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Da antigüidade

da arte real

S

e você acessar a Internet através de um site de busca internacional, e

pesqui-sar a palavra masonry, ou maçonarie, verá com surpresa uma longa lista de

diferentes métodos de construção civil. Entre os inúmeros títulos, aparecerá

também “Free Masonry”, e aqui então, serão encontrados os dados das Grandes

Lojas norte americanas, Grandes Lojas e Grandes Orientes da Europa, onde, em

alguns casos, é possível visitar o interior de suntuosos templos, construídos em

di-ferentes e ricos estilos arquitetônicos, bem como poderá obter informações sobre a

Potência, sua história, e informações sobre a Instituição Maçônica.

Aula 1

Em muitas obras sobre maçonaria aparece uma interpretação histórica equivocada provavelmente originada dessa dificuldade semântica.

Objetivos:

¡ Identificar os diferentes significados da palavra “Maçonaria”;

¡ Traçar a possível origem da Instituição a partir da cultura medieval.

Assim, a maçonaria milenar citada por muitos autores só é uma verdade histórica se a referência for a arte de construir, sobre a qual não é possível estabelecer uma época precisa para seu início como atividade humana, sendo encontrada com técnicas e estilos diferentes entre todos os povos conhecidos.

A palavra inglesa masonry (em francês maçone-rie) refere-se tanto à arte do construtor quanto à instituição moderna que chamamos pelo mesmo

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Apenas dentro deste significado restrito po-demos dizer que egípcios, chineses, indianos, persas, gregos, romanos, incas, maias, astecas etc. praticavam a maçonaria, tendo excelen-tes mestres maçons, pois suas construções atravessaram eras e mostram aos nossos olhos evidências de técnicas e conhecimentos insuspeitos. Contudo, não existem dados his-tóricos que permitam admitir-se a existência de qualquer organização, mesmo operativa, atuando continuamente através dos tempos passando de uma civilização para outra. Certamente as técnicas de construção desen-volvidas em alguns locais, apesar do sigilo em que eram mantidas, acabavam sendo copia-das pelos arquitetos, engenheiros e mestres de obras (mestres maçons) das regiões vizinhas. Também a razão nos leva a considerar a necessidade de uma organização complexa para manter em andamento construções de grandes proporções como pirâmides, templos e palácios. É certo que em cada local onde estas admiráveis construções foram erigidas, as centenas e, às vezes, milhares de trabalha-dores impunham uma organização, direção

e supervisão, para que a obra pudesse ser de-senvolvida com sucesso. Entretanto, todas as organizações que eram criadas e muitas vezes dissolvidas ao término da obra tinham fina-lidade eminentemente prática eram grupos de obreiros envolvidos numa edificação, no desenvolvimento de um projeto arquitetôni-co, não constituindo qualquer aspecto, ainda que embrionário, do que veio a ser a chamada Franco-maçonaria.

A arqueologia nos dá notícias da arte de construir, já com requintes e técnicas apuradas desde épocas remotas: um grupo de arqueólo-gos trabalhando na Anatólia, sul da Turquia, no início da década de sessenta, desenterrou as ruínas da mais antiga cidade até então conheci-da no mundo. (As Grandes Civilizações Desaparecidas, Edição de Seleções do Reader’s Digest- Lisboa 1981.)

Na localidade de Çatal Hüyük, a escavação de uma colina revelou restos de alicerces, paredes e muros de um complexo de casas geminadas cuja datação indicou o período entre 7200 a.C. e 6300 a.C. Podemos fazer uma idéia do que isso significa se lembrarmos

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que o início da história egípcia como uma única nação data de cerca de 3200 a.C. Esta enorme antiguidade ultrapassa em mais de três mil anos a data que, à época de An-derson, acreditava-se como sendo a da criação do mundo1 e que foi tomada como a origem

do calendário maçônico.

A arquitetura

entre os vários povos

Desde cerca de 3500 a.C., na mesopotâmia, homens criaram civilizações, erigindo templos e palácios, muitos dos quais, ao surgirem à luz deixavam entrever o apurado senso arquitetôni-co e técniarquitetôni-co alcançado por seus arquitetôni-construtores. Assim também a civilização persa, o mundo

greco-romano, as civilizações da Birmânia, Tailândia, Índia, China e Américas nos

dei-xaram registros claros da incrível capacidade criadora no desenvolvimento dos diferentes

estilos e técnicas arquitetônicas de cada povo ou nação.

Os construtores do passado cultivavam uma men-talidade mais geométrica do que matemática, em relação às medidas executadas.

Estavam mais interessados nas relações entre as medidas e suas proporções do que na ex-pressão numérica do valor medido. Assim, o método utilizado para o traçado das plantas das edificações iniciava-se com um desenho gerador simples; um círculo, triângulo ou quadrado a partir do qual, apoiando-se o compasso em pontos determinados, traça-vam-se as linhas e obtinham-se as proporções e dimensões da estrutura a ser edificada. Os egípcios e gregos utilizavam na

constru-ção de seus templos proporções geométricas relacionadas com os retângulos em que um dos lados tinha como medida a unidade, e outro tinha o valor das raízes quadrada2 de

2, 3 e 5, segundo a figura 1 a seguir.

Egípcios: São por demais conhecidos de todos

os feitos da arquitetura egípcia, que até hoje maravilha a todos com suas pirâmides, templos e esculturas que dificilmente poderiam ser hoje imitados, apesar de toda a tecnologia atualmente disponível.

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A figura 1 é formada traçando-se primeiramente um quadrado de lado um. A seguir toma-se a sua diagonal, e com o centro do compasso no canto inferior esquerdo, transfere-se a medida para a linha da base, traçando-se uma perpendicular a partir do ponto obtido, formando assim um gulo. Repetindo-se o processo, obtemos os retân-gulos com lados e .

Uma outra proporção muito utilizada na an-tiguidade, especialmente entre os gregos, era a chamada seção dourada. Ela surge sempre

que a relação entre duas medidas é tal que a razão entre a maior e a menor for igual à sua soma e a maior. Ela pode ser obtida facilmen-te através da geometria:

Traça-se um quadrado duplo e divide-se o primei-ro ao meio; toma-se a diagonal da segunda meta-de e transfere-se sua medida para a linha da base. O ponto obtido nesta linha está a 1,618 unidades da origem da mesma, e este é o valor da seção dourada como visto na figura 2.

Seu uso, comum entre os gregos, esteve também presente durante o Renascimento Italiano, e até em nossa época o arquiteto francês Le Corbusier fez uso desta proporção em uma de suas obras.

Um dos arquitetos de maior renome na an-tiguidade, cuja obra forneceu as bases para a renovação arquitetônica renascentista, foi Marcus Vitrúvius Pollo.3

Vitrúvio, como ficou conhecido, foi arquiteto, engenheiro e filósofo.

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Figura 2 A Seção Dourada

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Figura 1 Proporções geométricas

utilizadas pelos egípcios e gregos

A ele se deve a organização das conhecidas ordens de arquitetura: toscana, jônica, dórica, coríntia e compósita. Sua obra, conhecida como Dez Livros de Arquitetura, era

reverenciada e seguida em todo o Império Romano, e cerca de mil anos mais tarde serviu como fonte de estudos para inúmeros arquitetos italianos da renascença que, através de suas obras, reencontraram os valores estéticos há muito perdidos no desaparecido mundo greco-romano.

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provável é que alguns dos membros mais cultos do Collegium Fabrorum (a escola romana que designa as atividades de construção) se preocu-passem com considerações filosóficas tidas como parte integrante do contexto de sua ocupação, assim como o negócio prático da construção.

Conta-se que Pitágoras foi o primeiro a descobrir que cordas distendidas cujos com-primentos estejam entre si como uma série matemática harmônica, quando tangidas produzem um acorde agradável ao ouvido,

harmônico.

Assim, era possível traçar um paralelo entre os acordes harmônicos e as proporções geo-métricas de um edifício. De acordo com as antigas práticas, cada construção deveria ter as proporções correspondentes ao fim a que se destinava: templo, palácio, quartel etc. Quando um arquiteto não iniciado nestes Para Vitrúvio tanto o universo quanto o ser

humano haviam sido criados segundo princí-pios correlacionados. A representação do corpo de um homem em conjunção com a planta de um edifício, comum nas catedrais medievais, ficou conhecida como o Homem

Vitruviano. Deve-se ao

grande arquiteto ro-mano não apenas o planejamento de tem-plos e edifícios públi-cos, mas também a planta completa de uma cidade ideal, rigo-rosamente geométrica.

Comentando as conotações místicas atribuí-das por Vitrúvio às proporções ideais dos edifícios, nos diz Macnulty:

Não há dúvida que o pensamento encarnado por Vitrúvio teve uma profunda influência sobre a prática arquitetônica da antiga Roma, assim como na do renascimento, todavia, seria insensa-tez sugerir que os eficientes canteiros que constru-íram as cidades do império romano fossem todos sérios estudantes dos antigos mistérios. O mais

MACNULTY, W.K. Maçonaria, Edições Del Prado, 1996.

Cordas com comprimentos expressos pelas razões 3: 4: 5 produzem o acorde harmônico mais simples.

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conhecimentos construía, por exemplo, um templo cujas proporções seguissem apenas o senso estético do construtor, produziria com sua construção um efeito “dissonante” aos olhos de um iniciado. Considerava-se que, se as proporções não produzissem o acorde cós-mico correspondente à finalidade da constru-ção, por certo produziriam efeitos desastrosos nas reuniões realizadas em seu interior.

Louis Charpentiercomenta que as construções

de pedra tinham a capacidade de, pela geome-tria de sua construção, armazenar e amplificar ondas telúricas, produzindo uma concentra-ção de energias positivas emanadas da terra. Esta seria a razão das proporções minuciosas das catedrais medievais. Diz também que os

beneditinos haviam descoberto um método

de intensificar essas energias terrestres através do som, com canto gregoriano, que harmoni-zado à geometria do edifício produziria níveis de consciência mais elevados.

Vemos assim que a “Maçonaria milenar” não é a Ordem maçônica como nós a conhece-mos, ou qualquer organização embrionária a

ela assemelhada, mas simplesmente, a arte de construir; a milenar arquitetura.

Veja o que Anderson os ensina, na introdu-ção, de sua famosa obra:

“Adão, nosso primeiro pai criado a imagem de Deus, o Grande Arquiteto do Univer-so, deve ter tido as ciências liberais, particularmente a geometria escrita em seu co-ração..” (ANDERSON, James, As Constituições dos Franco Maçons, de 1723. A Fraternidade, São Paulo, 1982, p.1)

E segue daí, citando a instrução de Adão a seus filhos, passando pelas antigas civiliza-ções, dando a entender a existência contínua de uma ordem maçônica universal desde os tempos mais remotos da história. Outros autores seguiram-se a Anderson, ampliando e aprofundando suas afirmações, citando-se mutuamente, a ponto de, pela repetição em diferentes fontes, as fantasias acabarem assu-mindo para alguns leitores aspecto de

verda-Louis Charpentier, citado por Nigel Pennick - PENNICK, Nigel, op. cit., pp.68-73.

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de. Mesmo o texto de Anderson, as famosas Constituições refere-se aos costumes dos construtores operativos. Sua “história” da maçonaria nada mais é que um relato ima-ginativo do desenvolvimento da arte de cons-truir através de diferentes povos e épocas. Quando ele fala em maçom, refere-se ao

construtor operativo, ou aceito, mas seu conceito nada tem em comum com aquele hoje atribuído a essa palavra, como atesta a simples leitura de sua obra:

“...E porque se acredita racionalmente que o glorioso Augusto tornou-se o Grão Mestre da Loja de Roma, pois além de patrocinar Vitrúvio, contribuiu bastante para o bem-estar dos com-panheiros, como o testemunham os numerosos monumentos construídos em seu reinado, cujas ruínas se tornaram o Modelo e Padrão da verdadeira maçonaria em todos os tempos futuros, pois são verdadeiramente o epítome da arquitetura asiática, egípcia, grega e sicilia-na, que designamos comumente sob o nome de estilo de Augusto, e que não fazemos agora senão tentar imitar, sem que tenhamos atingido sua perfeição.” (ANDERSON, 1982, pp.25, 26)

Observe-se que para Anderson, a verdadeira maçonaria, referencial para todas as épocas

fu-turas, resumia-se em um estilo arquitetônico. Mais adiante ele acrescenta outras informa-ções à respeito do que entendia por maçom:

“Não se deve esquecer que os pintores, assim como os escultores, foram sempre considerados bons maçons, como o foram os construtores, os talhadores de pedra, os pedreiros, os carpinteiros, os marceneiros, os tapeceiros ou fabricantes de tendas, da mesma forma que um grande nú-mero de outros artesãos que se poderia indicar, e que trabalhavam segundo a geometria e as regras da construção.” (ANDERSON, 1982, p.25, 26)

Ao comentar as obrigações e leis examinadas pelas autoridades à época do rei Henrique , ele cita um manuscrito antigo, onde existe referên-cia ao tipo de instrução dado aos aprendizes:

“Em outro manuscrito mais antigo, lemos: Que quando o Mestre e os vigilantes se reúnem em loja, se for necessário, o Xerife do condado, ou o Prefeito da cidade, ou o Almotacel da vila, na qual se realize a assembléia, deverá ser feito companheiro e associado ao Mestre, para

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assis-ti-lo contra os rebeldes, e para salvaguardar os Direitos do Reino.” (ANDERSON, 1982, p.34.).

“Que quando os aprendizes são feitos, eles serão recomendados para não serem ladrões, nem receptadores, para trabalharem honestamente pelo salário, amar seus companheiros como a si próprios, e serem fiéis ao Rei da Inglaterra, ao Reino e à Loja.” (ANDERSON, 1982, p.34.).

Concluindo a parte “histórica” de seu texto, Anderson novamente deixa claro que toda

sua exposição até então tem por objetivo enaltecer a arte de construir, não a institui-ção hoje conhecida pelo mesmo nome:

“Em resumo, numerosos e grossos volumes seriam necessários para conter os múltiplos e esplêndidos exemplos da potente influência da arte de construir desde a criação, em cada época, e em todas as nações, que poderiam ser coligidos nas narrações de historiadores e dos viajantes: mais particularmente naquelas partes do mundo onde os europeus mantém

re-lações e fazem o comércio, de tais ruínas antigas, espaçosas, curiosas e magníficas colunatas que foram descobertas pelos pesquisadores, que não podem deplorar o suficiente as devastações gerais dos godos e dos muçulmanos; devemos concluir, que nenhuma arte jamais recebeu tan-to incentivo como esta; pois verdadeiramente nenhuma é tão geralmente útil à humanidade.”

(ANDERSON, 1982, pp. 44-46.)

O autor Anderson, orgulhosamente, apre-senta longa lista de edifícios públicos e parti-culares erigidos “Depois do renascimento da maçonaria romana na Grã-Bretanha”.

A introdução de elementos não-vinculados ao ofício, os “aceitos”, foi gradativamente alte-rando hábitos, acrescentando interpretações, trazendo novos símbolos, numa gestação que traria à luz a nova maçonaria, chamada es-peculativa, na qual cada maçom empenha-se em construir a si mesmo e, em assim fazendo, como pedra polida, bem esquadrada, insere-se positivamente no edifício social humano.

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Sabe-se que os exércitos do Império Romano se faziam acompanhar por um grupo de construtores. No processo de as-sédio e tomada de uma cidade, muralhas eram derrubadas e edificações destruídas. Cabia aos construtores a função de restaurar os edifícios necessários para o funcionamento da nova ad-ministração, agora sob a pax romana. Costuma-se citar Numa Pompílio como Costuma-sendo o criador dessa corporação de construtores, que constitui uma das alegadas origens da maçonaria.

Esses autores parecem ignorar que as invasões saxônicas promoveram uma destruição geral das construções romanas, com o extermínio de grande parte da população e a erradicação da arte de construir. Um testemunho disso é o fato de, nos cerca de 200 anos que se se-guiram, as construções serem executadas em madeira e palha (até cerca do ano 700).4

Antigas tradições relatam também que após a queda de Roma, membros do collégium Assim, podemos dizer que:

Os construtores do passado foram maçons, do mesmo modo que dizemos que todos os homens que trabalham em embarcações no mar são mari-nheiros, ou de que todos aqueles que se dedicam à pesca são pescadores, não decorrendo daí a exis-tência de qualquer organização comum a todos eles, uma marinha, que tenha transmitido instru-ções continuamente de uma nação para outra.

É evidente que, pela identidade de profissão, esses marujos têm em comum, mesmo em di-ferentes partes do mundo, comportamentos, técnicas, e até instrumentos idênticos.

Raízes na cultura medieval

Alguns autores sugerem ter a maçonaria penetrado na Bretanha através das legiões romanas invasoras da Inglaterra e, mantida oculta, afloraria nas corporações de constru-tores medievais.

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fabrorum remanescentes procuraram refúgio

numa ilha situada no lago de Cuomo, no nor-te da Itália. Dali nor-teriam levado sua arnor-te para outras partes da Europa, tornando-se conhe-cidos como mestres comacinos5.

A Europa medieval era composta por uma amálgama de povos constituídos pelas cha-madas Tribos bárbaras associadas aos

rema-nescentes do antigo Império Romano. Cos-tuma-se datar a queda de Roma do ano 476 d.C., com a tomada do poder imperial pelo germânico Odoacro. Entretanto, o esfacela-mento da civilização romana foi um processo em curso por todo o século , durante o qual os limites europeus do império começaram a ser ultrapassados em invasões sucessivas de vândalos, alamanos, suevos, e muitos outros.6

Esses povos, herdeiros da herança romana, não possuíam acervo cultural que lhes per-mitisse reconstruir e restabelecer a civilização que destruíram no processo de conquista.

Houve, assim, uma abrupta queda no processo civilizatório, a qual se refletiu em todas as mani-festações humanas, tais como: manufatura de ins-trumentos, jóias, processos artesanais, e nas artes. As técnicas de construção foram perdidas, sendo até a maneira adequada de talhar a pedra deixada no esquecimento, de modo que também no con-tinente europeu, por um longo período, multipli-caram-se as construções de madeira, mesmo para edifícios públicos e igrejas.

Assim, o cristianismo, alçado à condição de religião do Estado em 381 d.C. pelo impe-rador Teodósio, gradativamente se expandiu, firmando-se entre os múltiplos e cambiantes reinos que se formavam.

Aqueles povos, originalmente com suas pró-prias concepções religiosas, convertiam-se ao cristianismo num processo em grande parte dos casos compulsório, acompanhando a conversão de seu chefe, líder político ou rei. Por esta razão, não tendo alterado suas con-vicções, mantinham muitos de seus antigos

costumes e crenças.

Costumes e crenças. Os quais num processo

sincrético acabaram por ser, em muitos casos, incorporados pela Igreja, com a inclusão de suas festas religiosas no calendário eclesiástico, e seus deuses, com nomes trocados, alçados ao panteão dos Santos Católicos.

Mestres Comacinos: Esses mestres foram

ar-quitetos de renome em sua época, mas nada indica que tenham qualquer ligação direta com a maçonaria.

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Com o apoio dos soberanos francos inician-do com Clóvis (ou Meroveu), fundainician-dor da dinastia merovíngia, convertido ao cristia-nismo, a igreja progride em seu trabalho de evangelização dos bárbaros.

Em sua expansão o catolicismo conquistava não somente as almas dos europeus, mas também se estabelecia firmemente como po-der temporal, possuindo domínio sobre gran-des áreas de terra, com seus bispos e cardeais tendo influência permanente junto a nobres, senhores feudais e reis.

Outras dinastias continuaram apoiando a Igreja, e o famoso Carlos Magno, coroado em 880 d.C. pelo papa Leão III Imperador do Sacro Império Romano-Germânico, era considerado o eleito de Deus na terra. Ca-rolus Magnus, como era chamado em latim, construiu sua capital em Aachen, na atual Alemanha, para onde atraiu artesãos e sábios de toda a Europa. Foi nos mosteiros patro-cinados por ele onde se desenvolveu a repre-sentação das letras minúsculas do alfabeto, chamadas minúsculas carolíngias.4

Na mesma época foi criado o estilo de canto li-túrgico chamado gregoriano. Em sua corte

es-tudavam-se latim, grego, matemática e astro-nomia; e sob sua orientação igrejas e mosteiros abriam escolas em suas dependências. Toda A data do nascimento de Jesus, até

o século IV celebrada no dia 6 de janeiro, passou a ser comemorada no dia 25 de dezembro, festa do Natalis Solis Invictus, o nascimento do sol, correspondendo ao solstício de

inverno, dia a partir do qual os períodos de insolação vão aumentando e o sol “cresce em força e vigor.” Esta data, amplamente comemorada, fazia parte do culto do Sol Invictus, mesclada com o mitraísmo, e era adotado pelo

imperador Constantino, que em 321 d.C. já havia decretado como dia de repouso o “venerável dia do sol”, coincidindo com o domingo cristão.

BAIGENT, M., LEIGH, R., LINCOLN, H. O Santo Graal e a Linhagem Sagrada. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1993

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essa efervescência cultural foi chamada pelos historiadores de “Renascimento Carolíngio”. No ano de 910 Guilherme, o Pio, Duque de Aquitânia, fundou na França o convento de Cluny,5 dentro das normas beneditinas,

constituindo um marco de referência para outras sociedades monásticas e um impulso renovador na vida intelectual, com a criação de escolas e o desenvolvimento das artes. Durante o período medieval os mosteiros foram os centros onde a arte, literatura, filo-sofia e ciência ainda eram cultivadas, ainda que precariamente. O analfabetismo era generalizado tanto nas classes servis quanto nas senhoriais e apenas os monges, no seu afã de copiar as escrituras sagradas e os textos dos filósofos antigos aceitos pela igreja, man-tinham acesa a luz do trabalho intelectual durante aquele período de quase mil anos, da queda do Império Romano à renascença do século .

A limitação intelectual trazida pelo isolamen-to das comunidades feudais isolamen-torna-se visível nas ilustrações bíblicas produzidas nos

mos-teiros, onde egípcios e hebreus são representa-dos com trajes europeus da época e nação do artista, o mesmo ocorrendo com as cidades (supostas bíblicas) retratadas.

Devido às péssimas condições de vida e ao desconhecimento de noções de higiene, as-sociadas às constantes guerras, as populações medievais eram submetidas a freqüentes sur-tos de doenças que dizimavam quase com-pletamente os habitante de grandes áreas. A peste bubônica e a cólera eram freqüentes. O monge de Cluny, Raoul Glaber, narra numa linguagem vívida os horrores de uma destas epidemias ocorrida entre 1032 e 1034:

O autor citado em sua obra narra que ... “A fome estendeu de tal for-ma sua destruição que se poderia acreditar no desaparecimento de todo o gênero humano”... e , adiante : “as chuvas incessantes embeberam a terra de tal modo que durante três anos não foi possível abrir sulcos capazes de receber sementes. E, no tempo da colheita, toda a superfície dos cam-pos fora recoberta por ervas daninhas. Durante este período, depois de consumirem pássaros e

Operários trabalham na construção de uma igreja soba as ordens do imperador Carlos Magno

Monges trabalhando em sua biblioteca. Gravura de uma edição de 1494 do livro Diálogos sobre o poder dos imperadores e dos Pontífices, de Guilherme de Ocham.

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animais selvagens, os homens passaram a reco-lher, transtornados pela fome, toda a espécie de carniças e coisas terríveis de se dizer... Viajantes incautos eram assaltados por homens mais robustos, que lhes mutilavam os membros, co-ziam-nos e os devoravam. Muitas pessoas que migravam a fim de fugir do flagelo, ao encon-trar hospitalidade eram assassinadas e serviam de alimento aos que as haviam acolhido.” (Histó-ria das CiviliZações, Abril, Vol II, 1975.)

Não é de admirar que, não tendo explicações para suas continuadas calamidades, as pessoas apelassem para superstições, encarando todo evento maléfico como castigo divino, que só poderia ser sustido através de expiações.

Acresciam-se às penas do mundo físico as ameaças de condenação ao eterno fogo do in-ferno que pairava sobre o pecador impeniten-te, o que dava margem ao desenvolvimento de fanatismos extremados, em paralelo com uma busca desenfreada de soluções mágicas para seus problemas.

Foi dentro desse contexto socio-cultural que surgiram as corporações operativas, coorde-nando as relações de trabalho e ensino-apren-dizagem profissional no continente europeu por vários séculos.

Bem, vimos então nesta aula os principais fatos que marcaram a história inicial da ma-çonaria, os diferentes significados da palavra e sua origem a partir da cultura medieval. Na continuidade discutiremos as corpora-ções operativas como origem da maçonaria e a configuração da maçonaria atual como mutação da Operativa.

Atos de penitência, procissões, roma-rias e cultos místicos desenvolviam-se, criava-se um santo para cada ocorrên-cia da vida, numa necessidade frenética de proteção e orientação.

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Corporações

e Maçonaria

F

undamentados em uma quantidade respeitável de indícios, os autores

mo-dernos, que fazem da pesquisa histórica sua referência, têm identificado a

origem da maçonaria entrelaçada com as raízes das corporações de

constru-tores surgidas no período medieval, distante das fábulas e quimeras que costumam

projetar essa origem sobre um passado remoto. Alguns deles admitem a

contribui-ção trazida do Oriente pelos participantes das cruzadas. Inseridos naqueles

monu-mentais agrupamentos de pessoas envolvidos na aventura de livrar a Terra Santa

dos “infiéis”, e enriquecer com a pilhagem de suas riquezas, havia um corpo de

carpinteiros, pedreiros e canteiros acompanhando os cruzados sendo encarregados

da restauração das edificações destruídas nas batalhas, da construção de pontes e

fortificações.

Aula 2

Objetivos:

¡ Identificar as corporações operativas como ori-gem da Maçonaria;

¡ Configurar a maçonaria atual como mutação da Operativa, ocorrida inicialmente na Inglaterra.

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“Eles introduziram na França uma geometria usada no corte de pedra (le trait), a estereoto-mia, que fundamenta a técni-ca de construção das igrejas góticas”.1

Esses construtores foram a origem da Compagnonnage ou

Compagnonnique, a sociedade dos

compa-nheiros (compagnons) possuidora de ritos especiais de iniciação, acompanhados de pre-ocupação quanto ao comportamento dos seus membros, e que se multiplicou em todas as nações européias por todo o período medie-val, sobrevivendo em alguns deles até a Idade Moderna.

Entre os autores defensores da opinião comen-tada acima está Joules Boucher, que nos diz:

As corporações obreiras (em francês compag-nonnage) e a maçonaria parecem saídas de um mesmo tronco e, à medida que a maçonaria se desenvolvia, as corporações obreiras diminuíam.

Estas corporações, guildas ou grêmios, em cada uma de suas especificações, congregavam ope-rários artesãos e comerciantes em organizações que tinham como objetivos principais a proteção mútua, a manutenção de direitos adquiridos e o estabelecimento da qualidade dos serviços ou produ-tos comercializados. Elas regulavam também a formação profissional e prestavam assistên-cia soassistên-cial a seus membros.

Segundo Ruy Gama, As primeiras associações

conhecidas deste tipo apareceram nas cidades ale-mãs e britânicas no século XII e finais do século anterior sob a forma de guildas religiosas e sociais de artesãos e comerciantes, agrupando tecelões, pescadores, curtidores etc. Neste mesmo tempo apareceram também na França e Espanha.

O exercício das profissões no âmbito das ci-dades medievais veio a ser controlado pelas corporações, só sendo permitido a atuação de elementos a elas subordinados.

BOUCHER, Joules. A Simbólica Maçônica, Pensa-mento. São Paulo, 1979.

GAMA, Ruy. A Tecnologia e o Trabalho na História. Nobel/Edusp, 1986. p. 84.

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Em meados do século , no desenvolvi-mento de sua organização, as corporações adquiriram, na maioria das cidades, o direito de constituir suas próprias autoridades, ten-do a partir de então reconhecimento oficial, refletindo assim sua influência no meio social urbano.

Um aspecto interessante das atividades de-senvolvidas no âmbito das corporações, era

constituído por uma atividade que reunia aspectos inusitados, mistos de cultura e reli-giosidade.

A hierarquia existente nas corporações inicia-va-se com o aprendiz, geralmente um jovem com idade entre 12 e 15 anos. O aprendiz re-sidia com seu mestre e existia uma taxa a ser

paga pelos pais do aprendiz como remunera-ção do mestre. Após o transcurso de alguns anos, sendo aprovados pelos seus mestres, os aprendizes ascendiam ao nível seguinte, dos oficiais (companheiros).

Corporações: além daquelas inerentes aos seus

objetivos já citados

Taxa: O valor desta contribuição era estabelecido

pela corporação, a qual também determinava o período do aprendizado

Um exemplo disto é o fato ocorrido em Milão ao arquiteto Bruneleshi, em 1434 : No momento em que o famoso domo estava para ser concluído, ele foi preso a pedido da corporação de pedreiros à qual tinha, por negligência, deixado de se filiar.”

PALOU, Jean. A franco maconaria simbólica e iniciática, Pensamento, 1964. p. 26)

Cabia às corporações a representa-ção dramatizada de eventos bíblicos, chamados mistérios cristãos. W.H.G. Harmitege, citado por Ruy Gama, considera essas encenações como remanescentes dos collegia romanos, ou das festividades de origem germâni-ca, cabendo a cada guilda a representa-ção de um evento particular. Assim, em York, os armeiros tinham a responsabi-lidade pela representação da expulsão de Adão e Eva do paraíso e os constru-tores de barcos, juntamente com os pescadores, encenavam o episódio da construção da arca de Noé e o dilúvio.

GAMA, Ruy. op. cit. pp. 101-103

Neste nível o trabalho do companheiro já era

executado mediante contrato formal e juramen-tos prescrijuramen-tos pelas normas particulares de cada corporação.

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No posto mais elevado na hierarquia das corporações, destacavam-se os mestres. Submetendo-se a exame pelos membros da corporação, o candidato a mestre apresen-tava uma obra de sua execução. Uma vez aprovado, o novo mestre estaria capacitado

então para constituir sua própria ofici-na e, por sua vez, iniciar seus aprendizes. As corporações determinavam o número má-ximo de mestres que poderiam atuar no inte-rior de uma cidade, na proporção do número de habitantes desta, para que não ocorresse excesso na oferta de trabalho ou produtos.

Essa organização especial na forma de transmitir conhecimentos técnicos dentro dos vários ofícios foi uma característica medieval, não existindo quaisquer indícios de prática similar no mundo greco-romano que o antecedeu.

No que se refere às suas práticas iniciáticas, havia o costume de se manterem em segredo

os deveres de todas as corporações, sendo as instruções transmitidas oralmente, mesmo aquelas referentes a conhecimentos específi-cos de geometria.

O que no passado era segredo de profissão,

foi aos poucos surgindo nos tratados de geo-metria e estereotomia editados principalmen-te a partir do século  com Gerard Desarges, Mathurim Jousse e outros.

As corporações na Europa

Jean Palou2 sugere também uma origem

comum para a maçonaria e as corporações medievais.

Parece todavia, para falar só no Ocidente, que a maçonaria e o companheirismo não passaram no início de uma única e mesma organização, tronco comum tradicional, do qual deveriam sair os dois ramos numa época pouco precisa, muito provavelmente durante a Renascença.

(PALOU, Jean, A franco maconaria, simbólica e

iniciá-tica. Pensamento, 1964. p. 10.)

Segredo: Como uma alternativa auxiliar ao

processo de memorização, utilizavam-se canções, em cujas letras, veladamente, eram registradas demonstrações de teoremas geométricos.

Segredo de profissão: cuja revelação era cercada

de ameaças de punição explicitadas durante os juramentos iniciáticos.

Ao mestre pertenciam a oficina, os instrumentos e os materiais que seriam utilizados por sua equi-pe de aprendizes e companheiros

A prática continuada de cortes na pedra de ângulos e planos, registrada na mente do construtor, pode ter sido a origem da geometria descritiva.

(18)

E Marius Lepage3 complementa:

Os historiadores Ingleses observaram a notável semelhança dos catecismos ingleses primitivos com os rituais de iniciação dos companheiros. Historicamente não há a menor dúvida de que na maçonaria, como em muitas outras coisas, podemos observar uma dupla corrente: do con-tinente para a Inglaterra (na Idade Média), de-pois da Inglaterra para o continente, no fim do século XVII. A velha maçonaria das old charges é filha legítima das organizações companheiras continentais, principalmente alemãs e france-sas. (LEPAGE, Mahos. História e doutrina dA franco

Maconaria. Pensamento,1978. pp. 26, 27.)

Além do esforço para conseguir autonomia, ampliando seus direitos, as corporações pro-curavam também ter voz ativa na adminis-tração das cidades, o que, em alguns locais, gerou forte oposição por parte dos dirigentes municipais, provocando a proibição de sua atuação. Em 14 de março de 1655, em Paris, a Sorbonne publicava uma condenação às

reuniões de companheiros, e nos comentários anexos ao decreto condenatório podemos ler:

Nós, abaixo assinados, Doutores da sagrada faculdade de Teologia de Paris, achamos: 1o) Que nessas práticas há pecado de sacrilégio,

de impureza e de blasfêmia contra os mistérios de nossa religião.

2o) Que o juramento que fazem de não revelar

essas práticas, mesmo na confissão, não é justo nem legítimo, e não os obriga de modo algum; pelo contrário, que eles são obrigados a acusar a si próprios desses pecados, e desse juramento no confissão.(...)

Sumário das práticas ímpias, sacrílegas e supers-ticiosas que são executadas pelos companheiros seleiros, sapateiros, canteiros, cuteleiros e chape-leiros, quando recebem os chamados companhei-ros do dever. (BOUCHER, Joules. A simbólica maçonica, Pensamento, São Paulo, 1979, p.230.)

(19)

A seguir, após um comentário desairoso sobre o comportamento social dos companheiros, continua:

...Eles têm entre si uma jurisdição; elegem oficiais, um preboste, um lugar-tenente, um escrivão e um sargento; correspondem-se pelas cidades e têm uma senha pela qual se reconhecem e que é mantida em segredo, e formam por toda parte uma linha ofensiva contra os aprendizes de seu ofício que não sejam de sua facção, espancam-nos, mal-tratam-nos e solicitam para que entrem em sua companhia. As impiedades e sacrilégios que cometem são diferentes, de acordo com os diferentes ofícios. Todavia, tudo o que se segue lhes é comum: primeiro, fazer com que o que vai ser recebido jure sobre os san-tos evangelhos que ele não revelará nem a pai, nem a mãe, mulher ou filho, sacerdote ou clérigo, nem sequer na confissão o que irá fazer e ver fazer; e para tanto escolhem uma taberna, que eles chamam de mãe, porque é lá que costumam se reunir como na casa de sua mãe comum, na qual esco-lhem duas salas cômodas, que se

comuni-quem, uma das quais serve para as abomi-nações e outra para o festim.” “Esse preten-so Dever consiste em três palavras: honrar a Deus, Conservar a fortuna do Mestre e manter os companheiros. Mas, ao contrário, esses companheiros desonram grandemente a Deus, profanam todos os mistérios de nossa religião, arruinam os mestres (...) e se arruinam a si próprios pelo tributo que eles cobram para ser usado em bebidas. (...)

Segundo o mesmo autor, dentre os vários De-veres em que se agrupavam os companheiros, o que mais provavelmente estaria ligado às origens da maçonaria seria o Dever de Liber-dade, reunindo os canteiros, que nas lojas

trabalhavam a pedra mole, a pedra de canta-ria, trazida das pedreiras pelos pedreiros

ru-des, os rough stone masons, e tinha entre suas fábulas iniciáticas uma que fala da morte de um personagem chamado Mestre Jacques, Hiram, ou Adonhiram, numa história de crime e castigo, onde se fazem referências à construção do templo de Salomão com suas duas colunas Jakin e Boaz, conforme narra o texto bíblico.

A pedra de cantaria: free stone de onde se

origi-nou o termo free stone mason, mais tarde simplifi-cado para free mason

(20)

As condenações das práticas corporativas não se restringiam à França. Na Alemanha, Suíça, Ingla-terra, Holanda, em repetidas ocasiões, proibiam-se as reuniões dos operários, bem como, suas cerimô-nias e festividades de iniciação.

Os outros ofícios também fundamentavam suas cerimônias de recepção de novos mem-bros em adaptações de rituais católicos e tex-tos bíblicos conhecidos, aos quais referiam os objetos simbólicos presentes na sala.

O que se pode observar nesses e em outros documentos, é a presença constante do cris-tianismo católico nas práticas iniciáticas ope-rativas, sendo essa a razão de sua condenação, pois em assim fazendo estavam, segundo os Doutores da Sorbonne, escarnecendo das cerimônias que lhes serviram de inspiração. Completamente ausentes estão as referências aos mistérios gregos e romanos, tão queridos de certos autores, mas desconhecidos dos incultos maçons operativos, que analfabetos, nada sabiam da cultura e costumes de civili-zações antigas.

A imagem de circunspectos pedreiros, cons-cientes de significado esotérico de suas funções e símbolos no período operativo constitui completa ficção. Os rudes pedreiros construtores de catedrais, abadias e castelos, não eram mais “dotados de conhecimentos esotéricos” do que o comum “peão” de obras de nossos dias, como deixam transparecer todos os documentos ora conhecidos sobre aquela época.

Um bom exemplo desse tipo de documento são os “Estatutos dos Canteiros de Ratisbonne:

Klakenfurt, 4 de maio de 1628.

Em nome de Deus o Pai, do Filho, do Espírito Santo e de Santa Maria, mãe de Deus, de seus bem-aventurados santos servidores, os quatro santos coroados de memória eterna, conside-ramos que para conservar a amizade, a união, a obediência, fundamento de todo o bem, de toda utilidade e benefício de todos os príncipes, condes, senhores, localidades e congressos ma-çônicos atuais e futuros, igrejas, casas de pedra

(21)

ou construção, devemos formar uma fraterna comunidade. Isso pelo bem e utilidade de todos os mestres e companheiros do corpo do ofício dos trabalhadores de pedra e dos pedreiros em terra alemã, principalmente para evitar toda discussão, fracasso, inquietação, despesa e da-nos provenientes de desordens e transgressões à boa regra. Obrigamo-nos a cumprir todos os regulamentos pacífica e amigavelmente. Para que nosso empreendimento cristão se mostre de valia em todos os tempos, nós, mestres e companheiros do referido ofício, originários de Spire, Estrasburgo e Ratisbonne, em nosso nome e em nome de todos os outros mestres e companheiros do ofício acima mencionado, renovamos e esclarecemos as velhas tradições e nos constituímos num espírito fraternal em um agrupamento e nos obrigamos a observar fielmente os regulamentos definidos e isso para nós mesmos e para nossos sucessores.

1o Aquele que deseja fazer parte de nossa

orga-nização fraterna deve prometer observar todos os pontos e artigos mencionados nesse livro.

2o Se um trabalhador que empreendeu uma

obra honestamente concebida vem a morrer, é necessário que um mestre, não importa qual, perito na matéria dê continuidade à obra, le-vando-a a bom termo.

3o Caso se apresente um companheiro

compe-tente na matéria que deseja promoção após haver servido naquele ramo, pode-se aceitá-lo.

(RIFFARD, Pierre. A. O Esoterismo. São Paulo, Mandarim, 1996.)

E segue-se uma lista alcançando 19 artigos regulamentando relações de trabalho, salá-rios, atribuição de responsabilidades, sem qualquer alusão a doutrinas esotéricas ou vínculos místicos, além das referências in-trodutórias, que não sabemos se sinceras ou meramente formais. Assim também as an-tigas instruções britânicas, as “Old Charges”, deveres dos antigos maçons, reuniam regras de bom comportamento, definiam as rela-ções do aprendiz com seu mestre e familiares, indicando até regras de etiqueta à mesa.

(22)

Nicola Aslan nos informa que em 1495, na

Inglaterra, o rei Henrique :

Proíbe aos operários e artífices que se comuni-cassem por meio de sinais e toques distintivos, confirmando leis decretadas por Henrique VI. As-sim, desde os fins do século XV até o reinado de Elizabete I, foram decretadas leis que restringiam os direitos de reunião dos operários, privando-os inclusive dos privilégios do monopólio de suas respectivas profissões, bases em que se assentava a organização do trabalho durante a Idade Média. Tais proibições eram periodicamente renovadas.

Apesar de todas as condenações e proibições, as corporações sobreviveram, mas foram per-dendo gradativamente seu prestígio à medida que sua exclusividade, no exercício das profis-sões, foi sendo suprimida e o estabelecimento de empresas individuais desvinculadas das organizações antigas foi recebendo incentivo. Com a evolução das relações de trabalho na sociedade burguesa, a estrutura das corpora-ções de ofício começou a ser vista como en-trave, e , sucessivamente, os países da Europa proíbem a sua existência, oficialmente, por ato de lei, a partir do século ; Itália e Suíça na segunda metade do século, na Fran-ça em 1791, na Noruega, Alemanha, Áustria, Hungria e Espanha elas alcançam o século , e na Rússia encontramos sua mais longa sobrevivência: até a revolução de 1917.

De maçonaria

Operativa para

Especulativa

É na Inglaterra que vamos encontrar a guil-da dos pedreiros, a Free masonry assumindo características próprias, distintas das outras

ASLAN, Nicola. História da Maçonaria - Período Operativo. Aurora.

(23)

Outro documento, mais antigo, não faz

qual-quer referência ao famoso templo:

Este mesmo tema é retomado em manuscri-tos mais recentes, como o Thistle de 1756.

Mackey, citado por Alex Horne nos ensina:

Esta forma primitiva da lenda prevaleceu até talvez todo o correr do século XVII... mas por volta do fim do último século (isto é, o 18o), ou

talvez ainda mais tarde, no princípio do atual (o 19o), a narrativa da origem da

Franco-maçona-ria passou a ser repudiada e substituída por ou-tra em conou-tradição com os velhos manuscritos. Agora ninguém mais acredita que a maçonaria

Esse documento, o Poema Régius ou Poema de Halliwel, datado de 1390, sen-do o sen-documento maçônico mais antigo de que se tem notícia, remete a origem da instituição maçônica à construção da torre de Babel. Nele consta que o primeiro Grão Mestre teria sido Ninrod, o rei construtor da torre e ele teria dado aos pedreiros as primeiras instruções e a regulamentação da confraria.

corporações, e em sua evolução virá a trans-formar-se no início de 1717, na forma atual de maçonaria.

Os documentos mais antigos da velha ma-çonaria inglesa são as chamadas old charges,

as velhas instruções, que em geral enfatizam prescrições comportamentais para os obrei-ros. Uma dessas old charges está registrada no chamado manuscrito Cooke, cujas

data-ções sugerem o ano de 1410 para sua origem,

mas que reúne trechos que parecem ter sido copiados de outros documentos ainda mais antigos4.

Seu conteúdo faz referência à construção do templo de Salomão:

“Na feitura do templo de Salomão, que o rei Davi encetou... Salomão tinha 80 mil maçons trabalhando para ele;... Salomão confirmou as instruções que Davi, seu pai, dera aos maçons. E o pró-prio Salomão ensinou-lhes suas maneiras (isto é, costumes e práticas) que pouco diferem das maneiras ora em uso.”

(24)

se originou da Torre de Babel; o templo de Jeru-salém passou a ser considerado o local do seu nascimento; e a Salomão, não mais a Ninrod, se conferiu a denominação de primeiro Grão-Mes-tre. (HORNE, Alex. O Templo de Salomão na Tradição

Maçônica. Pensamento, 1982).

A razão dessa transferência, como sugere Alex Horne, pode estar ligada ao desejo dos ma-çons especulativos de desvincularem a insti-tuição de um edifício erigido contra a vonta-de vonta-de Deus, e que redundou num castigo (a dispersão e a confusão dos idiomas), e fazê-la remontar à construção de um edifício inspi-rado pelo próprio Deus, para o seu culto. Atualmente os maçons chamam de templo

ao local onde se realizam suas reuniões, e loja à assembléia de maçons que nele se reúne. No passado operativo, entretanto, a loja onde os maçons se reuniam era simplesmente um barracão, ou casa onde os operários se reu-niam para planejar o trabalho, os canteiros preparavam as pedras chegadas das pedreiras para serem usadas na construção.

G. Delavalle assim descreve a loja de Ovieto (Itália):

Era uma casa perto da Catedral, onde os ar-quitetos, pintores, escultores se reuniam para apresentar grande número de seus desenhos e modelos, para executá-los depois de terem sido aprovados pelo tesoureiro e pelos ordenadores dos trabalhos. (PALOU, Jean. A Franco Maçonaria

Simbólica e Iniciática, Pensamento, 1964. pp. 101-103.)

Nada se sabe hoje em dia do ritual de aber-tura dos trabalhos de uma loja operativa, de-vido à inexistência de documentos. Devemos lembrar que a passagem da tradição de boca para ouvido devia-se, além da imposição de segredo já comentada, ao fato de que poucos sabiam ler e escrever. O excesso de zelo dos maçons impunha também que as instruções escritas para serem lidas durante uma inicia-ção fossem queimadas imediatamente após o uso.

George Payne, Grão-Mestre entre 1718/21 reclamava que

(25)

Vários manuscritos valiosos foram muito apres-sadamente queimados por irmãos escrupulosos, para que não caíssem em mãos estranhas. (BATHAN, C. N. Maçonaria Antiga na Inglaterra. CMSB, 1995)

Jean Palou nos acrescenta informações a res-peito da cerimônia de iniciação de aprendizes:

A revista The Speculative Mason apresenta o texto de uma oração aprovada pela assembléia geral dos maçons de Wakefield, no dia 30 de novembro de 1663 e traduzida por J. Reyor: ‘Santíssimo e Glorioso El Shaddaï, Grande Arqui-teto do céu e da terra, doador de todos os dons e todas as graças, que prometeste que quando dois ou três estivessem reunidos em Teu Nome, estarias no meio deles: em Teu nome, nos reuni-mos, suplicamos muito humildemente que nos abençoes em todas as nossas empresas, que nos concedas Teu Espírito Santo, para iluminar nossos espíritos com a sabedoria e a inteligência de nosso Venerável e Digno Ofício, a fim de que possamos conhecer-Te e Te servir como convém e que todas as nossas ações possam contribuir para a tua glória e salvação de nossas almas’. Jean Reyor acrescenta que esta oração existe

também num ritual de abertura dos trabalhos

no grau de Aprendiz. A loja é então aberta no nome do rei Salomão. (Palou, Jean. A Franco

Maço-naria Simbólica e Iniciática, Pensamento, 1964.p.21.)

Durante a iniciação, o neófito deveria prestar juramento após ouvir as instruções, prome-tendo guardar segredo sobre uma “palavra do maçom”, além dos toques e sinais de reco-nhecimento. O juramento era prestado com a mão direita sobre um volume da Bíblia.

Benimelli nos esclarece que: as leis inglesas

dos séculos  e  exigiam formas de juramentos com rigorosas ameaças contra o perjúrio, tais como a “extração e queima das entranhas e o arrojamento ao mar, à distân-cia de um cabo, lá onde o fluxo e o refluxo passam duas vezes em 24 horas”.

Benimelli cita também um manuscrito de Edimburgo, de 1696, relativo aos construto-res de catedrais, que diz:

Juro por Deus e por São João, pelo esquadro e pelo compasso, submetendo-me ao juízo de todos, trabalhar a serviço de meu mestre na honorável loja, de segunda-feira de manhã até

BENIMELLI, J., CAPRILE, G., ALBERTON, V. Ma-çonaria e Igreja Católica - Ontem, hoje e amanhã. Edições Paulinas, 1983.

(26)

sábado, e de guardar as chaves, sob pena de que me seja arrancada a língua por baixo do queixo e de ser enterrado sob as ondas, onde o fluxo e o refluxo passam duas vezes em 24 horas e onde ninguém o saberá jamais.

A par das iniciações e dos trabalhos relativos às construções, desconhece-se o que mais se fazia nas reuniões das lojas operativas.

Não é possível determinar as razões porque foram permitidas as iniciações de pessoas não

diretamente ligadas ao ofício de construção nas lojas maçônicas operativas. Talvez, como acontece hoje em dia, dando-se, por exemplo, o título de bombeiro honorário a alguém que tenha prestado serviços de destaque àquela instituição, tenha sido conferido o título de “maçom honorário” aos patronos e amigos da arte de construir, que passaram a ser chama-dos de “maçons aceitos”. É possível também que a admissão de maçons aceitos – que em geral pertenciam à nobreza, ou eram pessoas de destaque na administração pública – aten-desse a um desejo de proteção e apoio para facilitar os trâmites dos negócios da guilda. Desconhece-se também a época em que essa prática teve início.

As lojas operativas não possuíam o grau de mestre. Um dos companheiros, que adquiris-se experiência suficiente, era escolhido para dirigir a loja, para ser seu mestre. Assim, o

Mestre da Loja não era um grau, mas uma

função. Também existem indicações de que os maçons aceitos, que nada tinham com a arte de construir, não precisavam passar pelo período de aprendizado, sendo admitidos diretamente como companheiros:

A referência mais antiga conhecida está no manuscrito régius e no Cooke, já citados, que nos informam haver a maçonaria penetrado na Inglaterra no tempo do rei Athelstan e que seu filho Edwin, interessado em geometria, filiou-se à corporação dos pedreiros, conce-dendo-lhes regulamentos e estatutos. Os historiadores modernos identificam Edwin como irmão de Athelstan, ex-plicando-se a confusão das relações de parentesco que aparece no documen-to maçônico como oriunda do fadocumen-to de Edwin ter sido o sucessor de Athelstan.

(27)

Está claro, diz Goblet d’Aviella, que não se podia impor a esta categoria de recrutas (pessoas de alta classe) os sete anos de aprendizado comum. São, portanto, recebidos de imediato como fellows (companheiros), reservando-se aos pro-fissionais a aplicação dos termos de aprendiz e, mesmo, de mestre. (BOUCHER, Joules. A Simbólica

Maçônica, Pensamento, São Paulo,, 1979. p.235)

Aos maçons aceitos era dada a oportunidade de participação nas reuniões das lojas, do convívio com o planejamento, os traçados , o simbolismo e o que mais se praticasse em loja. Sabe-se que, por volta do século , a guilda de construtores operativos estava em decadência, e o número crescente de maçons aceitos começava, em algumas lojas, a supe-rar os operativos.

Podemos imaginar o aumento da presença de maçons aceitos nas reuniões trazendo como conseqüência alterações gradativas nos proce-dimentos ou na interpretação do simbolismo, acabando por se impor, induzindo a criação de lojas independentes do ato de construir, não operativas, que com o tempo, fizeram

ressurgir das cinzas da decadente corporação operativa a nova fênix da maçonaria, chama-da especulativa.

É importante nos determos um pouco para examinar os acontecimentos envolvendo a fundação da Grande Loja de Londres. Os parcos relatos da época nos dão conta da decadência experimentada pela maçonaria nesse período, com o abandono das tradições, reuniões cada vez mais raras, quando até o banquete tradicional do solstício de inverno (verão no Brasil) não era mais celebrado.

E assim, sob as influências do panorama cultural da época, no dia 24 de junho de 1717, na Taberna do Gan-so e a Grelha, na praça da Catedral de São Paulo, em Londres, dia de São João Batista, realizou-se a as-sembléia dos maçons livres e aceitos das lojas as quais costumeiramente se reuniam na Ganso e a Grelha; Coroa; Taberna da Macieira; e na Caneca de Vinho, formando a primeira Grande Loja do mun-do, numa data que passou a ser considerada como o início oficial da nova modalidade de maçonaria – a especulativa.

(28)

Anderson registrou o que se segue5:

“O rei George I chegou a Londres no dia 20 de setembro de 1714. Algumas lojas de Londres, desejosas de um ativo protetor, em face da incapacidade de Sir Christopher Wren (pois o novo rei não era franco maçom e, além disso, não conhecia a língua do país)acharam por bem cimentar, sob um novo e grande Mestre o centro de união e harmonia. Com este objetivo, as lojas:

No 1. No Ganso Grelhado, na praça da Catedral

de São Paulo,

No 2. No Coroa, na Avenida Parker, perto

da Avenida Drury,

No 3. Na Taberna da Macieira, na Charles Street,

Convent Garden,

No 4 Na Taberna Caneca de Vinho, na, Channel

– Row Westminster, reuniram-se com alguns outros antigos irmãos no dito Macieira e, ten-do daten-do a presidência ao mais velho mestre maçom, mestre de uma loja, constituíram-se numa Grande Loja, par ínterim na devida forma.

(PALOU, Jean. Op. cit., pp. 48, 49.) (grifos meus).

O texto grifado sugere Sir Christopher Wren

como o anterior protetor da instituição, estan-do à época incapacitaestan-do para exercer aquelas funções. Pelas palavras do texto, comentando a decisão das Lojas unirem-se sob o comando de um novo Grande (Grão) mestre, podemos entender que Wren teria sido o Grão-Mestre anterior. Ora, este personagem, nascido em 1632, foi anatomista, matemático, professor,

inventor e arquiteto urbanista.

Restauradas as atividades das lojas de Lon-dres, “agora sob nova direção”, com novas funções e objetivos, maçons adormecidos vol-taram a participar de suas lojas e novos mem-bros foram iniciados. A partir deste período, a maçonaria experimentou um florescimento inusitado, a ponto de, em 1725, as quatro lo-jas originais terem se tornado 64, apenas em Londres, sem contar as lojas dos arredores e

de outras cidades vizinhas.6

Em 29 de setembro de 1720, sob o segundo grão-mestrado de George Payne, numa as-sembléia realizada na Taberna Armas do Rei,

Sir Christopher Wren: Autor de inúmeras obras

científicas e de numerosos inventos, participou da reconstrução de Londres após o grande incêndio de 1667, tendo sido também deputado em duas legislaturas. Em 1669 foi nomeado supervisor geral das obras reais, cargo que ocupou até a su-bida ao trono de George I, que o destituiu de suas funções. Considerando-se que Wren tinha 85 anos em 1717, podemos entender que sua incapacida-de incapacida-de continuar sendo o protetor da maçonaria poderia ter como causa a sua destituição do cargo que ocupava, sua idade, ou ambos os motivos, que poderiam estar inter-relacionados. Segundo consta, Sir Christopher Wren foi iniciado na maço-naria em 1691.

(29)

contando com a presença de 16 lojas, decidiu-se realizar a compilação das instruções da velha instituição operativa, em forma concisa e organizada, e designar o Reverendo James Anderson para esta tarefa. Em 1723, agora ocupando a função de Segundo Grande Vigilante do novo Grão-Mestre, Duque de Wharton, Anderson apresentou sua obra As

Constituições, referência fundamental e

pri-meiro documento oficial sobre a história da maçonaria. A nova Instituição, com o tempo, unificou todas as lojas da Inglaterra, e pas-sando também para o continente europeu, expandiu-se dali para todo o mundo.

Bem, nesta aula ficamos por aqui, mas na próxima continuamos nossos estudos, onde discutiremos o panorama cultural e filosófico/ religioso da renascença, identificando as in-fluências desses pensamentos na simbologia influenciaram na origem da maçonaria.

(30)

Herança Filosófica I

Aula 3

E

m meados do século , ocorreu na Europa um fenômeno cultural, que se

denominou

Renascimento

, a princípio como manifestação

caracteristica-mente italiana, mas que, em seu desenvolvimento acabaria por estender-se

a todo o continente europeu. Sua origem deve-se ao ressurgimento do interesse

pela cultura greco-romana, induzindo nos pensadores e artistas da época a idéia de

renovação cultural, através da redescoberta dos valores, artes, técnicas e filosofias

do passado. Seus reflexos manifestaram-se de modo mais abrangente dentro destas

áreas das artes, ciências e filosofia, tendo, contudo, efeitos sobre todas as

manifes-tações humanas.

Objetivos:

¡ Conhecer o panorama cultural e filosófico/ religioso da renascença do século XV;

¡ Identificar as influências desses pensamentos na simbólica maçônica e em sua filosofia;

¡ Esclarecer vínculos entre Maçonaria e outras ins-tituições, desfazendo mitos.

As referências históricas sobre o renascimento foram tomadas das coleções: História das civili-zações, Vol III, Ed. Abril, p. 57-71; e A História em revista, Ed. Time/Life (1400-1500), 1991, pp. 43-59.

Dos fatores que mais contribuíram para a eclosão do Renascimento na Itália, podemos destacar a preservação de um substrato das tradições romanas na região, adicionadas às influências do contato com a civilização

Bizantina. Seu foco inicial foi a cidade

ita-liana de Florença, onde a riqueza advinda do comércio começou a ser aplicada no desen-volvimento da cultura. Ali desenvolveu-se o

(31)

dignida-de do homem, com ênfase no mundo natural como sendo o reino humano por excelência. O humanismo exaltava o valor da vida ativa,

em contraste com a monástica, contemplati-va, enfatizada no período medieval.

Durante esse período a Maçonaria estava em sua fase operativa, isto é, as corporações construtoras estavam em franca atividade, conforme comentamos nas aulas anteriores. Arquitetos e engenheiros certamente foram influenciados pela efervescência cultural des-sa época, e alguns símbolos e conceitos cul-tivados por grupos de intelectuais, filósofos e místicos foram mais tarde incorporados ao acervo da maçonaria especulativa, erigida so-bre os alicerces das corporações construtores na Inglaterra (ver aula 02). Algumas dessas linhas de pensamento têm sido apontadas, erroneamente, como constituindo forma in-cipiente de maçonaria especulativa, ou versão preliminar da Instituição, quando, na ver-dade, sua contribuição se restringe a alguns conceitos e símbolos.

Para melhor esclarecer esses fatos, passaremos a comentar, nessa aula e nas duas seguintes, alguns dos principais movimentos cultu-rais e filosóficos/religiosos desse período tão rico da cultura européia, procurando demonstrar que, mesmo exercendo alguma influência sobre o pensamento maçônico, esses movimentos, ou linhas de pensamentos tinham seu desenvolvi-mento e objetivos totalmente distintos daqueles que vieram a compor a Maçonaria Especula-tiva.

O Renascimento Italiano produziu gênios da estirpe de Leonardo Da Vinci e Michelangelo Buonarotti, cujas obras perduram até nossos

dias, despertando a mesma admiração res-ponsável pela fama de seus autores em sua época. O espírito renascentista influenciou também o conhecimento científico. O mes-mo Da Vinci, fames-moso pelos seus dotes comes-mo pintor, foi também um anatomista, arguto observador, dissecando cadáveres por conta própria, no afã de obter conhecimento

origi-Derivado do termo latino Studia Humanitatis (es-tudos da humanidade), o humanismo reforçava a necessidade de educação com objetivos seculares e não-eclesiásticos, como no milênio anterior. As disciplinas preferidas para o estudo eram a poéti-ca, retóripoéti-ca, história, ética e polítipoéti-ca, considerando o homem como a medida de todas as coisas.

(32)

nal, não advindo das afirmações de antigos autores tidos como sábios. Considerando-se um “discípulo da experiência”, Leonardo dizia:

“Quem numa discussão apela para a autoridade, não usa a inteligência, mas a memória.” (História em Revista, op. cit., p. 55)

Sua capacidade de observação era tal que os detalhes por ele observados e desenha-dos em seu trabalho Códice sobre o vôo das aves só foram comprovados após o advento

da fotografia com alta velocidade. Da Vinci dedicou-se também a projetos de máquinas de guerra, engenharia e estudos científicos, chegando até a propor o uso do vapor como força motriz1.

Também conhecida de todos é a revolução produzida pelo trabalho de Nicolau Copér-nico, deslocando a terra de sua posição mile-nar como centro do universo, apresentando o sol como centro do sistema. Até então, as concepções científicas, religiosas e místicas viam todos os astros descrevendo circunfe-rências em torno da terra, considerada como

fixa. A astrologia partia deste ponto de vista, onde o sol e a lua eram considerados planetas, girando ao redor da terra, compondo com os outros até então conhecidos, Mercúrio, Vê-nus, Marte, Júpiter e Saturno, o místico nú-mero sete, originando os conceitos dos sete céus e das sete esferas celestes, onde, segun-do Aristóteles, cada um segun-dos planetas estava incrustado. O mesmo Copérnico, contudo, reverenciava a figura de Hermes Trismegisto, mostrando uma ligação com o pensamento místico, que abordaremos adiante.

Em seu livro Das Revoluções dos Corpos Ce-lestes, onde apresenta a teoria heliocêntrica,

ele diz:

“Imóvel, no meio de tudo, está o sol. Pois nes-se mais lindo templo, quem poria este can-deeiro de ouro em melhor lugar do que esse, do qual ele pode iluminar tudo ao mesmo tempo? Pois o sol não é inapropriadamente chamado, por alguns povos, de lanterna do universo; de sua mente, por outros; e de seu governante, por outros ainda. [Hermes] o três vezes grande chama-o de um deus visível, e Electra, de Sófocles, de onividente.

(33)

(História das Civilizações, op. cit., p. 71. Ver também: Colin A . Ronan, História ilustrada da Ciência, Jorge Zahar, 1987, p. 15,16.)

A renomada historiadora, Frances Yatesnos

esclarece:

As palavras citadas por Copérnico vêm do tratado hermético conhecido como Asclépius, chamado assim porque consiste num diálogo entre Hermes e um discípulo chamado Asclé-pius, no transcurso do qual Hermes diz: O sol ilumina as outras estrelas não tanto pelo poder de sua luz como por sua divindade e santidade, e deves considerá-lo [o sol], oh Asclépius, como o segundo deus, que governa todas as coisas e esparge sua luz sobre todos os seres vivos do mundo, tanto os que têm alma, quanto os que não a têm. (Frances Yates, Giordano Bruno e a Tradição Hermética, Cultrix, 1964, pp. 176,177.)

As palavras de Copérnico refletem a conci-liação feita pelo neoplatonismo renascentista, entre o pensamento hermético, platônico e o cristão.

Sobre o Hermetismo

Apesar da existência de focos de oposição ao cristianismo, a tendência geral do Renasci-mento desenvolveu-se no sentido de uma conciliação da cultura clássica com a cristã. Entre os problemas religiosos considerados relevantes, amplamente discutidos na época, estavam a função civil da religião e a tolerân-cia religiosa.

Refletindo o espírito de valorização dos es-critos antigos, algumas obras tiveram grande circulação e aceitação entre os sábios renas-centistas, entre as quais destaca-se a literatura atribuída a Hermes Trismegisto.

Tido por uns como um antigo sacerdote egíp-cio, e por outros como encarnação do próprio deus Toth, do panteão egípcio, foi também considerado o mensageiro dos deuses, tra-zendo sua sabedoria aos homens, sendo por isso identificado com o Hermes dos gregos (o Mercúrio latino), que lhe deram o título

de Trismegisto, três vezes grande.

Os comentários apresentados neste capítulo sobre o misticismo renascentista encontram sua maior referência nesta obra de Frances Yates e outras da mesma autora, que serão oportuna-mente citadas. Visando estudar o pensamento mágico que influenciou Giordano Bruno, Yates tece uma precisa descrição da ampla fundamen-tação hermética que permearia a filosofia e artes renascentistas, discutindo suas origens, e seus principais desenvolvimentos. Sua obra forneceu fartos subsídios para este trabalho. Ver também, da mesma autora, Ensayos Reunidos III, Ideas e Ideales del Renacimiento en el norte de Europa, Fondo de cultura Económica, México, 1993, pp. 379-386.

Referências

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