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ÔNUS DA PROVA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR MESTRADO EM DIREITO

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

Eduardo Scalon

ÔNUS DA PROVA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

MESTRADO EM DIREITO

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

EDUARDO SCALON

ÔNUS DA PROVA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

MESTRADO EM DIREITO

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Direitos Difusos e Coletivos sob orientação da Professora Patricia Miranda Pizzol.

(3)

ERRATA

Inclui-se no índice o Capítulo 4 – Conclusão – página nº 140. A Bibliografia passa a constar da página nº 142.

O texto referente ao capítulo adicionado segue a baixo.

4.1 CONCLUSÃO

No intuito de guarnecer os direitos dos consumidores, o CDC, dentre outras previsões, estabeleceu a responsabilidade civil dos fornecedores como objetiva, de acordo com a teoria do risco, exceção feita à responsabilidade dos profissionais liberais, cuja culpa no evento ainda precisa ser provada.

Além de retirar a necessidade de prova de culpa, o CDC adaptou as regras relativas ao ônus da prova às relações de consumo.

Ao autor, consumidor, consequentemente, caberá a prova dos fatos constitutivos de seu direito, conforme previsto no CPC. Todavia, essa prova obedecerá aos princípios protetores do CDC, cujo escopo é a facilitação da defesa.

Esse princípio informará a produção da prova nas hipóteses de fato ou vício do produto, assim como na responsabilidade civil do profissional liberal e da publicidade enganosa.

Nas hipóteses de fato do produto, a existência do defeito é presumida e a prova de sua inexistência atribuída ao fornecedor. Assim como, caberá ao fornecedor provar que não colocou o produto no mercado ou que a culpa pelo acidente é exclusiva do consumidor ou de terceiros.

Todavia, a prova produzida pelo consumidor poderá consistir apenas em indícios e presunções, desde que possibilitem ao magistrado a compreensão dos fatos.

(4)

Entretanto, a inversão não poderá prejudicar o direito à produção da prova pelo fornecedor e deverá ser determinada, preferencialmente, por ocasião do início da produção das provas no processo. Caso o juiz se convença da necessidade de inversão do ônus da prova após o encerramento da fase correspondente, deverá converter o julgamento em diligência para oportunizar ao fornecedor, o cumprimento do ônus que lhe foi atribuído.

(5)

Banca Examinadora

___________________________________________

___________________________________________

(6)
(7)

AGRADECIMENTOS

Agradeço à Professora Patricia Miranda Pizzol pelo auxílio, orientação e apoio.

Agradeço, também, ao amigo Claudio Lima Bueno de Camargo pelos anos de amizade e valiosas colaborações muito além do Direito.

Para minha sócia e amiga Julia Choueri Sordi, pelo incentivo e colaboração.

(8)

RESUMO

A promulgação do Código de Defesa do Consumidor no Brasil representou uma verdadeira quebra de paradgima na forma como as relações jurídicas eram avaliadas e tuteladas. Anteriormente, os conceitos de obrigação e responsabilidade eram orientados pelo Direito Privado, nos termos do Código Civil, com conceitos clássicos e arraigados como a autonomia das partes nas relações jurídicas. O CDC altera sobremaneira tais conceitos ao determinar que uma relação jurídica específica, relação de consumo, será tutelada diretamente por regras especiais e orientadas para a proteção e preservação dos direitos e interesses de uma das partes da relação. Essa orientação, em primeira análise, poderia se configurar como violação ao princípio da isonomia. Todavia, o foco das novas regras é justamente o reconhecimento da necessidade de maior proteção ao consumidor, justamente para equilibrar sua relação com os fornecedores. Esse novo conceito desafiou desde as faculdades cujo ensino jurídico sempre foi pautado pela dicotomia entre direito público e privado, como também os operadores do direito como advogados e juízes. A constatação da nova orientação que governa as relações de consumo demanda uma séria e cuidadosa reflexão de como se operacionaliza essa nova norma protetiva. O manejo descuidado das novas regras levaria esse importante avanço conceitual a uma maneira de prejudicar fornecedores. As alterações determinadas na tutela judicial dos direitos do consumidor obrigam a cuidadosa interpretação conjunta de várias legislações, na medida de sua aparente colisão, para que sejam obtidas conclusões que atinjam o escopo do equilíbrio entre as partes.

(9)

ABSTRACT

The promulgation of the Code of Consumer Protection in Brazil represented a real change in how legal relationships were assessed and protected.

Previously, the concepts of obligation and civil liability were oriented by private law, under the Civil Code, with classic and entrenched concepts as the autonomy of the mutual agreement in legal relations. The CDC greatly alter these concepts to determine that a particular legal relationship, consumer transaction, will be tutored directly by special rules and oriented to the protection and preservation of the rights and interests of one part of the relationship. This guidance, at first, could be configured as a violation of the principle of equal protection. However, the focus of the new rules is precisely the recognition of the need for greater consumer protection, in order to balance their relation with suppliers. This new concept challenged from law schools whose legal education has always been oriented by a dichotomy between public and private laws, as well as jurists and lawyers and judges. The acknowledgement of the new guidance that rules the relations of consumers demands a serious reflection of how apply this new protective law. Careless application of the new rules would transform this important improvement into just a way to jeopardize suppliers. These changes of the consumer protective law require a careful interpretation of several laws and the extent of his apparent collision so that conclusions they reach the scope of the balance between the parties is obtained.

(10)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...11

CAPÍTULO 1 A TUTELA DOS DIREITOS DO CONSUMIDOR...12

1.1FUNDAMENTOS...12

1.1.1 PRINCÍPIO DA ISONOMIA...17

1.1.1.1PRINCÍPIOS PROCESSUAIS CONSTITUCIONAIS...19

1.1.1.2PUBLICIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS...20

1.1.1.3VEDAÇÃO DO USO DE PROVAS OBTIDAS POR MEIO ILÍCITO...21

1.1.1.4CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA...23

1.2 RELAÇÃO DE CONSUMO - CONCEITOS...25

1.2.1 CONSUMIDOR...25

1.2.2 FORNECEDOR...31

1.2.3 PRODUTOS E SERVIÇOS...32

1.3 PRINCÍPIOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR...33

1.3.1 VULNERABILIDADE...34

1.3.2 AÇÃO GOVERNAMENTAL...38

1.3.3 HARMONIZAÇÃO DOS INTERESSES...40

1.3.4 EDUCAÇÃO E INFORMAÇÃO...41

1.3.5 MEIOS DE CONTROLE DE QUALIDADE E SEGURANÇA E SOLUÇÃO DE CONFLITOS...42

1.3.6 COIBIÇÃO DE ABUSOS...42

1.3.7 RACIONALIZAÇÃO E MELHORIA DOS SERVIÇOS PÚBLICOS....42

1.3.8 FACILITAÇÃO DE DEFESA...43

1.4 RESPONSABILIDADE CIVIL ...45

1.4.1 CONCEITO E ELEMENTOS...45

1.4.2 PRESSUPOSTOS...46

1.4.2.1 AÇÃO...46

1.4.2.2 DANO...47

(11)

1.4.3 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL...53

1.4.4 RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL...54

1.4.5 RESPONSABILIDADE CIVIL NO CDC...60

1.4.5.1 RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO...61

1.4.5.2 RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO...66

1.4.5.3 RESPONSABILIDADE DO PROFISSIONAL LIBERAL...73

CAPÍTULO 2 ASPECTOS GERAIS DA PROVA NO PROCESSO CIVIL ...76

2.1CONCEITO...76

2.2MEIOS DE PROVA...77

a) CONFISSÃO...77

b) DEPOIMENTO PESSOAL...78

c) PROVA DOCUMENTAL...80

d) EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO OU COISA...81

e) PROVA TESTEMUNHAL...83

f) PRESUNÇÃO...85

g) PROVA PERICIAL...87

h) INSPEÇÃO JUDICIAL...88

2.3OBJETO...89

2.4SUJEITOS...90

2.5DESTINATÁRIO...92

2.6MOMENTOS DA PROVA...93

2.7VALORAÇÃO DA PROVA...94

CAPÍTULO 3 – O ÔNUS DA PROVA NOS PROCESSOS RELATIVOS A LIDES DE CONSUMO...97

3.1.ÔNUS DA PROVA...97

3.1.1. CONCEITO...97

(12)

3.3. DO ÔNUS DA PROVA NO CÓDIGO DE DEFESA DO

CONSUMIDOR...104

3.3.1. ÔNUS PROBATÓRIO DO CONSUMIDOR...104

3.3.2. ÔNUS PROBATÓRIO DO FORNECEDOR ...108

3.4. DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR...120

3.4.1. REQUISITOS...123

a) HIPOSSUFICIÊNCIA...123

b) VEROSSIMILHANÇA...124

3.4.2. MOMENTO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA...128

a) DA INVERSÃO COMO REGRA DE JULGAMENTO...128

b) DA INVERSÃO COM REGRA DE INSTRUÇÃO...129

3.4.3. A INVERSÃO DO ÔNUS ECONÔMICO FINANCEIRO DA PROVA...131

3.5. ÔNUS DA PROVA E RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR...133

(13)

INTRODUÇÃO

(14)

1 A tutela dos direitos do consumidor 1.1 Fundamentos

Publicada em 11 de Setembro de 1990, a Lei nº 8.078 instituiu o Código de Defesa do Consumidor – CDC, mas as origens do movimento consumerista que culminou com o código são antigas.

O aumento da produção industrial, bem como sua eficiência, capacitou a indústria a disponibilizar no mercado consumidor uma quantidade maior de produtos a preços mais acessíveis. Foi criada a produção em série, também chamada “standartização” da produção, incrementada exponencialmente

com as Guerras Mundiais1.

Esse novo e crescente mercado demandava regulação e proteção. Uma das primeiras e muito relevantes legislações destinadas a regular essa nova realidade industrial foi a chamada Lei Sherman (Sherman Antitrust Act),

promulgada em 2 de julho de 18902.

A norma, criada pelo Senador do Estado americano de Ohio John Sherman visava impedir a criação e determinar a dissolução de monopólios de

mercado, os chamados “trustes” 3. O Presidente norte americano, William

Howard Taft (1909 a 1913) e procurador-geral dos Estados Unidos na época da sua promulgação, afirmou que o objetivo da norma era destruir o império petrolífero criado por John D. Rockefeller Sr., a Standart Oil.

Todavia, seu conteúdo provou-se ineficiente à época, por oferecer muitas brechas de interpretação favoráveis à manutenção dos “trustes”, ao ponto de ser apelidada de Swiss Cheese Act (Lei Queijo Suíço – tradução livre), e não acabou com os monopólios.

Dentre as inúmeras críticas à atuação da empresa na época estavam péssimas condições de trabalho, manipulação de preços de mercado, prejuízo aos consumidores e exclusão de produtores independentes.

1

NUNES, Rizzatto. Curso de direito do consumidor. 8ª ed., Sãp Paulo: Saraiva, 2013, p. 43. 2NUNES, Rizzatto. Ob. Cit. 42.

(15)

Posteriormente a empresa Standart Oil foi processada (Standart Oil

Co. of New Jersey x United States, 19104) e a decisão da Suprema Corte dos

Estados Unidos obrigou sua divisão em 34 companhias e diluição de seu controle acionário, o que eliminou a concentração do mercado sob seu comando.

Ainda que o Sherman Act fosse conhecido à época pelo apelido acima citado, constituiu-se com a base legal para a decisão judicial que acabou com o monopólio da empresa.

A amplitude dos efeitos dessa legislação foi de extrema relevância, pois beneficiava todos os consumidores americanos com o aumento da competição das empresas do setor.

Mesmo no Brasil, em tempos remotos, algumas leis esparsas tratavam de questões específicas sobre consumo. A cidade de Salvador dispunha de algumas normas que regulavam as atividades das “tabernas”, o preço do vinho

e até regras específicas aos “vendeiros” 5.

Nos EUA a fusão dos movimentos trabalhistas e consumeristas resultou na criação da “Consumer League” (Liga do consumo – tradução livre)

em 1891, uma entidade destinada a proteger os direitos dos consumidores6.

Todavia, uma das normas mais relevantes foi a Resolução nº 39/248, de 9 de abril de 1985, da Assembleia Geral da Organização das Nações

Unidas - ONU. Nesse documento, são reconhecidos7, nos objetivos propostos, o

desequilíbrio educacional, econômico e negocial que enfrenta o consumidor.

4

List of United States Supreme Court Cases volume 221, Lista de casos da Suprema Corte dos Estados Unidos, volume 221 – tradução livre.

5FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de direitos do consumidor. 12ª ed., São Paulo: Atlas, 2014, p. 4.

6 FILOMENO, José Geraldo Brito. Ob. Cit., p. 4.

7 Guidelines for consumer protection, 1. Taking into account the interests and needs of consumers in all countries, particularly those in developing countries; recognizing that consumers often face imbalances in economic terms, educational levels, and bargaining power; and bearing in mind that consumers should have the right of access to non-hazardous products, as well as the right to promote just, equitable and sustainable economic and social development, these guidelines for consumer protection have the following objectives.

(16)

Todos os países membros da ONU são conclamados a editar normas protetivas dos consumidores, para garantir sua segurança, educação, qualidade e segurança dos bens e serviços colocados à sua disposição, regras para obtenção de ressarcimento de danos, bem como normas específicas de proteção

em setores com alimentos, água e medicamentos8.

No Brasil, pode-se atribuir o início do “movimento consumerista” no ano de 1976, com a criação de uma comissão pelo governador paulista Paulo Egydio Martins para estudar a implantação de um “sistema estadual de defesa do consumidor”. Essa comissão originou a Lei nº 1.903/78, criadora do Grupo Executivo de Proteção ao Consumidor, convertido posteriormente no atual PROCON.

O fortalecimento do movimento consumerista culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988, cujo artigo 5º, XXXII estabeleceu

que “o Estado promoverá na forma da lei a defesa do consumidor”.

Para conferir maior efetividade ao comando de natureza programática, definiu-se no artigo 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias o prazo de 120 dias para que o Congresso Nacional promulgasse o futuro código.

Vale ressaltar que outras legislações consumeristas estrangeiras9

serviram de suporte para a criação do código brasileiro, assim como para matérias específicas.

O CDC como norma protetiva dos direitos do consumidor, estabelece uma série de princípios que deverão nortear toda a relação de consumo. Trata-se de um elenco de princípios epistemológicos e instrumentais que visam à defesa do consumidor, o reconhecimento de seus direitos, o pleno

exercício da cidadania e qualidade de vida10.

livre). Norma obtida junto ao site da ONU – Organizações das Nações Unidas, no endereço: http://www.un.org/documents/ga/res/39/a39r248.htm.

8 MIRAGEM, Bruno. Curso de Direito do Consumidor. 4ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 37.

9 Ley General para la Defensa de los Consumidores y Usuários, Lei nº 26/1984 (Espanha); Lei nº 29/81 (Portugal); Lei Federal de Protección al Consumidor, de 5 de fevereiro de 1976 (México) e Loi sur la Protection du Consommateur, 1979 (Quebec).

(17)

A origem dos princípios que norteiam o CDC encontra-se da CF, em várias passagens. Destacam-se:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

Conforme já exposto sobre as origens do movimento consumerista, a vertiginosa escalada da produção industrial e dos mercados de consumo demandou a proteção do cidadão, obtido com a elevação a fundamento republicado a cidadania, dignidade da pessoa humana e valores sociais do trabalho e livre iniciativa.

A livre iniciativa tem expressa proteção constitucional, mas acompanhada de princípios bem específicos.

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

I - soberania nacional; II - propriedade privada;

III - função social da propriedade; IV - livre concorrência;

V - defesa do consumidor;

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego;

(18)

Percebe-se que o incremento da atividade econômica e industrial é um dos objetivos do Estado, mas sob a égide de regras protetivas, dentre as quais especificamente encontra-se a defesa do consumidor.

Ainda que no caput do referido artigo conste que a ordem

econômica é fundada na livre iniciativa, o que em princípio seria contraditório com a defesa do consumidor, os incisos do artigo delimitam sua interpretação. O professor Rizzatto Nunes afirma que a livre iniciativa está garantida, porém assim definida:

a) o mercado de consumo aberto à exploração não pertence ao explorador; ele é da sociedade e em função dela, de seu benefício, é que se permite sua exploração;

b) como decorrência disso, o explorador tem responsabilidades a saldar no ato exploratório; tal ato não pode ser espoliativo;

c) se lucro é uma decorrência lógica e natural da exploração permitida, não pode ser ilimitado; encontrará resistência e terá de ser refreado toda a vez que puder causar dano ao mercado e à sociedade;

d) excetuando os casos de monopólio do Estado (p. Ex., do art. 177), o monopólio, o oligopólio e quaisquer outras práticas tendentes à dominação do mercado estão proibidos;

e) o lucro é legítimo, mas o risco é exclusivamente do empreendedor. Ele escolheu arriscar-se: não pode repassar esse ônus ao consumidor. Essas considerações são decorrentes da interpretação dos princípios já expostos e que devem ser harmonizados.

Com efeito, a letra a decorre das garantias constitucionais da função

social da propriedade, da defesa do consumidor, da construção de uma sociedade livre, justa e solidária e da promoção do bem comum. Tudo fundado no princípio máximo da garantia da dignidade da pessoa humana.

Quanto ao estabelecido nas letras b, c, d e e, as bases são as mesmas.

Contudo, reforce-se o aspecto da livre concorrência e da defesa do consumidor11.

A intenção do legislador não foi criar uma norma de defesa aos consumidores que sobrepujasse as demais leis ou que alçasse o consumidor a um

(19)

patamar superior ao fornecedor. Seu intento foi de equilibrar as posições, alçar o consumidor a uma posição de igualdade com o fornecedor. Para observar a propriedade do escopo da norma em igualar as partes dessa relação jurídica, iremos adentrar com conceito de isonomia.

1.1.1 Princípio da isonomia

A CF em seu artigo 5º caput, estabelece a igualdade de todos perante a lei.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

Todavia, a igualdade de todos somente será obtida se observadas suas características particulares e estas se encontrarem em patamar de igualdade com os demais.

A igualdade pode ser obtida por meio de legislações protetivas a determinadas categorias economicamente desprotegidas. São normas de

equilíbrio, com conteúdo diferenciador para atingir a justiça igualitária12.

O professor Humberto Theodoro Junior, citando Fernando Noronha, afirma que a defesa do consumidor não implica em se preocupar exclusivamente com eles, mas impedir que sejam vítimas de abuso. A criação do CDC não visa sobrepor o interesse do consumidor ao do fornecedor, mas

somente “alcançar razoável equilíbrio entre uns e outros” 13.

Esse equilíbrio é alcançado pela direta incidência do CDC, de maneira imperativa nas relações jurídicas antes dominadas pela autonomia da

vontade14.

12PALHARINI JUNIOR, Sidney. O princípio da isonomia aplicado ao direito processual

civil. Processo e constituição: estudos em homenagem ao professor José Carlos Barbosa Moreira, coord. Luiz Fux, Nelson Nery Junior e Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 617.

13 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Direitos do consumidor: a busca de um ponto de

equilíbrio entre as garantias do Código de Defesa do Consumidor e os princípios gerais do Direito Civil e do Direito Processual Civil. 8ª ed., Rio de Janeiro: 2013, p. 33.

(20)

Nesse sentido, o Código de Defesa do Consumidor visa equiparar as partes envolvidas numa relação de consumo como forma de aplicar o princípio da isonomia.

Essa proteção conferida ao consumidor não viola o princípio da isonomia, uma vez que existe uma adequação racional entre o tratamento

diferenciado construído e a razão diferencial que lhe serviu de supedâneo15.

De acordo com Bruno Miragem, o reconhecimento da existência de desigualdade entre fornecedores e consumidores, autoriza a intervenção do Estado no estabelecimento de normas protetivas. Essas normas diferem daquelas referentes ao direito civil tanto em matéria contratual, como na responsabilidade civil16.

Entretanto, além do princípio da isonomia, a CF estabelece objetivos fundamentais da República que, da mesma forma, orientam a tutela do consumidor. Podemos citar o art. 3º, I da CF assim estabelece:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

No conceito de liberdade do artigo incluem-se tanto o cidadão que deseja empreender, como também daquele que deseja apenas adquirir. Neste último, trata-se da liberdade de aquisição de um bem. Mas nas hipóteses em que essa liberdade de escolha não for plena, haja vista que suas opções são determinadas pelos fornecedores, o Estado deverá intervir para equilibrar a

relação17.

A sociedade justa se traduz em busca da harmonia e paz18 social

dentro coletividade e todas suas particularidades e conflitos inerentes.

Para transformar a relação de consumo em igualitária, o CDC criou mecanismos de proteção do consumidor como meios para que a sua

15 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, 3ª Ed., São Paulo: Malheiros, 1999, p. 39.

(21)

vulnerabilidade não se torne um empecilho para o exercício de seus direitos ou que esse não lhe gere prejuízos.

O CDC visa proteger este sujeito, sistematiza suas normas a partir da idéia básica de proteção de apenas um sujeito “diferente” da sociedade de

consumo: o consumidor19.

Nesse sentido, e como foco proposto neste estudo, foram estabelecidas previsões concernentes à tutela judicial do consumidor, bem como às provas produzidas no processo judicial cujo objeto seja uma relação de consumo. Tais previsões promovem a adaptação das regras relativas às provas à condição especial do consumidor, à especial proteção que a lei lhe confere.

Para avaliar as alterações promovidas pelo CDC, faz-se necessário um esboço legislativo sobre a matéria das provas e sobre a tutela jurisdicional.

1.1.1.1 Princípios processuais constitucionais

Alçado à categoria de princípio constitucional fundamental do

processo civil20, o devido processo legal informa todo o ordenamento relativo ao

Direito Processual Civil.

Sua previsão no artigo 5º, LIV, da Constituição Federal de 1988 – CF estabelece as diretrizes para as demais regras processuais.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

A adoção desse princípio, due process of law, seria suficiente para

assegurar as demais garantias processuais aos litigantes21, tais como a

publicidade dos atos processuais, vedação do uso de provas obtidas por meio ilícitos, garantia do juiz natural e contraditório e ampla defesa.

19 MARQUES, Claudia Lima. Ob. Cit., p. 71.

20 NERY JUNIOR, Nelson. Princípio do processo na Constituição Federal, 9ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 77.

(22)

Esses princípios podem derivar do devido processo legal ou pode-se dizer que sua reunião resulta na formação do devido processo legal. Pela inafastabilidade do controle jurisdicional, a Constituição garantiria o devido

processo22.

Todavia, a existência do princípio do devido processo legal, não prescinde da expressa previsão dos demais princípios. Abordaremos a seguir alguns deles, resumidamente.

1.1.1.2 Publicidade dos atos processuais

A impossibilidade de segredo ou ocultação dos atos processuais está prevista no artigo 5º, LX e 93 IX, ambos da CF.

Dessa maneira, todos os atos praticados no processo judicial, bem como as decisões proferidas deverão obrigatoriamente ser públicos e acessíveis a toda a população.

As limitações a esse princípio, todavia, guardam consonância com direitos de intimidade como casamento, filiação, separação dos cônjuges, alimentos e guarda de menores, além do interesse público, nos termos do artigo 155 do CPC.

AGRAVO DE INSTRUMENTO Ação revisional de contrato bancário Decisão que indeferiu os pedidos de assistência judiciária e de tramitação do feito sob segredo de justiça - Justiça Gratuita - Inexistência de documentos que comprovem a efetiva hipossuficiência econômica dos agravantes, ainda que momentânea. Segredo de justiça - Interesse exclusivamente privado - Ausência de interesse público que justifique a limitação da publicidade dos atos processuais - Decisão mantida - Recurso não provido. (TJSP Agravo de Instrumento nº 2052316-68.2014.8.26.0000, 17ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Irineu Fava, j. 07/05/2014).

Conforme se verifica do caso acima exposto, o pedido de tramitação do feito em segredo de justiça foi indeferido, haja vista que não estavam presentes as exceções ao princípio da publicidade.

22 CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Anotações sobre a garantia constitucional do juiz

(23)

1.1.1.3 Vedação do uso de provas obtidas por meio ilícito.

Trazida pelo artigo 5º, LVI da CF, a impossibilidade de utilização das provas obtidas por meio ilícito, traça importante limite à atuação dos litigantes. Provas ilícitas seriam as obtidas por violação do direito à intimidade artigo 5º, X da CF; inviolabilidade do domicílio artigo 5º, XI da CF, e comunicações artigo 5º, XII da CF.

Parte relevante da doutrina adota o princípio da proporcionalidade e admite determinadas provas, ainda que obtidas por meio ilícito, caso o direito a ser protegido pela produção da prova se sobreponha ao direito violado, como o acusado que grava conversa telefônica clandestinamente, em legítima defesa para

a prova de sua inocência23.

Todavia, a jurisprudência brasileira adota posição conservadora, admitindo apenas as interceptações telefônicas autorizadas judicialmente ou gravações fornecidas por uma das partes que participou da conversa.

RECURSO ESPECIAL. ARTIGO 214 C/C O ART. 224, "A", DO CP (ANTIGA REDAÇÃO). ART. 619 DO CPP. VIOLAÇÃO NÃO CARACTERIZADA. GRAVAÇÃO DE CONVERSA EM TERMINAL TELEFÔNICO PRÓPRIO, COM AUXÍLIO DE TERCEIRO. PODER-DEVER DE PROTEÇÃO DO FILHO MENOR. PROVA LÍCITA. ADMISSIBILIDADE. PALAVRA DA VÍTIMA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. FALTA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO FEDERAL. SÚMULA 284/STF.

REGIME PRISIONAL INICIAL. MATÉRIA NÃO

PREQUESTIONADA. SÚMULA 211/STJ. RECONHECIMENTO DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS DE OFÍCIO.

1. Não existe a violação ao artigo 619 do Código de Processo Penal quando o acórdão recorrido decidiu a controvérsia de forma fundamentada, sem incorrer em qualquer omissão.

2. A teor do disposto no artigo 157 do Código Penal são inadmissíveis as provas ilícitas, assim consideradas as que violam direito material do réu, devendo ser desentranhadas do processo, de modo a conferir

(24)

efetividade ao princípio do devido processo legal e a tutelar os direitos constitucionais de qualquer acusado no processo penal.

3. No caso concreto, a genitora da vítima solicitou auxílio técnico a terceiro para a gravação de conversas realizadas através de terminal telefônico de sua residência, na qualidade de representante civil do menor impúbere e investida no poder-dever de proteção e vigilância do filho, não havendo ilicitude na gravação. Dada a absoluta incapacidade da vítima para os atos da vida civil - e ante a notícia de que estava sendo vítima de crime de natureza hedionda - a iniciativa da genitora de registrar conversa feita pelo filho com o autor da conjecturada prática criminosa se assemelha à gravação de conversa telefônica feita com a autorização de um dos interlocutores, sem ciência do outro, quando há cometimento de delito por este último, hipótese já reconhecida como válida pelo Supremo Tribunal Federal. 4. O recurso especial, quanto à tese de condenação com base exclusiva na palavra da vítima, prestada na fase inquisitorial, não comporta conhecimento, pois o recorrente olvidou de apontar o dispositivo federal interpretado de forma divergente por outro tribunal, o que atrai, por analogia, a aplicação da Súmula 284/STF.

5. Também quanto ao regime inicial de cumprimento de pena, o recurso especial não comporta conhecimento, pois, apesar da oposição dos aclaratórios, a matéria não foi apreciada pelo Tribunal de origem, o que atrai o óbice da Súmula 211/STJ.

6. Todavia, verificada a flagrante ilegalidade na fixação do regime inicial de cumprimento da pena, fundamentado exclusivamente na determinação legal prevista no artigo 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/1990, já declarada inconstitucional, é possível a concessão de habeas corpus de ofício para sanar a coação ilegal à liberdade de ir e vir do recorrente. 7. Com efeito, reconhecida a inconstitucionalidade do óbice contido no § 1º do artigo 2º da Lei n. 8.072/1990, tem-se que tal preceito não se afigura idôneo a justificar a fixação do regime mais gravoso, haja vista que, para estabelecer o regime inicial de cumprimento de pena, deve o magistrado avaliar o caso concreto, de acordo com os parâmetros estabelecidos pelo artigo 33 e parágrafos, do Código Penal.

(25)

Tribunal de Justiça avalie a possibilidade de fixar o regime inicial diverso do fechado, consoante as diretrizes do artigo 33 do Código Penal. (STJ Resp. nº 1026605/ES, Sexta Turma, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe 13/06/2014).

Verifica-se do julgado transcrito a extensão do conceito de parte interessada à genitora do menor, incapaz e sob a ameaça de crime. A obtenção da gravação sem respaldo em autorização judicial foi admitida, pois produzida por parte integrante da comunicação e para prevenção de crime hediondo.

1.1.1.4 Contraditório e ampla defesa

Previsto no artigo 5º, LV da CF, esse princípio assegura a todos cidadãos o direito de exercer sua defesa, de maneira ampla e livre. Trata-se de requisito primordial de qualquer estado democrático e não simplesmente uma

benesse generosamente concedida aos particulares24.

Enquanto o contraditório assegura conhecimento, oportunidade de defesa de interesses e consideração judicial, a ampla defesa assegura o elemento dinâmico da bilateralidade, que é a efetiva utilização de meios e recursos pelas

partes.25 Sua formação demanda a ciência do ato processual, oportunidade para

manifestação e consideração judicial26.

O contraditório deve ser entendido como a necessidade de ciência a qualquer pessoa da existência de processo em seu desfavor, bem como, possibilidade de sua manifestação nos autos do processo. A parte tem direito a fazer prova de suas alegações, como também contraprova das alegações da parte contrária, como forma de manifestação do princípio do contraditório no

processo27.

Apesar da relevância do contraditório, o CPC prevê a tomada de decisões judiciais em casos específicos sem a oitiva da outra parte. A dispensa da manifestação, todavia, demanda a inexistência de prejuízo na decisão proferida.

24 OLIVEIRA, Pedro Miranda. Anotações sobre a garantia constitucional do juiz natual. in

Processo e constituição: estudos em homenagem ao professor José Carlos Barbosa Moreira, coord. Luiz Fux, Nelson Nery Junior e Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 557.

25 FERREIRA, William Santos. Princípios fundamentais da prova cível. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 44.

(26)

Neste aspecto, cita-se o artigo 557 do CPC, que trata da possibilidade do relator do Agravo negar seguimento ao recurso pode decisão liminar, sem intimação da parte contrária.

EMENTA DIREITO PROCESSUAL CIVIL. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. DESNECESSIDADE. ALEGAÇÃO DE

OFENSA AO DEVIDO PROCESSO LEGAL, AO

CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO RELATOR. ART. 557, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ACÓRDÃO RECORRIDO DISPONIBILIZADO EM 17.6.2010. O art. 557, caput, do Código de Processo Civil, prevê: “O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.” O acórdão recorrido não divergiu da jurisprudência firmada no âmbito desta Corte, no sentido de que a afronta aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, dos limites da coisa julgada e da prestação jurisdicional, quando depende, para ser reconhecida como tal, da análise de normas infraconstitucionais, configura apenas ofensa indireta ou reflexa à Constituição da República. As razões do agravo regimental não são aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada, mormente no que se refere ao âmbito infraconstitucional do debate e análise da moldura fática constante no acórdão de origem, a inviabilizar o trânsito do recurso extraordinário. Agravo regimental conhecido e não provido. (STF ARE nº 732.478/MT, Primeira turma, Rel. Min. Rosa Weber, DJe 09/04/2014).

Significa a possibilidade de as partes deduzirem as alegações de suas pretensões ou defesa, tanto no processo judicial como no administrativo,

somada a possibilidade de produção de provas e interposição de recursos28.

Passada a introdução, com breve exposição sobre os princípios constitucionais influentes na matéria, será abordada a aplicação do CDC nas hipóteses propostas de ônus da prova. Para tanto, faz-se mister abordar os

(27)

conceitos trazidos pela lei, na medida em que fornecem os subsídios para sua interpretação.

1.2 Relação de consumo - conceitos

A identificação da relação de consumo e por consequência a

aplicação das normas do29 CDC, demanda a análise de seus elementos, em razão

da opção legislativa de conceituar os sujeitos da relação, consumidor e fornecedor, bem como seu objeto, produtos ou serviços.

1.2.1 Consumidor

O CDC se vale de expediente pouco comum na legislação ao estabelecer no artigo 2, os conceitos e definições de quem são os destinatários de seu conteúdo. Essa tarefa caberia, via de regra, à doutrina, mas seu escopo é facilitar a interpretação e aplicação de seu conteúdo.

Nessa esteira, definiu no artigo 2º consumidor como a pessoa jurídica ou física que seja destinatário final da aquisição de um produto ou serviço.

Art. 2º - Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Contudo, o alcance do conceito de consumidor deve ser interpretado pela definição de destinatário final. Do contrário, estariam equiparadas a pessoa física e a grande empresa multinacional cuja aquisição de produtos e serviços tenha caráter negocial ou econômico, o que não é o objetivo da lei. Essa previsão deve ser entendida como um conceito jurídico

indeterminado, a ser interpretado caso a caso pelo Poder Judiciário30.

Questiona-se a inclusão das pessoas jurídicas no conceito de consumidor uma vez que não seriam vulneráveis como as pessoas físicas, haja vista possuírem meios de acesso a informações técnicas e maior possibilidade de manejo de sua defesa.

29 MIRAGEM, Bruno. Ob. Cit., p.135.

(28)

Para a melhor definição do conceito, foram formuladas duas teorias

que visam a definir consumidor, as teorias finalista e maximalista31. Pela teoria

finalista, o consumidor retira o bem do mercado como destinatário fático e econômico do bem; ao passo que pela teoria maximalista bastaria a retirada do produto do mercado para essa qualificação.

De acordo com a teoria finalista, a aquisição que vise a uma atividade negocial, o exercício de atividade comercial por meio de um produto ou serviço, não deve ser considerada como relação de consumo. Seria o consumo não profissional, para uso próprio e de sua família, limitando sua aplicação à

parte mais fraca da relação32.

A compra de peças automotivas por uma transportadora, um computador por um escritório de advocacia ou uma geladeira por um restaurante estariam reguladas pelo direito comum.

Da mesma forma, a aquisição pelo intermediário que pretende a

revenda do bem adquirido não deve ser interpretada como relação de consumo33.

A aquisição de produtos por um supermercado, de carros por uma revendedora ou remédio por uma farmácia, não se enquadrariam nas previsões do CDC.

O conceito de destinatário final é informado pelo ato de fruição do bem adquirido, que deve ser relacionada a uma necessidade pessoal e não econômica. Esse ato negocial deve ser realizado para consumo final, para uso

próprio ou de terceiro34.

Dessa forma, estariam excluídas do conceito de consumidor todas as pessoas jurídicas e físicas cuja aquisição tivesse relação com a atividade exercida. Nestes casos, o produto adquirido seria qualificado como insumo, cujo

ônus econômico seria transferido35.

31 NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Código de defesa do consumidor interpretado, 6ª ed., São Paulo: Editora Verbatim, 2014, p.38 e MARQUES, Claudia Lima. Ob. Cit., p. 116.

32 MARQUES, Claudia Lima. Ob. Cit., p. 116.

33 ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor, São Paulo: Saraiva, p. 38. 34 FILOMENO, José Geraldo Brito. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado

pelos autores do anteprojeto, 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 27.

(29)

Admite-se, todavia, o abrandamento dessa posição na hipótese da presença da vulnerabilidade da pessoa jurídica ou do profissional na aquisição do bem.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR PARA PROTEÇÃO DE PESSOA JURÍDICA. TEORIA FINALISTA APROFUNDADA. REQUISITO DA

VULNERABILIDADE NÃO CARACTERIZADO.

EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO ASSUMIDA EM MOEDA ESTRANGEIRA. FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO NÃO ATACADO.

1.- A jurisprudência desta Corte tem mitigado os rigores da teoria finalista para autorizar a incidência do Código de Defesa do Consumidor nas hipóteses em que a parte (pessoa física ou jurídica), embora não seja tecnicamente a destinatária final do produto ou serviço, se apresenta em situação de vulnerabilidade.

2.- No caso dos autos, tendo o Acórdão recorrido afirmado que não se vislumbraria a vulnerabilidade que inspira e permeia o Código de Defesa do Consumidor, não há como reconhecer a existência de uma relação jurídica de consumo sem reexaminar fatos e provas, o que veda a Súmula 07/STJ.

3.- As razões do recurso especial não impugnaram todos os fundamentos indicados pelo acórdão recorrido para admitir a exigibilidade da obrigação assumida em moeda estrangeira, atraindo, com relação a esse ponto, a incidência da Súmula 283/STF.

4.- Agravo Regimental a que se nega provimento. (STJ AgRg no REsp. nº 1.149.195/PR, Terceira Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, DJe 01/08/2013).

A aplicabilidade das normas, dessa forma, demandaria avaliação do caso concreto.

Sem adentrar especificamente em nenhuma teoria, o professor Rizzatto Nunes destaca a importância de interpretar o conceito de destinatário final para classificar quem se enquadraria na definição de consumidor.

(30)

consumidor. Todavia, o professor admite a existência de situações nas quais essa classificação não será suficiente.

Partindo do exemplo de da compra simultânea de uma caneta por um aluno e por um professor, e do seu uso distinto na sala de aula, pode-se constatar a incoerência da definição pela utilização do bem.

O aluno que utilizou a caneta para anotar a aula do professor estaria protegido pelo CDC, ao passo que o professor ao fazer suas anotações com a caneta precisaria se socorrer do CC para buscar proteção.

Essa distinção não possui base jurídica e ofenderia o princípio da isonomia.

Para o professor a solução reside na análise do produto adquirido. O CDC foi criado para regular as situações de introdução no mercado de produtos típicos de consumo, produzidos em série, distribuídos de modo amplo para toda a coletividade. A finalidade da utilização do bem não seria relevante e, no exemplo das canetas, tanto o professor como o aluno estariam protegidos pela

legislação consumerista no caso de algum problema36.

Para a teoria maximalista, basta a retirada do bem do mercado para que esteja presente a figura do consumidor. A destinação do bem ou natureza do seu uso não interferem na definição do conceito. O CDC seria uma legislação para regular o consumo, estendendo ao máximo as definições de consumidor, de

maneira objetiva37.

Bastaria, dessa forma, que o consumidor fosse o destinatário fático do produto ou serviço, que o retira do mercado e o utiliza em sua casa ou em seu

escritório38.

Essa definição não contemplaria a miríade de hipóteses presentes no desenrolar do mercado de consumo, bem como não seriam aplicadas a

contento as regras protetivas39.

(31)

Parte relevante da definição de consumidor reside no parágrafo único do artigo 2º, ao equiparar ao consumidor, a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis que tenha intervindo na relação de consumo. A relação jurídica entre as partes não precisa ser um ato de consumo, mas uma

subordinação aos efeitos da ação do fornecedor no mercado40.

CIVIL. PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR.

ADMINISTRADORA DE SHOPPING CENTER. EXPLOSÃO POR VAZAMENTO DE GÁS. CADEIA DE FORNECIMENTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. EMPREGADO DO

FORNECEDOR. FIGURA DO CONSUMIDOR POR

EQUIPARAÇÃO. APLICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA ESPECÍFICA. DANOS MORAIS. VALOR. REVISÃO EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. MONTANTE RAZOÁVEL. DISPOSITIVOS LEGAIS ANALISADOS: ARTS. 2º, 3º, 7º, PARÁGRAFO ÚNICO, 17 E 25 DO CDC; E 21, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC.

1. Ação ajuizada em 13.04.1999. Recurso especial concluso ao gabinete da Relatora em 14.03.2013.

2. Recurso especial em que se discute a extensão da figura do consumidor por equiparação prevista no art. 17 do CDC.

3. Os arts. 7º, parágrafo único, e 25 do CDC impõem a todos os integrantes da cadeia de fornecimento a responsabilidade solidária pelos danos causados por fato ou vício do produto ou serviço.

4. O art. 17 do CDC prevê a figura do consumidor por equiparação (bystander), sujeitando à proteção do CDC aqueles que, embora não tenham participado diretamente da relação de consumo, sejam vítimas de evento danoso decorrente dessa relação. Todavia, caracterização do consumidor por equiparação possui como pressuposto a ausência de vínculo jurídico entre fornecedor e vítima; caso contrário, existente uma relação jurídica entre as partes, é com base nela que se deverá apurar eventual responsabilidade pelo evento danoso.

5. Hipótese em que fornecedor e vítima mantinham uma relação jurídica específica, de natureza trabalhista, circunstância que obsta a

(32)

aplicação do art. 17 do CDC, impedindo seja a empregada equiparada à condição de consumidora frente à sua própria empregadora.

6. A indenização por danos morais somente comporta revisão em sede de recurso especial nas hipóteses em que o valor fixado se mostrar irrisório ou excessivo. Precedentes.

7. Nos termos do art. 21, parágrafo único, do CPC, se um litigante decair de parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas verbas de sucumbência.

8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido. (STJ Resp. nº 1370139/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 12/12/2013).

Conforme se verifica do julgado acima, a preocupação do legislador com a coletividade de consumidores expostos às práticas dos fornecedores pode ser comprovada no artigo 17 que equipara ao consumidor, todas as vítimas de um acidente de consumo.

O mesmo sentido se observa no artigo 29 CDC, ao tratar das práticas comerciais. São equiparados ao consumidor toda e qualquer pessoa que seja exposta às práticas abusivas previstas no Capítulo V, CDC. Um claro exemplo seria a publicidade enganosa, ainda que nenhum consumidor tenha reclamado do seu teor. Caberá ao Ministério Púbico a adoção das medidas

necessárias para coibir tal prática, em defesa da coletividade de consumidores41.

A jurisprudência brasileira tem adotado a teoria finalista, conforme se verifica do julgado abaixo transcrito:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO E NOVAÇÃO DE DÍVIDA. RELAÇÃO DE CONSUMO. TEORIA FINALISTA MITIGADA. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535 DO CPC. SÚMULA 7/STJ. DANO MORAL. RAZOABILIDADE.

1.- Tendo o Tribunal de origem fundamentado o posicionamento adotado com elementos suficientes à resolução da lide, não há que se falar em ofensa ao artigo 535, do CPC.

(33)

2.- A jurisprudência desta Corte tem mitigado a teoria finalista para autorizar a incidência do Código de Defesa do Consumidor nas hipóteses em que a parte (pessoa física ou jurídica), embora não seja tecnicamente a destinatária final do produto ou serviço, se apresenta em situação de vulnerabilidade. Precedentes.

3.- A convicção a que chegou o Acórdão acerca do dano e do aval decorreu da análise do conjunto fático-probatório, e o acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame do mencionado suporte, obstando a admissibilidade do Especial os enunciados 5 e 7 da Súmula desta Corte Superior.

4.- A intervenção do STJ, Corte de caráter nacional, destinada a firmar interpretação geral do Direito Federal para todo o país e não para a revisão de questões de interesse individual, no caso de questionamento do valor fixado para o dano moral, somente é admissível quando o valor fixado pelo Tribunal de origem, cumprindo o duplo grau de jurisdição, se mostre teratológico, por irrisório ou abusivo.

5.- Inocorrência de teratologia no caso concreto, em que foi fixado o valor de indenização em R$ R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), devido pelo ora Agravante ao autor, a título de danos morais decorrentes de inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito. 6.- Agravo Regimental improvido.(STJ AgRg no REsp. nº 1.413.889/SC, Terceira Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, DJe. 02/05/2014).

Todavia, vale ressaltar que aplicação dessa teoria demanda atenção às particularidades de cada caso, posição esta partilhada neste estudo.

1.2.2 Fornecedor

Novamente, neste ponto, o CDC estabelece conceito ao determinar quem são fornecedores. Para mitigar o risco de não o fazer a contento, a redação do artigo 3º é extensa e abrangente.

(34)

Conforme se apreende da redação, abrange toda e qualquer pessoa que introduza bem no mercado de consumo, seja ela física ou jurídica, de esfera privada ou pública, nacional ou estrangeira. O traço característico é o desenvolvimento de atividades tipicamente profissionais, além da

habitualidade42.

Qualquer ato mercantil praticado, presente o consumidor por evidente, é regulado pelo CDC, seja pela própria pessoa física, desde que dotada de capacidade conforme artigo 2º, do Código Civil – CC, ou por pessoas jurídicas, sob qualquer forma de organização, nos termos do artigo 16, I, do CC, como sociedades comerciais, sociedades civis e demais previsões.

O CDC, ao estabelecer como fornecedora qualquer pessoa jurídica de direito público, alcança todas as formas de organização, sejam sociedades de economia mista ou empresas públicas, nas formas do artigo 7º do CC.

O artigo 3º do CDC, após determinar quem se qualifica como fornecedor, exemplifica quais as atividades que exercidas por tais pessoas completariam a definição. Novamente, o artigo traz extensa previsão, desde atividades de manufatura como produção, montagem, criação e construção, até atividades mercantis, como importação, exportação, distribuição ou comercialização.

Feita a definição dos partícipes da relação de consumo, faz-se necessário adentrar-se no seu objeto.

1.2.3 Produtos e serviços

Quanto às definições de produtos e serviços, §§1º e 2º do artigo 3º, novamente o legislador teve o cuidado de traçar os conceitos para facilitar sua interpretação. A redação é ampla e genérica, no intuito de englobar todas possíveis hipóteses.

Classifica-se como produto todo e qualquer bem móvel ou imóvel, material ou imaterial, resultado da produção no mercado de consumo,

equiparando sua definição aos critérios já utilizados no mercado em geral43.

(35)

Serviço é toda e qualquer atividade prestada ou fornecida no mercado de

consumo44 mediante remuneração. A única ressalva seriam os serviços prestados

sob a égide de uma relação empregatícia, as quais são tuteladas pela legislação correlata.

Portanto, definidas as características da relação de consumo e a aplicabilidade do CDC, serão analisados seus princípios.

1.3 Princípios do Código de Defesa do Consumidor

A descrição dos princípios que regem o direito do consumidor é extensa e minudente, conforme se verifica da redação do artigo 4º do CDC:

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

II - ação governamental no sentido de proteger efetivamente o consumidor:

a) por iniciativa direta;

b) por incentivos à criação e desenvolvimento de associações representativas;

c) pela presença do Estado no mercado de consumo;

d) pela garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho.

III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica, sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

IV - educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;

(36)

V - incentivo à criação pelos fornecedores de meios eficientes de controle de qualidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo; VI - coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores;

VII - racionalização e melhoria dos serviços públicos;

VIII - estudo constante das modificações do mercado de consumo. Dessa lista podem-se destacar algumas observações relevantes, a seguir abordadas.

1.3.1 Vulnerabilidade

Conforme já abordado, o traço mais característico do consumidor é sua vulnerabilidade, no sentido de que se submete – sem opção – aos poderes dos

titulares dos meios de produção, os empresários45.

Esse desequilíbrio é o ponto central da proteção trazida pela lei, justificativa para todas diretrizes que visam à equiparação das partes, à efetiva aplicação da isonomia. Constitui-se como presunção legal absoluta decorrente do desequilíbrio existente entre consumidores e fornecedores, conferindo proteção

ao sujeito mais fraco da relação de consumo46.

A vulnerabilidade do consumidor decorre tanto de sua situação financeira, na medida em que não pode ser comparado em termos financeiros aos fornecedores, como também ao seu desconhecimento técnico dos produtos e serviços disponíveis no mercado.

De acordo com Bruno Miragem, citando Claudia Lima Marques, Sua classificação pode ser dividida em quatro espécies, como técnica, jurídica, fática e informacional.

45 COMPARATO, Fabio Konder. A proteção do consumidor: importante capítulo o Direito

(37)

Na vulnerabilidade técnica47 encontra-se a ausência de conhecimento técnico específico do consumidor sobre o produto ou serviço

adquirido, ao contrário do fornecedor, possuidor de todo esse conhecimento48. O

fornecedor, muitas vezes será o responsável pela criação e fabricação do produto e dominará por completo todas as características técnicas e tecnológicas envolvidas. Ainda que o consumidor tenha conhecimento de como utilizar o produto, isso não significa que domine seus detalhes técnicos ou até conheça todas suas funcionalidades a fundo.

Uma dona de casa pode conhecer a funcionalidade de um eletrodoméstico como máquina de lavar roupas, mas desconhece por completo suas características técnicas. Por outro lado, essa mesma consumidora pode adquirir uma moderna televisão e, além de desconhecer suas características técnicas, também poderá utilizá-la de maneira básica e desconhecer suas demais possibilidades de uso.

A vulnerabilidade jurídica49 consiste na falta de conhecimento dos

direitos e deveres do consumidor, bem como das consequências jurídicas dos

contratos que celebra50 ou das relações jurídicas que estabelece. Esse

desconhecimento se estende a questões financeiras e econômicas, cujo impacto pode ser verificado no extenso endividamento dos consumidores ao contrair empréstimos bancários, parcelar compras e até decidirem fazer o pagamento mínimo das faturas de cartão de crédito. Em todas essas situações descritas, os consumidores não tem conhecimento das regras financeiras das obrigações, muito menos dos impactos em seu patrimônio.

Por fim, a vulnerabilidade fática tem sua amplitude ampliada pela realidade de cada consumidor. Traduz-se na verificação das características pessoais de cada consumidor em relação ao fornecedor, sendo a mais comum à

vulnerabilidade econômica.51 O consumidor encontra-se em posição de

(38)

desvantagem frente às grandes empresas multinacionais, redes de lojas e serviços em geral.

Essa situação pode ser informada por características pessoais do consumidor, dentre as quais se cite o consumidor criança, o idoso, o analfabeto e

até o doente52.

Por fim, a vulnerabilidade informacional seria a decorrente da publicidade dirigida ao consumidor, seja pela mídia impressa, televisiva,

radiofônica ou eletrônica. Ao consumidor não é possível atestar a veracidade53

das informações prestadas pelo fornecedor, principalmente pelas técnicas de marketing e publicidade, cujo resultado sempre persegue a sedução e convencimento do consumidor.

Sua fragilidade reside na impossibilidade de negociar ou discutir as bases de uma aquisição que pretende fazer ou sequer conhecer os detalhes da oferta ou produto oferecido. Essa situação enfraquece o consumidor e desequilibra a relação e seu reconhecimento facilita a aplicação das normas

protetivas, à procura do fundamento da igualdade e da justiça equitativa54.

Limita-se a escolha na aquisição de produtos ou serviços àqueles disponíveis no mercado, cuja inserção e produção foram decididas

unilateralmente pelo fornecedor, com base em seus interesses55.

Para o fornecedor, o consumidor é o destinatário final de seu produto, mas inserido em um grande volume de pessoas, sem qualquer distinção ou característica de identidade individual.

A relevância do consumidor reside na qualidade de integrante de uma coletividade, o público alvo, convencionado para aumentar ou melhorar o resultado das vendas do produto ou serviço, como um dado estatístico em um plano de negócios.

52 MIRAGEM, Bruno. Ob. Cit., p. 116. 53 MIRAGEM, Bruno. Ob. Cit., p. 116.

(39)

Ao passo que para o consumidor, o fornecedor é muitas vezes parte fundamental de seu cotidiano, única possibilidade de aquisição do bem pretendido.

Essa drástica diferença insere o consumidor em uma posição de extrema fragilidade, cuja compensação ocorre pelas normas protetivas do CDC, que superam o simples reconhecimento de sua vulnerabilidade.

Destas, destacam-se a facilitação do acesso aos instrumentos de defesa, estabelecimento da responsabilidade objetiva do fornecedor e inversão do

ônus da prova56, a seguir abordadas.

Contudo, vale a ressalva da necessidade de observar e considerar as situações concretas da relação. As práticas comerciais dos fornecedores já se adequaram às disposições do CDC, a situação atual dos consumidores é indiscutivelmente mais benéfica.

Outra questão relevante é o nível de competição do mercado, resultante do aumento da quantidade de fornecedores e ofertas à disposição.

Quanto maior a competição57 entre os fornecedores, melhores

condições são oferecidas aos consumidores de seus produtos e serviços. Uma das

56 FILOMENO, José Geraldo. Ob. Cit., p.. 55.

(40)

garantias do consumidor, portanto, é a livre concorrência a obrigar o fornecedor a

disponibilizar produtos e serviços melhores do que seus concorrentes58.

A proteção dos consumidores, ainda que indiretamente pelo estabelecimento de regras que atuem na salvaguarda da concorrência, sob a égide da consecução de efetiva melhoria nos preços e eficiência do mercado, implica a necessidade de avaliação do caso concreto.

O local da residência do consumidor pode influir na conclusão sobre sua vulnerabilidade ou sobre sua falta de opção de escolha entre fornecedores. As grandes cidades brasileiras oferecem uma maior gama de possibilidades de escolha, o que indubitavelmente acarreta maior competição entre os fornecedores e oferecimento de melhores condições aos consumidores.

1.3.2 Ação governamental

O Estado deve assumir posição ativa no estabelecimento de direitos aos consumidores e deveres aos fornecedores para que respeitem e realizem tais

direitos59.

A atuação governamental (alínea a) defesa dos consumidores reflete na criação de órgãos específicos de implementação dessa política, tais como os PROCONS possuidores de estrutura para orientar e educar os

consumidores, bem como fiscalizar as atividades dos fornecedores, legitimados60,

inclusive, a propor ações coletivas.

Paralelamente à atuação governamental, fomenta-se a criação de associações civis (alínea b), representativas dos consumidores no mesmo sentido da atuação governamental como, por exemplo, o IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor.

No tocante à presença do Estado no mercado de consumo, entenda-se como atuação no entenda-sentido de sua organização e garantia da livre concorrência e

iniciativa, nos termos do artigo 170 da CF61. Essa atividade tem como órgão de

(41)

relevante atuação o CADE – Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência, fiscalizando monopólios, abusos do poder econômico.

Vale mencionar, a presença a que alude o texto não se equipara a participação do estado no mercado como fornecedor. Apesar de se admitir a aplicação do CDC nas relações dos consumidores com as concessionárias de serviço público, a justificativa para tanto não se encontra nesse princípio.

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE ÁGUA. RELAÇÃO DE CONSUMO. APLICAÇÃO DO CDC. VIOLAÇÃO DO HIDRÔMETRO NÃO COMPROVADA. PRETENSÃO DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. NÃO CABIMENTO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. "A jurisprudência desta Corte possui entendimento pacífico no sentido de que a relação entre concessionária de serviço público e o usuário final, para o fornecimento de serviços públicos essenciais, tais como água e energia, é consumerista, sendo cabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor" (AgRg no AREsp 354.991/RJ, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, Segunda Turma, DJe 11/09/2013).

2. O Tribunal a quo entendeu que não houve violação no hidrômetro. Para afastar a conclusão adotada pelas instâncias ordinárias, necessária seria a incursão no conjunto fático-probatório dos autos, o que é inviável ao Superior Tribunal de Justiça, diante do óbice contido no verbete sumular 7/STJ.

3. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg no AREsp. nº 372.327/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 18/06/2014).

A aplicação do CDC aos serviços públicos essenciais decorre da definição de consumidor, conforme será abordado adiante e da própria previsão do artigo 22 do CDC.

(42)

Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial - SINMETRO, adoção das normas técnicas padronizadoras editadas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT e também das International Organization for

Standardization – ISO62.

Por fim, a garantia dos padrões dos produtos e serviços (alínea d),

se traduz como princípio da confiança63, uma vez que o Estado age diretamente

na relação de consumo para garantir ao consumidor, produtos e serviços de qualidade, seguros e duráveis, bem como garante regras contratuais protetivas e garantidoras do equilíbrio entre as partes.

1.3.3 Harmonização dos interesses

A proteção dos consumidores não deve acarretar o atraso tecnológico ou impedir o desenvolvimento do mercado produtor. Deve-se buscar

compatibilizar os interesses de acordo com o bom senso64. O estabelecimento da

defesa do consumidor como um dos princípios da livre iniciativa, artigo 170, V

da CF, atua como limitação do regime liberal-capitalista65.

Exigir a boa-fé na relação entre consumidores e fornecedores,

significa pautar a relação, desde seu nascedouro até sua extinção com lealdade66.

Essa lealdade irradia seus efeitos para a oferta e publicidade do fornecedor, geradoras de expectativa no consumidor, bem como na correta e prévia informação dos detalhes da relação jurídica que será estabelecida, nos termos do

artigo 46 do CDC67.

Inclui-se no conceito, o dever de esclarecimento técnico68 do

consumidor, informação dos riscos do serviço, modo de prestação assim como utilidade do serviço ou produto.

62 FILOMENO, Jose Geraldo Brito. Ob. Cit. p. 59. 63 MARQUES, Claudia Lima. Ob. Cit. p. 232. 64 FILOMENO, José Geraldo Brito. Ob. Cit. p. 60. 65 MARQUES, Claudia Lima. Ob. Citi, p. 232. 66 MIRAGEM, Bruno. Ob. Cit., p. 126.

67 Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.

Referências

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