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O tombamento como forma de proteção do patrimônio cultural e a legitimidade ativa do Ministério Público nas questões de imóveis tombados em Florianópolis

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SOFIA CAVAZZOLA PEDROSO

O TOMBAMENTO COMO FORMA DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL E A LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO NAS QUESTÕES DE

IMÓVEIS TOMBADOS EM FLORIANÓPOLIS

Florianópolis 2013

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O TOMBAMENTO COMO FORMA DE PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL E A LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO NAS QUESTÕES DE

IMÓVEIS TOMBADOS EM FLORIANÓPOLIS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel.

Orientadora: Prof. Patrícia de Oliveira França, MSc.

Florianópolis 2013

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O presente trabalho visa examinar o instituto do tombamento, suas formas de aplicação, efeitos e eficácia prática. Inicia-se com a descrição da evolução histórica da proteção ao patrimônio artístico, histórico e cultural no Brasil, até que se alcançasse o tombamento como forma de proteção. Realiza-se então a conceituação do instituto, a verificação de suas espécies e a análise de seus efeitos. Passa-se a estudar a questão do cabimento de indenização nesses casos, sendo necessário para tanto, elucidar sua natureza jurídica e tipo de ato administrativo que compõe o tombamento. Após, analisa-se neste trabalho, a posição dos Tribunais brasileiros em relação ao direito de indenização nos casos de tombamento. No mais, são apresentadas algumas formas de incentivo fiscal aos proprietários de bens tombados, como forma de compensação pelas restrições e exigências imposta em relação ao bem. Por derradeiro, estudam-se os casos de imóveis tombados no Município de Florianópolis assim como as sanções administrativas e judiciais eventualmente impostas aos proprietários dos imóveis, em razão do descumprimento de qualquer exigência a eles legalmente impostas. Este trabalho é, em sua maioria, teórico, contudo analisa alguns casos concretos onde se verifica a aplicação de tal teoria na prática.

Palavras-chave: Patrimônio Cultural. Tombamento. Imóveis em Florianópolis. Ministério Público.

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1 INTRODUÇÃO ... 7

2 O INSTITUTO DO TOMBAMENTO ... 9

2.1 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO NO BRASIL ... 9

2.2 CONCEITO DE TOMBAMENTO ... 12

2.3 ESPÉCIES DE TOMBAMENTO ... 14

2.3.1 Quanto à constituição ou procedimento ... 14

2.3.2 Quanto à eficácia ... 17

2.3.3 Quanto aos destinatários ... 18

2.4 EFEITOS JURÍDICOS DO TOMBAMENTO ... 18

2.4.1 Em Relação ao Proprietário ... 19

2.4.2 Em Relação à Vizinhança ... 21

2.4.3 Em Relação ao Poder Público ... 22

2.4.4 Das Restrições à alienabilidade ... 24

3 A QUESTÃO DA INDENIZAÇÃO NO PROCESSO DE TOMBAMENTO ... 26

3.1 TOMBAMENTO COMO ATO VINCULADO OU DISCRICIONÁRIO ... 26

3.2 A NATUREZA JURÍDICA DO TOMBAMENTO ... 27

3.3 DO CABIMENTO DE INDENIZAÇÃO ... 28

3.4 A POSIÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA NOS PROCESSOS DE TOMBAMENTO . 29 3.5 OS PROGRAMAS DE INCENTIVO ... 31

3.5.1 Desconto no Imposto de Renda ... 32

3.5.2 O Programa Monumenta ... 33

3.5.3 Desconto no Imposto Predial Territorial Urbano – O IPTU em Florianópolis ... 34

3.5.4 Transferência do Direito de Construir – O Município de Florianópolis ... 35

4 PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO CULTURAL E O TOMBAMENTO DE IMÓVEIS 37 4.1 PATRIMÔNIO CULTURAL E OS BENS SUJEITOS AO TOMBAMENTO ... 37

4.2 COMPETÊNCIA PARA TOMBAR ... 40

4.3 DANOS AOS BENS TOMBADOS E SANÇÕES APLICÁVEIS ... 42

4.4 IMÓVEIS TOMBADOS NO MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS ... 47

4.5 A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA QUESTÃO DO TOMBAMENTO . 50 4.5.1 Inquéritos Civis ... 51

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4.5.3 Ações Civis Públicas ... 56

4.5.3.1 Análise do Caso Concreto ... 58

4.5.4 Ações Penais Públicas ... 59

5 CONCLUSÃO ... 60

REFERÊNCIAS ... 62

ANEXOS ... 67

ANEXO A – Política de Preservação do Patrimônio Cultural ... 68

ANEXO B – Dossiê Edificação Rua Conselheiro Mafra, n. 538 ... 81

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1 INTRODUÇÃO

Nos dias atuais, em razão do crescimento exacerbado e desorganizado das cidades, que impulsionaram excessivamente o mercado imobiliário, é evidente a escassez cada vez maior de terrenos disponíveis para a construção de novas edificações nos grandes centros.

É inegável a necessidade de novas construções frente ao grande crescimento populacional, contudo muitas vezes o espaço nas cidades é reduzido, fazendo com que se opte por destruir as construções antigas em prol das novas edificações que vem sendo levantadas.

A forte influência do capitalismo e a grande vantagem econômica que os investidores do mercado imobiliário possuem com a construção e venda de novos exemplares de edifícios, retira desses o interesse em preservar o patrimônio antes existente, esquecendo-se que o desfazimento de imóveis antigos acarreta na destruição de parte da história de uma sociedade.

Para proteger tal história ameaçada, tornou-se imperiosa a necessidade de o Poder Público intervir, criando assim um instituto com objetivo na manutenção e conservação do patrimônio cultural de um povo. É com este intuito que se aplica às edificações de relevante valor histórico o instituto do tombamento.

O presente trabalho descreverá, em seu segundo capítulo, como surgiu este instituto, que tem sua origem no século XVIII, e sua evolução histórica, até chegar aos dias atuais, quando possui, inclusive, previsão constitucional.

Demonstrar-se-á, outrossim, que o tombamento, como ato da administração pública traz restrições ao direito de propriedade do cidadão e, por isso, vem sendo questionado. Levanta-se, portanto, no terceiro capítulo, a questão do cabimento de indenização nos casos de tombamento, bem com outras formas de incentivos fiscais concedidos aos proprietários dos bens tombados.

A partir de então, com a definição de patrimônio cultural e de quem tem competência para assim declarar um bem, o quarto capítulo da presente monografia passa a analisar a aplicação do instituto do tombamento especificamente relativo a imóveis no Município de Florianópolis.

Perceber-se-á que não raro veem-se edificações com relevante valor histórico e com status de patrimônio cultural, em péssimo estado de conservação, caracterizando-se o descaso do cidadão e muitas vezes do poder público, com sua

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própria história. Questiona-se, portanto, se o instituto do tombamento é um meio eficiente para alcançar a conservação e integridade dos bens imóveis de relevante valor histórico, e quando não o é, qual o papel do Ministério Público para garantir a proteção dos imóveis tombados.

Verificar-se-á, por fim, quais sanções poderão ser aplicadas em caso de desobediências às exigências instituídas pelo tombamento e, em caso de inércia do Poder Público em aplicá-las, qual o papel do Ministério Público na defesa do direito ao patrimônio que assiste à sociedade.

Para isso é necessária a realização de um estudo capaz de identificar os principais problemas na aplicação do instituto em comento, bem como as ações que visam garantir sua plena aplicabilidade.

É com este objetivo que se apresenta o presente trabalho, que busca na literatura formal o fundamento do instituto do tombamento, bem como na análise de casos concretos a demonstração das condições de conservação dos imóveis tombados como patrimônio histórico na cidade de Florianópolis, e a atuação do Ministério Público nesses casos.

O método de abordagem utilizado é o dedutivo, posto que o presente estudo inicia-se com a análise geral do instituto do tombamento em sua totalidade, finalizando com a especificação de exemplares tombados na cidade de Florianópolis. Utiliza-se nesta monografia a pesquisa básica, uma vez que poderá gerar novos conhecimentos e exploratória, pois já explicita questionamento e hipóteses, que buscarão sanar os problemas enfrentados para a conservação do patrimônio histórico de Florianópolis.

Finalmente, para execução do trabalho realizou-se pesquisas bibliográficas, buscando referências teóricas e fáticas, sendo utilizados como fontes para pesquisa doutrinas, legislação pertinente ao assunto, artigos científicos e jurisprudência; além de estudo dos casos específicos dos bens tombados no Município de Florianópolis.

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2 O INSTITUTO DO TOMBAMENTO

O instituto do tombamento é um ato administrativo que objetiva a manutenção e conservação de determinado bem, por seu valor histórico, artístico, arquitetônico, paisagístico ou cultural.

Sua origem no Brasil data de meados do século XVIII, evoluindo durante anos, para que se garantisse a proteção hoje prevista na Constituição Federal (MIRANDA, 2006, p.1).

A evolução histórica e conceito do instituto do tombamento serão tratados e melhor detalhados na sequência deste capítulo.

2.1 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO NO BRASIL Os primeiros indícios de preocupação com a tutela do patrimônio no Brasil datam do século XVIII, mais precisamente no ano de 1742, quando o então Vice-Rei do Brasil ordenou a cessação das obras no Palácio das Duas Torres e sua posterior restauração (MIRANDA, 2006, p.1).

Destarte, colaciona-se trecho da referida manifestação, trazida pela obra de Marcos Paulo de Souza Miranda (2006. p.1):

Pelo que respeita aos Quartéis que se pretendem mudar para o Palácio das duas Torres, obra do Conde Maurício de Nassau, em que os Governadores fazem a sua assistência, me lastimo muito que haja de entregar ao uso violento e pouco cuidadoso dos soldados, que em pouco tempo reduzirão aquela fábrica a uma total dissolução, mas ainda me lastima mais que, com ela, se arruinará também a memória que mudamente estava recomendando à posteridade as ilustres e famosas ações que obraram os Portugueses na Restauração dessa Capitania.

Outro indício é o artigo 178 do Código Criminal do Império de 1830, também mencionado pelo citado autor (2006, p.1-2), que se refere à primeira sanção penal imposta no Brasil no que tange à guarda do patrimônio.

Tal dispositivo previa pena de prisão com trabalho de dois meses a quatro anos e multa de vinte por cento do valor do dano, para aquele que destruísse, abatesse, mutilasse ou danificasse monumentos, edifícios, bens públicos ou quaisquer outros objetos destinados à utilidade, decoração ou recreio público (BRASIL, 1830).

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As Constituições de 1824 e 1891 nada manifestaram a respeito da proteção do patrimônio. De acordo com Maria Tereza Fonseca Dias e Carlos Magno de Souza Paiva (2010, p.54) isso pode ser consequência da inspiração no Direito Romano, em que o Direito de Propriedade era praticamente absoluto.

O interesse pela proteção do patrimônio cultural, como menciona Marcos Paulo de Souza Miranda (2006, p. 2), desenvolveu-se de forma lenta no Brasil, só voltando a ter relevância nas décadas de 20 e 30, influenciado pela Sociedade Brasileira de Belas Artes.

Neste período, como ressalta Inês Virgínia Prado Soares (2009, p.24) houve movimentos para criação de uma legislação protetiva, resultando em diversos projetos de lei com cunho protecionista, apresentados principalmente pelos representantes dos Estados de Minas Gerais, Bahia e Pernambuco. Contudo, nenhum destes projetos mostrava relevância em âmbito nacional.

Ensina Marcos Paulo de Souza Miranda (2006, p.3), que “Somente em 1933 surgiu o primeiro diploma federal brasileiro tratando do patrimônio cultural. Foi o Decreto n. 22.928, de 12 de julho daquele ano, que erigiu a cidade de Ouro Preto a Monumento Nacional”.

Assim, no ano seguinte, a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil (BRASIL, 1934), promulgada em 1934, foi a primeira Carta brasileira que demonstrou cuidado com o patrimônio, quando, em seu artigo 10, III, determinou: “Art 10 - Compete concorrentemente à União e aos Estados: [...] III - proteger as belezas naturais e os monumentos de valor histórico ou artístico, podendo impedir a evasão de obras de arte;”.

Reforçando a importância de se resguardar o patrimônio, no ano de 1937 a Constituição dos Estados Unidos do Brasil (BRASIL, 1937) estabeleceu:

Art 134 - Os monumentos históricos, artísticos e naturais, assim como as paisagens ou locais particularmente dotados pela natureza, gozam de proteção e dos cuidados especiais da Nação, dos Estados e dos Municípios. Os atentados contra eles cometidos serão equiparados aos cometidos contra o patrimônio nacional.

É notável, portanto, o crescente interesse em resguardar a história do país. Percebeu-se, porém, a necessidade de se legislar de forma mais direta e específica a respeito do tema, o que se alcançou com o Decreto-Lei n. 25 de 1937 (BRASIL, 1937).

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Então, apenas 20 dias após a promulgação da referida Constituição (de 1937), em 30 de novembro de 1937, deu-se um passo definitivo em prol do patrimônio publico, com a publicação do Decreto-lei n. 25 – a Lei do Tombamento – (BRASIL, 1937) que veio apresentar formas concretas de proteção ao patrimônio no país, sobre a qual se falará mais minuciosamente adiante.

Com o intuito de dar maior efetividade à proteção do patrimônio, como bem reforçou Marcos Paulo de Souza Miranda (2006, p. 6), o Código Penal de 1940, tipificou em seu artigo 165, o crime de dano em coisa de valor artístico, arqueológico ou histórico: “Art. 165 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa tombada pela autoridade competente em virtude de valor artístico, arqueológico ou histórico: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa” (BRASIL, 1940).

Era a primeira vez que se previa uma sanção para aquele que agisse de forma a deteriorar o patrimônio cultural, ainda que fosse proprietário do bem.

Dando sequência à legislação protecionista, a Constituição promulgada em 1946 (BRASIL, 1946), estabeleceu no artigo 175 os bens submetidos à proteção do poder público: “Art 175 - As obras, monumentos e documentos de valor histórico e artístico, bem como os monumentos naturais, as paisagens e os locais dotados de particular beleza ficam sob a proteção do Poder Público”.

No mesmo norte manteve-se a Constituição de 1967 (BRASIL, 1967):

Art 172 - O amparo à cultura é dever do Estado.

Parágrafo único - Ficam sob a proteção especial do Poder Público os documentos, as obras e os locais de valor histórico ou artístico, os monumentos e as paisagens naturais notáveis, bem como as jazidas arqueológicas.

Tendo em vista que desde a Constituição de 1934 o patrimônio cultural tem recebido proteção constitucional, a Carta Magna hoje vigente, promulgada em 1988, não poderia excluir de seu rol tal amparo.

Assim, recepcionando o instituto do tombamento e os demais dispositivos supracitados, a Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988 (BRASIL, 1988), garante em seu artigo 23, incisos III, IV, VI e VII, a proteção da identidade nacional, ao reconhecer a “competência comum de todos os entes federativos para promover a defesa dos documentos e dos bens relacionados à história, à cultura e ao meio ambiente” (JUSTEN FILHO, 2006, p. 421).

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Descreve a Constituição, no artigo 216 (BRASIL, 1988), os bens considerados patrimônio cultural, reforçando, no § 1º, sua sujeição ao tombamento:

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

I - as formas de expressão;

II - os modos de criar, fazer e viver;

III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;

IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;

V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

§ 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá

e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários,

registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação. (grifo nosso).

Assim, percebe-se que desde o século XVIII a legislação brasileira vem se mostrando preocupada com a proteção do patrimônio nacional. Atualmente em vigor, a Carta Magna Brasileira de 1988 e o Decreto-Lei n. 25 garantem à sociedade o direito de ter seu patrimônio preservado, estabelecendo limites ao seu uso e exigências à sua conservação.

2.2 CONCEITO DE TOMBAMENTO

Como apresentado anteriormente, uma das formas de proteção ao patrimônio encontrada pelo Estado é o instituto do tombamento.

O termo “tombamento”, que dá nome ao Decreto-Lei 25/37, tem origem, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2012, p. 146) no direito português, “que utiliza a palavra tombar no sentido de registrar, inventariar, inscrever nos arquivosdo Reino, guardados na Torre do Tombo” (grifo do autor).

De acordo com Miranda (2006, p.108) Torres do Tombo, na sua origem portuguesa, referem-se ao Arquivo Público do Reino, em Lisboa, Portugal, instalado no século XIV, nas torres do castelo de São Jorge.

No Brasil, sob clara influência portuguesa, a expressão “tombamento” passou a ser utilizada como “a declaração pelo Poder Público do valor histórico, artístico, paisagístico, turístico, cultural ou científico de coisas ou locais que, por essa razão devam ser preservados” (MEIRELLES, 2012, p.635).

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Maria Sylvia Di Pietro (2012, p. 145) conceitua tombamento como “forma de intervenção do Estado na propriedade privada, que tem por objetivo a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional”.

Desta forma, qualquer bem público ou privado, seja por suas características arquitetônicas, históricas ou naturais, pode ser decretado de interesse público e, por esta razão, sujeitar-se ao tombamento, conforme determina o artigo 1º do Decreto Lei n. 25 de 30 de novembro de 1937 (BRASIL, 1937):

Art. 1º Constitue [sic] o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interêsse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico.

§ 1º Os bens a que se refere o presente artigo só serão considerados parte integrante do patrimônio histórico o artístico nacional, depois de inscritos separada ou agrupadamente num dos quatro Livros do Tombo, de que trata o art. 4º desta lei.

§ 2º Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são também sujeitos a tombamento os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pelo natureza ou agenciados pelo indústria humana.

Importante ressaltar que a competência para tombar um bem é tanto da União, quanto dos Estados ou dos Municípios, como assevera Paulo Affonso Leme Machado, citando Pontes de Miranda, (MACHADO, 2001, p. 864):

[...] pode o interesse na conservação e guarda ser mais especialmente para o Estado-membro, o Distrito Federal, ou o Município. Qualquer delas, inclusive a União, pode tombar o que outra já tombara, para reforçar a eficácia do tombamento, ou para evitar que a outra se omita na fiscalização ou dê permissões que firam o interesse revelado.

Reforçando tal entendimento, José Afonso da Silva (1981, p. 487 apud MACHADO, 2001, p. 864) afirma que “As três esferas de competência podem, paralelamente, tombar o mesmo bem, sem que haja exclusão em face de qualquer delas. Não ocorre caso de competência só da União, ou só do Estado, ou só do Município”.

Assim, qualquer bem de relevante interesse público poderá ser tombado, por um ou mais entes federativos, das formas que serão apresentadas a seguir.

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2.3 ESPÉCIES DE TOMBAMENTO

O instituto do tombamento pode ser classificado em diversas espécies, dependendo de quem é o proprietário do bem a ser tombado, de sua forma de constituição, eficácia e seus destinatários.

Quanto ao proprietário, de acordo com os ensinamentos de Paulo Afonso Leme Machado (2001, p. 871), o tombamento pode atingir bem pertencente a pessoa pública ou a pessoa privada (física ou jurídica).

Já para Maria Sylvia Di Pietro (2012, p. 147), pode-se ainda classificar o tombamento em três diferentes categorias, de acordo com sua constituição ou procedimento, quando será de ofício, voluntário ou compulsório; em relação à sua eficácia, se provisório ou definitivo; ou ainda quanto aos seus destinatários, quando poderá ser geral ou individual. Tais espécies serão melhores descritas a seguir.

2.3.1 Quanto à constituição ou procedimento

A espécie de tombamento se diferencia conforme este atinja bens públicos ou privados. Será de ofício o tombamento sobre os bens públicos e voluntário ou compulsório quando atingir bens pertencentes a pessoas privadas(DI PIETRO, 2012, p. 147).

O artigo 5º do Decreto-Lei n. 25 de 1937 (BRASIL, 1937) assim descreve o tombamento de ofício:

Art. 5º O tombamento dos bens pertencentes à União, aos Estados e aos Municípios se fará de ofício, por ordem do diretor do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, mas deverá ser notificado à entidade a quem pertencer, ou sob cuja guarda estiver a coisa tombada, afim de produzir os necessários efeitos.

Neste caso a “simples notificação à entidade a quem pertencer [o bem] (União, Estado ou Município) ou sob cuja a guarda estiver a coisa tombada” (DI PIETRO, 2012, p. 147) já faz com que se produzam os efeitos do tombamento.

Importante ressalva faz Paulo Affonso Leme Machado (2001, p.871) ao destacar que “o Decreto-Lei n. 25/37 não prevê recurso contra o ato administrativo que determinar o tombamento” . O mesmo evidencia Édis Milaré (2011, p. 324) ao

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afirmar que o tombamento de ofício “se sujeita apenas à deliberação coletiva do órgão preservacionista, sem qualquer contraditório” .

De outra banda, quando incidente sobre bem de pessoa privada o tombamento poderá ser voluntário ou compulsório, conforme determina o artigo 6º do Decreto-Lei n.25/37 (BRASIL, 1937): “Art. 6º O tombamento de coisa pertencente à pessôa [sic] natural ou à pessôa [sic] jurídica de direito privado se fará voluntária ou compulsoriamente [sic]”.

Será voluntário quando o proprietário pedir o tombamento e o bem possuir os requisitos para ser tombado. Em interpretação ao artigo 7º do já mencionado Decreto-Lei, Maria Sylvia Di Pietro (2012, p. 147) afirma que o tombamento voluntário ocorre quando:

1. o proprietário pedir o tombamento e a coisa se revestir dos requisitos necessários para constituir parte integrante do patrimônio histórico e artístico nacional, a jupizo do órgão técnico competente;

2. o proprietário anuir, por escrito, à notificação que se fizer para a inscrição da coisa em qualquer dos Livros do Tombo.

Em relação a esta espécie de tombamento, Leme Machado (2001, p. 871) evidencia a existência de “meio administrativo para o proprietário pedir o tombamento, o que mostra que não se pode, de antemão, visualizar este instituto jurídico como desnaturador da propriedade”.

Por fim, o tombamento será compulsório, como prevê o artigo 8º do Decreto-Lei n. 25/37 (BRASIL, 1937), sempre que o proprietário for contrário à inscrição de seu bem nos Livros do Tombo. “Art. 8º Proceder-se-á ao tombamento compulsório quando o proprietário se recusar a anuir à inscrição da coisa” (BRASIL, 1937).

O artigo 9º do Decreto-Lei 25/37 descreve como se dá o processo de tombamento, que, sob a análise sintetizada de Édis Milaré (2011, p.325) é assim relatado:

a) parecer do órgão técnico sobre o valor cultural do bem;

b) notificação ao proprietário para anuir ou impugnar a pretensão do Poder Público;1

c) deliberação coletiva do Conselho Consultivo da entidade incumbida do tombamento;

1

Quando se tratar de bem público e, portanto, tombamento de ofício, a partir desta notificação o instituto já gera seus efeitos. Por outro lado, tratando-se de bem privado e o proprietário anuir com a notificação, tem-se o tombamento voluntário.

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d) homologação do órgão político a que está afeta a entidade incumbida do tombamento;

e) inscrição no Livro do Tombo que se referir ao valor que fundamentou o tombamento;

f) transcrição em registro público [...], para que produza efeitos em relação a terceiros.

Para que o instituto do tombamento gere então seus efeitos, é necessário um parecer técnico que determine o valor do bem, seguido de uma notificação ao seu proprietário. A partir de então o tombamento passa pela análise de um Conselho representante da entidade que tombou o imóvel, para posterior homologação do órgão público competente. Só então o bem é inscrito em um dos Livros do Tombo e é realizado seu registro público, atingindo assim efeito sobre terceiros.

Durante tal procedimento, deve ser assegurado direito de manifestação do proprietário do bem. Como defende Carvalho Filho (2008, p. 749), independente da forma de tombamento, há

[...] absoluta necessidade de ser observado o princípio fundamental do devido processo legal [...], no qual se assegure ao proprietário o direito ao contraditório e à ampla defesa, incluindo meios de prova que visem a demonstrar a inexistência de relação entre o bem a ser tombado e a proteção ao patrimônio cultural.

Tal manifestação pode ser contrária ao tombamento e os argumentos ali levantados serão analisados na terceira etapa do procedimento, pelo Conselho Consultivo do órgão incumbido do tombamento.

Quando o Conselho não aceitava a manifestação do proprietário contrária ao tombamento, o Decreto Lei n. 25 (BRASIL, 1937) afirmava que esta decisão (a de tombar o bem) não era passível de recurso. Contudo, em 1941 o Decreto Lei n. 3.866 (BRASIL, 1941), estabeleceu a possibilidade de revogação do tombamento pelo Presidente da República, não de forma discricionária, mas sempre baseado no interesse público.

O Presidente da República, atendendo a motivos de interesse público, poderá determinar, de ofício ou em grau de recurso, interposto pôr qualquer legítimo interessado, seja cancelado o tombamento de bens pertencentes à União, aos Estados, aos municípios ou a pessoas naturais ou jurídicas de direito privado, feito no Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, de acordo com o decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937. (BRASIL, 1941).

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Diante do exposto, verifica-se que o tombamento pode ser realizado sobre bens pertencentes a qualquer ente público, bem como a pessoa de direto privado, sempre assegurando ao proprietário o direito constitucional ao contraditório e à ampla defesa em seu procedimento.

2.3.2 Quanto à eficácia

Quando à sua eficácia, o instituto do tombamento pode ser provisório ou definitivo, de acordo com o andamento de seu procedimento.

O artigo 10 do Decreto Lei n. 25/37 (BRASIL, 1937) estabelece:

Art. 10. O tombamento dos bens, a que se refere o art. 6º desta lei, será considerado provisório ou definitivo, conforme esteja o respectivo processo iniciado pela notificação ou concluído pela inscrição dos referidos bens no competente Livro do Tombo.

Parágrafo único. Para todas os efeitos, salvo a disposição do art. 13 desta lei, o tombamento provisório se equiparará ao definitivo.

A ressalva feita pelo parágrafo único do dispositivo acima citado, refere-se apenas ao Registro Público do tombamento do bem. Assim, percebe-se que o bem passível de tombamento já está protegido desde a notificação do proprietário, ainda que em caráter provisório. Como afirma Paulo Affonso Leme Machado (2001, p.878), “Mesmo antes de se chegar à decisão final, antes de se entrar no mérito se o bem vai ou não ser tombado, passa ele a ser preservado”.

Com a decisão final já tomada, esta apontando para o tombamento do bem, ele será inscrito no Livro do Tombo competente e o tombamento passará a ser definitivo. A partir de então se exigirá sua inscrição no Registro Público competente, conforme ressalvado pelo artigo 13 do Decreto Lei n. 252.

Percebe-se que, apesar da divisão legal em provisório e definitivo, os efeitos do tombamento são os mesmos nos dois casos. Garante-se desta forma que o bem esteja protegido desde a percepção de seu interesse público, evitando-se assim que o proprietário dilapide o bem durante o processo de tombamento.

2

Art. 13. O tombamento definitivo dos bens de propriedade partcular será, por iniciativa do órgão competente do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, transcrito para os devidos efeitos em livro a cargo dos oficiais do registro de imóveis e averbado ao lado da transcrição do domínio. (BRASIL, 1937).

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2.3.3 Quanto aos destinatários

Quanto aos destinatários o tombamento pode ser individual ou geral. Conforme os ensinamentos de Hely Lopes Meirelles (2012, p.636), o tombamento

É restrição individual quando atinge determinado bem – uma casa, p. ex –, reduzindo os direitos do proprietário ou impondo-lhes encargos; é limitação geral quando abrange uma coletividade, obrigando-a a respeitar padrões urbanísticos ou arquitetônicos, como ocorre com o tombamento de locais históricos ou paisagísticos.

A classificação do tombamento como geral da forma explicada acima por Hely Lopes Meirelles, traz algumas divergências na doutrina. Para Marçal Justen Filho (2006, p. 421), por exemplo, tal espécie de tombamento “deriva sempre das características individuais que cada bem apresenta. [...] Em outras palavras, não se tomba a ‘cidade’ nem o ‘bairro’, mas cada imóvel ali existente”.

Neste norte posiciona-se também José dos Santos Carvalho Filho (2008, p. 745) “os efeitos do ato alcançam diretamente apenas a esfera jurídica do proprietário de determinado bem. O dito tombamento geral seria ato limitativo de natureza genérica e abstrata, incongruente com a natureza do instituto”.

Para estes autores, não se pode considerar o tombamento de forma geral, pois este tem sempre relação específica com caráter individual de cada edificação. Assim, ainda que se queira tombar um bairro, ou uma cidade inteira, o instituto gerará seus efeitos individualmente sobre cada propriedade. O que se tem, portanto, são diversos imóveis vizinhos tombados individualmente.

Verifica-se que as discussões sobre esta classificação tem apenas relevância doutrinária, afinal, imóveis tombados individualmente ou de forma geral tem as mesmas proteções e sofrem os mesmos efeitos.

2.4 EFEITOS JURÍDICOS DO TOMBAMENTO

O instituto do tombamento para atingir seu fim, qual seja o de proteger e conservar determinado bem dotado de características que o elevam a patrimônio público, gera diversos efeitos sobre uso da coisa tombada. Tais efeitos estão elencados no Capítulo III do Decreto-Lei n. 25/37 (BRASIL, 1937).

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2.4.1 Em Relação ao Proprietário

O tombamento é uma forma de intervenção do Estado na propriedade privada e desta decorrem várias obrigações e restrições aos proprietários do bem tombado.

Como destaca Justen Filho (2006, p. 423), o tombamento “importa restrição quanto ao modo de usar, fruir e dispor do bem, que deve ser compatível com a preservação da sua identidade” e que varia de acordo com a natureza do bem tombado.

A possibilidade de se tombar um bem, restringindo o uso e fruição de seu proprietário, é decorrência do princípio constitucional da função social da propriedade, previsto no artigo 5º, inciso XXIII Constituição de 1988 (BRASIL, 1988). O mencionado princípio traz limitações ao direito de propriedade, mas conforme os ensinamentos de Álvaro Luiz Valery Mirra (1996, p. 59-60), não se restringe a isso:

A função social e ambiental não constitui um simples limite ao exercício de direito de propriedade, como aquela restrição tradicional, por meio da qual se permite ao proprietário, no exercício de seu direito, fazer tudo que não prejudique a coletividade e o meio ambiente. Diversamente, a função social e ambiental vai mais longe e autoriza até que se imponha ao proprietário comportamentos positivos, no exercício de seu direito, para que a sua propriedade concretamente se adeque à preservação do meio ambiente.

O tombamento, portanto, ao garantir a função social da propriedade, trará diversas obrigações ao proprietário do bem. Maria Sylvia Di Pietro (2012, p. 150), classifica estas obrigações como “positivas (de fazer), negativas (de não fazer) e de suportar (deixar fazer)”.

São negativas aquelas mencionadas nos artigos 14 e 17 do Decreto Lei n. 25/37 (BRASIL, 1937):

Art. 14. A. coisa tombada não poderá saír do país, senão por curto prazo, sem transferência de domínio e para fim de intercâmbio cultural, a juízo do Conselho Consultivo do Serviço do Patrimônio Histórico e Artistico Nacional. Art. 17. As coisas tombadas não poderão, em caso nenhum ser destruidas, demolidas ou mutiladas, nem, sem prévia autorização especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artistico Nacional, ser reparadas, pintadas ou restauradas, sob pena de multa de cincoenta por cento do dano causado.

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O artigo 14 acima transcrito, refere-se, como se pode perceber, ao transporte de bens móveis, como pinturas, escultura, obras de arte em geral, livros, partituras, etc., para outros países. Estes não podem livremente sair do país, obrigando seu proprietário a realizar solicitação ao Conselho Consultivo mencionado no dispositivo.

Além desta restrição, o artigo 17 supracitado, aponta outras que alcançam também aos bens imóveis. Em respeito a este artigo, os bens tombados não podem de nenhuma forma ser destruídos, nem restaurados sem autorização do Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

Claramente ambos os dispositivos visam garantir a integridade do bem tombado, porém, em alguns casos não seriam suficientes para promover sua conservação. Assim o legislador incluiu algumas obrigações de fazer ao proprietário, que também asseguram a manutenção do bem de interesse público.

Estas obrigações positivas são elencadas nos artigos 16, 19 e 22, do Decreto Lei n. 25 de 1937 (BRASIL, 1937):

Art. 16. No caso de extravio ou furto de qualquer objéto [sic] tombado, o respectivo proprietário deverá dar conhecimento do fáto [sic] ao Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional [SEPHAN], dentro do prazo de cinco dias, sob pena de multa de dez por cento sôbre [sic] o valor da coisa. Art. 19. O proprietário de coisa tombada, que não dispuzer [sic] de recursos para proceder às obras de conservação e reparação que a mesma requerer, levará ao conhecimento do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional a necessidade das mencionadas obras, sob pena de multa correspondente ao dobro da importância em que fôr [sic] avaliado o dano sofrido pela mesma coisa.

Art. 22. Em face da alienação onerosa de bens tombados, pertencentes a pessôas [sic] naturais ou a pessôas [sic] jurídicas de direito privado, a União, os Estados e os municípios terão, nesta ordem, o direito de preferência.

Estes dispositivos elencam três tipos diferentes de obrigações. A primeira delas diz respeito ao extravio ou furto do bem tombado. Neste caso o proprietário deve comunicar o órgão público responsável (SEPHAN) no prazo de 5 dias sob pena de multa. Este dispositivo evita que o proprietário tente se eximir da culpa pelo não cuidado com o bem tombado, afirmando não estar mais em sua posse.

Outra comum alegação dos proprietários de bens tombados que não desejam, ou mesmo não podem, manter um bom estado de conservação do patrimônio, é a de que não possuem recursos para tal. Mais uma vez em proteção

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ao bem, o legislador define que, nestes casos, o proprietário comunicará o SEPHAN, que passará então esta obrigação ao ente incumbido do tombamento.

Já o mencionado artigo 22 (BRASIL, 1937) trata da ordem de preferência que deve obedecer o proprietário em caso de alienação de seu patrimônio tombado. Assim, o bem deve ser oferecido primeiramente à União, ao Estado e em seguida ao Município em que o bem se localiza, nesta ordem. Caso nenhum dos entes federativos se interesse pela compra, só então poderá o proprietário livremente alienar seu patrimônio.

Por último, tem-se a obrigação de suportar, a que se submete o proprietário do bem tombado. Esta se relaciona à obrigação de submeter-se à fiscalização do órgão público responsável pelo tombamento do bem, conforme artigo 20 do já mencionado Decreto Lei n. 25/37 (BRASIL, 1937):

Art. 20. As coisas tombadas ficam sujeitas à vigilância permanente do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que poderá inspecioná-los sempre que fôr [sic] julgado conveniente, não podendo os respectivos proprietários ou responsáveis criar obstáculos à inspeção, sob pena de multa de cem mil réis, elevada ao dôbro [sic] em caso de reincidência.

Resta claro, portanto, que o proprietário do bem tombado deve sempre permitir e suportar a fiscalização do órgão público responsável sobre seu bem, tendo novamente como sanção, em caso de desobediência, a imposição de multa.

Tais imposições legais são imprescindíveis, ainda que na prática muitas vezes insuficientes, para que se possa alcançar o fim ao que o tombamento se propõe, qual seja o de manter a conservação do patrimônio cultural.

2.4.2 Em Relação à Vizinhança

As exigências e obrigações relativas a um bem tombado não se restringem àquela impostas ao seu proprietário. Novamente com o intuito de manter um bom estado de conservação do patrimônio, inclusive seu contexto ambiental, a legislação aponta algumas obrigações aos vizinhos do imóvel tombado.

Como bem afirma Édis Milaré (2011, p. 327), “A área do entorno do bem tombado é importante para garantir a ambiência e a visibilidade do patrimônio”. Para alcançar esta garantia, o legislador previu também restrições ao uso das

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propriedades vizinhas, ao determinar, no artigo 18 do Decreto Lei n. 25/37 (BRASIL, 1937):

Art. 18. Sem prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, não se poderá, na vizinhança da coisa tombada, fazer construção que lhe impeça ou reduza a visibílidade [sic], nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob pena de ser mandada destruir a obra ou retirar o objéto [sic], impondo-se nêste [sic] caso a multa de cincoenta [sic] por cento do valor do mesmo objéto [sic].

O conceito de redução da visibilidade previsto no supramencionado dispositivo é bastante amplo, como ressalta Hely Lopes Meirelles (2012, p. 638), este abrange:

[...] não só a tirada da vista da coisa tombada como a modificação do ambiente ao da paisagem adjacente, a diferença de estilo arquitetônico e tudo o mais que contraste ou afronte a harmonia do conjunto, tirando o valor histórico ou a beleza original da obra ou do sítio protegido.

Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2012, p. 181) a restrição imposta aos vizinhos do imóvel tombado é uma forma de servidão administrativa, no qual o dominante é o bem tombado, que tem como serviente, os prédios vizinhos. A autora afirma que a servidão “resulta automaticamente do ato do tombamento e impõe aos proprietários dos prédios servientes obrigação negativa de não fazer”. Ressalta ainda que não é previsto qualquer tipo de indenização nestes casos.

Como se viu, apesar de não ser proprietário de bem tombado, o vizinho do imóvel considerado patrimônio cultural deve cumprir algumas obrigações. Dentre estas, a de não construir de modo a tirar a visibilidade do bem. Ora, muitas vezes o terreno vizinho do bem tombado encontra-se em área valorizada imobiliariamente, contudo seu proprietário não poderá usufruir livremente do bem e, apesar de a situação claramente importar em prejuízos financeiro, em se considerando o caso servidão administrativa, não é previsto qualquer tipo de indenização ao proprietário vizinho.

2.4.3 Em Relação ao Poder Público

Restam ainda, como consequência do instituto do tombamento, as obrigações impostas ao poder público em razão do bem tombado. Como já

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explanado, um bem só é inscrito num dos Livros do Tombo se possuir características que definam como patrimônio cultural, de interesse público. Sendo de interesse público, parece evidente que as obrigações de proteção não se restrinjam a pessoa do proprietário, mas também ao ente público responsável por seu tombamento.

Assim entende Justen Filho (2006, p. 423), para quem a obrigação de preservar um bem tombado não se restringe ao seu proprietário, mas também ao Poder Público.

Tais obrigações inerentes á administração pública são elencadas por Marcos Paulo Miranda (2006, p. 139) da seguinte forma:

a) Exercício do poder-dever de impor penalidades administrativas àqueles que destruírem, inutilizarem, deteriorarem ou alterarem os bens tombados;

b) Executar as obras de conservação do bem, quando o proprietário não puder fazê-lo ou providenciar a desapropriação da coisa; [Artigo 19, Decreto Lei n. 25/37, BRASIL, 1937]

[...]

c) Exercer permanente vigilância sobre a coisa tombada, inspecionando-as sempre que julgar conveniente; [Artigo 20, Decreto Lei n. 25/37, BRASIL, 1937]

[...]

d) Providenciar, em se tratando de bens particulares, a transcrição do tombamento no Cartório de Registro de Imóveis. [Artigo 13, Decreto Lei n. 25/37, BRASIL, 1937]

Se o proprietário do bem tombado tem obrigações em relação a este, é necessário que exista um órgão competente para fiscalizar e verificar se elas vem sendo cumpridas. Este é um dos deveres do poder público. Aliado a este, há para o poder público a obrigação de, ao perceber qualquer irregularidade, impor ao proprietário do bem as penas administrativas previstas na legislação.

Como mencionado no título anterior, o proprietário tem o dever de informar à administração pública sua impossibilidade de manter a integridade do bem. De nada adiantaria o poder público ter este conhecimento se não interviesse para garantir a conservação do patrimônio. Assim, é também dever do ente público realizar as obras necessárias à conservação da coisa tombada.

O Decreto Lei n. 25 (BRASIL, 1937) ainda prevê como obrigação do ente público a transcrição do tombamento no Cartório de Registro de Imóveis, para que passe então a gerar efeitos sobre terceiros.

Conforme estudado, não cabe à administração pública apenas inspecionar os proprietários e aplicar sanções em caso de descumprimento da

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legislação protecionista, mas tem também o encargo de manter o estado de conservação dos bens tombados, garantido à sociedade o direito a ter seu patrimônio preservado.

2.4.4 Das Restrições à alienabilidade

Quanto à alienação de bens tombados, estes também sofrem algumas restrições, que variam de acordo com seu proprietário, se pessoa pública ou de direito provado.

Inicialmente, em se tratando de bem público tombado, importante destacar o artigo 11 do Decreto Lei n. 25 de 1937 (BRASIL, 1937), que assim versa: “Art. 11. As coisas tombadas, que pertençam à União, aos Estados ou aos Municípios, inalienáveis por natureza, só poderão ser transferidas de uma à outra das referidas entidades”.

Desta forma, é vedado ao ente público vender sua propriedade tombada, podendo apenas repassá-la a outro ente da federação.

Por outro lado, em se tratando de bem particular, a alienação onerosa deve respeitar o já mencionado direito de preferência dos entes públicos, sob pena de nulidade do ato, sequestro do bem e multa ao proprietário, em obediência ao artigo 22 do Decreto Lei n. 25 de 1937 (BRASIL, 1937):

Art. 22. Em face da alienação onerosa de bens tombados, pertencentes a pessôas [sic] naturais ou a pessôas [sic] jurídicas de direito privado, a União, os Estados e os municípios terão, nesta ordem, o direito de preferência.

[...]

§ 2º É nula alienação realizada com violação do disposto no parágrafo anterior, ficando qualquer dos titulares do direito de preferência habilitado a sequestrar a coisa e a impôr [sic] a multa de vinte por cento do seu valor ao transmitente e ao adquirente, que serão por ela solidariamente responsáveis. A nulidade será pronunciada, na forma da lei, pelo juiz que conceder o sequestro, o qual só será levantado depois de paga a multa e se qualquer dos titulares do direito de preferência não tiver adquirido a coisa no prazo de trinta dias. (BRASIL, 1937)

O parágrafo 2º do artigo 22 acima transcrito deixa claro que a alienação sem obediência ao direito de preferência torna nulo o negócio jurídico. Paulo Afonso Leme Machado (2001, p. 885) afirma que “Deixando de haver a regular notificação do Poder Público para que pudesse exercer sua preferência na alienação, esta é nula”. O dispositivo vai além, ao garantir ao ente titular do direito de preferência,

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habilitação para sequestrar o bem e impor multa tanto ao transmitente quanto ao adquirente.

Esta imposição de multa ao adquirente é possível tendo em vista a já estuda obrigação de inscrição do tombamento no Registro Público, garantindo assim a aplicação de seus efeitos a terceiros.

O direito de preferência é ainda garantido mesmo que o imóvel não esteja tombado em todas as esferas – nacional, estadual e municipal. Segundo Leme Machado (2001, p. 884) “A lei não exige que as três pessoas jurídicas de Direito Público interno tenham – as três – tombado o bem”. Assim, ainda que determinada coisa seja tombada apenas em âmbito municipal, deve a União receber notificação para que possa gozar o direito de preferência.

Assim, resta ao proprietário do bem tombado obedecer ao direito de preferência, oferecendo, em caso de alienação, o imóvel aos entes públicos e só em caso de desinteresse destes aos particulares, sobre pena de ser nulo seu negócio jurídico.

Como visto neste capítulo o tombamento acarreta em vários ônus para os envolvidos com a coisa tombada. Contudo, apenas em alguns casos cabe aos proprietários direito à indenização pelo bem tombado, existindo divergências tanto doutrinárias quanto jurisprudenciais a respeito, conforme se procurará demonstrar a seguir.

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3 A QUESTÃO DA INDENIZAÇÃO NO PROCESSO DE TOMBAMENTO

Ainda que se trate indubitavelmente de restrição ao direito de propriedade, há grande divergência, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, quanto ao tombamento ensejar direito de indenização ao proprietário do bem tombado, conforme se verificará adiante.

Para que se alcance alguma conclusão sobre o tema, importante analisá-lo sobre dois aspectos: inicialmente averiguar se o instituto do tombamento é ato discricionário ou vinculado; em seguida verificar sua natureza jurídica, se de servidão administrativa, limitação administrativa ou instituto próprio.

3.1 TOMBAMENTO COMO ATO VINCULADO OU DISCRICIONÁRIO

Já em relação ao primeiro aspecto, sobre ser o tombamento ato discricionário ou vinculado, existe divergências doutrinárias.

Um ato será discricionário, de acordo com Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo (2012, p. 433) quando a administração pública puder praticá-los “com certa liberdade de escolha, nos termos e limites da lei, quanto ao seu conteúdo, seu modo de realização, sua oportunidade e sua conveniência administrativa”.

Por outro lado, de acordo com os mesmos autores (2012, p. 432) será o ato vinculado quando a administração estiver adstrita ao prescrito em lei,

[...] sem margem alguma de liberdade de decisão, pois a lei previamente determinou o único comportamento possível a ser obrigatoriamente adotado sempre que se configure a situação objetiva descrita na lei. Não cabe ao agente público apreciar oportunidade ou conveniência administrativas quanto à edição do ato; uma vez atingidas as condições legais, o ato tem que ser praticado, invariavelmente.

Sobre esta classificação, Maria Sylvia Di Pietro (2012, p. 153) afirma ser o tombamento ato discricionário. Para a autora, o tombamento acarretará em conflito de valores, em que a Administração deverá “zelar pela conservação daquele que de forma mais intensa afete os interesses da coletividade. Essa apreciação terá que ser feita no momento da decisão, diante do caso concreto”.

Por outro lado, Hely Lopes Meirelles (2012, p. 636) entende ser o tombamento ato vinculado: “O tombamento realiza-se através de um procedimento

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administrativo vinculado, que conduz ao ato final de inscrição do bem num dos Livros do Tombo”.

Maria Tereza Dias (2010, p. 60), por sua vez, entende que não se pode considerar o tombamento ato totalmente vinculado, nem absolutamente discricionário. Para a autora,

[...] o tombamento é ato decorrente do poder discricionário, mas vinculado à condição caracterizadora de bem cultural, prevista na lei (histórica, artística, arqueológica, etnográfica) ou qualquer outra característica manifestadora do aspecto cultural. A autoridade pública pode escolher entre tombar este ou aquele bem e escolher ainda o momento de fazê-lo. Entretanto, o bem escolhido deve revestir-se de, pelo menos, uma das características culturais previstas no ordenamento jurídico.

Tal divergência é sequente na doutrina e acaba por influenciar o entendimento de cada estudioso quanto à natureza jurídica do instituto do tombamento, o que, consequentemente, interfere em sua tendência a conhecer ou não o direito à indenização que assiste ao proprietário do bem tombado.

3.2 A NATUREZA JURÍDICA DO TOMBAMENTO

Quanto à natureza jurídica do instituto do tombamento a doutrina também não é uniforme. Há entendimentos de que se trata este instituto de forma de Servidão Administrativa, Limitação Administrativa, Instituto próprio, entre outras correntes mais enfraquecidas.

De acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello (2007, p.872), o tombamento é uma modalidade de servidão administrativa. O mencionado autor define servidão administrativa como “o direito real que assujeita um bem a suportar uma utilidade pública, por força da qual ficam afetados parcialmente os poderes do proprietário quanto ao seu uso ou gozo” e caracteriza o tombamento desta forma pelo fato de este consistir em

[...] uma intervenção administrativa na propriedade, destinada a proteger o patrimônio histórico e artístico nacional, pela qual os poderes inerentes ao seu titular ficam parcialmente elididos, uma vez que poderá usar e gozar do bem, mas não alterá-lo[...]” (MELLO, 2007, p.872)

Maria Sylvia Di Pietro (2012, p. 154), contudo, afirma que o tombamento apenas se assemelha à servidão “pelo fato de individualizar o bem; porém dela

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difere porque falta a coisa dominante, essencial para caracterizar qualquer tipo de servidão”.

Outra corrente de doutrinadores entende ser o tombamento uma forma de limitação administrativa. Marçal Justen Filho (2006, p. 413) conceitua limitação administrativa como “alteração do regime jurídico privatístico da propriedade [...], impondo restrição das faculdades de usar e fruir de bem imóvel”.

Baseada nesta definição, Inês Virgínea Prado Soares (2009, p. 298) afirma ser o tombamento uma limitação administrativa, pois os institutos tem os mesmos traços característicos, como “[...] a generalidade, a unilateralidade, a imperatividade e a não-confiscatoriedade.”.

Comparando o tombamento com o instituto da limitação administrativa, Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2012, p.154) afirma que estes têm em comum apenas o fato de ambos serem impostos em benefício do interesse público; porém o tombamento individualiza o imóvel, o que não é característica da limitação.

Dado às diferenças apontadas entre o tombamento e a servidão administrativa ou entre aquele e a limitação administrativa, Maria Sylvia Zanella Di Pietro finaliza caracterizando o tombamento como categoria própria, pois “não se enquadra nem como simples limitação administrativa, nem como servidão” (2012, p.154). Este posicionamento é também de Édis Milaré (2011, p.324).

O fato de os doutrinadores considerarem o tombamento como instituto próprio, servidão administrativa ou limitação administrativa, influi no seu entendimento quanto à existência ou não do dever de indenizar o proprietário, conforme se verá adiante.

3.3 DO CABIMENTO DE INDENIZAÇÃO

No campo da indenização a doutrina é também divergente. Muitos autores, entre eles Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2012, p.146), defendem a tese de que o tombamento é ato gratuito. Para a autora, “O tombamento é sempre uma restrição parcial, não impedindo ao particular o exercício dos direitos inerentes ao domínio; por isso mesmo, não dá, em regra, direito à indenização”. Continua a Di Pietro (2012, p. 146): “Se, para proteger o bem, o Poder Público tiver que impor restrição total, de modo que impeça o proprietário do exercício de todos os poderes inerentes ao domínio, deverá desapropriar o bem”.

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Este é o entendimento de Édis Milaré (2011, p. 328), verificado quando o autor afirma que

[...] a simples declaração de interesse cultural em determinado bem, por encerrar restrição administrativa que apenas obriga o proprietário a mantê-lo dentro de suas características para a proteção da memória nacional, não engendra situação de prejuízo capaz de justificar qualquer dever indenizatório para o Poder Público.

Outros autores, contudo, entendem que em alguns momentos a indenização é devida. Assim posiciona-se Justen Filho (2006, p.421):

Em princípio, o tombamento não gera direito à indenização. O bem permanece no domínio do anterior proprietário, que dele pode usar e fruir, inclusive retirando os proveitos econômicos compatíveis com o tombamento. No entanto, surgirá direito à indenização quando o tombamento impuser deveres de cunho econômico ou quando impedir a exploração econômica que o bem apresenta potencialmente.

Hely Lopes Meirelles (2012, p. 639) também defende o direito à indenização nos casos de tombamento. O doutrinador é claro “Tombamento não é confisco [...] não podem um ou alguns particulares ser sacrificados no seu direito de propriedade sem a correspondente indenização reparatória do prejuízo ocasionado pelo tombamento”.

Além destas correntes, como evidencia Paulo Magalhães da Costa Coelho (2004, p. 492), havia ainda uma que defendia a obrigatoriedade de desapropriação em caso de tombamento pelo interesse público do bem. Corrente esta que atualmente encontra-se enfraquecida, sem muita significância.

Em resumo, pela maioria da doutrina, é admitida a indenização pelo prejuízo sofrido (principalmente pelos autores que entendem o tombamento como servidão administrativa), a desapropriação em algumas hipóteses e a inexistência do direito de indenização em outros casos (casos entendidos como limitação administrativa). Tal divergência acaba por influenciar também a jurisprudência, como se demonstra adiante.

3.4 A POSIÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA NOS PROCESSOS DE TOMBAMENTO

A jurisprudência não tem posição uniforme quanto à existência ou não do direito à indenização nos casos de tombamento.

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Mesmo dentro do Supremo Tribunal Federal encontram-se divergências. O Ministro Joaquim Barbosa, em voto referente ao Agravo Regimental no Recurso Extraordinário n. 361.127 declarou que “Não é qualquer tombamento que dá origem ao dever de indenizar: é preciso demonstrar que o proprietário sofre um dano especial, peculiar, no direito de propriedade” (BRASIL, 2012).

Já na decisão do referido Recurso Extraordinário, Joaquim Barbosa entendeu pelo cabimento de indenização, tendo em vista que o tombamento “aniquilou o valor econômico do bem” (BRASIL, STF, 2012).

Por outro lado, no julgamento do processo referente à Casa Modernista, do arquiteto Gregori Warchavchick o Supremo Tribunal Federal entendeu ser caso de desapropriação. A concessão da desapropriação indireta pelo ministro Celso de Mello, foi baseada no fato de ser o tombamento um instrumento “[...] para proteção, amparo e preservação do patrimônio cultural brasileiro. Quando, porém, ele resulta no esvaziamento do conteúdo patrimonial, é necessário que o Poder Público indenize seu proprietário” (BRASIL, STF, 2012). No caso concreto, o tombamento da Casa Modernista impediu seu uso, daí a razão à indenização.

Em outra ocasião, desta vez referente ao tombamento do Bairro Cosme Velho no Rio de Janeiro, o STF decidiu pelo não cabimento de indenização. Nesta demanda o Supremo Tribunal Federal entendeu ser caso de “Limitação administrativa genérica, gratuita e unilateral ao exercício do direito de propriedade, em prol da memória da cidade”(BRASIL, 2002. grifo nosso).

Como se vê, a Corte suprema do país não possui entendimento pacífico sobre a questão da indenização no tombamento. O mesmo se percebe no Superior Tribunal de Justiça e demais Tribunais do país.

O STJ, no recurso de Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 268044 (BRASIL, 2000), manteve a decisão a quo, concedendo indenização ao proprietário de bem tombado. Contudo, no julgamento do Recurso Especial n. 1168632 (BRASIL, 2010) entendeu pelo não cabimento de indenização.

Já o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, é mais tendente à não concessão de indenização ao proprietário de bens tombados. Isso pode ser verificado nas decisões das Apelações Cíveis n. 2007.058098-73 (SANTA CATARINA, 2008), n. 2010.024125-04 (SANTA CATARINA, 2013), entre outras.

3

PEDIDO ALTERNATIVO DE INDENIZAÇÃO. TITULARIDADE DA PROPRIEDADE PRESERVADA. DIREITO DE USO, GOZO E FRUIÇÃO LIMITADOS APENAS QUANTO À SUA PARTE ESTRUTURAL. DEVER DE CONSERVAR AS SUAS

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Como se vê, a questão da indenização nos processos de tombamento ainda gera muitas discussões jurisprudenciais. Porém, ainda que não concedida a indenização, cabe aos proprietários de bens tombados requerer outros incentivos financeiros, conforme se verificará em seguida.

3.5 OS PROGRAMAS DE INCENTIVO

Apesar de a indenização nos casos de tombamento ainda gerar fortes divergências doutrinarias e jurisprudenciais, alguns entes federativos estão apostando em outras formas de incentivo aos proprietários de bens tombados.

Para Maria Teresa Fonseca Dias e Carlos Magno de Souza Paiva (2010, p. 238), a concessão destes incentivos fiscais é uma forma que

[...] os proprietários de bens tombados, cujo valor histórico e artístico os tornam essenciais para o desenvolvimento e preservação da herança e identidade cultural de uma determinada sociedade, possuem como saída sustentável, para a busca de recursos com o fim de manutenção do valor cultural dos bens [...]

Dentre as formas de incentivo estão o desconto no imposto de renda, isenção de Imposto Predial Territorial Urbano, entre outros, como levantado por Marcos Paulo de Souza Miranda (2006, p.135):

No imposto de Renda de Pessoa Física, por exemplo, podem ser deduzidos 80% das despesas efetuadas para restaurar, preservar e conservar bens tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

CARACTERÍSTICAS ORIGINAIS. VANTAGENS, ADEMAIS, CONCEDIDAS AO PROPRIETÁRIO. ISENÇÃO TRIBUTÁRIA. DECRÉSCIMO ECONÔMICO NÃO EVIDENCIADO. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. "Constatando-se ainda que a indenização nos casos de tombamento apenas é devida quando as limitações impostas pelo Poder Público acarretam o esvaziamento do valor econômico do imóvel, situação não verificada na presente actio, o pedido de indenização por desapropriação não merece acolhimento."

4

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE CANCELAMENTO DE TOMBAMENTO - IMÓVEL TOMBADO PELO MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS - BEM EM PÉSSIMO ESTADO DE CONSERVAÇÃO - DEVER DE CONSERVAÇÃO E RESTAURAÇÃO - RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO - PEDIDO ALTERNATIVO DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA - INDEFERIMENTO - POSSIBILIDADE DE EXPLORAÇÃO ECONÔMICA DO IMÓVEL - LIMITAÇÃO DA

PROPRIEDADE APENAS QUANTO À ESTRUTURA DO PRÉDIO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - VALOR EXCESSIVO - REDUÇÃO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. De acordo com o que dispõe a legislação municipal de Florianópolis incumbe ao proprietário o dever de conservação e restauração do bem tombado, exceto se o mesmo não possuir recursos financeiros para tal, caso em que a responsabilidade passa ao Poder Público. Em se verificando que o apelante possui condições financeiras para proceder a reforma do bem tombado, pois no local pretendia erguer um edifício com 10

apartamentos, bem como, que é proprietário de diversos imóveis na Capital, o tombamento deve ser mantido, cabendo àquele providenciar a restauração do imóvel. Constatando-se ainda que a indenização nos casos de tombamento apenas é devida quando as limitações impostas pelo Poder Público acarretam o esvaziamento do valor econômico do imóvel, situação não verificada na presente actio, o pedido de indenização por desapropriação não merece acolhimento. No que diz respeito aos honorários advocatícios, considerando o trabalho, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, o valor inicialmente arbitrado em R$ 30.000,00 (trinta mil reais) mostra-se excessivo, devendo ser reduzido para R$ 1.000,00 (hum mil reais), esse sim condizente e adequado ao caso em comento.

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Existem alguns municípios que asseguram incentivos fiscais específicos para conservação dos bens tombados, ou isentam seus proprietários do IPTU.

Além destes, é ainda permitido que se transfira o direito de construir em caso de imóveis em região que permita maiores edificações, inviabilizadas, contudo, em razão do tombamento (Estatuto da Cidade. BRASIL, 2001).

Os programas de incentivo podem ser concedidos pelos Estados ou Municípios. De acordo com levantamento de Paulo Affonso Leme Machado (2001, p. 856), Estados como Acre, Alagoas, Rio Grande do Norte, Paraíba, Espirito Santo, Bahia, Sergipe, Mato Grosso, Rio Grande do Sul, São Paulo, preveem de alguma forma incentivos aos proprietários de bens tombados. Como se verá adiante, no Estado de Santa Catarina, especificamente no Município de Florianópolis, existem diversas formas de incentivo fiscal com o intuito de preservar o patrimônio histórico e cultural do local.

3.5.1 Desconto no Imposto de Renda

O Governo Federal, ao promulgar a Lei n. 8.313/91, conhecida como Lei Rouanet (BRASIL, 1991), instituiu o Programa Nacional de Apoio à Cultura, o qual prevê desconto no imposto de renda de proprietários de bens tombados.

Como destacam Maria Tereza Fonseca Dias e Carlos Magno de Souza Miranda, (2010, p. 240), “a captação de recursos para a preservação de bens imóveis tombados poderá ocorrer através de doações ou patrocínio a projetos culturais que envolvam a preservação de bens tombados”.

Destas doações ou patrocínios, poderá ser deduzido o imposto de renda, conforme versa o artigo 26 da Lei n. 8.313/91 (BRASIL, 1991):

Art. 26. O doador ou patrocinador poderá deduzir do imposto devido na declaração do Imposto sobre a Renda os valores efetivamente contribuídos em favor de projetos culturais aprovados de acordo com os dispositivos desta Lei, tendo como base os seguintes percentuais:

I - no caso das pessoas físicas, oitenta por cento das doações e sessenta por cento dos patrocínios;

II - no caso das pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, quarenta por cento das doações e trinta por cento dos patrocínios.

Com base no citado dispositivo, somado ao artigo 24 do mesmo diploma legal (BRASIL, 1991) a pessoa física que despender recursos “com o objetivo de

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conservar, preservar ou restaurar bens de sua propriedade ou sob sua posse legítima” obeterá desconto de até 80% oitenta por cento no imposto de renda, referente a estes gastos.

No caso de pessoas jurídicas, também com base no artigo 24 da Lei n. 8.313/91 (BRASIL, 1991) que equipara os gastos com a conservação do bem tombado à doação, o desconto será de até 40% (quarenta por cento) no imposto de renda relativo a estas despesas.

Tais deduções, contudo, não poderão ultrapassar 4% (quatro por cento) do imposto de renda devido, com base no artigo 5º da Lei n. 9.532/97 (BRASIL, 1997).

Outro requisito a ser respeitado para que se alcance a dedução do imposto de renda é a aprovação do projeto pelo Ministério da Cultura, conforme prevê o artigo 19 da Lei 8.313/91 (BRASIL, 1991). De acordo com este dispositivo, “Os projetos culturais previstos nesta Lei serão apresentados ao Ministério da Cultura [...] para aprovação de seu enquadramento nos objetivos do PRONAC [Programa Nacional de Apoio à Cultura]”.

A Lei 8.313/91 (BRASIL, 1991) permite, portanto, que os gastos que o proprietário vier a ter com seu bem, objeto do patrimônio histórico nacional, sejam descontados do imposto de renda, após avaliação do Ministério da Cultura, com a finalidade de incentivar o proprietário a manter seu bem sempre em bom estado de conservação.

3.5.2 O Programa Monumenta

O Programa Monumenta, de iniciativa do Ministério da Cultura, tem como objetivo a recuperação do patrimônio cultural urbano brasileiro, através da “restauração e recuperação dos bens tombados e edificações localizadas nas áreas de [intervenção do] projeto”(PROGRAMA MONUMENTA, 2013).

Além de estimular e promover a restauração e conservação de bens públicos, o programa Monumenta promove financiamentos facilitados para proprietários de bens tombados. Nestes casos “a taxa de juro é zero e os prazos variam de dez a vinte anos [...] e as parcelas do financiamento começam a ser pagas seis meses após a conclusão das obras” (PROGRAMA MONUMENTA, 2013),

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para financiamentos que tenham como objeto a recuperação de fachadas, coberturas, estruturas e reparos de imóveis considerados patrimônios culturais.

Para ter acesso a este financiamento, o Município ou Estado deverá lançar um edital público, para que os interessados apresentem suas propostas que, se selecionadas, serão analisadas por equipes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN e Caixa Econômica Feral. Com os projetos aprovados, os proprietários assinam o contrato de financiamento e recebem os recursos para as obras de restauração (PROGRAMA MONUMENTA, 2013).

O pagamento do financiamento é destinado ao Fundo Municipal de Preservação, visando dar continuidade aos trabalhos de preservação do patrimônio histórico local (PROGRAMA MONUMENTA, 2013).

Além destes projetos nacionais, a legislação Estadual e Municipal também poderão prever formas de incentivo à conservação de seu patrimônio, conforme se demonstrará, especificamente em relação ao Município de Florianópolis.

3.5.3 Desconto no Imposto Predial Territorial Urbano – O IPTU em Florianópolis

Outra forma de incentivo ao proprietário de bem tombado encontrada pelo legislador de alguns municípios é a isenção ou desconto no Imposto Predial Territorial Urbano.

Na Cidade de Florianópolis, por exemplo, a Consolidação das Leis Tributarias do Município – Lei Complementar n. 07/1997, em seu artigo 225 (FLORIANÓPOLIS, 1997), prevê o benefício da isenção do IPTU:

Art. 225 São isentos do imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana:

(...)

VII - o imóvel que possua valor histórico, artístico e/ou cultural, tombado por ato da autoridade competente, observado o dispostos no § 1º deste artigo.

A Prefeitura Municipal de Florianópolis concede este benefício em até 100% do valor do IPTU, conforme ressalva feita relativa ao § 1º do artigo 225 (FLORIANÓPOLIS, 1997).

Referências

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