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3 REFLEXÕES TEÓRICAS: A ANÁLISE DO DISCURSO E A CONSTRUÇÃO DO

4.1 Aspectos metodológicos componentes da pesquisa

Esta pesquisa é pautada no pressuposto fundamental da Análise do Discurso. Para desenvolvê-la, o corpus selecionado seguiu os parâmetros solicitados por essa vertente. Nesse contexto de pesquisa, a metodologia não vem pronta ou está acabada e determinada antes da análise dos dados, mas é estabelecida concomitantemente.

Nesse sentido, a teoria e a metodologia andam juntas em razão do que o objeto vai solicitando. Dessa forma, não se determina essas condições a priori. Assim, os estudos nessa linha de pesquisa possuem um caráter qualitativo e caracterizam-se a partir de duas grandes categorias muito presentes, quais sejam o estudo do objeto em seu contexto original e o olhar para o sujeito do discurso. Mariani (1998, p. 108) reflete, complementando nossa discussão, que “os sentidos das palavras podem mudar conforme a situação em que são usadas e conforme o lugar social ocupado pelo sujeito que fala”.

Com base nisso, selecionamos 32 (trinta e duas) redações divididas igualmente, em número, nos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017. Essas redações são espelhos enviados por candidatos que tiraram a pontuação máxima, nota mil, disponibilizados pelo G1 – portal de notícias brasileiro mantido pelo Grupo Globo e sob orientação da Central Globo de Jornalismo. O G1, desde 2014, disponibiliza, por ano, o espelho de 10 redações nota mil dos mais variados estados brasileiros. Esses espelhos são cedidos pelos alunos exclusivamente para o portal. Essa escolha do corpus contribui para termos uma noção das escolhas que constroem a forma estrutural do texto, além de algumas questões mais pontuais sobre a forma como os candidatos inserem a voz do outro, de forma mostrada, da mesma forma que complementa a reflexão a respeito do ensino de língua portuguesa nos anos finais do Ensino Médio com base nos discursos a que esses alunos vêm sendo submetidos.

A partir dessa reflexão, observamos, nas redações selecionadas, a forma como estas estão estruturadas, apontando para a heterogeneidade enunciativa mostrada no que diz respeito ao discurso direto e indireto e à modalização em discurso segundo como um dos componentes presentes na lógica argumentativa das redações, uma vez que a proposta de escrita solicitada é

caracterizada como sendo materializada por um texto dissertativo-argumentativo. Após a análise textual, e comparando as redações, tecemos as reflexões citadas anteriormente.

Ademais, é importante esclarecer, quanto ao tipo de pesquisa realizada, que esta considera, no que diz respeito à análise dos dados, aspectos quantitativos e qualitativos. Na perspectiva quantitativa, nos empenhamos na quantificação propriamente dita de alguns elementos dos dados para, principalmente, critério de comparação. No que tange aos aspectos qualitativos específicos, os utilizamos para uma maior profundidade dos dados analisados. Esses aspectos levam em conta a verificação das motivações para tais ocorrências baseadas em aspectos linguísticos e extralinguísticos (GERHARDT; SILVEIRA, 2009).

Para justificar a escolha por um modo quanti-qualitativo de investigação, recorremos a um paradigma que visa, de antemão, às manifestações singulares. Esse paradigma é pautado nos detalhes e busca o que não é pressuposto ou levantado em hipóteses nos dados, mas o que o corpus, em sua singularidade, pode, ao longo da investigação, proporcionar à pesquisa, visto que esse modo, proposto por Ginzburg (1986), parece mais produtivo para responder às questões e aos objetivos desta pesquisa.

A investigação pautada nesse paradigma se ancora em procedimentos abdutivos de investigação, bem como de questões metodológicas, que enfatizam: i) os critérios de identificação dos dados a serem tomados como representativos do que se quer tomar como a “singularidade que revela”, uma vez que, em um sentido trivial do termo, qualquer dado é um dado singular; II) o conceito de “rigor metodológico”, que não pode aqui ser entendido no mesmo sentido que é tomado no âmbito de paradigmas de investigação centrados nos procedimentos experimentais, na replicabilidade e na quantificação.

Para centralizar a pesquisa com base nesse mecanismo metodológico, é importante salientar que, diante da vasta singularidade dos dados, devemos compreender que o que posiciona a pesquisa são o olhar e as escolhas do pesquisador que está, certamente, filiado ou pertencente a algum lugar específico de fala. O que o conduzirá, portanto, é definido pelas diferentes filiações, programas de pesquisa, conduta e olhar do pesquisador.

Nessa mesma linha de pensamentos, podemos refletir sobre a importância de deixarmos que os dados “falem” frente ao que já está pressuposto, já que

somente um programa de pesquisa que antecipadamente já definiu seus resultados pode dispensar-se da pergunta “o que ensinam os dados ou acontecimentos?”. Para aqueles que dispensam tal pergunta, trata-se apenas de buscar exemplos que corroborem os pontos de vista e definições antecipadamente fixadas (GERALDI 1996, p. 147).

Tratando, portanto, de textos singulares, únicos e diversificados, esperamos que, ao longo das investigações, os dados se comportem de maneira construtiva e não, apenas, comprobatória.

Consoantes a essa metodologia, atentamos para como as categorias de análise são postas na AD, entendendo que são postuladas e criadas depois do contato com o corpus, ou seja, no andamento da pesquisa. Nesse contexto, nos ancoramos na argumentação segundo Charaudeau (2009, p. 205), tratada da seguinte maneira:

c) Para que haja argumentação, é necessário que exista:

– uma proposta sobre o mundo que provoque um questionamento, em alguém, quanto à sua legitimidade [...].

– um sujeito que se engaje em relação a esse questionamento (convicção) e desenvolva um raciocínio para tentar estabelecer uma verdade (quer seja própria ou universal, quer se trate de uma simples aceitabilidade ou de uma legitimidade) quanto a essa proposta. – um outro sujeito que, relacionado com a mesma proposta, questionamento e verdade, constitua-se no alvo da argumentação. Trata-se da pessoa a que se dirige o sujeito que argumenta, na esperança de conduzi-la a compartilhar da mesma verdade (persuasão), sabendo que ela pode aceitar (ficar a favor) ou refutar (ficar contra) a argumentação.

Charaudeau (2009) foi fundamental para que analisássemos a lógica argumentativa das redações. Para tanto, utilizamos o que nos seus estudos está posto como asserção de partida (dado, premissa), asserção de chegada (conclusão, resultado) e uma (ou várias) asserção de passagem. Esses fatores são fundamentais para que compreendamos a lógica argumentativa.

Esses pontos destacados nas redações analisadas nos garantiram a possibilidade de observar que a lógica argumentativa deve estar presente nesses textos uma vez que eles precisam de uma tese (A1), de uma proposta de intervenção (A2) e dos argumentos (asserção de passagem) que sustentem essa tese e ancorem a proposta de intervenção.