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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Tiago de Lima Almeida

O Dever Fundamental de Pagar Tributo no Estado Democrático de Direito

Mestrado em Direito

SÃO PAULO 2018

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Tiago de Lima Almeida

O Dever Fundamental de Pagar Tributo no Estado Democrático de Direito

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Direito Constitucional sob a orientação do Professor Doutor Marcelo de Oliveira Fausto Figueiredo Santos.

SÃO PAULO 2018

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Autorizo exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico.

Assinatura _______________________________ Data____________________________________ e-mail___________________________________

Almeida, Tiago de Lima

O Dever Fundamental de Pagar Tributo no Estado Democrático de Direito / Tiago de Lima Almeida. -- São Paulo, 2018.

132 f.

Orientador: Profº Doutor Marcelo de Oliveira Fausto Figueiredo Santos. Dissertação (Mestrado em Direito) -- Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito, 2018.

1. Estado democrático de direito. 2. Direitos fundamentais. 3. Deveres fundamentais. 4. Solidariedade social. 5. Cidadania contributiva. 6. Custo dos direitos fundamentais. 7. Dever fundamental de pagar tributo. I. Santos, Marcelo de Oliveira Fausto Figueiredo. II. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Programa de Estudos Pós Graduados em Direito. III. Título.

1. Lesão por pressão. 2. Registros eletrônicos de saúde. 3. Assistência de enfermagem.

Dissertação de Mestrado apresentada à Escola de Enfermagem Ribeirão Preto/USP. Área de concentração: Enfermagem

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Tiago de Lima Almeida

O Dever Fundamental de Pagar Tributo no Estado Democrático de Direito

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de MESTRE em Direito Constitucional.

Aprovado em: ___/___/___

BANCA EXAMINADORA

______________________________________

______________________________________

(5)

A Deus, pela vida e pela sabedoria. Aos meus pais, pelo exemplo.

À minha amada esposa Rachel Ximenes, pelo incentivo, ensinamentos, confiança, carinho e paciência.

Aos Professores que, através das riquíssimas lições, me mostraram a face apaixonante da ciência do direito.

A todos aqueles que anseiam por um mundo mais digno e justo.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, a Deus por me permitir sempre estar em sua presença e alcançar tão desejado título.

A minha família, a qual amo muito, pelo carinho e apoio incondicional.

A minha esposa, exemplo de profissional e maior incentivadora da construção e realização deste tão desejado sonho.

A minha sempre companheira noturna de estudos, Clotilde.

A PUC-SP, palco de tantos espetáculos dos mais renomados artistas atuantes na ciência do direito.

Ao meu orientador, Prof. Dr. Marcelo Oliveira Fausto Figueiredo Santos, por acreditar no futuro desse projeto e contribuir para o meu crescimento acadêmico. Sua participação foi fundamental para a realização deste trabalho.

A todos os professores do curso de Direito da PUC que foram muito importantes na minha vida acadêmica, no desenvolvimento dessa Dissertação, e em muito acrescentaram com os seus ensinamentos.

A todos os meus amigos que fizeram parte desses momentos, sempre me ajudando e incentivando.

A todos aqueles que, de alguma forma, estiveram ou estão próximos de mim, fazendo esta vida valer cada vez mais a pena.

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“A sabedoria dos homens é proporcional não à sua experiência, mas à sua capacidade de adquirir experiência." (Bernard Shaw)

(8)

RESUMO

A presente dissertação aborda a ideia de que o Estado se materializa em uma organização jurídico-política, cuja finalidade é proteger e implementar os valores consagrados pela comunidade. A partir de tal premissa, o trabalho propõe analisar o papel fundamental dos tributos para a garantia da vida na sociedade moderna e para a promoção do bem comum. Alguns deveres, atinentes à própria existência, concretização e manutenção do Estado, são coroados pela Constituição com o status de fundamentais, como é o caso do pagamento de tributo, principal fonte de custeio dos gastos públicos. Através da análise da evolução histórica do Estado e das relações entre ele e os indivíduos, necessária se faz a exata compreensão da relação entre o Estado Democrático de Direito e o Estado Fiscal. Não é factualmente possível a instituição de um Estado Democrático de Direito sem a previsão da obtenção de meios necessários à sua manutenção. É pilar fundamental ao Estado Democrático de Direito a obtenção de recursos aptos a custear e realizar os seus objetivos pelos quais, inclusive, justifica a sua própria criação, A partir desta necessidade, surge o Estado Fiscal e o poder de tributar que o materializa. O trabalho abordará o exato alcance do dever do indivíduo de pagar tributo sob a legitimação de um dever de solidariedade social. O exercício da solidariedade fortalece o vínculo entre os indivíduos, construindo uma cidadania solidária, que atua cooperativamente em busca do bem comum. Nessa perspectiva, o dever de pagar tributo obriga a todos, que ostentam capacidade econômica, a contribuírem com o Estado e, logo, com o desenvolvimento da sociedade, entregando ao mesmo, parcela de suas riquezas em um sentido amplo. O modelo de Estado que garante uma sociedade livre, justa e solidária, tal qual aquela desenhada pelos princípios contidos na Constituicão da República Federativa do Brasil, necessita de uma contrapartida por parte dos indivíduos que integram tal sociedade, qual seja, o pagamento de tributo, que carrega em sua essência um dever constitucional oponível a todos. O pagamento dos tributos é um dever dos integrantes da sociedade que garante a existência do Estado e possibilita que este obtenha meios de atingir seus fins, em especial, a garantia e efetivação dos direitos fundamentais.

Palavras-chave: Estado democrático de direito. Direitos fundamentais. Deveres fundamentais. Solidariedade social. Cidadania contributiva. Custo dos direitos fundamentais. Dever fundamental de pagar tributo.

(9)

ABSTRACT

The present dissertation approaches the idea that the State materializes in a juridical-political organization, whose purpose is to protect and implement the values consecrated by the community, it analyzes the fundamental role of the tributes for the guarantee of the life in the modern society and for the promotion of the common good. Some duties, related to the very existence, concretization and maintenance of the State, are crowned by the Constitution with the status of fundamental ones, as is the case of the payment of tribute, main source of cost of public expenses. Through the analysis of the historical evolution of the State and the relations between it and the individuals, a precise understanding is made of the relation between the Democratic State of Law and the Fiscal State. It is not factually possible to establish a democratic state of law without the provision of the means necessary for its maintenance. It is a fundamental pillar for the Democratic State of Right to obtain resources able to meet and fulfill its objectives by which, even, it justifies its own creation. From this necessity arises the Fiscal State and the taxing power that materializes it. The work will address the exact scope of the individual's duty to pay tribute under the legitimation of a duty of social solidarity. In this perspective, the duty to pay tribute obligates all, who have the ability to contribute, to contribute with the State and, therefore, with the development of society delivering the same share of its wealth in a broad sense. The model of state that guarantees a free, just and solidary society, such as that drawn by the principles contained in the Constitution of the Federative Republic of Brazil, requires a counterpart on the part of the individuals that integrate such society, namely, the payment of tribute, which carries in its essence a constitutional duty opposable to all. The payment of taxes is a duty of the members of society, which guarantees the existence of the State and enables it to obtain means to achieve its ends, especially the guarantee and implementation of fundamental rights.

Key Words: Democratic state. Fundamental rights. Fundamental duties. Social solidarity. Contributory citizenship. Cost of fundamental rights. Fundamental duty to pay tribute.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11

2 REFLEXÕES SOBRE A INSTITUIÇÃO “ESTADO” ... 15

2.1 Conceito de Estado ... 16

2.2 Dos fins do Estado ... 24

2.3 O exercício do poder do Estado ... 27

3 DA EVOLUÇÃO DO ESTADO: SURGIMENTO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO ... 34

3.1 As faces políticas e sociais adotadas pelo Estado Moderno ... 35

3.2 Da evolução histórica do Estado de Direito: Do Estado Liberal de Direito ao Estado Democrático de Direito ... 40

3.2.1 Estado Liberal de Direito ... 41

3.2.2 Estado Social de Direito ... 44

3.2.3 Estado Democrático de Direito... 48

3.2.3.1 República Federativa do Brasil - Estado Democrático de Direito ... 53

4 ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E O SEU PAPEL NA GARANTIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ... 57

4.1 Dos Direitos Fundamentais no Estado Democrático de Direito ... 58

4.2 Efetividade dos Direitos Fundamentais no Estado Democrático de Direito ... 62

5 SOLIDARIEDADE SOCIAL E CIDADANIA CONTRIBUTIVA ... 65

5.1 Solidariedade Social ... 65

(11)

6 DOS DEVERES FUNDAMENTAIS ... 74

6.1 Breve registro histórico sobre os Deveres Fundamentais ... 75

6.2 Conceito de Deveres Fundamentais ... 77

6.3 Classificações dos Deveres Fundamentais ... 81

6.4 Solidariedade e Cidadania como fundamentos materiais para os Deveres Fundamentais ... 84

6.5 Relação entre os Deveres Fundamentais e os Direitos Fundamentais ... 85

6.6 Deveres Fundamentais no Estado Democrático de Direito ... 88

6.6.1 Relação entre os Deveres Fundamentais e os Princípios Constitucionais ... 89

6.6.2 Aplicação dos Deveres Fundamentais no Estado Democrático de Direito ... 90

6.7 Deveres Fundamentais na Constituição Brasileira de 1988 ... 92

7 O DEVER FUNDAMENTAl DE PAGAR TRIBUTOS COMO INSTRUMENTO DE CONCRETIZAÇÃO DE DIREITOS ... 95

7.1 O Dever Fundamental de Pagar Tributo e o Estado Democrático de Direito ... 95

7.2 O custo dos Direitos Fundamentais no Estado Democrático de Direito ... 97

7.3 O Estado Fiscal ... 104

7.3.1 O papel da Solidariedade Social no Estado Fiscal ... 110

7.3.2 República Federativa do Brasil, um Estado Fiscal ... 112

7.4 Poder de Tributar e Justiça Fiscal ... 116

8 CONCLUSÃO ... 123

(12)

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa apresentar um estudo sobre o dever fundamental de pagar tributos no Estado Democrático de Direito.

Compreender a evolução do Estado até se chegar ao Estado Democrático de Direito, modelo de Estado destinado à promoção dos direitos de liberdade do homem, acrescida da proteção dos direitos sociais e valores como a dignidade da pessoa humana, constitui o ponto de partida desta dissertação.

O trabalho, após a apresentação do modelo de Estado Democrático de Direito, trará reflexões para o fato de que a concretização do aludido modelo de Estado depende de uma série de fatores e encontra diversos desafios, sendo necessário examinar os elementos capazes de proporcionar uma sociedade mais justa e igualitária.

Com vistas a esse objetivo, o trabalho abordará a compreensão ampla acerca do Estado, indagando-se inclusive, sobre os fins do Estado, as relações entre Estado e Poder, bem como Estado e Direito, culminando com a evolução do Estado até o modelo atual – Estado Democrático de Direito.

Nesse panorama, o Estado Democrático de Direito, através da Constituição, elenca uma gama de direitos sociais e individuais a serem perseguidos e garantidos por este, no intuito de promover o desenvolvimento social, humano e político. Desta forma, tornou-se indispensável à utilização de recursos para realizar os propósitos pelos quais o Ente Estatal foi organizado.

Assim, em íntima conexão com os direitos fundamentais da população, surge a questão das obrigações estatais, positivas e negativas, necessárias ao fomento e garantia destes direitos. O grave problema, porém, é que, não raras vezes, o discurso jurídico se limita a tratar exclusivamente sobre a bipolaridade entre o direito fundamental e a obrigação estatal, negligenciando, quase que por completo, o importantíssimo enfrentamento dos deveres fundamentais.

Por mais que o tema seja de suma importância, são poucos os trabalhos doutrinários que se debruçam a fundo sobre este, sendo também escassa a jurisprudência que dê aos deveres fundamentais a atenção que estes merecem.

Tal fato pode ser explicado, seja por um impulso de negativa de subordinação, seja em função do que a história conta dos momentos em que os deveres eram mais presentes e

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arbitrariamente impostos aos cidadãos. O estudo e o reconhecimento dos deveres fundamentais encontram obstáculos de dificultosa superação que atrapalham sensivelmente a sua verificação no plano fático.

A história da humanidade nos mostra, na essência de cada transformação do Estado, uma revolução fiscal, isso porque o tributo interfere na sociedade e na individualidade das pessoas, porquanto há uma relação inerente com a liberdade, justiça, igualdade e solidariedade.

Sob este prisma, o tributo surge como um fator eminentemente político e filosófico, sem o qual o Estado moderno não poderia cumprir com os objetivos que justificam a sua criação.

Salvo raras exceções, nossos juristas não situam o tributo no contexto do Estado Democrático de Direito, pois ainda se percebe uma visão limitada, calcada em uma estreita leitura liberal do Estado e lógico-formalista do direito que define o tributo como mera obrigação de financiar as atividades estatais de gerir a res publica.

Reconhecer a fundamentalidade do dever de pagar tributo é um importante passo para se compreender a complexa relação jurídico-tributária em sua inteireza e, cedendo à vã idéia do tributo ser uma obrigação que visa diminuir ou limitar direitos, ter-se-á a concepção de que o mesmo surge como ferramenta de contribuição para o fomento dos próprios direitos fundamentais dos contribuintes.

O tributo vai muito além do que uma submissão ao Estado, tampouco um mal necessário. É, isto sim, um dever fundamental inerente à vida em sociedade, garantindo a sua organização e manutenção.

O presente trabalho visa expor a ideia de que não se cria uma cultura sólida de respeito a direitos se não se investe na adequada compreensão, aplicação e exigência dos deveres de um mesmo sujeito.

Assim, o tributo é um dever fundamental porque, no Estado Democrático de Direito, ele garante e promove os direitos fundamentais, tudo em vistas ao desenvolvimento da personalidade humana com liberdade, justiça e solidariedade.

A questão acerca do custo dos direitos revela-se essencial, pois um Estado que pretenda garantir direitos fundamentais aos seus cidadãos deve possuir uma respectiva fonte de custeio, motivo pelo qual é pertinente compreender as formas que os Estados podem agregar receitas aos cofres públicos.

(14)

Desta feita, percebe-se que o modelo de sociedade livre, justa e solidária, tal qual àquela imaginada desde a criação do Estado Democrático de Direito, deverá ser financiada pelos seus próprios indivíduos, obrigação que surge como um dever constitucional oponível a todos.

Cabe, então, aos membros da sociedade arcar com as despesas públicas, contribuindo para a manutenção da própria sociedade, mediante a adoção do modelo de Estado Fiscal. Ora, se dentre outros, é dever do Estado concretizar direitos positivos previstos constitucionalmente, incumbe à sociedade reconhecer o custo que isso acarreta aos cofres públicos, competindo a ela própria financiá-los.

É imprescindível que se atente à perspectiva de que não é sustentável a instalação de um Estado Democrático de Direito sem a necessária previsão de como se obter os meios necessários à sua manutenção, notadamente recursos aptos a realizar os objetivos pelos quais fora criado, surgindo, assim, o Estado Fiscal.

A partir da noção de Estado Fiscal, faz-se conveniente a exposição das teorias que materializam o poder de tributar que o integra. Percorreremos o longo caminho que se inicia com a noção de relação de mero poder, passando pela relação normativa pura, para enfim, culminar com a noção atual do poder de tributar, alicerçado, primordialmente, no dever de solidariedade social.

Com base nesta concepção, é de suma importância à análise da significação do conceito de solidariedade, a sua reinserção no contexto atual e, sobretudo, o dever de solidariedade social oponível a todos os cidadãos e a sua relação com o dever de pagar tributos.

Outrossim, após o exame de todos esses pressupostos, é pertinente se verificar em que medida o Estado concorre para a construção de uma cidadania solidária, capaz de implementar políticas públicas tributárias de inclusão social, voltadas ao atendimento dos direitos sociais e individuais e à promoção da justiça e da igualdade, também como forma de recuperar uma parte da legitimidade do Estado moderno.

É cabível uma reflexão sobre a base ideológica que possibilita o reconhecimento dos deveres fundamentais. Justificar-se-á o dever fundamental de pagar tributos no contexto do Estado Democrático de Direito, cujo dever de solidariedade social é um dos objetivos fundamentais, se fazendo presente, neste cenário, a cidadania contemporânea.

A implementação dos direitos fundamentais requer uma contraprestação por parte dos indivíduos, dentre outras, o dever de pagar tributo. O reconhecimento da cultura tributária e

(15)

de suas práticas, incluídos os vínculos de interação entre os gestores do Estado e a população em geral, se torna essencial para a concretização de direitos, pois somente com o pagamento de tributos e sua correta administração é possível se construir uma sociedade equilibrada.

Neste contexto, é importante a análise sobre o custo dos direitos fundamentais no Estado Democrático de Direito, trazendo à baila a discussão de que tais direitos exigem recursos financeiros para que sejam socialmente eficazes. Será apresentado o conceito de Estado Fiscal, sendo este o responsável por recolher uma parcela, prevista pela Constituição, das riquezas produzidas pela economia, operacionalizando o sistema de justiça distributiva.

Buscar-se-á na doutrina uma reflexão sobre os deveres fundamentais, em especial o dever fundamental de pagar tributos, trazendo a sua idéia, conceituação, relação com os direitos fundamentais, seu fundamento jurídico, suas dimensões e sua relação com os princípios constitucionais.

As considerações finais demonstrarão que, embora implícito na carta constitucional, o dever de pagar tributo obriga a todos os indivíduos possuidores de uma capacidade econômica a contribuírem com parcela de seus recursos para o desenvolvimento do Estado e da sociedade.

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2 REFLEXÕES SOBRE A INSTITUIÇÃO “ESTADO”

Para se medir a legitimidade dos atos praticados pelo Estado, é necessária a compreensão do conceito de Estado, bem como dos fins do Estado e do exercício do poder que este detém.

Existem duas principais teorias sobre a formação originária do Estado: a formação natural, que admite que o Estado se formasse naturalmente e não por ato voluntário; a formação contratual, garantindo que um acordo de vontades de alguns homens, ou de todos, levasse à criação do Estado.

Segundo os ensinamentos do Professor Paulo Bonavides, o Estado, pessoa coletiva, cuja ação decorre da vontade humana, possui notadamente fins. Para o aludido Professor, onde houver direito, haverá teleologia1.

A realização dos fins do Estado depende da conduta dos indivíduos que o criaram. Neste cenário, é necessário que a conduta das pessoas seja regulada por algum tipo de normatividade que evite riscos à manutenção do próprio Estado.

Na visão de Kelsen, o Estado enquanto uma comunidade social seria constituída por uma ordem normativa, identificando-se com esta, que centralizaria o poder de coerção. Veja o quanto pontuado pelo filósofo austríaco:

[...] se o Estado é concebido como uma comunidade social, esta comunidade apenas pode como já acima se expôs, ser constituída por uma ordem normativa (sim, identifica-se mesmo com esta ordem), a ordem normativa que constitui o Estado apenas pode ser a ordem de coerção relativamente centralizada que nós verificamos ser a ordem jurídica estadual2.

O cumprimento e a efetividade das ações necessárias para a obtenção dos fins requer o exercício do poder. Tal legitimidade para o exercício do poder é considerada um dos elementos fundamentais ao entendimento do que seja o Estado.

A efetividade das ações necessárias ao alcance dos fins do Estado requer o exercício do poder, sendo este um dos elementos fundamentais para a sua própria existência. Pode-se afirmar que o Estado, figura como o portador da summa potestas, sendo que a análise do

1BONAVIDES. Paulo. Teoria do Estado. 3.ed. São Paulo: Malheiros.2001. p.22.

2KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. Tradução de João Baptista Machado. 6. Ed. São Paulo: Martins

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Estado se concentra predominantemente no estudo dos diversos poderes e das relações entre eles, que são de domínio do soberano3.

Íntimas são as relações entre Estado e direito, pois que a realização dos fins do Estado depende da conduta dos indivíduos, conduta esta que necessita de regulação, sob pena de colocar em risco a realização dos fins do Estado.

É conveniente trazer à baila o entendimento de que o Estado não é apenas a fonte do direito, mas também figura simultaneamente como o produto do direito, derivando a sua constituição e a sua existência jurídica do direito público4.

Como o presente trabalho se propõe a tratar sobre o dever fundamental de pagar tributo, importante é a constatação de que o fenômeno tributário ocorre no âmbito da atuação estatal. Para manutenção das atividades que visam à promoção do bem comum, o Estado necessita de dinheiro, sendo que no exercício do seu poder de instituir a lei, o Estado impõe os tributos aos particulares visando obter renda para custear seus fins, suas atividades públicas.

Neste capítulo, buscar-se-á examinar a conceituação de Estado e seus elementos, bem como abordar os seus fins e suas relações com o poder e com o direito.

2.1 Conceito de Estado

Evidente na doutrina que não existe um conceito uníssono sobre a definição do Ente “Estado”. Esta divergência é fruto da multiplicidade de sentidos em que a definição de Estado é empregada, além da complexidade do objeto e dos diversos pontos de vista a partir dos quais pode o mesmo ser abordado5.

Para Hans Kelsen, a dificuldade de se definir o conceito de Estado estaria pautada na variedade de objetos que o termo denota. Nas palavras de Kelsen:

[...] às vezes, a palavra é usada em um sentido bem amplo, para indicar a sociedade como tal, ou alguma forma especial de sociedade. Mas a palavra também é com frequência usada com um sentido bem mais restrito, para indicar um órgão particular da sociedade - por exemplo, o governo, ou os sujeitos do governo, uma nação, ou o território que eles habitam. A situação insatisfatória da teoria política que, essencialmente, é uma teoria do Estado deve-se, em boa parte, ao fato de diferentes autores tratarem de problemas

3BOBBIO, Norberto. Estado, governo e sociedade. Tradução de Marco Aurélio Nogueira. 7. Ed. Rio de Janeiro:

Paz e Terra. 1987. p.77.

4RADBRUCH, Gustav. Introdução à Ciencia do Direito. Tradução Vera Barkow. São Paulo: Martins Fontes,

1999. p.37.

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bastante diferentes usando o mesmo termo e até, de um mesmo autor usar inconscientemente a mesma palavra com vários significados6.

Não é tarefa fácil conceituar Estado, já que este se encontra sempre em mutação. Nas palavras de Alessandro Mendes Cardoso:

O Estado como concepção jurídica ou política ou, ainda, como sistema institucional não se consolida numa forma acabada e estanque. Pelo contrário, encontra-se sempre em mutação, impelido por diversos fatores sociais, culturais, econômicos e políticos. Ou seja, o Estado como forma instrumental de organização social modifica-se tendo em vista a alteração dos fins a que se propõe e das formas consideradas, em determinado tempo, como mais viáveis para a consecução destes7.

As concepções são várias e antigas quanto às tentativas de apresentar um conceito exato para Estado.

Em Aristóteles, o Estado é uma associação natural que se constitui como totalidade da qual o indivíduo é parte integrante, de modo que, fora do Estado, o indivíduo não tem humanidade. Veja os pensamentos de Aristóteles:

De maneira evidente, o Estado está na ordem da natureza e antecede ao indivíduo: pois, se cada indivíduo por si, a si mesmo não é suficiente, o mesmo modo acontecerá com as partes em relação ao todo. Ora, o que não consegue viver em sociedade, ou que não necessita de nada porque se basta a si mesmo, não participa do Estado; é um bruto ou uma divindade. A natureza faz assim com que todos os homens se associem8.

Segundo a teoria que teve Aristóteles como o seu grande precursor, o Estado surge como necessidade, já que o indivíduo só encontra possibilidade de ampla realização quando está inserido em uma comunidade. Aristóteles entendia que o homem, com a sua capacidade de distinguir entre o bem e o mal, bem como com a capacidade de se comunicar, encontra as possibilidades de associação para formar o Estado. "O que, especificamente, diferencia o homem é que ele sabe distinguir o bem do mal, o justo do que não o é, e assim todos os sentimentos dessa ordem cuja comunicação forma exatamente a família do Estado"9.

6KELSEN, Hans. Teoria geral do Direito e do Estado. Tradução de Luis Carlos Borges. São Paulo: Martins

Fontes, 1998. p.261.

7

CARDOSO, Alessandro Mendes. O dever fundamental de recolher tributos no Estado Democrático de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2014. p.46

8ARISTÓTELES. A política. Tradução de Torrieri Guimaraes. São Paulo: Martin Claret, 2001. p.15. 9ARISTÓTELES, 2001. p.14.

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Karl Doehring defende o conceito de Estado de George Jillinek: uma associação humana que formou um povo; se estabeleceu em um determinado território e que dispõe de uma autoridade estatal baseada na organização. Essa descrição de Estado é conhecida como teoria dos três elementos10.

Hobbes traz a leitura de que o Estado seria o resultado de um pacto de cada homem com todos os homens, onde haveria a outorga de poderes para governá-los, de modo que cada indivíduo transferiria para um terceiro o direito de governá-lo. Feito isso, a multidão reunida em uma só pessoa se chamaria Estado, em latim civitas.

Isto é mais do que consentimento, ou concórdia, é uma verdadeira unidade de todos eles, numa só e mesma pessoa, realizada por um pacto de cada homem com todos os homens, de um modo que é como se cada homem dissesse a cada homem: Cedo e transfiro meu direito de governar-me a mim mesmo a este homem, ou a esta assembleia de homens, com a condição de transferir a ele teu direito, autorizando de maneira semelhante todas as suas ações11.

John Locke descreve o Estado como a união de indivíduos em um único corpo, onde prevalece uma lei comum estabelecida e uma judicatura, com autoridade para decidir sobre as controvérsias entre eles, punindo os transgressores. Para o aludido autor, o Estado seria uma associação que exerceria as funções de legislar e de julgar.

Aqueles que estão unidos num único corpo e tem uma lei comum estabelecida e uma judicatura à qual apelar, com autoridade para decidir controvérsias entre eles e punir os transgressores, estão em sociedade civil uns com os outros [...]12

Seguindo a ídeia de que o Estado seria um órgão centralizador do poder social, Montesquieu afirma que a reunião de todas as forças particulares forma aquilo que se denomina de Estado Político13.

10

DOEHRING, Karl. Teoria do Estado. Coordenação Luiz Moreira; Tradução Gustavo Castro Alves Araújo. Belo horizonte: Del Rey, 2008, p.40.

11HOBBES, Thomas. Leviatã ou matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil. Tradução de João

Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. São Paulo: Nova Cultural, 1997.p.143.

12LOCKE, John. Dois tratados sobre o governo. In: MORRIS, Clarence (Org). Os grandes filósofos do Direito.

Tradução de Reynaldo Guarany. São Paulo: Martins Fontes, 2002. Livro II, cap. VII, p.144.

13MONTESQUIEU, Charles de Secondat. O espírito das leis. Tradução de Cristina Murachco. São Paulo:

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Em Rousseau, encontramos a definição de que o Estado é uma pessoa coletiva, fruto da união dos indivíduos por meio de um pacto, formando um corpo político. Atenção para os seus dizeres:

Essa pessoa pública, que se forma assim pela união de todas as outras, antigamente, tinha o nome de Cidade e hoje de República, ou de corpo político, que, quando é passivo, é chamado por seus membros de Estado, quando ativo de Soberano, e, quando em comparação com seus pares, de Potência14.

Este pacto, o contrato social, tem como objetivo, nas palavras de Rousseau, materializar uma forma de associação que defenda e proteja a pessoa e os bens de cada associação de qualquer força comum, e pela qual cada um, unindo-se a todos, não obedeça, portanto, senão a si mesmo15. Na doutrina de Rousseau, o Estado surge por meio da união dos indivíduos, os quais, mediante um pacto, se submetem à vontade geral, sendo o Estado uma pessoa coletiva.

Por sua vez, Hegel enxergava o Estado como efetividade da ideia ética, sendo este a realidade da ideia moral objetiva. Em sua visão, o Estado é a unidade que reflete o espírito do povo, havendo uma relação hierárquica entre o Estado e os indivíduos, cabendo a este um dever e àquele um poder, poder este que é soberano.

O Estado, como realidade em ato da vontade substancial, realidade que adquire na consciência particular de si universalizada, é o racional em si e para si: esta unidade substancial é um fim próprio absoluto, imóvel, nele a liberdade obtém o seu valor supremo, e assim este último possui um direito soberano perante os indivíduos que em serem membros do Estado têm o seu mais elevado dever16.

Bobbio apresenta a sua conceituação de Estado como organização suprema de uma comunidade de homens. O elemento essencial ao Estado seria a soberania, caracterizada como um poder absoluto que não reconhece limites, uma vez que não reconhece acima de si mesmo nenhum outro poder superior17.

14ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a economia política e do contrato social. Tradução de Maria

Constança Pires Pissarra. Petropolis: Vozes, 1996. p.79

15ROUSSEAU, Jean-Jacques. O Contrato Social. Rio de Janeiro: Tecnoprint, 1762, p.35.

16HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Principios da filosofia do Direito. Tradução de Orlando Vitorino. São

Paulo: Martins Fontes, 1997. p.217.

17BOBBIO, Norberto. Direito e Estado no pensamento de Emanuel Kant. 4. ed. Tradução de Alfredo Fait.

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Hobbes entendia que o homem viveria sem poder e sem organização, num estágio que ele o denominou de estado de natureza, o qual representava uma condição de guerra. Com o intuito de evitar a guerra, Hobbes propôs que haveria a necessidade de se criar o Estado para controlar e reprimir o homem. O Estado seria, na visão de Hobbes, o único capaz de entregar a paz e, para tanto, o homem deveria ser supervisionado pelo Ente Estatal legitimado por um contrato social. Nas palavras de Hobbes:

Isto é mais do que consentimento, ou concórdia, é uma verdadeira unidade de todos eles, numa só pessoa, realizada por um pacto de cada homem com todos os homens [...] Feito isto, a multidão assim unida numa só pessoa se chama Estado, em latim civitas18.

Neste cenário, na visão da doutrina contratualista, o Estado é fruto da reunião de pessoas, através de um contrato visando, primordialmente, o bem comum. Sobre tal enfoque, Immanuel Kant registra que:

[...] o ato pelo qual um povo se constitui num Estado é o contrato original. Ao se expressar rigorosamente, o contrato original é somente a idéia desse ato, com referência ao qual exclusivamente podemos pensar na legitimidade de um Estado. De acordo com o contrato original, todos (omnes et singuli) no seio de um povo renunciam à sua liberdade externa para reassumi-la, imediatamente, como membros de uma coisa pública, ou seja, de um povo considerado como um Estado (universi). E não se pode dizer que o ser humano num Estado sacrificou uma parte de sua liberdade externa inata a favor de um fim, mas, ao contrário, que ele renunciou, inteiramente, à sua liberdade selvagem e sem lei para se vir com sua liberdade toda não reduzida numa dependência às leis, ou seja, numa condição jurídica, uma vez que esta dependência surge de sua própria vontade legisladora19.

Para Max Weber, o Estado se apresenta como o titular do monopólio legítimo do uso da coação física. Para ele, o Estado contemporâneo deve ser concebido como uma comunidade que, dentro dos limites de determinado território, reivindica o monopólio do uso legítimo da violência. "O Estado não se deixa definir, sociologicamente, a não ser pelo específico meio que lhe é peculiar, da forma como é, peculiar a todo outro agrupamento político, a saber, o uso da coação física”20.

18 HOBBES, Thomas. Leviatã ou matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil. São Paulo: Martin

Claret, 2003, p.143.

19KANT. Immanuel. A Fundamentação da Metafísica dos Costumes. A Doutrina Universal do Direito, p.158. 20WEBER, Max. Ciência e política: duas vocações. Tradução de Jean Melville. São Paulo: Martin Claret, 2001.

(22)

Evoluindo na reflexão acerca do elemento essencial da definição do objeto “Estado”, Miguel Reale entende que o Estado é uma realidade cultural, de natureza tridimensional, onde haverá sempre três elementos indissociavelmente conjugados, quais sejam:

I- o fato de existir uma relação permanente de Poder, com uma discriminação entre governantes e governados; II- um valor ou um complexo de valores, em virtude do qual o Poder se exerce; III- um complexo de normas que expressa à mediação do Poder na atualização dos valores de convivência21.

Ainda nas palvras de Reale, o Estado seria a conjugação do poder, convivência e do ordenamento jurídico que o constitui22.

Diante da dificuldade de se definir o conceito de Estado, neste trabalho adotar-se-á, em uma visão ampla e não absoluta, o conceito de que o Estado é uma figura abstrata criada pela sociedade.

Como fruto da criação da sociedade, adota-se a corrente que defende ser o Estado uma ficção política criada pela vontade da unificação e desenvolvimento do homem, com intuito de regulamentar e preservar o interesse público dos membros da referida sociedade.

Num determinado momento, o homem sentiu o desejo vago e indeterminado de um bem que ultrapassasse o seu bem particular e imediato e que ao mesmo tempo fosse capaz de garanti-lo e promovê-lo. Este é o bem comum ou bem público que somente é alcançado através da coordenação de esforços e intercooperação organizada de um grupo específico. Assim, com intensidade diversa, conforme o desenvolvimento social e a mentalidade de cada grupo, o instinto social leva ao Estado.

O Estado originou-se da vontade de preservação do interesse ou bem comum, posto que a sociedade primitiva não ostentasse os mecanismos necessários para promover a paz e o bem estar de seus membros.

Nessa linha, o homem deixa de ter a liberdade natural, que se consubstancia em um direito sem limites, de cunho instintivo, que o subsume em um verdadeiro estado natural, para ganhar a liberdade civil, a qual tem como limitação a vontade geral, tornando-se, pois, um ser racional e moral.

21REALE, Miguel. Teoria do Direito e do Estado. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p.374. 22Ibidem, p.375.

(23)

Assim, aceitando a autoridade da vontade geral, o cidadão não só passa a pertencer a um corpo moral coletivo, bem como adquire liberdade, obedecendo a uma lei que prescreve para si mesmo.

O Estado é a vontade da unificação de membros do grupo social, visando o bem comum ou bem público. Igualmente, diante da vontade de membros de um grupo social, o Estado figura como uma organização social, organização esta que é dotada de poder e com autoridade para orientar o comportamento de toda coletividade.

A única forma de perpetuação e conservação do bem comum foi à delegação, pelos membros do grupo social, de poder a um único Ente, o Estado.

A palavra Estado vem do latim status que significa posição e ordem. Essa posição e ordem transmitem a idéia de manifestação de poder, ou seja, podemos conceituar Estado como uma forma de sociedade organizada politicamente.

Estado é um conceito político que designa uma forma de organização social, soberana e coercitiva. Desta forma, o Estado é o conjunto de instituições que possuem a autoridade para regular o funcionamento da sociedade dentro de um determinado território.

O conceito de Estado, na visão de diversas doutrinas, pode ter variações e alcances diversos, mas o axioma, que é o bem comum, sempre encontra uma uniformidade, ou seja, a criação do Estado visa à realização do bem público e por isso detém autoridade (direito de mandar) e poder (força para obrigar).

No que se refere a “bem comum” como finalidade precípua do Estado, Tobias Barreto com muita propriedade pontua que:

[...] o fim do Estado é um facto que a cada momento se realisa na sociedade e que a cada momento está para ser realisado. Sempre se realisou e nunca acaba de se realisar. É um acto interminavelmente repetindo-se, incessantemente renovando-se. Todas as vezes que a lei penal pune aquelle que se poz em conflicto contra a ordem publica, offendendo direitos de terceiro, está se realisando o fim do Estado. Todas as vezes que o cidadão que trabalha gosa pacificamente dos proventos do seu trabalho, e o cidadão que estuda gosa dos fructos de suas vigílias, de suas indagações, á sombra da lei, o fim do Estado está se realisando. A honra protegida contra os ataques da injuria, da calumnia, e do ímpeto carnal: a vida do cidadão inviolavel, sua propriedade garantida contra o roubo, o furto, o esbulho, etc: o exercicio, em summa, de todos os direitos afiançados pelos poderes publicos: tal é o fim do Estado23.

23BARRETO, Tobias. Prelecções de direito constitucional - Estudos de Direito. vol. II, Sergipe: E.C.E., 1926,

(24)

O Estado pode coercitivamente impor sua vontade a todos que habitam seu território, pois seus objetivos são os de ordem e defesa social para realizar o bem público. Por isso e para isso o Estado tem autoridade e dispõe de poder, cuja manifestação concreta é a força por meio da qual se faz obedecer. Assim, Estado é a organização político-jurídica de uma sociedade para realizar o bem público/comum, com governo próprio e território determinado.

O homem é envolvido no laço do Estado antes de seu nascimento, com a proteção dos direitos do nascituro, e até depois de sua morte, o Estado disciplina o cumprimento de suas últimas vontades.

O Estado moderno é uma sociedade à base territorial, dividida em governantes e governados, e que pretende, dentro do território que lhe é reconhecido, a supremacia sobre todas as demais instituições. Põe sob seu domínio todas as formas de atividade cujo controle ele julgue conveniente.

O povo, o território e a soberania são as características do Estado Moderno, que se originou da necessidade de unidade e da busca de um único governo soberano, dentro de um território delimitado.

O governo pressupõe a soberania. Se o governo não é independente e soberano, não existe o Estado Perfeito.

Para Kelsen, a soberania significa que o Estado é uma autoridade suprema. Veja o quanto pontuado:

[...] a afirmação de que a soberania é uma qualidade essencial do Estado significa que o Estado é uma autoridade suprema. A autoridade costuma ser definida como o direito ou poder de emitir comandos obrigatórios. O poder efetivo de forçar os outros a certa conduta não basta para constituir uma autoridade24.

No conceito de soberania percebe-se a presença do elemento força, ou sistema de força, que define o destino dos povos. É pela soberania que surge o Estado Moderno. A soberania garante o desenvolvimento do Estado, representando a expressão jurídica da força no Estado constituído segundo os imperativos éticos, econômicos, religiosos etc., da comunidade nacional25.

24KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. Tradução: Luis Carlos Borges. 3 ed. São Paulo: Martins

Fontes, 2000, p.544.

(25)

Segundo Dallari, a ideia de soberania está diretamente ligada à noção de poder, estando ínsita a ideia de poder de unificação. Nesta senda, soberania seria “o poder de organizar-se juridicamente e de fazer valer dentro de seu território a universalidade de suas decisões”26.

Chega-se à ilação de que o povo, elemento essencial do Estado, continua a ser componente ativo mesmo depois que o Estado foi constituído, sendo o povo, destarte, o elemento que oferece condições ao Estado para formar e externar a sua vontade e, por isso mesmo, viabilizar o exercício da soberania.

Após essas breves considerações, a reflexão agora versará sobre os fins do Estado e posteriormente sobre o exercício do poder do Estado, estando o conceito e o exercício da soberania, muito latentes nos próximos itens.

2.2 Dos fins do Estado

Com a formação do Estado ao longo da história, mostra-se necessária uma abordagem sobre os principais fins deste ente político e jurídico.

É de notório conhecimento, entre os estudiosos do tema, que o Estado deve propiciar aos seus cidadãos a forma ideal de convivência social, procurando sempre atingir a plena paz social e conceder o bem comum aos seus membros.

Hobbes, em reflexão sobre as finalidades do Estado, considera que o desígnio dos homens é cuidar de sua segurança pessoal e de seu bem estar. Neste ponto, Hobbes entende que as leis naturais não são suficientes para evitar o estado de desordem entre os indivíduos, de modo que seria necessária a existência de um poder maior que mantenha o respeito e dirija as ações dos homens no sentido de um benefício comum. O Estado, então, se materializaria nesse poder comum, cujo objetivo é atingir e garantir a segurança do indivíduo e da comunidade. A única forma de constituir um poder comum é conferir toda força e poder a um homem ou a uma assembleia de homens, que possa defender uma só vontade, vontade esta que diz respeito à paz e segurança comuns. O Estado não é um fim em si mesmo, mas uma associação artificialmente criada pelos homens com o objetivo de garantia da segurança e do bem estar da coletividade. Segundo Hobbes:

A única forma de constituir um poder comum, capaz de defender a comunidade das invasões dos estrangeiros e das injúrias dos próprios

(26)

comunheiros, garantindo-lhes assim uma segurança suficiente para que, mediante seu próprio trabalho e graças aos frutos da terra, possam alimentar-se e viver satisfeitos, é conferir toda a força e poder a um homem, ou a uma assembléia de homens, que possa reduzir suas vontades, por pluralidade de votos, a uma só vontade27.

Sobre a ideia de que as leis naturais não são suficientes para evitar o estado de desordem, Rousseau registra que em um determinado estágio, os homens precisaram se associar, notadamente, pelo fato de que individualmente não encontraram maneiras para superarem os obstáculos que surgiram à conservação do estado natural. Foi através de um pacto, contrato social, que o Estado nasceu com a função de, na expressão de uma vontade geral, dirigir as pessoas, cuidando de seus interesses28.

Com semelhante abordagem sobre a necessidade de se assegurar a segurança e o bem estar da coletividade, abordando a preservação da propriedade, inclusive, Locke entende que os homens, apesar de alguns privilégios do estado de natureza, são propensos a se associarem, buscando abrigo nas leis estabelecidas e no governo. A proteção da vida, da liberdade e da propriedade estaria em risco no estado de natureza, pois que em tal estágio não existe uma lei que sirva de critério objetivo de resolução dos conflitos; não existe um juiz imparcial e com autoridade legítima; não existe um poder que garanta o cumprimento e obediência à decisão proferida pelo juiz29.

Do entendimento de Locke podemos abstrair que o Estado é uma associação com funções de legislar, julgar e de executar as leis, funções estas que possuem a finalidade precípua de garantir a paz, a segurança e o bem geral público. Para Locke:

[...] quando os homens constituem sociedade abandonando a igualdade, a liberdade e o poder executivo do estado de natureza aos cuidados da comunidade para que disponha deles por meio do poder legislativo de acordo com a necessidade do bem dela mesma, fazem-no cada um com a intenção de melhor preservar a si próprio, à sua liberdade e propriedade [...] Por isso, quem tiver nas mãos o poder legislativo ou supremo de uma comunidade tem a obrigação de governa-la mediante leis estabelecidas, promulgadas e conhecidas do povo, e não por meio de decretos extemporâneos; juízes equânimes e corretos terão de resolver as controvérsias à luz dessas leis, e empregar a força da comunidade no seu território apenas na execução de tais

27HOBBES. Thomas. Leviatã. Tradução de Pietro Nassetti.São Paulo: Martin Claret, 2001.p.130.

28ROUSSEAU, Jean Jacques. Do contrato social. Tradução de Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2001.

p.32.

29LOCKE, John. Segundo tratado sobre o Governo. Tradução de Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2002.

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leis [...] E tudo isso visando apenas à paz, à segurança e ao bem geral do povo30.

O Estado tem como finalidade a proteção da pessoa, dos bens e a conservação da liberdade. A crescente complexidade das funções assumidas pelo Estado - da garantia da segurança perante o exterior, da paz civil à promoção do bem-estar e da justiça social - decorre do alargamento das necessidades humanas, das pretensões de intervenções dos governantes e dos meios de que se podem dotar.

Para Kant, o fim do Estado é a criação e a manutenção da ordem jurídica, de modo que tal ordem se materializa na lei. O bem público seria, portanto, a lei que garanta ao cidadão a liberdade, permitindo a cada um alcançar, no âmbito desta liberdade, a felicidade pessoal31.

Reis Friede defende que a sociedade política que se forma pela instituição do poder político, em primeiro lugar, busca o fator segurança para as pessoas e para os valores destas, posto que a organização estatal seja um instrumento de defesa da nação no âmbito externo e também interno32.

Friede propõe uma divisão dos fins do Estado em fins jurídicos e fins sociais. Os fins jurídicos, considerados fundamentais ou essenciais, são: garantia da ordem interna; defesa da soberania na esfera internacional; criação das leis; e exercício da justiça. Os fins sociais, entendidos como não essenciais, seriam àqueles ligados a atividades de parceria com a iniciativa privada, tal como previdência social, educação e saúde33.

O Estado tem a tarefa de coordenar a integração da comunidade com os poderes de organização, sanção e execução, implantando direitos que serão exercidos em uma jurisdição organizada.

A comunidade, organizada em Estado, tem finalidades a atingir, de modo que estas finalidades determinam as funções do Estado. Os fins da coletividade determinam as tarefas e objetivos do Estado. Os fins variam de acordo com os valores característicos de cada comunidade e de acordo com o momento histórico.

30LOCKE, 2002. p.94.

31BOBBIO, Norberto. Direito e estado no pensamento de Emanuel Kant. 4.ed. Tradução de Alfredo Fait.

Brasília, DF: Editora Universidade de Brasília, 1997. p.134.

32FRIEDE, Reis. Curso de Ciência Política e teoria geral do Estado. 2. Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,

2002. p.77.

(28)

O Estado contemporâneo exerce uma função social, podendo ser denominado, inclusive, como o Estado das prestações, possuindo como objetivo a se perseguir a promoção do bem estar social da comunidade.

Portanto, podemos elencar como fins do Estado a segurança, a justiça e o bem estar. É de notório conhecimento entre os estudiosos do tema que o Estado deve propiciar aos seus cidadãos a melhor forma possível de convivência social, procurando sempre, como dito anteriormente, atingir a plena paz social e propiciar o bem comum aos seus membros. 2.3 O exercício do poder do Estado

O poder do Estado assume a coordenação e a supremacia de todos os outros tipos de poder, constituindo-se no núcleo da ação política, com a submissão de todos os indivíduos à sua coercibilidade em virtude da crença em sua legitimidade. Neste diapasão, no que se refere à legitimidade do poder do Estado, ela deve derivar da necessidade de estabelecer-se a necessária convivência social. Desse modo, se toleraria um maior ou menor grau de dominação de um grupo sobre os demais, com vista a essa finalidade estatal precípua.

O poder político existe, antes de tudo, porque se verificou ser historicamente indispensável à imposição e manutenção da paz em sociedade. Um Estado que não consiga garantir um grau mínimo de segurança interna, deixa de existir como Estado. A garantia da paz é, assim, o primeiro fim do Estado, no sentido de que é aquele fim cujo não cumprimento acarreta a própria destruição do Estado.

No Estado o poder é inerente à natureza do seu objeto, se mostrando como o meio para realização dos fins que se propõe a comunidade.

Tal poder é exercido sobre a comunidade, com clara interferência na liberdade do indivíduo. No âmbito do Estado, não pode o indivíduo fazer tudo o que pretende. Há de observar os comportamentos autorizados ou não proibidos pela ordem jurídica.

Quando o poder é despersonalizado, como é o caso do Estado, o que se nota é que fica facilitada a submissão e aceitação de suas determinações pelos indivíduos. Daí que o poder é considerado legítimo quando é aceito e existe a disposição de obediência por parte daqueles que não o detêm. Por outro lado, será ilegítimo quando exercido por indivíduos ou grupos sociais não aceitos pelos demais, e que impõem sua vontade sob uma resistência.

Para Norberto Bobbio, destacam-se três teorias fundamentais acerca do significado de poder: a teoria substancialista, consoante o poder seja identificado com uma coisa que se usa para adquirir outros bens; a teoria subjetivista, atrelada à capacidade de um sujeito

(29)

alcançar seus anseios; e a teoria relacional, que pressupõe uma relação entre dois sujeitos que implica na possibilidade de um deles obter do outro um comportamento determinado34.

Na teoria substancialista, o poder é meio de se conseguir impor uma vontade ou a concordância de outra vontade. O poder, para essa teoria, consiste no meio de produção dos efeitos desejados, podendo se valer de força, ameaças de punição e promessas de recompensa.

Para a teoria subjetivista, o poder é decorrente da capacidade do sujeito de obter certos efeitos. O Estado tem o poder de fazer as leis e, fazendo as leis, de influir sobre a conduta da coletividade.

Por fim, na teoria relacional, o poder é uma relação, onde um dos sujeitos obtém do outro uma conduta que, sem o poder, não ocorreria. O poder, quando definido como relação entre sujeitos, está ligado ao conceito de liberdade.

Uma definição mista, subjetiva e relacional de poder social é a de Ruth Zimmerling, que define o poder como a capacidade de obter resultados desejados, fazendo com que os outros se comportem como queremos. Como o poder político é subcategoria do poder social, essa definição é adequada à sua explicitação, embora seja igualmente aplicável a outras subcategorias como as de poder econômico e poder ideológico35.

Pode-se dizer que o poder se refere ao domínio, faculdade ou jurisdição que se tem para mandar ou para executar uma ação que afeta aos demais, mesmo contra sua vontade, utilizando-se da força, caso seja necessária. Cabe ao Estado o monopólio do uso legal da força.

O poder político consiste, originariamente, na possibilidade de impor pela força, aos indivíduos membros de um grupo social, a adoção de um determinado comportamento. Quando na passagem da Idade Média para a Idade Moderna esse poder passou a ser exercido com exclusividade, por meio do monopólio da coerção legítima, deu-se origem ao surgimento do Estado.

Bobbio caracteriza o poder político soberano mediante o critério do monopólio do uso exclusivo da força legitima sobre determinado território. Quem tem o direito exclusivo de usar a força sobre um determinado território é o soberano. Se o uso da força é a condição necessária do poder político, apenas o uso exclusivo deste poder lhe é também a condição

34BOBBIO, Norberto. Estado, Governo e sociedade: para uma teoria geral da política. 7. Ed. Tradução de

Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. p.77.

(30)

suficiente. O Estado consegue obter obediência contínua a seus comandos graças também ao uso exclusivo do poder coativo36.

Embora a força física seja uma condição necessária e exclusiva do poder, não é condição suficiente para a sua manutenção. Em outras palavras, o poder que apenas se sustenta na força não pode durar. Logo, esse poder também precisa ser legítimo, ou seja, ter o consentimento daqueles que o obedecem.

Tomando como base o cenário em que o poder é exercido, Aristóteles fala sobre o poder do pai sobre os filhos; o poder do senhor sobre os escravos; e, por fim, o poder do governante sobre os governados. Para cada tipo de poder o filósofo indica um critério de interesse, de modo que o poder paterno é exercido com a busca de se proteger o interesse dos filhos; o poder senhorial é exercido com o interesse de propriedade do senhor face aos seus escravos; e o poder político é exercido de acordo com o interesse de quem governa ou de acordo com o interesse de quem é governado37.

Para Aristóteles, só é legítimo o poder exercido em prol do bem comum segundo a leitura realizada pelo filósofo, na sua taxonomia das formas de governo, seria corrompido o governo em que os governantes perseguem o interesse próprio, sendo virtuoso o governo em que os governantes perseguem o interesse público.

Miguel Reale conceitua o poder soberano conforme a titularidade, eficiência e finalidade. A titularidade do poder soberano é da Nação; no tocante à eficiência, o poder é a possibilidade de fazer valer as decisões do soberano; por fim, mas não menos importante, a finalidade do poder é a realização do bem comum. Para o autor, soberania é o poder da Nação, especialmente no que diz respeito à organização desta, fazendo valer dentro do seu território a universalidade de suas decisões para a realização do bem comum38. Para Reale, em uma visão social, a Nação possui a titularidade da soberania, enquanto que, sob uma ótica jurídica, a soberania seria do Estado no momento em que este figura como detentor do exercício do poder.

A noção de legitimidade é uma das chaves do problema do poder. Podemos afirmar que a noção de legitimidade nas sociedades democráticas traduz-se como “consenso”, ou

36BOBBIO, Norberto. Estado, Governo e sociedade: para uma teoria geral da política. 7. Ed. Tradução de

Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. p.81.

37ARISTÓTELES. A política. Tradução de Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2001. 38REALE, Miguel. Teoria do direito e do estado. 5 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2000, p.130.

(31)

seja, a conformidade que existe em uma dada sociedade sobre suas estruturas, hierarquia, orientação, autoridade, governo, etc.

No período moderno, as teorias contratualistas se dedicaram a explicar a legitimidade do poder político. Segundo essas teorias, o governo era tido como um produto concebido por um artifício humano, um corpo social cuja legitimação derivava da autorização das próprias pessoas que haviam se sujeitado a um pacto que lhes permitiria garantir a própria sobrevivência em sociedade.

A legitimidade do governo deve se fundar na segurança física, na proteção dos direitos naturais e no respeito às leis instituídas.

A autoridade política deve ser legitimada na vontade geral do povo, único e verdadeiro soberano, não devendo trasladar-se a um corpo político.

A legitimidade diz respeito não só à origem do poder, mas também à sustentação do poder. Do conceito de legitimidade, resultou uma determinada concepção da obrigação política do dever de obedecer ao comando do poder político.

Segundo os ensinamentos de Fábio Konder Comparato, o exercício estável do poder social depende de sua aceitação por parte das pessoas sobre as quais ele se exerce. Não há que se esquecer de que toda relação de poder, pela sua própria natureza, é bilateral, de modo que a obediência representa sempre uma manifestação livre e racional de vontade. Até mesmo a coação irresistível é uma situação precária, instável e muitas vezes insustentável. Os detentores do poder, em qualquer contexto social, se dedicam a obter a submissão voluntária e pacífica de seus subordinados, ou seja, buscam o reconhecimento social de sua legitimidade39. Nas palavras de Comparato:

[...] uma das grandes verdades postas em foco pela reflexão histórica e politica dos últimos 200 anos é que o exercício estável do poder social, em qualquer de suas modalidades – política, econômica, religiosa, intelectual - depende necessariamente de sua aceitação voluntária por parte das pessoas as quais ele se exerce40.

O poder legítimo ao governo deve necessariamente atender aos anseios do seu povo, verdadeiro soberano e detentor do poder. Na verdade, tem de se reconhecer que, em grande medida, a manutenção do apoio popular depende da eficácia da ação política na consecução

39COMPARATO, Fábio Konder. A democratização dos meios de comunicação de massa. In: GRAU, Eros

Roberto; GUERRA FILHO, Willis Santiago (Org.). Direito Constitucional: estudos em homenagem a Paulo

Bonavides: São Paulo: Malheiros, 2001. p.149.

(32)

dos interesses públicos ou, pelo menos, no convencimento da opinião pública de que os interesses gerais estão sendo atendidos.

A evolução histórica demonstrou que a soberania possui, indissociavelmente, uma expressão jurídica que é a possibilidade de adotar atos jurídicos de autoridade. O exercício da soberania implica em atos que produzem uma transformação na esfera jurídica dos destinatários, nos seus direitos e obrigações, sem necessidade do seu consentimento. O Direito, notadamente, passa a ser usado como ferramenta de exercício do poder político.

O Direito contém a sensível função de impor limites ao exercício do próprio poder. O poder político é, assim, um poder exercido sobre um grupo social, implicando a possibilidade de manipulação da sua esfera jurídica, bem como de execução pela força das obrigações assim impostas, de forma a condicionar o comportamento dos integrantes desse grupo e, portanto, produzir resultados desejados pelos titulares do poder.

Vê-se na proposição supra a conceituação do direito como um elemento limitador do poder do Estado, ou pelo menos, como instrumento de direcionamento ético e valorativo do exercício do poder.

Bobbio muito bem pontuou que ao lado do problema do fundamento do poder, os estudiosos sempre se ocuparam também com o problema dos limites do poder, sendo este último normalmente analisado de acordo com as relações entre o direito e o Estado. A partir desta problemática, segundo Bobbio, sempre se indagou se seria melhor o governo das leis ou o governo dos homens41.

Para Sahid Maluf, no tocante às limitações do poder do Estado, o Estado existe para servir ao povo e não o povo para servir ao Estado. A soberania deve ser exercida sob um governo de leis, leis estas que definem e limitam o poder. A autoridade do direito é maior do que a autoridade do Estado42. Nas palavras de Maluf: "O Estado é uma organização destinada a manter, pela aplicação do Direito, as condições universais de ordem social. E o direito é o conjunto das condições existenciais da sociedade, que ao Estado cumpre assegurar"43.

Pelos ensinamentos, supraelencados, percebe-se que a existência do direito positivo pressupõe a existência de regras para organização do poder, além da existência de órgãos capazes de garantir a aplicabilidade de tais regras.

41BOBBIO, Norberto. Estado, Governo e sociedade: para uma teoria geral da política. 7. Ed. Tradução de

Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. p.96.

42MALUF, Sahid. Teoria geral do Estado. 14. Ed. São Paulo: Sugestões Literárias, 1983.p.53. 43MALUF, 1983, p.17.

(33)

Dúvidas surgem no tocante à questão da existência de direito sem positividade, se a positividade só resulta do poder conferido ao Estado, bem como se há hierarquia entre os diversos ordenamentos.

Seguindo as lições de Miguel Reale, quanto à questão do monismo ou pluralismo jurídico, este traz em sua doutrina três correntes, quais sejam: a corrente do monismo jurídico, que prega que o direito é uma criação do Estado, sendo a soberania um poder absoluto que só respeita os limites que ela traça a si mesma; a corrente da sociabilidade absoluta do direito, quando se chega à conclusão de que existe direito sem Estado, sendo que a soberania não é una; a corrente sintética, que defende a existência de uma graduação de positividade jurídica, sendo que o direito estatal sempre é a expressão do máximo grau de positividade44.

Segundo a doutrina monista, onde se identificam grandes expoentes como Rousseau, Hobbes, Kant, Hegel, Jhering, dentre outros, o Estado seria a fonte única do Direito, sendo que as normas que não podem ser impostas por ele, não constituem regras de direito.

Utilizando a doutrina de Rousseau, podemos sintetizar que os defensores do monismo jurídico sustentavam que a soberania é inalienável e indivisível, e desta soberania nasce o direito. Para o filósofo, só a vontade geral pode dirigir as forças do Estado segundo o fim de sua instituição, o bem comum. O povo, legislando soberanamente, seria o Estado, criador do direito que se confunde com a lei. A lei é a expressão da vontade geral, sendo que tal vontade geral é a vontade da maioria do povo que diretamente se governa, logo, o direito seria a vontade do Estado45.

Ainda sobre a estatalidade do direito, Jhering defende que o direito de coação social se encontra sob o domínio exclusivo do Estado, de modo que toda e qualquer associação que queira fazer valer os seus direitos deve se recorrer ao Estado. O Estado, portanto, seria a única fonte do direito, já que as normas que não podem ser impostas por ele não constituem regras de direito. O Estado enquanto poder soberano possui a supremacia sobre todas as associações do seu território46.

Sob outro ponto de vista, apresentando a doutrina pluralista e abandonando os adeptos da estatalidade do direito, Reale47 menciona, dentre outros autores adeptos à socialidade do direito, Gierke, Hauriou e Santi Romano. Em Gierke, “cada corporação tem um sistema de

44REALE, Miguel. Teoria do direito e do estado. 5 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2000, p.220.

45ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. Tradução de Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2001.

p.40.

46REALE, Miguel. Teoria do direito e do estado. 5 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2000, p.233. 47REALE, 2000, p.271 – 294.

(34)

direito próprio, sendo idêntica ao Estado do ponto de vista de sua personalidade legal, pois toda comunidade orgânica é capaz de produzir Direito, ou melhor, o Direito surge concomitantemente com toda forma de organização, seja ela o Estado ou uma corporação”. Citando Hauriou, “o Estado é uma instituição entre as instituições, mas de todas as instituições que a ordem social produziu, a mais eminente é a instituição do Estado. Todas as instituições tem o poder de criar direito próprio, de formular regras de direito, as quais, portanto, tem um caráter derivado e secundário”. Por fim, em Santi Romano, “cada instituição constitui um mundo jurídico subsistente e um corpo social fechado que possui uma individualidade própria, uma esfera completa de direito objetivo”.

Para os adeptos de tal corrente, há de se admitir a existência de várias formas de garantia para as relações de Direito, bem como de se reconhecer que a garantia jurídica não constitui monopólio do Estado.

Apresentadas as correntes monista e puralista, fato é que todos os Estados adotam como fim a administração da justiça em sociedade, com o objetivo precípuo de manter a paz social.

Os tribunais surgem historicamente como alternativa à realização da justiça pelas próprias mãos, justiça esta que colocava em risco a ordem pública e, portanto, o fim primário do Estado. A garantia da paz interna e externa e a administração da justiça implicaram na instituição de diversos serviços públicos, dentre os quais os jurisdicionais e, ainda e compreensivelmente, os fiscais, campo este em que se explorará o dever fundamental de pagar tributo.

A norma jurídica há sempre que buscar os fins sociais, fins estes alicerçados nos valores da sociedade.

Feitas as pertinentes considerações sobre os elementos, fins e exercício do Poder do Estado, importante analisar a evolução histórica da concepção de Estado até o surgimento do Estado Democrático de Direito.

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