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DE CABRAL A CABRAL: Um estudo de caso sobre Poder e Corrupção na Administração Pública do Brasil

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Academic year: 2021

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SIMONE MARINS DOS SANTOS

DE CABRAL A CABRAL:

Um estudo de caso sobre Poder e Corrupção na Administração Pública do Brasil

RIODEJANEIRO 2020

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DE CABRAL A CABRAL:

Um estudo de caso sobre Poder e Corrupção na Administração Pública do Brasil

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação Strictu Sensu – Doutorado em Psicanálise, Saúde e Sociedade | UVA| Universidade Veiga de Almeida, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutora em Psicanálise. Área de concentração Psicanálise e Sociedade.

Orientador: Prof. Drº Auterives Maciel

RIODEJANEIRO 2020

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Programa de Doutorado em Psicanálise, Saúde e Sociedade

Doutoranda: Simone Marins dos Santos

Título: De Cabral a Cabral

Um estudo de caso sobre poder e corrupção na administração

pública do Brasil.

Banca Examinadora

Orientador: Prof. Dr. Auterives Maciel Júnior (UVA – RIO)

Profa. Dra. Ana Maria Rudge (UVA – RIO)

Prof. Dr. José Maurício Loures (UVA – RIO)

Dra. Ana Carolina Wolf Baldino Peuker (UFRGS – RS)

Prof. Dr. Mário Bruno (UERJ)

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Dedico esta tese à sofrida população do Rio de Janeiro, estado fluminense símbolo da crise que vive o país. Dos conflitos éticos aos econômicos, da insegurança à calamidade na saúde por tamanha corrupção. Os problemas do Rio vão muito além das críticas, eles sintetizam a deterioração de um país mergulhado em escândalos de corrupção.

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A Deus, que me deu força e perseverança para chegar até aqui, e conquistar, com fé, mais uma etapa vitoriosa da minha trajetória.

Aos meus queridos pais, Daniel e Cirley, e ao meu amado companheiro Alessandro, pelo amor, incentivo e apoio constantes.

Aos meus professores, em especial ao meu Orientador, Professor Auterives Maciel, por ter me acolhido “aos 45 minutos do segundo tempo”, com carinho e entusiasmo, e pelo zelo, dedicação nas causas acadêmicas.

À minha fiel escudeira Elizabeth, e a todos que, de alguma forma, estiveram do meu lado nessa caminhada.

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“Se o povo for conduzido apenas por meio de leis e decretos impessoais e se forem trazidos à ordem apenas por meio de punições, ele apenas procurará evitar a dor das punições, evitando a transgressão por medo da dor. Mas se ele for conduzido pela virtude e trazido à ordem pelo exemplo e pelos ritos em comum, ele terá o sentimento de pertencer a uma coletividade e o sentimento de vergonha quando agir contrário a ela e, assim, bem se comportará de livre e espontânea vontade”.

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De Cabral a Cabral reflete sobre o fenômeno da corrupção desde a história colonial do Brasil, perpassando por fatos em diversos períodos até os dias atuais com a operação “Lava Jato” e a prisão do ex-governador Sérgio Cabral. Assim, contextualizamos conceitos de ética e poder de forma objetiva para uma melhor compreensão do estudo. Nesse contexto, os representantes públicos têm como premissa a promoção da confiança da sociedade em seu caráter ético, na sua conduta, exercendo suas funções com segurança e clareza sobre o que pode e o que não pode ser feito, estabelecendo valores como paz, segurança, desenvolvimento socioeconômico das nações e dos povos. A partir da análise de um governo corrupto, contextualizado pelo caso do ex-governador, concluímos que a falta de ética é um sintoma de uma administração deficiente, o que permite que gestores públicos inescrupulosos explorem oportunidades para pôr o interesse próprio acima do interesse público, contrariando as exigências de seus cargos, corroborando o modo de funcionar da administração pública desde seus primórdios, favorecendo a não observância dos preceitos éticos e que as relações de poder funcionam como fonte de corrupção das pessoas que são corrompidas exatamente pelo abuso destas relações com o poder. Entendemos que é necessário estabelecer sanções administrativas e punições contra a má conduta, por intermédio de processos criminais e civis, para demonstrar que a corrupção não pode ser tolerada, e que a sociedade se politize para se manifestar contra a corrupção.

Palavras-chave: Administração Pública; Corrupção; Ética e Psicanálise; Poder,

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From Cabral to Cabral reflects on the phenomenon of corruption since the colonial history of Brazil, going through facts in various periods until the present day with the “Lava Jato” operation and the arrest of ex-governor Sérgio Cabral. Thus we contextualize concepts of ethics and power in an objective way for a better understanding of the study. In this context, public representatives have as premise the promotion of society's trust in its ethical character, in its conduct, exercising its functions safely, and clarity about what can and cannot be done, establishing values such as peace, security, socioeconomic development of nations and peoples. From the analysis of a corrupt government, contextualized by the case of the Former Governor, we conclude that the lack of ethics is a symptom of a deficient administration, which allows unscrupulous public managers to explore opportunities to put self-interest above the public interest, contrary to the demands of their positions. Corroborating that the way of functioning of the public administration since its beginnings favors the non-observance of the ethical precepts and that the power relations function as a source of corruption of the people who are corrupted exactly by the abuse of these relations with the power. We understand that it is necessary to establish administrative sanctions and punishments against misconduct, through criminal and civil processes, to demonstrate corruption cannot be tolerated, and that society politicizes itself to demonstrate against corruption.

Keywords: Public Administration; Corruption; Ethics and Psychoanalysis; Power;

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colonial de Brasil, pasando por hechos en varios períodos hasta la actualidad con la operación "Lava Jato" y el arresto del ex gobernador Sérgio Cabral. Por lo tanto, contextualizamos los conceptos de ética y poder de manera objetiva para una mejor comprensión del estudio. En este contexto, los representantes públicos tienen como premisa la promoción de la confianza de la sociedad en su carácter ético, en su conducta, en el ejercicio de sus funciones de manera segura y en la claridad sobre lo que se puede y no se puede hacer, estableciendo valores como la paz, la seguridad. , desarrollo socioeconómico de naciones y pueblos. Del análisis de un gobierno corrupto, contextualizado por el caso del exgobernador, concluimos que la falta de ética es un síntoma de una administración deficiente, que permite a los administradores públicos sin escrúpulos explorar oportunidades para poner el interés propio por encima del interés público, contrario a las exigencias de sus cargos. Corroborando que la forma de funcionamiento de la administración pública desde sus inicios favorece el incumplimiento de los preceptos éticos y que las relaciones de poder funcionan como una fuente de corrupción de las personas que están corrompidas exactamente por el abuso de estas relaciones con el poder. Entendemos que es necesario establecer sanciones administrativas y castigos contra la mala conducta, a través de procesos penales y civiles, para demostrar que la corrupción no se puede tolerar, y que la sociedad se politiza para manifestarse contra la corrupción.

Palabras-clave: Administración Pública; Corrupción; Ética y Psicoanálisis; Poder;

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Figura 1. Esquema de corrupção na PETROBRAS 57

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INTRODUÇÃO 12 1 ACORRUPÇÃONOBRASIL:DODESCOBRIMENTOÀATUALIDADE 20

1.1 A contextualização da Ética e sua diferenciação da Moral no fenômeno

corrupção 21

1.2 Panorama da corrupção 23

1.3 A corrupção e o exercício do poder 30

1.4 Corrupção e causalidade 32

1.5 A origem da corrupção no Brasil 36

1.5.1 A corrupção no Brasil Colônia 39

1.5.2 A corrupção no Brasil Imperial 43

1.5.3 A corrupção no Brasil República 45

1.5.4 A corrupção na Ditadura 48

1.5.5 A corrupção na Democracia 50

1.6 O caso de corrupção da Operação Lava Jato 53

1.7 Ascensão e queda do ex-governador Sérgio Cabral 59

2 POLÍTICA,PODERESUASRELAÇÕESCOMACORRUPÇÃO 64

2.1 A questão da corrupção sob a ótica do poder 65

2.2 Análise dos principais relatos do ex-governador Sérgio Cabral 66

2.3 As relações de poder para Foucault 68

2.4 Foucault e o biopoder, a governamentalidade e a culpa 78

2.5 Reflexões acerca da Corrupção na ótica de Foucault 84

2.6 O mal da atualidade: o olhar da Psicanálise no fenômeno do Poder e da

Corrupção 87

2.7 Reflexões sobre a Corrupção e o Mal-Estar na Civilização 102

3. DISCUSSÃO ECONSIDERAÇÕESFINAIS 110

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INTRODUÇÃO

A corrupção se tornou um dos assuntos mais comuns nas mídias sociais e cada vez mais expõe a falência da ética - fundamental à vida social, pois é baseada na consciência de que cada ação individual se reflete no contexto social e no universo particular do indivíduo. O ato de corromper é a expressão equivocada dos valores de uma dada cultura que justifica a exploração de uma pessoa sob a outra e que condecora aquele que obtém vantagens por sua perspicácia.

A corrupção, quando praticada na administração pública, expõe um universo de inversão de valores no qual prevalecem interesses particulares em detrimento dos interesses públicos, interferindo em todo processo social e político. Quando um governante desvia uma verba destinada à saúde ou supervaloriza a compra de insumos por meio de licitações ilícitas em seu benefício ou em benefício dos seus cúmplices, ele acaba por condenar ao desamparo social todos aqueles que necessitaram deste auxílio.

Os recursos públicos são provenientes dos cidadãos na forma de contribuições obrigatórias (impostos). Assim, a sociedade exige respostas aos seus anseios e necessidades na aplicação desses recursos, com o objetivo de ver e usufruir dos resultados decorrentes de um eficiente destino desta contribuição. É dever da administração pública a prestação de serviços públicos com qualidade e transparência na gestão destes recursos. A aplicação de capitais nesse setor expõe que nem sempre o sucesso se configura em aumento de confiança na conduta ética dos agentes públicos. A inquietação com a falta da ética pública faz parte da agenda política internacional devido às consequências que resultam da sua falta, pois além de ser um embaraço moral é uma cominação à ordem econômica e à saúde coletiva.

Neste sentido, este estudo busca discutir sobre o fenômeno da corrupção e suas relações com o poder nos indivíduos que trabalham na administração pública e de verificar como ela se expressa no comportamento ético nesse contexto, em observância aos preceitos que orientam a conduta no trabalho no serviço público. A pesquisa que subsidiará este projeto tem um enfoque genealógico, político, social e ético, e ainda usará alguns conceitos da Psicanálise. Partiremos de

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algumas hipóteses, entre elas, a de que há fatores no próprio modo de funcionar da administração pública que favorecem a não observância destes preceitos éticos, e de que a própria formação pessoal do indivíduo, tanto pelo contexto social quanto pessoal, pode favorecer ou dificultar a conduta ética no trabalho.

O interesse por este estudo se justifica, primeiramente, pelo fato de a pesquisadora exercer desde 2012 suas atividades profissionais no Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE/RJ) - Órgão responsável pela fiscalização da aplicação dos recursos públicos por parte dos governantes. O uso de todo o dinheiro do contribuinte aplicado em impostos é verificado por esse setor da Administração Pública, que tem sua missão e atribuição definidas pela Constituição.

Segundo informações disponibilizadas no site do TCE/RJ, o órgão atua em conjunto com a Assembleia Legislativa, e, quando solicitado, atua também com o Executivo, o Judiciário, o Ministério Público, a Receita Federal, demais tribunais de contas e outros setores. Um dos trabalhos de fiscalização refere-se à prestação de contas do Chefe do Poder Executivo do Governo do Estado, que são julgadas pela Assembleia Legislativa, com base no parecer prévio (contrário ou favorável), emitido pelo Tribunal - que verifica, por exemplo, se a Lei Orçamentária Anual aprovada por essa Assembleia foi respeitada, bem como o cumprimento dos limites constitucionais, em termos de aplicação de recursos em diferentes áreas, tais como educação, saúde e meio ambiente, entre outras.

Este trabalho também se estende às contas dos chefes dos Poderes Legislativo e Judiciário, bem como do Ministério Público e do próprio Tribunal de Contas, além dos prefeitos, presidentes de câmaras dos 91 municípios fluminenses, secretários estaduais e municipais, presidentes de autarquias, fundos e fundações, entre outros órgãos. As contas dos administradores da Capital são analisadas pelo Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro. Assim, num ambiente onde as irregularidades são frutos da má-gestão ou efeito dos equívocos éticos praticados por estes servidores, identificamos a necessidade de buscar respostas acerca da prática da corrupção e da ausência da moralidade na administração pública, não apenas no âmbito deste estado, mas em todo o Brasil.

Este projeto é a continuidade de uma vida dedicada à minha formação (graduação, especializações, pós-graduações e Mestrado) na área da Psicologia. Esse caminho se funde à minha trajetória profissional e ao meu interesse pelo

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estudo do comportamento humano, do Direito, da Filosofia, da Sociedade e, atualmente, pelo estudo da dimensão ética do sujeito e suas relações com o poder.

Esta pesquisa também se justifica pelos atuais questionamentos que a sociedade tem feito sobre a atuação de nossos governantes e aos escândalos que levaram a população a grandes manifestos, indagações e conflitos que permeiam a prática da ética na administração pública. Ela ainda se justifica pelo inexpressível número de material publicado sobre o tema, o que mostra a necessidade de uma maior investigação e reflexão do fenômeno.

No aspecto institucional, o assunto abordado se torna relevante no contexto da ética, o que me permitirá, como servidora, agregar valor sobre as atividades exercidas hoje e futuramente, visando ao cumprimento da missão institucional; no incentivo ao autodesenvolvimento e desenvolvimento profissional contínuo; na disseminação do conhecimento adquirido, visando ao aperfeiçoamento profissional e institucional; no comprometimento com a chefia com o processo de desenvolvimento do servidor; na inovação de processos educacionais; no estímulo à pesquisa e a publicações sobre ética na administração pública; para a excelência dos serviços prestados no âmbito deste Tribunal, entre outras.

O objetivo geral deste estudo é apresentar uma compreensão teórica e prática da corrupção a partir da investigação bibliográfica e de dados colhidos por meio de publicações em jornais, revistas de dados relevantes das falas, ações e condutas sobre o tema, e do estudo do caso de um ator envolvido no cenário político (reconhecido pelo seu descompromisso ético e condenado por seus atos de corrupção na Administração Pública Governamental do Estado do Rio de Janeiro) – o ex-governador Sérgio Cabral.

Os agentes públicos têm como premissa a promoção da confiança da sociedade em seu caráter ético, na sua conduta, exercendo suas funções com segurança, inteireza, e clareza sobre o que pode e o que não pode ser feito, como preconiza a Declaração Universal dos Direitos Humanos, no campo da promoção da ética pública, estabelecendo valores como paz, segurança, desenvolvimento socioeconômico das nações e dos povos e padrões éticos internacionais, a serem perseguidos pelos Estados. A Declaração ainda define, em seu artigo 21, que todos têm o direito de participar do governo de seu país, todos têm o direito de

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acesso igual ao serviço público em seu país e a vontade dos povos será à base da autoridade do governo.

Nesse sentido, é uma responsabilidade do governo, pois é necessário assegurar e facilitar a participação de seus cidadãos no processo de governança e a prestação de serviços públicos de qualidade, acessíveis a todos. Assim, algumas hipóteses devem ser consideradas, como o modo de funcionar da administração pública que favorece a não observância dos preceitos éticos; a formação pessoal do indivíduo, tanto pelo contexto social quanto pessoal pode favorecer ou dificultar a conduta ética no trabalho; o poder político como fonte de corrupção das pessoas; e as pessoas corrompidas pelo abuso entre as relações com o poder.

Dessa forma, abordaremos no primeiro capítulo a história da corrupção no Brasil, suas possíveis causas e tipos, perpassando por fenômenos, fatos e história em diversos períodos até os dias atuais com a operação “Lava Jato” e a prisão do ex-governador Sérgio Cabral. Neste capítulo, ainda contextualizaremos conceitos de ética e poder de forma objetiva para uma melhor compreensão do estudo. No segundo capítulo investigaremos o fenômeno da corrupção e introduziremos o pensamento filosófico contemporâneo. Pesquisaremos ainda a questão da corrupção sob a ótica do poder, utilizando, além da filosofia, a abordagem psicológica e psicanalítica na constituição do poder neste sentido.

Para a metodologia, o presente estudo tem como proposta a abordagem qualitativa de um estudo de caso. Segundo Chizzotti (2003), a pesquisa qualitativa se refere a um trabalho empírico, por meio do desenvolvimento de uma pesquisa que visa reunir e organizar um conjunto comprobatório de informações. Essas informações retiradas dessa pesquisa são documentadas, abrangendo qualquer tipo de informação disponível, escrita, oral, gravada ou filmada, que se preste para fundamentar o relatório do caso que será, por sua vez, objeto de análise crítica pelos informantes ou qualquer interessado.

Godoy (1995) destaca que a pesquisa qualitativa parte de questões amplas, que se definem ao longo do estudo, não havendo hipóteses pré-estabelecidas, separação sujeito-objeto, neutralidade científica, generalização ou manipulação de variáveis. Nesse sentido, não tem perspectiva de investigar em termos de causa e efeito, pois considera que os fenômenos sociais que estuda são determinados por uma complexidade de causas e efeitos. Neste tipo de pesquisa, o mais importante

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é o porquê do fenômeno, partindo de como o olhar, os discursos e as práticas em relação ao objeto estudado foram construídos historicamente.

O estudo também se dará por meio de uma pesquisa bibliográfica. Serão utilizadas produções acadêmicas e artigos publicados em sites científicos, indexados nas bases de dados como: SCIELO (Scientific Eletronic Library Online), BVS (Biblioteca Virtual de Psicologia), PEPsic (Periódicos Eletrônicos em Psicologia) e no Google Acadêmico, a respeito do tema pesquisado, em consonância com o objetivo exposto. Também serão analisadas as publicações de livros que abordam assuntos como a Psicanálise, ética, política e sociedade. Nesse contexto, serão utilizadas as obras de Michel Foucault, Sigmund Freud e suas reflexões de amplitude social e cultural juntamente com outros autores contemporâneos. Para complementar a fundamentação teórica, estudaremos autores que suplementarão os estudos além de outros que contribuíram para história social e política da corrupção e sua relação com o poder. Diante da escassez de produção bibliográfica referente à corrupção na atualidade, utilizamos ainda publicações jornalísticas, principalmente a coleta das falas públicas do ex-governador.

A pesquisa será descritiva, pois visa observar, analisar e registrar as informações sobre o poder e a corrupção na Administração Pública, assim como sua dimensão ética. A pesquisa será ampla dentro do fenômeno estudado, pois buscará compreender e refletir sobre o indivíduo e suas relações com o poder, e como esta relação implica de forma contundente na ética presente no trabalho dos representantes legais do Estado, perpassando ainda pela figura do ex-governador, visando definir os condicionantes da relação entre poder e corrupção.

Para Minayo (1994), uma pesquisa qualitativa será sempre descritiva e as descrições nela contidas estão sempre influenciadas pelos significados que o ambiente lhes proporciona, ou seja, são produtos de uma visão subjetiva. Segundo a autora, é uma realidade que não pode ser quantificada, respondendo a questões muito particulares, trabalhando com um universo de significados, crenças e valores e que correspondem a um espaço mais profundo das relações, dos fenômenos que podem não ser reduzidos à operacionalização de variáveis.

O método incluirá revisão crítica da literatura, visando subsidiar e a dar sustentação às afirmações contidas neste estudo, especialmente no que tange às Leis, à Administração Pública, à Psicanálise e à sociedade. Triviños (1987)

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salienta que no processo de desenvolvimento do estudo há também a necessidade de uma fundamentação teórica geral, sendo fundamental uma revisão aprofundada de toda a literatura em torno do tema. E é essa fundamentação teórica que proporciona a formulação das questões de pesquisa e das perguntas norteadoras.

As publicações disponibilizadas foram investigadas por meio das palavras-chave isoladas ou em interação: Ética/Corrupção; Origem/Corrupção; Corrupção/ Poder; Corrupção/Psicanálise; Psicanálise/Poder. Esse levantamento foi fundamental para a verificação empírica quanto ao estado da arte e no que se refere ao ineditismo proposto neste trabalho no Brasil.

Para a coleta de dados serão utilizadas falas, ações e condutas do ex-governador – disponibilizadas nos grandes periódicos jornalísticos produzidos à época. A metodologia da análise de dados será calcada na abordagem de Bardin (2002), bem como as exigências da análise de conteúdo. Tal análise foi definida pela autora como um conjunto de técnicas que tem a comunicação como ponto de partida e é sempre feita a partir da mensagem, tendo por finalidade a produção de inferências. O ato de inferir significa a realização de uma operação lógica, pela qual se admite uma proposição em virtude de sua ligação com outras proposições já aceitas como verdadeiras. Na análise de conteúdo, os dados são reunidos segundo um significado comum (dados brutos) e depois reunidos em categorias empíricas relativas à problemática da pesquisa. Essas categorias são escolhidas pelo pesquisador, segundo critérios definidos tanto pela pesquisa quanto pelos próprios dados brutos, como veremos abaixo (BARDIN, 2002). Neste caso, os registros das falas do ex-governador compreendem as fases de pré-acusação, pós-acusação, pós-condenação e pós-prisão.

Para sua contextualização, o presente trabalho apresentará o estudo do caso do ex-governador Sérgio Cabral para a coleta de dados, selecionados diante dos papéis fundamentais que representam no cenário da corrupção. Outro critério adotado para a participação nessa pesquisa foi a relação do caso com o poder e a Administração Pública.

A análise desses dados se dará à luz de Bardin (2002), que aponta como pilares na análise de conteúdo a fase da descrição ou preparação do material, a inferência ou dedução e a interpretação. Dessa forma, os principais pontos da pré-análise foram a leitura flutuante (primeiras leituras de contato os textos), a escolha

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dos documentos (no caso os relatos transcritos), a formulação dos objetivos (relacionados com a disciplina), a referenciação dos índices e elaboração dos indicadores (a frequência de aparecimento) e a preparação do material.

De acordo com Ludke (1996), o processo de análise de conteúdos tem início com a escolha de uma unidade de análise. Há dois tipos de unidade: a de registro e a de contexto. Na primeira, selecionam-se segmentos específicos do conteúdo, como, por exemplo, a frequência com que aparece no texto uma palavra, um tópico, um tema, uma expressão, uma personagem ou um determinado item. Em outros casos será preferível analisar o contexto em que uma unidade dada ocorre.

Serão utilizadas as seguintes sugestões de Bardin (2002) para a análise de dados propriamente dita: 1 - Uma delimitação progressiva do foco de estudo; 2 - Uma formulação de questões analíticas, a fim de permitir a articulação entre os pressupostos teóricos do estudo e a evidência empírica; 3 - O aprofundamento da revisão da literatura; 4 - A testagem de ideias junto aos sujeitos, neste caso o ex-governador; 5 - Um uso extensivo de comentários, observações e especulações ao longo da coleta.

Quanto aos procedimentos de análise de dados, inicialmente será realizada uma leitura vertical das publicações. Entendemos por leitura vertical a das entrevistas, reportagens, artigos e depoimentos, um a um, do começo ao fim (sem preocupação de análise), mas, sim, com a compreensão do conteúdo. Recorreremos a áudios e vídeos disponibilizados pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro no momento dos depoimentos para nos certificarmos ou esclarecer falas reproduzidas em forma de texto. Serão realizadas as correções às transcrições no sentido de dar maior fidedignidade possível às falas.

Após uma nova leitura de cada material, desta vez marcando os temas relacionados ao objeto da pesquisa, agruparemos as categorias identificadas em cada relato, formando um conjunto organizado em temas, para efeito de comparação, quanto às semelhanças e variações. A leitura exaustiva de cada um dos dados pode realçar categorias mais evidentes que deram origem a uma primeira classificação: o estudo de caso.

Buscaremos, com isto, atender aos critérios de qualidade das categorias, sugeridos por Bardin (2002), ou seja, que as categorias devem ser mutuamente exclusivas, homogêneas, pertinentes e produtivas. Embora considerados esses

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critérios, a complexidade e a ambiguidade das falas, ao contrário de constituírem problema para análise, serão enriquecedoras de aspectos novos que permitiram criar categorias próximas do conteúdo delas.

As categorias identificadas ao final deste processo de análise serão trabalhadas utilizando ainda alguns fundamentos da Psicanálise. Ressalta-se a importância dos estudos empíricos referenciados na análise do material extraído das publicações sobre o caso. As categorias não serão quantificadas, mantendo-se fiel ao princípio qualitativo (MINAYO, 1994). Os resultados mantendo-serão obtidos por meio do estudo do referido caso. Percorreremos as categorias definidas pela análise de conteúdo e traçaremos alguns comentários a título de articulação de conteúdos significativos e/ou relevantes para o objeto de estudo.

A partir da análise de um mau governo, podemos refletir que a falta de ética é um sintoma de administração e gestão deficientes, o que permite que gestores públicos irresponsáveis ou inescrupulosos explorem oportunidades para pôr o interesse próprio acima do interesse público, contrariando as exigências de seus cargos. É necessário estabelecer sanções administrativas e punições contra a má conduta, por intermédio de processos criminais e civis, para demonstrar que falhas éticas não são toleradas.

Esta pesquisa busca evidenciar que a má conduta está ligada, não só a um problema estrutural de fragilidade institucional, mas emocional e ético também. Um sistema legal inadequado antecipa, catalisa e reforça padrões de comportamento inadequados. Mas, por outro lado, a falta de treinamento profissional no serviço público e dos planos de carreira faz com que a corrupção crie raízes e um sentimento de impunidade que toma conta daqueles que não possuem valores éticos.

Educar os cidadãos sobre os seus direitos, aumentar a transparência e a responsabilização dos gestores públicos para com suas ações é fundamental numa sociedade; contudo, para assegurar um padrão ético adequado no setor público são necessários: vontade política, transparência, normas simples e suficientes de conduta.

Diante disso, este trabalho buscar avançar nesse novo entendimento, como contribuição ao controle social, tendo como consequência o surgimento de um novo olhar no campo da administração pública, trazendo para análise modelos já existentes sobre a ética pública.

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CAPÍTULO 1:

A CORRUPÇÃO NO BRASIL: DO

DESCOBRIMENTO À ATUALIDADE

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1.1 A contextualização da Ética e sua diferenciação da Moral no fenômeno corrupção

Iniciaremos nosso estudo realizando a priori uma contextualização da moral e da ética no fenômeno corrupção para um maior esclarecimento sobre o seu panorama. Contudo, seu desenvolvimento e aplicabilidade serão explorados no decorrer da pesquisa teórica que subsidiará a tese, pois a dimensão ética do exercício do poder sustentará a hipótese proposta. Este capítulo reflete um propósito que é a compreensão e interesse geral sobre um tema importante para o Brasil no contexto atual, vivendo a maior crise de sua história, o que demanda uma reconstrução política, exigindo um reforço da dimensão ética desta prática.

A corrupção não é um episódio esporádico, é uma novela infinita do cotidiano brasileiro. Assunto comum nos lares e botequins faz parte do senso comum e dos julgamentos mais superficiais sobre a política brasileira. Não é novidade que a corrupção é o um dos crimes mais perversos que podem ocorrer dentro de uma democracia liberal. Como afirmado anteriormente, ela expõe a falta da ética num mundo em que o indivíduo é autodeterminado, indica a falta ética de um sujeito por meio de escolhas e decisões individuais. Para vivermos em sociedade é necessário cumprir regras éticas e o corrupto corrompe essa regra, essa lei.

Segundo Vasquez (1997), a palavra ética vem do grego ethos que significa “modo de ser, caráter”. Algumas vezes é considerada como sinônimo da palavra moral, esta de origem latina, morale, que quer dizer “costumes”. No entanto, a moral pode ser definida como um conjunto de normas e regras destinadas a regular as relações dos indivíduos numa comunidade social. A ética, por sua vez, relaciona-se ao estudo dos juízos de apreciação que se referem à conduta humana, do ponto de vista do bem e do mal, seja relativo a uma sociedade, em determinada época, seja de modo absoluto.

De acordo com Hegel (1990), a ética, muitas vezes, é confundida com a moral, pois na Grécia Antiga já foram consideradas sinônimas, embora tenham conceitos diferentes. O filósofo Aristóteles, inclusive, afirmou que moralidade não está apenas na ordem do discurso, mas também na paixão e na ética. A separação dos dois termos se deu progressivamente e se afirma com a

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declaração de que a vida ética exige o desempenho de obrigações morais, legais e éticas. O autor ainda utiliza o argumento de Kant, de que a moralidade é a consciência moral, em seu imperativo categórico, como códigos para determinados grupos sociais, sem precisar prestar contas a ninguém. A eticidade, em contraponto, constitui-se da formação do caráter de cada indivíduo, segundo padrões de identificação do ambiente familiar e social (HEGEL, 1990).

Conforme Sung e Silva (1995), a ética é uma reflexão teórica que analisa e critica ou legitima os fundamentos e princípios que regem um determinado sistema moral, ou seja, a ética poderia ser entendida como a teoria sobre a prática moral. A moral, portanto, fica compreendida como algo que se impõe de fora para dentro, baseada nos costumes; a ética, por outro lado, implica uma análise crítica destes costumes que serão aceitos ou questionada pelo indivíduo. A ética pressupõe um juízo de valor que vem de dentro para fora do indivíduo. Analisando ainda o conceito de ética, observa-se que esta depende de opções dadas ao indivíduo, ou seja, do poder da liberdade de escolha.

Esta possibilidade de escolha, como requisito para classificar uma atitude como ética, é colocada por Aristóteles em Ética a Nicômaco. A ética implica uma escolha própria de cada indivíduo e não deve depender de terceiros. Diante de uma situação, o indivíduo age de acordo com seus valores e com as opções que lhe são apresentadas em um determinado momento. Além de ter como pré-requisito a liberdade, o exercício da ética implica também responsabilidade. Dessa forma, a moral é cristalizada na sociedade, enquanto a ética é individual e crítica, estando relacionada, assim, à liberdade de escolha e à responsabilidade.

Para Vasquez (1997), a ética é a teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade. A eficácia ética tem por propósito a reflexão crítica da atividade moral, quer dizer, sobre o que é ou pode ser errado. Dessa forma, a ética não é moral. Moral é o objeto de estudo da ética, diz respeito aos costumes, valores e normas de conduta de cada sociedade. A ética pode ser entendida como o regimento, a lei do ato moral, o controle de qualidade da moral. Os códigos de ética, por exemplo, servem para os diferentes “tipos” de sociedades dentro do sistema maior. A ética ainda está presente em todas as ações humanas, que, por sua vez, são norteadas por valores. No sentido das atitudes humanas estão os estudos científicos nas quais também estão incluídos os valores. Os valores não

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são estáveis, eles evoluem com as necessidades do homem, haja vista o princípio da igualdade, que diz respeito a tratar da mesma maneira indivíduos diferentes, hoje repensados como da equidade, ou seja, devem-se atribuir tratamentos diferentes a indivíduos diferentes, entendendo-se que não há nada mais desigual do que tratar igualmente situações ou indivíduos com características diversas.

Na leitura de Vasquez (1997) ainda podemos definir a ética como um conjunto de regras, princípios ou maneiras de pensar que guia, ou chama a si a autoridade guiar, as ações de um grupo em particular (moralidade), ou, também, o estudo sistemático da argumentação sobre como nós devemos agir (filosofia moral). A real subsistência da moral não significa a existência evidente de uma ética, entendida como filosofia moral, pois é essencial uma reflexão que questione e interprete o sentido dos valores morais. Assim, temos a compreensão de que existe uma profunda ligação entre Ética e Filosofia: a primeira nunca pode deixar de ter como fundamento a concepção filosófica do homem que nos dá uma visão total deste como ser social histórico e criador. Uma série de conceitos com os quais a ética trabalha de uma maneira específica, como os de liberdade, necessidade, valor, consciência e sociabilidade pressupõe um prévio esclarecimento filosófico. Também, os problemas relacionados ao conhecimento moral ou com a forma, significação e validade dos juízos orais exigem que a ética recorra a disciplinas filosóficas especiais, como a lógica, a filosofia da linguagem e a epistemologia.

A questão da dimensão ética deve ser abordada a partir de pressupostos básicos que a fundamenta, como o da dialética da necessidade e da liberdade. Assim, a história da ética se entrelaça com a história da filosofia, e é nesta que ela busca fundamentos para regular o desenvolvimento histórico-cultural da humanidade. Dentro do nosso estudo, esse viés perpassa ainda pela história do Brasil e a formação do indivíduo.

1.2 Panorama da Corrupção

A corrupção não acontece somente no Brasil, é um fenômeno político e, principalmente, econômico que possui uma longa história. No decorrer da evolução dos povos está repleta de fatos denegridores que foram proporcionados por seus governantes, independente de seus títulos – Caciques, Faraós, Reis,

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Imperadores, Papas, Presidentes, entre outros, estiveram envolvidos em tais atos. Atualmente, o tema faz parte do cotidiano social de forma insistente e de várias maneiras. Contudo, existe uma diversidade de atos que abrange seu histórico como nepotismo, propina, desvios de funções, altos salários de servidores que não comparecem ao trabalho, suborno, entre outras condutas ilícitas da posição pública em benefício próprio que são veladas e não chegam ao conhecimento da sociedade, pois sua prática é sempre encoberta.

A corrupção é um fenômeno negativo e injusto do ponto de vista social, pois favorece um ambiente de incerteza e ineficiência que afeta o desenvolvimento dos mercados, atrasa o crescimento de um país, acentua as condições de pobreza, diminui o desenvolvimento econômico, atingindo principalmente os cidadãos menos abastados. Nesta pesquisa, identificamos diferentes abordagens sobre corrupção, apresentando diversas dimensões do seu estudo, como a legal, a econômica, a política, a cultural e a administrativa. Cada teoria traz distintos entendimentos sobre a corrupção e quais possíveis formas de reduzir a sua ocorrência, como citaremos sob a forma de uma breve explanação, mediante a pesquisa sobre a temática.

A dimensão legal abrange três aspectos: a má aplicação das leis, a falta de leis e as leis que favorecem a corrupção por meio de lacunas. É um rompimento com os deveres formais da função pública, como o suborno e o nepotismo. Nesse sentido, entendemos que com mais leis e com sua melhor aplicabilidade existiria menos corrupção; a dimensão econômica abrange pesquisas sobre a obtenção de vantagem financeira ilegal e seus efeitos nocivos para economia de um país; a dimensão política abrange estudos que caracterizam o aspecto político da corrupção, fraudes, irregularidades, superfaturamento, desvio de fundos públicos diante de manipulações de ordem política, levando em consideração que a prática é realizada por “políticos corruptos”; a dimensão cultural está ligada a crenças, religiões, influências da mídia e o comportamento social – aborda a questão da corrupção de acordo com a região, procurando entender se os aspectos culturais podem explicar como a corrupção está vinculada a uma sociedade e como esta tolera os agentes; a dimensão administrativa se traduz na ausência de um bom governo, reforçado sob a ótica da vulnerabilidade e fragilidade da prática governamental e o interesse do funcionário público em benefício próprio,

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rompendo instruções e regras internas com objetivos pessoais. Nesse sentido, o próprio Estado não elabora medidas anticorrupção, posto que falta formação e capacitação.

Como observado, existem algumas interpretações acerca do estudo da corrupção. Mesmo reconhecendo a importância das abordagens dessas dimensões na compreensão desse estudo, todas têm em comum o viés moral acerca da sua conceituação. Nesse sentido, constatamos que a corrupção tem a ver com o rompimento das virtudes do indivíduo, e se origina quando as regras são rompidas numa relação com a moral. Contudo, propomos o estudo da dimensão ética sob a ótica da nociva prática governamental do ex-governador e atual detento Sérgio Cabral Filho, que estudaremos no próximo capítulo. Dessa forma, algumas conceituações são importantes para a apresentação do panorama da corrupção.

Para Tanzi (1998), o termo corrupção é derivado do verbo latino rumpere, que significa romper, quebrar. É o que se rompe na sua organização; estava associado e se solta. Seria o rompimento de uma regra, uma lei, um código moral ou social. Para consolidação do ato, ele deve ocorrer pela intenção de um favorecimento pessoal ou com pessoa com a qual o corrupto tenha o algum vínculo.

De acordo com Miranda (2018), um dos primeiros acadêmicos a definir corrupção foi Valdimer Orlando Key, em 1936. Em sua Tese, ele considera a corrupção como o controle abusivo do poder e dos recursos do governo, visando tirar proveito pessoal ou partidário. Esse proveito pode ser na forma de poder ou controle dentro da organização política ou na forma de apoio político por parte de vários indivíduos (KEY, 1936, p. 5-6 apud MIRANDA, 2018). Nesse sentido, vemos que inicialmente o fenômeno se caracteriza como uma forma de obter vantagens por meio da extrapolação das tarefas dos servidores públicos.

Na redação dada pela Lei de Improbidade Administrativa, o conceito de “Corrupção” é inserido no entendimento dos “atos de improbidade administrativa”, que são caracterizados por causarem danos ao erário, enriquecimento ilícito e violação aos princípios administrativos. No Código Penal, corrupção é o termo para designar o mau uso da função pública, visando obter uma vantagem. A Corrupção passiva sobrevém quando um servidor público exige dinheiro ou outra

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vantagem para fazer algo ou deixar de fazer algo. Em contraponto, a corrupção ativa transcorre no momento em que um cidadão oferece um benefício financeiro ou de outra natureza a um agente público, visando a uma vantagem.

Segundo o site do The World Bank - Banco Mundial -, de acordo com as Diretrizes sobre Prevenção e Combate à Fraude e à Corrupção configura prática corrupta oferecer, dar, receber ou solicitar, direta ou indiretamente, qualquer coisa de valor para influenciar de maneira imprópria as ações de outra parte, sendo exemplos típicos dessas práticas o suborno e o “pagamento por fora”.

Para Agostinho de Hipona, o conceito de corrupção tem a religião como indicador das práticas políticas e a Terra seria um mundo corrupto de cobiça, luxo e vaidade, numa eterna busca de redenção por meio da fé cristã. Santo Agostinho, como ficou conhecido, foi um defensor obstinado da corrupção moral, pois colocava a moralidade religiosa acima da política, defendendo inclusive que a queda do Império se deu pela corrupção moral dos romanos em sua obra “Cidade de Deus”. Na sua visão, a política é algo fundamental para que haja na sociedade a ordem. Por meio do exercício com retidão do poder, os governantes prestarão a todos um excelente serviço voltado para o bem comum. Santo Agostinho não distingue o fundamento ético do homem e do Estado, pois o Estado será bondoso, justo e correto se os seus agentes forem movidos pela justiça – que se encontra somente em Deus, sendo esta a condição para que o Estado desempenhe com eficácia sua função de promover a segurança, a paz e a concórdia dos cidadãos. O pensador renascentista Maquiavel, em sua obra O Príncipe (1686), faz uma anteposição aos que tinham a corrupção como um caráter relacionado à moral individual, pois via na corrupção uma ligação com o enfraquecimento de leis e instituições políticas, bem como a falta de preocupação e ação dos cidadãos em relação à coisa pública. Para o autor, a corrupção é uma desgraça que soterra o conceito de bem público, sem distinção de partido e com poucas exceções, gerando a decadência e a ruína do Estado. Maquiavel rompe com a tradição do governante bonzinho, comparando-o a um déspota, desmistificando a ideia de que era um patriarca da pátria.

Podemos observar que, a partir desse discurso, iniciamos um movimento de ruptura da ética com a política a partir do momento que o autor desenvolve a ideia sobre como chegar ao poder sem escrúpulos, defendendo, inclusive,

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métodos pelos quais os fins justificam os meios. Nesse sentido, podemos destacar que diversos políticos no decorrer da História seguiram à risca os preceitos de Maquiavel (1686), lesando e prejudicando o próprio homem.

Bezerra (1995) aponta três definições mais usadas para a corrupção; a primeira delas é baseada no ofício público. Nesse sentido, a corrupção existe quando há desvio por parte dos servidores públicos, com o objetivo de obter benefícios para si ou para outrem. A segunda está baseada no mercado, que considera corrupção o ato do servidor que tem por premissa a maximização de sua renda pessoal. E, em terceiro, a definição centrada na ideia de bem público, que entende a corrupção como sendo a violação do interesse público em função da preocupação com ganhos particulares.

Para os juristas e filósofos italianos Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998), a corrupção é um comportamento ilegal de quem desempenha um papel na estrutura do Estado. É entendida como um fenômeno pelo qual o servidor público é levado a agir fora dos padrões normativos do sistema, favorecendo interesses particulares em troca de recompensa. Ainda de acordo com os autores, a corrupção é o comportamento ilegal de quem desempenha uma atividade estatal.

Segundo Prado (2014), a corrupção é uma forma de violar o bom funcionamento do Estado Democrático de Direito, principalmente porque acaba influenciando na Administração Pública. Neste sentido, a corrupção torna-se uma confusão entre interesses particulares com os interesses da Administração Pública, cujos fins sempre serão ilícitos. A imagem do Estado fica comprometida, sua credibilidade é questionada, já que o dever de todos que exercem alguma função pública é agir com probidade, eficiência e impessoalidade.

Carvalho (2001) afirma que no Brasil o sentido da palavra corrupção ganhou novos contornos, de acordo com cada período da História, e argumenta:

Uma das causas de nosso pobre desempenho analítico pode estar na dificuldade de precisar o que cada um entende por corrupção. Em nossa história e sem dúvida também em outras, o sentido da palavra variou ao longo do tempo (CARVALHO, 2001).

Para o autor, a corrupção pode ser ainda caracterizada pela determinação de se fazer algo por vias ocultas de acordo com a concepção ética da maioria (corroborando com a proposta do estudo), não se tratando apenas de uma

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questão de imoralidade, mas sim de ilegalidade, visto que está intrinsecamente ligada a um comportamento contrário à lei, por parte de quem desempenha um papel na estrutura estatal.

No Brasil, quando pensamos em atos de corrupção, atribuímos imediatamente aos representantes políticos, que no país são eleitos democraticamente pela sociedade para o exercício de governo. Diante deste senso comum, não há dúvidas que, historicamente, os agentes políticos adotam práticas ilícitas, caracterizando-os frente à sociedade, como a face da corrupção. Por outro lado, o conceito popular de “jeitinho brasileiro” assumiu um papel preponderante nas relações entre os indivíduos, tornando-se tão comum ao cotidiano, que em muitos casos ocorre de modo imperceptível.

Para Bittencourt (2010), de acordo com o Código Processual Penal Brasileiro, a corrupção é um delito (art. 333). Conforme dispõe o referido artigo, a corrupção está baseada no ato de oferecer ou prometer alguma vantagem indevida ao funcionário público, como forma de ele praticar, omitir ou retardar ato de ofício, que é aquele compreendido entre as atribuições funcionais específicas do servidor público. A corrupção está dividida em ativa - quando o servidor realmente a pratica – e a passiva – que acontece em razão da sua conduta no sentido de receber ou aceitar de vantagem indevida.

De acordo com o Código de Ética dos Servidores Públicos, toda e qualquer prática que atente contra a moral, ou burle as leis e regulamentos, com intuito de obter vantagens para si ou para outrem se caracteriza como o objeto da corrupção. Contudo, no dia a dia, são comum atitudes como oferecer propina a agentes fiscalizadores e policiais para evitar multa, não emitir uma nota fiscal, furar fila, comprar produtos falsificados, bater ponto para o colega, colar na prova da escola, fazer “gato” na televisão a cabo ou na energia elétrica, alterar o peso e medida de produtos, exercer a profissão sem a devida observância aos Códigos de Ética profissional, sonegar impostos, utilizar bens públicos para fins particulares ou em benefício de terceiros, entre outros atos tão ilícitos quanto os cometidos pelos governantes do País. O fato é que poucos reconhecem que praticam atos corruptos, ainda que muito pequenos, mas, mesmo assim não conseguem abrir os olhos para verem as próprias falhas e mergulham pouco a pouco na corrupção cotidiana.

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Desta maneira percebemos que a corrupção não é privilégio dos políticos ou servidores públicos, posto que está arraigada no cenário social brasileiro como uma doença contagiosa e até incurável, pois não foi descoberta a vacina ou o antidoto para esse mal que ultrapassa os limites da moral e da ética.

Para Nietzsche (2008), o sujeito decadente é crente, iludido pela estrutura do pensamento; é aquele que vive num mundo de fantasia e sombras. O autor dá o nome de corrompido a um animal, a uma espécie, a um indivíduo, quando perde seus instintos, quando escolhe o que lhe é nocivo. A corrupção não se trata de criar uma estratégia para movimentar mais poder, para se afirmar como o detentor desse poder: pelo contrário. Ela é o sentir-se culpado por ter criado a estratégia e revelar-se como culpado para as autoridades:

A entendo – e desejo enfatizar novamente – livre de qualquer valor moral: e isso é tão verdade que a corrupção de que falo é mais aparente para mim precisamente onde esteve, até agora, a maior parte da aspiração à “virtude” e à “divindade”. Como se presume, entendo essa corrupção no sentido de decadência: meu argumento é que todos os valores nos quais a humanidade apoia seus anseios mais sublimes são valores de decadência (NIETZSCHE, 2008).

Para o autor, a corrupção é a decadência contra a humanidade, pois acreditam que o futuro é tão incerto que vivem para o momento: estado de alma que favorece o jogo dos tentadores de todas as espécies, posto que também não se deixa seduzir, e corromper, se não por “um momento”, reservando-se a um futuro e à virtude.

Este panorama evidencia que o político acha justo fazer de tudo para continuar no exercício do poder, considerando como ações legítimas atos como lesar o erário, subornar e extorquir, agindo dentro da lei, só que uma lei própria. Esse abuso de poder não pode ser considerado comum.

O poder é a capacidade de agir direta ou indiretamente que se exerce entre pessoas, configurando uma estratégia política. Não existe sociedade sem poder e as relações de poder nascem dentro da sociedade. O poder político surge com Estado, e ele definirá as regras sociais que estabelecem as relações entre os cidadãos, visando organizar, proteger e assegurar a vida em sociedade. Com o Estado nascem as instituições e os regimes políticos que inicialmente foram estabelecidos para pôr fim ao sistema de poder pessoal. Neste sentido, faremos

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uma contextualização inicial do poder; contudo, este será a base para os próximos capítulos.

1.3 A Corrupção e o Exercício do Poder

A Constituição Federativa do Brasil (1988) declara em seu primeiro artigo que o povo é titular do poder, que o exerce por meio de representantes eleitos democraticamente. Na Constituição, o povo é soberano e detentor do poder, podendo este estipular limites ao exercício deste, pois é direito do povo reavê-lo quando os interesses dos representantes se sobrepuserem aos interesses coletivos. Essa soberania popular é exercida pelo voto, e os direitos e deveres que tratam da participação do povo na vida política são assegurados, sendo um instrumento que dará limites ao próprio poder, o arbítrio, dentro da sua regulamentação baseada na democracia e com seus objetivos fundamentais: a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

Na atualidade, um dos fundamentos da democracia baseia-se na ideia de que os governantes devem prestar contas ao povo, responsabilizando-se por suas ações ou omissões no exercício do poder. Em contraponto, sempre surgem preocupações do lado dos que detêm o poder, e da força que essas instituições que os controlam possam ganhar; um desses órgãos são os Tribunais de Contas. Notamos que existe uma preocupação latente de que o controlador se torne sem limites, que ele se sobreponha e se torne um grande um vilão sobre o governo e sobre a própria sociedade, impedindo o desenvolvimento do país.

O filósofo francês Michel Foucault, em sua obra “A Microfísica do Poder”, de 1979, afirma que o poder é exercido de múltiplas maneiras e não somente a partir do Estado ou outras estruturas sociais historicamente poderosas, como a Igreja, a escola ou forças armadas. Segundo o autor, existe um “micropoder”, que é exercido igualmente nas relações sociais diferentes do “macropoder”, em que indivíduos ou a sociedade exercem o poder e praticam a coação mediante ele, podendo afetar uma relação conjugal, familiar, trabalhista ou até social, pois nossas relações diárias são um conjunto de pressões e contrapressões entre indivíduos.

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Foucault (1979) analisou como os mecanismos de poder operam na sociedade. Sua reflexão sobre o tema vai além da esfera pública e política, já que, para ele, o poder está na base de todas as práticas sociais e não se traduz numa posse, mas, sim, numa relação entre uma ou mais pessoas e jamais será exercido sem algum tipo de resistência. Ele deve obedecer às regras sociais, institucionais e culturais interiorizadas pelo indivíduo.

Neste sentido, para Foucault (1979), o poder está difundido em todas as formas e setores, sendo mais evidente nas instituições políticas. A sociedade se constitui como vítima desse poder, tornando o homem escravo dessas instituições e de toda forma de poder. O autor afirma que o poder é micro e macro, pois ele se fragmentou e se tornou eficaz, formando autoridades ditadoras em nome do Estado de direito, destruindo, assim, a democracia. Dessa forma, o poder não está apenas no setor público, mas em todos os lugares, em todas as classes. Contudo, o controle desse poder é fundamentalmente político, ideológico, possibilitando vantagens aos seus agentes. Com o poder nas mãos, a corrupção se vislumbra e pode acometer tanto um policial quanto um senador.

De acordo com Foucault (1979), não é possível a prática da corrupção sem o poder; portanto, a corrupção é um fenômeno de quem exerce o poder. Desse modo, é primordial a criação das leis, que são rigorosas para aqueles que usufruem o poder, beneficiando, assim, a punição dos corruptos. Foucault (1979) ainda analisou a questão dos interesses ao tratar das artes de governar ou governamentalidade, alegando que esta diz respeito à gestão das coisas e das pessoas, a um problema do próprio governo, no sentido de condução das populações. É o problema do governo como gestão das condutas que forma o objeto das diferentes formas de governamentalidade política, sendo a primeira forma a razão do Estado, cuja ideia é definir os objetos que devem orientar o governo dos homens, realizado pelo poder soberano, e os objetos pelos quais se estruturará esse poder.

O Estado é ao mesmo tempo um dado e um objeto a ser construído. Por isso, é organizado por uma política interna baseada em princípios ilimitados de intervenção. Segundo Foucault, após uma ruptura conceitual houve uma transformação nas formas de governamentalidade, uma limitação nas medidas de política interna. A partir deste, as atividades individuais passaram a obedecer a um

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princípio de limitação intrínseco. Para ele, o instrumento intelectual que motivou essa transformação foi a economia política e o seu resultado foi a nova forma de governamentalidade chamada liberalismo.

Foucault (1979) aponta que a principal característica do liberalismo é assegurar o jogo complexo dos interesses, garantindo a liberdade necessária para que tal jogo se desenrole. Assim ele inicia a discussão sobre os mecanismos de segurança como o princípio de cálculo para a fabricação das liberdades necessárias à arte de governar liberal, que tem seu funcionamento unificado à necessidade de determinar exatamente em que medida, e até que ponto, os interesses individuais, as liberdades individuais, vão constituir ou não um perigo para o interesse de todos. A partir dessa discussão entende-se que o jogo de interesses no liberalismo só poderá se manter puro ou livre de corrupção se houver mecanismos de segurança que garantam a separação das esferas de interesse, a pública e a privada.

O fenômeno da corrupção no Brasil tomou um curso grandioso que atinge todos os degraus institucionais com raras exceções. Sua prática gera descrédito seja qual for sua natureza, sendo considerado o grande mal da política, que acabou tornando o poder em crime. A corrupção é o uso discricionário do poder, opondo-se não só às virtudes, mas às leis como um todo. O agente político é visto como um indivíduo que tem acesso a esse poder, por isso a ideia de que a corrupção é um problema somente ligado à política. Essa afirmação corrobora com o pensamento de Foucault, pois essa “microfísica da corrupção” existe e dela participam muitos indivíduos que publicamente condenam esse histórico de desvio de conduta. Essas microformas de corromper a vida social perdem a visibilidade diante dos altos desvios de verbas que esvaziam os cofres do Estado com a macrocorrupção, que envolve ministros, parlamentares, etc. Contudo, todos nós somos cúmplices quando não denunciamos todas as formas de corrupção praticada, que deve ser combatida tendo como base o viés da ética.

1.4 Corrupção e causalidade

A corrupção, como já foi acima constatado, é um crime mais conhecido e difundido no meio político diante do acesso ao poder. Não existe uma causa única

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para sua existência, visto que ela decorre de uma variedade de fatores. Um destes é a impunidade, que significa ausência de punição. A impunidade faz com que a corrupção se torne uma prática costumeira, frequente, cotidiana, em que o corruptor tem a segurança de que nunca será descoberto. Esta certeza da ausência de punição não é somente a falta da lei, mas, sim, da sua má aplicabilidade, na qual um advogado consegue facilmente encontrar lacunas na lei e livrar pessoas que lesaram o erário público de responder um processo criminal. O peso dessa impunidade recai sobre três esferas: a política, a econômica e a social. Na política, perde-se a credibilidade nos agentes públicos; na econômica, os danos ao erário, sem contar as mazelas sociais e a péssima qualidade dos serviços públicos, como saneamento, saúde, educação e segurança.·.

De acordo com Andrioli (2006), as consequências do sistema político brasileiro que se constitui num ciclo vicioso que facilita as ações corruptas são a falta de transparência, a exclusão da maioria da população das decisões políticas mais importantes, a baixa participação política da sociedade civil e a impunidade com relação à corrupção.

Para Sousa (2011), as causas da corrupção estão agrupadas em quatro aspectos: níveis de desenvolvimento, processos de modernização, cultura cívica e qualidade das instituições, dentre as quais destacamos a que encontra causas da corrupção nos níveis de desenvolvimento de um Estado, e a que faz correspondência da cultura cívica da sociedade com a corrupção. A primeira dimensão está intrinsecamente ligada a países com grandes desigualdades sociais, funcionando como um mecanismo paralelo de distribuição de renda, já que o Estado, enquanto detentor dessa função, não a realiza satisfatoriamente. Já no aspecto da civilidade das culturas como fator essencial para uma sociedade corrupta, o autor destaca que ela se justifica à medida que as sociedades com altos níveis de confiança social e institucional, e com uma maior participação e interesse da sociedade pela política, apresentam níveis de corrupção menos críticos.

Como observa Klitgaard (1994), a corrupção não está limitada aos países em desenvolvimento e seu predomínio e resistência são desalentadores. Para o autor, a corrupção tem um efeito nocivo sobre os gestores públicos e o desenvolvimento econômico e político, juntamente com órgãos ineficientes da

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administração pública, provocando um impacto imediato no crescimento dos países mais pobres. Ele aponta que se trata de um crime de cálculo e não de paixão, o que significa que este comportamento derivaria menos da falta de princípios éticos ou morais e mais das condições materiais favoráveis para a prática do crime. Vale ressaltar que o autor, ao fazer referência aos primeiros autores que escreveram sobre nações atrasadas ou colônias, ressaltaram a corrupção como sendo sinal de debilidade moral ou de inferioridade dos nativos (KLITGAARD, 1994).

Para Klitgaard (1994), de acordo com a teoria de cálculo, a corrupção ainda envolve três variáveis: a oportunidade para ocorrer o ato ilegal, a chance de a ação corrupta ser descoberta, e a probabilidade de o autor ser punido. Portanto, é importante a punição do autor, a penalização do ato corrupto exerce papel avançado no combate à corrupção de forma imediata, e na sua ocorrência, de forma mediata. A prática da transgressão está particularmente ligada à possibilidade de os atos corruptos serem descobertos.

Assim sendo, diante do apresentado podemos constatar que a questão da corrupção não seria sua distinção, mas sua punição, para que haja uma resposta à sociedade, visto que um sistema mais rígido causa temor ao pretenso corrupto. É comum subentender que um servidor público detém certos poderes, podendo, dessa forma, favorecer-se deles, utilizando o poder como moeda de troca, constituindo o abuso de autoridade de forma arbitrária.

O filósofo Aristóteles (2016) possui uma obra que trata especificamente da corrupção. Este livro sobre “A Geração e a Corrupção” aborda este tema mais como questão biológica do que como problema ético. Para o autor, todos os seres naturais possuem uma essência e uma finalidade. Quando a substância de algum ser ou sua finalidade se modifica, ele se corrompe, se degenera, se perverte. Assim, o ser vivo, ao morrer, também se corrompe. Há ainda corrupção quando um ser não cumpre ou deturpa sua finalidade.

Segundo Aristóteles:

(...) no que diz respeito à geração e à corrupção dos entes que se geram e se destroem por natureza, devemos distinguir, em todos eles do mesmo modo, suas causas e definições; ademais, é preciso determinar qual é o aumento e a alteração, e se por acaso se deve considerar que a alteração e a geração têm a mesma natureza ou se, pelo contrário, são

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diversas, tal como se diferenciam também quanto aos nomes que levam (...) (ARISTÓTELES, 2016)

Por exemplo, quando alguém afirma ser o que não é também é corrupção. O filósofo ainda realizou um estudo sobre a corrupção dos magistrados da época, em que alega que a ambição é a origem das revoltas políticas, posto que estas nascem da prepotência e abuso de cargos dos magistrados ambiciosos.

Dentre o conjunto de fatores responsáveis pelo nível de corrupção observado nas diversas nações, é possível destacar, dentre elas, as seguintes: a elevada burocracia, que reduz a eficiência da administração pública; um sistema judiciário lento e pouco eficiente; um elevado poder discricionário do Estado na implementação e condução de políticas; e salários inferiores no setor público, em relação ao setor privado.

Em nosso país existem inúmeros fatores que contribuem para a corrupção, é o que afirma Carvalho (2001):

...entre as inúmeras razões que agravaram a corrupção no Brasil estão, em destaque, o crescimento da máquina estatal, trazendo consigo uma excessiva burocratização, ampliando as oportunidades para o exercício de práticas clientelistas e patrimonialistas, e aumentando o domínio do executivo sobre o legislativo; a ditadura militar, que protegeu com o arbítrio a atuação dos governantes; e a construção de Brasília, que libertou os políticos do controle das ruas, ampliando a sensação de impunidade (CARVALHO, 2001).

A ineficiência estatal, por exemplo, comum em diversos Estados no mundo, é um considerável fator de desenvolvimento da prática de atos corruptos. Entendemos, assim, que a fonte da corrupção é a própria fonte do Estado.

Várias manifestações dessa ineficiência do poder público podem ser mencionadas como incentivos à corrupção, como, por exemplo: decisões arbitrárias, que desvirtuam o uso do poder, sendo resultado de uma imódica discricionariedade dos agentes públicos; o corporativismo existente em setores da Administração, como a Justiça, por exemplo; a ineficiência quase generalizada de repressão à práticas ilícitas praticadas por pessoas que exercem funções públicas importantes, entre outras.

Conforme se notam, inúmeras são as causas da corrupção, variando desde a civilidade das sociedades como um todo, até a reduzida probabilidade de efetiva punição. Importante salientar que a atribuição à corrupção não advém

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apenas de uma causa específica, mas antes de um conjunto de fatores que colaboram para sua prática e são esses fatores que devem ser analisados como forma de remediação de seus danos.

1.5 A Origem da corrupção no Brasil

No Brasil, a intimidade com a corrupção é tamanha que flerta com o cotidiano do brasileiro, que foram dados vários adjetivos para o termo corrupção, como cerveja, molhar a mão, jeitinho, rolo, esquema, mamata, negociata, por fora, taxinha, propina, presentinho, falcatrua, maracutaia, entre outros. Essas nomenclaturas estão associadas ao comportamento de querer “tirar vantagem em tudo”, pressupondo que os sujeitos aguardam o máximo possível de benefícios, visando exclusivamente ao benefício próprio.

A corrupção no Brasil não é novidade e sua história é marcada por diversos acontecimentos. Sendo assim, fica oportuna a necessidade de estudar o contexto histórico da corrupção em sua origem – O Descobrimento e, em outros momentos, que caracterizam e servem de referência para o fenômeno. Neste capítulo, essas épocas serão retratadas de acordo com as percepções sociais, políticas e morais, arraigadas em nossa atualidade.

De acordo com o site da Transparência Internacional, no momento desta pesquisa (dezembro, 2019), o Brasil ocupa no seu Índice de percepção da corrupção referente a 2018 da 96ª posição para a 105ª no ranking mundial. O País caiu e sua pontuação passou de 37 para 35: o valor mais baixo dos últimos sete anos. Ao lado do Brasil, estão países como Armênia, El Salvador, Peru, Timor Leste, entre outros. Neste sentido, o Brasil é um dos países mais corruptos do mundo, estudiosos afirmam que a corrupção surgiu na desde a época do seu Descobrimento (1500), o que aponta para um aprimoramento da arte de corromper na sua evolução histórica em todas as suas dimensões.

Segundo Mello (2015), as raízes da corrupção são observadas desde o processo de colonização e, posteriormente, nos primórdios da vida sociopolítica brasileira, no patrimonialismo, no clientelismo e no coronelismo. Os primeiros que aqui chegaram não tinham compromisso ético, moral, religioso e político, apenas a vontade de tirar proveito da situação, ludibriando os índios, por exemplo, em troca das riquezas naturais do novo território.

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