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Intervenção pedagógica e construção da competência moral em universitários

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

ANTONIO DOUGLAS DE MORAES

I

NTERVENÇÃO PEDAGÓGICA E CONSTRUÇÃO DA

COMPETÊNCIA MORAL EM UNIVERSITÁRIOS

CAMPINAS

2016

(2)

I

NTERVENÇÃO PEDAGÓGICA E CONSTRUÇÃO DA

COMPETÊNCIA MORAL EM UNIVERSITÁRIOS

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Doutor em Educação, na área de concentração de Psicologia Educacional.

Orientadora: Profª Drª Telma Pileggi Vinha

O arquivo digital corresponde à versão final da tese defendida pelo aluno Antonio Douglas de Moraes, e orientada pela Profª Drª Telma Pileggi Vinha

CAMPINAS

2016

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TESE DE DOUTORADO

I

NTERVENÇÃO PEDAGÓGICA E CONSTRUÇÃO DA

COMPETÊNCIA MORAL EM UNIVERSITÁRIOS

Autor: Antonio Douglas de Moraes

COMISSÃO JULGADORA

Orientadora: Profª Drª Telma Pileggi Vinha Profª Drª Roseli Palermo Brenelli

Profª Drª Alessandra de Morais Shimizu Profª Drª Orly Zucatto Mantovani de Assis Profª Drª Eliete Aparecida de Godoy A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

(5)

Dedico esse trabalho...

Ao meu sobrinho e afilhado

Lucas

Que chegou durante o meu doutorado e se tornou fonte de alegria

e inspiração. Na esperança de que sejam oferecidas cada vez

mais às crianças condições para que se desenvolvam

integralmente.

(6)

A

GRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, Dércio e Cecília, ao meu irmão Jefferson. Pelo amor, respeito e fé cultivados na convivência familiar, pelo incentivo e apoio nos estudos, preocupação constante dos meus pais, na minha vida e na do meu irmão. Ao Pe. João Augusto Piazza, que como Pedagogo sempre me incentivou a ver a vida como um processo de desenvolvimento e evolução, inclusive na vivência da fé. Pelo apoio e incentivo em todos estes anos de estudo. A Arquidiocese de Campinas, na pessoa de Dom Airton José dos Santos, Arcebispo Metropolitano de Campinas, pelo apoio na realização deste trabalho e pela atenção dedicada a mim na busca de, juntos, oferecer uma formação cada vez melhor para os seminaristas. Na pessoa da Professora Maria Tereza Petrilli, que me alfabetizou, quero agradecer e homenagear todas as professoras da minha infância e juventude. Minha gratidão à Profa. Dra. Orly Zucatto Mantovani de Assis, Coordenadora do Laboratório de Psicologia Genética da Faculdade de Educação da UNICAMP, pela maestria na condução desta tese e pelo exemplo incansável na luta por uma Educação de qualidade. Dentre

(7)

Agradeço à Profa. Dra. Telma Pileggi Vinha, que tornou possível a realização desta tese. Sua presença sempre foi motivo de admiração, pela capacidade intelectual, pela seriedade e dedicação nas pesquisas, mas confesso, que para mim, sobretudo pela simplicidade, pelo exemplo de vida. À Profa. Dra. Patrícia Bataglia que aceitou coorientar este trabalho, pela dedicação e contribuição, principalmente no auxílio na definição dos instrumentos que seriam essenciais para a coleta de dados, bem como no tratamento estatístico das informações coletadas. Pelo amor demonstrado no trabalho que realiza. Às Professoras Dras. Roseli Palermo Brenelli, Alessandra de Morais Shimizu, Eliete Aparecida de Godoy, que compuseram a banca de defesa desta tese, pelo cuidado na leitura e apontamentos que enriqueceram este trabalho. Aos Professores, Diretores e alunos dos cursos que tornaram possível esta investigação. Aos seminaristas integrantes do Grupo Experimental pela cooperação, boa vontade, lealdade que apresentaram durante todo o trabalho, mas também pela convivência, pelas experiências vividas juntos no dia a dia de nossa casa. Sou grato aos colegas de curso, professores, todos do Laboratório de Psicologia Genética, da Secretaria da Pós-Graduação, funcionários, pelo auxílio na documentação, prazos, e demais procedimentos

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Não tenho como nomear, mas são tantos colegas, amigos e amigas que me acompanham a tantos anos e outros mais recentes, que me ouvem, discordam, mas respeitam e acolhem. Encontro sentido para minha vida com a presença de vocês. Muita gratidão! Expresso também meus agradecimentos à CAPES pela bolsa concedida que possibilitou a realização deste programa de

(9)

R

ESUMO

Estudar a competência do juízo moral em universitários e os efeitos de uma intervenção pedagógica no desenvolvimento da competência moral de um grupo de seminaristas graduandos de Filosofia e Teologia, bem como verificar a influência das variáveis independentes, religião e valores na referida competência é o que esta pesquisa pretende. Esta tese fundamenta-se nos estudos de Psicologia Genética, de valores e da religião. Para responder ao problema desta investigação foi utilizado um modelo de pesquisa quase-experimental. Para tanto foram realizados o pré-teste e o pós-teste com todos os participantes: Grupo Controle - GC (GCT - graduandos de teologia, GCF - graduandos de filosofia) e uma intervenção pedagógica realizada com o Grupo Experimental – GE (seminaristas graduandos dos cursos de filosofia e de teologia que estão se preparando para o sacerdócio). Para a coleta de dados no pré e no pós-teste foram utilizados os seguintes instrumentos: Teste para avaliar a competência do juízo moral (MCT_xt ), Escala de Crença Pós-Crítica (PCBS) e Questionário de Perfis de Valores (QPV). Os resultados do pré e do pós-teste referentes a todos os sujeitos, com exceção do GE, em sua maioria correspondem ao nível médio de competência do juízo moral, de acordo com o instrumento MCT_xt; na Escala de Crença Pós-Crítica (PCBS) classificam-se no quadrante denominado de Segunda Ingenuidade que inclui a transcendência e interpretação simbólica; no Questionário de Perfis de Valores (QPV) as respostas apresentadas mostram que os valores estão voltados ao poder, autopromoção e interesses individuais. No pós-teste os integrantes do GE apresentaram mudanças significativas no MCT_xt. Quanto ao QPV, o GE apresentou um escore maior na autodeterminação que se relaciona com a autonomia e escore menor nos valores poder e realização relacionados à autopromoção. Constatou-se também que resultados de todos os sujeitos na Escala de Crenças (PCBS), demonstram que o grupo dos alunos do curso de Teologia apresentou maior aceitação da transcendência do que o GE e este maior aceitação da transcendência do que os graduandos de Filosofia. Os resultados do pós-teste evidenciam que os participantes do GE apresentaram progresso significativo em relação a todos os aspectos avaliados. Tanto a análise quantitativa como a análise qualitativa comprovam a eficácia da Intervenção Pedagógica.

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A

BSTRACT

To study the competence of moral judgment on college students and the effects of a pedagogical intervention in the development of moral competence in a group of seminarians students of philosophy and theology, as well as to check the influence of independent variables, religion and values in that competence is what is meant by this research. This thesis is based upon studies of Genetic Psychology and Psychology of values and religion. To address the problem of this research a quasi-experimental research model was used. In order to perform this, the pre-test and the post-test was applied to all participants: the Control Group - CG (TCG - theologians' control group, PCG - philosophers' control group) and a pedagogical intervention was performed with the Experimental Group - EG (seminarians students of philosophy and theology that are preparing themselves for priesthood). For the data collection in the pre- and post-test the following instruments were used: Moral Judgment Competence Test (MCT_xt), Post-Critical Belief Scale (PCBS), and Values Profile Questionnaire (VPQ). The results found both in the pre-test and in the post-test concerning all subjects, excepting the EG, are located mostly in the average level of competence of moral judgment according to the MCT_tx instrument; in the Post-Critical Belief Scale (PCBS) they are classified within the quadrant named Second Ingenuity, including transcendence and symbolic interpretation; in the Values Profile Questionnaire (VPQ) the responses show that the values are turned to power, self-promotion and individual interests. In the post-test the EG members presented significant changes regarding the MCT_xt. As for the QVP, the EG presented a higher score in the self determination which relates to autonomy and a lower score in the values power and realization which relates to self promotion. It was also found that results of all subjects in the Belief Scale (PCBS), show that the group of Theology graduate students showed greater acceptance of transcendence than the EG, and the EG showed greater acceptance of transcendence than Philosophy graduate students. The post-test results showed that participants in the EG had significant progress on all evaluated aspects. Both quantitative analysis and qualitative analysis prove the effectiveness of the Pedagogical Intervention. Keywords: pedagogical intervention, moral competence, philosophy, theology, values.

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L

ISTA DE

T

ABELAS

Tabela 1. Distribuição por idade dos alunos do curso de Filosofia ... 127

Tabela 2. Escolaridade do Pai dos alunos do curso de Filosofia ... 127

Tabela 3. Escolaridade da Mãe dos alunos do curso de Filosofia ... 127

Tabela 4. Número de Irmãos dos alunos do curso de Filosofia ... 128

Tabela 5. Estado Civil dos Pais dos alunos do curso de Filosofia... 128

Tabela 6. Horas de Tela correspondente aos alunos do curso de Filosofia ... 128

Tabela 7 Distribuição por idade dos alunos do curso de Teologia ... 129

Tabela 8. Escolaridade do Pai dos alunos do curso de Teologia ... 129

Tabela 9. Escolaridade da Mãe dos alunos do curso de Teologia ... 130

Tabela 10. Número de Irmãos dos alunos do curso de Teologia ... 130

Tabela 11. Estado Civil dos Pais dos alunos do curso de Teologia... 130

Tabela 12. Horas de Tela correspondente aos alunos do curso de Teologia ... 131

Tabela 13. Distribuição por idade dos sujeitos do grupo experimental ... 131

Tabela 14. Escolaridade do Pai dos sujeitos do grupo experimental ... 132

Tabela 15. Escolaridade da Mãe dos sujeitos do grupo experimental ... 132

Tabela 16. Número de Irmãos dos sujeitos do grupo experimental ... 132

Tabela 17. Estado civil dos Pais dos sujeitos do grupo experimental ... 133

Tabela 18. Horas de tela correspondente aos sujeitos do grupo experimental ... 133

Tabela 19. Significância no Teste de Postos Sinalizados de Wilcoxon no Grupo de Intervenção ... 134

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dois a dois ... 136

Tabela 23. Sumarização do Teste de Hipóteses em relação a opinião dos sujeitos quanto aos dilemas e C escore nos 3 grupos. ... 136

Tabela 24. Teste de Kruskall-Wallis de Amostras Independentes na PCBS... 138

Tabela 25. Alfa de Cronbach por Subescala... 139

Tabela 26. Correlações da subescala PCBS 1 nos três grupos estudados ... 140

Tabela 27. Correlações da subescala PCBS 1 retirando itens: 4, 21 e 25 ... 140

Tabela 28. Correlações da subescala PCBS 2 nos três grupos estudados ... 141

Tabela 29. Correlações da subescala PCBS 3 nos três grupos estudados ... 141

Tabela 30. Correlações da subescala PCBS 3 retirando o item 31 ... 141

Tabela 31. Correlações da subescala PCBS 3 retirando os itens 15 e 28 ... 142

Tabela 32. Correlações da subescala PCBS 4 nos três grupos estudados ... 142

(13)

S

UMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 15

CAPÍTULO I–AMORAL EM PIAGET, KOHLBERG E LIND ... 21

1.1 Breve noção histórica sobre a Moral ... 21

1.2 Orientações gerais da obra de Piaget ... 23

1.3 Laurence Kohlberg: teoria do desenvolvimento do raciocínio Moral ... 34

1.4 A Teoria do Duplo Aspecto da Moralidade... 46

1.5 Revisão Bibliográfica ... 49

CAPÍTULO II–RELIGIÃO,ESPIRITUALIDADE E MORAL ... 54

2.1 Religião ... 54

2.2 Espiritualidade ... 60

2.3 Relação entre moral e religião ... 63

CAPÍTULO III–EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO MORAL ... 68

3.1 A Educação Moral ... 68

CAPÍTULO IV–DELINEAMENTO DA PESQUISA ... 79

4.1 Justificativa ... 79

4.2 Hipóteses ... 81

4.3 Objetivos ... 81

4.4 Sujeitos, métodos e caracterização da pesquisa... 82

4.5 Instrumentos utilizados para a coleta de dados (Anexo II) ... 84

(14)

CAPÍTULO V– INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA ... 93

5.1 Fundamentos psicológicos e filosóficos da Intervenção Pedagógica ... 94

5.2 As Práticas Morais no Contexto da Intervenção ... 96

5.3 Procedimentos utilizados na Intervenção Pedagógica ... 101

CAPÍTULO VI–APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS ... 125

6.1 Caracterização da amostra de alunos de Filosofia que constituem o GCF ... 126

6.2 Caracterização da amostra de alunos de Teologia que constituem o GCF ... 129

6.3 Caracterização da amostra dos seminaristas que constituem o GE ... 131

6.4 Análise dos dados que respondem ao Objetivo Principal do Trabalho ... 133

6.5 Análise dos dados que respondem aos Objetivos Específicos do Trabalho ... 136

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 144

REFERÊNCIAS ... 150

ANEXO I ... 162

APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA ... 164

ANEXO II ... 169

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I

NTRODUÇÃO

Ao iniciar a exposição dos estudos que compõem esta tese com o intuito de torná-la pública e, sobretudo, com o que se deseja obter por meio desta pesquisa, torna-se importante uma compreensão das razões que motivaram tal empreendimento científico.

A partir dos nossos estudos do mestrado (Moraes, 2011), sobre a espiritualidade nas ações pedagógicas de professores, surgiu a motivação desta pesquisa de doutorado em busca da obtenção de uma resposta, para uma experiência educacional. Sendo reitor de uma instituição religiosa, na qual residem jovens universitários dos cursos de graduação em Filosofia e Teologia, que são seminaristas, fui estimulado por uma forte inquietação diante da tarefa de acompanhá-los no processo de sua formação.

Constatou-se inicialmente que, em geral mostravam-se receosos ao dar opiniões, preferiam acatar o que o formador dizia, pediam autorização para o que precisavam realizar, ficavam pouco à vontade para tomar iniciativas, não estavam acostumados, talvez por falta de oportunidade, a estabelecer regras que organizassem a vida pessoal diária e a comunitária da instituição. Esse modo de agir poderia ser explicado pelo fato de que desde que ingressaram na escola provavelmente não tiveram oportunidade de tomar decisões, dar sugestões sobre o que gostariam de aprender, expressar seus sentimentos, estavam habituados a obedecer a autoridade de seus professores e gestores.

Por outro lado, com fundamentos em nossos estudos anteriores percebemos também que esse modo de ser desses alunos, poderia estar relacionado a questão da espiritualidade e da autonomia moral. Compreendendo a espiritualidade como uma dimensão integradora do psiquismo humano, que une e configura os aspectos intelectuais, emocionais, corporais de modo a contribuir para uma prática educativa democrática ou libertadora, entendemos que nosso papel como reitor dessa instituição seria contribuir positivamente para que esses futuros sacerdotes recebessem uma formação que propiciasse a esses alunos a conquista da autonomia intelectual e moral.

A espiritualidade religiosa, dimensão fundamental na formação desses jovens, manifesta-se também em atitudes morais e éticas, que permitem construir a virtude da

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generosidade. Wolman (2001) ao explicitar os sete fatores por meio dos quais a espiritualidade se manifesta, mostra que em dois desses fatores, a moralidade está muito presente. Um deles é o fator comunidade que se baseia em atividades de comunhão, participação, fazendo com que a preocupação para com o outro se torne um ato moral. O fator intelectualidade, por meio do qual se estimula o pensamento, a reflexão, a participação ativa, nos leva a tratar de questões morais de fundamental importância para a atualidade. Moraes (2011) em suas entrevistas com professores, observou que quando interpelados sobre a maneira como achavam que sua espiritualidade se manifestava, constatou muitas respostas envolvendo comportamentos morais e éticos, na busca da justiça, do bem e, sobretudo, daquilo que é o mais adequado para a pessoa humana. Os professores reconheceram como manifestação de sua espiritualidade, por exemplo, a importância de ser justo no momento de dar uma nota, se referindo ao cuidado ao decidir algo na vida de um aluno.

Além disso, ao constatar também que mais do que transmitir teorias claramente formuladas é importante o educador despertar em seus alunos sentimentos e possibilitar ações concretas de fraternidade, justiça, ajuda mútua, surgiu a necessidade de pesquisar sobre maneiras de auxiliá-los no desenvolvimento da moralidade, favorecendo a construção da competência do juízo moral e, consequentemente da espiritualidade.

O desafio tanto afetivo como cognitivo desencadearam curiosidades que se traduziram em constantes indagações em relação a esse fenômeno. Consciente do esforço exigido e da possibilidade de resultados insatisfatórios, acreditou-se que valeria um investimento pessoal ao atuar como reitor, mas também em busca de um aprofundamento que pudesse oferecer uma contribuição, propiciando a esses jovens universitários, por meio de uma proposta de intervenção pedagógica, um cotidiano que pudesse intervir de modo a proporcionar uma evolução na dimensão moral do psiquismo desses jovens.

Assim sendo, o que se pretende é verificar se em um ambiente cujas relações sejam baseadas na reciprocidade, generosidade, respeito mútuo os alunos teriam oportunidade de progredir no desenvolvimento em direção à conquista da competência moral.

Tendo em vista o exposto, considerando as tendências do desenvolvimento moral de crianças e adolescentes encontrados por Jean Piaget e os estágios de desenvolvimento do raciocínio moral especialmente em jovens e adultos encontrados por Kohlberg e seus seguidores em inúmeras pesquisas, iniciou-se esse empreendimento científico, esperando coletar dados sobre como se pode favorecer o desenvolvimento da competência do juízo moral em jovens universitários e quais são os fatores relacionados, bem como verificar se os procedimentos utilizados na intervenção pedagógica foram eficazes.

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Jean Piaget (1896-1980) nos proporciona por meio de sua obra elementos indispensáveis para caracterizar a evolução da inteligência desde o nascimento até o alcance pleno do seu desenvolvimento, a inteligência operatória formal. A importância do desenvolvimento da moralidade consiste em considerar que assim como alguém pode aperfeiçoar sua capacidade de raciocinar logicamente, por meio de atividades que envolvem o conhecimento lógico-matemático, pode também aperfeiçoar sua competência do juízo moral quando tem experiências situações problema que implicam o raciocínio moral.

Piaget foi quem primeiro sistematizou uma teoria cognitiva do desenvolvimento moral em sua obra Le judgment moral chez l’enfant (1932/1994). Ele observou o desenvolvimento do juízo moral de crianças entre 5 e 12 anos a partir da interação das crianças durante o jogo e do respeito que elas tinham às regras do jogo de bolinhas de gude.

Considerandoa afirmação de Piaget: “a lógica é a moral do pensamento, como a moral é uma lógica da ação” (PIAGET, 1994, p. 17) surgiram muitos estudos na área do desenvolvimento moral, sobretudo porque a moralidade passou a ser considerada como passível de ser desenvolvida. A moralidade deixa de ser entendida somente como um problema de atitudes, de preferências morais e torna-se também algo relacionado à competência e cognição.

Outros autores deram continuidade às teorias sobre o desenvolvimento moral seguindo a corrente teórica de Piaget e, têm colaborado na elaboração de programas e métodos educacionais para promover o desenvolvimento da competência moral.

Lawrence Kohlberg (1927 -1987), na obra Essays on moral development (1984) elaborou uma hipótese sobre a natureza e o curso do desenvolvimento moral cognitivo e estabeleceu uma subdivisão em três níveis de desenvolvimento, sendo que em cada um se distinguem dois estágios. Para isso Kohlberg centrou sua pesquisa em adolescentes e jovens e não somente em crianças e pré-adolescentes como fez Piaget.

Kohlberg (1984) identificou seis estágios de julgamento moral distribuídos em três níveis. No nível Pré-Convencional estão os estágios 1 e 2. No nível Convencional encontramos os estágios 3 e 4. O nível Pós-Convencional é composto dos estágios 5 e 6. Serão apresentados detalhes a respeito dos níveis e estágios de juízomoral no capítulo 1.

Foi Kohlberg quem, por meio do conceito de moralidade que é inseparável do pensamento hipotético-dedutivo e da ação real, chegou ao aspecto da competência (capacidade) o que possibilitou a validação de instrumentos de medida. O instrumento de medida elaborado por ele e seus colaboradores foi o Moral Judgment Interview – MJI, ou Entrevista do Juízo Moral.

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Georg Lind, pesquisador contemporâneo, professor aposentado de Psicologia Educacional na Universidade de Konstanz – Alemanha, tem se destacado mundialmente por suas pesquisas no campo do desenvolvimento moral ao longo de trinta anos. Várias de suas publicações sobre o desenvolvimento moral podem ser encontradas em seu site:

HTTP://www.uni-konstanz.de/ag-moral. Ele elaborou um novo método com a intenção de prover um teste com validade teórica e de maior objetividade de modo a contribuir para o avanço da pesquisa em educação moral. Trata-se do Moral Judgment Test – MJT, ou Teste de Juízo Moral, baseado no termo competência do juízo moral que consiste na “habilidade de um indivíduo ver as implicações de uma situação moral, organizar e aplicar regras morais e princípios em situações concretas” (LIND, 2005a, p. 21). As pesquisas de Lind constituem a ponte entre ideias morais e ação moral. Lind partiu do comportamento e desenvolvimento moral dos pressupostos teóricos estabelecidos pela teoria cognitivo-desenvolvimentista de Piaget e de Kohlberg.

O MJT – Moral Judgment Test ou Teste de Juízo Moral, já foi traduzido e adaptado para mais de trinta línguas.

Patrícia Bataglia (2003) contribui para a investigação no Brasil particularmente no que concerne ao ambiente de ensino-aprendizagem como estimulador do desenvolvimento da competência do juízo moral. A autora colaborou para a investigação das causas da segmentação moral1 e propôs a inclusão de um terceiro dilema à versão padrão do MJT, o dilema do Juiz Steinberg, dando origem a versão estendida do Moral Judgment Test – MJT_xt que tem contribuído para os estudos a respeito da influência da cultura na competência moral. Vale lembrar que, recentemente Lind alterou o nome do MJT, Teste de Juízo Moral para MCT – Teste de Competência Moral, como será denominado daqui em diante neste trabalho.

Os resultados obtidos contribuíram para que se constatasse que jovens universitários ainda não construíram a devida competência do juízo moral a fim de que possam exercer a profissão para qual se preparam nos cursos de graduação.

A idade média dos integrantes da amostra estudada é de 24,5 anos. As pesquisas empíricas sobre desenvolvimento moral têm demonstrado que nessa idade o jovem já poderá ter construído a almejada competência do juízo moral, característica das personalidades íntegras, possuidoras de valores éticos e democráticos que visam à cidadania, capazes de

1 Fenômeno referente a resultados muito baixos nas respostas sobre o dilema da eutanásia e que, portanto, não

refletem a competência individual, mas uma grande influência de agentes sociais como a religião, o exército e outras instituições, pelo tipo de relação que os sujeitos estabelecem com a autoridade. Esse tipo de interferência pode impedir a visualização do objeto de estudo original.

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empreenderem transformações tecnológicas, culturais, científicas necessárias para a evolução da sociedade contemporânea.

Se esses jovens chegaram à universidade sem ter atingido o ápice do desenvolvimento moral pode ser porque não encontraram no ensino fundamental e médio uma escola que lhes oferecesse tudo o que é “necessário à construção de um raciocínio pronto e de uma consciência moral desperta”. (PIAGET, 1974, p.61)

Considerando-se a idade desses jovens seria legítimo esperar que ao ingressar na universidade eles teriam completado seu desenvolvimento cognitivo e moral. Entretanto, os dados coletados nesta pesquisa evidenciaram que isso não aconteceu com a amostra estudada.

É importante destacar que esses resultados apontam para o fato de que a escola de educação básica e a de ensino médio não estão desempenhando o seu papel de favorecer o desenvolvimento cognitivo e moral de seus alunos.

Demonstrar esta situação é um dos méritos desta pesquisa, visto que, para que esta situação se modifique é preciso que os currículos da escola básica e ensino médio tenham uma proposta coerente e consistente de contribuir para o desenvolvimento integral de seus alunos.

Espera-se com esta pesquisa, sobretudo por meio dos estudos dos autores citados, compreender como se dá a evolução e a construção da competência do juízo moral e, se um ambiente de cooperação contribui de maneira mais eficaz para a construção da competência moral. Além disso, pretende-se também que os resultados encontrados possam ser utilizados para fundamentar diretrizes de uma formação acadêmica que proporcione a esses jovens as condições necessárias para progredirem no desenvolvimento da moralidade em direção à conquista da autonomia e aperfeiçoamento da espiritualidade.

Esta questão encaminha para o seguinte objetivo geral:

Avaliar a eficácia de um processo de Intervenção Pedagógica inspirada no processo de Solicitação do Meio incluindo discussão de dilemas morais, clarificação de valores, resolução de conflitos e técnicas complementares no desenvolvimento da competência moral de seminaristas.

Esta pesquisa está organizada da seguinte forma: a) A introdução constitui a primeira parte;

b) Em linhas gerais, as posições de Piaget, Kohlberg e Lind que constituem o marco teórico deste trabalho encontram-se no capítulo I, juntamente com a revisão de pesquisas relacionadas ao tema;

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d) O conteúdo sobre Educação e Desenvolvimento Moral adotado nesta tese encontra-se no capítulo 3;

e) O quarto capítulo trata do Delineamento da Pesquisa;

f) Os fundamentos, procedimentos e atividades realizadas na Intervenção Pedagógica constituem o quinto capítulo;

g) A apresentação e análise dos resultados constam no sexto capítulo; h) Conclui-se com as considerações finais e implicações pedagógicas;

i) Dos anexos I e II constam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, o documento de aprovação da pesquisa obtido no Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP e os instrumentos utilizados na pesquisa;

j) No Apêndice encontram-se os detalhes dos procedimentos, atividades, bem como o conteúdo da Intervenção Pedagógica.

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C

APÍTULO

I

A

M

ORAL EM

P

IAGET

,

KOHLBERG E

L

IND

Ser “moral” implica pensar nos outros, na humanidade ... Ser “moral” implica ter vontade: querer e raciocinar além do próprio eu ... Ser “moral” implica, às vezes, perder vantagens imediatas para si em prol de outros que nunca conheceremos ... Às vezes implica, até mesmo sermos revolucionários, sermos contrários às leis que nos humilham, as leis que nos tornam submissos, sem dignidade.

KANT Neste primeiro capítulo serão apresentados os principais precursores que tornaram possível o avanço de novas teorias do desenvolvimento moral, sobretudo Jean Piaget (1896-1980) e Kohlberg (1927-1987), um de seus seguidores na área da moralidade, George Lind (2000), atualmente pesquisador e professor aposentado da Universidade de Konstanz – Alemanha, que desenvolveu a Teoria do Duplo Aspecto da Moralidade e algumas considerações complementares de Bataglia (2001).

1.1 Breve noção histórica sobre a Moral

A moralidade desperta o interesse desde a antiguidade e foi objeto de estudo de grandes filósofos antigos e, em suas obras encontramos as origens das concepções sobre a moral. Em sua obra intitulada Ética a Nicômaco, Aristóteles (384-322 a.C.), define moral como sendo a busca do bem e da felicidade.

Foram os filósofos gregos que sistematizaram as primeiras reflexões sobre a moral e definiram uma concepção moral reflexiva, a partir de concepções humanas, baseando-se no pressuposto de que a moral é constituída por virtudes passíveis de ser alcançadas quando o homem é ou torna-se sábio.

Segundo Vázques (2002) a palavra moral origina-se do latim “mos”, “moris”, que significa “maneira de se comportar regulada” e de “moralis”, “morale”, que faz referência ao que é “relativo aos costumes”.

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No campo da Filosofia destacam-se também as obras de Emmanuel Kant (1724 – 1804), filósofo alemão. Para ele a verdadeira moral é a que se baseia no dever de agir de acordo com os princípios universais. Isso está explicitado em sua afirmação: “Age apenas segundo uma máxima tal que possas querer que ela se torne lei universal” (Kant, 1785/1980, p. 129). Trata-se de um imperativo categórico moral, que emana da razão pura e prática, independe de experiências anteriores ou de quaisquer consequências externas ou internas, imediatas ou não.

Pode-se entender melhor considerando-se a seguinte situação: se um adolescente deixar de agredir um colega na escola pelo motivo de que poderá ser levado para a diretoria, não se encontra nesta situação valor moral, pelo fato de o aluno ter agido de tal maneira por medo de uma possível punição. Se o aluno decidisse não agredir o colega, entendendo que a não agressão pode ser uma “lei universal”, aí então haveria valor moral.

Este exemplo nos lembra que para Kant (1974) existem duas tendências morais que guiam as ações dos sujeitos e determinam suas relações com as regras, normas e leis, são elas, a heteronomia, que pode ser entendida como a obediência cega às regras, sem ter consciência de seu significado, e a autonomia, quando se faz uso das regras que o próprio sujeito constrói baseado em princípios de igualdade. Por isso, para Kant, agir moralmente bem, não é, necessariamente, o mesmo que agir conforme as regras determinadas pela sociedade. É o caso, por exemplo, do jovem que devolve para o dono o relógio que encontrou, com receio de que alguém possa vê-lo usando o referido objeto. Observa-se aqui que o motivo da devolução não foi a norma de restituir o objeto à pessoa que o perdeu, mas sim o fato de que alguém poderia saber que ele não fez o que deveria ter feito.

Comparando a outras áreas do conhecimento, como a Filosofia, é recente o interesse pelo estudo da moralidade na Psicologia.

Freud (1856 – 1939) manifesta a preocupação com problemas morais desde suas primeiras obras. Em “Três Ensaios sobre a Sexualidade” (Freud, 1905/1987), apresenta a censura moral por meio de mecanismos de inibição, considerados como barreiras e defesas, que poderiam impedir a criança de realizar suas pulsões sexuais parciais caso a satisfação de tais pulsões viesse a causar mais desprazer do que prazer. Posteriormente, Freud (1923/1976) retoma a questão moral com a ideia de superego para explicar como as pessoas passam a controlar as suas pulsões. Trata-se do Complexo de Édipo em que no final do período fálico, frente ao desejo de ter a mãe, a criança percebe a figura paterna como um obstáculo para realizar o seu desejo, surgindo nela sentimentos de hostilidade contra o pai e desejo de suprimi-lo. Tal complexo, ao intensificar-se, faz com que a criança se sentindo

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impossibilitada de satisfazer seus desejos e para evitar o sentimento de medo, identifica-se com o pai por meio da repressão dos sentimentos e da interiorização de normas adotadas pela figura paterna. O superego só se solidifica na adolescência, após a passagem pelo período denominado por Freud de latência.

Na teoria comportamental, Skinner (1974/1982, 1953/1989), atribui à aprendizagem de comportamentos morais às contingências ambientais, ou seja, tais comportamentos são frutos do ambiente e são controlados por regras mantidas sob o domínio de antecedentes verbais, como instruções, regras mantidas por consequência diretas.

Assim, pode-se afirmar que tanto na teoria psicanalítica como na teoria comportamental, a moral é considerada como algo a ser internalizado, de fora para dentro. No primeiro caso pela ação do outro na constituição do superego e no segundo, por interferência de imitação ou outras contingências ambientais.

Como evidenciam Camino e Luna (2005), Piaget não concorda com as concepções comportamentalista e psicanalítica pelo fato de que, embora considerem em suas teorias acerca da moral que ocorre num processo interveniente representacional que é aprendido, atribui a aprendizagem de comportamentos morais vinculada à formação das estruturas cognitivas decorrentes de um processo dinâmico por meio do qual o sujeito reconstrói inteiramente suas ações no mundo.

Desse modo, pode-se inferir que somente com Piaget e depois com Kohlberg que se ressalta a pessoa como agente do processo moral, com a capacidade de julgar algo como certo ou errado. Piaget fez uso das concepções de Kant para elaborar a sua teoria sobre o desenvolvimento do juízo moral em crianças. A Epistemologia Genética de Piaget é a principal perspectiva teórica adotada nesta investigação, juntamente com outras teorias, as de Kohlberg e Lind, que se propuseram a estudar a moralidade.

1.2 Orientações gerais da obra de Piaget

Por considerarmos necessárias algumas explicações sobre o desenvolvimento das estruturas mentais e a originalidade do pensamento infantil, nos fixaremos nas grandes linhas em função do que pretendemos desenvolver depois, sobretudo para entender melhor como se dá, numa perspectiva cognitivo-desenvolvimentista o desenvolvimento moral não só na criança, mas no adolescente e adulto.

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Jean Piaget nasceu na Suíça, em 1896. Antes mesmo de terminar seus estudos secundários, demonstrava domínio nos mais variados saberes como a biologia, psicologia, matemática e filosofia. A convergência de todos esses saberes é perceptível em toda a sua obra. Piaget preocupou-se em formular a natureza do conhecimento em categorias que pudessem ser relacionadas com os fenômenos estudados pela biologia. Os estudos matemáticos contribuíram para os estudos filosóficos e de epistemologia do conhecimento. Estudou as obras fundamentais da psicologia e trabalhou na clínica de E. Bleuler, um grande mestre da psiquiatria suíça e no laboratório de psicologia da Sorbonne, com Binet e, por meio de técnicas de observação orientadas especificamente para a originalidade do pensamento infantil.

A influência de todos esses fatores orientou a obra de Piaget que se consagrou em seus escritos sobre a inteligência infantil. Escutar a linguagem das crianças de 4 a 11 anos, lhes fazer perguntas para buscar conhecer como raciocinam, imaginam o mundo, como julgam, constituíram os primeiros trabalhos de Piaget de 1921 a 1925, sendo que cinco de seus escritos foram publicados de 1923 a 1932: Le language et La pensée chez l’enfan, 1923; Le

jugement et la raisonnement chez l’enfant, 1924; La representation Du monde chez l’enfant, 1926; La causalité physique chez l’enfant, 1927; Le jugement moral chez l’enfant, 1932.

No período de 1925 a 1929 iniciou também os estudos voltados para as primeiras manifestações da vida intelectual em crianças de 0 a 2 anos, antes do surgimento da linguagem. La naissance de l’intelligence chez lénfant, 1936 e La construction du réel chez

l’enfant, 1937 são os que se tornaram mais clássicos e que representam esse período.

É a partir de 1929 até aproximadamente 1949 que tem início a preocupação de Piaget com as aplicações pedagógicas de suas teorias pelo fato de ter ocupado funções na Universidade de Genebra e na UNESCO. Os três volumes da Introduction à l’epistémologie

genétique, publicados em 1950 são dessa época.

Após isso, diversas pesquisas foram realizadas. Les mécanismes perceptifs, 1961 é uma síntese de diversos novos campos de pesquisa. De 1957 a 1966 vinte volumes resultaram de pesquisas voltadas aos estudos de epistemologia genética que se propuseram explicar o desenvolvimento das operações lógico matemáticas.

Mesmo resumidamente é possível notar o quanto se tornaram uma obra extraordinária e rica os estudos e pesquisas de Piaget, com publicações até mesmo após o seu falecimento em 1980.

Piaget (1982) durante mais de cinquenta anos dedicou-se à pesquisa sobre o desenvolvimento humano e a buscar uma explicação de como ocorre a passagem de um estado mais elementar do conhecimento para um estado mais avançado. Mantovani de Assis

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(2010) afirma que para Piaget (1975) tal desenvolvimento ocorre por meio de um processo em que se constrói progressivamente as estruturas da inteligência que vão evoluindo em relação às estruturas anteriores como formas de equilíbrio.

Pode-se afirmar então que Piaget (1972) estudou a origem (gênese) do desenvolvimento e a evolução do conhecimento, e também como se dá o processo de construção do conhecimento. É precisamente aos trabalhos de Piaget que se atribui a abordagem de tais perspectivas, basta perceber que antes dele não era comum considerar que a inteligência infantil operava de maneira diferente da dos adultos.

O interesse de Piaget em dar uma fundamentação teórica para o desenvolvimento da inteligência e também ao modo como se dá a construção do conhecimento está embasado numa investigação científica e este é um dos seus grandes méritos, apresentar uma explicação científica de como se dá a evolução do ser humano, que parte do estágio em que não consegue se distinguir cognitivamente do mundo até o ponto de conseguir resolver equações complexas para que possa ir além da própria imaginação. Uma das principais capacidades que os seres humanos possuem é a de construir representações da realidade onde estão inseridos. Essa capacidade começa a ser desenvolvida desde o nascimento a partir da construção dos esquemas sensórios motores. O conhecimento do ambiente e as trocas que estabelece com o meio constituem uma ferramenta essencial para a sua adaptação a esse meio e, portanto, garante a sua sobrevivência. Com efeito, esses modelos não somente permitem explicar o que está acontecendo, dando sentido aos acontecimentos, mas também tornam possível a antecipação do futuro permitindo que o sujeito aja em conformidade com essa antecipação.

Assim, para Piaget (1996), o conhecimento não está no sujeito (organismo), nem no objeto (meio), mas decorre das interações entre os dois, ou seja, para o autor a inteligência está relacionada à aquisição de conhecimento, à medida em que ocorre a interação entre sujeito e objeto. Isso desencadeou um debate entre duas correntes epistemológicas da época: 1. O empirismo corrente que, como ajuda-nos a esclarecer Garcia (2002), defende que a observação sensorial é a fonte primeira e o último juiz de todo o conhecimento. As fontes do conhecimento no empirismo são externas aos indivíduos, essa concepção tem como defensor, Locke (1632 - 1704), segundo o qual o conhecimento é resultado da prática e que todo produto da mente deriva da experiência. Essa perspectiva epistemológica pode influenciar o campo pedagógico, ao considerar que o ensino centrado no professor representa a única fonte de conhecimento por transmitir as informações que serão armazenadas nos e pelos alunos num processo acumulativo; 2. O racionalismo, que tem como principal representante Descartes (1596 - 1650). Essa corrente epistemológica nega a informação sensorial como

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fonte principal do conhecimento embora não ignore a sua importância. Para os racionalistas o conhecimento é inato ao sujeito, que nasce com ideias “à priori”, fazendo desses dependentes da experiência apenas para que se manifeste aquilo que já sabe, o sujeito já traz algo só para amadurecer no decorrer da vida. Esse raciocínio também consubstancia práticas docentes e juntamente com o empirismo, embora de forma contraditória, apresentam como ponto comum a passividade do sujeito.

Retomando, portanto, o que foi dito anteriormente, Piaget (1996a) defende a ideia de que o conhecimento e o desenvolvimento da inteligência resultam de uma construção progressiva do sujeito ao interagir com o meio físico e social. De acordo com os estágios do desenvolvimento da inteligência, o conhecimento é construído por meio das estruturas cognitivas que se organizam no decorrer desse processo.

Piaget (1990) afirma que o conhecimento não resulta, em suas origens, nem do sujeito nem do objeto, mas das interações que ocorrerão e que dependem dos dois ao mesmo tempo. Assim para o autor, o problema inicial do conhecimento encontra-se nos elementos percebidos pelas significações relativas à ação.

Assim, “para Piaget, conhecer não é simplesmente contemplar, imaginar ou representar o objeto, conhecer exige uma ação sobre o objeto para transformá-lo e para descobrir as leis que regem suas transformações” (RAMOZZI-CHIAROTTINO, 1984, p. 47). E ainda, “conhecer não consiste em copiar o real, mas em agir sobre ele e transformá-lo” (PIAGET, 1996a, p. 37).

Toda fundamentação teórica baseada numa investigação científica faz com que Piaget continue a contribuir significativamente com a Educação, ao resgatar a importância do sujeito no seu processo de desenvolvimento, possibilitando que considerássemos as suas descobertas sobre as diferenças existentes entre o pensamento do adulto e das crianças, as quais frente à realidade elaboram hipóteses e reformulam seu conhecimento por meio do funcionamento intelectual, constituído pelos processos de assimilação e acomodação os quais asseguram a compreensão da realidade que as cerca, por meio da construção de estruturas cognitivas cada vez mais complexas. Como nos esclarece Mantovani de Assis:

É esse funcionamento que permite ao ser humano adaptar-se ao meio em que vive, por intermédio de dois processos fundamentais: o primeiro é o da assimilação ou incorporação de um elemento do meio exterior (objeto, acontecimento, etc...) a um esquema sensório-motor ou estrutura do sujeito. O segundo processo é a acomodação ou modificação do esquema, ou de uma estrutura, em função das particularidades do objeto a ser assimilado. (MANTOVANI DE ASSIS, 2013, p 56)

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Piaget, portanto, enfatiza que o conhecimento não se dá empiricamente porque a percepção é passível de enganos e exemplifica isso com a questão da conservação, ou seja, se apresentarmos para uma criança de quatro ou cinco anos, duas pequenas bolas feitas com a mesma quantidade de massa de modelar e na frente dela modificarmos a forma de uma das bolas e fizermos uma “salsicha” ela vai dizer que esta possui mais massa. Tal fato ocorre porque ainda não é capaz de realizar regulações compensatórias. Isso vai acontecer também com a conservação do volume, do peso, do líquido. O conhecimento também não se dá de forma “a priori” porque se as grandes categorias do conhecimento fossem inatas não haveria diferença entre o pensamento da criança e do adulto. Mas como as pesquisas piagetianas demonstraram as noções de objeto, espaço, tempo e causalidade, conservação, classificação e seriação apresentam uma evolução de um período de desenvolvimento para outro. Primeiramente essas categorias são construídas ao nível da inteligência prática, depois são reconstruídas no período da inteligência representativa, e finalmente ao nível da inteligência operatória concreta e formal. O que se observa é que todo conhecimento evolui de um estado elementar para outro estado cada vez mais complexo. Se as categorias do conhecimento fossem inatas não se observaria essa evolução.

Para Piaget, “toda inteligência é uma adaptação” (PIAGET, 1982, p. 162), por isso, estudou a gênese do conhecimento tomando como referência a ação do sujeito e como ocorre a construção da sua inteligência que é compreendida como um conjunto de estruturas momentaneamente adaptadas. Momentaneamente porque a cada momento ocorre assimilação como, por exemplo, agitar, sugar, balançar, que são esquemas de ação ou reunir, separar, classificar, que são operações mentais.

Então para a Psicologia Genética há uma diferenciação entre desenvolvimento e aprendizagem como esclarece Piaget:

Primeiro, eu gostaria de esclarecer a diferença entre dois problemas: o problema do desenvolvimento e o da aprendizagem. (...) desenvolvimento é um processo que diz respeito à totalidade das estruturas de conhecimento. Aprendizagem apresenta o caso oposto. Em geral, a aprendizagem é provocada por situações provocadas por psicólogos experimentais; ou por professores em relação a um tópico específico; ou por uma situação externa. Em geral, é provocada e não espontânea. Além disso, é um processo limitado a um problema único ou a uma estrutura única. Assim, eu penso que desenvolvimento explica aprendizagem, e esta opinião é contrária à opinião amplamente difundida de que o desenvolvimento é uma soma de experiências discretas de aprendizagem (PIAGET, 1975, p. 176).

Piaget (1975) entende o desenvolvimento como um processo que dá suporte para a aprendizagem a qual acontece em função do desenvolvimento. O processo de aprender diz

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respeito à aquisição de um conhecimento novo, por isso deve estar vinculado ao processo de desenvolvimento.

Por meio de tais critérios, Piaget acabou por distinguir quatro grandes períodos do desenvolvimento da inteligência mostrando que a construção do conhecimento segue um caminho regular. Trata-se dos estágios, que não devem ser interpretados literalmente, ou seja, como uma classificação arbitrária, porque correspondem a critérios bem definidos, sendo que a idade indicada é relativa, é só uma referência.

É importante considerar que, como nos esclarecem Coll e Gillièron (1987) cada fase se caracteriza por formas diferentes de organização mental, exatamente o que torna possível ao indivíduo as diferentes maneiras de se relacionar com a realidade que o rodeia. Conforme os estímulos proporcionados pelo meio em que o indivíduo se encontra e também por causa de possíveis diferenciações da estrutura biológica de cada pessoa, pode ocorrer variação de tempo, porém, todas as pessoas têm possibilidade de percorrer esses quatro estágios explicitados a seguir.

Período Sensório- motor (de 0 a 2 anos).

Segundo Piaget (1967) esse é um período que vai desde o nascimento até a aquisição da função simbólica (capacidade de representação) e é marcado por um extraordinário desenvolvimento mental. Mesmo que com a ausência da linguagem não seja possível constatar isso com tanta facilidade, da forma como se percebe no desenvolvimento dos períodos que se seguem, nos quais o ritmo do desenvolvimento se torna bem mais lento.

Nesse período o desenvolvimento,

[...] representa uma conquista através da percepção e dos movimentos, de todo o universo prático que cerca a criança. Ora, esta ‘assimilação senso-motora’ do mundo exterior imediato realiza, em dezoito meses ou dois anos, toda uma revolução copernicana em miniatura. Enquanto que, no ponto de partida deste desenvolvimento, o recém-nascido traz tudo para si ou, mais precisamente, para o seu corpo, no final, isto é, quando começam a linguagem e o pensamento, ele se coloca, praticamente, como um elemento ou um corpo entre os outros, em um universo que construiu pouco a pouco, e que sente depois como exterior a si próprio (PIAGET, 1967, p. 16).

No recém-nascido, as funções adaptativas estão limitadas ao exercício dos aparelhos reflexos inatos. O universo que o rodeia é conquistado por meio da percepção como a sucção, e dos movimentos, dos olhos, por exemplo. Isso tudo vai sendo progressivamente aperfeiçoado pela criança, de modo que não há uma passividade do sujeito nem mesmo nesse período.

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Para Piaget (1967) o que marca a passagem do período sensório-motor para o pré-operatório é o aparecimento da função simbólica ou semiótica, a emergência da linguagem. O autor afirma que:

Além de todas as ações, reais ou materiais que é capaz de efetuar, como no curso do período precedente, a criança torna-se, graças à linguagem, capaz de reconstituir suas ações passadas sob forma de narrativas, e de antecipar suas ações futuras pela representação do verbal (PIAGET, 1967, p. 23).

Considerando que a emergência da linguagem ocorre nesse período, constata-se que a inteligência é anterior à linguagem e, por isso, conforme nos alertam Coll e Gillièron (ibid): “não se pode atribuir à linguagem a origem da lógica, que constitui o núcleo do pensamento racional” (COLL; GILLIÈRON, 1987, p. 30). Assim, conforme esclarece La Taille (1992) entende-se que o desenvolvimento da linguagem depende do desenvolvimento da inteligência. Na teoria piagetiana a linguagem é considerada como uma condição necessária, mas não suficiente ao desenvolvimento.

Identifica-se que nesse período surge a função semiótica com as suas manifestações dentre elas a linguagem que por sua vez acarreta modificações significativas nos aspectos cognitivos, afetivos e sociais do psiquismo infantil, proporcionando condições para que a criança desenvolva a capacidade de, por meio da representação, atribuir significados à realidade.

Embora a criança apresente muitas transformações em seu comportamento na medida em que se desenvolve é preciso chamar a atenção para duas características importantes desse período. A primeira é o egocentrismo. Conforme afirma Rappaport, Fiori e Davis (1981) a criança, ainda que possua a função de aquisição de esquemas sensoriais-motores adquiridos no período anterior e, por esse motivo, já possua a capacidade de atuar de forma lógica e coerente, apresenta um entendimento desequilibrado da realidade por não possuir esquemas conceituais. A segunda é a ausência da reversibilidade. A criança é capaz de percorrer um determinado caminho cognitivo, porém não consegue inverter mentalmente a direção que está seguindo para reencontrar o ponto de partida não modificado (FLAVELL 1963). Isso implica também a dificuldade de manter uma sequência de raciocínio.

Período das Operações concretas (de 7 a 11 e 12 anos)

Este período é considerado como um novo limiar, decisivo na vida da criança no que diz respeito à afetividade, inteligência e socialização, como Piaget (1967) afirma:

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Em cada um dos aspectos complexos da vida psíquica, quer se trate da inteligência ou da vida afetiva, das relações sociais ou da atividade, propriamente individual, observa-se o aparecimento de formas de organizações novas, que completam as construções esboçadas no decorrer do período precedente, assegurando-lhes um equilíbrio mais estável e que também inauguram uma série ininterrupta de novas construções (PIAGET, 1967, p. 42).

É nesse período que surge a capacidade de a criança estabelecer relações e coordenar pontos de vista diferentes e, por isso, a incapacidade de colocar-se no lugar da perspectiva dos outros pouco a pouco é superada. É um progresso no ponto de vista da socialização.

O aparecimento da capacidade de a criança coordenar ações interiorizadas faz com que ela comece a realizar mentalmente as operações e não mais somente ações físicas típicas da inteligência prática.

A reversibilidade, ou seja, a capacidade de pensar simultaneamente o estado inicial e o final de alguma transformação efetuada sobre os objetos, será construída ao longo desse estágio e do operatório formal.

É importante ressaltar, conforme aponta Piaget (1967) que agora a criança se torna “capaz de cooperação, pois não mais confunde seu próprio ponto de vista com o dos outros, mas o dissocia convenientemente, para coordená-los” (PIAGET, 1967, p. 43).

Por sua vez, “A linguagem egocêntrica desaparece quase totalmente e as frases espontâneas da criança testemunham, pela própria estrutura gramatical, a necessidade de conexão entre as ideias e de justificação lógica” (PIAGET, 1967, p. 43).

Em ambos os casos, “a criança se mostra susceptível de um início de reflexão” (PIAGET, 1967, p.43).

Conforme diz o próprio Piaget:

O essencial destas constatações é que, sob este duplo aspecto, a criança de sete anos começa a se libertar de seu egocentrismo social e intelectual, tornando-se, então capaz de novas coordenações, que serão da maior importância, tanto para a inteligência quanto para a afetividade. Para a inteligência, trata-se do início da construção lógica, que constitui, precisamente, o sistema de relações que permite a coordenação dos pontos de vista entre si. Estes pontos de vista são tanto aqueles que correspondem a indivíduos diferentes, como aqueles correspondentes a percepções ou intuições sucessivas do mesmo indivíduo (PIAGET, 1967, p. 44).

Período das Operações formais (12 anos em diante)

Segundo Inhelder e Piaget (1999) são três as características funcionais básicas do pensamento formal, que mostram a compreensão adequada sobre a maneira pela qual os adultos interpretam o mundo. O entendimento da realidade como um subconjunto do possível. O caráter hipotético dedutivo, isto é, ser

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[...] capaz de deduzir as conclusões, partindo de puras hipóteses e não apenas de observações reais. Suas conclusões chegam a ser independentes da verdade do fato. Por isso é que essa forma de pensamento representa tanta dificuldade e exige um trabalho mental muito maior que o pensamento concreto (PIAGET, 1967, p. 78).

Neste estágio, alcança-se o padrão intelectual que poderá persistir na idade adulta, pois adquire a sua forma final de equilíbrio. O estágio do pensamento formal constitui a última etapa do desenvolvimento e possui dois traços característicos em profunda relação: a inserção no mundo dos adultos, com todos os problemas que isso representa e o início da capacidade de manejar o pensamento hipotético-dedutivo característico da ciência. Isso significa que o pensamento formal permite deduzir as conclusões partindo de hipóteses e não apenas de observáveis. Se antes, no pensamento operatório concreto, a experiência era operada no presente, pela criança, agora o adolescente pode refletir, realizar operações sobre proposições, sobre eventos possíveis que caracterizam o pensamento adulto.

Delval (1998) esclarece que com condições de formular e comprovar hipóteses o adolescente atinge o estágio do pensamento formal, procura algo determinado, persegue uma ideia para tentar encontrar uma resposta, ou seja, vai à procura de algo. Além de formular hipóteses adquire condições de comprová-las e tirar as consequências da resposta que obtiver. Antes, no período concreto, o sujeito faz conjecturas para dirigir sua ação, mas estas são simples extensão do que está presente, não vai além do dado. Agora, com o pensamento formal organiza não somente os aspectos visíveis, mas também aquilo que é possível e ainda não aconteceu.

A posição construtivista demonstra que não podemos conhecer a realidade tal como ela é, mas que construímos modelos ao representá-la em nossas mentes, o que nos permite antecipar o que vai acontecer e agir de acordo com essas representações.

A utilização das categorias de espaço, tempo e causalidade que são os grandes princípios organizadores da realidade confere infinitas possibilidades às representações.

Com efeito, esses modelos não somente permitem explicar o que está acontecendo, dando sentido aos acontecimentos, mas também tornam possível a antecipação do futuro permitindo que o sujeito aja em conformidade com essa antecipação. O espaço é usado para localizar o que acontece em determinado lugar, a causalidade estabelece relações de dependência entre acontecimentos, mas é o tempo que permite a transferência, para uma dimensão mais abstrata, é o que dá sentido/significado à causalidade.

Não é possível avançar no tempo, realmente, mas pode-se fazer mentalmente e prever o que acontecerá, para que, dessa forma, defina-se a ação atual do que se deseja obter. Dispor

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dessa prodigiosa capacidade de recordar/lembrar o que aconteceu e, por conseguinte, poder extrair ensinamentos daquilo que aconteceu no passado, no presente e agir no futuro e, sobretudo, antecipar o que ainda não tenha acontecido, é possível quando alcançamos o estágio formal que constitui a última etapa do desenvolvimento e que se caracteriza pela forma diferente de enfrentar situações que nos apresentam algum problema ou perturbação.

Assim conclui-se essa exposição sintética dos estágios do desenvolvimento intelectual propostos por Piaget.

É importante ressaltar que o desenvolvimento intelectual, afetivo e moral é indissociável, complementar e irredutível. Embora não haja relação de causa e efeito entre esses dois aspectos do desenvolvimento Piaget (1932-1994) esclarece que o desenvolvimento cognitivo é necessário mas não suficiente para que ocorra o desenvolvimento da moralidade.

Piaget (1932) foi também um dos poucos a se dedicar ao estudo dos aspectos morais do pensamento humano. Segundo Mantovani de Assis: “As pesquisas de Piaget (1932) sobre o desenvolvimento moral demonstram que, assim como a inteligência, a moralidade também resulta de um processo construtivo” (MANTOVANI DE ASSIS, 2010, p. 211).

Piaget (1932) apresenta a hipótese construtivista interacionista para a área da moral, ou seja, para ele o desenvolvimento moral é um processo de construção que resulta das trocas entre o indivíduo e o meio social, portanto, diferenciando-se novamente dos referenciais empiristas e aprioristas. Piaget admite que relações de constrangimento (controle exterior) não favorecem o desenvolvimento moral por dificultar o desenvolvimento da autonomia (controle interno).

Assim, os principais conceitos formulados por Piaget (1932) em relação à moral são a heteronomia e a autonomia. São duas maneiras das pessoas se conduzirem nas relações com seus pares e com os adultos.

De acordo com a teoria do desenvolvimento moral de Piaget, podemos encontrar três tendências morais distintas, que assim como no caso dos estágios do desenvolvimento da inteligência, a idade é apenas uma referência e pode variar de acordo com cada indivíduo, mesmo porque acontecem paralelamente.

Até os dois anos de idade, encontramos um pré-estágio egocêntrico. Nesse período, a criança é amoral, sobretudo porque ela é centrada em si mesma. Não segue regras coletivas.

A partir dos dois anos a criança começa a evoluir para um primeiro estágio, o da heteronomia, período marcado pela dependência de uma vontade exterior, dos seus pais ou de outras pessoas que a criança respeita. É a fase do respeito unilateral pelos outros, aparece o interesse pelas atividades coletivas e regradas, mas acreditam que as regras são intocáveis,

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foram concebidas pelos adultos ou até por Deus e, portanto, qualquer modificação é proibida, é a moral da obediência. A criança não vê a regra como algo necessário para regular, harmonizar as ações de um grupo, por isso as segue à risca. Nesse estágio, o realismo moral acarreta uma concepção objetiva da responsabilidade em que se dá importância às consequências e não para a intenção do ato. Piaget (1932) afirma que:

O realismo moral é a tendência da criança em considerar os deveres e os valores a eles relacionados como subsistentes em si, independentemente da consciência e se impondo obrigatoriamente, quaisquer que sejam as circunstâncias às quais o indivíduo está preso. (PIAGET, 1932, p. 97)

O realismo moral resulta de uma confusão entre o subjetivo e o objetivo, bem como da coação intelectual exercida pelo adulto, ou seja, a criança considera bom, os atos de obediência aos adultos ou às regras e mal todo ato de desobediência às regras. O que é observado não é o espírito, o sentido, a intencionalidade da ação, mas aquilo que está ao “pé da letra”, os atos são avaliados em função de suas consequências. Para compreender melhor pode-se citar o exemplo das xícaras, em que uma criança quebra, acidentalmente 11 xícaras e uma outra criança que quebra 1 xícara ao estar cometendo um ato ilícito. Uma criança em fase de realismo moral julga pelo aspecto exterior da ação, ou seja, o prejuízo maior é o material e não a desobediência ou não da regra, nesse caso considera mais culpada a que quebrou 11 xícaras acidentalmente do que a que quebrou uma intencionalmente. Isso pode ser atribuído ao fato de que normalmente o adulto usa de muito rigor para com os desajeitamentos infantis, por muitas vezes não compreender as situações, punem em função da materialidade do ato.

As características que o realismo moral apresenta podem ser melhor compreendidas por meio de pesquisas realizadas por Piaget, nas quais são utilizadas duas histórias que envolvem a mentira e o roubo, em situações que comumente ocorrem na vida das crianças. A respeito da mentira, a pesquisa realizada tinha como objetivo analisar como a criança julga e avalia e chegou-se a resultados interessantes. Por exemplo, ao comparar duas mentiras a que para a criança parece “menos ruim” é a que a outra pessoa pode acreditar mais facilmente e a “pior mentira” é aquela em que não se pode acreditar. Isto é, dizer à mãe que tirou nota boa na prova quando não havia realizado nenhuma prova, é menos ruim do que dizer que levou um susto com um cachorro do tamanho de um cavalo. As crianças compreendem que a primeira mentira foi dita para obter uma recompensa e que a segunda não passa de um simples exagero. Mesmo assim, a criança considera a primeira mentira “menos ruim” porque tirar nota

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boa é uma coisa possível de acontecer, sendo que a segunda mentira por ser impossível que exista um cachorro tão grande como um cavalo, é considerada pior.

Assim, para as crianças que se encontram no estágio da heteronomia, uma afirmação parece mais mentirosa quanto mais se afasta da realidade, ao contrário dos mais velhos que acreditam que a mentira é mais grave quanto menos aparente for.

A partir de 7-8 anos em que acontece avanço do progresso em relação à cooperação social, marca-se o início da autonomia que é baseada no respeito mútuo. Segundo Piaget (1967) este período constitui a fase final do desenvolvimento moral pelo fato de o indivíduo estar apto para a cooperação. As crianças começam a respeitar as regras compreendendo-as como um acordo entre parceiros, assim, se pode criar regras de modo que possam ser apreciadas e aceitas pelos outros. Aos poucos o respeito unilateral cede diante do respeito mútuo e a criança passa a se ocupar com as intenções e desprezar o resultado do ato, o que supõe a cooperação e o respeito mútuo, dando espaço para a reciprocidade e não para a obediência. Os sujeitos, para se relacionarem desse modo, precisam se descentrar, compreender o ponto de vista do outro, coordenar esses pontos de vista com os próprios e estabelecer regras de equidade, características que definem a autonomia moral.

1.3 Laurence Kohlberg: teoria do desenvolvimento do raciocínio Moral

Kohlberg concluiu sua tese de doutorado intitulada: “The development of modes moral thinking and choise in the years 10 to 16” em 1958, na Universidade de Chicago. O autor se esforçou para trabalhar os dados da psicologia do desenvolvimento moral e ampliou suas investigações no domínio da psicologia evolutiva, influenciado por Piaget (1932/1994) que desenvolveu estudos sobre a questão do juízo moral em crianças dos 3 aos 12 anos. Kohlberg tinha por objetivo incluir a população jovem.

A teoria de Kohlberg foi sendo revista e reformulada à luz de muitos estudos empíricos realizados por ele e por seus colaboradores entre 1960 a 1980, ano em que se registra o maior número de referências para a maior parte das pesquisas atuais, sobretudo as obras de Kohlberg (1981 e 1984). Sua obra tornou-se referência para a discussão a respeito do desenvolvimento moral em adolescentes, jovens e adultos até hoje para a maior parte das pesquisas nesse campo. É o que podemos constatar a partir de Rest (1983) que destaca e afirma a validade do projeto original de Kohlberg, embora aponte a necessidade de corrigir alguns aspectos gerais. Turiel (1998) mantém em seus estudos os elementos principais da obra

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de Kohlberg, sobretudo o compromisso com a razão. Rest et al. (1999) que reafirmam que seu programa permanece frutífero.

Kohlberg (1984) identificou seis estágios de julgamento moral que estão subdivididos em três níveis: nível pré-convencional que corresponde aos estágios 1 e 2, nível convencional estágios 3 e 4 e nível pós-convencional referente aos estágios 5 e 6. Desse modo, mantém-se a tese nuclear de acordo com a teoria de Piaget, “assim como existe uma sequência para o pensamento lógico-matemático” (FREITAG, 1992, p. 201) há uma sequência de estágios morais invariantes. Como afirmou Biaggio (2001): “(...) a dimensão de heteronomia para autonomia perpassa o esquema evolutivo de Kohlberg tanto quanto o de Piaget

[...] Kohlberg supõe a universalidade da sequência de estágios, que culminam com a justiça, ou seja, o sujeito constrói o conhecimento, sendo capaz de atingir os níveis mais altos de julgamento moral (BIAGGIO, 2001, p. 2).

Kohlberg (1984) esclarece que o processo de equilibração progressiva de ontogênese do juízo moral, explicado pela teoria do desenvolvimento cognitivo, é hierárquico no que diz respeito a integração moral, no sentido da justiça crescente. O autor explica por meio dos seguintes itens:

1. O juízo moral permanece num processo de desempenho de um ideal que está na assunção de um papel – ideal role taking.

2. Uma nova estrutura lógica surge em cada estágio que corresponde aos estágios lógicos das operações mentais de Piaget.

3. Essa estrutura torna-se melhor elaborada em direção à justiça.

4. Sempre no estágio atual essa estrutura torna-se mais abrangente, diferenciada e equilibrada em relação ao estágio anterior (KOLBERG,1984, p. 147)

As pesquisas e teorias de Kohlberg (1992) estão inseridas no grupo das cognitivo-evolutivo, como as de Piaget porque defendem que o desenvolvimento concorre para transformações básicas das estruturas cognitivas e que as formas superiores de equilíbrio que resultam dessas transformações procedem da interação entre o organismo e o meio. Afirma ainda que um dos pontos centrais da teoria cognitivo-evolutiva é o de que o desenvolvimento cognitivo assim como o moral ocorrem por meio da evolução de estágios. Tais estágios são os mesmos para todos os indivíduos e seguem uma mesma ordem, sucedendo estruturas que permitirão passar para os estágios posteriores.

No que se refere ao desenvolvimento moral e cognitivo ambos são influenciados pelos seguintes fatores: maturação biológica, aprendizagem, transmissões culturais os quais são

Referências

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