UFPE — MA248 — 2017.2 — PROF. FERNANDO J. O. SOUZA
AULAS 04 E 05 – v. 1.0
Assuntos: Revis˜ao de pares ordenados e produtos cartesianos. Alguns tipos b´asicos de rela¸c˜oes bin´arias. Introdu¸c˜ao aos conjuntos parcialmente ordena- dos.
Orienta¸ c˜ ao: Nas resolu¸c˜oes, dar solu¸c˜oes leg´ıveis e completas, explicando todos os passos e detalhes, e indicando as propriedades e os resultados utili- zados. Caso a solu¸c˜ao de um item esteja dispon´ıvel, s´o conferi-la ap´os tentar resolvˆe-lo seriamente. Podem ser usados os recursos da l´ogica de predicados com igualdade e os axiomas de ZF j´a estudados nas aulas 01 a 03.
pares ordenados e produtos cartesianos: axiom´ atica Rela¸c˜oes abundam na matem´atica, tanto auxiliando a realiza¸c˜ao de axiom´a- ticas atrav´es de conjuntos, como fazendo um papel de protagonistas (Ex.:
rela¸c˜oes de ordem; fun¸c˜oes). Elas s˜ao formalizadas atrav´es do conceito de par ordenado: aRb, “a se relaciona a b por meio de uma rela¸c˜ao R”, ´e reali- zada como (a, b) ∈ R uma vez que par ordenado esteja bem definido.
Defini¸ c˜ ao 1. Do ponto-de-vista formal, uma no¸c˜ao de par ordenado ´e uma regra que associa, a todos os elementos 1 x e y, um par ordenado (x, y) satisfazendo duas propriedades:
i. A propriedade caracter´ıstica 2 , definindo a igualdade de pares orde- nados:
∀x, y, x ′ , y ′ , ( (x, y) = (x ′ , y ′ ) ⇐⇒ (x = x ′ ∧ y = y ′ ) ) ; ii. Dados quaisquer conjuntos X e Y , a classe
X × Y :=
z ∃x ∈ X : ∃y ∈ Y : z = (x, y) , formada por abstra¸c˜ao e mais comumente denotada 3 por
(x, y ) x ∈ X, y ∈ Y , ´e um con- junto (leg´ıtimo) em ZF, denominado produto cartesiano 4 de A e B.
1 Assumindo pureza, “a todos os conjuntos”.
2 Assim, a primeira e a segunda entradas distinguem-se uma da outra.
3 Esta nota¸c˜ao far´ a sentido com o conceito de fam´ılia indexada, a ser estudado em breve.
4 Em homenagem a Ren´e Descartes, cuja formula¸c˜ ao da geometria anal´ıtica (“La G´eo-
m´etrie”, publicado em 1637) foi a motiva¸c˜ ao para o eventual desenvolvimento da ideia de
produto cartesiano. Seu nome foi traduzido para o latim como “Cartesius”, que resulta no
adjetivo “Cartesianus” (masc.), “Cartesiana” (fem.), “Cartesianum” (neutro).
Quest˜ ao 2. Nesta quest˜ao, produtos cartesianos ser˜ao considerados apenas do ponto-de-vista formal na Defini¸c˜ao 1. Sejam A, B, C e D conjuntos.
2.a. Descrever, por extens˜ao, ∅ × ∅, {∅} × {∅} e ∅ × {∅}. Eles s˜ao iguais?
2.b. (O produto cartesiano n˜ao ´e comutativo!) Mostrar que A × B e B × A podem ser diferentes. Obter uma lista de condi¸c˜oes sobre A e B que equivale a A × B = B × A. Demonstrar tal equivalˆencia;
2.c. (O produto cartesiano n˜ao ´e associativo!) Mostrar que (A × B) × C e A × (B × C) podem ser diferentes, mesmo no caso A = B = C.
Proposi¸ c˜ ao 3. Nesta proposi¸c˜ao, produtos cartesianos ainda ser˜ao conside- rados do ponto-de-vista formal na Defini¸c˜ao 1. Sejam A, B, C e D conjuntos.
3.a. Apesar de nem ser comutativo nem associativo (cf. problemas 2.b e 2.c), o produto cartesiano admite bije¸c˜oes canˆonicas 5 entre A × B e B × A, e entre (A × B) × C e A × (B × C), a saber:
σ A,B : A × B −→ B × A
(a, b) 7−→ σ A,B ( (a, b) ) = (b, a) α A,B,C : ((A × B ) × C) −→ (A × (B × C))
((a, b), c) 7−→ α A,B,C ( ((a, b), c) ) = (a, (b, c))
Usando as bije¸c˜oes canˆonicas do tipo α A,B,C acima, e um resultado chamado teorema de coerˆencia para categorias monoidais (Saunders MacLane, 1963), podemos concluir que quaisquer duas parentesiza¸c˜oes 6 de uma lista finita de conjuntos A 1 , A 2 , . . . , A n podem ser identificadas de modo canˆonico ´ unico, de modo que podemos vˆe-las como representantes de um objeto (“´ unico a menos de isomorfismo”) A 1 × A 2 . . . × A n , sem referˆencia aos parˆenteses.
3.b. [Halmos, Sec. 6] A × B = ∅ ⇐⇒ (A = ∅ ∨ B = ∅);
∅ 6= A × B ⊆ C × F = ⇒ (A ⊆ c ∧ B ⊆ F ); e
a condi¸c˜ao ∅ 6= A × B ´e necess´aria para se chegar `a conclus˜ao anterior;
3.c. (A ∩ B) × (C ∩ D) = (A × C) ∩ (B × D), A × (C ∪ D) = (A × C) ∪ (A × D) e, analogamente, (A ∪ B) × C = (A × C) ∪ (B × C), mas ´e poss´ıvel termos (A ∪ B) × (C ∪ D) 6= (A × C) ∪ (B × D).
5 Mais precisamente, “isomorfismos naturais”, um conceito da teoria das categorias.
6 Ex.: A×((B ×(C ×D)×(E ×F )×G)×H ) e ((A×B)×(C ×D))×((E ×F )×(G×H )).
apˆ endice: alguns modelos para os pares ordenados
H´a mais de uma realiza¸c˜ao (modelo) da teoria formal dos pares ordena- dos. Abaixo, damos trˆes exemplos, os quais admitem diversas varia¸c˜oes que funcionam: a de Norbert Wiener (1914) foi a primeira a aparecer, e foi pro- posta para funcionar em mais de uma teoria dos conjuntos; a de Karzimierz Kuratowski (1921) ´e usualmente adotada em ZF.
Defini¸ c˜ ao 4. Dados os conjuntos X e Y , denotamos:
(X, Y ) W = b { {{X}, ∅}, {{Y }} } (par ordenado de Wiener); e (X, Y ) K = b { {X}, {X, Y } } (par ordenado de Kuratowski).
Obs. Ambas possuem variantes que n˜ao alteram a essˆencia dos resultados abaixo. Ex.: Poder´ıamos ter usado { {Y }, {X, Y } } como par ordenado de Kuratowski. Enquanto a primeira vers˜ao privilegia a indica¸c˜ao de qual ´e a primeira entrada X, a segunda privilegia a indica¸c˜ao da segunda entrada Y .
Quest˜ ao 5. Descrever, por extens˜ao, (∅, ∅) W e (∅, ∅) K . Eles s˜ao iguais?
Proposi¸ c˜ ao 6. Sejam A, B , C e D conjuntos.
6.a. (A, B) K = (C, D) K ⇐⇒ ((A = C)∧(B = D)) ⇐⇒ (A, B) W = (C, D) W . Dica: Considerar os casos A = B e A 6= B separadamente;
6.b. Seja a seguinte classe (produto cartesiano de pares ordenados de Wiener) dada por abstra¸c˜ao: W A,B = b
(a, b) W a ∈ A, b ∈ B =
{y|a ∈ A, b ∈ B : y = (a, b) W }. Existe um conjunto X (em ZF) do qual W A,B ´e subconjunto 7 ;
6.c. Seja a seguinte classe (produto cartesiano de pares ordenados de Kuratowski) dada por abstra¸c˜ao: K A,B = b
(a, b) K a ∈ A, b ∈ B =
{x|a ∈ A, b ∈ B : x = (a, b) K }. Existe um conjunto Y (em ZF) do qual K A,B ´e subconjunto 8 .
7 Disto, temos a boa defini¸c˜ ao de W A,B em ZF : dados A e B, existe um ´ unico conjunto extensionalmente igual a {x ∈ X |a ∈ A, b ∈ B : x = (a, b) W } em ZF.
8 Disto, temos a boa defini¸c˜ ao de K A,B em ZF : dados A e B, existe um ´ unico conjunto
extensionalmente igual a {y ∈ Y |a ∈ A, b ∈ B : y = (a, b) K } em ZF.
rela¸ c˜ oes bin´ arias num conjunto
Defini¸ c˜ ao 7. Dados os conjuntos X e Y , dizemos que R ´e uma rela¸ c˜ ao bi- n´ aria de X em Y se, e somente se, R ⊆ X ×Y . Em caso afirmativo, denota- mos ∀x ∈ X, ∀y ∈ Y, (xRy ⇐⇒ (x, y) ∈ R), e dizemos que: x relaciona-se a y por R; X ´e o dom´ınio de R (Dom(R) = X); e Y ´e o contradom´ınio de R (ContraDom(R) = Y ). Denotamos a nega¸c˜ao xRy pelo modo tradicional x6 Ry , ou seja: ∀x ∈ X, ∀y ∈ Y, (x6Ry ⇐⇒ ¬(xRy) ⇐⇒ (x, y) ∈ / R).
Dizemos que R ´e uma rela¸ c˜ ao bin´ aria em X se, e somente se, R ´e uma rela¸c˜ao de X em X (ou seja, R ⊆ X × X).
Dos tipos de rela¸c˜ao bin´aria abaixo, os assinalados com asterisco (*) s˜ao opcionais nesta disciplina e podem ser ignorados. No entanto, recomendamos que o(a) leitor(a) tente entendˆe-los e compar´a-los com os demais tipos que, por sua vez, aparecem com frequˆencia em matem´atica e devem ser recordados.
Defini¸ c˜ ao 8. Dada uma rela¸c˜ao R em X, dizemos que:
− R ´e reflexiva se, e somente se, ∀x ∈ X, xRx, ou seja, (x, x) ∈ R;
− R ´e irreflexiva (ou estrita) se, e somente se, ∀x ∈ X, x6Rx, ou seja, (x, x) ∈ / R;
− (*) R ´e correflexiva se, e somente se, ∀x, y ∈ X, xRy = ⇒ x = y, ou seja, (x, y) ∈ R = ⇒ x = y;
− R ´e sim´ etrica se, e somente se, ∀x, y ∈ X, xRy = ⇒ yRx, ou seja, (x, y) ∈ R = ⇒ (y, x) ∈ R;
− R ´e assim´ etrica se, e somente se, ∀x, y ∈ X, xRy = ⇒ y6Rx, ou seja, (x, y) ∈ R = ⇒ (y, x) ∈ / R;
− R ´e antissim´ etrica se, e somente se, ∀x, y ∈ X, (xRy ∧yRx) ⇒ x = y, ou seja, ( (x, y) ∈ R ∧ (y, x) ∈ R ) = ⇒ x = y;
− R ´e transitiva se, e somente se, ∀x, y, z ∈ X, (xRy ∧ yRz) = ⇒ xRz, ou seja, ( (x, y) ∈ R ∧ (y, z) ∈ R ) = ⇒ (x, z) ∈ R;
− (*) R ´e antitransitiva 9 se, e somente se,
∀x, y, z ∈ X, (xRy ∧ yRz) = ⇒ x6 Rz, ou seja, ( (x, y) ∈ R ∧ (y, z) ∈ R ) = ⇒ (x, z) ∈ / R;
9 Alguns autores utilizam o termo intransitiva para designar uma rela¸c˜ ao que n˜ ao ´e
transitiva, enquanto outros usam aquele termo como sinˆ onimo de antitransitiva. Entenda
a diferen¸ca!
− (∗)R ´e euclidiana (ou euclidiana ` a direita) se, e somente se,
∀x, y, z ∈ X, (xRy ∧ xRz) = ⇒ yRz, ou seja, ( (x, y ) ∈ R ∧ (x, z) ∈ R ) = ⇒ (y, z) ∈ R;
− (*) R ´e euclidiana ` a esquerda se, e somente se,
∀x, y, z ∈ X, (yRx ∧ zRx) = ⇒ yRz, ou seja, ( (y, x) ∈ R ∧ (z, x) ∈ R ) = ⇒ (y, z) ∈ R;
− (*) R ´e extens´ıvel (ou serial) se, e somente se, ∀x ∈ X, ∃y ∈ X : xRy, ou seja, cada x em X se relaciona a algum elemento de X por R;
− R ´e densa se, e somente se, ∀x, y ∈ X, [xRy = ⇒ ∃z ∈ X : (xRz∧zRy)], ou seja, entre quaisquer dois elementos relacionados, existe um terceiro;
− R ´e tricotˆ omica se, e somente se, ∀x, y ∈ X, uma, e apenas uma, das seguintes situa¸c˜oes ocorre: xRy ou yRx ou x = y; ou seja, (x, y ) ∈ R ou x = y ou (y, x) ∈ R. Isto pode ser descrito por meio de conectivos como: ∀x, y ∈ X, ( xRy ∨ ˙ x = y ∨ ˙ yRx) ∧ ¬ ( xRy ∧ x = y ∧ yRx);
− (*) R ´e conexa se, e somente se, ∀x, y ∈ X, ( xRy ∨ x = y ∨ yRx) (ou seja, relaxamos a exclusividade m´ utua na defini¸c˜ao anterior, mas mantemos a exaust˜ao);
− R ´e total (ou linear ou fortemente conexa) se, e somente se,
∀x, y ∈ X, (xRy ∨ yRx), ou seja, ( (x, y) ∈ R ∨ (y, x) ∈ R );
− R ´e bem fundada se, e somente se, para todo subconjunto n˜ao-vazio C de X, existe um elemento m ∈ C tal que nenhum elemento de C ´e relacionado a m por R. Simbolicamente:
∀S ⊆ X : S 6= ∅, ∃m ∈ S : ∀s ∈ S, s6Rm.
Dizemos que tal m ´e um elemento R−minimal de S.
Ainda estudaremos as seguintes combina¸c˜oes, que s˜ao important´ıssimas:
− Rela¸ c˜ oes de ordem estrita: rela¸c˜oes que s˜ao irreflexivas e transitivas (o que equivale a serem assim´etricas e transitivas por 13.g e 13.h);
− Rela¸ c˜ oes de ordem parcial: rela¸c˜oes que s˜ao reflexivas, antissim´e- tricas e transitivas;
− Rela¸ c˜ oes de equivalˆ encia: rela¸c˜oes que s˜ao reflexivas, sim´etricas e
transitivas.
Quest˜ ao 9. Alguns exemplos para fixa¸c˜ao dos conceitos acima.
9.a. Verificar que a rela¸c˜ao R = b {(0, 0); (0, 1); (1, 0); (0, 2); (3, 2)} ( P × P no conjunto P = {0, 1, 2, 3} n˜ao ´e de nenhum dos 16 tipos definidos acima!
Dica: Este exemplo enfatiza o papel do quantificador ∀ (“para todo”) na defini¸c˜ao de cada tipo especial de rela¸c˜ao mencionado!
9.b. Verificar o que pode ser dito sobre as seguintes rela¸c˜oes bin´arias na hu- manidade mesmo que de modo aproximado, uma vez que n˜ao fixamos uma modelagem matem´atica para a humanidade: parentesco (“ser parente de”);
“ser irm˜a(o) de”; “ser filho(a) de”; “ser pai ou m˜ae de”; descendˆencia (“ser descendente de”); ancestralidade (“ser ancestral de”); e “ser cˆonjugue de”;
9.c. Verificar o que pode ser dito sobre as seguintes rela¸c˜oes bin´arias entre os competidores ao final de torneio eliminat´orio simples (quem perde uma par- tida ´e eliminado(a)): “foi eliminado por”; e “eliminou”;
9.d. Verificar o que pode ser dito a respeito das seguintes rela¸c˜oes bin´arias em
N
: “ser divisor de” (simbolizada por x|y ou por x\y); “ser m´ ultiplo de” (isto
´e, “ser divis´ıvel por”: x ´e m´ ultiplo de y ⇐⇒ y|x); “n˜ao ser divisor de” (x6 | y);
“n˜ao ser m´ ultiplo de”; <; ≤; >; e ≥;
9.e. Recordar que, em
Z, ser par significa ser m´ ultiplo de 2, e ser ´ımpar ´e a nega¸c˜ao de ser par. Verificar o que pode ser dito a respeito das seguintes rela¸c˜oes bin´arias em
Z: <, ≤, >, ≥, al´em de
− ∀x, y ∈
Z, xR 1 y ⇐⇒ x e y s˜ao pares;
− ∀x, y ∈
Z, xR 2 y ⇐⇒ x e y s˜ao ´ımpares;
− ∀x, y ∈
Z, xR 3 y ⇐⇒ x ´e par e y ´e ´ımpar;
− ∀x, y ∈
Z, xR 4 y ⇐⇒ x ´e ´ımpar e y ´e par;
9.f. Verificar o que pode ser dito a respeito das seguintes rela¸c˜oes bin´arias:
− ∀(a, b), (c, d) ∈
N×
N, (a, b)R 5 (c, d) ⇐⇒ a + d = b + c;
− ∀(x, y ), (w, z) ∈
Z×
Z, (x, y)R 6 (w, z) ⇐⇒ xz = yw;
− ∀(x, y ), (w, z) ∈ (
Z\{0}) × (
Z\{0}), (x, y)R 7 (w, z) ⇐⇒ xz = yw;
− ∀(x, y ), (w, z) ∈ (
N\{0}) × (
N\{0}), (x, y)R 8 (w, z) ⇐⇒ xz = yw.
Defini¸ c˜ ao 10. Dado um conjunto A, a rela¸ c˜ ao vazia ∅ em A ´e o conjunto vazio visto como rela¸c˜ao em A (ou seja, como subconjunto de A ×A), ou seja, a rela¸c˜ao vazia em A ´e aquela em que todo elemento de A n˜ao se relaciona a elemento algum de A.
Obs. Uma rela¸c˜ao ser a rela¸c˜ao vazia num conjunto A n˜ao significa a mesma coisa que o conjunto A ser vazio.
Defini¸ c˜ ao 11. Dado um conjunto A, definimos sua rela¸ c˜ ao-identidade Id A como sendo a rela¸ c˜ ao de igualdade = aplicada aos elementos de A, ou seja,
Id A := {(a, b) ∈ A × A|a = b}, tamb´em descrita como {(a, a)|a ∈ A}.
Obs. Se A 6= ∅, denotaremos, arbitrariamente, por N A a rela¸ c˜ ao de dife- ren¸ ca 6= em A: N A = {(a, b) ∈ A × A|a 6= b}.
Quest˜ ao 12. Seja A um conjunto n˜ao-vazio. Em alguns dos itens abaixo, faz diferen¸ca se A ´e unit´ario ou n˜ao. Ser´a que, para algum deles, faz diferen¸ca se o n´ umero de elementos 10 de A for, digamos, igual a 2 ou igual a 3 (ao inv´es de maior que 3)?
12.a. Verificar que, no conjunto vazio, a ´ unica rela¸c˜ao bin´aria ´e rela¸c˜ao a vazia e, devido `a vacuidade do conjunto, tal rela¸c˜ao satisfaz todos os 16 conceitos (tipos) apresentados acima!
12.b. Verificar que {(a, b) ∈ A × A|a = b ∧ a 6= b} = ∅, a rela¸c˜ao vazia em A;
12.c. De quais tipos s˜ao as rela¸c˜oes ∅, Id A , N A e A × A em A?
12.d. De quais tipos s˜ao as rela¸c˜oes ⊆, (, ⊇ e ) em P (A)?
V´arios dos itens da proposi¸c˜ao abaixo s˜ao ´ uteis para compreendermos rela¸c˜oes de ordem.
Proposi¸ c˜ ao 13. Sejam A um conjunto, e R uma rela¸c˜ao em A. Ent˜ao:
13.a. A × A = Id A ⊔ N A ;
13.b. R ´e reflexiva ⇐⇒ Id A ⊆ R ⇐⇒ R ∩ Id A = Id A ;
10 A ideia de n´ umero de elementos (cardinalidade) ´e formalizada em matem´ atica atra-
v´es de bije¸c˜ oes entre conjuntos. Ela d´ a origem ao conceito de n´ umero cardinal.
13.c. R ´e correflexiva ⇐⇒ R ⊆ Id A ⇐⇒ R ∩ Id A = R;
13.d. R ´e irreflexiva ⇐⇒ R ⊆ N A ⇐⇒ R ∩ Id A = ∅;
13.e. R ⊔ Id A ´e reflexiva (dita fecho reflexivo de R);
13.f. R\Id A ´e irreflexiva;
13.g. Se R ´e assim´etrica, ent˜ao, R ´e irreflexiva;
13.h. Se R ´e transitiva e irreflexiva, ent˜ao R ´e assim´etrica;
13.i. R ´e assim´etrica se, e somente se, R ´e antissim´etrica e irreflexiva;
13.j. Se R ´e assim´etrica, ent˜ao seu fecho reflexivo R ⊔ Id A ´e uma rela¸c˜ao antissi- m´etrica;
13.k. Se R ´e antissim´etrica, ent˜ao R\Id A ´e assim´etrica;
13.l. Se R ´e tricotˆomica, ent˜ao R ´e assim´etrica;
13.m. Se R ´e total, ent˜ao R ´e reflexiva.
Quest˜ ao 14.
14.a. Dar um exemplo de uma rela¸c˜ao irreflexiva que n˜ao ´e assim´etrica (e, por- tanto, n˜ao ´e transitiva devido a 13.h, nem ´e antissim´etrica devido a 13.i).
14.b. (Exerc´ıcio opcional para a pr´atica de demonstra¸c˜ao. Os trˆes primeiros itens s˜ao relativamente f´aceis.) Seja R uma rela¸c˜ao bin´aria em A. Provar as afirma¸c˜oes abaixo. Para as implica¸c˜oes, tamb´em investigar se suas rec´ıprocas s˜ao verdadeiras ou falsas, buscando contraexemplos para as falsas:
i. Se R ´e sim´etrica e antissim´etrica, ent˜ao R ´e correflexiva;
ii. Se R ´e sim´etrica e assim´etrica ou R ´e reflexiva e irreflexiva, ent˜ao R = ∅;
iii. Se R ´e reflexiva, ent˜ao R ´e densa;
iv. Se R ´e antitransitiva, ent˜ao R ´e irreflexiva;
v. Se R ´e euclidiana e reflexiva, ent˜ao R ´e sim´etrica;
vi. Se R ´e sim´etrica, ent˜ao s˜ao dois a dois equivalentes: R ´e transitiva; R ´e euclidiana; e R ´e euclidiana `a esquerda;
vii. Se R ´e sim´etrica, transitiva e extens´ıvel, ent˜ao R ´e reflexiva;
14.c. Toda rela¸c˜ao sim´etrica e transitiva tem que ser reflexiva?
14.d. Toda rela¸c˜ao conexa tem que ser reflexiva?
Defini¸ c˜ ao 15. Dada uma rela¸c˜ao bin´aria R em um conjunto X, o fecho transitivo de R, que denotaremos por R + , ´e a rela¸c˜ao definida por:
∀x, y ∈ X, xR + y se, e somente se, existe um n´ umero finito n > 0 de ele- mentos de X, x 0 , x 1 , . . . , x n , tais que x = x 0 , x 0 Rx 1 , x 1 Rx 2 , . . . , x n− 1 Rx n
(ou seja, x ı−1 Rx ı para todo ı ∈ {1, . . . , n}), e x n = y. De forma abrevi- ada, se, e somente se, existe uma sequˆencia finita de elementos relacionados x = x 0 Rx 1 Rx 2 R · · · Rx n− 1 Rx n = y.
Obs. Como admitimos o caso n = 1, temos que ∀x, y ∈ X, xRy = ⇒ xR + y.
Proposi¸ c˜ ao 16. Seja R uma rela¸c˜ao bin´aria em um conjunto X.
16.a. R ⊆ R + ;
16.b. R + ´e transitiva;
16.c. Se T ´e uma rela¸c˜ao transitiva que cont´em R, ent˜ao R + ⊆ T . Em outras palavras, R + ´e a menor (para ⊆) das rela¸c˜oes transitivas que cont´em R, e ´e a interse¸c˜ao delas;
16.d. Se R ´e transitiva, ent˜ao R + = R.
conjuntos parcialmente ordenados
J´a fomos introduzidos aos conceitos de rela¸c˜ao de ordem estrita e parcial no final da Defini¸c˜ao 8, e discutimos algumas propriedades relacionadas a eles na Proposi¸c˜ao 13.
Proposi¸ c˜ ao 17. (Parcial vs. estrita). Seja A um conjunto.
17.a. Cada rela¸c˜ao de ordem estrita < ′ em A induz uma rela¸c˜ao de ordem parcial
≤ ′ em A por: ∀a, a ′ ∈ A, a ≤ ′ a ′ ⇐⇒ (a < ′ a ′ ∨ a = a ′ ). Em outras palavras, denotando as rela¸c˜oes < original e ≤ induzida por E e P E respectivamente, temos que P E = E ⊔ Id A . cf. Item 13.e.
Obs. Portanto, o objetivo demonstrar que P E satisfaz a defini¸c˜ao de rela¸c˜ao
de ordem parcial, utilizando, para tanto, que E satisfaz a defini¸c˜ao de rela¸c˜ao
de ordem estrita;
17.b. Cada rela¸c˜ao de ordem parcial ≤ em A induz uma rela¸c˜ao de ordem estrita
< em A por: ∀a, a ′ ∈ A, a < a ′ ⇐⇒ (a ≤ a ′ ∧ a 6= a ′ ). Em outras palavras, denotando as rela¸c˜oes ≤ original e < induzida por P e E P respectivamente, temos que E P = P \Id A . cf. Item 13.f.
Obs. Portanto, o objetivo demonstrar que E P satisfaz a defini¸c˜ao de rela¸c˜ao de ordem estrita, utilizando, para tanto, que P satisfaz a defini¸c˜ao de rela¸c˜ao de ordem parcial;
17.c. As duas constru¸c˜oes acima s˜ao inversas. Mais precisamente: a ordem parcial induzida pela ordem estrita induzida por uma ordem parcial dada ´e igual a esta ´ ultima e, trocando as instˆancias de “parcial” pelas de “estrita” nesta frase e vice-versa, obtemos outro resultado v´alido. Em suma: utilizando a nota¸c˜ao dos itens anteriores, temos que P E
P= P e E P
E= E;
17.d. Uma rela¸c˜ao de ordem parcial em A ´e total se e somente se a rela¸c˜ao de ordem estrita induzida por ela ´e tricotˆomica;
17.e. (Ordem dual de ≤). Cada rela¸c˜ao de ordem parcial ≤ em A induz uma rela¸c˜ao de ordem parcial ≤ ∗ (mais comumente denotada por ≥ ) em A, dada por: ∀a, a ′ ∈ A, a ≤ ∗ a ′ (isto ´e, a ≥ a ′ ) ⇐⇒ a ′ ≤ a.
Obs. Novamente, o objetivo do exerc´ıcio ´e demonstrar que ≤ ∗ satisfaz a defini¸c˜ao de rela¸c˜ao de ordem parcial, utilizando, para tanto, que ≤ a satisfaz.
Obs. Analogamente, temos a rela¸c˜ao de ordem dual < ∗ (ou >) de qualquer rela¸c˜ao de ordem estrita em A dada;
17.f. Dada uma rela¸c˜ao de ordem parcial ≤ em A:
i. ≤ ∗ ´e total se, e somente se, ≤ ´e total; e ii. ≤ ´e a ordem dual de ≤ ∗ (ou seja, ≤ ∗∗ =≤).
Defini¸ c˜ ao 18. Sejam X um conjunto, ≤ uma rela¸c˜ao de ordem parcial em X, S ⊆ X, e elementos a, b, m, M ∈ X. Dizemos que:
− (X, ≤) ´e um conjunto parcialmente ordenado (ou CPO 11 ), e que X ´e o conjunto subjacente 12 ao CPO (X, ≤);
− a e b s˜ao compar´ aveis se, e somente se, a ≤ b ∨ b ≤ a;
11 Em inglˆes, “partiallu ordered set” ou “poset”.
12 Em inglˆes, “underlying set” ou “field”, embora “field” tamb´em signifique campo (como
em campo de vetores) e corpo. Conjunto subjacente ´e uma nomenclatura que se aplica
a todas as estruturas matem´ aticas definidas como conjuntos (subjacentes a elas) munidos
de algo, e n˜ ao apenas a CPOs.
− a e b s˜ao incompar´ aveis se, e somente se, a e b n˜ao s˜ao compar´aveis;
− ≤ ´e uma rela¸ c˜ ao de ordem total (ou rela¸ c˜ ao de ordem linear ), ambas ≤ e < s˜ao ordena¸ c˜ oes totais de A, e (A, ≤) ´e um conjunto totalmente ordenado se, e somente se, ≤ ´e total (ou seja, todos os elementos de X s˜ao compar´aveis uns aos outros) – cf. Item 17.d;
− m ´e um elemento minimal de (X, ≤) se, e somente se, ∀x ∈ X, (x ≤ m = ⇒ x = m) (ou seja, nenhum elemento de X ´e menor que m, mas podem existir elementos que n˜ao se comparam a m). Se n˜ao houver ambiguidade, tamb´em dizemos que m ´e um elemento minimal de X.
Analogamente,
− M ´e um elemento maximal de (X, ≤) (ou de X) se, e somente se,
∀x ∈ X, (M ≤ x = ⇒ x = M );
− m ´e um m´ınimo de (X, ≤) (ou de X) se, e somente se, ∀x ∈ X, m ≤ x (em particular, todo elemento de X se compara a m); analogamente,
− M ´e um m´ aximo de (X, ≤) (ou de X) se, e somente se, ∀x ∈ X, x ≤ M ;
− A ordem induzida em S por ≤ ´e a restri¸c˜ao de ≤ a S × S, ou seja,
≤ | S×S = {(s, s ′ ) ∈ s × S|s ≤ s ′ } = (S × S)∩ ≤. Informalmente,
´e o resultado de aplicarmos a rela¸c˜ao original ≤ apenas a pares de elementos em S;
− S ´e uma cadeia de (X, ≤) (ou de X) se, e somente se, a ordem induzida por ≤ em S ´e total. Em outras palavras, uma cadeia ´e um subconjunto de X totalmente ordenado por ≤ ;
− S ´e uma anticadeia de (X, ≤) (ou de X) se, e somente se, quaisquer dois elementos de S distintos s˜ao incompar´aveis na ordem induzida por
≤ em S.
Obs. Tendo em vista os resultados enunciados na Proposi¸c˜ao 17, concei- tos para rela¸c˜oes de ordem parcial ou estrita misturam-se na literatura, adaptando-se a vers˜ao de um tipo de rela¸c˜ao de ordem para o outro ao se incluir ou excluir a identidade Id A , ou seja, a rela¸c˜ao de igualdade em A. Por exemplo, dada uma rela¸c˜ao de ordem estrita < em A, podemos falar no CPO (A, ≤) com ≤ induzida por <.
Obs. (Anti)cadeias s˜ao muito importantes na teoria da ordem e no estudo
de proposi¸c˜oes equivalentes ao axioma da escolha (ou seja, nas manifesta¸c˜oes
da n˜ao-construtividade na matem´atica).
Proposi¸ c˜ ao 19. Seja (A, ≤) um CPO.
19.a. Se A possui m´ınimo, ent˜ao ele ´e ´ unico.
Obs. Em caso afirmativo, o m´ınimo ´e denotado por min (A) ou min (A, ≤).
Resultado an´alogo vale para m´aximo, denotado por max (A) ou max (A, ≤);
19.b. Se existir min (A, ≤), ent˜ao existe max (A, ≤ ∗ ) e min (A, ≤) = max (A, ≤ ∗ ).
Analogamente, se existir max (A, ≤), ent˜ao existe min (A, ≤ ∗ ) e max (A, ≤) = min (A, ≤ ∗ );
19.c. Se C ´e uma cadeia de (A, ≤) e D ´e uma anticadeia de (A, ≤), ent˜ao C ∩ D ´e vazio ou unit´ario (isto ´e, C e D tˆem, no m´aximo, um elemento em comum).
Obs. Teoremas curiosos como os de Dilworth e Mirsky exploram este fato.
Quest˜ ao 20. Seja um CPO (A, ≤). Consideremos as rela¸c˜oes R, “ser com- par´avel a”, no CPO dado (isto ´e, xRy ⇐⇒ x e y s˜ao compar´aveis), e S, “ser incompar´avel a” no mesmo CPO (ou seja, xSy ⇐⇒ x e y s˜ao incompar´aveis).
20.a. Observar que R ⊔ S = A × A;
20.b. De quais dos tipos de rela¸c˜ao bin´aria na Defini¸c˜ao 8 R ´e? E S?
Para as defini¸c˜oes de intervalos e segmentos, n˜ao pressuporemos a tota- lidade da ordem na defini¸c˜ao dos intervalos. Tamb´em n˜ao assumiremos que (X, ≤) ´e ilimitado inferior ou superiormente. ´ E interessante o(a) leitor(a) verificar a aplica¸c˜ao destes conceitos em exemplos como os do Item 27.b e os CPOs na Proposi¸c˜ao 29.
Defini¸ c˜ ao 21. Sejam (X, ≤) um CPO, e elementos a, b ∈ X tais que a ≤ b.
Definimos os intervalos com extremidades a e b:
[a, b] < := {x ∈ X|a ≤ x ≤ b} (um intervalo fechado), com o caso particu- lar [a, a] < = {a} (um intervalo fechado degenerado );
]a, b[ < := {x ∈ X|a < x < b} (um intervalo aberto); e
]a, b] < := {x ∈ X|a < x ≤ b}, [a, b[ < := {x ∈ X|a ≤ x < b} (intervalos semiabertos `a esquerda e `a direita, respectivamente).
Obs. ]a, a[ < = [a, a[ < =]a, a] < = ∅.
Dado S ⊆ X, dizemos que:
− S ´e um segmento inicial 13 do CPO (X, ≤) se, e somente se, para cada s ∈ S, todos os elementos de X menores que s tamb´em pertencem a S;
13 Em inglˆes, “initial segment”, “lower set”, “downward closed set”, “down set”, “decreasing
set” ou “semi-ideal”.
− S ´e um segmento final 14 do CPO (X, ≤) se, e somente se, para cada s ∈ S, todos os elementos de X maiores que s tamb´em pertencem a S.
Ex.: Para a ordem usual em
R, os quatro tipos de intervalos com extremida- des a e b definidos acima coincidem com os usuais. J´a os segmentos iniciais s˜ao
Re os intervalos do tipo ] − ∞, b[ ou ] − ∞, b], enquanto os segmentos finais s˜ao
Re os intervalos do tipo ]a, +∞[ ou [a, +∞[.
Ex.: Em
Zmunido de sua ordem usual <
Z:
N´e um segmento final;
Z\
N´e um segmento inicial; [0, 2] <
Z= {0, 1, 2}; [0, 1] <
Z= {0, 1}; [0, 1[ <
Z= {0};
]0, 1] <
Z= {1}; e ]0, 1[ <
Z= ∅ =] − 1001, −1000[ <
Z. Quest˜ ao 22. Seja (A, ≤) um CPO.
22.a. Sob que condi¸c˜oes a uni˜ao de dois intervalos de A ainda ´e um intervalo de A?
22.b. Provar que a interse¸c˜ao de dois intervalos de A ainda ´e um intervalo de A.
Proposi¸ c˜ ao 23. Seja (A, ≤) um CPO.
23.a. A interse¸c˜ao e a uni˜ao de dois segmentos iniciais de A tamb´em s˜ao segmentos iniciais de A. Resultado an´alogo vale para segmentos finais;
23.b. O complemento de um segmento inicial de A ´e um segmento final de A, e vice-versa.
Defini¸ c˜ ao 24. Seja (X, ≤) um CPO. A rela¸ c˜ ao de cobertura ≺ (do CPO ou de ≤ ou de <) ´e dada por: ∀x, y ∈ X, x ≺ y (“x ´e coberto por y”; “y cobre x”) se, e somente se, (x < y e ∄z ∈ X : x < z < y), ou seja, x ´e menor que y mas nenhum elemento de X est´a entre x e y na ordem <, isto
´e, ]x, y [ < = ∅.
O diagrama de Hasse do CPO (X, ≤) ´e um grafo ac´ıclico dirigido (ori- entado) que representa a rela¸c˜ao de cobertura ≺ do CPO da seguinte maneira:
os v´ertices s˜ao os elementos do conjunto X subjacente ao CPO; e, para cada (x, y) ∈ X × X, uma aresta (flecha, seta) vai de y a x se, e somente se, x ≺ y.
Obs. Vide exemplos nos itens 26.b (pensando cada aresta tracejada como uma aresta simples) e 27.b
14 Em inglˆes, “upper set”, “upward closed set” ou “upset”.
Quest˜ ao 25. De quais tipos de rela¸c˜ao bin´aria na Defini¸c˜ao 8 a rela¸c˜ao de cobertura (“´e coberto por”) num CPO ´e?
Proposi¸ c˜ ao 26. Seja (A, ≤) um CPO.
26.a. Se ≤ ´e total, ent˜ao, para cada a ∈ A, existe, no m´aximo, um elemento de A que cobre a;
26.b. A rela¸c˜ao de cobertura ≺ induz uma rela¸c˜ao de ordem estrita em A do seguinte modo: para todo (x, y) ∈ A × A, x ´e menor que y se, e somente se, existe um caminho orientado 15 no diagrama de Hasse de y a x. Deno- taremos, arbitrariamente, esta rela¸c˜ao de ordem estrita por ⋖, como em x⋖y.
Ex.: A = {a, b, c, d, e, f, h}. Pelo diagrama de Hasse abaixo, conclu´ımos, por exemplo, que a ⋖ b e a ⋖ e devido aos caminhos destacados com arestas tracejadas. No entanto, temos que a ≺ b mas a ⊀ e. Por sua vez, na rela¸c˜ao de ordem estrita original, temos que a < b (pois a ≺ b), e a < e, pois: a ≺ g e g ≺ e, donde a < g e g < e e, da transitividade de <, conclu´ımos que a < e.
b
u } r r r r r r r
r r r r r r r o o c o o d
x x
rr rr rr rr rr rr r
a e
u } s s s s s s s
s s s s s s s
e e
▲▲ ▲▲
▲▲ ▲▲
▲▲ ▲▲ ▲
f
o o
g
a i
❑ ❑
❑ ❑
❑ ❑
❑
❑ ❑
❑ ❑
❑ ❑
❑ o o h
26.c. A rela¸c˜ao ⋖ ´e o fecho transitivo da rela¸c˜ao ≺ (Vide Defini¸c˜ao 15 e Proposi¸c˜ao 16);
26.d. A rela¸c˜ao ≺ est´a contida na rela¸c˜ao ⋖ que, por sua vez, est´a contida na rela-
¸c˜ao <, mas ´e poss´ıvel que cada continˆencia seja estrita. Em outras palavras,
∀x, y ∈ A, x ≺ y = ⇒ x ⋖ y = ⇒ x < y, mas a rec´ıproca de cada implica¸c˜ao pode ser falsa.
Obs. Vide contraexemplos no exemplo do Item 26.b e nos itens 32.b e 32.g;
26.e. Se o CPO dado ´e finito (ou seja, o conjunto subjacente A ´e finito), ent˜ao as rela¸c˜oes ⋖ e < s˜ao iguais. Logo, para CPOs finitos, podemos recuperar a rela¸c˜ao de ordem estrita a partir de sua rela¸c˜ao de cobertura;
15 Um caminho orientado (ou dirigido) ao longo de um grafo orientado consiste de um
n´ umero finito de arestas justapostas com mesma orienta¸c˜ ao, ou seja, a extremidade final de
uma aresta chega na extremidade final da pr´ oxima aresta. No caso, a primeira extremidade
inicial ´e y, e a ´ ultima extremidade final ´e x.
26.f. As rela¸c˜oes de ordem usuais de
Ne
Ztˆem as seguintes rela¸c˜oes de cobertura:
∀x, y ∈ X, x ≺ X y ⇐⇒ y = x + 1, onde X =
Ne X =
Z, respectivamente.
Quest˜ ao 27. (As rela¸c˜oes de ordem nos menores conjuntos).
27.a. A rela¸c˜ao vazia no conjunto vazio ´e uma rela¸c˜ao de ordem parcial ? Estrita ? Em caso afirmativo, ´e total/tricotˆomica, respectivamente ?
Sejam os conjuntos C 1 ={a}; b C 2 ={a, b}; b C 3 ={a, b, c}; b C 4 ={a, b, c, d} b e C 5 ={a, b, c, d, e}, onde b a, b, c, d e e s˜ao elementos dois a dois distintos.
27.b. Escrever, explicitamente, todas as rela¸c˜oes de ordem estrita em C 1 e todas em C 2 . Fazer o mesmo, a menos de permuta¸c˜ao dos elementos, em C 3 , em C 4 e em C 5 .
Obs. Para a descri¸c˜ao, podem ser usadas v´arias apresenta¸c˜oes. Por exemplo, uma das rela¸c˜oes de ordem estrita em C 4 ´e dada, dentre outros modos:
− Como rela¸c˜ao bin´aria em C 4 : < = {(a, b); (a, d); (b, d)};
− Na nota¸c˜ao usual para ordem, < diz que: a < b, a < d e b < d;
− Pelas cadeias maximais 16 : a < b < d e c (isto ´e, {a, b, d} e {c});
− Por sua rela¸c˜ao de cobertura, em virtude do Item 26.e:
≺ = {(a, b); (b, d)}, isto ´e, a ≺ b ≺ d;
− Pelo diagrama de Hasse:
a o o b o o d c
Eis outro exemplo em C 4 :
− Como rela¸c˜ao em C 4 : < = {(a, b); (a, c); (a, d); (b, d); (c, d)};
− Na nota¸c˜ao usual para ordem, < diz que: a < b, a < c, a < d, b < d e c < d;
− Pelas cadeias maximais: a < b < d e a < c < d;
− Por sua rela¸c˜ao de cobertura: ≺ = {(a, b); (a, c); (b, d); (c, d)}, isto
´e, a ≺ b ≺ d e a ≺ c ≺ d;
16 Maximais entre as cadeias C 4 com respeito ` a rela¸c˜ ao de ordem parcial ⊆ no Item 29.e.
− Pelo diagrama de Hasse:
b
w w
♣♣ ♣♣ ♣
a d
g g
◆◆ ◆◆ ◆
w w
♥♥ ♥♥ ♥
c
g g
PP PP P
E ainda um terceiro exemplo em C 4 :
− Como rela¸c˜ao em C 4 : < = {(a, b); (a, c); (a, d)};
− Na nota¸c˜ao usual para ordem, < diz que: a < b, a < c, e a < d;
− Pelas cadeias maximais: a < b, a < c, e a < d;
− Por sua rela¸c˜ao de cobertura: ≺ = {(a, b); (a, c); (a, d)}, isto ´e, a ≺ b, a ≺ c e a ≺ a ≺ d;
− Pelo diagrama de Hasse:
b
v v
♥♥ ♥♥ ♥
a o o c d
h h
PP PP P
27.c. Para cada uma das rela¸c˜oes de ordem estrita obtidas no Item 27.b, descrever:
todos os seus elementos minimais, elementos maximais, m´ınimos e m´aximos;
e todas as suas cadeias maximais e anticadeias maximais;
27.d. Repetir o Item 27.c para P (C 4 ), P (C 4 )\{∅} e P (C 4 )\{∅, C 4 } ordenados parcialmente por inclus˜ao (cf. Item 29.a);
27.e. Para cada um dos trˆes exemplos em C 4 usados para descrever apresenta¸c˜oes no Item 27.b, fornecer: todos os segmentos iniciais e finais; e os quatro inter- valos com extremidades a e d.
Quest˜ ao 28. (Ordem discreta). Seja A um conjunto.
28.a. Provar que Id A ´e uma rela¸c˜ao de ordem parcial em A (dita ordem discreta em A), e ´e igual `a sua pr´opria ordem dual;
28.b. Se o n´ umero de elementos de A ´e maior que 1, Id A ´e total ou n˜ao? Justificar;
28.c. Para a ordem discreta num conjunto com mais de 1 elemento, descrever:
todos os seus elementos minimais, elementos maximais, m´ınimos, m´aximos,
intervalos, e segmentos iniciais e finais; e todas as suas cadeias maximais e
anticadeias maximais.
Proposi¸ c˜ ao 29. Seja A um conjunto.
29.a. (P (A), ⊆) ´e um CPO com m´ınimo ∅ e m´aximo A;
29.b. Corol´ ario: As rela¸c˜oes bin´arias em A formam o CPO (P (A × A), ⊆) com m´ınimo ∅ (rela¸c˜ao vazia) e m´aximo A × A;
29.c. Corol´ ario: As rela¸c˜oes bin´arias em A de um tipo particular (Ex.: rela¸c˜oes reflexivas, rela¸c˜oes de ordem estrita, etc.) formam um CPO com rela¸c˜ao de ordem parcial ⊆;
29.d. Id A ´e o m´ınimo do CPO das rela¸c˜oes de ordem parcial em A (cf. Corol´ario 29.c), ou seja, al´em de ser uma delas (pelo Item 28.a), ela est´a contida em todas elas;
29.e. Para toda rela¸c˜ao de ordem parcial ≤ em A, s˜ao CPOs com m´ınimo ∅:
({C ⊆ A | C ´e cadeia de (A, ≤)} , ⊆);
({C ⊆ A | C ´e anticadeia de (A, ≤)} , ⊆);
({C ⊆ A | C ´e intervalo de (A, ≤)} , ⊆);
({C ⊆ A | C ´e intervalo aberto de (A, ≤)} , ⊆);
({C ⊆ A | C ´e intervalo semiaberto `a esquerda de (A, ≤)} , ⊆);
({C ⊆ A | C ´e intervalo semiaberto `a direita de (A, ≤)} , ⊆);
({C ⊆ A | C ´e intervalo semiaberto de (A, ≤)} , ⊆);
({C ⊆ A | C ´e segmento inicial de (A, ≤)} , ⊆); e
({C ⊆ A | C ´e segmento final de (A, ≤)} , ⊆). O m´aximo dos dois ´ ultimos CPOs ´e A. Tamb´em ´e CPO ({C ⊆ A | C ´e intervalo fechado de (A, ≤)} , ⊆).
Obs. Para toda rela¸c˜ao de ordem parcial ≤ em A, os dez conjuntos subja- centes aos CPOs descritos acima s˜ao subconjuntos de P (A). Tais CPOs tˆem suas rela¸c˜oes de ordem (⊆) induzidas do CPO (P (A), ⊆) do Item 29.a;
29.f. Os subconjuntos de uma cadeia tamb´em s˜ao cadeias, e os subconjuntos de uma anticadeia ainda s˜ao anticadeias. Colocando isto em uma forma mais abstrata: ambos os conjuntos {D ⊆ A | D ´e anticadeia de (A, ≤)} e
{C ⊆ A | C ´e cadeia de (A, ≤)} s˜ao segmentos iniciais do CPO (P (A), ⊆).
RELA ¸ C ˜ OES DE ORDEM BOAS E DENSAS
Nesta se¸c˜ao, restringir-nos-emos a conjuntos totalmente ordenados. O
estudo da boa funda¸c˜ao aplicada a rela¸c˜oes de ordem parcial n˜ao-totais ´e
complicado. Boas ordena¸c˜oes e, mais geralmente, boas rela¸c˜oes s˜ao muito
importantes em v´arios t´opicos da matem´atica e tamb´em na teoria da com-
puta¸c˜ao.
Defini¸ c˜ ao 30. Sejam X um conjunto, e ≤ uma rela¸c˜ao de ordem total em X (alternativamente, < uma rela¸c˜ao de ordem estrita tricotˆomica em X). A rela¸c˜ao ≤ (e <) ´e dita uma boa ordena¸ c˜ ao de X, e X ´e bem ordenado por ≤ (e por <) se, e somente se < ´e bem fundada (cf. Defini¸c˜ao 8).
Obs. Adaptando a boa funda¸c˜ao de < para ≤, ao inv´es de:
∀S ⊆ X : S 6= ∅, ∃m ∈ S : ∀s ∈ S, s ≮ m, poder´ıamos escrever:
∀S ⊆ X : S 6= ∅, ∃m ∈ S : ∀s ∈ S, (s ≤ m ⇒ s = m).
Invocando que ≤ ´e total, obtemos a vers˜ao abaixo, mais direta:
∀S ⊆ X : S 6= ∅, ∃m ∈ S : ∀s ∈ S, m ≤ s.
Assim, a boa funda¸c˜ao equivale a todo subconjunto n˜ao-vazio S de X possuir m´ınimo (com rela¸c˜ao `a ordem induzida por ≤ ou < em S).
Defini¸ c˜ ao 31. Sejam X um conjunto, e ≤ uma rela¸c˜ao de ordem total em X (alternativamente, < uma rela¸c˜ao de ordem estrita tricotˆomica em X).
Dizemos que a rela¸c˜ao < (ou ≤) ´e densa se, e somente se:
− X possui dois ou mais elementos distintos; e,
− < ´e uma rela¸c˜ao densa (cf. Defini¸c˜ao 8), ou seja, entre quaisquer dois elementos de X distintos, h´a um terceiro. Mais precisamente:
∀x, y ∈ X, x < y = ⇒ ∃z ∈ X : x < z < y.
Proposi¸ c˜ ao 32.
32.a. Em qualquer conjunto (A, ≤) bem ordenado vale a seguinte propriedade:
∀a ∈ A, ou a = max (A, ≤) ou a ´e coberto por um ´ unico s a ∈ A. (1) s a ´e dito sucessor imediato de a (para efeito de ordem) – cf. Item 26.a.
Ideia de demonstra¸ c˜ ao: Se a n˜ao ´e o m´aximo elemento de A, ent˜ao o elemento s a = min ≤ ({x ∈ A|a < x}) cobre a;
32.b. Toda ordena¸c˜ao densa possui rela¸c˜ao de cobertura vazia;
32.c. Corol´ ario: Toda ordena¸c˜ao densa n˜ao ´e boa. A afirma¸c˜ao contrapositiva (logicamente equivalente e, portanto, tamb´em v´alida) ´e: toda boa ordena¸c˜ao (total) n˜ao ´e densa;
32.d. A ordena¸c˜ao total usual de
N´e boa (e, portanto, n˜ao ´e densa);
32.e. As ordena¸c˜oes totais usuais de
Qe
Rs˜ao densas (e, da´ı, n˜ao s˜ao boas);
32.f. A ordena¸c˜ao total usual de
Znem ´e densa nem ´e boa, mas satisfaz a pro- priedade (1) do Item 32.a. A rela¸c˜ao de ordem estrita de
Zcoincide com sua rela¸c˜ao de ordem ⋖ induzida, no Item 26.b, por sua rela¸c˜ao de cobertura (cf.
Item 26.f), apesar de
Zser infinito − cf. Item 26.e;
Obs. Este ´ ultimo fato n˜ao ´e consequˆencia da propriedade (1) do Item 32.a;
como alguns poderiam suspeitar. O Item 32.g ilustra dois contraexemplos;
32.g. Sejam ω e ω e dois elementos distintos um do outro e de todos os n´ umeros naturais. Sejam A =
N⊔ {ω}, e B = A ⊔ { e ω}. Sejam < N a ordem usual de
N