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As transições ao longo do ciclo de vida familiar: famílias com filhos pequenos

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Academic year: 2021

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Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

As transições ao longo do ciclo de vida

familiar: famílias com filhos pequenos

Relatório de Estágio do Mestrado em Enfermagem de

Saúde Familiar

Helena Rafaela Vieira do Rosário

Trabalho efetuado sob a orientação da Professora Doutora Maria Da Conceição Alves Raínho Soares Pereira

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II

A ti Rafael, pelo sentir, em cada segundo, a Família

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III O júri

Presidente Professora Doutora Maria João Filomena Santos Pinto Monteiro

Arguente Professora Doutora Marília dos Santos Rua

Orientadora Professora Doutora Maria da Conceição Alves Rainho Soares Pereira

Professora Coordenadora na Escola Superior de

Enfermagem da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

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IV

Agradecimentos Dedico os meus especiais agradecimentos à Professora Doutora Conceição Rainho pela caminhada de mãos dadas, compreensão em relação às minhas fragilidades e entusiasmo constante.

À Cláudia pela caminhada juntas e pelo desafio: está a valer a pena.

À Cris porque sim, ao Sam por fazer parte de nós, à minha mãe, sempre!

Ao Óscar, timoneiro de cada viagem (esta não foi exceção) e ao Rafael por tudo!

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V

Palavras-chave Família, Família com filhos pequenos, saúde, educação, tarefas

Resumo Enquadramento: As mudanças dos últimos anos em Portugal e

no mundo envolveram mudanças profundas na estrutura e organização familiar. O desenvolvimento da família ao longo do seu ciclo de vida é caracterizado por um percurso único, movido por eventos previsíveis ou imprevisíveis e pelas tendências sociais. Até ao momento poucos estudos se centraram numa etapa específica do ciclo de vida familiar: as famílias com filhos pequenos.

Objetivos: Explorar e descrever as tarefas inerentes às famílias

com filhos pequenos na transição para os filhos no pré-escolar e, compreender a transição das famílias com filhos pequenos para os filhos pré-escolar.

Métodos: Desenvolvemos um estudo com abordagem

qualitativa, recorrendo a duas sessões de grupo focal com profissionais da área da educação, saúde, e pais com um filho de 3 anos, num total de seis pessoas. As entrevistas foram transcritas e a análise do conteúdo teve por base os pressupostos de Bardin. O estudo foi aprovado pela comissão de ética da administração regional de saúde.

Resultados: Da análise das entrevistas emergiram quatro

categorias que ilustram a experiência das famílias com filhos pequenos. Tempo para ser criança, tempo para ser família, tempo em creche e tempo para a saúde, são os diferentes e complexos tempos destas famílias. O tempo é considerado um elemento central na experiência e organização do sistema da família em interação com os vários sistemas que a rodeia, incluindo a educação e a saúde.

Conclusão: Este estudo permitiu compreender os desafios e as vivências das famílias com filhos pequenos na transição dos filhos para o pré-escolar e, contribui para estudos posteriores que pretendam envolver uma avaliação e intervenção integradora com as famílias, particularmente as com filhos pequenos.

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VI

Keywords Family; childbearing families; health; education; tasks

Abstract Background: Changes in recent years in Portugal and around

the world involved deep changes in family structure and organization. The development of the family throughout its life cycle is characterized by a single route, driven both by foreseeable and unpredictable events as well as by social trends. So far, few studies have focused on a specific stage of the family life cycle such as childbearing families.

Aim: To explore and describe the tasks associated to the

transition of childbearing families to preschool children, and understand the transition of childbearing families to preschool children.

Methods: We developed a qualitative study, using two sessions

of focus groups with a total of six people, four of whom were professionals from the field of education and health, and parents with a child of three years. The interviews were transcribed verbatim and content analysis was based on the assumptions of Bardin. The study was approved by the regional health administration.

Results: Four categories emerged from the study to illustrate

childbearing families experience. Time to be a child, time to be family, time for childcare centers and time for health, are the different and complex times for these families. Time is considered a central element in the experience and organization of the family’s system in interaction with multiple systems surrounding it, including education, care and health.

Conclusion: This study allowed us to understand the challenges

and experiences of childbearing families in the transition to preschool children and contributes to further studies which wish to involve an assessment and integrated intervention with families.

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VII

Abreviaturas e/ou siglas ACES- Agrupamento de Centros de Saúde USF – Unidade de Saúde Familiar

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VIII Índice INTRODUÇÃO ... 10

CAPITULO I - O CAMINHO PERCORRIDO NUMA UNIDADE DE SAÚDE FAMILIAR DA REGIÃO NORTE ... 13

1.

CONTEXTUALIZAÇÃO E OBJETIVOS ... 14

2. REFLEXÃO SOBRE O DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS ... 16

CAPITULO II – ESTUDO ... 21

1.

FAMÍLIAS E ENFERMAGEM: CONFLUÊNCIAS E TENDÊNCIAS ... 22

1.1 A saúde da criança no contexto familiar ... 22

1.2 Famílias com filhos pequenos: vivências e transições ... 26

1.3 Modelos de avaliação e intervenção familiar ... 28

2.

OBJETIVOS E METODOLOGIA ... 31

Desenho do estudo ... 31

Participantes no estudo ... 32

Métodos e estratégias de recolha de dados: focus group ... 32

Análise dos dados ... 33

Considerações éticas ... 33

3.

APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS ... 34

4.

DISCUSSÃO ... 42

5.

CONCLUSÕES ... 46

Implicações para a prática, investigação, educação e política ... 47

SINTESE CONCLUSIVA DO RELATÓRIO ... 49

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 51

APÊNDICES ... 57

Apêndice I – Guião da Entrevista

Apêndice II – Consentimento Informado Apêndice III - Parecer Comissão de Ética Apêndice IV – Autorização da Instituição

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IX

Lista de Tabelas

Tabela 1 Categorias e subcategorias relacionados com a unidade família ... 34

Lista de figuras

Figura 1 Modelo de promoção da saúde familiar (Reproduzido de Christensen, P. (2004). The health promoting family: a conceptual framework for future research. Social Science & Medicine. 59, 377-387). ... 25

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INTRODUÇÃO

O presente relatório de estágio emerge da Unidade Curricular Estágio, integrada no 3º semestre do 2º ano, do Curso de Mestrado em Enfermagem de Saúde Familiar. O mestrado resulta do consórcio entre a Escola Superior de Enfermagem da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro e Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Bragança. A unidade curricular semestral envolveu prática clínica em contexto de uma Unidade de Saúde Familiar (USF), num total de 480 horas, distribuídas pelo período compreendido entre 20 de janeiro e 30 de julho de 2016, sob orientação dos Mestres Ricardo Tinoco e Cristiana Lopes e, supervisão da Professora Doutora Conceição Rainho.

O estágio ocorreu numa unidade da região norte, norteado pelos seguintes objetivos principais: i) cuidar a família como uma unidade de cuidados; ii) prestar cuidados específicos nas diferentes fases do ciclo de vida da família ao nível da prevenção primária, secundária e terciária; iii) mobilizar os recursos da comunidade para a prestação de cuidados à família capacitando a mesma face às exigências e especificidades do seu desenvolvimento; iv) identificar precocemente os determinantes da saúde com efeitos na saúde familiar; e, v) desenvolver em parceria com a família processos de gestão, promoção, manutenção e recuperação da saúde familiar, identificando e mobilizando os recursos necessários à promoção da sua autonomia.

A enfermagem tem transposto alguns marcos que permitiram a definição da sua identidade e do seu domínio disciplinar. Nos últimos vinte anos tornou-se claro que a evidência decorre da investigação, aumentou a diversidade de pensamento em simultâneo com o enlace entre teoria e prática, potenciando o empowerment dos enfermeiros, com recurso à evidência e tecnologia. Assiste-se ao desenvolvimento da disciplina, assente numa perspetiva de integração, contrária ao verificado no início dos anos 60, onde as teorias se desenvolveram isoladas e com questões mais direcionadas para a área da educação e administração. Na atualidade, o diálogo entre os investigadores, educadores, “teóricos” e os enfermeiros dos contextos da prática profissional de enfermagem é claro e compreensível. Concordamos com (Meleis, 2012) quando afirma que estes grupos trabalham em parceria, e escrevem todos para todos.

Existem alguns indícios de que as próprias organizações profissionais têm assumido uma linguagem coerente com a dos clínicos e teóricos (Meleis, 2012). A este propósito,

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reflita-se sobre a definição da profissão de enfermagem discutida pela Associação de Enfermeiros Americana em 1980, revista em 1990 e em 2003 e, que permaneceu inalterada em 2010. Inicialmente a enfermagem foi definida como “the diagnosis and treatment of human responses to actual or potential health problems” 1 (American Nurses Association,

1980, p. 9). Esta definição é congruente com um foco direcionado para as respostas humanas, por oposição às “funções” dos enfermeiros, interações ou relações e, por oposição aos sinais, sintomas e comportamentos. Em 2003, a definição é atualizada, embora mentendo a essência da definição inicial, abordou outras características essenciais da enfermagem como o foco na resposta humana, ênfase nas potencialidades (e não no problema), a dimensão subjetiva da experiência humana e o objetivo de facilitar e promover a saúde (Meleis, 2012).

“Nursing is the protection, promotion, and optimization of health and abilities;

prevention of illness and injury; alleviation of suffering through the diagnosis and treatment of human response; and advocacy in the care of individuals, families, communities, and populations.”2 (American Nurses Association, 2010, p. 10).

Na atualidade, a enfermagem não é indiferente aos desafios societais nem à reorganização dos serviços de saúde, mais centrados na comunidade e na família. Por conseguinte, a enfermagem de saúde familiar tem vindo a afigurar-se como um campo disciplinar da enfermagem com conhecimento próprio e com uma dimensão crescente, decorrente da necessidade de avaliação e intervenção familiar, com implicações ao nível da investigação (Figueiredo, 2013).

A família agrega-se pela necessidade de afetos, é a célula estaminal da sociedade, contribuindo para o desenvolvimento de todas as potencialidades do ser humano. Enquanto unidade sistémica com capacidade auto-organizativa, é considerada altamente complexa (Figueiredo, 2013).

Um sistema, definido como a mútua interação entre vários elementos, quando adaptado à família, permite analisá-la como unidade em constante interação com os seus membros e com outros sistemas. Assim, cada membro da família é considerado simultaneamente um subsistema e um sistema complexo, uma parte e um todo, à semelhança da própria família (Wright & Leahey, 2013). A família enquanto sistema é parte de um suprassistema mais alargado e é composta por múltiplos subsistemas. Nesta perspetiva, a família como um todo é maior do que a soma das suas partes, a mudança de um dos membros tem impacto em toda a família e o comportamento do outro afeta o

1 Tradução livre da autora: A enfermagem é definida como “o diagnóstico e tratamento das respostas humanas a problemas de

saúde atuais ou potenciais” (American Nurses Association, 1980, p.9).

2 Tradução livre da autora: “Enfermagem é a proteção, promoção e otimização da saúde e habilidades; prevenção da doença e

lesões; alívio do sofrimento através do diagnóstico e tratamento da resposta humana; apoio no cuidado aos indivíduos, famílias, comunidades e populações (American Nurses Association, 2010, p. 10).

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comportamento do indivíduo inicial como uma circularidade geométrica. A título de exemplo, o apoio dado pelo pai (A) à mãe (B) no cuidado ao recém-nascido tem implicações na segurança apresentada pela mãe em relação aos cuidados e ao próprio pai (A-B-A) (Wright & Leahey, 2013). Os comportamentos da família são, assim, melhor entendidos de um ponto de vista circular em detrimento de uma causalidade linear, num equilíbrio entre mudança e estabilidade.

Ao longo do ciclo de vida, as famílias experienciam transições expectáveis comuns. De acordo com Duvall (1977) atravessam oito fases, entre elas as famílias com filhos pequenos, que compreende o período desde o nascimento do primeiro filho até aos três anos de idade. As famílias com filhos pequenos estão sujeitas a desafios complexos, como o aceitar o novo filho no sistema familiar. Embora as tarefas adstritas a cada estádio do ciclo estejam descritas (McGoldrick, Carter, & Garcia-Pedro, 2011; Wright & Leahey, 2013), de acordo com o nosso melhor entendimento pouco se sabe sobre a vivência das famílias na transição da criança para o pré-escolar, quando a família se vê confrontada com a saída da criança de instituições como as creches ou as amas, encaradas como uma continuidade dos cuidados familiares, e, transita para o pré-escolar. Por conseguinte, partimos para esta investigação, norteados pela questão Como vivenciam as famílias as transições associadas à etapa de família com filhos pequenos para a etapa com filhos no pré-escolar? Em consonância, pretendemos explorar e descrever as tarefas inerentes às famílias com filhos pequenos na transição para os filhos no pré-escolar e, compreender a transição das famílias com filhos pequenos para os filhos no pré-escolar.

O presente documento está dividido em dois capítulos principais, sendo precedido pela introdução e páginas preliminares e sucedido pela síntese conclusiva do relatório, referências bibliográficas e apêndices. O capítulo I é dedicado ao caminho percorrido numa USF da região norte, procedemos à contextualização e objetivos do estágio na referida USF e refletimos sobre o desenvolvimento de competências no domínio da enfermagem de saúde familiar. No capítulo II abordamos o estudo desenvolvido, iniciamos com um enquadramento em relação às famílias com filhos pequenos, posteriormente descrevemos a metodologia, os resultados e, finalmente abordamos a discussão e as principais conclusões.

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CAPITULO I - O CAMINHO PERCORRIDO NUMA UNIDADE DE SAÚDE FAMILIAR DA REGIÃO NORTE

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1. CONTEXTUALIZAÇÃO E OBJETIVOS

As experiências no decorrer do nosso percurso (profissional e pessoal) tornam-nos diferentes, nas conceções e nos pontos de vista. É um sentido de incompletude dinâmico que impulsiona um caminho a descobrir e inovar. Foi com este sentido que ingressamos no estágio que decorreu na USF de Gualtar pertencente ao agrupamento de centros de saúde (ACES) Cávado I-Braga, no período compreendido entre o dia 20 de janeiro e 30 de julho de 2016, num total de 480 horas presenciais e de trabalho autónomo. O estágio foi desenvolvido sob a orientação dos Mestres Cristiana Lopes e Ricardo Tinoco, ambos enfermeiros na USF Gualtar, bem como da Professora Doutora Conceição Rainho.

A USF de Gualtar é uma unidade funcional do ACES Cávado I Braga, integrada na Administração Regional de Saúde do Norte, IP. A sua missão versa a prestação de cuidados de saúde personalizados, garantindo a acessibilidade, a globalidade, a qualidade e a continuidade de cuidados. A USF é considerada modelo B e é constituída por uma equipa multiprofissional (médicos de família, enfermeiros, secretários clínicos e assistentes técnicos), dando cobertura a uma população de cerca de 14 000 pessoas, residentes nas freguesias de Gualtar, S. Mamede de Este, S. Pedro de Este, Tenões e área urbana do concelho de Braga.

Partimos para o estágio com os seguintes objetivos: i) cuidar a família como uma unidade de cuidados; ii) prestar cuidados específicos nas diferentes fases do ciclo de vida da família ao nível da prevenção primária, secundária e terciária; iii) mobilizar os recursos da comunidade para a prestação de cuidados à família capacitando-a face às exigências e especificidades do seu desenvolvimento; iv) identificar precocemente os determinantes da saúde com efeitos na saúde familiar e, v) desenvolver em parceria com a família processos de gestão, promoção, manutenção e recuperação da saúde familiar, identificando e mobilizando os recursos necessários à promoção da sua autonomia.

As intervenções da Enfermagem de família são muito amplas e, portanto, podem assumir diferentes abordagens (Hanson, 2005; Kaakinen, Hanson, & Denham, 2010). A família pode ser entendida como o contexto de desenvolvimento humano, onde o enfoque da enfermagem é a pessoa cliente e, a família é considerada um recurso ou um stressor no continuum saúde/doença. A segunda refere-se à família como cliente. Nesta abordagem, a família resulta do somatório de cada um dos seus membros e o foco direciona-se para cada um deles, pelo que, a unidade familiar pode não ser considerada ou enfatizada. A terceira abordagem vê a família como sistema, cujo foco da atenção se centra na família como cliente. Nesta perspetiva, o todo é maior do que a soma das partes, são enfatizadas as

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interações entre os membros da família e os subsistemas que a constituem. A quarta abordagem enquadra a família como componente de uma sociedade, tal como qualquer outra instituição (de saúde, educação, religiosa, etc).

Consideramos que a família é a célula estaminal3 da sociedade, é um subsistema do

sistema mais amplo dessa mesma sociedade (Hanson, 2005; Kaakinen et al., 2010). No estágio, tivemos oportunidade de recorrer às diferentes abordagens de avaliação e intervenção enunciadas, de acordo com as necessidades do indivíduo e família. Atuamos nos diferentes níveis de prevenção, da primordial à quaternária (Almeida, 2004), nomeadamente na prevenção de doenças crónicas como a obesidade, diabetes, hipertensão ou doenças cardiovasculares e na promoção e literacia em saúde. Desenvolvemos com a família estratégias potenciadoras da sua saúde, reorganização das regras e tarefas familiares, identificando e mobilizando os recursos necessários à promoção da sua autonomia e adaptação aos diferentes contextos, privilegiando as forças da família.

No seguimento desta abordagem à contextualização das experiências e dos objetivos do estágio, refletimos sobre o desenvolvimento de competências.

3 O adjetivo estaminal advém da palavra latina staminale que significa em botânica folha floral fértil que produz os grânulos do

pólen, e filete que sustenta a antera onde se encontram os grânulos de pólen. Recorremos a este adjetivo, por oposição à célula básica, por esta última ser considerada indiferenciada. A família é dinâmica com limites e fronteiras definidos e com possibilidade de abertura a múltiplos sistemas que a rodeiam.

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2. REFLEXÃO SOBRE O DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS

As competências específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Familiar foram aprovadas por unanimidade na assembleia geral da Ordem dos Enfermeiros em novembro de 2010 e posteriormente publicadas (Regulamento nº 126/2011). No decorrer do estágio, de forma gradual e segura, procuramos ser referências e suporte qualificados às necessidades das famílias com as quais trabalhamos. A equipa multiprofissional da USF e, em particular a de Enfermagem, permitiu que aprofundássemos a nossa proximidade às famílias, sem invadir o seu domínio privado, estabelecendo intervenções de enfermagem após uma avaliação pormenorizada da sua estrutura, desenvolvimento e funcionalidade (Wright & Leahey, 2013).

Procurando refletir sobre as competências individualmente, ainda que com dificuldade porque se cruzam e por vezes se sobrepõem, particularizamos ambas as competências e as unidades de competência no texto que se segue. Destacamos que as famílias da USF de Gualtar são, na generalidade pertencentes a uma classe média alta, de acordo com a notação social da família (Graffar, 1956) e famílias nucleares. Tentaremos ilustrar o desenvolvimento de competências, aludindo a algumas famílias em concreto.

C1- Cuida da família como unidade de cuidados

Os nossos cuidados de enfermagem centraram-se na família como unidade, interessámo-nos com a sua experiência no decorrer do tempo, com passado e com o seu futuro. Na abordagem a diferentes famílias, e em particular a famílias idosas, conseguimos identificar que nem todos os membros atingiram o seu potencial de saúde em simultâneo, mas sentimos uma influência forte entre cada um dos membros e o todo (e vice versa).

No decorrer do nosso estágio, progressivamente e, à medida que estabelecemos um contacto mais profundo com um grupo restrito de famílias, compreendemos a unicidade da família. Não há famílias iguais, pelo contrário, a sua complexidade, herança e a influência que o todo tem no indivíduo e o indivíduo no todo4 foi marcante em cada dia da nossa

prática clínica. Mais, foi possível evidenciar as interações presentes nas famílias, possibilitando a atribuição de significado contextual à vertente relacional. A avaliação familiar envolveu, além da dimensão do desenvolvimento e funcional, a dimensão estrutural, interna, externa e do contexto, de acordo com vários modelos, nomeadamente o de Calgary (Wright & Leahey, 2013).

4 A este propósito e, atendendo à Teoria Geral dos Sistemas, entende-se a família como unidade sistémica, constituída por

subsistemas, como o fraternal ou parental, e integrados em sistemas mais amplos, como os vizinhos e comunidades religiosa. Os subsistemas são também constituídos por subsistemas de indivíduos (Wright & Leahey, 2013)

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Uma multiplicidade de famílias integra a unidade de saúde em análise. Contactamos com famílias em vários estadios do ciclo familiar, com múltiplas tarefas, organizadas diferentemente e com processos emocionais de transição evidentes. Verificámos que a família revela finalidades comuns aos seus membros e mudanças na sua organização, em equilíbrio dinâmico e versátil, com as mudanças que ocorrem no sistema familiar ou extra-familiar.

Realçamos as famílias com filhos pequenos, sem concretizar nenhuma em concreto, onde verificámos que o(s) grande(s) desafio(s) inerente às famílias e, em particular ao subsistema parental, foram aceitar o novo filho, proceder a ajustes no subsistema parental, realinhar as relações e as regras com a família mais alargada, designadamente os avós.

A família não é imutável, mas antes dinâmica e fluida. Na avaliação do desenvolvimento familiar, intercetamos inúmeras famílias em diferentes estádios, com diferentes tarefas e ligações entre os seus membros. As mudanças do estado marital e as formas de coabitação são evidentes na atualidade e definem as “novas” famílias. Existe um número crescente de divórcios, passando de 30% no ano 2000 para 70.4% em 2013 (PORDATA, 2016). Assim, sentimos necessidade de recorrer a estadios adicionais de ciclo familiar como as família pós-divórcio e com novos casamentos (McGoldrick et al., 2011) para responder às transições emocionais e de desenvolvimento da própria família.

Sabemos que a família é capaz de criar um balanço entre a mudança e a estabilidade. A mudança provoca uma transição para um novo estadio de equilíbrio. As transições podem assumir uma natureza normativa, esperada ou mesmo planeada, ou não normativa, imprevisível ou inesperada, que ocorre no seio da família (Relvas, 2005). As transições normativas correspondem às transições de desenvolvimento e às etapas do ciclo de vida. De acordo com Duvall (1977) vão desde as famílias sem filhos à família idosa (a este propósito poderá ler-se o ponto 1.1 do capítulo II). Contudo, sabe-se que as famílias poderão não transitar para o estadio de desenvolvimento expectável, por exemplo nas famílias com crianças com deficiência, a criança pode não evoluir no seu processo de autonomização, por défices no ambiente físico e/ou ao nível de outros cuidadores, quando comparadas com crianças sem deficiência (Gedaly-Duff, Nielsen, Heims, & Frances, 2010). No estágio, tivemos oportunidade de contactar com várias famílias nos diferentes estadios de desenvolvimento descritos, na USF ou em casa.

Os acontecimentos não normativos contrariam a previsibilidade do ciclo familiar, ainda que em ambos os acontecimentos, normativos ou não normativos, o desfecho seja sempre desconhecido. De acordo com alguns autores, existem três grandes acontecimentos não normativos, disruptivos com esquemas pré-estabelecidos, designadamente o divórcio, monoparentalidade e o recasamento (Costa, 1994). Ainda assim, são oportunidades de

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crescimento individual e familiar. Claro que processos de transição saúde/doença, situacionais, de desenvolvimento ou organizacionais podem assumir um caráter involuntário e imprevisível que mereça a atenção de atores do domínio da saúde (Meleis, 2012). A título ilustrativo, um membro da família com a qual trabalhamos sofreu um acidente vascular cerebral e ficou com hemiparesia. Isto provocou uma mudança em todos os elementos da família e na sua organização, de um modo diametralmente diferente da organização que tinha na fase anterior ao evento crítico.

A orientação de cuidados teve como foco, como já referimos, a família como unidade, a qual permitiu o desenvolvimento de relações marcantes, e com significado, entre as famílias e nós, os profissionais de saúde. Concetualizamos o cuidado no contexto desta relação, procurando a partilha da perícia, das forças e dos recursos para o sucesso da relação de cuidados. Por conseguinte, pautamos o nosso contacto com as famílias pela reciprocidade não hierárquica, confiança, comunicação e negociação para responder às necessidades da família e dos seus membros. Fomos desafiados a analisar a história da família, as suas crenças, regras, conhecimento, comunicação, religião, rotinas diárias, etc. Verificámos que práticas diretivas, exigentes e insistentes num determinado aspeto não são favorecedoras de uma relação satisfatória entre o enfermeiro e a família. Foi evidente que famílias estão mais recetivas às estratégias dos enfermeiros, num contexto de interação colaborativa em detrimento da diretiva.

Sublinhamos a intervenção desenvolvida numa família com filhos pequenos, com dificuldade em estabelecer rotinas (principalmente ao deitar). Inspirados pelo modelo de intervenção de Calgary, procuramos intervir nos domínios cognitivo, afetivo e comportamental da família (Wright & Leahey, 2013). No domínio cognitivo, a nossa intervenção com os pais, versou o esclarecimento sobre a importância da definição de regras, em sintonia e de forma harmoniosa, para o desenvolvimento do bem-estar da criança. Ao nível afetivo foi relevante destacar a importância de admitir as frustrações, incentivando ao suporte do pai em relação à mãe e vice-versa, especialmente quando é visível o esforço de um deles. Finalmente, no domínio comportamental os pais foram desafiados à assertividade no estabelecimento das rotinas, regras, principalmente na ida para a cama, assegurando, previamente, que todas as necessidades das crianças estavam asseguradas.

Salientamos, ainda, uma consulta com um casal (família idosa), a esposa com 82 anos e o esposo com 75 anos. Viviam num edifício residencial sem barreiras arquitetónicas, com higiene adequada e com sistema de abastecimento de água. A senhora estava aposentada de uma profissão de professora primária e, o senhor continuava a trabalhar como empreiteiro. Tinham um filho, casado que vivia numa cidade dos arredores da sua e

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um neto. A matriarca da família, visivelmente mais debilitada do que o marido, apresentava dificuldade na deambulação, excesso de peso e alterações glicémicas. Foi muito interessante enfatizar as forças da família e definir algumas estratégias, em conjunto, no sentido de promover estilos de vida saudáveis, particularmente ao nível da alimentação saudável e atividade física. O casal sentiu-se responsável pela adoção das estratégias adaptativas discutidas em conjunto para prevenir complicações e potenciar a saúde de ambos.

C2-Presta cuidados específicos nas diferentes fases do ciclo de vida da família ao nível da prevenção primária, secundária e terciária.

As intervenções e os cuidados prestados às famílias foram progressivamente melhorados no decorrer do estágio. Alinhamos com Shober & Affara (2001) na perspetiva de que as intervenções dependem da experiência do enfermeiro, grau de independência, autonomia e responsabilidade no seu cuidado à família.

Baseamos a nossa recolha de dados familiar em diversos modelos, principalmente o modelo de avaliação e intervenção familiar de Calgary (Wright & Leahey, 2013), mas também o modelo dinâmico de avaliação e intervenção familiar (Figueiredo, 2013). De realçar que recorremos não só à recolha de dados da família como um todo, mas também à de cada membro da família individualmente, procurando destacar os pontos de vista, as crenças, as atitudes e comportamentos em relação às suas vivências. A título ilustrativo, destacamos a identificação de subsistemas relacionados com as crenças, mãe e filha muito preocupadas com a alimentação saudável, enquanto o pai a considerar que era uma preocupação desnecessária.

Com regularidade, evidenciamos as forças, competências e os recursos observados nas entrevistas e nas consultas. Procuramos salientar padrões comportamentais (“A Joana é cuidadosa com o seu pai”) em detrimento de um comportamento isolado (“A Joana hoje foi cuidadosa com o seu pai”). As famílias que lidam com doenças crónicas sentem-se, por vezes, exaustas e sem esperança e nem sempre têm consciência das suas forças. O mestrado de Enfermagem em Saúde Familiar e, em particular o estágio, despertou em nós uma paixão pelo olhar para a saúde verdadeiramente, enfatizar as forças e resiliência, em detrimento das disfunções e fragilidades dos membros da família. A nossa intervenção familiar foi inspirada na complexidade da prática do “elogio” à família, como forma de criar oportunidades de reflexão, muitas vezes expressada em silêncio, no escutar e nas práticas de autoelogio da própria família (Limacher & Wright, 2006).

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Na avaliação inicial foi possível identificar situações variadas. O isolamento social dos mais velhos e as queixas da solidão em famílias perto do fim de vida, ou as preocupações relacionadas com o crescimento e desenvolvimento das crianças nas famílias com filhos pequenos, foram alguns exemplos concretos que mereceram intervenções particulares e continuadas, envolvendo os domínios cognitivo, afetivo e comportamental da família. No caso concreto de famílias com um filho adolescente, fomos desafiados a trabalhar a família para que o jovem comunicasse sobre a vivência do divórcio dos pais. Explorámos ao nível das dimensões cognitiva e afetiva o significado do divórcio, o que sente em relação ao divórcio, o que é ser pai e ser mãe após o divórcio. Reunimos com o adolescente e, posteriormente com a mãe. Não conseguimos envolver o pai do adolescente e não interviemos na dimensão comportamental. Este contexto foi marcante, por ser incompleto. Enfatizou o conceito de cooperação e colaboração, por oposição ao de não adesão e resistência da família. Inspiramo-nos em diversos autores que nos ajudaram a ter uma orientação mais focada nas soluções, forças e resiliência, reflexão na comunicação, linguagem e oportunidades. Consideramos muito desafiante o trabalho com as famílias, prolongado no tempo e, destacamos que a intervenção familiar não se inicia apenas no momento que sucede a avaliação inicial. Alinhamos com Wright e Leahey (2013) que defendem que a entrevista à família já é uma intervenção com a própria família. Sempre que os enfermeiros fazem uma questão circular5, influenciam a família, geram nova informação

e, consequentemente intervêm com a família.

Baseados nos pressupostos dos modelos de intervenção como o de Calgary (Wright & Leahey, 2013), focamo-nos na promoção, manutenção e melhoria das funções familiares nos domínios cognitivo, afetivo e comportamental. Estivemos conscientes de que a mudança numa das vertentes como a cognitiva pode influenciar as outras, nomeadamente a comportamental e a afetiva. Destacamos as forças dos indivíduos e das famílias, oferecemos estratégias e opiniões, validamos, reconhecemos as respostas emocionais face ao problema, encorajamos as narrativas relacionadas com o problema identificado, definimos os recursos necessários, encorajamos o respeito e a definição de rituais (Wright & Leahey, 2013).

Procuramos validar as decisões da família, incentivando os seus membros a proporem soluções promotoras de mudanças, numa perspetiva de negociação não hierárquica. Atendemos às influências externas (societais e comunitárias) e às práticas de saúde da família (Christensen, 2004), imbuídos pela convicção de que a saúde é aprendida e praticada no seio familiar (Kaakinen, 2010a).

5 As questões interventivas podem ser de dois tipos: linear e circular. As lineares pretendem informar o enfermeiro sobre algum

fenómeno em concreto, enquanto as questões circulares pretendem a mudança terapêutica ainda que de forma subliminar (Tomm, 1988).

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1. FAMÍLIAS E ENFERMAGEM: CONFLUÊNCIAS E TENDÊNCIAS

Com a reforma mais recente dos cuidados de saúde primários em Portugal, a reorganização dos centros de saúde e implementação das USF, é enfatizado o enfermeiro de família, o qual integra a equipa multiprofissional nestas unidades funcionais (Decreto-Lei 149/2014). O enfermeiro com especialidade em saúde familiar atua numa dimensão colaborativa, não-hierárquica com as famílias, focando-se nas forças por oposição à patologia ou doença (Friedemann, 1995; Wright & Bell, 2009). A proximidade com as famílias facilita o estabelecimento de cuidados personalizados e inclusivos, contudo, sabe-se que as intervenções dirigidas à família como unidade de cuidados são insuficientes, nomeadamente em contextos oncológicos (Dieperink, Coyne, Creedy, & Ostergaard, 2017).

A saúde familiar é um conceito dinâmico associado ao bem-estar biológico, psicológico, espiritual, sociológico e cultural de cada membro e do sistema familiar (Hanson, 2005). Esta definição combina a dimensão de cada elemento individualmente e da família como um todo. Centramo-nos, neste capítulo, na saúde da criança integrada no sistema familiar, aludindo às famílias com filhos pequenos.

1.1 A saúde da criança no contexto familiar

As dinâmicas relacionais entre pais e filhos são influenciadas por uma multiplicidade de fatores (Stevens, Hough, & Nurss, 2002), tais como os sentimentos desenvolvidos na relação primária estabelecida entre o bebé e a mãe, basilares para a aprendizagem social (Giddens, 2000). A dependência entre a criança e a mãe (ou outra figura com responsabilidade parental) altera-se por volta do primeiro ano de vida do bebé, período onde os jogos e brincadeiras começam a ocupar grande parte da sua vida, que passa a incluir, também, o falar e o andar (Mandleco, 2012). No segundo ou terceiro ano, a criança desenvolve uma capacidade crescente de entender as interações relacionais entre os diferentes membros da família e envolve-se em atividades associativas nas quais relaciona o seu comportamento com o dos outros. Por volta dos quatro anos, a criança inicia brincadeiras cooperativas que, além de implicarem a interação com o outro, apresentam uma finalidade comum (ex: brincar aos papás e às mamãs). Neste percurso, a criança aprende o que é a disciplina, autodomínio, a comer educadamente e, mais tarde, por volta dos cinco anos torna-se relativamente autónoma (Giddens, 2000; Mandleco, 2012).

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O modelo ecológico de Bronfenbrenner (1979) descreve um sistema hierarquizado que influencia e é influenciado por múltiplos sistemas. Este modelo propõe o enquadramento da criança no microssistema, os familiares e a escola no mesosistema, os familiares alargados, o trabalho dos pais, entre outros, no exosistema, e, o macrosistema compreende as ideologias e atitudes onde a criança está inserida (Bronfenbrenner, 1979). O contexto que exerce maior influência na criança é o familiar, na medida em que é onde passa a maior parte do tempo (Bronfenbrenner, 1979). A família tem a grande tarefa de nutrir e estimular a criança para que se torne um adulto criativo, responsável e saudável (Gedaly-Duff et al., 2010).

O conceito de família encerra vários constructos no seio de cada indivíduo ou grupo de indivíduos. Na atualidade, a definição tradicional de família é desafiada, particularmente se pensarmos no reconhecimento do casamento e adoção por casais do mesmo sexo (Wright & Leahey, 2013). Alinhamos com a definição proposta por Hanson (2005), que defende que a família é composta por dois ou mais indivíduos que referem pertencer à mesma família e, que dependem uns dos outros para apoio emocional, físico ou económico. Ao longo do tempo, a família sofre uma evolução complexa, com diferenciação estrutural progressiva e etapas previsíveis de desenvolvimento (Duvall, 1977; McGoldrick et al., 2011; Relvas, 2000). Para compreendermos a sua estrutura é relevante refletir sobre o desenvolvimento do ciclo de cada família. Cada membro da família partilha um passado, um presente e um futuro, pelo que o seu desenvolvimento é único e a sua história transcende as fases de desenvolvimento individual, como o ser criança, adulto ou idoso.

Os conceitos de “desenvolvimento familiar” e “ciclo de vida familiar”, por vezes são confundidos. O primeiro enfatiza o caminho individual e único percorrido pela família, incluindo os eventos previsíveis ou não previsíveis e, as tendências sociais. O ciclo de vida familiar engloba as etapas típicas que a maioria das famílias atravessa, incluindo as entradas e saídas dos seus membros (Wright & Leahey, 2013). O conceito de desenvolvimento familiar apresenta similitudes com o de carreira familiar (“family career”) o qual incorpora os estádios, as tarefas e as transições, as mudanças de desenvolvimento expectáveis e as inesperadas como as crises situacionais, divórcio, recasamento, adoção e morte (Gedaly-Duff et al., 2010). Este conceito é particularmente útil porque permite compreender os diferentes tipos de famílias em que os adultos estão casados, a coabitar, são solteiros, divorciados, recasados ou homossexuais. As transições expectáveis da família, associadas às diferentes fases do seu ciclo de vida, encerram um conjunto de tarefas bem definidas, que requerem uma reorganização das regras e dos papéis dentro da própria família. À luz desta conceção, uma família saudável é aquela que conclui com sucesso as suas tarefas de desenvolvimento (Kaakinen & Hanson, 2010).

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As últimas décadas foram pautadas por mudanças profundas na família. O curso de vida do homem e da mulher tem-se alterado, com as opções profissionais a assumirem relevo sobre as expectativas familiares. A educação e formação de cada indivíduo tem vindo a prolongar-se no tempo e, no caso concreto da mulher, a qual mantém um papel marcante no cuidado à criança, é desafiada a uma participação ativa e responsabilidade crescente no mercado de trabalho. Porém, a empregabilidade da mulher, por sua vez, é fortemente influenciada quer pelo número de crianças, quer pela idade da criança mais nova (Eurostat, 2009). Neste contexto, as crianças envolvem-se cada vez mais cedo no sistema educativo, como as creches, os jovens adultos saem mais tarde de casa e, os mais velhos continuam a trabalhar até mais tarde do que nas gerações anteriores, pelo que tornam as fases do ciclo de vida familiar menos claras do que no passado e, possivelmente, poderão contribuir para alguma tensão e confusão no seio da família (Wright & Leahey, 2013). Ainda assim, atrevemo-nos a aludir à primeira autora a classificar o percurso da família em estádios do ciclo de vida (Duvall, 1977). De acordo com ela, as famílias atravessam oito fases: i) famílias sem filhos; ii) famílias com filhos pequenos; iii) famílias com filhos em idade pré-escolar; iv) famílias com filhos na escola; v) família com adolescentes; vi) famílias com filhos adultos jovens; vii) família na meia-idade e, viii) família idosa. Apesar de terem passado mais de 60 anos desde esta classificação, ainda lhe é reconhecida destaque na atualidade (Kaakinen & Hanson, 2010).

A demanda pela saúde da família como unidade e o encorajamento para que as famílias valorizem e integrem a promoção da saúde no seu estilo de vida são componentes centrais da enfermagem de família. A promoção da saúde familiar envolve atividades dirigidas e adotadas pelas famílias para fortalecerem a sua unidade familiar. Por conseguinte, a promoção da saúde é aprendida no seio familiar e os padrões e comportamentos de saúde são desenvolvidos, absorvidos e transmitidos às gerações seguintes (Kim-Godwin & Bomar, 2010). Na atualidade, são reclamados os modelos de promoção da saúde dirigidos à unidade familiar, por oposição àqueles mais focados no indivíduo, comunidade e subsistemas familiares (parental, díade mãe-filho), na medida em que os comportamentos de saúde, os valores e os hábitos são aprendidos dentro do seio familiar.

O modelo de promoção da saúde da família (“Health promoting family”) desenvolvido por Christensen (2004) centra-se, fundamentalmente, nas práticas de saúde da família. O modelo caracteriza o modo como as famílias conseguem promover a saúde da criança e, em simultâneo a sua própria saúde, enfatizando o percurso ecológico e cultural da família. Divide-se em duas partes, a interna e a externa (figura 1). Centremo-nos na dimensão externa, a qual inclui as influências societais e as comunitárias. Os fatores societais

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constituem a base material da família e os recursos disponíveis, como por exemplo o rendimento económico, riqueza, educação, estrutura familiar e etnia (figura 1). O domínio comunitário é configurado pelas esferas sociais que contribuem para a saúde da criança, como por exemplo a comunidade local, escolas, serviços de saúde, grupos de pares, instituições de cuidado e comunicação social.

Figura 1 Modelo de promoção da saúde familiar (Reproduzido de Christensen, P. (2004). The health promoting family: a conceptual framework for future research. Social Science & Medicine. 59, 377-387).

A componente central do modelo, mais associada à conceção da família e aos seus processos de desenvolvimento, está delimitada por um círculo semi-permeável, relacionado e influenciado pelos fatores “externos” à família. Os elementos centrais do nível interno incluem o percurso ecocultural da família (“family ecocultural pathway”) e as práticas de saúde familiar (“family health practices”). Estas últimas incluem todas as atividades do quotidiano que alteram e influenciam a saúde dos membros da família, como a alimentação,

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atividade física, consumo de álcool, tabaco, vinculação e outros fatores que contribuem para a saúde e bem-estar da criança (Christensen, 2004).

Exploraremos, em seguida, a etapa de desenvolvimento do ciclo de vida familiar, a família com filhos pequenos, por considerarmos que se trata de uma fase de abertura do sistema familiar ao mundo extrafamiliar e, consequentemente, uma circunstância favorável à promoção de estilos de vida saudáveis à família como sistema e aos seus membros individualmente.

1.2 Famílias com filhos pequenos: vivências e transições

Os desafios crescentes nas diferentes fases da vida da família, e cuja superação origina sentido de mestria e previsão de sucesso nas tarefas seguintes, não são inflexíveis (Figueiredo, 2012) nem terminam de forma súbita quando se inicia outra etapa. Muitas vezes, as famílias são responsáveis por multitarefas de desenvolvimento correspondentes a mais do que uma fase.

Sabe-se que as intervenções na primeira infância são eficazes na prevenção de doenças crónicas como o excesso de peso e obesidade (Daniels et al., 2012; Kimani-Murage et al., 2013; Taylor et al., 2013), bem como na adoção de uma alimentação saudável e no desenvolvimento adequado (Daniels, Mallan, Nicholson, Battistutta, & Magarey, 2013). As famílias são as principais promotoras de estilos de vida saudáveis da criança, contudo são confrontadas com múltiplos desafios sociais, económicos e demográficos, que exigem por parte dos profissionais de saúde uma compreensão profunda das suas vivências, para ser possível intervir de modo personalizado e eficaz.

O conceito de transição é muito comum nas teorias de desenvolvimento, stress e adaptação, pelo facto de enquadrar as continuidades e descontinuidades dos eventos da vida dos seres humanos. As transições estão, invariavelmente, relacionadas com mudança e desenvolvimento, ambos tópicos de muito relevo para a Enfermagem. Em alguns casos, a transição é iniciada por eventos não controlados, noutros pode ser iniciada por eventos deliberados como o casamento, nascimento de um filho e entrada no pré-escolar. A transição é, assim, entendida por uma passagem ou o movimento de uma fase, condição ou estado para outro. O processo, o tempo e a perceção são conceitos alinhados com a transição, bem como a complexa interação pessoa(s)-ambiente (Schumacher & Meleis,

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2010). Sabe-se que nem todas as mudanças implicam uma transição, dada a necessidade da reconstrução da autoidentidade (Meleis, Sawyer, Im, Messias, & Shumacher, 2010).

De acordo com Meleis e colaboradores (2000) a transição envolve a natureza (tipos, padrões e propriedades), as condições (facilitadoras e inibidoras) e os padrões de resposta face à transição. As transições são consideradas únicas, complexas e multidimensionais, despoletadas por um “ponto de viragem” que desafia a novos padrões de resposta. A categoria tipo de transição pode ser desenvolvimental, situacional, saúde/doença ou organizacional. No presente estudo centramo-nos na transição de tipo desenvolvimental, que envolve o ciclo de vida familiar. Estamos conscientes dos padrões da transição e que as famílias podem vivenciar simultaneamente múltiplas transições e não apenas uma (Meleis et al., 2010).

As famílias, e particularmente as que estão no estadio dos filhos pequenos, enfrentam inúmeros desafios, que intersetam a grande tarefa dos adultos se tornarem cuidadores/educadores de uma nova geração. As experiências anteriores, o envolvimento com a carreira, a privação de sono podem influenciar a nova família e são preditores do bem-estar parental (Medina, Lederhos, & Lillis, 2009). Estudos anteriores evidenciam que o choro da criança pequena, incontrolável e inconsolável, é considerada uma das tarefas mais exigentes para o casal e pais da criança (Patrick, Garcia, & Griffin, 2010).

A vivência da parentalidade dos homens e mulheres não é igual, as mulheres tendem a proceder a uma reestruturação cognitiva, a delegar outras tarefas e ao recorrer a suporte social (Gedaly-Duff et al., 2010). O nascimento de um filho envolve uma reorganização das tarefas familiares as quais incluem o ajuste do subsistema parental à nova criança, conjugando as necessidades individuais com as responsabilidades parentais. Neste contexto, surgem os desafios relacionados com o espaço individual, a vivência afetiva, a intimidade emocional e sexual e o processo de socialização, acompanhados por mudanças no sentido do self, nas relações com a família de origem, relação com a criança e entre o casal (Wright & Leahey, 2013). É reclamado às famílias os cuidados à criança, organização das questões financeiras e das tarefas domésticas. Além destas, outras tarefas integram os estadio das famílias com filhos pequenos. As relações com a família alargada sofrem ajustes e incluem novos e complexos desafios relacionados com o significado do comportamento da criança, os seus sintomas e cuidados, com os papéis dos avós e dos tios nos cuidados à criança. Neste contexto, o casal é despertado a desenvolver novos papéis, em vez de os substituir, para si e para os restantes adultos da família (Gedaly-Duff et al., 2010). Este estadio é caracterizado por sentimentos de satisfação na família alargada, decorrentes da intimidade com a nova criança e sem a preocupação da parentalidade.

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As exigências das famílias com filhos pequenos, nomeadamente as relacionadas com o trabalho profissional e os cuidados à criança podem ser conflituantes. É um esforço árduo e diário equilibrar estes conflitos. Os pais que trabalham (e vimos anteriormente que este é fenómeno crescente) precisam decidir onde colocar as crianças, numa creche, ama, com os avós, etc. Não obstante a vivência destes conflitos seja diferente de família para família, o enfermeiro pode ser facilitador na resolução destas questões (Gedaly-Duff et al., 2010). Isto acontece, antecipando as necessidades e dando informação sobre as diferentes possibilidades de atendimento coletivo (ou outros) existentes na comunidade, discutindo os prós e os contras, e sobre como lidar com as mudanças inesperadas (e não normativas) dos membros da família (Limbo, Petersen, & Pridham, 2003).

A avaliação da família é considerada fundamental para que ocorra uma intervenção personalizada e adequada. Os enfermeiros recorrem a um conjunto vasto de modelos para colherem essa informação, alguns deles baseiam-se em modelos teóricos, outros recorrem a questionários, procurando o inesperado e a história da família singular e diferente de todas as outras.

1.3 Modelos de avaliação e intervenção familiar

Existem múltiplos modelos de avaliação e intervenção familiar. Independentemente do modelo utilizado, sabe-se que a avaliação sistemática permite assegurar as necessidades da família e descobrir os seus suportes e recursos (Kaakinen, 2010b). Debruçamo-nos nos modelos de avaliação e intervenção familiar de Calgary e no dinâmico de avaliação e intervenção familiar para discutir a relevância da avaliação familiar e da intervenção adequada e personalizada. Alinhamos com as autoras e procuramos descentrar-nos das tarefas, do trabalho de casa e das intervenções iniciadas pelos enfermeiros. Em alternativa, descobrimos (ou fomos descobrindo) as ideias e os recursos das famílias, num ciclo de co-criação de interação com a família (Leahey & Wright, 2016). Sentimo-nos atraídas pela dimensão positiva de saúde e doença, subliminarmente presente no modelo de intervenção familiar, e que recentemente foi reforçado pelo estudo aprofundado do funcionamento cerebral (Wright, 2015).

Wright e Leahey, no seu modelo, recorrem a conceitos da terapia familiar e da enfermagem, nomeadamente a teoria geral dos sistemas, cibernética, comunicação, teoria da mudança e biologia (Kaakinen, 2010b; Wright & Leahey, 2013). As questões de avaliação familiar centram-se em três categorias, a estrutural, de desenvolvimento e funcional. Cada categoria contém várias subcategorias que podem (ou não) ser totalmente avaliadas na

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primeira consulta ou em momento subsequentes. A avaliação familiar incide, principalmente na interação entre todos os membros da família e assenta numa abordagem sistémica (Wright & Leahey, 2013).

A dimensão estrutura apresenta a estrutura interna (composição da família, género, orientação sexual, posição na fratria, subsistemas, limites), externa (família extensa e sistemas mais amplos) e o contexto (etnia, raça, classe social, religião e espiritualidade, ambiente). Além da entrevista e observação, o genograma e ecomapa são estratégias recomendadas para a avaliação da estrutura familiar (Kaakinen, 2010b; Wright & Leahey, 2013).

A dimensão de desenvolvimento destaca os estádios, as tarefas e os vínculos. A compreensão do estádio de desenvolvimento permite que o enfermeiro avalie e intervenha de forma mais sustentada, específica e com sentido. Finalmente, a dimensão funcional envolve duas subcategorias, a instrumental correspondente às atividades de vida diária e a expressiva (comunicação emocional, comunicação verbal, comunicação não-verbal, comunicação circular, solução de problemas, papéis, influência e poder, crenças, alianças e uniões). A funcionalidade familiar reflete o modo como os seus membros reagem entre si no quotidiano familiar (Wright & Leahey, 2013).

Intervir no sistema familiar é desafiante e não é isento de erros por parte dos profissionais de saúde (Wright & Leahey, 2005). A intervenção dos enfermeiros prevê a mudança no seio familiar, com a certeza que cada família é única e individual e que para se intervir é fundamental conhecer a família. A intervenção com as famílias, com base no modelo em análise, prevê o recurso a estratégias concretas promotoras da funcionalidade familiar nas dimensões cognitiva, afetiva e comportamental (Wright & Leahey, 2013). Baseados na preocupação de aprofundar o nosso conhecimento relacionado com as famílias com filhos pequenos desenvolvemos a presente investigação.

Em Portugal, em 2012 foi criado o “Modelo Dinâmico de Avaliação e Intervenção Familiar”, co-desenvolvido e validado em contextos de saúde primários com os enfermeiros de família. Inspirado pelo modelo de avaliação familiar de Calgary, inclui uma matriz multidimensional que inclui a estrutura (rendimento familiar, edifício residencial, precaução de segurança, abastecimento de água e presença de animais domésticos); desenvolvimento (satisfação conjugal, planeamento familiar, adaptação à gravidez, papel parental) e, funcionamento do sistema familiar (papel do cuidador e processo familiar) (Figueiredo, 2013).

O modelo baseia-se numa perspetiva sistémica e define os conceitos de família, saúde familiar, ambiente familiar e cuidados de enfermagem à família. A implementação de intervenções de enfermagem é sustentada pela validação com família das forças e

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problemas identificado e pelo estabelecimento conjunto (enfermeiro e família) de objetivos de mudança. É reforçada a multidimensionalidade e singularidade da família, destacando não só as necessidades, mas principalmente as forças, como elementos estruturantes para a capacitação da família (Figueiredo, 2013).

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2. OBJETIVOS E METODOLOGIA

Numa atualidade marcada por mudanças profundas e ímpares na família, procuramos, com esta investigação, explorar as tarefas inerentes às famílias com filhos pequenos na transição para os filhos no pré-escolar, descrever as tarefas inerentes às famílias com filhos pequenos na transição para os filhos no pré-escolar e compreender a transição das famílias com filhos pequenos para os filhos no pré-escolar. No decorrer do estudo fomos norteados pela questão Como vivenciam as famílias as transições associadas à etapa de família com filhos pequenos para a etapa com filhos no pré-escolar?

Desenho do estudo

A investigação que se apresenta, de índole qualitativa, partiu do modelo de avaliação e intervenção familiar de Calgary. Como foi descrito anteriormente, avaliação da família compreende a dimensão estrutural, de desenvolvimento e funcional (Wright & Leahey, 2013). Centramo-nos na fase de desenvolvimento por considerarmos que o conhecimento histórico sobre o desenvolvimento da família é de particular relevância para os enfermeiros. Seguimos o desafio das autoras e discutimos as satisfações das famílias, bem como as suas tensões e os stresses. “When nurses use the family development category, we encourage them to have families discuss their joys and satisfactions as well as their tensions and stresses”6 (Wright & Leahey, 2013, p. 93). Neste contexto, foram desenvolvidas duas sessões de focus group englobando famílias com filhos pequenos na USF de Gualtar, pertencente ao ACES Cávado I-Braga, nos dias 6 e 20 de junho de 2016. Os participantes foram ouvidos, procurando dar sentido à informação recolhida de um grupo de discussão planeado sobre as tarefas inerentes às transições vivenciadas pelas famílias com filhos pequenos. As reuniões ocorreram em ambiente saudável em que cada elemento do grupo influenciou o todo como resposta a ideias e comentários durante a discussão (Krueger & Casey, 2009). Foram utilizadas entrevistas semi-estruturadas, notas de campo de observação das sessões, no sentido de se alcançar consenso neste tópico.

6 Tradução livre da autora: “Quando os enfermeiros usam a categoria de desenvolvimento da família, encorajamo-los a que

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Participantes no estudo

Foram convidadas a participar no estudo sete pessoas, pai, mãe, dois enfermeiros, um médico, uma educadora de infância e uma psicóloga, selecionados por conveniência. Atendendo aos objetivos do estudo, os elementos parentais pertenciam ao estádio de famílias com filhos pequenos (Duvall, 1977), isto é, apresentavam um filho mais velho com idades compreendidas entre os 2 e os 3 anos. Os pais foram convidados pela investigadora, com recurso ao email e desafiando-os a integrar as sessões de discussão. A mãe apresentava uma licenciatura em gestão e o pai um mestrado em educação física e saúde. Ambos se encontram no ativo e constituíam uma família nuclear com um filho rapaz. Residiam num local predominantemente urbano.

Pretendemos ter um abordagem integradora sobre transição das famílias com filhos pequenos para os filhos no pré-escolar, pelo que convidamos dois enfermeiros e um médico pertencentes a uma unidade funcional da região norte e que trabalham com famílias neste estádio do ciclo de vida. Sabe-se que a maioria das crianças está integrada em contextos de educação e cuidados como as creches, pelo que convidamos uma educadora de infância com quem tínhamos desenvolvido estudos anteriores. A psicóloga, simultaneamente docente no ensino superior, no âmbito da educação e formação em licenciaturas de ensino básico foi desafiada a integrar este grupo focal. Todos aceitaram, voluntariamente, participar no estudo.

Métodos e estratégias de recolha de dados: focus group

O focus group compreende discussões semi-estruturadas focadas num determinado assunto, com grupos de 4 a 12 pessoas. Embora os participantes respondam, individualmente, a questões, são também encorajados a interagir com os restantes membros do grupo (Krueger & Casey, 2009). Esta dinâmica promove a auto-revelação, num contexto estimulante e flexível (Streubert & Carpenter, 2011).

Na presente investigação, o focus group foi implementado em junho de 2016 em local considerado conveniente ao envolvimento dos participantes na USF. Foram desenvolvidas duas sessões com a duração entre 60 e 90 minutos cada, de acordo com procedimentos internacionalmente aceites (Kitzinger, 1995; Krueger & Casey, 2009) e de acordo com o guião da entrevista (apêndice I). Este método de recolha de dados privilegia a interação do grupo como a fonte de dados e reconhece o papel ativo do investigador na dinamização da discussão no grupo (Krueger & Casey, 2009). Os participantes foram posicionados em círculo, de modo a que todos se vissem mutuamente, isto facilitou a interação e registo a comunicação verbal e não verbal. Foi oferecida água e café no início

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da sessão para permitir o estabelecimento de contacto informal. Antes de cada sessão foram elencadas algumas regras importantes para o focus group, como por exemplo, o não haver conversas paralelas simultaneamente e, manter os assuntos abordados de modo confidencial. O moderador foi a investigadora, assistido por um segundo investigador que fez um diário de notas de campo durante e após as sessões. Recorreu-se a notas de campo com informação da comunicação não-verbal e a síntese da discussão dos participantes.

Análise dos dados

Foi efetuada a transcrição dos discursos verbatim e análise de conteúdo teve por base os pressupostos de Bardin (2015). Procedemos à análise profunda do corpus com uma leitura flutuante, deixando-nos invadir pelas impressões e orientações do conteúdo. Efetuamos a codificação transformando os dados em bruto do texto, com recurso ao recorte e agregação, permitindo atingir uma representação do conteúdo. Efetuamos recortes ao nível semântico, identificando palavras ou frases (unidades de registo). Ao conjunto das unidades de registo semanticamente coerentes. foram criadas categorias e subcategorias (Bardin, 2015). A informação ficou guardada de modo seguro em ficheiros eletrónicos.

Considerações éticas

Foi obtido o consentimento informado (apêndice II) de todos os participantes no estudo, de forma esclarecida, com a clarificação dos objetivos propostos, de acordo com os pressupostos da Declaração de Helsínquia e da Convenção de Oviedo. O princípio da confidencialidade foi explicado num encontro preliminar, antes do início do estudo. Foi assegurada a possibilidade de cada participante abandonar o estudo a qualquer momento e, o anonimato foi mantido. Foi obtido o parecer da comissão de ética da administração regional de saúde-norte com o número 90/2016 (apêndice III).

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3. APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS

Participaram nas sessões de grupo focal seis pessoas, pais (mãe e pai) de um filho com 3 anos, dois elementos da equipa de saúde (enfermeira e médica), uma educadora de infância e uma psicóloga. Duas investigadoras forma moderadoras das sessões. Quisemos ter uma visão alargada das necessidades associadas às famílias com filhos pequenos pelo que incluímos uma.

Da análise do corpus emergiram quatro categorias: i) tempo para ser criança; ii) tempo para ser família; iii) tempo em creche; e, iv) tempo para a saúde e, catorze subcategorias ilustram a complexidade da transição das famílias com filhos pequenos para o pré-escolar. Na tabela 1 estão sintetizadas as categorias e subcategorias emergentes, bem como a definição formulada. O tempo (nos seus mais diversos olhares) esteve presente nas vozes de todos os intervenientes nas sessões.

Tabela 1 Categorias e subcategorias relacionados com a unidade família

Categoria Subcategoria Definição formulada

Tempo para ser criança Exploradora Birras e manipulação A criança e o que a rodeia

A criança está a descobrir o mundo que a rodeia, diariamente e em cada segundo.

A criança discute (à sua maneira) o que pretende do adulto que a rodeia

O mundo exterior, em constante interação com a criança, é facilitador ou inibidor da sua aprendizagem e crescimento.

Tempo para ser família

Tempo para ser pai

Super mãe

Tempo para as regras

Tempo para estar em interação

Tempo para o dia-a-dia

O tempo é identificado como o principal inibidor do exercício da parentalidade. Tempo para crescer, aprender a ser pai, sendo pai, da inexperiência à proficiência.

A mãe é entendida como tendo múltiplas tarefas enquanto pessoa, profissional, mãe, em casa. Quando é necessário assumir uma responsabilidade inesperada ou suplementar em relação à criança, é a mãe que “avança”.

A criança deve ser conhecedora dos limites e fronteiras. O tempo para os estabelecer, naturalmente, é considerado residual.

O tempo para estar, verdadeiramente, em família, com a criança, com o esposo, com o outro, é destacado como um fator de qualidade familiar. Se os pais estão felizes, as crianças também estarão.

A rotina diária é estabelecida gradualmente, com partilha entre o casal e com decisões, saudáveis, ou não, relacionadas com as múltiplas exigências da criança, como a alimentação e o sono.

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Figura 1 Modelo de promoção da saúde familiar (Reproduzido de Christensen, P. (2004). The health  promoting  family:  a  conceptual  framework  for  future  research
Tabela 1 Categorias e subcategorias relacionados com a unidade família  Categoria  Subcategoria  Definição formulada

Referências

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