilegalidade da prisão seja actual, sendo a actualidade reportada ao momento em que é necessário apreciar o pedido.

IV - O termo final do prazo referido na al. a) do n.º 1 do art. 215.º do CPP é a data da prolação da acusação, solução de que não resulta prejudicado o direito de defesa, sendo certo que a peça foi prolatada dentro do prazo máximo

previsto.

(2)

Texto Integral

O cidadão nacional AA, arguido preso preventivamente à ordem do inquérito n.º 12/17.5JBLSB, do Departamento Central de Investigação e Acção Penal, Secção Única, vem em petição subscrita por Advogada, invocando o disposto nos artigos 215.º e 222.º do Código de Processo Penal e artigo 27.º, n.ºs 1 e 3, da Constituição da República Portuguesa, requerer que lhe seja concedida a providência de Habeas Corpus, nos termos e com os fundamentos seguintes:

«O arguido AA, encontra-se preso preventivamente à ordem destes autos desde o dia 11 de Julho de 2018, por se encontrar indiciado da prática, e co- autoria material e em concurso efectivo de:

- associação criminosa previsto e punido pelo art. 299º nº 1 e 2 do Código Penal;

- homicídio qualificado na forma tentada, previsto e punido pelos arts. 131º e 132º nº 1 e 2 h) e j) do Código Penal;

-roubo, p.p. pelo art. 210 nº 1 e 2, ali. a) e b), com referência ao art. 204º nº 2 f), todos do Código Penal;

-ofensas à integridade física graves, p.p. 144º b), c) e d) do Código Penal;

-ofensas à integridade física qualificadas p.p. pelo art.º 145º nº 1 b) e c) do Código Penal

No caso em apreço, temos que:

Por despacho proferido pelo Mmo. JIC, datado de 18-07-2018, foi o arguido sujeito à medida de coação mais gravosa - a prisão preventiva.

Por despacho de fls. 11352 e seguintes foi declarada a especial complexidade dos autos.

Consta do referido despacho que passamos a citar: “ … declaro, como se promove a especial complexidade dos presentes autos, elevando-se assim para um ano o prazo máximo de duração da prisão preventiva e de OPHVE a que os arguidos se encontram sujeitos nos autos, sem ser deduzida acusação, prazo de um ano que se contará desde a data de detenção dos arguidos.”

(3)

Sucede que, o arguido AA, como supra referido, encontra-se detido à ordem dos presentes autos desde o dia 11/7/2018.

Com efeito,

encontramo-nos no dia 12/7/2019 sem que, tenha sido deduzida acusação pública nos presentes autos.

Pelo que, o prazo de um ano (1) para dedução da acusação, conforme determinado no douto despacho do Mmo JIC, encontra-se esgotado.

Nessa conformidade, o arguido AA (SIC) encontra-se preso ilegalmente.

Conforme preceituado no artº 27º da Constituição da Republica

Portuguesa, o direito à liberdade é um direito fundamental, pudendo a sua privação ocorrer apenas “pelo tempo e nas condições que a lei determinar”, nos casos elencados no nº 3 do mesmo preceito legal.

Constituindo a providência de habeas corpus um instrumento reactivo dirigido ao abuso de poder, em virtude de prisão ou detenção ilegal.

A manutenção ilegal da medida de prisão preventiva in casu constitui fundamento da presente providência de habeas corpus e reveste natureza excepcional e urgente para proteger a liberdade individual.

Pelo que,

Nos termos do previsto nos artºs 215º do CPP e 27º da CRP, a manutenção da prisão preventiva do arguido Francisco Guia (SIC) é ilegal, em virtude de se encontrar ultrapassado o prazo fixado para a mesma (1 ano), pelo que deverá o mesmo ser restituído de imediato à liberdade.

Requerer-se seja de imediato concedida a Providência de Habeas Corpus em razão de prisão ilegal do arguido AA

Prova

Documentos cuja junção se requer:

1. Promoção do MP referente á especial complexidade dos autos 2. Despacho Judicial que responde à promoção que antecede 3. Todas as decisões de prorrogação da prisão preventiva».

(Realces do texto)

(4)

*****

Os autos foram instruídos de acordo com o despacho da Exma. Juíza de Instrução Criminal em serviço de turno na Comarca de Lisboa, com promoção do Ministério Público referente à especial complexidade dos autos (fls. 10240 a 10250 do processo principal) e despacho judicial que respondeu a tal

promoção (fls. 11348 a 11355).

*****

A Exma. Juíza de Instrução Criminal em serviço de turno no Juízo de Instrução Criminal de Lisboa exarou a informação a que alude o artigo 223.º, n.º 1, do CPP, a fls. 6 destes autos, nestes termos:

«Venerando Juiz Presidente do Supremo Tribunal de Justiça Tenho a honra de informar V. Exa do seguinte:

O arguido AA foi preso preventivamente a 11/7/2018, encontrando-se a aguardar os ulteriores termos processuais em prisão preventiva desde 18/7/2018.

Os autos foram declarados de especial complexidade - fls. 11352 a 11355.

A acusação foi deduzida a 10/7/2019.

Por despacho proferido a 12/7/2019 a medida de coação foi reexaminada, nos termos do art°. 213° n°. 1 b) CPP.

Tendo o arguido sido acusado dentro do prazo legal, mantém-se a medida de prisão preventiva aplicada ao arguido - art°. 215° n°s. 1 a) e 3 CPP.

Conforme o requerido, junte, apenas, promoção do MP referente à especial complexidade dos autos e o despacho judicial que responde à promoção que antecede.

Remetam-se os presentes autos ao Venerando Juiz Presidente do Supremo Tribunal de Justiça».

***

Convocada a Secção Criminal e notificado o Ministério Público e o Defensor, teve lugar a audiência.

(5)

***

Cumpre apreciar e decidir.

***

Constam dos autos – certidão junta e teor da informação prestada – os seguintes elementos fácticos que interessam para a decisão da providência requerida:

I – O ora peticionante, arguido no inquérito n.º 12/17.5JBLSB, do

Departamento Central de Investigação e Acção Penal, Secção Única, encontra- se preso à ordem de tal processo desde o dia 11 de Julho de 2018.

II – O peticionante encontrava-se indiciado pela co-autoria material e em concurso efectivo dos seguintes crimes:

- Associação criminosa, p. e p. pelo artigo 299.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal;

- Homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas h) e j), do Código Penal;

- Roubo agravado, p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), todos do Código Penal;

- Ofensas à integridade física graves, p. e p. pelo artigo 144.º, alíneas b), c) e d), do Código Penal;

- Ofensas à integridade física qualificadas, p. e p. pelo artigo 145.º, n.º 1, alíneas b) e c), do Código Penal.

III – Em 4-12-2018, o Ministério Público, tendo em conta o número de

arguidos – 66 – dos quais 63 detidos, os crimes indiciados, dimensão e volume do processo com 26 volumes e 74 apensos, novas diligências a realizar, como exames periciais nas áreas da biologia e da balística, e realização de pedidos de cooperação policial e judicial de carácter internacional e ligações da estrutura dos HAMC Portugal com a restante organização a nível mundial, requereu a declaração de especial complexidade dos autos.

IV – Após cumprimento do disposto no artigo 215.º, n.º 4, do CPP, por

despacho do Juiz de Instrução Criminal de Lisboa-7.ª Secção, de 8-01-2019, foi declarada a especial complexidade dos autos, dizendo a finalizar: «Assim

sendo, pese embora o referido pelos arguidos que se pronunciaram nos autos

(6)

na sequência do cumprimento do disposto no n°4 do artº 215° do CPP, tendo em conta o exposto e pelas razões referidas na douta promoção que faz fls.

10243 a 10249 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida, para todos os efeitos legais e ao abrigo do disposto no artº 215° n° l al. a), n° 2, n°3 e n° 4 e 218° n°3 todos do CPP, declaro, como se promove a especial

complexidade dos presentes autos, elevando-se assim para um ano o prazo máximo de duração da prisão preventiva e de OPHVE a que os arguidos se encontram sujeitos nos autos, sem ser deduzida acusação, prazo de um ano que se contará desde a data de detenção dos arguidos. (Sublinhado do texto).

V – O Ministério Público, no dia 10 de Julho de 2019, deduziu acusação.

VI – Por despacho de 12 de Julho de 2019 foi reexaminada a medida de coacção, nos termos do artigo 213.º, n.º 1, alínea b), do CPP.

Apreciando.

A providência de habeas corpus constitui uma garantia do direito à liberdade com assento na Lei Fundamental que nos rege.

Incluída no Capítulo I «Direitos, liberdades e garantias pessoais», do Título II

“Direitos, liberdades e garantias”, da Parte I “Direitos e deveres

fundamentais”, a providência de habeas corpus está prevista no artigo 31.º da Constituição da República Portuguesa, que estabelece:

1 – Haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.

2 – A providência de habeas corpus pode ser requerida pelo próprio ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos.

3 – O juiz decidirá no prazo de oito dias o pedido de habeas corpus em audiência contraditória.

O texto do n.º 1 foi alterado/revisto pela Lei Constitucional n.º 1/97, que introduziu a Quarta revisão constitucional (Diário da República I-A Série, n.º 218/97, de 20 de Setembro de 1997) e que pelo artigo 14.º alterou a redacção do n.º 1 do artigo 31.º da Constituição, de modo a que nesse preceito a

expressão “a interpor perante o tribunal judicial ou militar consoante os casos” fosse substituída pela expressão “a requerer perante o tribunal competente”, assim afastando a referência a tribunais militares.

(7)

Mas como assinala Faria Costa em Habeas Corpus: ou a análise de um longo e ininterrupto “diálogo” entre o poder e a liberdade, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, volume 75, Coimbra, 1999, pág. 549, a revisão

constitucional de 1997 não veio, nem de longe nem de perto, restringir o âmbito de aplicação da norma. Por isso, o habeas corpus vale também e em toda a linha perante a jurisdição militar.

Como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, Coimbra Editora, 4.ª edição revista, 2007, a págs. 509, o n.º 2 do artigo 31.º reconhece uma espécie de acção popular de habeas corpus (cfr. art. 52.º -1), pois, além do interessado, qualquer cidadão no gozo de seus direitos políticos tem o direito de recorrer a providência em favor do detido ou preso. Além de corporizar o objectivo de dar sentido útil ao habeas corpus, quando o detido não possa pessoalmente desencadeá-lo, essa acção popular sublinha o valor constitucional objectivo do direito à

liberdade.

A providência em causa é uma garantia fundamental privilegiada (no sentido de que se trata de um direito subjectivo «direito-garantia» reconhecido para a tutela do direito à liberdade pessoal, neste sentido, cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, pág. 296) e citando este e J. J. Gomes

Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, Coimbra Editora, 4.ª edição revista, 2007, a figura do habeas corpus é historicamente uma instituição de origem britânica, remontando ao direito anglo - saxónico, mais propriamente ao Habeas Corpus Amendment Act,

promulgado em 1679, passando o instituto do direito inglês para a Declaração de Direitos do Congresso de Filadélfia, de 1774, consagrado pouco depois na Declaração de Direitos proclamada pela Assembleia Legislativa Francesa em 1789, sendo acolhido pela generalidade das Constituições posteriores e introduzido entre nós pela Constituição de 1911 (artigo 3.º- 31), tendo como fonte a Constituição Republicana Brasileira de 1891, muito influenciada pelo direito constitucional americano.

A Constituição de 1933 (artigo 8.º, § 4.º) consagrou igualmente o instituto, que só veio a ser regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 35.043, de 20 de

Outubro de 1945, cujas disposições vieram a ser integradas no Código de Processo Penal de 1929 pelo Decreto-Lei n.º 185/72, de 31 de Maio, sendo que no pós 25 de Abril de 1974 teve a regulamentação constante do Decreto-Lei n.º 744/74, de 27 de Dezembro de 1974 e do Decreto-Lei n.º 320/76, de 4 de Maio de 1976.

(8)

A Lei n.º 43/86, de 26 de Setembro - lei de autorização legislativa em matéria de processo penal, a cujo abrigo foi elaborado o Código de Processo Penal vigente - estabeleceu a garantia no artigo 2.º, n.º 2, alínea 39 – “ (…) garantia do habeas corpus, a requerer ao Supremo Tribunal de Justiça em petição apresentada perante a autoridade à ordem da qual o interessado se mantenha preso, enviando-se a petição, de imediato, com a informação que no caso

couber, ao Supremo Tribunal de Justiça, que deliberará no prazo de oito dias”.

Sendo o único caso de garantia específica e extraordinária

constitucionalmente prevista para a defesa de direitos fundamentais, o habeas corpus testemunha a especial importância constitucional do direito à

liberdade.

Sendo o direito à liberdade um direito fundamental – artigo 27.º, n.º 1, da CRP – e podendo ocorrer a privação da mesma, «pelo tempo e nas condições que a lei determinar», apenas nos casos elencados no n.º 3 do mesmo

preceito, a providência em causa constitui um instrumento reactivo dirigido ao abuso de poder por virtude de prisão ou detenção ilegal.

Ou, para utilizar a expressão de Faria Costa, apud acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Outubro de 2001, in CJSTJ 2001, tomo 3, pág.

202, atenta a sua natureza, trata-se de um «instituto frenador do exercício ilegítimo do poder».

A providência de habeas corpus tem a natureza de remédio excepcional para proteger a liberdade individual, revestindo carácter extraordinário e urgente

«medida expedita» com a finalidade de rapidamente pôr termo a situações de ilegal privação de liberdade, decorrentes de ilegalidade de detenção ou de prisão, taxativamente enunciadas na lei: em caso de detenção ilegal, nos casos previstos nas quatro alíneas do n.º 1 do artigo 220.º do CPP e quanto ao

habeas corpus em virtude de prisão ilegal, nas situações extremas de abuso de poder ou erro grosseiro, patente, grave, na aplicação do direito, descritas nas três alíneas do n.º 2 do artigo 222.º do CPP.

Sendo a prisão efectiva e actual o pressuposto de facto da providência e a ilegalidade da prisão o seu fundamento jurídico, esta providência

extraordinária com a natureza de acção autónoma com fim cautelar (assim, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II volume, pág. 297) há- de fundar-se, como decorre do artigo 222.º, n.º 2, do CPP, em ilegalidade da prisão proveniente de (únicas hipóteses de causas de ilegalidade da prisão):

(9)

a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;

b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou

c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.

****

Analisando.

No essencial, no caso concreto, o que está em discussão é a questão de saber se a privação da liberdade do arguido impetrante é ilegal.

O peticionante fundamenta a providência em prisão ilegal, convocando,

embora não o concretize, o fundamento previsto na alínea c) do n.º 2 do artigo 222.º do CPP.

A providência do habeas corpus tem lugar quando alguém se encontra

ilegalmente preso, tratando-se de meio expedito, célere, destinado a pôr cobro a situações de prisão ilegal.

Como se extrai do acórdão de 27-10-2010, proferido no processo n.º

108/06.9SHLSB-AH.S1-3.ª Secção, o processo de habeas corpus assume-se como de natureza residual, excepcional, e de via reduzida: o seu âmbito restringe-se à apreciação da ilegalidade da prisão, por constatação e só dos fundamentos taxativamente enunciados no artigo 222.º, n.º 2, do CPP.

Reserva-se-lhe a teleologia de reacção contra a prisão ilegal, ordenada ou mantida de forma grosseira, abusiva, por chocante erro de declaração enunciativa dos seus pressupostos.

Revertendo ao caso concreto.

Em causa verificação de excesso de prazo por não ter sido deduzida acusação até 12 de Julho de 2019, encontrando-se esgotado o prazo de um ano para a dedução de acusação.

Vejamos se há excesso de prazo, fundamento previsto na alínea c) do n.º 2 do artigo 222.º do CPP.

Como resulta do supra exposto, o requerente encontra-se preso preventivamente por contra ele haver indícios de ter cometido, na forma consumada, crimes de associação criminosa, homicídio qualificado, na forma

(10)

tentada, roubo agravado, ofensas à integridade física graves e ofensas à integridade física qualificadas, sendo o crime de associação criminosa

catalogado como “criminalidade altamente organizada”, na definição do artigo 1.º, alínea m), do CPP, na redacção da Lei n.º 26/2010, de 30 de Agosto,

entrada em vigor em 29-10-2010.

Sendo assim, há que considerar o prazo a observar no caso concreto,

atendendo à real situação processual do requerente no presente momento.

Estabelece o artigo 215.º do Código de Processo Penal Prazos de duração máxima da prisão preventiva:

1 – A prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início, tiverem decorrido:

a) Quatro meses sem que tenha sido deduzida acusação;

b) Oito meses sem que, havendo lugar a instrução, tenha sido proferida decisão instrutória;

c) Um ano e dois meses sem que tenha havido condenação em 1.ª instância;

d) Um ano e seis meses sem que tenha havido condenação com trânsito em julgado.

Nos termos do n.º 2 do mesmo preceito “Os prazos referidos no número anterior são elevados, respectivamente, para seis meses, dez meses, um ano e seis meses e dois anos, em casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, ou quando se proceder por crime punível com pena de prisão de máximo superior a 8 anos, ou por crime: a) Previsto no artigo 299.º (…)”.

3 – Os prazos referidos no n.º 1 são elevados, respectivamente, para um ano, um ano e quatro meses, dois anos e seis meses e três anos e quatro meses, quando o procedimento for por um dos crimes referidos no número anterior e se revelar de excecional complexidade, devido, nomeadamente, ao número de arguidos ou de ofendidos ou ao carácter altamente organizado do crime.

O requerente coloca a questão de excesso de prisão preventiva, por não ter sido proferido despacho de acusação no prazo de um ano.

No presente caso, a acusação foi deduzida dentro do prazo de um ano, verificando-se o termo final no dia 18 de Julho de 2019, já que o prazo de

(11)

prisão preventiva reporta-se a esta medida de coacção e não à detenção que a antecede.

Mas mesmo considerando como termo inicial a data de detenção, como de resto, sublinhou o despacho que declarou a especial complexidade, o prazo exauriu-se no dia 11 de Julho de 2019, tendo o Ministério Público deduzido acusação dentro do prazo, já que o fez em 10 de Julho de 2019.

Como afirmámos nos acórdãos de 24 de Outubro de 2007, processo n.º 3977/07; de 13 de Fevereiro de 2008, proferido no processo n.º 522/08, infra referido; de 10 de Dezembro de 2008, processo n.º 3971/08, CJSTJ 2008, tomo 3, pág. 254; de 9 de Fevereiro de 2011, processo n.º 25/10.8MAVRS-B.S1; de 21 de Março de 2012, processo n.º 32/11.3PAMGR-A.S1; de 18 de Junho de 2014, processo n.º 307/13.7TAELV-E.S1; de 2 de Dezembro de 2015, processo n.º 232/15.7JDLSB-A.S1, de 15 de Março de 2017, no processo n.º

77/16.7PEPDL.S1 e de 8 de Maio de 2018, no processo n.º 3125/17.0T9SNT- C.S1:

“O que tem sido discutido a este nível é saber se é de ter em conta a data em que a acusação é deduzida, ou antes, a data em que chega ao

conhecimento do seu destinatário, tendo a questão sido abordada várias vezes exactamente a propósito da acusação e sua notificação, entendendo-se que o termo final do prazo em curso em cada fase reporta-se sempre à prolação do despacho e não à notificação da peça processual, nesse aspecto havendo concordância total e uniforme na jurisprudência.

Na dicotomia data da prolação da acusação (ou decisão instrutória ou

condenação em 1.ª instância) /data da notificação da acusação (ou da decisão instrutória ou da condenação em 1.ª instância), como elemento aferidor da determinação do momento relevante para se estabelecer o marco que importa ter em atenção na definição do dies ad quem do prazo de duração máxima de prisão preventiva, é de ter como correcta a opção pela data em que é

elaborada a acusação (ou a decisão instrutória ou a condenação em 1.ª instância).

Desde logo pode avançar-se com um argumento literal, a extrair da alínea a) do n.º 1 do artigo 215.º do CPP, quando refere o decurso do prazo sem que tenha sido deduzida acusação e de modo similar nas restantes alíneas, como na b), ao referir o decurso do prazo sem que tenha sido proferida decisão instrutória e nas alíneas c) e d), ao colocar o ponto final do prazo sem que tenha havido condenação, em 1.ª instância, ou com trânsito em julgado.

(12)

Em todos estes casos é patente a referência à data da prática do acto processual ou elaboração da decisão final (acusação, decisão instrutória e condenação) proferida no processo de acordo com cada etapa ou fase

processual e não ao momento em que chega ao conhecimento do destinatário o teor da mesma.

De contrário, em caso de pluralidade de arguidos, teríamos datas

diferentes consoante os diversos momentos em que a decisão fosse chegando ao destino.

Por outro lado, furtando-se o destinatário ao recebimento da notícia, descoberto estaria o caminho para se prolongar o prazo caso se mostrasse pontualmente necessária ou conveniente tal estratégia.

No caso em apreciação cumpriu-se a garantia de que a acusação é proferida dentro do prazo de seis meses”.

Este Supremo Tribunal de Justiça já tomou posição sobre a questão,

defendendo-se no acórdão de 11 de Outubro de 2005, proferido no processo n.º 3255/05-3.ª Secção, CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 186, que para o efeito

previsto no artigo 215.º do CPP, releva a data da acusação e não a notificação ao arguido dessa peça processual, podendo ver-se ainda os acórdãos de 14 e 22 de Março de 2001, in Sumários do Gabinete de Assessores, n.º 49, págs. 62 e 81; de 15 de Maio de 2002, processo n.º 1797/02-3.ª e de 11 de Junho de 2002, ibid., n.º 61, pág. 84 e n.º 62, pág. 81; de 10 de Março de 2005,

processo n.º 912/05-5.ª Secção; de 19 de Julho de 2005, processo n.º 2743/05;

de 12 de Dezembro de 2007, processo n.º 4646/07-3.ª Secção; de 25 de Junho de 2008, processo n.º 2197/08-5.ª Secção; de 06 de Janeiro de 2010, processo n.º 28/09.5MAPTM-B.S1-3.ª Secção; de 18 de Fevereiro de 2010, processo n.º 1546/09.0PCSNT-A.S1-5.ª Secção; de 15 de Abril de 2010, processo n.º

97/09.8POER-B.S1-5.ª Secção; de 2 de Junho de 2010, processo n.º

649/09.1JDLSB-D.S1-3.ª Secção; de 30 de Dezembro de 2010, processo n.º 4/09.8ZLSB-A.S1-3.ª Secção; de 31 de Março de 2011, processo n.º

377/10.0JAFAR-A.S1-3.ª Secção, em que interviemos como adjunto; de 21 de Março de 2012, processo n.º 32/11.3PAMGR-A.S1-3.ª Secção; de 21 de Junho de 2012, processo n.º 62/12.8YFLSB.S1-5.ª Secção, in CJSTJ 2012, tomo 2, pág. 216; de 21 de Novembro de 2012, processo n.º 22/12.8GBETZ-D.S1-3.ª Secção; de 4 de Julho de 2013, processo n.º 4377/11.4FFLSB-B.BS1-3.ª

Secção; de 9 de Agosto de 2013, processo n.º 374/12.0JELSB-A.S1-3.ª Secção, in CJSTJ 2013, tomo 3, pág. 176 (seguindo de perto o acórdão de 10 de

Dezembro de 2008, processo n.º 3971/08-3.ª, afirma-se: “Para efeitos do art.

(13)

215.º, n.º 1, a) e n.º 2 do CPP não é a notificação e tradução da acusação que delimita o prazo máximo de prisão preventiva, mas sim, a dedução, ou não, do requerimento acusatório); de 27 de Dezembro de 2013, processo n.º

131/13.7YFLSBS1-5.ª Secção; de 27 de Dezembro de 2013, processo n.º 132/13.5YFLSBS1-5.ª Secção; de 2-10-2014, processo n.º

107/13.4P6PRT.S1-5.ª Secção; de 12-11-2014, processo n.º 150/10.5JBLSB- BU.S1-3.ª Secção, em que interviemos como adjunto, de 12 de Março de 2015, processo n.º 29/14.1ZRLSB-A.S1-3.ª Secção; de 4 de Fevereiro de 2016,

processo n.º 502/15.4JDLSB-A.S1-5.ª Secção; de 9 de Março de 2016,

processo n.º 2481/15.9JAPRT-A.S1, em que interviemos como adjunto; de 25 de Maio de 2016, processo n.º 27/13.2ZRCBR-A.S1; de 17 de Novembro de 2016, processo n.º 14/16.9ZCLSB-A.S1-5.ª Secção; de 23 de Março de 2017, processo n.º 48/15.0GBTVR-D.S1-5.ª Secção; de 23 de Março de 2017,

processo n.º 48/15.0GBTVR-D.S2-5.ª Secção; de 12 de Abril de 2017, processo n.º 1051/16.9T9VRL-A.S1-5.ª Secção; de 18 de Maio de 2017, processo n.º 84/13.1GTALQ-D.S1-5.ª Secção; de 20 de Julho de 2017, processo n.º 33/16.5GGSNT-I.S1-5.ª Secção; de 24 de Agosto de 2017, processo n.º 650/16.3GAMTA-B.S1-5.ª Secção; de 20 de Setembro de 2017, processo n.º 33/17.8ZFLSB-B.S1 e n.º 72/15.3GAAVZ-B.S1-5.ª Secção; de 8 de Novembro de 2017, processo n.º 14/17.1ZRCBR-C.S1-3.ª Secção; de 20 de Dezembro de 2017, processo n.º 18/16.1PESTB-C.S1-3.ª Secção; de 3 de Janeiro de 2018, processo n.º 11/16.4GBSTR-A.S1-5.ª Secção; de 10-01-2019, processo n.º 6/16.8GASTB-B.S1 e da mesma Relatora, de 22-01-2019, processo n.º 272/15.6T9CTX-B.S1, da 5.ª Secção.

No acórdão de 23-04-2015, proferido no processo n.º 686/11.0GAPRD-E.S1, da 5.ª Secção, pode ler-se: “Não existe um certo prazo de prisão preventiva próprio de cada fase do processo, há sim um limite máximo de prisão

preventiva até que se atinja um dado momento processual. Ora esse momento é escolhido, segundo o legislador, por ter lugar a prática de um ato (acusação, decisão instrutória, condenação em 1.ª instância), ou uma certa ocorrência (trânsito em julgado). Não pela notificação (ela mesma ato processual) de quaisquer daqueles atos”.

O mesmo se passa com a decisão instrutória, como decidiu o acórdão de 28 de Junho de 1989, processo n.º 18/89-3.ª Secção: “Os prazos de prisão preventiva referidos no art. 215.º, n.º 1, al. b), do CPP contam-se até ao momento em que é proferida a decisão instrutória, e não até ao momento em que ela é notificada”.

(14)

No mesmo sentido, face a decisão instrutória, o acórdão de 10 de Agosto de 2012, por nós relatado no processo n.º 223/10.4SMPRT-E.S1 e de 19 de Novembro de 2016, processo n.º 2324/14.0JAPRT-Z.S1.

No mesmo sentido se pronuncia Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 4.ª edição

actualizada, 2011, págs. 616/7.

Igualmente neste sentido se tem pronunciado o Tribunal Constitucional.

Como se colhe dos acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 404/2005, de 22 de Julho e n.º 208/2006, de 22 de Março, publicados, respectivamente, no Diário da República, II Série, de 31 de Março de 2006 e de 4 de Maio de 2006, em que se questionava a norma da alínea c) do n.º 1 do artigo 215.º do CPP:

“2.4. Recordada a jurisprudência relevante do Tribunal Constitucional sobre a matéria, importa salientar que o legislador processual penal de 1987

adoptou modelo diverso do até então vigente quanto à fixação dos limites máximos de prisão preventiva.

Na vigência do Código de Processo Penal de 1929 e suas diversas

modificações, adoptou-se o sistema de fixação de prazos máximos de prisão preventiva directamente correspondentes a cada fase processual. Esses

prazos eram, na redacção do artigo 308.º dada pelo Decreto-Lei n.º 377/77, de 6 de Setembro, e do artigo 273.º, na redacção do Decreto-Lei n.º 402/82, de 23 de Setembro: 1.° - desde a captura até à notificação ao arguido da

acusação ou do pedido de instrução contraditória pelo Ministério Público: 40 dias por crimes a que caiba pena de prisão maior; 90 dias por crimes cuja investigação caiba exclusivamente à Polícia Judiciária ou que legalmente lhe seja deferida; 2.° - desde a notificação ao arguido da acusação ou do pedido de instrução contraditória pelo Ministério Público até ao despacho de pronúncia em l.ª instância: 4 meses, se ao crime couber pena a que corresponda

processo de querela; 3.° — após a formação da culpa: 3 anos (ou, se

terminarem antes, quando se igualar metade da duração máxima da pena correspondente ao crime mais grave imputado ao arguido, ou, no caso de recurso da decisão condenatória, quando se atingir a duração da pena de prisão fixada na decisão recorrida). Neste regime, não havia “transferências”

de tempos de prisão preventiva: se esta fosse determinada apenas após a notificação da acusação, aplicava-se o prazo indicado em 2.° lugar, sendo indiferente que na fase precedente o arguido tivesse estado em liberdade.

(15)

O regime instituído pelo Código de Processo Penal de 1987 é diverso, pois não há contagens separadas de prazos para cada fase. O prazo conta-se sempre do início da prisão preventiva, mas não pode exceder certos limites (acumulados) reportados a quatro marcos processuais: 1.° - dedução da

acusação; 2.° - prolação de decisão instrutória quando tenha havido instrução;

3.° - condenação em 1.ª instância; 4.° - trânsito em julgado da condenação.

A estes quatro marcos aplicam-se três regimes: o normal (6, 10 e 18

meses e 2 anos), o especial atendendo à gravidade dos crimes (8 meses, 1 ano, 2 anos e 30 meses) e o excepcional quando a essa gravidade dos crimes

acresce a excepcional complexidade do procedimento (12 e 16 meses e 3 e 4 anos) — n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 215.º do CPP. Como refere GERMANO

MARQUES DA SILVA (Curso de Processo Penal, vol. II, 2.ª edição, Lisboa, 1999, p. 289):

“Não há um prazo de prisão preventiva para cada fase processual, há é um limite máximo de duração da prisão preventiva até que se atinja determinado momento processual. Por isso, se o início da prisão preventiva só se verificar já na fase de instrução ou na de julgamento, os limites máximos até à decisão instrutória, condenação em l.ª instância ou decisão transitada continuam a ser os mesmos. Por idêntica razão, se numa determinada fase se tiver esgotado o limite do prazo de duração da prisão, o arguido pode voltar a ser preso se se passar a outra fase e se se mantiverem as razões para determinar a sua prisão, desde que se não tenha ainda atingido o máximo da correspondente fase.”

Na base desta alteração de sistema terá estado o propósito de promover o andamento sem delongas do processo, incentivando os respectivos

responsáveis a respeitar os prazos de conclusão de cada fase, sob risco de insubsistência de uma prisão preventiva tida por essencial para a prossecução dos objectivos da justiça criminal.”

Já na vigência da nova redacção dada ao artigo 215.º do CPP pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, decidiu o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 2/2008 (publicado no Diário da República, II Série, de 14 de Fevereiro de 2008):

“Segundo o regime do citado artigo 215° do Código de Processo Penal, o prazo de duração da prisão preventiva conta-se sempre do seu início e não pode exceder certos limites (acumulados) que se reportam a quatro marcos processuais: 1.° - dedução da acusação; 2.°- prolação de decisão instrutória

(16)

quando tenha havido instrução; 3.° - condenação em l.ª instância; 4.° —

trânsito em julgado da condenação. Aos prazos fixados para cada uma dessas fases processuais aplicam-se, consoante os casos, três diferentes regimes: o normal (4 meses, 8 meses, 1 ano e 2 meses e 1 ano e 6 meses); o especial, em que se atende à gravidade dos crimes (6 meses, 10 meses, 1 ano e 6 meses e 2 anos); e o excepcional, quando a essa gravidade dos crimes acresce a

excepcional complexidade do procedimento (1 ano, 1 ano e 4 meses, 2 anos e 6 meses e 3 anos e 4 meses) — n.°s 1, 2 e 3 do artigo 215.° do CPP.

A ideia central do sistema é a de fazer coincidir, ao menos

tendencialmente, a duração máxima (acumulada) de prisão preventiva com o termo das sucessivas fases processuais.

Os prazos de 4 meses, 8 meses e 1 ano de limite máximo de prisão

preventiva até dedução de acusação correspondem são indicativos da duração do inquérito em cada um dos circunstancialismos definidos no artigo 215°, n.°

1, alínea a), e n.°s 2 e 3 (cfr. artigo 276.°, n.°1, primeira parte, e n.°2, alíneas a) e c)). O acréscimo de 4 meses ao limite máximo de prisão preventiva, em todas as situações, até prolação da decisão instrutória, toma em atenção os prazos máximos de 2 e 3 meses para conclusão da instrução, que só se inicia com o requerimento para abertura de instrução, a apresentar no prazo de 20 dias a contar da notificação da acusação e a que acresce o prazo de 10 dias para prolação do despacho de pronúncia (cfr. artigos 306.º, n.°s 1, 2 e 3, 287.

°, n.°1, e 307.°, n.° 3, todos do CPP). É dentro desta lógica que se fixou o prolongamento da duração máxima da prisão preventiva por mais 6 meses, 10 meses e 22 meses, tempo estimado como eventualmente necessário para conclusão do julgamento em l.ª instância, e por mais 4 meses, 6 meses e 10 meses, tempo estimado para conclusão das fases de recursos até se atingir o trânsito em julgado.

Como se verifica, os prazos de duração máxima de prisão preventiva são pré- determinados segundo a fase processual, a gravidade do tipo legal de crime e a complexidade do procedimento.”

Decidindo sobre a invocada inconstitucionalidade da norma do artigo 215.º, n.º 1, alínea a), do CPP, estando em causa questão similar à presente, no âmbito do recurso do supra referido acórdão de 13 de Fevereiro de 2008,

proferido no processo n.º 522/2008, de que fomos relator, pronunciou-se o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 280/2008, de 14 de Maio de 2008, proferido no processo n.º 295/08 - 1.ª Secção, publicado no Diário da República, II Série, n.º 141, de 23-07-2008.

(17)

Estava em causa a inconstitucionalidade do artigo 215.º, n.º 1, alínea a), do C.P.P., interpretado no sentido de que para os efeitos nele previstos os prazos se contam da prolação da acusação e não da sua notificação, por violação do disposto nos artigos 28.º, n.º 4, 31.º e 32.º, n.º 1, todos da C.R.P.

Como pode ler-se em tal acórdão, «(…), como resulta do citado artigo 28.

°, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, “a prisão preventiva está sujeita aos prazos estabelecidos na lei”, significando que não pode, face à sua natureza de “ultima ratio”, de deixar de estar temporariamente limitada.

Cabendo à lei a fixação de prazos de prisão preventiva, dispõe,

consequentemente, o legislador ordinário de uma relativa margem de

liberdade de conformação, sem embargo de dever ser respeitado o princípio da proporcionalidade, conforme salientam Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, 4.ª edição revista, I volume, Coimbra, página 490 e, no mesmo sentido Jorge Miranda e Rui Medeiros, in Constituição Portuguesa Anotada, I, Coimbra, 2005, página 321, e Acórdãos deste Tribunal n.°s 137/92 e 246/99 (o primeiro disponível em

www.tribunalconstitucional.pt e o segundo publicado no Diário da República, II Série, de 28 de Julho de 1999)».

E depois de afirmar não se detectar razão de ser para emitir um juízo de inconstitucionalidade, adianta: «Com efeito, estamos perante a fixação do termo de um prazo fixado na lei, de acordo com uma interpretação desta que

“não se mostra incongruente com a aventada justificação do sistema instituído de duração de prisão preventiva, não desrazoável, tendo em atenção os

factores relevantes de estar em causa crime de especial gravidade (...).”

(Acórdão n.° 208/2006, já citado).

Na verdade, o legislador não está impedido de tomar em conta como termo final do prazo da primeira fase da prisão preventiva a data de acusação, uma vez que este momento se revela congruente com propósito de promover sem delongas o normal decurso do processo.

Não é assim desrazoável a opção do legislador».

Revertendo ao caso presente.

Tendo ficado sujeito a prisão preventiva em 18-07-2018, após detenção em 11-07-2018, considera o peticionante que o prazo de um ano para a dedução de acusação expirou em 11-07-2019, não tendo sido deduzida acusação.

(18)

Na apreciação da questão o que interessa é averiguar se a situação em que o requerente se encontra se enquadra na citada alínea c) do n.º 2 do artigo 222.º do CPP, havendo que indagar se se mostra excedido o prazo de duração da prisão preventiva, se há excesso de tempo de prisão.

Nesta análise há que ter em consideração a fase em que se encontra o processo no momento em que o pedido é formulado e apreciado.

O requerente entende que a acusação deveria ter tido lugar dentro do indicado prazo de um ano, como resulta da declaração de especial

complexidade e do disposto no artigo 215.º do CPP, n.ºs 1, alínea a), 2 e 3, do CPP, por ser caso de criminalidade altamente organizada ou quando se

proceder por crime punível com pena de prisão de máximo superior a 8 anos.

Como decorre do disposto no artigo 202.º, n.º 1, alínea a), do CPP, pode ser imposta a prisão preventiva quando houver fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a 5 anos.

Por outro lado, de acordo com a alínea c) do mesmo preceito, na redacção introduzida pela Lei n.º 26/2010, de 30 de Agosto, que operou a décima nona alteração ao Código de Processo Penal, entrada em vigor em 29-10-2010, o juiz pode impor a prisão preventiva quando “c) Houver fortes indícios de prática de crime doloso de terrorismo ou que corresponda a criminalidade altamente organizada punível com pena de prisão de máximo superior a 3 anos”.

E de acordo com o artigo 1.º, alínea m), do CPP, na redacção introduzida pela mesma Lei n.º 26/2010, considera-se “Criminalidade altamente

organizada” as condutas que integrarem crimes de associação criminosa, tráfico de pessoas, tráfico de armas, tráfico de estupefacientes ou de substâncias psicotrópicas, corrupção, tráfico de influência, participação económica em negócio ou branqueamento.

No caso foi deduzida acusação em 10 de Julho de 2019, entrando-se numa nova fase, passando o prazo de duração máxima de prisão preventiva para um ano e quatro meses.

Por fim, dir-se-á que há que ter em conta que apenas releva a prisão efectiva e actual e a ilegalidade da prisão deve ser aferida em função da situação presente.

(19)

De acordo com o princípio da actualidade, é necessário que a ilegalidade da prisão seja actual, sendo a actualidade reportada ao momento em que é necessário apreciar o pedido – neste sentido, cfr., i.a., os acórdãos deste

Supremo Tribunal de 6 de Janeiro de 1994, in BMJ n.º 433, pág. 419; de 21 de Janeiro de 2000, in BMJ n.º 493, pág. 269; de 24 de Outubro de 2001,

processo n.º 3543/01-3.ª Secção; de 30 de Janeiro de 2003, processo n.º 378/03-5.ª Secção; de 26 de Junho de 2003, in CJSTJ 2003, tomo 2, pág. 224;

de 19 de Outubro de 2006, processo n.º 3950/06-5.ª; de 20 de Dezembro de 2006, processo n.º 4731/06-3.ª; de 1 de Fevereiro de 2007, processo n.º

350/07-5.ª; de 15 de Fevereiro de 2007, processo n.º 526/07-5.ª; de 19 de Abril de 2007, processo n.º 1440/07-5.ª; de 13 de Fevereiro de 2008, processos n.ºs 435/08 e 522/08; de 2 de Abril de 2008, processo n.º 1154/08; de 22 de

Outubro de 2008, processo n.º 3447/08; de 10 de Dezembro de 2008, processo n.º 3971/08; de 19 de Dezembro de 2008, processo n.º 4140/08; de 5-05-2009, processo n.º 665/08.5JAPRT-A.S1; de 9 de Fevereiro de 2011, processo n.º 25/10.8MAVRS-B.S1; de 10 de Agosto de 2012, n.º 223/10.4SMPRT-E.S1; de 21 de Novembro de 2012, processo n.º 22/12.8GBETZ-D.S1; de 9 de Agosto de 2013, processo n.º 374/12.0JELSB-A.S1; de 18 de Junho de 2014, processo n.º 307/13.7TAELV-E.S1-3.ª; de 17 de Dezembro de 2014, processo n.º

1/12.6GBALQ-A.S1; de 21 de Janeiro de 2015, processo n.º 9/15.0YFLSB.S1;

de 11 de Fevereiro de 2015, processo n.º 18/15.9YFLSB.S1-3.ª; de 12 de

Março de 2015, processo n.º 29/14.1ZRLSB-A.S1 e n.º 4914/12.7TDLSB.-A.S1, de 15 de Abril de 2015, processo n.º 118/10.1JBLSB-C.S1; de 22 de Abril de 2015, processo n.º 49/15.9YFLSB.S1; de 9 de Julho de 2015, processo n.º 529/03.9TAAVR-C.S1; de 2 de Dezembro de 2015, processo n.º

232/15.7JDLSB-A.S1; de 9 de Março de 2016, processo n.º 2481/15.9JAPRT- A.S1, em que interviemos como adjunto; de 17 de Março de 2016, processo n.º 289/16.3JABRG-A.S1-3.ª; de 19 de Outubro de 2016, processo n.º

2324/14.0JAPRT-Z.S1, de 15 de Março de 2017, processo n.º

77/16.7PEPDL.S1; de 30-05-2018, processo n.º 500/15.8JACBR.C1-A.S1; de 6-02-2019, processo n.º 721/09.2JABRG-C.S1; de 27-03-2019, processo n.º 1769/15.3JAPRT-A.S2, todos da 3.ª Secção, e de 29-04-2015, processo n.º 818/13.4TXPRT-F.S1; de 14-07-2015, processo n.º 39/14.9SPRT-C.S1; de 11-02-2016, processo n.º 741/12.0TXPRT-F.S1; de 28-03-2019, processo n.º 257/18.0GCMTJ-BA.S1, todos da 5.ª Secção; de 31-07-2015, processo n.º 98/15.7TRPRT.P1-A.S1.5.ª, este reportando a actualidade ao momento em que é feito o pedido.

Como refere o acórdão de 22-07-2015, proferido no processo n.º 213/12.2TELSB-.S1-3.ª Secção, não cabe no âmbito do pedido de habeas

(20)

corpus a verificação da legalidade da prisão reportada a momentos anteriores, designadamente o cumprimento dos prazos de duração máxima da prisão preventiva em fases processuais já ultrapassadas.

Neste momento, encontrando-se proferida a acusação em 10 de Julho de 2019 encontra-se precludida a fase prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 215.º do CPP, não havendo qualquer excesso.

Em conclusão: o termo final do prazo referido na alínea a) do n.º 1 do artigo 215.º do CPP é a data da prolação da acusação, solução de que não resulta prejudicado o direito de defesa, sendo certo que a peça foi prolatada dentro do prazo máximo previsto.

Como vimos, terminando o prazo de um ano em 18 de Julho de 2019 (ou mesmo em 11 de Julho de 2019), a providência deu entrada no dia 12,

entendendo o peticionante que se encontrava ultrapassado o prazo fixado para a dedução da acusação.

A prisão do requerente foi ordenada por autoridade competente, em situação em que é admissível por o crime de associação criminosa cair na definição de criminalidade altamente organizada - artigos 1.º, alínea m) e 202.º, n.º 1, alínea c), do CPP - e não há excesso de prazo, pois que se

encontra preso preventivamente desde 18 de Julho de 2018, estando em curso actualmente o prazo de um ano e quatro meses, a que alude o artigo 215.º, n.º 1, alínea b), e n.ºs 2 e 3, do CPP.

Não se verifica, pois, a ilegalidade da prisão, inexistindo o fundamento da alínea c) do n.º 2 do artigo 222.º do CPP subjacente ao invocado pelo

requerente, o que inviabiliza desde logo a providência, por ausência de pressupostos, já que a violação grave do direito à liberdade, fundamento da providência impetrada, há-de necessariamente integrar alguma das alíneas daquele n.º 2 do artigo 222.º do Código de Processo Penal.

O artigo 222.º, n.º 2, do Código de Processo Penal constitui a norma delimitadora do âmbito de admissibilidade do procedimento em virtude de prisão ilegal, do objecto idóneo da providência, nela se contendo os

pressupostos nominados e em numerus clausus, que podem fundamentar o uso da garantia em causa.

Sendo assim, é de indeferir a providência por falta de fundamento

bastante, sendo infundada a petição - artigo 223.º, n.º 4, alínea a), do Código de Processo Penal.

(21)

Sendo esta a jurisprudência constante deste Supremo Tribunal, que se supõe conhecida, como já se disse, nestes casos, mandaria a prudência que se aguardasse um ou dois dias, após o termo do prazo, em ordem a indagar se a acusação foi já deduzida ou não, pois que, naturalmente, a notificação

verificar-se-á alguns dias após.

Decisão

Pelo exposto, acordam na formação de turno de 16 a 19 de Julho de 2019 do Supremo Tribunal de Justiça em indeferir, por manifestamente infundada, a providência de habeas corpus requerida por AA.

Custas pelo requerente, com taxa de justiça de três unidades de conta, nos termos do artigo 8.º e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais - Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro (rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 22/2008, de 24 de Abril, in Diário da República, 1.ª série, n.º 81 e com as alterações introduzidas pela Lei n.º 43/2008, de 27 de Agosto, in Diário da República, 1.ª série, n.º 165, pelo Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de Agosto, pelo artigo 156.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro – Lei do Orçamento do Estado 2009 (Diário da República, 1.ª série, n.º 252,

Suplemento), pelo artigo 163.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril –

Orçamento do Estado para 2010, pelo Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de Abril, Diário da República, 1.ª série, n.º 73, de 13-04-2011, pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, in Diário da República, 1.ª série, n.º 31, de 13 de Fevereiro, que procedeu à sexta alteração e republicação do RCP, rectificada com a Declaração de Rectificação n.º 16/2012, de 26 de Março, in Diário da

República, 1.ª série, n.º 61, de 26-03-2012, pela Lei n.º 66-B/2012, de 31de Dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 126/2013, de 30 de Agosto, in Diário da República, 1.ª série, n.º 167, de 30 de Agosto, pela Lei n.º 72/2014, de 2 de Setembro, pela Lei n.º 49/2018, de 14 de Agosto, in Diário da República, 1.ª série, n.º 156, de 14 de Agosto e pela Lei n.º 27/2019, de 28 de Março, in Diário da República, 1.ª série, n.º 62, de 28 de Março), o qual aprovou – artigo 18.º – o citado Regulamento, publicado no anexo III do mesmo diploma legal, sendo a Tabela actualizada de acordo com o Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de Abril, sem prejuízo da isenção subjectiva que venha a ser detectada, nos

termos do artigo 4.º, n.º 1, alínea j), do mesmo diploma.

Mantém-se em vigor o valor da UC (Unidade de conta) vigente em 2018, conforme estabelece o artigo 182.º da Lei n.º 71/2018, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2019). Tal valor é de 102,00 €, que se tem mantido inalterado desde 20 de Abril de 2009.

(22)

Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

Lisboa, Escadinhas de São Crispim, 19 de Julho de 2019 Raul Borges

Helena Moniz Tomé Gomes

Referências

Documentos relacionados

primeira, a omissão de pronúncia: a segunda, se a alteração do regime de propriedade única de prédio para o de propriedade horizontal não prejudica o direito do arrendatário a

a) Em termos formais, parecem estar cumpridos, in casu, os requisitos constantes do n.º 3 no artigo 400.º do Código de Processo Penal e do artigo 678.° n.° 1 do Código de

recorrente, tendo em conta o disposto nos art.ºs 21.º, n.º 1, e 31.º do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro e 73.º do CP, condená-lo na pena de 3 anos de prisão (reduzindo a pena

II - Provado que a vítima ergueu um cajado de madeira, com cerca de 130 cm de comprimento e 7 cm de diâmetro, revestido na parte superior com uma placa de alumínio de cerca de 10 cm

Isto porque, dos factos provados, se verifica, por um lado, que o autor provou que lhe foi diagnosticada uma incapacidade permanente global de 66% e, por outro lado, porque, aquando

acidente, em local que lhe não era permitido fazê-lo, ( vedação de uma das bermas com barras de protecção metálica) e, sobretudo, por o ter feito sem tomar a devida atenção, por

- É de afastar a aplicação do artº 72º do CIVA na medida em que para tanto a autora teria que provar - e não provou – “que a remuneração por si percebida não incluía o IVA,

II - O contrato de compra e venda do tractor não depende da observancia de qualquer formalidade especial e o registo não e constitutivo de direitos.. III - Não existe declaração