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Redações nota mil do ENEM: um estudo analítico da massificação de sua estrutura e conteúdo

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM

REDAÇÕES NOTA MIL DO ENEM: UM ESTUDO ANALÍTICO DA MASSIFICAÇÃO DE SUA ESTRUTURA E CONTEÚDO

RENATA INGRID DE SOUZA PAIVA

Natal, RN 2020

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REDAÇÕES NOTA MIL DO ENEM: UM ESTUDO ANALÍTICO DA MASSIFICAÇÃO DE SUA ESTRUTURA E CONTEÚDO

RENATA INGRID DE SOUZA PAIVA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Estudos da Linguagem (PPgEL), da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), como requisito para obtenção do título de mestre em Estudos da Linguagem, na área de concentração Linguística Teórica e Descritiva. Orientadora: Profa. Dra. Sulemi Fabiano Campos

Natal, RN 2020

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PAIVA, R. I. S. Redações nota mil do ENEM: um estudo analítico da massificação de sua estrutura e conteúdo. Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem). Ufrn/PPgEL: Natal (RN), 2020.

BANCA EXAMINADORA

Profa. Dra. Sulemi Fabiano Campos (Orientadora – UFRN)

Profa. Dra. Maria da Penha Casado Alves (Examinadora Interna – UFRN)

Profa. Dra. Sylvia Coutinho Abbott Galvão (Examinadora Externa ao Programa – UFRN)

Prof. Dr. Thomas Massao Fairchild (Examinador Externo à Instituição – UFPA)

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Aos meus pais e irmão que, com amor, seguram minha mão e fortalecem minha trajetória.

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AGRADECIMENTOS

Acreditando que somos e estamos nesse mundo uns com os outros, sociáveis e pertencentes, compreendo que, nesta trajetória, muitas foram as pessoas que cruzaram e/ou permaneceram em meu caminho. A todos esses, quero agradecer, recordar suas passagens, permanências, e tentar, por meio de palavras, registrar todo o meu zelo e apreço. Registrar, inclusive, toda a felicidade que transborda do meu coração.

Começo, pois, destacando a presença constante de Deus na minha vida. É Ele quem sustenta meus pensamentos e meus sonhos e em quem busco forças. Ao Deus que eu tenho como um amigo, como fortaleza e a quem eu agradeço a possibilidade de ser quem venho sendo e de aprender com isso.

Aos meus pais e irmão, que são os pilares da minha vida e que participaram com presença constante deste caminho, agradeço com muito zelo e amor, ainda que as palavras não sejam suficientes.

À Neuma, minha mãe, que com seu colo amoroso, suas palavras doces, sensíveis e consistentes, seu apoio, seu carinho e sua doçura, segurou minha mão e me acolheu nos momentos de desespero. Quem soprou, com nobreza, esperanças que foram determinantes para que eu seguisse, em meu coração. Agradeço, além disso, pelos momentos que vibrou, sorriu e comemorou cada pequena vitória desta trajetória e por ter zelado por ela junto comigo em todos os momentos.

Ao José, meu pai que, durante todo este processo, esteve sempre por perto me oferecendo apoio e presença constantes e me assegurando da existência de minhas capacidades. Quem deixa o coração se revelar por entre as palavras mais firmes e precisas que foram essenciais para que eu confiasse que posso ir bem longe, que posso alcançar meus sonhos e objetivos, na medida em que eu desejo, estabeleço minhas metas e sigo em busca deles.

Ao Rodrigo, meu irmão, meu amigo, meu exemplo de determinação, de perseverança, de força e, principalmente, de coragem, agradeço por muito, por tudo e por tanto. Sei que meus passos seguem mais firmes, mais precisos e mais confiantes a cada vez que tenho a certeza, por meio de nossa amizade e cumplicidade que temos um ao outro sempre. Seu cuidado e seu zelo foram e são um dos meus melhores combustíveis, não só nesta etapa, mas em toda a minha vida.

Às minhas avós: obrigada! À vovó Teresa, que partiu desta vida, na qual foi exemplo de luta e superação, e que hoje, acredito, está olhando e zelando por mim de um lugar bem

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melhor; e à vovó Anita, que, com seu olhar experiente, seu amor e seu testemunho de vida, me ensina muito sobre o que sou e sobre o que quero ser. Em nome delas, registro minha gratidão pela oportunidade de ter convivido com meu avô Alcebíades e por ter conhecido, ainda que não em vida, um pouco sobre meu avô Antônio. Aproveito, em nome dos meus avós, para agradecer aos meus familiares que se fizeram presentes (das mais variadas formas) durante a execução deste projeto. Vocês foram e são muito importantes.

Dentre algumas pessoas, quero agradecer a alguns amigos, em especial, que estão em minha vida e que, mesmo diante dos desencontros e dos caminhos diferentes que a vida nos impõe, se fazem presente e ajudam a colorir, com cores vibrantes, minha vida.

À Maria Clara, minha amiga, pelo companheirismo na graduação, na especialização, no mestrado, nos projetos presentes e futuros e na vida. Nossa amizade é reflexo de luz em minha vida. Eu agradeço por muito e, inclusive, pela oportunidade de ter cruzado seu caminho e por todo o apoio recíproco e verdadeiro que sempre trocamos. Além de agradecer pela leitura e pela revisão deste trabalho, sei que eu o confiei em ótimas mãos.

Ao Victor, meu amigo, por todas as vezes que nos mostramos que a amizade vai muito além da presença, do presente e do constante. Nós somos e, acredito, sempre seremos a nossa constância. Sempre irei agradecer a você por poder compartilhar momentos, sentimentos e amizade.

À Jéssica, minha amiga, por todas as vezes que você acreditou em mim, me incentivou e deixou claro, com sua naturalidade e precisão, que não tinha dúvida alguma do meu potencial. Por muitas vezes, você enxergou momentos em que eu precisava relembrar do quanto eu era capaz.

Aos amigos, anjos, que transbordam meu coração e que, tenho certeza, sabem quem são: vocês são os sorrisos, as alegrias, os dilemas e toda a autenticidade possível. Vocês foram, até quando não sabiam, apoio, colo e alento nos momentos em que o peso não só pesava como também fazia barulho. Aos meus amigos, minha lealdade e meus sinceros sorrisos.

Ainda nesse contexto, quero destacar as minhas amigas Bruna, Maria Luiza e Rebecca, que chegaram até minha vida por meio das palavras, das Letras e do desejo por fazer a diferença na educação. Vocês foram muito importantes durante as etapas que nutriram o desejo por essa pesquisa, além de serem importantes na minha vida.

À minha orientadora, Profa. Dra. Sulemi Fabiano Campos, agradeço a receptividade, paciência e zelo desde o primeiro momento em que ouviu minhas ideias e considerou orientá-las e, também, por seu empenho em cultivar as sementes do conhecimento. Sua orientação foi crucial para a concretização desta etapa.

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Agradeço à Universidade Federal do Rio Grande do Norte e ao Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem. Nesses lugares pude compartilhar, compreender e formar meus objetivos.

Com muito carinho, agradeço ao Grupo de Pesquisa em Estudos do Texto e do Discurso – GETED de que faço parte. Pertencendo ao grupo, percebi o quanto é importante o apoio e a presença de quem vive o caminho com passos semelhantes. Então, a todos os integrantes, aqui representados por Liliane, Maiara e Adenilton, meu muito obrigada.

Aos amigos do curso de Psicologia, projeto em que decidi me aventurar, quero endossar o quanto sou feliz e grata nesse “lugar” onde fui muito bem acolhida e que fez uma significante diferença numa etapa primordial da conclusão deste trabalho.

Aos colegas que fiz na Secretaria de Educação a Distância – SEDIS, em nome de José Correia e Letícia Torres, meu agradecimento pelas palavras de encorajamento, pela oportunidade de aprendizados e pelo ambiente saudável de trabalho que toda a equipe se esforça para preservar.

Agradeço, também, a todos os professores que fizeram parte de minha vida. Vocês despertaram meu apreço pela licenciatura, me encorajaram e me proporcionaram incríveis momentos de crescimento. Assim, aos professores do ensino básico, do ensino superior e mais especificamente da banca de qualificação e de todos os momentos de troca de conhecimento durante o mestrado: vocês são incríveis e necessários. Obrigada!

De um modo bem especial, agradeço aos que eu não citei diretamente ou que não pertencem aos espaços que apontei, mas que foram importantes. Muitas pessoas passaram pelo meu caminho durante esses dois anos, muitos ficaram brevemente, outros demoraram um pouco mais, assim como muitos permanecem. A todos, pelas palavras pontuais, sorrisos, convivência, vivências, sou grata.

Por fim, aos sonhos dos estudantes que, em sua grande maioria, perpassam pela escrita da redação do ENEM. Minha gratidão é, também, minha torcida pela concretização de todos esses caminhos sonhados.

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“A tarefa não é tanto ver aquilo que ninguém viu, mas pensar o que ninguém ainda pensou sobre aquilo que todo mundo vê.”

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RESUMO

O contexto de produção textual do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) é um dos principais mobilizadores dos anos preparatórios para os candidatos, inclusive, no tocante ao ensino de língua portuguesa nos anos finais do Ensino Médio. Com base nos impactos causados pelo exame, esta pesquisa visa ao estudo analítico da escrita das redações nota mil, tomando como hipótese a massificação da estrutura e do conteúdo dos textos. A pesquisa tem como objetivo geral: investigar de que forma as escolhas estruturais e conteudísticas dos alunos, bem como a utilização da voz do outro, influenciam na lógica argumentativa para o êxito das redações nota mil. Como objetivos específicos, delimitamos: i) identificar as marcas estruturais e conteudísticas encontradas nos textos e quais se apresentam com maior recorrência; ii) caracterizar como se dá a utilização e a recorrência, nos textos analisados, da inserção da voz alheia; iii) determinar, de forma comparativa, a funcionalidade dessas vozes inseridas na lógica argumentativa das redações; e iv) mostrar em quais aspectos as escolhas estruturais, conteudísticas e a inserção da voz alheia constituem o que consideramos como massificação. Para tanto, recorremos às contribuições de Charaudeau (2009) acerca da organização de textos argumentativos assim como da lógica argumentativa; de Authier-Revuz (1990, 2004) sobre as reflexões de heterogeneidade enunciativa mostrada; de Adorno (1985), para a discussão sobre massificação, e Pêcheux (1995) sobre a posição do sujeito para caracterizar o lugar do discurso dos candidatos autores nas redações. O corpus é constituído de 32 (trinta e duas) redações distribuídas, igualmente, por quatro anos (2014, 2015, 2016 e 2017). Os resultados apontam que, em todos os anos, há uma padronização na estrutura e no conteúdo que não é atribuída ao que sugerem as cinco competências em sua totalidade, além de uma recorrência da utilização da inserção explícita da voz alheia para compor a lógica argumentativa. Quanto à questão da massificação estrutural e conteudística, observamos que há reincidência da construção de uma “forma” de redação moldada e pré-estabelecida para que os candidatos, nos anos preparatórios para o exame, ativem a necessidade de moldar seus textos para que ocupem a posição de redações “modelo”, aqui consideradas com a nota máxima.

Palavras-chaves: Massificação da estrutura. Massificação do conteúdo. Redações nota mil do ENEM.

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ABSTRACT

The context of textual production of the Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) is one of the main mobilizers of the preparatory years for candidates, including with regard to teaching Portuguese in the final years of high school. Based on the impacts caused by the exam, this research aims at the analytical study of the writing of grade one thousand composition, taking as a hypothesis the massification of the structure and content of the texts. The research has the general objective: to investigate how the students' structural and content choices, as well as the use of the other's voice, influence the argumentative logic for the success of the grade one thousand composition. As specific objectives, we delimit: i) to identify the structural and content marks found in the texts and which are presented with greater recurrence; ii) to characterize the use and recurrence, in the analyzed texts, of the insertion of the voice of others; iii) determine, in a comparative way, the functionality of these voices inserted in the argumentative logic of the composition; and iv) show in which aspects the structural, content choices and the insertion of others' voices constitute what we consider as massification. For that, we resort to the contributions of Charaudeau (2009) about the organization of argumentative texts as well as the argumentative logic; Authier-Revuz (1990, 2004) on the reflections of enunciative heterogeneity shown; de Adorno (1985), for the discussion on massification, and Pêcheux (1995) on the subject's position to characterize the place of the speech of the candidate authors in the composition. The corpus consists of 32 (thirty-two) composition, equally spread over four years (2014, 2015, 2016 and 2017). The results show that, in all years, there is a standardization in structure and content that is not attributed to what the five competencies suggest in their entirety, in addition to a recurrence of the use of the explicit insertion of the other's voice to compose the argumentative logic. As for the issue of structural and content massification, we observe that there is a recurrence of the construction of a molded and pre-established “form” of writing so that candidates, in the preparatory years for the exam, activate the need to shape their texts so that they occupy the position of “model” composition, considered here whit the maximum score.

Key-words: Structural massification; Content massification; ENEM thousand note compositions.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Imagem 1 – Competências da Redação do ENEM... 32

Imagem 2 – Direcionamentos de componentes obrigatórios... 43

Imagem 3 – Proposta de Redação do ENEM 2014 ... 55

Imagem 4 – Texto motivador I da Proposta de Redação do ENEM 2014 ... 55

Imagem 5 – Texto motivador II da Proposta de Redação do ENEM 2014 ... 56

Imagem 6 – Texto motivador III da Proposta de Redação do ENEM 2014 ... 56

Imagem 7 – Proposta de Redação do ENEM 2015 ... 57

Imagem 8 – Texto motivador I da Proposta de Redação do ENEM 2015 ... 57

Imagem 9 – Textos motivadores II e III da Proposta de Redação do ENEM 2015 ... 58

Imagem 10 – Texto motivador IV da Proposta de Redação do ENEM 2015 ... 58

Imagem 11 – Textos motivadores I e II da Proposta de Redação do ENEM 2016 ... 59

Imagem 12 – Texto motivador III da Proposta de Redação do ENEM 2016 ... 60

Imagem 13 – Texto motivador IV da Proposta de Redação do ENEM 2016 ... 60

Imagem 14 – Proposta de Redação do ENEM 2016 ... 60

Imagem 15 – Texto motivador I da Proposta de Redação do ENEM 2017 ... 62

Imagem 16 – Textos motivadores II e III da Proposta de Redação do ENEM 2017 ... 62

Imagem 17 – Texto motivador IV da Proposta de Redação do ENEM 2017 ... 62

Imagem 18 – Proposta de Redação do ENEM 2017 ... 63

Imagem 19 – Direcionamentos para a escrita das redações ... 65

Imagem 20 – Orientações para a escrita das redações ... 66

Imagem 21 – A Relação Argumentativa ... 89

Quadro 1 – Excerto da R1-2014 ... 66

Quadro 2 – Composição estrutural das redações de 2014 ... 68

Quadro 3 – Excerto da R1-2015 ... 69

Quadro 4 – Composição estrutural das redações de 2015 ... 71

Quadro 5 – Excerto da R1-2016 ... 72

Quadro 6 – Composição estrutural das redações de 2016 ... 73

Quadro 7 – Excerto da R1-2017 ... 74

Quadro 8 – Composição estrutural das redações de 2017 ... 75

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Quadro 10 – Excertos das redações de 2015 ... 80

Quadro 11 – Excertos das redações de 2016 ... 82

Quadro 12 – Excertos das redações de 2017 ... 84

Quadro 13 – Trechos das propostas de intervenção das redações de 2014 ... 93

Quadro 14 – Trechos das propostas de intervenção das redações de 2015 ... 93

Quadro 15 – Trechos das propostas de intervenção das redações de 2016 ... 94

Quadro 16 – Trechos das propostas de intervenção das redações de 2017 ... 94

Quadro 17 – Marcas estruturais das redações nota mil de 2014 e 2015: inserção da voz alheia .. 100

Quadro 18 – Marcas estruturais das redações nota mil de 2016 e 2017: inserção da voz alheia .. 100

Quadro 19 – Vozes encontradas nas redações nota mil do ENEM 2014, 2015, 2016 e 2017 ... 102

Quadro 20 – Trechos das propostas de intervenção das redações nota mil do ENEM de 2014, 2015, 2016 e 2017 ... 104

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AD – Análise do Discurso EM – Ensino Médio

ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio

GETED – Grupo de Estudos do Texto e do discurso LDB – Lei de Diretrizes de Base

NGM - Nomenclatura Gramatical Brasileira SISU – Sistema de Seleção Unificado

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 17

2 A EDUCAÇÃO BRASILEIRA, O ENEM E SEUS DESDOBRAMENTOS ... 24

2.1 Breve contexto histórico da educação brasileira... 25

2.2 Perspectiva e possibilidades que cercam o Exame Nacional do Ensino Médio... ... 29

2.3 Discussão sobre os caminhos percorridos pelo sujeito até chegar à redação do ENEM ... 30

2.4 As competências da Redação do ENEM ... 31

3 REFLEXÕES TEÓRICAS: A ANÁLISE DO DISCURSO E A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE MASSIFICAÇÃO ... 34

3.1 Apresentação do modelo teórico fundamental para a execução da pesquisa: Análise do Discurso (AD) ... 34

3.2 Construção do conceito de massificação a partir dos estudos basilares que norteiam a pesquisa ... 38

3.2.1 Heterogeneidades Enunciativas ... 38

3.2.2 O Sujeito por trás da autoria ... 41

3.2.3 Organização do Texto Argumentativo ... 42

3.2.4 A massificação ... 45

4 CAMINHOS METODOLÓGICOS ... 49

4.1 Aspectos metodológicos componentes da pesquisa ... 49

4.2 Caminhos percorridos ... 51

5 ANÁLISE DOS DADOS: MASSIFICAÇÃO DA ESTRUTURA E DO CONTEÚDO ... 54

5.1 Da proposta à redação nota mil: um olhar analítico sobre a estrutura ... 54

5.1.1 Pano de fundo da escrita das redações: a proposta de redação ... 54

5.1.2 Tessitura das redações nota mil: uma análise estrutural ... 64

5.2 Estratégias argumentativas: análise de conteúdo e seus desdobramentos ... 76

5.2.1 A inserção das vozes alheias ... 76

5.2.2 A proposta de intervenção e a recorrência de uma estratégia argumentativa ... 92

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5.3 Reflexos da massificação da estrutura e do conteúdo... 99

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 106

REFERÊNCIAS ... 109

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INTRODUÇÃO

Acreditando, sempre, que o conhecimento só pode se enraizar e dar frutos quando semeado e cuidado, consolidamos uma etapa da formação acadêmica obtendo como fruto a finalização deste estudo. Não consideramos a conclusão deste trabalho o fim da reflexão, que deve ser perpetuada, deve ganhar novas perspectivas e visões e, acima de tudo, deve dar outros frutos, servindo, dessa forma, ao nosso modo de enxergar e compartilhar o conhecimento.

Esta dissertação é fruto de inquietações acerca de pontos da produção da redação do Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM, mais precisamente a partir de análises preliminares contidas em trabalhos anteriores sobre as redações nota mil, consideradas como modelo de texto ideal. Com o título de “redação nota mil”, esses textos ganham as salas de aula, as estampas de cartilhas de preparação para a prova e outros lugares que as atestam como escrita modelo para o êxito no exame. Essas inquietações também abarcam as possibilidades de escritas que, embora delimitadas pelas cinco competências, entre outros mecanismos, tornam-se eficientes para a proposta da redação do exame.

Observando a língua como uma produção social, entendemos seu mecanismo de funcionamento como um constante movimento de construção e reconstrução. Nesse sentido, Geraldi (1999, p. 14) afirma que “a miséria social e a miséria da língua confundem-se”, tornando ambos os objetos passíveis de carências muito semelhantes. Podemos compreender, então, que um dos problemas do processo de ensino-aprendizagem está atrelado ao fato de os objetivos da instituição escola ser, dessa forma, uma provável miséria, pois esquece que a educação é um problema social e não puramente pedagógico. Esse fato interfere diretamente nas possíveis medidas de mudanças.

Nesse contexto, nos anos 90, alguns trabalhos que trataram de redações de vestibulares se destacaram, como os trabalhos de Costa Val (1991) “Redação e textualidade”, e Pécora (1999) “Problemas de Redação”. Ambos os trabalhos colocam como foco principal o estudo analítico da escrita, mais precisamente da composição e da construção de redações. Esses trabalhos, levando em consideração as metodologias adotadas, bem como os resultados são tidos, atualmente, como referências para novos trabalhos que queiram tratar de escrita escolar e, mais precisamente, da escrita de redações.

O trabalho de Costa Val (1991) é voltado para o estudo da natureza do texto e dos fatores envolvidos em sua produção e recepção e comparou cem redações elaboradas por candidatos ao curso de Letras na UFMG em 1983. Essa comparação objetivou o estabelecimento de um diagnóstico para levantar questões sobre o ensino de redação nas escolas. Os resultados encontrados destacam, principalmente, a falta de informatividade dos textos, o que muito se

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assemelha ao que propomos para nossa análise, uma vez que as redações nota mil do ENEM muito se assemelham às analisadas pela autora, no que diz respeito, por exemplo, ao conteúdo. No que diz respeito ao trabalho de Pécora (1999), realizou-se, a partir da análise de 6000 redações, um diagnóstico dessas produções no que concerne aos problemas mais recorrentes nos textos. Esse trabalho resultou numa listagem de problemas que foram encontrados no corpus e organizados analiticamente, como, por exemplo, problemas na formulação das orações, na domínio das regras de recursos gráficos e da norma culta, bem como problemas de grafia e de transcrição da oralidade. Em suma, esses problemas foram atrelados, também, ao senso comum que constituem os textos analisados.

Essas pesquisas a que tivemos acesso no contexto de elaboração desta dissertação nos mostraram que, embora quase 30 (trinta) anos depois, ainda nos deparamos com os mesmos problemas contextuais, composicionais, de ausência de informatividade, presença exarcebada do senso comum e influência que esses diagnósticos exercem no Ensino de Língua Portuguesa.

Outras pesquisas tidas como referência para este estudo se pautaram num objeto que resgata a heterogeneidade enunciativa. Além disso, essas pesquisas investigaram, em redações, a exemplo de Borges (2005), “A Heterogeneidade Discursiva em redações escolares”, e de Busse (2006), “A Heterogeneidade Discursiva em redações produzidas por vestibulandos”. Ambos se sustentam em uma perspectiva da Análise do Discurso e selecionaram o corpus nas esferas escolares ou adjacências. O primeiro delimitou a escolha em torno de redações de vestibulares e o segundo de redações escolares. As escolhas dos autores nos impulsionaram para abordarmos outra vertente das redações dessa esfera, optando, então, pelas redações nota mil do ENEM.

Seguindo, contemplamos o trabalho de Soares (2014) “A Redação na Prova do ENEM: uma análise dialógica do discurso”, que analisa propostas de redação do ENEM, considerando a constituição histórica, estrutura composicional e estilo na relação com vestibulares que não aderiram ao ENEM como processo seletivo e com documentos oficiais. Esse estudo resultou na observação de que há, nesse contexto de produção, fatores que limitam a relação do sujeito com o texto; e o de Jesus (2015) “A autoria em redações nota mil no ENEM”, que analisa como os candidatos se constituem como autores de suas redações. Esse trabalho verificou que os sujeitos se constituem por meio da constante utilização de paráfrases dos textos motivadores.

Por fim, consideramos o trabalho de Lima e Piris (2017), “A argumentação no ENEM: análise de uma redação nota mil”, que visou à ampliação da compreensão acerca dos tipos de argumentos presentes nas redações do ENEM, cujo resultado apontou para a constatação de que os argumentos são autorizados por determinada formação discursiva, o que denuncia uma certa

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fragilidade sobre o processo de ensino e aprendizagem, e o trabalho de Targino (2018) “A argumentação em redações do ENEM-2015”, que objetivou a investigação das estratégias argumentativas nas redações do ENEM 2015 e cujos resultados indicaram que o candidato recorre a operadores argumentativos para que possam selecionar, relacionar e organizar fatos em defesa da opinião sobre o tema, além de revelarem, também, a atitude do autor perante o assunto contemplado.

Considerando os trabalhos apresentados, percebemos que alguns estudos ainda são preliminares frente aos objetos investigados. Compreendemos a dissertação de Soares (2014), considerada um estudo mais extenso, como sendo de extrema importância para o andamento de nossa pesquisa. Visto isso, sentimos a necessidade de contribuir para o estado da arte que compõe essas temáticas, especificando nosso objeto, as redações nota mil do ENEM, com outro olhar e trazendo elementos que construíram uma nova hipótese frente às já existentes.

Alguns desses trabalhos, como nossa pesquisa, também foram constituídos a partir das redações do ENEM. No que diz respeito à composição do exame, temos, quanto à sua estrutura, uma prova objetiva e uma redação. A redação de natureza argumentativa traz, recorrentemente, uma proposta de texto com temas sociais que tenham estado ou estejam, de alguma forma, sendo discutidos na sociedade. Isso garante, aos que se submeterão à prova, um caminho a ser percorrido na preparação e acaba possibilitando aos cursinhos o grande marco de “adivinhar” o tema que será proposto, garantido, no ano seguinte, mais estudantes.

Com base nisso e no novo olhar que os sujeitos passaram a debruçar sobre o ENEM, observamos uma mudança significativa em algumas camadas do ensino, principalmente nos anos finais do EM, que se volta ao ensino de redação para o gênero explicitado, bem como para temas mais sociais os quais são recorrentes no processo seletivo em questão. Esse novo olhar pode ser tido pelos sujeitos que participam da realização das provas, pelos candidatos (em especial os alunos que estão no terceiro ano do EM), pelos corretores, que a cada ano precisam se adaptar ainda mais aos moldes de correção dado o crescimento do exame e a grande demanda, e pelos professores de língua portuguesa, que passam a dar um enfoque maior à preparação dos alunos para a realização dessa prova.

Esses pontos, atrelados ao que foi exposto anteriormente, servem como norte e motivação para a análise proposta e elaborada nesta dissertação, que teve como objetivo analisar as redações nota mil do ENEM segundo a hipótese de massificação da estrutura e do conteúdo desses textos. As motivações estabelecem pontes com todo o histórico apresentado, que carrega um resumo de como se deu a educação brasileira no que concerne ao ensino de Língua

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Portuguesa. Além disso, o levantamento de pesquisas na área foram de grande motivação para que o trabalho fosse pensado.

Esta pesquisa é vinculada ao GETED – Grupo de Estudos do Texto e do Discurso, que vem abarcando pesquisas que desenvolvem reflexões bastante relevantes sobre o que se produz no Ensino Superior e em diversos níveis de escolaridade. O Grupo vem tratando as questões que envolvem leitura e escrita como necessárias e fundamentais e compreendendo essas questões como formas de aprendizado que produzem mudanças em diversas relações, a exemplo, principalmente, da relação do sujeito com o saber.

Partindo da perspectiva de pesquisas do GETED, destacamos os trabalhos de França (2018) e de Miranda (2019). Ambos os trabalhos, assim como este, problematizam a escrita, com a diferença de que focam na modalidade de escrita acadêmica. A pesquisa de França (2018) tem como objeto a relação dialógica entre o sujeito e o discurso outro que constrói a filiação teórica na escrita do pesquisador em formação, especificamente em teses de doutorado. Esse trabalho teve como resultados a confirmação da hipótese que sugeriu ser possível, pela materialidade da escrita, observar distintos arranjos familiares que são definidos a partir do diálogo que o pesquisador estabelece com a voz do outro em diferentes níveis de alteridade. Por outro lado, a pesquisa de Miranda (2019) tem como objeto arranjos linguísticos que engendram os discursos no processo de produção escrita do pesquisador em formação. Os resultados desse estudo também confirmam a hipótese sugerida, que definia ser possível observar diferentes arranjos linguísticos definidos a partir das formas de articulação do outro mobilizado pelo pesquisador em formação.

Em ambos os trabalhos, foi possível observar, entre outras questões, aspectos que focalizam a mobilização das escolhas dos autores, ponto esse que também objetivamos nesta pesquisa uma vez que as escolhas estruturais e conteudísticas dos candidatos que se submetem à escrita das redações do ENEM são primordiais para que possamos analisar se a hipótese por nós sugerida é verdadeira. Essas pesquisas, portanto, contribuíram muito para o nosso processo de construção, análise e escrita.

Para esta pesquisa, assumimos a hipótese de que há, na escrita das redações nota mil, uma massificação da estrutura e do conteúdo. Essa hipótese surgiu de algumas leituras e análises prévias a respeito das redações nota mil aqui analisadas, assim como das pesquisas e estudos já citados. Essas leituras nos levaram a perceber essas redações como sendo mais semelhantes do que indicam as próprias competências que regem o texto.

O corpus da pesquisa é constituído por 32 redações nota mil do Exame Nacional do Ensino Médio, distribuídas, igualmente, por quatro anos, 2014, 2015, 2016 e 2017. O recorte

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temporal foi feito com base na disponibilidade do veículo em que buscamos essas redações, que passaram a ser disponibilizadas em 2014. Essas redações foram obtidas por meio do site G1.

Para que a pesquisa fosse executada, partimos das seguintes questões:

I – Quais as marcas estruturais e conteudísticas encontradas nos textos e quais se apresentam com maior recorrência?

II – Como se dá a utilização e a recorrência, nos textos analisados, da inserção da voz alheia?

III – Como se dá, de forma comparativa, a funcionalidade das vozes inseridas na lógica argumentativa?

IV – Em quais aspectos as escolhas estruturais, conteudísticas e a inserção da voz alheia constituem o que consideramos como massificação?

Para nortear a pesquisa em questão, além de atender às questões apresentadas, nos orientamos pelos seguintes objetivos geral e específicos:

Objetivo geral: investigar de que forma as escolhas estruturais e conteudísticas dos alunos, bem como a utilização da voz do outro, influenciam na lógica argumentativa para o êxito das redações nota mil.

Objetivos específicos:

• identificar as marcas estruturais e conteudísticas encontradas nos textos e quais se apresentam com maior recorrência;

• caracterizar como se dá a utilização e a recorrência, nos textos analisados, da inserção da voz alheia;

• determinar, de forma comparativa, a funcionalidade dessas vozes inseridas na lógica argumentativa das redações;

• mostrar em quais aspectos as escolhas estruturais, conteudísticas e a inserção da voz alheia constituem o que consideramos como massificação.

A partir disso, mapeamos uma breve reflexão a respeito do ensino de língua portuguesa nos últimos anos do Ensino Médio, uma vez que o exame supracitado teve seu primeiro objetivo voltado para uma análise do EM anualmente. Essa reflexão tem o intuito de gerar questões provocativas para futuros trabalhos que venham a abordar os impactos sociais desse contexto de produção textual. Para tanto, apontamos, previamente, a percepção das escolhas dos

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candidatos para a composição das estratégias argumentativas tomando como base o resultado dessas redações, sempre atentando para a massificação dos argumentos, os quais podemos observar pois são modelos do que deve ser feito para a obtenção da nota máxima.

Essa reflexão pautada na análise da inserção da voz alheia também resultou numa amostra da origem da maioria das citações que são utilizadas pelos candidatos, provocando uma busca por discursos inseridos no ambiente escolar visto que, atualmente, a preparação para o ENEM se dá desde o início do Ensino Médio. Os alunos se preparam para a prova durante cerca de três anos, tempo considerável para reunirem, principalmente estando inseridos em ambientes nos quais circulam vários gêneros, vozes de outrem para constituírem suas redações bem como reafirmarem, consolidarem e modelarem suas próprias convicções.

Para que pudéssemos atender ao objetivo perseguido pela pesquisa, nos ancoramos nas perspectivas da Análise do Discurso. Essa perspectiva tem como objetivo o estudo do discurso para refletirmos sobre as questões que implicam aspectos contextuais e ideológicos, as escolhas dentro das possíveis possibilidades e as congruências, bem como do estudo do texto, para, especificamente, analisarmos esses textos, seus contextos de produção e seus elementos pré e pós textuais. Mais adiante, foi feita uma maior contextualização da perspectiva adotada.

Posteriormente à delimitação das linhas de pesquisa e de suas especificidades, compreendamos, também, o arcabouço teórico em que nos ancoramos. Para que pudéssemos desenvolver as análises a fim de responder as questões de pesquisa, recorremos às contribuições de Charaudeau (2009) acerca da organização de textos argumentativos e da lógica argumentativa; de Authier-Revuz (1990, 2004) sobre reflexões da heterogeneidade enunciativa mostrada; de Adorno (1985), para a discussão sobre massificação; e, também, de Pêcheux (1995), sobre a posição do sujeito, para caracterizar o lugar do discurso dos candidatos autores nas redações.

Quanto aos aspectos organizacionais, esta dissertação está dividida em seis seções. Na primeira, são abordados os aspectos introdutórios da pesquisa. Na segunda, tem-se um panorama de contextualização do ENEM, partindo de um breve histórico da educação brasileira tendo em vista as perspectivas do exame, uma discussão a respeito dos caminhos percorridos pelo sujeito até chegar à redação do ENEM e a delimitação da produção mediada pelas cinco competências. Ademais, na terceira seção, são expostas as bases teóricas fundamentais para a execução da pesquisa.

Na seção seguinte, são abordados os aspectos metodológicos propriamente ditos, partindo dos que compõem a pesquisa tanto nos moldes de análises quanto de organização dos dados, seguidos do detalhamento dos caminhos percorridos. Na quinta seção, são analisados os

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dados que identificam e descrevem a proposta de redação, a estrutura das redações e os dados que expõem as escolhas dos candidatos no que concerne às estratégias argumentativas e à proposta de intervenção. Na sexta seção, por fim, estão as considerações finais e os demais aspectos linguísticos imprescindíveis para o entendimento da pesquisa acompanhados de uma breve reflexão provocativa para trabalhos futuros que se proponham a ampliar essa temática.

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2 A EDUCAÇÃO BRASILEIRA, O ENEM E SEUS DESDOBRAMENTOS

Nesta seção, abordamos aspectos que compõem um breve histórico da educação brasileira, construindo o processo de educação até a introdução do ENEM como um dos processos seletivos mais importantes do país. Nesse sentido, trouxemos aspectos macros que envolvem o histórico da educação brasileira e aspectos mais específicos, como os caminhos que o exame e os candidatos percorreram e os aspectos que são cobrados na redação. Para corroborar isso, refletimos com base em Maldidier (2003, p. 15-16), que escreve algumas considerações com base nos estudos de Michel Pêcheux:

O discurso me parece, em Michel Pêcheux, um verdadeiro nó. Não é jamais um objeto primeiro ou empírico. É o lugar teórico em que se intricam, literalmente, todas as suas grandes questões sobre a língua, a história, o sujeito. A originalidade da aventura teórica do discurso prende-se ao fato que ela se desenvolve no duplo plano do pensamento teórico e do dispositivo da análise de discurso, que é seu instrumento. O discurso, trazendo as considerações postas, se adequa a algumas questões que estão inteiramente interligadas, como bem disse o autor, em formas de nó. Esse emaranhado sem saídas visíveis é o que forma o lugar teórico em que se encontram várias questões linguísticas, assim como questões que envolvem os sujeitos participantes. É nesse lugar que estão locados vários pontos da análise, o que nos sugere que não são pontas soltas e descontextualizadas, mas pertencentes a cenários que envolvem questões nem sempre recuperadas de forma fácil. Essas questões dizem respeito ao que ancora o objeto, os caminhos percorridos de análise e os aspectos levantados nas discussões.

Quando estruturamos uma análise que se pauta na premissa de que o discurso jamais é um objeto empírico ou que existe unicamente e que é alheio aos outros componentes que lhe dizem respeito, optamos por compreender o que significa esse “lugar teórico” em que ocorrem as relações que compõem o discurso. Com isso, constatamos um espaço interativo e não preestabelecido e, para que esse discurso seja analisado, é importante que sua totalidade seja posta em evidência uma vez em que todos os elementos possuem sua relevância.

Isso posto, e já consoantes com a necessidade de ver a totalidade e não unicamente o fenômeno em separado, compreendemos que perceber os elementos anteriores e formadores do contexto de produção da redação do ENEM são importantes. Para tanto, refletir o contexto que ancora as perspectivas do ENEM e suas possibilidades fundamentam as análises que foram feitas nas seções seguintes.

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2.1 Breve contexto histórico da educação brasileira

O ensino de língua portuguesa, ao longo da história, passou por grandes transformações. Inicialmente, com a Companhia de Jesus, a finalidade de catequização era quem determinava os caminhos a serem seguidos; essa contribuição jesuítica demorou por volta de três séculos. Seguindo, tivemos a vinda de tradicionais famílias de imigrantes portugueses que, com os jesuítas expulsos, tornaram obrigatório o ensino de português no Brasil, escolha tomada como solução para apaziguar a disputa que vinha ocorrendo entre a língua geral (uma mistura do português com a língua indígena) e a língua portuguesa.

Adiante, o português não só se tornou obrigatório nas escolas como também se tornou uma língua padrão, além de utilizada no comércio. O que se sabe é que, no geral, os problemas que a educação e, especificamente, a língua portuguesa enfrentaram não são de hoje. A educação pós jesuítica, que se iniciou no século XVIII, era restrita a uma pequena parcela da população até que, com a chegada de D. João, em 1808, fossem criados os centros de transmissão desse saber. Paralelo a isso, a literatura se desenvolvia plenamente.

Quando olhamos para os estudos linguísticos no Brasil durante esse período, tínhamos estudos, ainda, unicamente empíricos, sem um método, e as gramáticas continuavam sendo tratadas de qualquer forma por amadores. Por volta do século XIX, com a independência do país, os ensinos de Gramática, Retórica e Poética cederam lugar ao ensino de Língua Portuguesa. Esse ensino era baseado na literatura que prestigiava grandes portugueses e, com isso, criava um contexto de escrita que “imitava” a escrita dessas obras; a partir daí, surgiu a preocupação que norteou a reforma do ensino de língua que culminou, por exemplo, nas primeiras gramáticas escritas por brasileiros.

O ensino de língua materna, no século XIX, era baseado por uma relação tradicional entre teoria e análise e a linguagem era considerada expressão do pensamento. Foi só no início do século XX que chegamos, com base nas novas teorias linguísticas, aos primeiros sinais de mais mudanças, ainda que, nesse período, a concepção de língua fosse pautada em um sistema único que não aceitava variedades. Ensinar o português se baseava em transmitir e fixar as regras prescritas pela gramática normativa, garantindo a continuidade desse conhecimento e, com isso, os objetivos das classes dominantes eram priorizados.

Um pouco mais adiante, com o surgimento de novos teóricos e novas discussões, à escola ainda cabia o ensino da gramática normativa, mas, no ensino universitário de língua materna, já havia espaço para outros debates, como o da gramática histórica. A estilística também começava a ganhar espaço e a linguística também ganhava forma e novos nomes, assim

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como novas vertentes e perspectivas, mas, nos ensinos primários e secundários, a questão do ensino ainda era problemática. Até que, em 1959, com o intuito de acabar com as diversas formas de nomenclaturas abordadas ao bem querer dos professores, o governo federal decidiu unificar o sistema a partir da portaria de Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB).

A solução norteada pela NGB não foi satisfatória pois só dizia respeito às nomenclaturas e não ao ensino em sua totalidade. Foi, então, criada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que determina que “a educação é direito de todos e será dada no lar e na escola” (Art. 2). Essa lei também passa a se comprometer com a qualidade do ensino quando atenta para as especificidades, problemas e dificuldades de cada região com um currículo mais flexível.

Na década de 60, com o novo modelo econômico, o povo conquistou o direito à educação sistemática. Mas, essa mudança não foi apenas educacional. Com a ditadura militar e a busca pelo desenvolvimento do capitalismo, escolas foram fechadas, iniciou-se uma perseguição a professores e alunos acusados de comunismo, acabou-se com a liberdade de imprensa, entre outros fatores que caracterizam não apenas uma mudança educacional, mas sociopolítica. Com isso, o objetivo da escola passou a ser a de formar indivíduos que auxiliassem o governo na expansão industrial.

Com essas mudanças ao longo da história, o alunado foi mudando o caráter elitista das escolas públicas e esta começou a dar espaço a uma parcela da população de menor poder aquisitivo, enquanto a elite passou a procurar ainda mais as escolas particulares. Os professores começaram a sentir essa diferença e também foram mudando. Esses profissionais que antes também eram da elite também passaram por alterações, como a inserção nas camadas mais populares, já que os prestígios do magistério foram perdidos com a nova política salarial.

A consequência desse cenário resultou na mudança da qualidade do ensino, que se tornou menos refinada. Nesse contexto, as concepções de linguística europeia e norte-americana começam a chegar no Brasil, mas foram administradas por professores que não tinham formação em linguística, causando várias distorções. Kato (1988, p. 52) reflete um pouco sobre isso:

Em virtude da falta de formação específica da maioria dos professores de Linguística da década de 1963-1973, muitas aberrações podem ter sido cometidas em nome dela. Assim, a ciência passa a ser questionada por culpa de uma legislação precipitada e dessa formação precária que levou muitos professores treinados nessa época, e também autores de livros didáticos, a proporem e utilizarem propostas pedagógicas em cima de conceitos e princípios mal compreendidos.

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Numa época em que o governo militar decidiu fazer face ao que o contexto solicitava, que era a instalação de faculdades particulares sem se preocupar com a formação dos docentes, enquanto a rede de ensino público se ocupava da demanda dos grandes números de analfabetos que chegavam, a Lei de Diretrizes e Bases 5692/71 estabeleceu a língua nacional como instrumento de comunicação e expressão da cultura brasileira. Com essa nova perspectiva, os professores se viam na dualidade contraditória de “baixar o nível” do ensino ou aderir à reprovação em massa.

Consonante a isso,

Encarar a língua como instrumento de comunicação é uma concepção mecanicista, adequada aos fins pragmáticos do ensino. Trata-se de objetivo, no mínimo, abrangente e parcamente delimitado em termos curriculares. Não mais a língua é encarada como sistema único, o que a adequava a um ensino elitista. Para atender às camadas populares que, agora, assolam as escolas, urge um ensino utilitário com a língua voltada para a oralidade. Cada vez mais, o ensino torna-se menos normativo e, portanto, menos rigoroso, em relação aos padrões cultos da língua. Ensinar gramática passa a ser coisa ultrapassada. Em decorrência, esse ensino vem a configurar-se pela Teoria da Comunicação: o aluno deve ser capaz de “funcionar” como emissor e receptor de mensagens pela utilização de códigos verbais e não-verbais. Em outras palavras: de forma pragmática, a língua não é mais encarada como sistema único, o que propiciava um ensino elitista; agora, propunha-se o desenvolvimento das habilidades de expressão e compreensão de mensagens, um ensino compatível, portanto, com o uso da língua (CLARE, 2003, p. 14).

Nesse sentido, surgiram algumas discussões, como a de continuar ou não com o ensino por meio de regras gramaticais, e os professores que seguiam por esse caminho passaram a ser vistos com outros – negativos – olhos. Esse contexto deixou a visão língua como um sistema em segundo plano ou para os mais desprestigiados; no lugar disso, ensinavam-se os elementos de comunicação e as funções de linguagem. Também surgiram livros didáticos que já vinham com respostas prontas e objetivas, sem que fossem necessárias grandes reflexões. Segundo Geraldi (1999, p. 93), ocorria uma grande “parafernália didática”. Os autores da maioria desses manuais didáticos estavam voltados para exercícios e o trabalho de ensino baseado na oralidade, na comunicação e nas questões práticas desse mecanismo. Com isso, havia um claro esquecimento de que o objetivo do professor de português era também ensinar a língua escrita. Foi só por volta do final dos anos 70 que começaram a inserir redações em provas de exames e vestibulares, buscando, nisso, a solução para o estado do ensino naquela época, o que acarretava na interpretação errônea de que a melhoria da expressão dos alunos se daria a partir do domínio das técnicas de escritas dessas redações, reduzindo todo um projeto de ensino.

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Nessas redações, cobrava-se o uso da língua padrão e, com isso, “o aluno é levado a reproduzir estereótipos ou generalidades sobre os mais variados assuntos, compondo, então, a redação (e não a produção de um texto) com base na imagem que ele assimilou do gosto e da visão de língua do professor” (UCHÔA, 1993, 65).

Durante a segunda metade dos anos 80, algumas mudanças puderam ser vistas quando os professores, mestres e doutores, começaram a publicar suas pesquisas questionando o ensino por essa perspectiva e, a partir de 1985, foi constatado, com base nos resultados dos vestibulares, que os alunos não respondem bem ao processo seletivo, alegando que eles redigiam textos mal e, quase sempre, pareciam não entender o que liam. Nesse contexto, surgiram as modalidades de disciplinas, cursinhos e afins voltados única e exclusivamente para a produção de redações.

Dando um salto, chegamos à década de 90, quando aconteceu o que pode ser considerado uma evolução no que concerne às produções textuais nos vestibulares. As redações começaram a ganhar outros focos, como a variação dos textos cobrados e as diferentes linguagens, e o aluno começou a ser direcionado para a escrita do seu próprio texto.

Geraldi (1999) traz à tona, de forma recorrente, que a utilização do texto em sala de aula, frente ao que é feito, deve ser sugerida a partir de um contexto existente e não como objeto meramente elaborado para correção do professor. Quando o fim é unicamente esse, o aluno/sujeito passa a escrever com base na nota que espera receber e não na funcionalidade, no papel comunicativo real de seu texto. Se levarmos isso até os anos finais do Ensino Médio, o foco será as produções textuais de exames de seleção deixando de lado, talvez, alguns processos de subjetividade e criatividade que poderiam ser melhor desenvolvidos.

Esse padrão de ensino é “resumido” em processos seletivos que cobram textos com finalidades fictícias e a diferença, nesses casos, é que o aluno não conhece o “avaliador”, mas, por outro lado, conhece as características e “receitas” dos possíveis gêneros cobrados. Essas avaliações de textos que não se inserem em contexto real algum levam a avaliação para um campo puramente da construção da linguagem baseada em correções separadas que olham para pontos independentes do texto e não para sua totalidade como uma unidade.

Ainda com base nas palavras de Geraldi (1999), é necessário que o sujeito seja constituído como quem escreve alguma coisa para alguém e, para isso, no ensino deve haver subsídios para que os sujeitos tenham o que dizer, tenham motivação para dizer e tenham em mente para quem irão dizer, destacando, por esse viés, um ensino construtivo. Quando refletimos as contribuições de Geraldi para o ensino, podemos fazer uma ponte para essas avaliações sistêmicas e, com isso, podemos enxergar que há um desencontro entre as

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perspectivas e, ainda que a avaliação sistêmica esteja em outros moldes e tenha fins específicos, ela, certamente, reflete o ensino.

Tomemos como exemplo dessa conjuntura de ensino o ENEM, que está em vigor no Brasil desde 1998, surgiu com o intuito de avaliar o desempenho dos estudantes no final do Ensino Médio e que, a partir de 2009, passou a ser utilizado como instrumento de seleção para as universidades públicas brasileiras, bem como critério para o cálculo de bolsas de gratuidade em universidades particulares. Hoje, o ENEM é o instrumento de um dos maiores processos seletivos no Brasil, o Sistema de Seleção Unificada (SISU), e seu crescimento ano após ano é nítido uma vez que não se volta apenas para os alunos concluintes do EM, mas, também, para todos egressos do EM que desejem ingressar no Ensino superior.

2.2 Perspectivas e possibilidades que cercam o Exame Nacional do Ensino Médio Antes de tratarmos diretamente do ENEM, é interessante que saibamos que as políticas de acesso ao ensino superior começaram bem antes em alguns outros países, a exemplo da China, que foi a primeira nação a pensar e criar um Exame Imperial que se responsabilizou pela inserção dos cidadãos no serviço público, no intuito de compor a elite intelectual do governo chinês (SILVEIRA; BARBOSA; SILVA, 2015).

O Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) surgiu em 1998, na gestão do ministro da Educação Paulo Renato Souza, no governo Fernando Henrique Cardoso, com o intuito de avaliar o desempenho dos estudantes. Durante mais de dez anos, o exame foi usado para essa função e, só a partir de 2009, passou a ser utilizado como porta de entrada para as Universidades públicas brasileiras por meio do Sistema de Seleção Unificada (SISU), bem como critério para o cálculo de bolsas de gratuidade em universidades particulares. Hoje, o ENEM é um dos maiores processos seletivos do Brasil e seu crescimento, ano após ano, é nítido uma vez que não se volta apenas para os alunos do Ensino Médio, mas, também, para todos que desejam ingressar no Ensino Superior.

Na visão de Cavalcante (2006, p. 309) sobre a temática de implantação do ENEM, tem-se que

O avanço no processo de globalização da modernização científica e tecnológica tem provocado, nos últimos anos, mudanças significativas em todos os campos da atividade humana. Com o intuito de acompanhar esse processo, o Ministério da Educação (MEC) propôs uma reforma para o ensino médio na década de 1990, com destaque para a implantação do sistema de avaliação em larga escala, justificada pela necessidade de se estabelecer um padrão mínimo de qualidade para a educação brasileira.

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Durante o tempo em que o ENEM tinha a função de dimensionar o desempenho dos estudantes, as seleções, os concursos e o ingresso ao Ensino Superior eram elaborados regionalmente e isso favorecia a pluralidade dos métodos de cobrança nas mais variadas universidades. Portanto, unificar a prova e, aos poucos, torná-la o instrumento primordial do SISU foi facilitador para que os estudantes menos favorecidos passassem a ter oportunidades para se deslocarem e estudarem em regiões mais desenvolvidas.

Embora tenha se tornado um agente facilitador dentro da perspectiva abordada, o Exame Nacional do Ensino Médio precisa, para que seja, de fato, gerenciador de um fluxo maior de estudantes, ser bem elaborado. O sucesso da prova depende de uma boa formulação que respeite os graus de conteúdo, de habilidades e competências que são desenvolvidos no Ensino Médio, e, também, que seja democrática, estabelecendo um equilíbrio para que todo o país possa realizá-la.

Essa mudança de perspectiva que alterou os interesses da realização das provas é marco na educação visto que a forma de se portar durante a prova, hoje, faz com que os candidatos se preparem como se fosse uma verdadeira corrida e não como antes, na realidade da avaliação do ensino como único fim. Essa “corrida” pode ser vista como a necessidade de somar conteúdos, de decorar as vozes alheias e a estrutura da redação. Essa mudança, acreditamos, é refletida nos anos finais do Ensino Médio uma vez que o ensino de língua portuguesa precisa se adequar à demanda, nas aulas de produção de texto, da redação do ENEM.

Quanto à sua estrutura, o ENEM é constituído por uma prova objetiva e por uma redação. A redação traz, recorrentemente, uma proposta de texto com temas sociais que tenham estado ou estejam, de alguma forma, sendo discutidos na sociedade, o que garante aos candidatos um caminho a ser percorrido desde a preparação. Isso é um dos fatores que possibilita aos cursinhos o grande marco de “adivinhar” o tema que será proposto, garantindo, no ano seguinte, mais estudantes.

2.3 Discussão sobre os caminhos percorridos pelo sujeito até chegar à redação do ENEM Entre os aspectos mais relevantes discutidos em nossa pesquisa, temos, de antemão, os candidatos ao processo de seleção norteador de nosso estudo. Como já foi apresentado, o ENEM teve uma ruptura em sua finalidade inicial, passando a ser porta de entrada das mais diversas oportunidades de ingressar no Ensino Superior. Essa informação estreita os laços que nos permitem supor que os candidatos, ou, pelo menos, sua maioria, passaram a optar por realizar o exame com o intuito de conseguir ingressar no Ensino Superior.

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Nessa perspectiva, observamos que esses candidatos são compostos, em grande maioria, por concluintes do Ensino Médio, mas alunos das mais variadas modalidades de ensino do país e dos mais variados níveis também disputam as vagas disponíveis. Quando pensamos nesse perfil de candidato, logo nos remetemos às diretrizes dos ensinos nas aulas de português nos anos finais do ensino médio voltadas para a produção textual do ENEM uma vez que um maior número de aprovados também gera prestígio, visibilidade e interesse de novos alunos para as escolas que saírem na frente nessa “corrida”.

Por isso, entender que há uma via de mão dupla nessa troca de conhecimento faz com que entendamos a necessidade das escolas que os seus alunos se saiam bem nas provas, consigam boas notas e se destaquem, pois, com isso, as próprias escolas irão se destacar. A consequência disso, supomos, são os recorrentes manuais disponíveis de diversas formas na internet, nos cursinhos preparatórios e nas aulas de português do Ensino Básico. É nesse mecanismo de “receita” de aprovação que os alunos se baseiam e, claro, não podemos responsabilizá-los já que o sistema vem funcionando e trazendo resultados satisfatórios.

Quando falamos em funcionamento, não estamos alegando que seja um funcionamento positivo ou negativo. O intuito desta reflexão inicial é, justamente, pôr em questão quais são os possíveis contextos envolvidos, quais as perspectivas que podem ser observadas e por meio de quais ópticas se corroboram o desenvolvimento da escrita, do processo criativo dos candidatos. Mas, devemos recordar que, no que concerne aos encaminhamentos dados, as escolhas não são tão vastas assim quando as opções giram em torno de inovação.

2.4 As competências da Redação do ENEM

A redação do ENEM, como já relatamos anteriormente, é moldada com base em cinco competências que delimitam as formas de avaliação dos textos, ou seja, os avaliadores fazem a correção das redações com base nos cinco critérios disponibilizados. Os critérios são avaliados, no texto, de forma separada. As competências são, portanto, o ponto de partida nos quais os candidatos deveriam se basear/se baseiam, bem como o ponto de sustentação durante todo o texto para que, ao longo da produção, sejam feitas alterações e correções mediante uma expectativa de boa avaliação.

Para fomentar a reflexão a respeito do que essas competências solicitam e de como estão dispostas nas cartilhas e manuais, vamos, de antemão, observar quais são essas competências:

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Imagem 1 – Competências da redação do ENEM

Fonte: Brasil (2017, p. 8).

Partindo da primeira competência, compreendemos que demonstrar o domínio da modalidade escrita e formal da língua portuguesa é uma expectativa gerada por todos os processos de seleção que incluam produção textual. A língua é avaliada por meio da utilização adequada da norma solicitada; uma fuga muito drástica dessa utilização garante uma baixa nota nesse aspecto. Essa competência não é “novidade” para os processos seletivos que compreendem uma produção textual; portanto, sua correção não é singular para o ENEM.

A segunda competência é responsável pelo direcionamento do candidato ao tema textualmente proposto. Nessa perspectiva, são elencados outros dois importantes pontos: a inserção de conhecimentos das mais variadas áreas do conhecimento e o desenvolvimento de um texto no formato dissertativo-argumentativo em prosa. Fugir dos aspectos temáticos (tangenciar o tema) e/ou escrever um texto em verso ou fora do formato dissertativo-argumentativo podem levar o candidato a zerar essa competência, pois é nela em que o candidato precisará demonstrar seu domínio do texto a partir do tema proposto uma vez que não poderá haver tangenciamento do tema.

A terceira competência é responsável pelo “andamento” do texto, uma vez que direciona o candidato para as escolhas textuais que permeiam o ponto de vista, objetivando, propriamente, a argumentação. Nesse sentido, determina que os candidatos devem procurar fatos, opiniões e afins para que façam uma sustentação consistente do ponto de vista que defendem diante do tema proposto. Essas escolhas devem permear outras áreas do conhecimento, mas não de forma

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aleatória e sim como uma base de sustentação que demonstre a capacidade do candidato de relacionar áreas, fatos, opiniões e afins.

A quarta competência relaciona os conhecimentos do candidato com um texto dissertativo-argumentativo, solicitando que sejam explicitados os conhecimentos a respeito desse modelo de texto por meio dos mecanismos linguísticos que o compreende. Nessa competência, mecanismos como os coesivos e argumentativos são primordiais uma vez que são componentes imprescindíveis à composição de um texto dissertativo-argumentativo.

Por fim, a quinta competência diz respeito à elaboração de uma proposta de intervenção para o tema proposto: essa proposta deve sintetizar a tese, os argumentos elencados e, consoante a isso, desenvolver uma espécie de solução para a problemática discutida. A única ressalva para essa proposta é a de que se deve respeitar os Direitos Humanos; no mais, espera-se que o candidato elabore uma forma de “intervenção” para que o problema seja amenizado, sanado ou refletido.

São essas as cinco competências que norteiam e direcionam os alunos para caminhos de correções semelhantes. O que já deixamos posto desde esta descrição é que não compreendemos as cinco competências como fatores limitantes uma vez que elas são, dentro de uma perspectiva mais abrangente, responsáveis por garantir correções equitativas e não textos composicional e conteudisticamente muito semelhantes, a ponto de dificultar, no processo de leitura, o reconhecimento de suas diferenças.

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3 REFLEXÕES TEÓRICAS: A ANÁLISE DO DISCURSO E A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE MASSIFICAÇÃO

Para a compreensão da ancoragem teórica de nosso estudo, organizamos, nesta seção, as teorias bases, bem como suas relações e pertinências para abordagem e definição dos resultados encontrados em nossa pesquisa. Dessa forma, iniciamos refletindo sobre os pressupostos fundamentais da Análise do Discurso e seguimos com a construção do conceito de massificação a partir dos estudos basilares que norteiam a pesquisa, quais sejam: a heterogeneidade enunciativa, o sujeito por trás da autoria, a organização do texto argumentativo, a lógica argumentativa e uma reflexão sobre a massificação.

3.1 Pressupostos fundamentais da Análise do Discurso

Para compor a filiação epistemológica em que esta pesquisa se pauta, trazemos à luz a perspectiva teórica francesa da Análise do Discurso. Com base nos postulados de Maingueneau (1997), a escola francesa de análise do discurso está filiada a uma determinada tradição intelectual europeia que tem como hábito unir uma certa reflexão do texto a uma reflexão sobre história. Por volta de 1960, essa corrente iniciou uma reflexão estruturalista a respeito da escritura; essa articulação se deu entre a linguística, o marxismo e a psicanálise.

Compreendemos que a Análise do Discurso surgiu como base interdisciplinar já que não era uma preocupação só dos linguistas, mas de historiadores e de alguns psicólogos. Sob a expectativa de articular o linguístico e o social, a Análise do Discurso alarga seus objetivos para outras áreas do conhecimento e, com isso, inicia-se uma proliferação dos usos da expressão “análise do discurso”.

As escolhas dentro dessa perspectiva do conhecimento, devem, portanto, abarcar algumas dimensões que são apontadas por Maingueneau (1997) que dizem respeito ao quadro das instituições em que o discurso é produzido; aos embates históricos, sociais, além de outros que se cristalizam no discurso; e ao espaço próprio que cada discurso configura para si mesmo no interior de um interdiscurso.

Se partirmos dos pontos em que as formas verbais e não verbais da linguagem estão por toda a parte, que por todos os lugares as pessoas estão fazendo uso dela, se comunicando, dialogando, entre outras coisas, chegamos à máxima de que é pela interação linguística de homens que falam que se interessa a Análise do Discurso (ORLANDI, 2003, p. 15). Entretanto, para que possamos chegar ao que se pesquisa hoje e quais as perspectivas atuais da AD,

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precisamos nos voltar à história e refazer o percurso que compõe as três fases da Análise do Discurso que, desde o seu começo, no século XXI, até os dias atuais, sofreu grandes mudanças. A primeira fase se destaca pelos estudos analíticos mais basilares e mais estáveis e, dentro dessa perspectiva, as variações de sentido, por exemplo, eram bem menores. A partir de Mussalim e Bentes (2004), compreendemos que os discursos eram produzidos com base em contextos de produções mais homogêneos e estáveis. Com isso, discursos que não estivessem nesses aspectos limítrofes de homogeneidade não eram abarcados pela primeira fase da AD. Isto posto, chegamos à construção de conceito de máquina discursiva. Pêcheux (1995) considerava que os processos discursivos eram gerados por máquinas discursivas, ou seja, por condições estáveis de produção.

Na segunda fase, as máquinas discursivas dão lugar à formação discursiva que é definida como “um conjunto de regras anônimas, históricas, sempre determinadas no tempo e no espaço que definiram em uma época dada, e para uma área social, econômica, geográfica ou linguística dada, as condições de exercício da função enunciativa” (FOUCAULT, 1997, p. 43). Ou seja, as formações discursivas limitam ou determinam o lugar social que o sujeito ocupa e o que pode ou não ser dito nele. Com isso, foram ampliadas as possibilidades de análises que envolviam os discursos e a estabilidade que outrora era considerada foi perdida.

Na terceira fase da AD, o conceito de interdiscursividade é implantado, ocupando, definitivamente, o lugar das máquinas discursivas, conceito que foi deixado para trás. Essa interdiscursividade, somada à desconsideração que fazia alusão à independência do discurso, resultou na reflexão que determina a simultaneidade pelas quais atravessam as formações discursivas. A interdiscursividade se torna uma das principais teses da AD e, no que concerne às pesquisas atuais, Pêcheux (1995) reflete que essas tornaram seu objeto o trabalho da heterogeneidade discursiva a partir do jogo das contradições sócio-históricas. Nessa fase, o discurso não é constituído de forma independente, mas em relação com o(s) outro(s).

Com base nessa descrição da história da AD, enveredamos nossa reflexão para o que constitui a perspectiva teórica francesa, chamada por Maingueneau (1997) de “escola francesa de análise do discurso”. A AD francesa se insere num quadro que passa a articular o social e o linguístico, ampliando, dessa forma, esse campo para outras áreas de conhecimento. É a partir disso que se inicia a delimitação de seus próprios campos para se chegar em sua própria especificidade (BRANDÃO, 1991). Entretanto, para que seja constituída essa especificidade, com base nos postulados de Maingueneau (1997), Brandão (1991, p. 17) apresenta algumas dimensões, quais sejam

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• o quadro das instituições em que o discurso e produzido, as quais delimitam fortemente a enunciação;

• os embates históricos, sociais etc. que se cristalizam no discurso; • o espaço próprio que cada discurso configura para si mesmo no interior de um interdiscurso.

Assim, essas dimensões determinam que os estudos que propiciam resultados referentes à linguagem não devem ser feitos única e exclusivamente em relação ao seu sistema interno uma vez que devem atentar para os modos de constituição das formações ideológicas (BRANDÃO, 1991). Portanto, a constituição do objeto não é puramente linguística no concernente às análises, mas é, também, determinada por contextos, modos de produção, épocas, atravessamentos ideológicos, entre outros, e tudo isso precisa ser levado em consideração nos estudos.

o quadro das instituições em que o discurso e produzido, as quais delimitam fortemente a enunciação ideológicos de Estado na conceituação do termo "formação ideológica". E será da Arqueologia do saber que Pêcheux extraíra a expressão "formação discursiva", da qual a AD se apropriara, submetendo-a a um trabalho específico (BRANDÃO, 1991, p. 18).

Ancorando-se no exposto, compreendemos os conceitos nucleares como partes fundamentais de nossa pesquisa. Para que entendamos a relação feita, partimos da realização desses conceitos, a iniciar pelo conceito de ideologia contemplado da seguinte forma:

Cada grupo dispõe da ideologia que convém ao papel que ele deve preencher na sociedade de classe: papel de explorado (a consciência ―profissional‖, ―moral‖, ―cívica‖, ―nacional‖ e apolítica altamente ―desenvolvida‖); papel de agente da exploração (saber comandar e dirigir-se aos operários: as ―relações humanas‖), de agentes de repressão (saber comandar, fazer-se obedecer ―sem discussão‖, ou saber manipular a demagogia da retórica dos dirigentes políticos), ou de profissionais da ideologia (saber tratar as consciências com o respeito, ou seja, o desprezo, a chantagem, a demagogia que convêm, com as ênfases na moral, na virtude, na ―transcendência‖, na nação, no papel da França no mundo etc.). (ALTHUSSER, 1983, p. 79-80).

Essa perspectiva defendida por Althusser é pautada na reflexão dele sobre os Aparelhos Ideológicos de Estado (AIE). Segundo ele, para que as classes dominantes continuem no poder, elas precisam gerar “mecanismos de perpetuação ou de reprodução das condições materiais, ideológicas e políticas de exploração” (ALTHUSSER, 1970 apud BRANDÃO, 1991, p. 23). Para essa perspectiva, o Estado possui aparelhos repressores (ARE), como o governo, a administração, o Exército, a polícia, os tribunais, as prisões, etc., e aparelhos ideológicos (AIE), como a religião, a escola, a família, o direito, a política, o sindicato, a cultura e a informação.

Referências

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