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Arq. NeuroPsiquiatr. vol.3 número2

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Academic year: 2018

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REGISTRO D E CASOS

T U M O R D A F O S S A P O S T E R I O R C O M S I N T O M A T O L O G I A A T Í P I C A

ESTUDO ANÁTOMO-CLÍNICO DE UM CASO DE HEMANGIOBLASTOMA DE LINDAU

PAULO PINTO PUPO * JOSÉ VICTOR DOURADO**

O s casos clínicos em neurologia nos proporcionam muitas vezes o p o r t u n i d a d e p a r a d i a g n ó s t i c o s t o p o g r á f i c o s p r e c i s o s , m e r c ê de u m a s i n t o m a t o l o g i a rica e o b j e t i v a . N ã o r a r o , êles p e r m i t e m a o n e u r o -l o g i s t a a r q u i t e t a r p -l a n o s c o m r e q u i n t e s de d e t a -l h e s e vê--los confirm a d o s n a confirm i n ú c i a d o s d a d o s a n a t ô confirm i c o s p o s t e r i o r confirm e n t e e v i d e n -ciados. É êste u m j ô g o em q u e o raciocínio clínico d e f r o n t a - s e , p o r v e z e s , c o m v e r d a d e i r o s p r o b l e m a s de x a d r e z , c o m freqüência u l t r a p a s s a n d o e m d e t a l h e s à s r e a i s n e c e s s i d a d e s d o caso clínico. N e m s e m p r e , p o r é m , isto se p a s s a . A s i n t o m a t o l o g i a n e u r o l ó g i c a p o d e a p r e s e n t a r - s e d e m o d o d e s c o n c e r t a n t e e m e s m o e m b a r a ç a r a c o n s e c u ç ã o d o d i a g n ó s t i c o c l í n i c o t o p o g r á f i c o . O caso q u e t r a z e -m o s h o j e à p u b l i c a ç ã o p e r t e n c e a êste g r u p o .

T r a t a - s e de u m t u m o r d a fossa p o s t e r i o r q u e o c a s i o n o u , n o d e c u r s o d e s u a e v o l u ç ã o , h e m i s s í n d r o m e p i r a m i d a l , h e m i a n e s t e s i a e h e m i s s í n d r o m e c e r e b e l a r à d i r e i t a e, a i n d a m a i s , lesão d o t r i g ê m e o e do facial t a m b é m à d i r e i t a . Se b e m q u e o d i a g n ó s t i c o t i v e s s e s i d o possível, pelo m e n o s p a r a a s n e c e s s i d a d e s clínicas d o caso, o r a c i o c í n i o localizatório e fisiopatológico q u e t í n h a m o s feito e m v i d a do p a c i e n t e e s b o r o o u s e p o r c o m p l e t o d i a n t e d a r e a l i d a d e a n a t ô

-T r a b a l h o das cátedras de Neurologia e A n a t o m i a P a t o l ó g i c a da Escola Paulista de Medicina e do L a b o r a t ó r i o de Neuropatologia do H o s p i t a l do J u -queri. Recebido p a r a publicação em 23 m a r ç o 1945.

* L i v r e D o c e n t e da F a c . Med. Univ. S. Paulo e Chefe de Clínica N e u -rológica da Escola Paulista de Medicina. N e u r o p a t o l o g i s t a do H o s p i t a l de J u q u e r i .

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mica e v i d e n c i a d a n a m e s a de necrópsia. A c o m p a n h a m o s êste p a c i e n t e , c o m i n t e r v a l o s , d u r a n t e m a i s de 8 m e s e s , e a s p a r t i c u l a r i d a d e s da s i n t o m a t o l o g i a p o r êle a p r e s e n t a d a , a s s i m c o m o s u a c o r r e -l a ç ã o a n á t o m o - c -l í n i c a , c o n s t i t u e m m o t i v o suficiente p a r a j u s t i f i c a r a a p r e s e n t a ç ã o dêste e s t u d o .

O B S E R V A Ç Ã O : F . S., branco, polonês, com 33 anos de idade. Apresentou-se

para consulta no Ambulatório de Neurologia da Escola Paulista de Medicina cm 23 de julho de 1942, informando que 2 meses e meio antes, pela manhã, após um acesso de tosse, apresentara, repentinamente, perda da consciência, passageira, se-guida de impossibilidade de movimentação voluntária dos membros superior e in-ferior do lado direito. Apresentou, nessa época, distúrbios da micção, com reten-ção de urina durante 2 dias. N o momento, vomitou muito. Relata ainda que teve, nessa ocasião, forte cefaléia e distúrbio da visão, com diplopia. N o dia da consulta foi assinalado ( D r . Dante Giorgi) : cefaléia intensa, principalmente fron-t a l ; disfron-túrbios da visão com diplopia; fraqueza dos membros superior e inferior direitos e, no ouvido direito, corrimento fétido que se iniciara uma semana antes.

Exame neurológico — Estática difícil, com oscilações. Marcha de tipo

ebrio-so, com tendência a queda e desvio predominante para a direita. Síndrome

pira-midal deficitária à direita (dificuldade nos movimentos voluntários, diminuição da

fôrça muscular e, pela manobra de Mingazzini, queda do membro inferior), em ausência de síndrome de libertação, acompanhada de síndrome cerebelar também à direita (desvio da marcha e lateropulsão para a direita, incoordenação motora nítida nos membros superior e inferior, reflexo patelar ligeiramente pendular) e de hemianestesia também à direita (comprometimento em todo o lado direito do corpo, inclusive face, das sensibilidades táctil, térmica, dolorosa, cinestésica, ar-trestésica e palestésica). Quanto aos pares cranianos, não havia alteração obje-tiva — a hemianestesia da face acompanhava a do restante do corpo e o reflexo corneano não fôra verificado. N ã o havia nistagmo. O exame otorrinolaringoló-gico (Dr. V. Perella) mostrou: otite média supurada à direita, com conseqüente surdez de condução.

Tratamento: Foi administrada sulfamida por via oral (Dagenan) num totai

de 30 gramas. E m 8 dias, as melhoras gerais eram sensíveis, assim como as Ja sintomatologia neurológica. Diminuíram sensivelmente a sintomatologia piramidal e os distúrbios da sensibilidade, restando a incoordenação motora e a marcha atáxica.

Os exames de líquor mostraram hipertensão e dissociação albumino-citológica ligeira: Punção suboccipital, deitado; pressão inicial 36, pressão final 12, volume retirado 15 cc. Proteínas totais 0,88 grs. por lt.; citologia 2,4 células por mm.8

, sendo 100% linfócitos; r. Pandy, opalescência; r. Weichbrodt, negativa; r. Nonne, opalescência; cloretos 7,20 grs. por mil; r. Wassermann, negativa com 1 cc.; r. Steinfeld negativa com 1 cc.; r. desvio de complemento para cisticercos negativa com 1 cc.; r. Eagle negativa; r. benjoim 00200.02222.00000.0; r. Takata-Ara po-sitiva tipo floculante. O quadro flemático evidenciou uma leucocitose de 14.200 por mm.8

com 80% de neutrófilos ( D r . J. B. R e i s ) .

O diagnóstico suposto foi de propagação do processo purulento (otite média supurada) à fossa posterior, com possível pequeno abscesso protuberancial. P e r -manecia de difícil explicação a homolateralidade da sintomatologia cerebelar, pi-ramidal e sensitiva. O doente foi retirado pela família em visível melhora clínica, restando inalterado o quadro liquórico.

Evolução — em 11 de setembro de 1942, veio o paciente a nosso consultório

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an-dar, em manter-se de pé, sensação de atordoamento, acusando cefaléia a qualquer movimento brusco da cabeça, principalmente quando a inclinava para a frente. A cefaléia se localizava na hemifronte direita. Estática titubeante, alargando a base de sustentação, o mesmo se dando quando tentava a marcha, na qual havia desvio para a direita e tendência à queda, também para a direita. A prova dos bra-ços estendidos mostrava, dentro de alguns segundos, pequena flexão dos dedos, diminuição da distensão de todos os músculos, abaixamento pequeno de todo o membro superior direito, evidenciando a existência de um déficit piramidal, além da perturbação cerebelar. Prova da indicação: à ordem de movimentar separa-damente os membros superiores para fôra, para cima ou para baixo, enquanto que o esquerdo volta com segurança à posição primitiva, o direito não o faz — para dentro ultrapassa a linha mediana, qualquer que seja a posição de partida, e no eixo horizontal ultrapassa para cima ou para baixo, quando vem respectivamente de baixo ou de cima. Síndrome de comprometimento piramidal à direita: Sinais deficitários e sinais de libertação nos membros do hemicorpo direito (no membro superior, diminuição da fôrça e da dextreza nos pequenos movimentos; no mem-bro inferior, as manobras de Barre e Mingazzini são positivas. Refletividade pro-funda mais viva à direita, sinal de Babinski duvidoso à direita, sinais de Gordon e Oppenheim esboçados à direita). Pequeno déficit da motricidade dos músculos inferiores da face (paresia facial tipo c e n t r a l ? ) . Hipoestesia táctil, térmica e do-lorosa no território do trigêmeo à direita (nesta zona, acusa espontaneamente sen-sação de constante a r d o r ) . Abolição do reflexo corneano à direita. No restante, já não havia distúrbios da sensibilidade, salvo quanto ao reconhecimento da forma e da substância de objetos na mão direita, cuja pesquisa, entretanto, era preju-dicada pelo déficit da motricidade (preensão defeituosa). Ligeira ataxia nos membros superior e inferior direitos, que nos pareceu de origem cerebelar. Cra-niograma normal (Dr. Celso Pereira da Silva).

Como propuséssemos fazer as provas ventriculográficas, porque já suspeitá-vamos da existência de tumor na fossa posterior, o paciente se recusou e não mais voltou à consulta.

E m fevereiro de 1943, o paciente nos foi enviado pelo Dr. Henrique Mendes, que o examinara para efeito de aposentadoria. Devido a suas precárias condições gerais, internamo-lo de novo no Hospital S. Paulo.

Exame neurológico — A inspecção geral evidenciava, desde logo, cegueira cm

ambos os olhos, com midríase bilateral, abolição do reflexo fotomotor, ausência de fixação visual e nítido nistagmo ocular. Encontrava-se em decúbito dorsal, indiferente ao meio, em estado de obnubilação mental. Respondia com dificuldade e tardiamente à s perguntas, cansando-se com grande facilidade, o que muito di-ficultava o exame neurológico. Irritabilidade evidente, quando muito solicitado.

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das sensibilidades superficiais no território do trigêmeo à direita, enquanto que no restante do organismo elas estavam íntegras, pelo menos quanto às excitações grosseiras.

Pares cranianos — Cegueira por papiledema bilateral. Não havia perturba-ções do olfato. Musculatura ocular íntegra no território dos I I I e I V pares. Anestesia no território do V, à direita, com abolição do reflexo corneano. P a -resia do V I à direita. Pa-resia frusta do V I I , à direita, comprometendo sòmente os músculos peribucais e o elevador da asa do nariz (tipo lesão central do facial). Exame do ouvido: surdez à direita por distúrbio de condução (antiga otite su-p u r a d a ) , evidenciada su-pelas su-provas de Weber (lateralizado su-para a direita), Rinne

(negativo à direita) e Schwabach (alongado à direita). N ã o havia perturbações da deglutição, da fonação e dos movimentos da língua, assim como dos reflexos palatinos.

Alem dêstes elementos, deve ser anotada a posição da cabeça em permanente inclinação para a direita sem haver paresia de músculos cervicais, sinal de com-prometimento cerebelar à direita e síndrome de hipertensão intracraniana (papile-dema, cefaléia, t o r p o r ) . Nos últimos dias apareceu também sinal de Babinski à esquerda.

Exame do liqüido céfalo-raquidiano: Punção suboccipital, deitado; pressão

inicial além de 80; pressão final 50, retirados 5 c.c. de líquor turvo e xantocrômico, com formação de coágulos maciços. Reação de Fouchet positiva; proteínas totais 32,8 grs. por litro; citologia 2,8 células por mm3

. (Dr. J. B. Reis).

Resumindo o quadro neurológico observado durante a moléstia, encontramos:

a ) hemiassinergia cerebelar à direita: perturbações da estática e da marcha, com tendência a desvio e a queda para a direita; b) hemiparesia, com comprometi-mento piramidal à direita, que se mostrou de intensidade variável e que, por fim, estendeu-se também ao lado esquerdo (hemiplegia dupla) ; c) hemianestesia táctil, térmica e dolorosa, à direita, que in medulampletamente; d) hemianestesia para as sensibilidades profundas à direita que, no último período da moléstia, não pôde ser mais verificado devido à não-cooperação do paciente; e) comprometimento do facial à direita, do tipo de lesão central, aparentemente de acôrdo com a síndrome de lesão piramidal também à direita; f) comprometimento periférico do trigêmeo à direita; g ) síndrome de obstrução da fossa posterior, com líquor de estase e grande hipertensão intracraniana; h ) surdez à direita, por antiga otite média supurada; i) estado vertiginoso rebelde, cujo fator causal pode ser encontrado na lesão do ouvido, na do vestibular periférico ou central (protuberância) ; j ) au-sência de comprometimento dos nervos bulhares.

Diagnóstico clínico — Processo da fossa posterior (provável neoplasia), na

linha mediana (síndrome piramidal bilateral, bloqueio da circulação liquórica), predominantemente à direita (síndrome cerebelar e sinais de lesão periférica do trigêmeo à direita). A hemiparesia e a hemianestesia, de intensidade variável, talvez se explicassem pela contrapressão da protuberância junto à parede óssea do crânio.

No estado precário em que se achava o paciente, não houve possibilidade de se realizar as provas ventriculográficas, assim como de tentar a intervenção ci-rúrgica. A morte deu-se em estado de grande hipertensão intracraniana, em 16 de março de 1943.

Com o consentimento da família, foi praticada necrópsia parcial no Departa-mento de Anatomia Patológica da Escola Paulista de Medicina (Prof. Moacyr de Freitas A m o r i m ) .

Necropsia 19/43: O encéfalo mostra intenso edema do parênquima e grande

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trans-versais do cérebro mostram sòmente hidrocefalia interna, sem alterações paren-quimatosas focais. Na fossa posterior, há um grande tumor ocupando a região inferior do ângulo pontocerebelar direito, tumor êste que comprime fortemente o lobo digástrico, o flóculo, o nódulo e a amígdala do hemisfério cerebelar direito e, além disso, invade o I V ventrículo, preenchendo totalmente sua metade infe-rior, bloqueando-o por completo. O tumor tem o tamanho de uma noz, consis-tência firme, coloração vinhosa escura. Mostra-se formado por traves conjunti-vas e lagos venosos de vários tamanhos, cheios de sangue. Seus limites são mais

Fig. 1 — Corte transversal do cérebro mostrando a dilataçâo dos ventrículos laterais e foramens de Monro.

ou menos nítidos na face lateral, o mesmo não se dando na face medial, pela qual invade infiltrativamente o flóculo e a amígdala cerebelares, assim como a calota bulbar. Superiormente, emite um prolongamento que se insinua entre as malhas conjuntivas do sulco bulboprotuberancial e, por compressão, ocasiona lesão focal (amolecimento) na hemicalota protuberancial à direita. Êstes dados descri-tivos são melhor objetivados nas figuras 1, 2 e 3.

Estudo microscópico: Os cortes do tumor, por congelação, mostram unia

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ARQUIVOS DE NEUR0-PSIQU1 ATRIA

Fig. 2 — E m a nota-se a ponta infe-rior do tumor aparecendo em lugar do lobo digástrico e do flóculo cerebelar à direita. Não há, nesse nivel, compro-metimento do tronco cerebral. E m b

o tumor, cortado em sua maior exten-são, mostra a natureza angiomatosa e também, a compressão do lobo digástri-co, do flóculo e da amígdala cerebelar à direita e do hemibulbo direito. Em c, o corte mostra o comprometimento da substância branca do hemisfério cerebe-lar e do vermis (nódulo e ú v u l a ) , as-sim como da calota protuberancial.

Fig. 3 — Maior detalhe (b da fig. anterior) do comprome-timento bulbar. Do hemibulbo direito só a oliva e a pirâmide

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de núcleo claro, ovóide, vesiculoso, e citoplasma muito claro, poliédrico ou qua-drangular, alongado, com aspecto de células endoteliais. As células são freqüen-temente isoladas umas das outras, pelo menos em alguns pontos, por espaços claros. Não há fibrilas gliosas ou outras entre as mesmas. Tendência a uma disposição concêntrica em alguns trechos. Muitas células contêm pigmento hemossiderótico no citoplasma. E m alguns trechos, vêm-se largas zonas de esclerose. Diagnóstico: Hemangiendotelioma, hemangioblastoma de Lindau (Prof. Moacyr de Freitas A m o r i m ) .

Fig. 4 — Nivel dos núcleos de Goll e Burdach ( W e i g e r t ) . Relativa deformação do bulbo com achatamento lateral. Notam-se as olivas bulhares bem distintas, sendo a direita desviada ventralmente. Notam-se ainda, íntegras, as pirâmides e os núcleos de Goll e Burdach bilateralmente, assim como o lemnisco medial di-reito. N a região retro-olivar direita há um foco de amolecimento recente (pro-duto indireto da compressão do tumor) limitado externamente pelo bordo do bulbo e medialmente indo até a Unha mediana, onde atinge o canal do epêndima, foco êste que compromete grandemente as fibras de projeção dos núcleos de Goll e Burdach direitos (fibras arciformes). Consequentemente, vamos encontrar o lem-nisco medial esquerdo inteiramente degenerado. N a calota bulbar podem ainda ser evidenciados os feixes espinhotalâmico, central da calota e de Gowers conservados

em ambos os iados.

Cortes em diferentes alturas do tronco cerebral — Material incluído em

ce-loidina e corado pelo método de Weigert. *

O estudo detalhado dos cortes transversos do tronco cerebral veio trazer ele-mentos bastante interessantes. Resumiremos seu resultado em uma síntese dos elementos positivos que foram encontrados e que serão levados em conta na aná-lise anátomo-clínica dêste caso, assim como apresentaremos sòmente os cortes mais demonstrativos: a ) tumor comprimindo e deformando grandemente o bulbo por seu lado direito, comprometendo fundamentalmente as formações aí

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Fig. 5 — Nivel dos núcleos do X I I , X I , X e I X nervos ( W e i g e r t ) . — Vemos o tumor em sua maior extensão comprimindo e deformando completamente o he-mibulbo direito e infiltrando-s parcialmente em seu parênquima, assim como obs-truindo a luz do quarto ventrículo. N a hemicalota bulbar, à direita, estão pro-fundamente comprometidos, o pedúnculo cerebelar inferior e a região dos núcleos dos nervos I X , X e X I , que podem ser vistos na hemicalota esquerda. Os núcleos do X I I estão conservados bilateralmente. O feixe espinhotalâmico também está conservado. N a hemicalota esquerda observa-se o lemnisco medial descorado

(de-generação walleriana) em contraste com o do lado oposto. As pirâmides estão íntegras.

Fig. 6 — Nivel da zona de passagem bulboprotuberancial ( W e i g e r t ) . — O tumor se apresenta multiforme. Dorsalmente recobre quasi toda a área do assoalho do quarto ventrículo. Lateralmente se insinua entre as leptomeninges da fosseta la-teral do bulbo. N a hemicalota direita estão comprometidos o pedúnculo cerebelar inferior e os núcleos vestibulares, vendo-se conservados os feixes espinhotalâmico, central da calota e lemnisco medial, assim como o feixe longitudinal posterior. N a

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Fig. 7 — Nivel da protuberância inferior ( W e i g e r t ) . — Reconhecem-se à esquerda as fibras do V I e V I I nervos, que caracterizam a região. Notar na hemicalota esquerda, o lemnisco medial degenerado, e na hemicalota direita, uma área ne-crótica (amolecimento) comprometendo os núcleos do V e V I I nervos. As res-tantes formações anatômicas estão bem conservadas.

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das — pedúnculo cerebelar inferior, núcleos sensitivos do TX e X nervos, raiz descendente do trigêmeo, núcleos vestibulares. Estavam íntegros o feixe longitu-dinal posterior, o lemnisco medial e os feixes espinhotalâmico, central da calota e espinhocerebelar de Gowers; b) foco de amolecimento no bulbo inferior, con-seqüente à compressão pelo tumor, comprometendo os neurônios eferentes dos núcleos de Goll e de Burdach, que, entrecruzando-se, passam para a esquerda e, como conseqüência, degeneração walleriana do lemnisco medial esquerdo em tôda altura do tronco cerebral; c) prolongamento do tumor no sulco bulboprotube-rancial, determinando foco necrótico (amolecimento) na hemicalota protuberancial direita, que compromete os núcleos do trigêmeo e do facial e, parcialmente, as fibras eferentes do facial; d) integridade histológica das fibras piramidais. In-felizmente, em virtude da necrópsia parcial, não pudemos examinar cortes da medula, com cujo estudo poderíamos ter melhores esclarecimentos sobre a exis-tência ou não de comprometimento anatômico do feixe piramidal.

Os restantes cortes, em níveis superiores, só evidenciam a degeneração walle-riana do lemnisco medial (feixe bulbotalâmico) esquerdo, sendo portanto dispen-sáveis para o nosso raciocínio anátomo-clínico.

C O R R E L A Ç Ã O ANÁTOMO-CLÍNICA

A s c o n s i d e r a ç õ e s q u e êste e s t u d o n o s s u s c i t a são de d u a s or-d e n s : e x p l i c a ç ã o f i s i o p a t o l ó g i c a or-da s i n t o m a t o l o g i a clínica, e e t i o l o g i a d o p r o c e s s o e x i s t e n t e n a fossa p o s t e r i o r .

R e l a t i v a m e n t e ao p r i m e i r o i t e m , a s c o u s a s são a l g o c o m p l i -c a d a s . O d i a g n ó s t i -c o -clíni-co n ã o p ô d e ser e s t a b e l e -c i d o de m o d o a c e r t a d o . O e x a m e a n a t ô m i c o s i s t e m á t i c o d a s f o r m a ç õ e s da fossa p o s t e r i o r v e i o m o s t r a r - n o s q u e , d e fato, o q u e lá h a v i a era a t é c e r t o p o n t o c a p r i c h o s o e m u i t o difícil de ser d i a g n o s t i c a d o c o m p r e c i s ã o . S e n ã o , v e j a m o s : a s d u a s h i p ó t e s e s clínicas q u e h a v í a m o s e s t a b e l e -cido — t u m o r n a h e m i f o s s a p o s t e r i o r d i r e i t a , c o m p r o m e t e n d o p o r c o n t r a p r e s s ã o a s v i a s da m o t r i c i d a d e e da s e n s i b i l i d a d e à e s q u e r d a , e s e d e de c o m p r e s s ã o a o n í v e l da p r o t u b e r â n c i a — n ã o se confirm a r a confirm t o t a l confirm e n t e . D e fato, n ã o h a v i a c o confirm p r o confirm e t i confirm e n t o a n a t ô -m i c o d a s v i a s p i r a -m i d a l e e s p i n h o t a l â -m i c a e o t u -m o r c o -m p r i -m i a g r a n d e m e n t e o b u l b o e n ã o a p r o t u b e r â n c i a . O fato da s i n t o m a t o

logia n e u r o l ó g i c a e v i d e n c i a r , à d i r e i t a , u m a s í n d r o m e de c o m p r o m e -t i m e n -t o d a s v i a s da s e n s i b i l i d a d e e da via p i r a m i d a l , ao lado de u m a s í n d r o m e c e r e b e l o s a t a m b é m à d i r e i t a , isto é, h o m o l a t e r a l ,

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a p e n s a r e m t u m o r c o m p r i m i n d o |a p r o t u b e r â n c i a e n ã o o b u l b o . É p r e c i s o q u e seja l e m b r a d o n ã o e x i s t i r , a t é o p e r í o d o final da m o -léstia, d i s t ú r b i o s n a d e g l u t i ç ã o e n a fonação. R e l a t i v a m e n t e a o a c ú s t i c o , r e p e t i m o s , a s u r d e z d i r e i t a ( s e q ü e l a de o t i t e s u p u r a d a ) fazia c o m q u e n ã o p u d é s s e m o s r a c i o c i n a r l e v a n d o e m c o n t a o seu c o m p r o m e t i m e n t o . A s p r o v a s de W e b e r , R i n n e e S c h w a b a c h , feitas, é v e r d a d e , e m condições p r e c á r i a s do p a c i e n t e , i n d i c a v a m q u e o n e r v o e s t a v a í n t e g r o . P e l a s c o n d i ç õ e s e m q u e f o r a m feitas e s t a s p r o v a s , d e i x a m o - l a s de l a d o e m n o s s o raciocínio l o c a l i z a t ó r i o .

A m b o s os e r r o s de d i a g n ó s t i c o clínico e s t ã o , a s s i m , i n t e i r a m e n t e j u s t i f i c a d o s . M a i s i n t e r e s s a n t e é a a n á l i s e da c o r r e l a ç ã o e x i s t e n t e e n t r e o q u a d r o clínico e os e l e m e n t o s a n á t o m o - p a t o l ó g i c o s . D e s t a c o r r e l a ç ã o p o d e m o s c h e g a r à s s e g u i n t e s c o n c l u s õ e s :

1. P r e s e n ç a de u m t u m o r n a h e m i f o s s a p o s t e r i o r d i r e i t a , c o m -p r i m i n d o g r a n d e m e n t e a c a l o t a b u l b a r e s e m e v i d e n c i a r , clinica-m e n t e , d i s t ú r b i o s r e l a t i v o s a o s n e r v o s b u l b a r e s .

2. Êste t u m o r e m i t i a u m p r o l o n g a m e n t o e m d i r e ç ã o à c a l o t a p r o t u b e r a n c i a l e c o m p r o m e t i a a s s i m n ú c l e o s e fibras do V e V I I n e r v o s à d i r e i t a , e x p l i c a n d o a s i n t o m a t o l o g i a clínica c o r r e s p o n d e n t e ( p a r e s i a facial, h e m i a n e s t e s i a t o t a l da face, a b o l i ç ã o do reflexo c o r n e a n o ) .

3 . A lesão do facial e r a periférica e n ã o c e n t r a l , c o m o se s u -p u n h a , e o fato da -p a r e s i a se s i t u a r e x c l u s i v a m e n t e n o t e r r i t ó r i o inferior do r o s t o t a l v e z se e x p l i q u e pelo n ã o c o m p r o m e t i m e n t o a n a -t ô m i c o -t o -t a l d o n ú c l e o e d a s s u a s fibras e f e r e n -t e s e a f e r e n -t e s .

4. N ã o h a v i a lesão e v i d e n t e d a s fibras p i r a m i d a i s , m e s m o a b a i x o d a lesão, ficando a s s i m a c o m p r e e n s ã o da s i n t o m a t o l o g i a p i r a m i d a l l i g a d a a p o s s í v e i s f e n ô m e n o s de e d e m a e a o u t r o s d i s -t ú r b i o s c i r c u l a -t ó r i o s p a s s a g e i r o s a êsse nível. E s -t a e x p l i c a ç ã o e s -t á de acôrdo com a v a r i a b i l i d a d e d o s s i n a i s p i r a m i d a i s e c o m a s u a b i l a t e r a l i d a d e n o s ú l t i m o s d i a s de v i d a do p a c i e n t e .

5. U m fóco de a m o l e c i m e n t o n o b u l b o inferior c o m p r o m e t i a a s fibras a r c i f o r m e s e m i t i d a s dos n ú c l e o s d e Goll e de B u r d a c h à direita, a n t e s do e n t r e c r u z a m n t o p i n i f o r m e . E m c o n s e q ü ê n c i a , e n -c o n t r a v a - s e o l e m n i s -c o m e d i a l e s q u e r d o d e g e n e r a d o e m tôda a l t u r a do t r o n c o c e r e b r a l , o q u e e s t á d e acôrdo c o m a s p e r t u r b a ç õ e s da s e n s i b i l i d a d e p r o f u n d a do l a d o o p o s t o , i s t o é, h e m i c o r p o d i r e i t o . É p o s s í v e l q u e êstes d i s t ú r b i o s d a s e n s i b i l i d a d e t e n h a m c o o p e r a d o n a g ê n e s e da i n c o o r d e n a ç ã o m o t o r a p e r s i s t e n t e n o s m e m b r o s d i r e i t o s .

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T a l v e z p e r t u r b a ç õ e s g e r a i s , t a i s c o m o o e d e m a e os d e m a i s fenô-m e n o s i n f l a fenô-m a t ó r i o s iniciais t i v e s s e fenô-m t i d o p a p e l p r e p o n d e r a n t e e fenô-m s u a g ê n e s e . P o s t e r i o r m e n t e , c o m o d e s a p a r e c i m e n t o de t a i s fenô-m e n o s , d e s a p a r e c e u t a fenô-m b é fenô-m a h e fenô-m i a n e s t e s i a d i r e i t a . N o e s t á d i o final, q u a n d o se intensificou o q u a d r o de d i s t ú r b i o s p i r a m i d a i s , o p a c i e n t e já n ã o e s t a v a e m c o n d i ç õ e s de p r e s t a r i n f o r m e s sobre a s e n s i b i l i d a d e .

7. C o m p r o m e t i m e n t o do p e d ú n c u l o c e r e b e l a r inferior e d o h e m i s f é r i o c e r e b e l a r à d i r e i t a , e x p l i c a n d o a h e m i a s s i n e r g i a d i r e i t a , os d i s t ú r b i o s d a m a r c h a c o m t e n d ê n c i a a o d e s v i o , e a q u e d a p a r a a d i r e i t a .

8. C o m p r o m e t i m e n t o do flóculo e n ó d u l o c e r e b e l a r e s à d i r e i t a , m o t i v a n d o , s e m d ú v i d a , a p e r s i s t ê n c i a da i n c l i n a ç ã o da cabeça p a r a a d i r e i t a .

9. N ã o h a v i a c o m p r o m e t i m e n t o a n a t ô m i c o do V I p a r . A p a -r e s i a -r e c e n t e dêste n e -r v o fô-ra o c a s i o n a d a pelos f a t o -r e s g e -r a i s d e e d e m a encefálico e d e h i p e r t e n s ã o i n t r a c r a n i a n a .

10. O b l o q u e i o do 4.° v e n t r í c u l o pelo t u m o r e v i d e n c i a a c a u s a da hidrocefalia i n t e r n a , da h i p e r t e n s ã o i n t r a c r a n i a n a e da e s t a s e l i q u ó r í c a ( g r a n d e d i s s o c i a ç ã o a l b u m i n o - c i t o l ó g i c a e c o a g u l a ç ã o m a c i ç a ) .

(13)

n e o p l a s i a , c o n f i r m a d o p e l o e x a m e do l í q u o r , q u e r e v e l o u b l o q u e i o c o m p l e t o d a fossa p o s t e r i o r e h i p e r t e n s ã o i n t r a c r a n i a n a .

A m e d i t a ç ã o sobre a s d i v e r g ê n c i a s a n á t o m o - c l í n i c a s p a s s a d a s e m r e v i s t a v e m a i n d a p ô r em fóco u m a n o v a q u e s t ã o m u i t a s v e z e s o b s e r v a d a e m n e u r o l o g i a , q u a l seja a d a f r a g i l i d a d e funcional d o s s i s t e m a s de v i a s l o n g a s . A f u n ç ã o p i r a m i d a l , e m p a r t i c u l a r , é a p r i m e i r a a c l a u d i c a r e m u m g r a n d e n u m e r o de i n j ú r i a s a o s i s t e m a n e r v o s o c e n t r a l ( c o m o t r a u m a s e t u m o r e s ) s e m q u e s e j a m s u a s v i a s a n a t ô m i c a s a s ú n i c a s c o m p r o m e t i d a s . O c a s o q u e h o j e a p r e -s e n t a m o -s é b e m u m a d e m o n -s t r a ç ã o di-s-so. À e x i -s t ê n c i a i n d u b i t á v e l de u m a s í n d r o m e p i r a m i d a l (deficitária e d e l i b e r t a ç ã o ) se c o n t r a -p õ e a i n t e g r i d a d e a n a t ô m i c a d a s v i a s -p i r a m i d a i s . N ã o h á d ú v i d a de q u e a f u n ç ã o n e r v o s a , e m p a r t i c u l a r a d e l o n g o s s i s t e m a s de c o n d u ç ã o , p o d e ser c o m p r o m e t i d a t e m p o r a r i a m e n t e , p o r a ç ã o d i r e t a ou i n d i r e t a do a g e n t e m ó r b i d o , s e m q u e a i n t e g r i d a d e de s e u s sis-t e m a s a n a sis-t ô m i c o s o seja.

Imagem

Fig. 1 — Corte transversal do cérebro mostrando a  dilataçâo dos ventrículos laterais e foramens de Monro
Fig. 3 — Maior detalhe (b da fig. anterior) do comprome- comprome-timento bulbar. Do hemibulbo direito só a oliva e a pirâmide
Fig. 4 — Nivel dos núcleos de Goll e Burdach  ( W e i g e r t ) . Relativa deformação  do bulbo com achatamento lateral
Fig. 6 — Nivel da zona de passagem bulboprotuberancial  ( W e i g e r t ) . — O tumor  se apresenta multiforme
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Referências

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