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Caio Cesar Carvalho Lima

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Academic year: 2019

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

CAIO CÉSAR CARVALHO LIMA

Análise da adequação das normas sobre competência às inovações decorrentes da sociedade da informação

Mestrado em Direito

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

CAIO CÉSAR CARVALHO LIMA

Análise da adequação das normas sobre competência às inovações decorrentes da sociedade da informação

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como exigência parcial para a obtenção do título de MESTRE em Direito Processual Civil, sob a orientação da Professora Doutora Arlete Inês Aurelli.

São Paulo

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

CAIO CÉSAR CARVALHO LIMA

Análise da adequação das normas sobre competência às inovações decorrentes da sociedade da informação

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo como exigência parcial para a obtenção do título de MESTRE em Direito Processual Civil, sob a orientação da Professora Doutora Arlete Inês Aurelli.

Aprovada em: _____________

Banca Examinadora

Profa. Dra. Arlete Inês Aurelli (Orientadora)

Instituição: PUC-SP Assinatura______________________

Prof. Dr.________________________________________________________ Instituição: ________________________Assinatura______________________

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Dedico a presente Dissertação de Mestrado em Direito aos meus pais, pelo exemplo maior de caráter e de dedicação aos filhos;

ao meu irmão, pelos fundamentais momentos que tornaram possível a elaboração da Dissertação;

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, por nunca terem medido esforços para me proporcionar todas as oportunidades que almejei, ainda que, para tanto, fossem necessárias renúncias ao seu próprio conforto, bem como por terem me ensinado a enfrentar os desafios cotidianos sempre de cabeça erguida. Sem dúvida, devo a eles bem mais do que a vida!

Ao meu irmão e a minha cunhada, por terem reduzido a carga a que fui submetido durante a elaboração deste trabalho, por meio de conversas de apoio, muitas vezes em situações nas quais apenas o carinho de irmão reconfortaria.

A minha noiva, pela convivência diária, pelo apoio incondicional e pela paciência de me tolerar nos dias mais estressantes, nunca tendo deixado de me amparar e sempre compreendendo os momentos nos quais não pude me dedicar a ela da forma como desejava, por ter que escrever esta Dissertação.

A minha Orientadora, que sempre me incentivou e deu relevantes direções sobre a melhor forma de conduzir esta dissertação, sem cujo apoio não teria sido possível concluir o trabalho com a profundidade necessária. Igualmente, agradeço pela oportunidade de ser seu assistente nas aulas de Graduação, há 04 semestres, o que tem propiciado grande vivência prática da arte de ser Professor.

Aos Professores Doutores João Batista Lopes e Maria Elizabeth de Castro Lopes, pelo acolhimento e apoio, em momentos bastante difíceis, durante a elaboração deste trabalho.

Ao Professor Doutor Cassio Scarpinella Bueno, pelos ensinamentos sobre Introdução ao Direito Processual Civil, bem como pelas valiosas informações para melhoria do trabalho, trazidas durante a Banca de Qualificação.

A todos os amigos que residem em São Paulo, especialmente ao Gustavo, Lucas e David, que conheci há mais de 15 anos no Colégio Militar de Fortaleza, e, desde então, jamais nos afastamos. Sem eles, que tornaram mais fácil a mudança e a adaptação, teria sido ainda mais difícil morar distante de toda a família.

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A todos do Escritório Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados Associados, referência internacional no estudo do Direito Eletrônico, sem os quais não teria obtido muitas das informações referenciadas no presente trabalho, bem como teria sido difícil aprofundar os estudos de diversos tópicos abordados.

Ao Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sem cujo auxílio, proporcionado desde a Graduação, jamais teria conseguido concluir os presentes estudos.

A Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), pelo fundamental apoio, sem o qual também não teria sido possível finalizar o presente trabalho, da forma como se apresenta.

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RESUMO

A presente Dissertação tem como objetivo principal investigar, sob a ótica do Direito Processual Civil, a adequação do conceito de competência, da forma como atualmente entendido, à realidade da sociedade da informação tecnológica. Para tanto, fundamental o estudo da doutrina, legislação, jurisprudência e dos projetos de lei relativos ao tema. Para alcançar o objetivo almejado, foi importante abordar a essência da Rede Mundial de Computadores, verificando os impactos legais trazidos em decorrência das alterações tecnológicas. Do mesmo modo, relevante observar as escolas de estudo do Direito da Informática e da Telemática, o que propicia acompanhar e entender a evolução na forma de se posicionar sobre o assunto ao longo dos anos. Convém também verificar os motivos que justificaram a criação das fronteiras territoriais, vez que esse marco artificial ainda é utilizado atualmente. É igualmente importante abordar a forma como o assunto é disciplinado em outras nações, especialmente nos Estados Unidos da América, na Itália e em Portugal, para os fins de colher a abordagem de outras nações sobre o tema. Por fim, relevante verificar a forma como os juízes pátrios estão se posicionando sobre o assunto, bem como a forma de tratamento do tema pelas previsões de lege ferenda. Entende-se que, dessa forma, conseguir-se-á cobrir o tema de forma ampla e com a profundidade que o trabalho suscita, embasando as considerações finais, de que o conceito de competência precisa ser atualizado, a fim de melhor se harmonizar às novas implicações sociais.

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ABSTRACT

This dissertation aims to investigate, from the perspective of Civil Procedural Law, the adequacy of the concept of competence as presently understood, considering the changes from the information technology society. To reach this objective, it will be important to study doctrine, legislation, case law and bills related to this theme. To achieve this desired goal, it is important to address the essence of the World Wide Web, verifying the legal impacts brought on as a result from technological changes. Moreover, it is relevant to study Cyberlaw’s schools of philosophy, which will make it

easier to understand the evolution of the subject over the years. It is also important to check the grounds taken into consideration for the establishment of territorial boundaries, since this artificial concept is still used today. Additionally, it is important to address how the subject is addressed in other nations, especially in the United States, Italy and Portugal, for the purposes of harvesting the treatment of other nations on the subject. Finally, it is relevant to verify how Brazilian judges are positioning themselves on the subject, and how to deal with the de lege ferenda predictions. With this research,

the topic will be extensively covered and with the depth that the work demands, which will lead to the conclusion that the concept of competence needs to be updated in order to be better harmonized with the new social implications.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

CAPÍTULO 01 – COMPETÊNCIA: CONCEITO CALCADO EM FRONTEIRAS TERRITORIAIS FIRMEMENTE DELIMITADAS? ... 29

1 JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA ... 29

1.1 O conceito clássico de jurisdição ... 33

1.2 Conceito clássico de competência ... 35

1.2.1 Critério territorial para determinação da competência ... 37

2 JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA – CONCEITOS TERRITORIALMENTE DEFINIDOS? ... 39

2.1 Conformação dos institutos na sociedade da informação tecnológica... 45

2.2 Soluções trazidas pela legislação pátria em vigor... 49

CAPÍTULO 02 - O DIREITO INFORMÁTICO E AS TEORIAS PARA REGULAMENTAÇÃO ... 55

1 A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO – AMBIENTE NOVO E DIFERENTE? 57 2 SOBRE ESSE “NOVO” RAMO DO DIREITO: NOMENCLATURA E AUTONOMIA ... 58

3 TEORIAS ACERCA DA REGULAMENTAÇÃO DA INTERNET ... 63

3.1 Teoria Libertária - Autorregulamentação ... 63

3.2 Escola do Direito do Ciberespaço ... 67

3.3 Escola da Arquitetura da Rede ... 70

3.4 Teoria do Direito Internacional ... 76

3.5 Teoria da Aplicabilidade do Direito Vigente ... 79

CAPÍTULO 03 - COMPETÊNCIA NA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES ... 82

1 OS TRIBUNAIS BRASILEIROS E O ENFRENTAMENTO DE QUESTÕES TECNOLÓGICAS ... 82

1.1 Decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal ... 82

1.2 Decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça ... 86

1.3 Decisões proferidas pelos Tribunais Trabalhistas e Estaduais ... 88

2 COMPETÊNCIA JUDICIAL PARA ILÍCITOS CIVIS NA INTERNET ... 90

2.1 Tratamento do assunto no direito brasileiro ... 91

2.2 Tratamento nos Estados Unidos da América ... 98

2.3 Tratamento na União Europeia ... 107

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CAPÍTULO 04 - TRATAMENTO LEGAL SOBRE A ESTIPULAÇÃO DA COMPETÊNCIA EM ILICITOS ORIGINADOS NA REDE MUNDIAL DE

COMPUTADORES ... 121

1 ORDENAMENTO JURÍDICO NACIONAL ... 122

1.1 Legislação vigente ... 122

1.2 Previsões de lege ferenda... 124

1.2.1 Projeto de Lei do Novo Código de Processo Civil... 125

1.2.2 Marco Civil da Internet ... 129

1.2.3 Coleta de dados e servidores em território nacional ... 134

1.3 Outras previsões relevantes... 136

2 REGRAS TRANSNACIONAIS DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL ... 140

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 145

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INTRODUÇÃO

A presente pesquisa tem por objetivo, entre outros, verificar a adequação do tradicional conceito de competência, considerado, atualmente, em relação às atualizações e novas questões trazidas pela crescente popularização da Internet1, configurando o que se convencionou chamar de “sociedade da informação tecnológica”, conforme será discutido com maiores detalhes, ao longo deste trabalho.

Investigar-se-á, ainda, se as leis, hoje em vigor – não só no Brasil, mas em diversos países do mundo –, são suficientes para bem tratar desses aspectos2. Igualmente, serão verificadas algumas decisões judiciais, dos tribunais pátrios e de várias nações, especificamente tratando de tais questões.

Para que sejam alcançados os objetivos propostos, importante verificar, primeiramente, os aspectos fundamentais que levaram à criação da Rede Mundial de Computadores (do inglês, World Wide Web ou “WWW”). Desse modo, será possível entender a sua arquitetura, o que será de importância fundamental para que se consiga expressar um posicionamento acerca do objeto em estudo.

Somente assim, conhecendo-se as particularidades dessa ferramenta global, conseguir-se-á entender melhor as necessidades específicas de regulamentação que ela suscita, não sendo o principal desiderato da presente pesquisa, tecer detalhes excessivos sobre o tema3, mas apenas traçar seus principais aspectos.

1 A despeito das distinções existentes entre os termos “Internet” (a Rede Mundial de Computadores,

englobando todas as redes existentes) e “Internet” (quaisquer redes conectando máquinas), no presente trabalho, ambos os verbetes serão utilizados como sinônimos em sentido genérico, tendo em vista que a diferenciação entre eles não trará profundas repercussões para a pesquisa. Da mesma forma, serão utilizadas outras expressões sinônimas, como “Rede Mundial de Computadores”, entre outras. Sobre o assunto, veja-se a seguinte explicação: “Surgiu uma distinção entre ‘Internet’ com um i minúsculo e ‘Internet’ com um I maiúsculo. Oficialmente, a distinção foi simples: ‘Internet’ significa qualquer Rede usando TCP/IP [Protocolo de comunicação, que adiante será explicado com um pouco mais de detalhes], enquanto ‘Internet’ significa a rede pública, subsidiada pelo governo federal que era composta de muitas redes ligadas, todas rodando os protocolos TCP/IP. Grosso modo, a ‘Internet’ é privada e a ‘Internet’ é pública”. Tradução livre do original em inglês: “By now, a distinction had emerged between ‘Internet’ with a small i, and ‘Internet’ with a capital I.Officially, the distinction was simple: ‘Internet’ meant any network using TCP/IP while ‘Internet’ meant the public, federally subsidized network that was made up of many linked networks all running the TCP/IP protocols. Roughly speaking, an ‘Internet’ is private and the “Internet” is public.” (HAFNER, Katie; LYON, Matthew. Where wizards stay up late: the origins of the Internet. New York: Simon & Schuster Paperbacks, 2006, p. 244).

2 Para maiores detalhes sobre o tema da origem dos meios de comunicação, recomenda-se a leitura de:

ROHRMANN, Carlos Alberto. O governo da Internet: uma análise sob a ótica do direito das Telecomunicações, 2006, p. 11. Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/files/anexos/ 5935-5927-1-PB.pdf>. Último acesso em: 24 fev. 2013.

3 Assim, justifica-se a necessidade da presente introdução, tratando de aspectos específicos sobre a

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Para tanto, é fundamental abordar brevemente os principais aspectos históricos relacionados ao tema objeto do trabalho, perpassando a antiga a necessidade dos homens de terem mecanismos por meio dos quais conseguissem guardar e difundir seus pensamentos, bem como se comunicarem com os demais ao seu redor. Esse aspecto, com o crescimento populacional e o desbravamento de novos territórios cada vez mais distantes, foi aumentando de importância.

Nesse sentido, demorou certo tempo até que se percebesse que a utilização dos sinais de fumaça e dos pombos-correios era de pouca eficiência prática, limitando as possibilidades de comunicação. Era necessário encontrar formas mais eficazes.

O grande salto na seara dos mecanismos comunicacionais dar-se-ia certo tempo depois, com o surgimento de diversos aparatos impulsionados pela II Guerra Mundial, tais como o telégrafo – por volta da década de 40 do século XIX, criado por Samuel Finley Breese Morse –, o primeiro artefato que possibilitou a troca de mensagens, de forma relativamente rápida, já entre distâncias maiores.

O acelerado desenvolvimento dessas máquinas deu-se no período bélico, considerando a necessidade das nações de sempre quererem superar umas às outras. Quanto mais rapidamente conseguissem realizar os cálculos necessários para efetivação das etapas da guerra (cálculos balísticos, construção de equipamentos potentes com baixa massa, previsão climática, dentre outros), melhores posicionadas estariam no cenário militar.

Até então, as instituições bancárias detinham a maior capacidade de cálculo, que, certamente, era sobremaneira inferior ao mínimo que se precisava para ter a dianteira em um front de guerra.

Remonta a essa época o surgimento do Enigma (computador utilizado pelos alemães para cifrar mensagens) e do Colossus (criado pelos ingleses e que objetivava decodificar os textos compilados pelos adversários)4.

“Apesar de cada vez mais integrada ao cotidiano das pessoas, ainda há um grande deslumbramento e perplexidade dos juristas e dos legisladores com relação à Internet: poucos se preocupam em compreender como superar as limitações dos mecanismos tradicionais de regulação e tutela no âmbito da Rede, ainda que não faltem projetos de lei – às vezes criados às pressas, sem maiores reflexões ou debates com a comunidade acadêmica e científica. (...) É imperioso, portanto, compreender certas características da Internet e suas implicações jurídicas, para tratar da tutela de direitos no âmbito da Rede”. (LEONARDI, Marcel. Tutela e privacidade na Internet. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 150).

4 “Alguns protótipos de computador foram utilizados, antes mesmo de serem concluídos. Em 1943, uma

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Em meados da década de 40 do século passado, surgiu também o ENIAC (Eletronic Numerical Integrator and Computer; Integrador e Computador Numérico-Eletrônico, em português), que representou o primeiro computador eletrônico propriamente dito, que era bastante grande, e, nem por isso, eficiente5.

Aos poucos, houve evolução dos componentes das máquinas, com a substituição dos transistores por válvulas, o que trouxe espaço para a criação dos chips (na década de 1950) e que levou à criação dos circuitos integrados uma década depois.

Tais mudanças possibilitaram paulatina elevação da capacidade de cálculo das máquinas. Antes, simples tarefas demandavam não apenas longo tempo (era comum esperar um dia ou mais para obtenção de respostas), mas correspondiam a procedimentos extremamente complexos.

Foi apenas na década de 90 do século passado que o computador passou a apresentar formato parecido com o que hoje se observa, já sendo, de certo modo, portátil e com capacidade de processamento e armazenamento razoáveis. Foi nessa época que dispositivos periféricos começaram a se popularizar, incluindo-se não só teclado, mouse, scanner, mas também placas de modem, que possibilitaram a disseminação da Internet, que até então estava restrita a um grupo seleto.

Ainda não se tem exata certeza acerca da origem da “Rede Mundial de Computadores”6. Para uns, teve origem na sociedade civil; para a grande maioria, no entanto, teve início estritamente militar. Entende-se que, em verdade, esse surgimento

Segunda Guerra Mundial”. Tradução livre do original em inglês: “Some computer prototypes were pressed into service barely before they were completed. In 1943, a team of British developers created COLOSSUS, an electronic device designed to decode messages encrypted by the German Enigma machine. COLOSSUS contained 1.800 vacuum tubes, used binary arithmetic, and was capable of reading input at the rate of 5,000 characters per second. COLOSSUS successfully broke the Enigma codes and gave the Allies a major advantage during World War II.” (PARSONS, June Jamrich; OJA, Dan. New

perspectives on computer concepts 2013. Cengage Learning: Boston, 2013, p. 490)

5 Mais informações sobre o assunto, incluindo-se as funcionalidades e as limitações do ENIAC podem ser

verificadas em: MOYE, William T. ENIAC: The Army-Sponsored Revolution. Disponível em: <http://ftp.arl.army.mil/mike/comphist/96summary/>. Último acesso em: 24 fev. 2013.

6“Muito se fala que a Internet teve origem exclusiva na Rede militar ARPANET. Tal afirmação não

procede, uma vez que muito antes do surgimento da ARPANET, pesquisas relativas a redes de computadores packet switched já estavam avançadas na Universidade da Califórnia em Los Angeles -

UCLA e no MIT, nas quais já era possível a troca de mensagens eletrônicas entre computadores. Grande parte da fama da ARPANET deve-se ao fato de alguns autores terem colocado a Rede militar e sua aplicação estratégica no caso de guerra entre os Estados Unidos e a extinta União Soviética como sendo a única origem da Internet. Maiores referências acerca da Rede militar do Departamento de Defesa Americano – ARPANET – são encontradas em http://www.att.com/attlabs/brainspin/networks/ connections.html, visitado em 2 de março de 1999: [T]he ARPANET, the first national computer network, which was built by the U.S. Department of Defense in 1969. Initially it connected a group of scientists at four universities and allowed them to work together, despite the physical distance.” (ROHRMANN,

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se deu simultaneamente com a troca mútua de conhecimento entre ambas as esferas, uma auxiliando a outra, havendo tanto militares quanto cientistas da sociedade civil diretamente envolvidos.

A ARPANET7 (Advanced Research Projects Agency Network; Agência de Pesquisas em Projetos Avançados, em português), para alguns considerada como precursora da Internet, teve suas atividades financiadas diretamente pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos da América (EUA), tendo sido estruturada pelo então Presidente Dwight Eisenhower, em vista da dianteira assumida pelos russos, quando do lançamento do satélite Sputnik, em outubro do ano de 1957. O objetivo era evitar que os norte-americanos fossem novamente surpreendidos com situações como esta.

Tratando tecnicamente, a ARPA não foi idealizada com o objetivo de criar o que hoje se conhece como Internet, principalmente a partir da consideração de que a origem da Rede em si não parece estar ligada diretamente a atitudes eminentemente voltadas para a proteção dos EUA contra ataques nucleares8, o que não quer dizer que militares não tenham participado da organização, como já referenciado.

A princípio, as missões da Agência se voltavam claramente à conquista do espaço sideral. Com o fracasso da Agência em atingir o objetivo, tal missão foi transferida para a NASA (National Aeronautics and Space Administration; Administração Nacional da Aeronáutica e do Espaço, em português).

Com este fracasso, questionou-se acerca do que seria feito com a ARPA: extingui-la, reduzi-la, ampliá-la ou alterar seu objetivo?

7 “Johnson [Roy Johnson, primeiro diretor da ARPANET] foi instruído a contratar um militar oficial de

carreira como seu vice e a selecionar um cientista chefe para completar sua equipe de líderes”. Tradução livre do original em inglês: “Johnson had been instructed to hire a military flag officer as his deputy, and to select a chief scientist to round out his leadership team”. (HAFNER, Katie; LYON, Matthew. Where

wizards stay up late: the origins of the Internet. New York: Simon & Schuster Paperbacks, 2006, p. 21)

8 “Rumores persistiram por anos que a ARPANET tinha sido construída para proteger a segurança

nacional, em face de um ataque nuclear. Foi um mito que não foi contestado por tempo suficiente para tornar-se amplamente aceito como fato. (...) O projeto havia incorporado as intenções mais pacíficas - para ligar os computadores em laboratórios científicos em todo o país para que os pesquisadores pudessem compartilhar recursos do computador. Taylor [Bob Taylor, então diretor do Departamento de Processamento de Informações Técnicas da ARPANET] sabia que a ARPANET e sua progênie, a Internet, não tinha nada a ver com o apoio ou a sobrevivência da guerra - nunca”. Tradução livre do original em inglês: “Rumors had persisted for years that the ARPANET had been built to protect national security in face of a nuclear attack. It was a myth that had gone unchallenged long enough to become widely accepted as fact. (…) The project had embodied the most peaceful intentions – to link computers at scientific laboratories across the country so that researchers might share computer resources. Taylor knew the ARPANET and its progeny, the Internet, had nothing to do with supporting or surviving war – never did.” (HAFNER, Katie; LYON, Matthew. Where wizards stay up late: the origins of the Internet.

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Em vista do empenho técnico dos membros da Agência, conseguiu-se trazê-la novamente para a ativa, de modo que ela passou a tratar de pesquisas científicas de longo prazo. A partir de então, voltou-se o foco da ARPA para as universidades, local natural de maior profusão de conhecimentos técnicos.

Quando o cientista norte-americano John Licklider assumiu cargo de gerência na ARPA, começou a pôr em prática ideias do que posteriormente viria a constituir a Internet. Foi o projeto denominado de Intergalactic Computer Network (em português, Rede Intergaláctica de Computadores), que visava facilitar a troca dos resultados dos estudos entre os membros da Agência, independentemente do local em que se encontrassem fisicamente.

A grande alteração deu-se quando Licklider idealizou que a Rede Intergaláctica poderia ser estendida para além de um grupo restrito e, com isso, passar a abarcar um universo maior de computadores interconectados, por meio dos quais pudesse ser levada a efeito a troca de documentos9, com redução do tempo necessário para realizar a tarefa.

Nessa busca por maior celeridade, primeiramente, tentou-se transmitir esses pacotes por meio de linhas telefônicas. Não tendo isso se mostrado viável, em razão do grande tempo que seria necessário, mesmo para pequena quantidade de informações. Depois, este processo foi realizado se utilizando de dataphones (antecessores dos modems), existentes desde 1960 e que transformavam dados digitais em sinais analógicos, transmitindo-os por meio de cabos de telefone, e, por fim, reconstituindo-os no formato digital. O sucesso não foi alcançado. Ainda era necessária longa espera para a troca de informações.

Grande mudança seria levada a efeito por Leonard Roberts, sucessor de Licklider na ARPA. Entendendo que as conclusões da Agência eram novidades para todo o mundo, resolveu realizar uma apresentação pública, para demonstrar os resultados da Agência. Ela ocorreria na Primeira Conferência Internacional sobre Comunicação via Computadores (First International Conference on Computer

9“Ele [John Licklider] estenderia o conceito da Rede Intergaláctica para significar não apenas um grupo

de pessoas para quem ele estava enviando memorandos, mas um universo de computadores interconectados em que todos pudessem enviar as suas mensagens” Tradução livre do original em inglês: “He would extend the concept of the Intergalactic Network to mean not just a group of people to whom he was sending memos but a universe of interconnected computers over which all might send their memos.”

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Communication), realizada entre os dias 24 a 26 de outubro do ano de 1972, em Washington, nos Estados Unidos10.

A exposição começou a ser idealizada com praticamente um ano de antecedência. Dessa forma, possibilitou-se que os últimos detalhes da Rede11 fossem finalizados.

Eles idealizaram algumas formas de comprovar a efetividade desse novo desenvolvimento científico: primeiramente, imprimiriam na sala de exibição do hotel em que o evento aconteceria, localizado em Washington, um arquivo que seria obtido a partir de computador localizado em Boston, o qual estava vinculado a servidor em Los Angeles12; depois, tentariam movimentar uma “tartaruga elétrica”, a partir de comandos encaminhados à distância, dentre outros13.

O desenvolvimento da Internet em si foi consequência da necessidade sentida pelos próprios membros da ARPANET de trocar dados entre si, de modo sigiloso e rápido, sem que houvesse muita interferência negativa (o que implica em elevação do tempo gasto) entre as máquinas pelas quais os documentos trafegariam.

Nos estudos realizados acerca do melhor modo de se alcançar os objetivos almejados, concluiu-se que seria muito custoso espalhar pesados e caros computadores de grande capacidade de processamento ao longo de todo o território dos EUA, para possibilitar a troca de informações. Entenderam que seria mais vantajoso escolher

10 “Em 1972, a Primeira Conferência Internacional sobre Comunicação via Computadores, realizada em

Washington, DC, para discutir o progresso desses esforços iniciais. O presidente desta conferência foi Vinton Cerf, que, junto com Robert Kahn, liberaria o padrão de IP Protocolo de Internet TCP/IP, apenas quatro anos mais tarde”. Tradução livre do original em inglês: “In 1972, the first International Conference on Computer Communication (ICCC) was held in Washington, DC, to discuss progress of these early efforts. The chairman of this conference was Vinton Cerf, who, along with Robert Kahn, would release the standard Internet Protocol TCP/IP just four years later.” (DECUSATIS, Casimer;

KAMINOW, Ivan. The optical communications reference. Academic Press: Great Britain, 2009, p. 222)

11A utilização do termo “Rede” é feito com a letra “R” em maiúscula, em referência ao nome próprio

“Rede Mundial de Computadores”, distinguindo-o de outra “Rede” qualquer, estando sem alteração o que já foi comentado sobre a diferença entre “Internet” e “Internet”.

12 “Sua equipe [ARPANET] havia projetado uma demonstração em que alguém em Washington poderia

puxar um arquivo em Boston por meio do computador host, em Los Angeles. A ideia era imprimir o arquivo na sala de exibição no Hilton”. Tradução livre do original em inglês: “His team had designed a demonstration in which someone in Washington could pull up a file in Boston via the host computer in Los Angeles. The idea was to print out the file in the exhibit room at the Hilton”. (HAFNER, Katie;

LYON, Matthew. Where wizards stay up late: the origins of the Internet. New York: Simon & Schuster Paperbacks, 2006, pp. 38).

13 Apenas a título de curiosidade, no primeiro teste dessas demonstrações que foi feito, já em Washington,

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alguns pontos principais para instalar tais dispositivos e criar alguma forma de vincular (linkar) a essas máquinas os vários computadores existentes.

Desse modo, acreditava-se que não apenas se deixaria mais ágil a troca de informações entre os diversos pesquisadores, como também o fariam de forma mais barata e, principalmente, tornariam a pesquisa mais eficiente, vez que conseguiriam melhor compartimentar as diversas etapas do estudo entre os distintos centros.

Começava, enfim, a surgir (de certo modo, ao acaso) uma forma rudimentar mais concreta do que hoje se denomina de Internet, acrônimo de INTERconnected

NETworks (em português, Redes Interconectadas, razão pela qual também tem a

denominação de Rede das Redes, Rede de Redes, Rede, dentre outras).

Assim, com o aprofundamento das pesquisas no âmbito da ARPANET, conseguiu-se desenvolver, por volta da década de 70 do século passado, um sistema que possibilitou a troca de dados de forma mais veloz que até então já se havia conseguido entre duas máquinas. Foi utilizada metodologia (protocolo) que dividia a mensagem em diversas partes (pacotes), antes de sua transmissão.

Em 1972, quando a ARPANET foi apresentada no evento realizado em Washington, anteriormente referido, quarenta já eram os computadores interligados nessa Rede, em distintos pontos dos EUA. Essas máquinas já eram dotadas de capacidade de trocar mensagens, semelhantes ao e-mail.

Em 1977, começou a pulverizar-se a utilização dessa Rede, tendo sido implantada na Universidade de Wisconsin (EUA) algo semelhante à ARPANET, para fins estritamente acadêmicos, denominada de CSNET – Computer Science Network (Rede de Ciência da Computação, em português)14; em 1982, foi a vez de a Europa apresentar a sua versão da Rede, a EUNET.

Possibilitou-se assim que pessoas não pertencentes ao Ministério da Defesa dos Estados Unidos tivessem acesso às inovações decorrentes da conexão e troca rápida de informações entre máquinas, não apenas nos EUA, agora também já se expandindo para a Europa.

14“A CSNET era parecida com a ARPANET. Era uma grande Rede de interconexão com o propósito de

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Com o crescente número de Redes, houve necessidade de unificar a forma de conectar as máquinas, tendo em vista os diferentes sistemas que eram utilizados para conexão. Era como se se tentasse unificar de algum modo os vários idiomas falados pelas diversas pessoas que tentavam se conectar à Rede. Era preciso, então, selecionar qual seria o “idioma oficial”, isto é, o protocolo15 de conexão.

Os administradores da ARPANET escolheram uma dentre as opções existentes. Depois dessa escolha, tal protocolo passou a ser utilizado pelas demais Redes, cujos organizadores ficaram temerosos de se verem isolados, uma vez que, caso optassem por protocolo diverso, poderiam estar impossibilitados de conectarem-se à ARPA, Rede que apresentava grande crescimento e reunia a maior quantidade de usuários.

Optou-se pelo “Protocolo TCP/IP” (Transmission Control Protocol/Internet Protocol; Protocolo de Controle de Transmissão/Protocolo de Internet, em português)16, idealizado em 1974 por Vinton Cerf, o que rendeu a ele o título de “pai da Internet”. A escolha se deu em razão da grande flexibilidade e diversidade de utilização do TCP/IP, frente às demais opções existentes.

Como o nome mesmo já adianta, o TCP/IP consiste em um “conjunto de regras” para comunicação de Redes Internet, ordenando as transmissões realizadas entre elas, possibilitando que isso se dê com o mínimo de influxos negativos possível, não se adequando ao presente trabalho estudo mais aprofundado do tema.

Em 1981, a Rede começou a popularizar-se de forma definitiva, por meio de ações do Governo dos EUA, que disponibilizou para escolas e para universidades, gratuitamente, acesso à Rede. Em 1986, seria criada a FreeNet, na Universidade de Cleveland (EUA). Com ela, permitiu-se, de forma inédita, o acesso livre daqueles não vinculados ao meio acadêmico ou militar. Esse foi o grande marco que propiciou o posterior crescimento da Rede.

15 “Um protocolo é um conjunto de regras que governa a comunicação de dados. Um protocolo define o

que é comunicado, como é comunicado e quando”. (FOROUZAN, Behrouz A. Protocolo TCP/IP. 3. Ed. Porto Alegre: AMGH, 2010, p. 6).

16 “TCP/IP é um conjunto de protocolos de comunicação que define como diferentes tipos de

computadores se comunicam entre si. Seu nome é proveniente de seus protocolos básicos, Tranmission Control Protocol e Internet Protocol. O Internet Protocol fornece endereçamento lógico quando os dados

se movem entre os hosts [máquinas conectadas à Internet]: ele divide os dados em pacotes, os quais são

então encaminhados para as máquinas através da Rede. O Tranmission Control Protocol garante que os

pacotes de uma mensagem sejam novamente montados na ordem correta no destino final e quaisquer datagramas ausentes sejam reenviados, até que sejam recebidos corretamente”. (SIEVER, Ellen et al.

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Em 1989, surgiu a ferramenta que deu origem ao WWW17, permitindo a transferência de textos, imagens e áudio. Esses são os pilares do que hoje se denomina de “hipertexto”, isto é, a possibilidade de transmissão de blocos de informação contendo textos, palavras, imagens ou sons, fazendo-se o acesso a eles por meio de referências específicas denominadas hyperlinks ou simplesmente links. O sucesso dessas Redes foi tamanho que, em 1990, já eram 300 mil os usuários conectados.

A consolidação da Rede se deu apenas em 1992, quando surgiram os primeiros programas que facilitaram o acesso, mesmo àqueles longe da academia militar ou das grandes universidades. Estavam começando a ser criados os browsers, programas utilizados para consultar os mais diversos sites na Internet, de forma gráfica mais acessível à população, por não se fazer necessário o uso de complexa linguagem de programação. Operou-se enorme simplificação dos comandos que antes se faziam necessários para utilização da Internet, consolidando-se a utilização do mouse.

A Internet foi efetivamente idealizada para ser algo não limitado às fronteiras territoriais de dada nação. O primeiro grande exemplo disso foi quando um dos membros da ARPANET esqueceu um aparelho de barbear na Inglaterra, dando-se conta disto apenas quando chegou a casa. Assim, resolveu tentar obter de volta o equipamento. Mediante um simples comando de whois – “onde”, em português, utilizado para buscar o local em que fisicamente estão os usuários da Rede em dado momento –, conseguiu chegar em um colega da ARPANET que ainda estava na Inglaterra e a ele solicitou para trazer de volta o aparelho, sem delongas e nenhum gasto adicional.

Destarte, ainda que a Rede fosse eminentemente de cunho científico quando foi criada, não havia nenhum impedimento para seu uso com fins pessoais. O exemplo acima não foi o primeiro e nem o último a ter acontecido.

A Rede das Redes foi gestada para ser, efetivamente, um sistema sem regras formalmente estipuladas e firmadas, de ampla liberdade, em confronto com a rigidez e formalidade até então existentes. E, dessa forma, apesar de ser destinada a princípio exclusivamente para a troca de informações oficiais dos Estados Unidos da América, há

17 Fundamental referenciar Tim Berners-Lee, conhecido como o “criador” da “Rede Mundial de

Computadores” (do inglês World Wide Web - WWW), conforme informações disponíveis no portal W3C

(World Wide Web Consortium) - principal organização que busca o desenvolvimento de padrões abertos

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rumores de que seus próprios criadores a usaram, por exemplo, para tratativas ilícitas, antes da popularização18.

Figura como uma das principais características dessa Rede, também, o fato de ela ter sido desenvolvida com base na ideia “end-to-end” (“fim-a-fim”), no sentido de que a função dela é propiciar a transmissão de dados entre os dispositivos a ela acoplados. Não interessa a qualidade ou o conteúdo transmitido: tudo, até o novo e nunca antes pensado, pode por ela passar19.

E é fundamental que a essência da arquitetura da Rede não seja alterada por meio da regulamentação específica que adiante será tratada, sob pena de se inviabilizar ou dificultar o seu desenvolvimento. Contudo, justamente em razão dessa incrível liberdade, para se falar o que quiser, sem necessidade de autenticação segura acerca da autoria, faz-se necessário que a atuação dos usuários na Rede siga determinadas prescrições legais mínimas.

A expansão no uso da Rede tem trazido tantas benesses, aos mais diversos setores, que a inclusão digital tem sido cada vez mais buscada. Nesse sentido, existem diversos projetos, tanto governamentais20, quanto particulares21 em tal direção. Já

18“Não havia quaisquer regras formais que restringem o uso da ARPANET para aqueles com acesso

autorizado. O caso da recuperação do barbeador de Kleinrock [o caso do aparelho de higiene pessoal acima comentado] não foi a primeira vez que alguém tinha ultrapassado os parâmetros oficiais de utilização da Rede. As pessoas estavam enviando mais e mais mensagens pessoais. Há rumores de que até mesmo um negócio de drogas ou dois tenham sido realizados sobre alguns dos Processadores de Mensagens no norte da Califórnia”. Tradução livre do original em inglês: “There weren’t any formal rules restricting use of the ARPANET by those with authorized access. Kleinrock’s razor retrieval wasn’t the first time anyone had pushed past official parameters in using the network. People were sending more and more personal messages. Rumor had it that even a dope deal or two had been made over some of the IMPs [Interface Message Processors] in Northern California”. (HAFNER, Katie; LYON, Matthew.

Where wizards stay up late: the origins of the Internet. New York: Simon & Schuster Paperbacks, 2006, pp. 188)

19 “A Internet foi desenvolvida com base no princípio

end-to-end (e2e), ou fim-a-fim (...) a complexidade

e a inteligência ficam nas extremidades na Rede, e ela se limita a transmitir dados. (...) como os aplicativos são executados em computadores nas extremidades da Rede, novos aplicativos apenas precisam ser conectados à Rede para funcionar: nenhuma mudança é necessária nos computadores dentro

da Rede. Em segundo lugar, tendo em vista que seu design não é otimizado para nenhuma aplicação em

particular, a Rede está aberta para inovações e usos imprevistos”. (LEONARDI, Marcel. Tutela e privacidade na Internet. São Paulo: Saraiva, 2012, pp. 152-153).

20 O programa de inclusão digital do Governo Federal do Brasil atua em diversas frentes, focando também

nos âmbitos estadual e municipal, visando não apenas possibilitar o acesso a tecnologia aos que não possuem capacidade para adquiri-lo, mas também educando e ensinando a população sobre como utilizar dispositivos de informática e sobre como conectar à Internet. Maiores detalhes podem ser obtidos em: <http://www.inclusaodigital.gov.br/>. Último acesso em: 18 jun. 2013.

21 Observe-se, por exemplo, o Projeto Loon, que pretende levar provimento de acesso à Internet a lugares

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existem estudos com o objetivo de criar uma Rede conectando a Terra a outros planetas. Idealizada pelo “pai da Internet” acima já referido, Vinton Cerf (ou Vint Cerf, como é mais conhecido), é denominada de InterPlaNet (Internet Interplanetária), com previsão de entrar em funcionamento até o ano de 203022.

Já há certo tempo que os astronautas da NASA têm acesso à Internet de dentro das naves espaciais. Utilizando-se um protocolo especial de comunicação, capaz de tolerar longas distâncias e eventuais “rompimentos” que possam surgir nesse caminho, o DTN (Disruption Tolerant Newtworking; Redes Tolerantes a Atraso, em português), em substituição ao protocolo TCP/IP, tem tornado possível o envio de informações (texto, áudio e vídeo), por parte dos tripulantes23.

É possível constatar o que se afirma nos perfis no Twitter24 de alguns

astronautas da NASA – http://www.twitter.com/@Astro_Soichi e

http://www.twitter.com/@Astro_Mike, por exemplo – nos quais é possível verificar fotos e relatos enviados diretamente do diminuto espaço das naves em que eles se encontram. Até mesmo telescópios espaciais não tripulados enviados pela NASA têm remetido à Terra, de forma automática (isto é, sem a presença direta de humano), imagens obtidas a partir do espaço sideral25.

informações podem ser obtidas no site oficial: <http://www.google.com/loon/>. Último acesso em: 18

jun. 2013.

22 GREGO, Maurício. A web vai a Marte. Revista Info. São Paulo: Abril, julho de 2009, p. 54/55. Mais

informações podem ser obtidas no site oficial do Projeto: <http://www.ipnsig.org>. Último acesso em 24 fev. 2013.

23 “A NASA testou com sucesso a primeira Rede sideral de comunicações modelada na Internet.

Trabalhando como parte de uma equipe da NASA, os engenheiros de Propulsão a Jato do Laboratório da NASA, em Pasadena, na Califórnia, utilizaram o software chamado de Disruption-Tolerant Networking,

ou DTN, para transmitir dezenas de imagens do espaço de e para uma espaçonave da NASA, localizada a cerca de 20 milhões de milhas da Terra”. Tradução livre do original em inglês: “NASA has successfully tested the first deep space communications network modeled on the Internet. Working as part of a NASA-wide team, engineers from NASA's Jet Propulsion Laboratory in Pasadena, Calif., used software called Disruption-Tolerant Networking, or DTN, to transmit dozens of space images to and from a NASA science spacecraft located about 20 million miles from Earth”. (BROWN, Dwayne; TRINIDAD,

Katherine; BORJA, Rhea. NASA Successfully Tests First Deep Space Internet. Disponível em: http://www.nasa.gov/home/hqnews/2008 /nov/HQ_08-298_Deep_space_Internet.html. Último acesso em: 24 fev. 2013).

24“Como o Facebook ou o MySpace, o Twitter é uma rede social, mas tem características bem mais

simples e atraentes. (...) esse novo instrumento é constituído, antes de tudo, de uma rede social e de um servidor para o que é chamado de microblogging, de modo a permitir aos usuários o envio e a leitura de

atualizações pessoais de outros indivíduos de seu contato, por meio de textos com o máximo de 140 caracteres, os tweets [tuítes, em português], pela Internet ou pelo celular, sob o formato de mensagens

curtas, ou seja, os nossos populares torpedos ou SMS – siga de short message services”. (COMM, Joel;

BURGE, Ken. O poder do Twitter: estratégias para dominar seu mercado e atingir seus objetivos com um tweet por vez. Trad.: Leonardo Abramowicz. São Paulo: Gente, 2009, p. XV).

25 O

site oficial do telescópio espacial Hubble, em que diversas fotos capturadas estão disponíveis é:

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Consegue-se, de certo modo, traçar a magnitude da Rede, bem como a total ausência de fronteiras que é sua característica maior, presente desde a sua primeira apresentação pública, em que o objetivo maior dos seus idealizadores foi justamente demonstrar o aspecto transfronteiriço, isto é, a ausência de fronteiras físicas bem delimitadas.

Tal característica resta evidente, por exemplo, a partir da leitura de alguns dos dispositivos do Projeto de Lei nº 2.126/2011, conhecido popularmente por “Marco Civil da Internet”, no qual se reconhece a escala mundial da Rede26. Da mesma forma, a Presidente Dilma Rousseff apresentou projeto de resolução perante a Organização das Nações Unidas27, abordando o caráter transnacional da Rede, o qual foi escrito em conjunto com a chefe de governo da Alemanha, Angela Merkel.

Especificamente tratando do Brasil, a Internet chegou somente em 1988 – e de forma bastante incipiente e restrita às universidades – por meio da FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e do LNCC (Laboratório Nacional de Computação Científica). A liberação para o público em geral se deu apenas no início do ano de 1995, com o surgimento do primeiro provedor de acesso comercial brasileiro, Mandic28.

Desde então, a utilização de recursos da Tecnologia da Informação vem crescendo de forma expressiva. Conforme dados de 30 de junho de 2012, foi superada a marca de dois bilhões de usuários na Internet no mundo29, número que, atualmente, deve estar em algo próximo de três bilhões.

Exemplo disso é a o forte crescimento do uso de mecanismos de tecnologia da informação. Com esta tendência, desde 2010, o número de transações bancárias realizadas online superou aquelas efetivadas em ambiente físico30.

26PL 2.126/2011: “A disciplina do uso da Internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade

de expressão, bem como: I - o reconhecimento da escala mundial da Rede”.

27 Observe-se breve excerto, apenas à guisa de ilustração: “(…) Observando que o ritmo acelerado do

desenvolvimento tecnológico permite aos indivíduos em todas as regiões utilizarem novas tecnologias de informação e comunicação”. Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/sala -de-imprensa/notas-a- imprensa/brasil-e-alemanha-apresentam-a-assembleia-geral-da-onu-projeto-de-resolucao-sobre-o-direito-a-privacidade-na-era-digital>. Último acesso em: 09 nov. 2013.

28 Informações obtidas em: http://www.mandic.com.br/sobre/historia/. Último acesso em: 10 abr. 2013. 29 Internet Usage World Stats - Internet and Population Statistics. Disponível em:

<http://www.Internetworldstats.com/>. Último acesso em: 24 fev. 2013.

30 GROSSMANN, Luís Osvaldo. Internet supera os ATMs nas transações bancárias no Brasil.

Disponível em:

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Ademais, está cada vez mais presente a utilização da computação em nuvem31, que, em apertada suma, representa a possibilidade de que, com a utilização da Internet, tenha-se o acesso a dados, informações, softwares, dentre outros, sem que eles sequer estejam armazenados no computador que realiza a comunicação com a Rede das Redes32.

Com o aumentou da utilização da Rede Mundial de Computadores, vem sendo verificada também a elevação dos ilícitos efetivados por meio dela, o que pode ser constatado em relatórios técnicos oficiais33 e por notícias divulgadas na mídia, cabendo destaque às conclusões do “Fórum Econômico de Davos”, realizado em 200934.

Em vista da essência da Internet, criada para o eficiente intercâmbio de informações, conforme acima já explanado, as tarefas perpetradas nela trazem como consequência o tráfego de dados em diversos países do mundo, não estando os dados restritos às fronteiras em que o usuário se localiza.

Melhor explicando, o simples ato de enviar uma mensagem, para um colega localizado na sala ao lado em que o indivíduo se encontra, pode envolver diversas jurisdições, passando desde o servidor de dados responsável pela remessa da mensagem, até a efetiva recepção pelo destinatário. Igual situação se dá em relação à criação e ao acesso de portais da Internet, os quais são acessíveis de qualquer lugar do mundo.

As dificuldades surgem caso se deseje, por exemplo, ter acesso aos dados envolvidos na troca de mensagens acima referida – nome do remetente, endereço de IP de acesso, informações de cadastro junto ao provedor de e-mail, dentre outros –, uma vez que, possivelmente, outras nações, além do Brasil, deverão ser envolvidas.

Nessa situação, considerando a atual legislação processual civil, os tradicionais conceitos de jurisdição e competência e, em especial, o fato de que os grandes

31 Para maiores informações sobre o tema, recomenda-se a leitura de: TAURION, Cezar. Cloud

Computing: computação em nuvem: transformando o mundo da tecnologia da informação. Rio de Janeiro: Brasport, 2009 e de MATHER, Tim; KUMARASWAMY, Subra; LATIF, Shahed. Cloud Security and Privacy: an enterprise perspective on risks and compliance. O’Reilly Media Inc.:Sebastopol, 2009.

32 A ideia não é puramente noviça, podendo-se recuperar resquícios de seu uso, desde a década de 90 do

século passado. Para maiores informações, recomenda-se a leitura de: KAUFMAN, Lori M. et al. Data

security in the world of Cloud Computing. IEEE Security and Privacy, vol. 7, no. 4, pp. 61-64, July/Aug. 2009.

33 Por todos, recomenda-se a leitura dos relatórios anuais divulgados pelo Federal Bureau of Investigation, disponíveis em: http://www.ic3.gov/media/annualreports.aspx.

34 Para tanto, recomenda-se a leitura de: WEBER, Tim. Cybercrime Threat rising sharply. Disponível

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provedores de serviços de Internet35 têm sede fora do Brasil, os mecanismos de comunicação internacional, da forma como instituídos hoje, têm se mostrado insuficientes.

Traz ainda maior preocupação a constatação de que os provedores de e-mail, por exemplo, não guardam por muito tempo esses dados de cadastro – na verdade, até o momento, sequer existe no Brasil obrigação legal expressa em tal sentido36, apesar de diversas decisões judiciais já terem especificamente se manifestado acerca de tal necessidade37; depois, argumentam que é necessário o investimento de grandes somas para que se consiga armazenar todas essas informações e que os malfeitores podem, fácil e periodicamente, mudar-se de local, a fim de que não sejam encontrados.

As leis hoje em vigor foram elaboradas tomando em conta uma realidade com fronteiras geograficamente bem delimitadas, cumprindo investigar se ainda são viáveis para a sociedade atual38.

Surgem, pois, implicações para os legisladores, juízes e operadores do Direito, que devem estar atentos a essas novas demandas, sob pena de deixar-se flanco aberto à

35 Para uma leitura sobre as diferenças entre provedores de

backbone, provedores de acesso, provedores

de correio eletrônico, provedores de hospedagem e provedores de conteúdo, indicamos a leitura da obra: LEONARDI, Marcel. Responsabilidade civil dos provedores de Internet. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005, pp. 20 – 32.

36 Mencione-se a recomendação do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.Br), órgão criado pela

Portaria Interministerial do Ministério n.º 147/1995, para acompanhar, estabelecer recomendações, dentre várias outras ações relativas à Internet no Brasil: “Os provedores de acesso devem passar a manter, por um prazo mínimo de três anos, os dados de conexão e comunicação realizadas por seus equipamentos (identificação do endereço IP, data e hora de início e término da conexão e origem da chamada)”. Disponível em: http://www.cg.org.br/publicacoes/documentacao/desenvolvimento.htm. Último acesso em: 24 fev. 2013. Previsões semelhantes existiam na redação original do Projeto de Crimes Eletrônicos, mas que não foram mantidas na redação final da Lei nº 12.735/2012. O tema está sendo tratado de forma mais contundente no PL 2.126/2011, já mencionado anteriormente, o qual apresenta seção destinada especificamente para tratar sobre “guarda de registros”, entre os artigos 14 a 18.

37 Apenas para ilustração, observe-se o seguinte julgado: REsp 1406448/RJ, Relatora Ministra Nancy

Andrighi, Terceira Turma, julgado em 15/10/2013, DJe 21/10/2013.

38 “Leis e regulamentos foram organizados no pressuposto de que as atividades são, no todo,

geograficamente delimitadas: o direito de regulamentar a conduta é compartilhado entre os Estados geograficamente definidos em uma base predominantemente geográfica - cada Estado pode regular o que ocorre dentro de seu território. Localização é o critério para a partilha de atividades. Esta regra de atribuição básica funciona bem quando a conduta é geralmente localizada dentro de um único território. Então é claro o que pertence a quem. No entanto, a atividade on-line não é, por padrão localizada em um único território”. Tradução livre do original em inglês: “Law and regulation have been organized on the assumption that activities are on the whole geographically delimited: the right to regulate conduct is shared out between geographically defined States on a predominantly geographic basis – each State can regulate what occurs within its territory. Location is the criterion for the sharing of activities. This basic allocation rule works well when conduct is generally located within a single territory. Then it is clear what belongs to whom. Yet online activity is not by default located in a single territory”. (KOHL, Uta.

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perpetuação de práticas ilícitas, isto é, a produção legislativa pode não conseguir acompanhar a evolução da tecnologia39.

Diante disso, fundamental que sejam estipuladas regras claras para tratamento dos crescentes incidentes surgidos relativos à Rede. A aparente sensação de impunidade que o “mundo virtual” propicia não deve subsistir na prática, sendo premente tratar tais incidentes.

Fundamental ter claro que a ideia não é se alcançar um sistema jurídico livre de lacunas, até mesmo porque isso se trata de tarefa impossível, ante as constantes mudanças pelas quais passa a sociedade40. Da forma como hoje nosso ordenamento jurídico está posto, no entanto, remanescem incertezas em relação a questões básicas sobre qual lei é aplicável, bem como sobre quem vai editá-la, quem vai aplicá-la, dentre outros41.

Igualmente, caso sejam utilizados mecanismos de Computação em Nuvem, de pouca utilidade será a apreensão de um computador, como ocorre na grande maioria dos casos envolvendo investigação digital nos tempos atuais, já que as informações buscadas não estarão armazenadas diretamente no interior da máquina apreendida.

39 Sobre o assunto, interessante verificar o relato da Ministra Nancy Andrighi acerca das dificuldades de

aplicar as leis “provectas” hoje em vigor e das tentativas de inovações tecnológicas no âmbito do Poder Judiciário: “Vivendo num sítio de leis provectas e tendo a incumbência de aplicá-las em um contexto social diverso daquele para o qual referidas leis foram concebidas, é sempre um grande desafio, mas é principalmente motivo de muita alegria, especialmente para uma juíza que se aproxima dos trinta anos de atividade judicante. Não vai longe o tempo quando propus à minha Turma de julgamento no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios que inovássemos o nosso trabalho de elaboração de acórdãos. A proposta era de que encerrado o julgamento, ato contínuo, expressão daquela época, hoje, tempo real lavrássemos o acórdão do julgado e na mesma sessão o relator e o presidente da Turma assinassem”. (ANDRIGHI, Fátima Nancy. Os métodos alternativos de resolução de litígios e o direito da Internet: perspectivas no Brasil. Palestra proferida na Conferência Interamericana de Arbitragem Direito na Internet, promovida pelo Instituto Arbiter e Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática, em Recife, 08/12/2005).

40 “É cabível imaginar, em abstrato, uma ordem jurídica na qual todo possível conflito de interesses esteja

regulado diretamente por uma norma material que o preveja e o componha (...). Na realidade, sem embargo, pode não acontecer isso; ou mais exatamente: não é possível que aconteça. Especialmente pelo que toca às normas materiais, trata-se de autêntica impossibilidade. Basta para explicá-la, pensar no constante movimento da transformação da vida social, em virtude do qual se extinguem pouco a pouco antigas formas de conflito, enquanto que novas formas vão aparecendo”. (CARNELUTTI, Francesco. Sistema de Direito Processual Civil. Vol. 1. 2. Ed. São Paulo: Lemos e Cruz, 2004, p. 182).

41 “É claro, portanto, que a Internet deve ter lei e ordem se for para se tornar um mercado estável e essa é

a nossa crença de que as pessoas devem ser protegidas de conduta desonrosa. O que não está claro, no entanto, é qual lei vai ser, quem vai ter a oportunidade de escrevê-la e quem vai aplicá-la”. Tradução livre do original em ingles: “It is clear, therefore, that the Internet must have law and order if it is to become a stable marketplace and if it is our belief that people ought to be protected from disreputable conduct. What is unclear, however, is what this law will be, who will have the opportunity to write it, and who will enforce it”. (MEFFORD, Aron. Lex Informatica: Foundations of law on the Internet. Indiana Journal of

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Ademais, quando necessária a solicitação de dados de provedores de acesso, de empresas responsáveis por hospedagem de sites, dentre outros, se localizados fora do território nacional, não é difícil encontrar barreiras para o atendimento de tais pedidos. Conforme se observará no presente trabalho, é comum a argumentação de que, em vista de a ordem judicial ter sido emitida pelo Poder Judiciário brasileiro, ela não teria “validade” ou “eficácia” fora das fronteiras geográficas do Brasil, não sendo suficiente a simples expedição de carta rogatória para o cumprimento das ordens.

Assim, como diversas das empresas que proveem esses serviços têm sede fora do território nacional, urge que um Juiz do respectivo local da sede do provedor expedisse a ordem de solicitação dos dados42.

Importante o aprofundamento da pesquisa, pois, a fim de verificar a possibilidade de atendimento de solicitações como as ora referidas, observando a conformação do ordenamento jurídico nacional e estrangeiro.

Outra grande discussão diz respeito acerca de qual juiz seria o competente para a apreciação de uma demanda envolvendo múltiplas jurisdições, nos casos anteriormente mencionados. Quando se está diante de situações para as quais existem vários ou nenhum ente competente para apreciação da questão, é natural que a insegurança jurídica ressalte.

Assim, ainda que haja legislação tratando especificamente de dada situação conflituosa, se não se tiver certeza sobre quem deve apreciar a demanda, existe grande risco de que não haja como efetivamente aplicar a lei.

A perpetuação de situações ilícitas na Internet (quer porque não há legislação, quer porque, havendo legislação, não se consegue dar seguimento com demandas judiciais em vista de questões de jurisdição e de competência), pode ter repercussões até mesmo nas relações que se passam em ambiente físico.

42 Para melhor delimitar o tema do presente trabalho, convém esclarecer que aqui não se adentrará em

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Por exemplo, torna-se pouco eficaz a obrigatoriedade da exibição de receita médica para a compra de determinados medicamentos, se eles conseguem ser adquiridos rapidamente e sem qualquer comprovação pela Internet. Igualmente, ao se permitir, de forma completamente livre no ambiente da Internet, a ampla divulgação de materiais protegidos por direitos autorais pode-se configurar como desprestígio à norma protetiva43.

Portanto, no primeiro capítulo far-se-á breve análise sobre o tema da jurisdição e da competência, abordando os ideais que foram considerados quando da estipulação dos conceitos, mormente verificando se foram tomados em conta os aspectos territoriais, quando da idealização das regras constantes nos diplomas processuais civis. O trabalho enfocará o conceito de competência, mas também serão apresentados os fundamentos mais relevantes sobre jurisdição com o intuito de facilitar o entendimento dos temas em debate.

No segundo capítulo, serão abordados aspectos condizentes ao Direito da Informática, com foco nas teorias que tratam da regulamentação da disciplina, abordando a relativização das fronteiras na hodierna sociedade da informação tecnológica.

No terceiro capítulo, far-se-á análise, dentre outros, do tema da competência, sob a ótica das inovações trazidas pela tecnologia da informação, com foco no Brasil, Estados Unidos e Europa. Na oportunidade, será referenciada a questão da Lex Informatica, algo semelhante à Lex Mercatoria, que pretende unificar o tratamento dado à questão, no âmbito da Internet, aplicável aos “netcidadãos” (tradução livre do original netizen em inglês)44.

43 Convém deixar claro que aqui não se adentrará o profundo debate acerca da necessária modernização

da Lei de Direitos Autorais em vista das inovações da tecnologia da informação (a Lei nº 9.610/1998, atualmente em vigor, teve origem do Projeto de Lei do Senado 249, no ano de 1989, quando a Internet comercial sequer havia chegado ao Brasil). Para alguns, a “divulgação” propiciada pela Internet apenas tem dado maior retorno aos artistas, não havendo espaço para se falar em perda de receita pelos autores, em razão da grande Rede. Para outros, o excesso de liberdade que hoje permeia a Internet, aliada à facilidade de compartilhar arquivos (e foi justamente sob esse ideal que a Rede foi criada, conforme acima já declinado) têm sido responsáveis por grandes prejuízos aos artistas. Para debate aprofundado sobre o tema, recomenda-se a leitura de: VASCONCELOS, Cláudio Lins de. Mídia e Propriedade Intelectual: A crônica de um modelo em transformação. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

44“’Netcidadão’ é uma combinação de “cidadão” e “Net”, que é útil ao descrever as obrigações políticas

ou legais e os direitos de um ator da Net, como um cidadão da Net”. Tradução livre do original em inglês: “‘Netizen’ is a combination of ‘citizen’ and ‘Net’ that is useful when describing the political or legal obligations and rights of a Net actor as a citizen of the Net”. (MEFFORD, Aron. Lex Informatica:

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CAPÍTULO 01 – COMPETÊNCIA: CONCEITO CALCADO EM FRONTEIRAS TERRITORIAIS FIRMEMENTE DELIMITADAS?

No presente trabalho, não se tem a intenção de repisar aspectos já abordados à exaustão em obras de maior fôlego, envolvendo o tema de jurisdição e competência45. Aqui, pretende-se revisitar o conceito de jurisdição, tendo em vista se tratar de noção fundamental para bem compreender o que diz respeito à competência, foco do presente estudo, em vista de ambos os institutos estarem intrinsecamente relacionados, abordando desde os entendimentos clássicos até os mais modernos, analisando o contexto social em que eles foram forjados.

Depois, passa-se à verificação de compatibilidade dessas ideias com a atual sociedade da informação tecnológica, considerando-se que elas surgiram e se consolidaram há centenas de anos, em ambiente sobremodo diferente daquele que hoje se observa, que era caracterizado pela existência de fronteiras territoriais firmemente calcadas.

1 JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA

O poder de decisão dos conflitos sociais nem sempre esteve nas mãos do Estado-Juiz. O Direito levou longo tempo até se firmar como ciência voltada à consecução da justiça, sendo comum a sua confusão com as regras genéricas de moral, religião e convivência.

Durante a Revolução Francesa, a burguesia, na tentativa de chegar ao poder, tomando-o dos nobres, apregoou de modo mais firme a importância de se seguir uma vontade ajustada com os anseios sociais. Foi sendo forjado aos poucos um Poder

45 Apenas para apontar algumas obras, desde logo, recomenda-se a leitura de: CHIOVENDA, Giuseppe.

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Judiciário dotado de maior independência46, retirado que foi o poder dos monarcas de ditar as regras da sociedade.

Após subir ao poder, contudo, a burguesia – de forma exclusiva e taxativa –, em subversão das ideias outrora defendidas, passou a ditar as normas que regeriam a sociedade. Aliaram-se os poderes econômico e político47.

Paulatinamente, contudo, passaram a ser consideradas como Direito tão somente as emanações oriundas do Estado48, representado por meio de seu corpo de Magistrados, que teriam a função precípua de aplicar a lei, sem que tivessem grande possibilidade de inovar o quanto estivesse expressamente transcrito pela letra fria do texto legal.

Aos poucos, entretanto, foi-se dando maior poder aos juízes, que, a partir de então, deixaram de ser a mera boca da lei49 e passaram a ter a possibilidade de expressar certa criatividade no ato de aplicar a norma, apresentando solução aos casos que eram postos para sua apreciação, indo além da mera aplicação direta e imediata.

Não se trata de dotar a pessoa do juiz de prerrogativas ou de vantagens desmesuradas. Ao contrário: refere-se a que os juízes possuem “poderes-deveres”50, isto

46 Para aprofundamento do assunto, recomenda-se a leitura de: ARRUDA ALVIM. Manual de Direito

Processual Civil. 15. ed. São Paulo: RT, 2012, pp. 196-199.

47 “(...) a burguesia pós-revolucionária aliou a seu poder econômico, o político e, nesta condição,

abandonou os ideais perseguidos e prometidos para retirar benesses de uma situação cuja calmaria da navegação só a ela permite uma viagem livre de chuvas e trovoadas. Idealizadora do emergente Estado soube (e sabe), como ninguém, transitar pelo poder”. (PEREIRA FILHO, Benedito Cerezzo. O poder do juiz: ontem e hoje. In Anais do Anais do XIV Congresso Nacional do CONPEDI. Florianópolis/SC :

Fundação Boiteux, 2005. p. 271-272).

48 Para ampla abordagem sobre as codificações, abrangendo os distintos modelos existentes, suas

principais características e críticas, recomendamos a leitura de: VALLADÃO, Haroldo. O Direito Civil, o Código Civil Brasileiro e o Projeto de sua reforma – Estrutura e sistemática (códigos multiplicados, especiais e autônomos – descompasso do Projeto com a evolução jurídica). In Revista de Informação

Legislativa. Senado Federal. Disponível em:

<http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/180950/000356858.pdf?sequence=3>. Último acesso em: 15 jan. 2013.

49 “Em tempo de excessiva veneração a respeito da intangibilidade das leis, como foram os primeiros anos

da Revolução Francesa, este poder de interpretação judicial pareceu tão perigoso que se chegou a impor aos juízes a obrigação de suspender qualquer decisão quando se encontrassem frente a uma lei obscura, e a de buscar a explicação oficial, nesses caso, junto aos órgãos legislativos (référé législatif obligatoire)”.

(CALAMANDREI, Piero. Instituições de Direito Processual Civil. Tradução: Douglas Dias Ferreira. Vol. 2. 2. ed. Campinas Bookseller, 2003, p. 96).

50“Impede, porém, de início, afastar um equívoco muito frequente quando se cuida da matéria: os poderes

conferidos ao juiz não constituem privilégios ou vantagens outorgados à pessoa do Magistrado, mas se destinam a assegurar a real e efetiva prestação jurisdicional. Sobreleva notar, pois, que a ampliação dos poderes do juiz não significa restrição aos direitos dos advogados e das partes, mas implica, ao revés, maior prestígio àqueles e maior segurança a estas”. (LOPES, João Batista. Os poderes do juiz e o aprimoramento da prestação jurisdicional. In Revista de Processo, Ano IX, nº 35, abril-junho de 1984,

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