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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC-SP Thalita Abdala Aris

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Thalita Abdala Aris

Improbidade administrativa no Direito Eleitoral

Mestrado em Direto Constitucional

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Thalita Abdala Aris

Improbidade administrativa no Direito Eleitoral

Mestrado em Direito Constitucional

Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Constitucional, sob a orientação do Professor Doutor Antônio Carlos Mendes.

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Banca Examinadora:

_______________________________

_______________________________

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Em primeiro lugar, agradeço ao meu orientador, professor Antônio Carlos Mendes, por todos esses anos de aprendizado, seja como advogada da Mendes Advogados Associados, seja como assistente nas aulas de Direito Constitucional e Eleitoral da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, responsável por apresentar-me o Direito Eleitoral e sem o qual este trabalho não se faria possível. Tenho o privilégio, como poucos, de receber diariamente os seus ensinamentos, transmitidos com humildade, enorme generosidade e maestria. Terá sempre o meu respeito e admiração.

À minha querida amiga Bartira, que, mais do que ninguém, acompanhou de perto cada passo tomado para a execução desse trabalho, ouvindo pacientemente minhas dúvidas, teorias e mudanças de planos, auxiliando-me a decidir com mais clareza. Agradeço por sua amizade, por seu companheirismo, pelas broncas quando perdia o foco e, principalmente, por me consolar, tantas e tantas vezes, nos meus momentos de desânimo, sempre com um abraço carinhoso à disposição.

Ao meu amor, Omar, por tornar mais doce esses complicados meses de conclusão da dissertação. Agradeço por sua inesgotável paciência, por seu incentivo constante para que eu seguisse firme e adiante, por sua compreensão em relação às minhas necessárias reclusões e por estar sempre ao meu lado, me apoiando.

Aos meus colegas da Mendes Advogados Associados, os quais, cada um à sua forma, auxiliaram-me a concluir essa etapa, como uma grande família, estando aqui representados pela Dra. Sônia Mendes, a quem agradeço pelas revisões realizadas e pelas orientações gentilmente transmitidas para a elaboração desta dissertação.

Ao meu querido amigo Rafael Motta e Corrêa, mestre nota dez, por sua amizade de irmão, por sua preocupação e alerta com relação aos meus prazos e regras do mestrado, e pelas risadas proporcionadas nos momentos de desespero. Agradeço também aos meus queridos Marina Feferbaum e Bruno Lorenci, amigos a quem, quando pedi ajuda, já estavam com o braço estendido, oferecendo-a. A todos os meus estimados amigos, especialmente os do clube Sírio e os do Mackenzie, de quem me ausentei temporariamente por conta dos estudos e que, mesmo assim, jamais me abandonaram. Sem vocês tudo ficaria sem graça.

À minha amiga e eterna mestra, Marisa Gaieski, meu mais sincero agradecimento. Ainda que não tenhamos hoje em dia um contato diário, suas lições, sua conduta íntegra e sua generosidade serão sempre um exemplo a seguir.

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O Brasil se inscreveu no rol dos povos livres. Contentou-se, porém, com a fachada.

Falta-lhe o espírito da democracia, por lhe carecer a base da cultura, e o exercício da liberdade política.

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ARIS, Thalita Abdala. Improbidade administrativa no Direito Eleitoral. 231 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.

O presente trabalho tem por escopo analisar os princípios da moralidade administrativa e da probidade administrativa no Direito Eleitoral, especialmente para fins de representação política, tendo por fundamento de validade para a análise do tema os artigos 14, § 9º, e 15, V, da Constituição Federal de 1988. Será analisada a Lei Complementar nº 64/90, recentemente alterada pela Lei Complementar nº 135/2010, esta última chamada vulgarmente de “Lei da Ficha Limpa”, que prevê hipóteses de inelegibilidade que visam à proteção da probidade administrativa e da moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato. Os julgados do Supremo Tribunal Federal que trataram da constitucionalidade da Lei Complementar nº 135/2010 merecerão especial destaque, tendo em vista que jamais no Brasil se debateu tanto a respeito da moralidade administrativa e da sua relação com a capacidade eleitoral passiva. Além disso, serão verificadas as hipóteses taxativas de improbidade administrativa, que têm relevância para o Direito Eleitoral, observando-se os contornos estabelecidos pela Lei nº 8.429/92. As previsões concernentes à improbidade administrativa no Direito Eleitoral são aquelas previstas no artigo 15, V, da Constituição Federal de 1988, no artigo 1º, I, alíneas “g” e “l”, da Lei Complementar nº 64/90 e no artigo 73, “caput” e § 7º, da Lei nº 9.504/97, dispositivos que serão analisados especificamente.

Ante a escassez de doutrinas a respeito do tema, este será analisado com base num enfoque jurisprudencial, observando-se os requisitos legalmente previstos que asseguram a moralidade e a probidade administrativas, elementos indissociáveis do mandato político.

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ARIS, Thalita Abdala. Administrative Improbity in Electoral Law. 231 f. Dissertation (Master in Law) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.

The present work has the scope to analyze the principles of administrative morality and administrative probity within the Electoral Law, specially for the purposes of political representation, based on the articles 14, § 9, and 15, V, of the 1988 Federal Constitution. An assessment will be made of the Complementary Law nº 64/90, recently altered by the Complementary Law nº 135/2010, the later being commonly known as “Clean Record Law”, which foresees hypothesis for ineligibility aiming to protect the administrative probity and the morality for the term to come, considering the previous life of the candidate. The decisions of the Federal Supreme Court which dealt with the constitutionality of the Complementary Law nº 135/2010 will be highlighted, given that the discussion on administrative morality and its relation with the right to stand for election has never been on the spotlight such as on these days. The foreseen hypothesis of administrative improbity that are relevant to the Electoral Law will also be verified, by observing the outlines established by the Law nº 8.429/92. The provisions concerning the administrative improbity on Electoral Law are those on the article 15, V, of the 1988 Federal Constitution, article 1, I, items “g” and “l”, of the Complementary Law nº 64/90 and article 73, “caput” and § 7, of the Law nº 9.504/97, which will be assessed

specifically. Due to the scarcity of doctrines on this theme, it will be analyzed under a jurisprudential approach, with attention to the legal requisites that assure the morality and administrative probity, inextricable elements of a political term.

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ADC Ação Declaratória de Constitucionalidade ADI Ação Direita de Inconstitucionalidade

ADPF Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental AMB Associação dos Magistrados Brasileiros

CF Constituição Federal

EC Emenda Constitucional

IPC Índice de Percepções de Corrupção

LC Lei Complementar

OAB Ordem dos Advogados do Brasil

RE Recurso Extraordinário

REsp Recurso Especial

STF Supremo Tribunal Federal

STJ Superior Tribunal de Justiça

TCU Tribunal de Contas da União

TRE Tribunal Regional Eleitoral TSE Tribunal Superior Eleitoral

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1 DEMOCRACIA ... 13

1.1 Conceito de democracia ... 13

1.2 Democracia representativa, mandato político e voto ... 16

1.3 Democracia e direito eleitoral ... 21

2 O DIREITO ELEITORAL NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 ... 23

2.1 Estrutura da Justiça Eleitoral ... 23

2.2 Cidadania, pluralismo politico e participação popular ... 27

2.3 Direitos políticos e partidos políticos ... 33

3 DIREITOS POLÍTICOS ... 38

3.1 Elegibilidade e inelegibilidade na Constituição Federal de 1988 ... 38

3.2 Casos de perda e suspensão dos direitos políticos ... 44

3.3 Legislação extravagante ... 47

4 PRINCÍPIOS DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA E DA PROBIDADE ADMINISTRATIVA ... 50

4.1 Noção geral sobre princípios jurídicos ... 50

4.2 Princípio da moralidade administrativa ... 57

4.3 Princípio da probidade administrativa ... 70

5 MORALIDADE ADMINISTRATIVA E ELEGIBILIDADE ... 88

5.1 Corrupção, moralidade administrativa e o Direito Eleitoral ... 88

5.2 Improbidade administrativa no Direito Eleitoral ... 103

5.3 Análise jurisprudencial do tema ... 109

6 VIDA PREGRESSA DO CANDIDATO, PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA, SEGURANÇA JURÍDICA, IRRETROATIVIDADE DAS LEIS E ANTERIORIDADE ELEITORAL ... 112

6.1 Dados históricos ... 112

6.1.1 Consulta TSE n. 1.621 e Recurso Extraordinário n. 86.297 ... 113

6.1.2 Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 144 ... 118

6.1.3 Comentários aos julgados anteriores à Lei Complementar n. 135/2010 ... 124

6.2 Lei Complementar nº 135/2010 ... 126

6.2.1 Recursos Extraordinários n. 631.102 e 630.147 (caso Jader Barbalho) ... 127

6.2.2 Recurso Extraordinário nº 633.703 (anterioridade eleitoral) ... 134

6.2.3 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.578 e Ações Declaratórias de Constitucionalidade nº 29 e nº 30 ... 143

6.2.4 Comentários aos julgados relativos à Lei Complementar nº 135/2010 ... 155

6.2.4.1 Anterioridade eleitoral ... 158

6.2.4.2 Presunção de inocência ... 159

6.4.2.3 Irretroatividade das leis ... 166

6.2.4.4 Soberania popular ... 168

7 HIPÓTESES DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NO DIREITO ELEITORAL .. 175

7.1 Interpretação do artigo 15, V, da Constituição Federal de 1988 ... 175

7.2 Artigo 1º, I, “g”, da Lei Complementar nº 64/90: rejeição de contas públicas ... 177

7.3 Artigo 1º, I, “l”, da Lei Complementar nº 64/90: ação de improbidade administrativa 189 7.4 Artigo 73 da Lei nº 9.504/97: condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais ... 197

CONCLUSÃO ... 213

(11)

INTRODUÇÃO

A forma de organização política de uma sociedade constitui elemento fundamental para definir como se dará o seu desenvolvimento.

De acordo com a evolução do homem, a democracia se firmou como o regime que melhor atende aos anseios da população, especialmente a partir do seu conceito verificado com a Revolução Francesa, quando o poder político passou a ser organizado por uma Constituição, tendo por princípios a garantia aos direitos fundamentais e a maior participação dos cidadãos nas decisões políticas.

O modelo representativo de democracia, no qual o representante político toma decisões em nome de toda coletividade, se mostrou o mais adequado para atender à complexidade das relações econômicas, sociais e políticas verificadas nas sociedades contemporâneas.

Nesse sentido, tendo em vista a relevância da atividade exercida pelos mandatários do poder, imperioso que exerçam sua função de forma reta, proba, séria, comprometida, ostentando conduta ilibada e honesta, valores que são indissociáveis da figura do representante político em um Estado Constitucional.

Além do voto — que constitui importante instrumento democrático no combate à má administração pública, permitindo que, através das eleições, não sejam reconduzidos ao poder os mandatários que deixaram de representar adequadamente a população —, o ordenamento jurídico deve ainda prever outros mecanismos para garantir a moralidade e a probidade administrativas no exercício do mandato.

(12)

Com efeito, será conferida especial atenção aos artigos 14, § 9º, e 15, inciso V, ambos da Constituição Federal, que tratam, respectivamente, da moralidade e da probidade administrativas para fins de elegibilidade e da suspensão dos direitos políticos em caso de condenação por improbidade administrativa.

Além disso, será verificada a legislação extravagante em Direito Eleitoral que versa sobre o tema, destacando-se a Lei Complementar nº 135/2010, que conferiu nova redação à Lei Complementar nº 64/90 (Lei das Inelegibilidades), de forte conteúdo ético e que, com base na vida pregressa dos candidatos, restringiu a capacidade eleitoral passiva; e a Lei nº 9.504/97, Lei das Eleições, especialmente na parte que trata das condutas vedadas aos agentes públicos em campanha, que correspondem a atos de improbidade administrativa.

Cabe salientar que a moralidade administrativa, por se tratar de um princípio, não incidirá apenas em determinadas situações previstas em lei. Tal princípio regerá todo e qualquer ato havido na esfera eleitoral, funcionando como um vetor para a interpretação das normas de Direito Eleitoral, motivo pelo qual não serão verificadas hipóteses específicas que visam a sua proteção, uma vez que espalhadas por toda legislação eleitoral.

Por outro lado, os atos de improbidade administrativa, ante a gravidade de suas sanções, deverão vir expressamente previstos na legislação eleitoral e deverão passar, necessariamente, pela disciplina conferida pela Lei nº 8.429/92, Lei de Improbidade Administrativa, motivo pelo qual serão verificadas cada uma das hipóteses legais que dispõem sobre os atos de improbidade administrativa em matéria eleitoral, bem como a disciplina contida na Lei nº 8.429/02.

De fato, a incidência dos princípios da moralidade administrativa e da probidade administrativa no Direito Eleitoral constitui tema pouco explorado pela doutrina.

(13)

Cabe salientar que os julgados que discutiram a constitucionalidade da Lei Complementar nº 135/2010, chamada vulgarmente de “Lei da Ficha Limpa”, consistirão em importante objeto de pesquisa, seja pela riqueza dos fundamentos contidos nos votos proferidos, seja pelo fato de que tais decisões enfrentaram exatamente a questão da moralidade e da probidade administrativas para fins de elegibilidade, tratando-se de divisor de águas para o Direito brasileiro no que diz respeito ao tema.

Conforme se buscará demonstrar, não há como se pensar em representação política sem que haja o respeito à probidade e à moralidade administrativas, valores inerentes à própria função do mandatário e que vêm sendo cada vez mais enaltecidos pela sociedade brasileira — descontente com os escândalos de corrupção na política noticiados regularmente —, sendo que especialmente aquele que praticou ato de improbidade administrativa não ostenta conduta condizente com o mandato político.

(14)

1 DEMOCRACIA

1.1 Conceito de democracia

O homem, como ser eminentemente social, vem, ao longo do tempo, aperfeiçoando a forma de se organizar para viver harmonicamente em sociedade. De acordo com as regras de comportamento e a forma de poder político, cada agrupamento humano comporá a sua própria ordem jurídica, conforme destaca Dalmo Dallari:

O ser humano é naturalmente associativo, tem necessidade de convivência, e esta, por sua vez, cria a necessidade de regras de comportamento, como também de um centro de poder que assegure a coesão e a harmonia do grupo, inclusive o respeito às regras estabelecidas. Assim, cada agrupamento humano permanente desenvolve seus costumes, que incluem um conjunto de normas de comportamento e uma forma de poder político. Desse modo se constituem os povos, com suas respectivas ordens jurídicas.1

Com relação ao poder político, partiremos de dois marcos históricos de interesse para o presente estudo: a Independência dos Estados Unidos da América, em 1776, e, especialmente, a Revolução Francesa, em 1789, inspirada nos ideais de igualdade, liberdade e fraternidade, movimento que culminou na elaboração da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, e, em seguida, na primeira Constituição francesa.

A partir de tais movimentos, liderados pela burguesia ascendente, que se insurgiu contra as monarquias absolutistas, objetivando o respeito à liberdade e aos direitos individuais e uma maior participação no poder, as regras básicas de organização política passaram a ser reunidas sob a forma de um instrumento jurídico denominado Constituição, de aspirações democráticas, ao qual o governante também deveria se submeter.

A organização do poder político por meio de uma Constituição, com o objetivo de fortalecer o ideal democrático, corresponde ao modelo verificado nos dias atuais, especialmente pelos povos ocidentais.

(15)

Nesse sentido, ao falarmos dos ideais democráticos almejados pelo Estado Constitucional,2 importante definirmos “democracia”, conceito que está intimamente ligado aos princípios da moralidade e da probidade administrativa no que se refere à elegibilidade, conforme veremos no decorrer do presente estudo.

A democracia, que tem origem na Grécia antiga, pode ser definida atualmente, nos termos do discurso proferido por Abraham Lincoln, como o governo “do povo, pelo povo e para o povo”. Trata-se do regime político no qual o poder advém da vontade do povo, constituindo, conforme salienta José Afonso da Silva, o “meio e instrumento de realização de valores essenciais de convivência humana”, onde se verifica o respeito e a tolerância entre os conviventes.3

O autor português J. J. Gomes Canotilho, ao definir democracia, ressalta a possibilidade de destituição dos dirigentes e de revogação dos mandatos, afirmando tratar-se

de “forma ou técnica processual de seleção e destituição pacífica de dirigentes” e,

remetendo-se à fórmula do Karl Popper, consigna que a democracia “nunca foi a soberania do povo, não o pode ser, não o deve ser”.4

Hans Kelsen salienta que “politicamente livre é quem está sujeito a uma ordem jurídica de cuja criação participa” e, nesse sentido, afirma que “democracia significa que a

‘vontade’ representada na ordem jurídica do Estado é idêntica às vontades dos sujeitos”,

sendo o seu oposto a escravidão da aristocracia.5

Em obra que trata especificamente da democracia, Hans Kelsen, além de afirmar que democracia significa identidade entre governantes e governados, entre o sujeito e o objeto de poder, tratando-se de governo do povo sobre o povo, indica como sua “essência e valor” a liberdade (da qual decorre a igualdade), o povo, o parlamento, a representação, o princípio da maioria e a escolha dos chefes de governo, consignando ser a liberdade seu princípio

2 Conforme Jorge Miranda, “significa Estado assente numa Constituição reguladora tanto de toda a sua

organização como da relação com os cidadãos e tendente à limitação do poder.” (MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Coimbra: Coimbra, 2002, p. 71).

3 SILVA, José Afonso. O sistema representativo, democracia semidireta e democracia participativa. Revista do

Advogado. São Paulo: AASP, 2003, p. 94.

4 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed., Coimbra:

2003, Almedina, p. 291-292.

5 KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. Tradução Luís Carlos Borges. 3. ed., São Paulo:

(16)

fundamental, pois repercute em todos esses outros elementos, principalmente na noção de povo.6

Alf Ross sustenta que a palavra “democracia” possui uma multiplicidade de sentidos, dividindo-os, (i) quanto à sua forma, tendo-se o sentido político-jurídico; e (ii) quanto ao seu conteúdo, tendo-se os sentidos econômico e humano.

Com relação ao sentido jurídico, define a democracia como regime de governo, ou seja, a forma com que o Estado está organizado, segundo a sua Constituição, ou, ainda, como um modelo de funcionamento do Estado no qual o povo, em sua totalidade, ou em grandes grupos de indivíduos, tem influência suprema ou decisiva no que se refere ao exercício da autoridade pública.

Com relação ao seu conteúdo, trata da democracia econômica ou verdadeira, efetiva ou real, que corresponde à ordem econômica que visa nivelar a desigualdade econômica existente entre as diferentes classes, favorecendo os mais oprimidos. Trata, ainda, da democracia em sentido humano, vista como uma atitude ou forma de vida, no que diz respeito à vida familiar, às relações sociais, à educação e formação dos filhos, ou seja, em toda relação entre homem e homem.7

Paulo Bonavides, ao definir democracia, ressalta o povo como sujeito ativo e passivo do poder: “A democracia é aquela forma de exercício da função governativa em que a vontade soberana do povo decide, direta ou indiretamente, todas as questões de governo, de tal sorte que o povo seja sempre o titular e o objeto — a saber, o sujeito ativo e o sujeito passivo de todo o poder legítimo”.8

Para Antônio Carlos Mendes, a democracia política constitui “princípio estrutural do Estado Democrático”, assentado na forma de governo segundo a qual “o poder político ou a

6 KELSEN, Hans. La democrazia. Tradução Giogio Melloni. 4. ed., Bologna: Il Mulino, 1981, p. 50-51. 7 ROSS, Alf. Por que democracia? Tradução Roberto J. Vernengo. Madri: Centro de Estudios Constitucionales,

1989, p. 83/84.

8 BONAVIDES, Paulo. Democracia direta: a democracia do terceiro milênio.

In: RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes;

(17)

soberania é exercida pelo Povo e não por uma pessoa ou um grupo específico e

determinado.”9

Por fim, trazemos o conceito de democracia por Jorge Carpizo, embasado no procedimento definido pela Constituição, que deve garantir os direitos fundamentais:

[...] democracia es el sistema en el cual los gobernantes son electos periódicamente por los electores; el poder se encuentra distribuido entre varios órganos con competencias propias y con equilibrios y controles entre ellos, así como responsabilidades señaladas en la Constitución con el objeto de asegurar los derechos fundamentales que la propia constitución reconoce directa o indirectamente.10

Conforme destaca Carlos Mario da Silva Velloso, há indicadores próprios ao regime democrático, sendo eles: a participação do povo, o sufrágio universal, a divisão de poderes e o pluralismo.11

Pelos conceitos supracitados entendemos como característica própria da democracia o fato de o povo ostentar a titularidade do poder político, o qual será organizado de acordo com a Constituição de cada Estado.

1.2 Democracia representativa, mandato político e voto

Delineada a noção de democracia, cabe agora verificarmos o seu modelo representativo, sucessor da democracia direta praticada na Grécia antiga, na qual as decisões políticas eram tomadas diretamente pelo povo, em assembleia popular.

Com relação ao originário modelo grego, destaca Hans Kelsen que, ainda que se praticasse a democracia direta, o princípio democrático era consideravelmente restringido, tendo em vista que “nem todos os membros da comunidade têm, em absoluto, direito de tomar parte nas deliberações e decisões da assembleia popular”.12

9 MENDES, Antônio Carlos. Introdução à teoria das inelegibilidades. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 17. 10 CARPIZO, Jorge. Concepto de democracia y sistema de gobierno en América Latina. Lima: Idemsa, 2008,

p. 110.

11 VELLOSO, Carlos Mario da Silva. A reforma eleitoral e os rumos da democracia no Brasil. In: ROCHA,

Cármen Lucia Antunes; VELLOSO, Carlos Mario da Silva (Coords.). Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 1996, p. 24.

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Conforme destaca Friedrich Muller, “‘povo’ não é um conceito simples nem um conceito empírico; povo é um conceito artificial, composto, valorativo; mais ainda, é e sempre foi um conceito de combate”. De acordo com dados históricos, verifica-se que o povo, desejado pelos “donos do poder”, foi manipulado ou criado à força. Em um Estado Constitucional, porém, o povo tem mais raramente a função de “ícone de uma legitimidade ilusória”, tendo-se o povo como “povo ativo”, “instância de legitimação global” e

“destinatário de prestações civilizatórias do estado”, revaloração que torna a sociedade mais

democrática.13

Cabe observar que, para Alf Ross, jamais existiu, e não haverá possibilidade de existir, uma democracia direta, perfeitamente completa e pura. Até na sua forma mais primitiva, não havia a possibilidade de que todos os atos — legislativos, judiciais e administrativos — passassem por um plebiscito, ficando parte deles a cargo de órgãos especiais, particularmente ao rei.14

O fato é que, após os movimentos havidos no século XVIII, o conceito de democracia foi revisto. Além da modificação do que se entendia por “povo”, o crescimento das populações e a maior complexidade das relações econômicas, sociais e políticas na Idade Contemporânea tornaram inviável o exercício da democracia de forma direita, adotando-se, dessa forma, o modelo representativo de democracia.

Esclarece Norberto Bobbio que o significado descritivo geral do termo “democracia” não se alterou com o passar dos séculos. Foi mantido o titular do poder político, qual seja, o povo, sendo que a mudança, portanto, entre o que se chama de democracia dos “antigos” e a democracia dos ”modernos” reside no modo de exercer esse direito, passando-se da democracia direta para a democracia representativa.15

13 MULLER, Friedrich. Quem é o povo: a questão fundamental da democracia. Tradução Peter Naumann. 6. ed.,

São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. Revisão Paulo Bonavides, p. 102-104. O autor define “povo ativo” como sujeito de dominação através de uma assembleia constituinte, eleições, iniciativa popular, referendo; “instância de legitimação global” como os agentes jurídicos que chegam ao seu cargo não por eleição do povo, proferindo, porém, as decisões em nome do povo, destinatário das prescrições; e “destinatário das prestações civilizatórias” como a proteção constitucional e infraconstitutcional daqueles que se encontram num dado território.

14 ROSS, Alf. Por que democracia. Op. cit., p. 201.

15 BOBBIO, Norberto. Liberalismo e democracia. Tradução Marco Aurélio Nogueira. São Paulo: Brasiliense,

(19)

A democracia representativa é definida por Hans Kelsen como “uma democracia na qual a função legislativa é exercida por um parlamento eleito pelo povo, e as funções administrativa e judiciária, por funcionários igualmente escolhidos por um eleitorado”.16

No mesmo sentido, José Afonso da Silva ressalta que, na democracia representativa, o povo, “fonte primária do poder”, em razão da extensão territorial, da densidade demográfica e da complexidade dos problemas sociais, não pode dirigir os negócios do Estado diretamente, motivo pelo qual “outorga as funções de governo aos seus representantes, que elege

periodicamente”.

Nesse sentido, na democracia representativa tem-se uma participação popular

“indireta, periódica e formal, por via das instituições eleitorais que visam a disciplinar as

técnicas de escolha dos representantes do povo”.17

Para Norberto Bobbio,18 a democracia representativa corresponde à “forma de governo em que o povo não toma ele mesmo as decisões que lhe dizem respeito, mas elege seus próprios representantes, que devem por ele decidir”, sendo-lhes outorgado um mandato.

Alf Ross, ao tratar da ideologia do modelo representativo, destaca a falibilidade do homem, consignando a importância de se eleger representantes confiáveis que, ao defenderem os interesses coletivos, exercerão melhor a função do que o povo em si mesmo poderia fazer:

Las decisiones populares directas son falibles, no sólo porque el pueblo frecuentemente se equivocará sobre lo que beneficia, sea por ignorancia, por inconstancia o por miopía, sino también porque muchas veces la mayoría se dejará arrastrar por siniestros intereses particulares, a expensas de una consideración razonable de los intereses minoritarios. La función del Pueblo no es, pues, y fundamentalmente, la de legislar, sino la de elegir a una élite de representantes confiables y de jefes cuya función consistirá en proteger los intereses de todos, mucho mejor de lo que el pueblo mismo pueda hacer directamente, conduciéndolo hacia los objetivos que mejor concuerden con sus verdaderos intereses y su voluntad constante.19

16 KELSEN, Hans. Teoria Geral... Op. cit., p. 413.

17 SILVA, José Afonso. O sistema representativo... Op. cit., 2003, p. 97. 18 BOBBIO, Norberto. Liberalismo... Op. cit., p. 33-34.

(20)

Com efeito, a representação popular é exercida através de mandato, credenciando o mandatário ao exercício do poder, “com liberdade absoluta para agir, buscando o melhor para o seu titular, o povo”, motivo pelo qual o mandato eletivo é tido por Djalma Pinto como “a mais notável conquista para a consolidação da democracia, cuja característica reside em atribuir aos cidadãos a exclusiva titularidade do poder”.20

O mandato, de acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello, corresponde ao “ponto de referência para a efetivação da democracia”,21 sendo concebido da seguinte forma por Geraldo Ataliba: “Pedra de toque do sistema, o mandato põe-se como ponto de referência dos demais institutos informadores da República. Estes devem ser estudados e avaliados em função daqueles”. O jurista ainda destaca duas características essenciais do mandato, quais sejam, a periodicidade (possibilidade de alternância do poder) e a responsabilidade (prestação de contas e fiscalização pelos mandantes).22

Por oportuno, cabe salientar que a noção que temos hoje por mandato representativo, derivada das lições de Montesquieu e Sieyès, afastou-se do modelo de mandato imperativo23 havido na França entre os séculos XVII e XVIII.

Conforme esclarece Manoel Gonçalves Ferreira Filho, o mandato representativo confere ao representante o poder de decisão sobre os meios e modos de realizar o bem geral, desvinculando-o juridicamente da vontade dos seus eleitores, tendo apenas o dever moral de observá-la.24 Nesse sentido, abandonam-se os interesses particulares em prol do interesse geral.

O modelo contemporâneo, ou de “representação livre”, foi objeto de crítica por Hans Kelsen, que afirma tratar-se de “representaçãoficta”, na qual os eleitos não são responsáveis juridicamente perante o eleitorado, em contraposição ao modelo do mandato imperativo.

20 PINTO, Djalma. Direito Eleitoral: improbidade administrativa e responsabilidade fiscal: noções gerais. São

Paulo: Atlas, 2003, p. 89.

21 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Representatividade e democracia. In: ROCHA, Cármen Lucia

Antunes; VELLOSO, Carlos Mario da Silva. (Coords.). Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 1996, p. 41.

22 ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. 3. ed., São Paulo: Malheiros, 2011, p. 92.

23 O mandato imperativo consiste em modelo francês de representação, anterior à Revolução Francesa, no qual o

parlamentar eleito ficava juridicamente obrigado a seguir a vontade dos seus eleitores (ATALIBA, Geraldo. Op. cit., p. 94-98). Os representantes eram meros porta-vozes das comunidades que os designavam, tratando-se de mandato assimilável ao de Direito Privado (FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 31. ed., São Paulo: Saraiva, 2005, p. 84-85).

(21)

Consignou que tal independência jurídica do representante se afasta do próprio conceito de representação política, sendo o princípio democrático substituído pela divisão de trabalho.25

O mandato representativo, de fato, confere independência ao representante diante do corpo eleitoral. Contudo, a população poderá contar, quando da realização das eleições, com instrumento democrático para fazer valer a sua vontade, qual seja, o voto.

A hoje Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha destaca a importância do voto: “Voto é poder. O voto é o verbo mais vigoroso do cidadão. É a sua voz que se faz soar para a plenificação da democracia representativa”.26

Meirelles Teixeira enfatiza a relevância do voto como instrumento que torna efetiva a titularidade do poder político pelo povo, sendo através do voto que se exercita a soberania e se concretiza a democracia:

É pelo voto que se exerce a soberania, isto é, se adotam as decisões políticas fundamentais, os princípios jurídicos supremos de organização do Estado e de realização dos fins estatais, expressos todos na Constituição. É ainda pelo voto que se instituem os órgãos governamentais que, em nome do povo, devem exercer a soberania. É pelo voto que se concretiza, enfim, o governo democrático, como já vimos, baseado no consentimento, na adesão livre, da maioria dos cidadãos, por aqueles fatores de consciência, de eficácia psicológica, que um sistema de normas, ou um programa de vida comum, exerce na alma dos homens. É pelo voto, afinal, que se realiza no Estado, aquele “status” de equilíbrio, resultante das diferentes tendências contidas nas vontades e opiniões de conteúdo político, existentes na comunidade estatal.27

José de Alencar afirmou que o voto é “o limite natural não somente de um ramo do poder, mas de todo poder”, atuando como uma membrana em toda a circunferência do governo, “de modo que não se penetra neste sem atravessar aquelle”.28 Ressaltou, de forma

25 KELSEN, Hans. Teoria Geral... Op. cit., p. 413.

26 ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Justiça Eleitoral e representação democrática.

In: ROCHA, Cármen Lucia

Antunes; VELLOSO, Carlos Mario da Silva (Coords.). Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Del Rey, 1996, p. 377.

27 TEIXEIRA, José Horácio Meirelles. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense Universitária,

1991, p. 503-504.

28 ALENCAR, José de. Systema Representativo. Brasília: Senado Federal, 1997. Edição fac-similar. 1. ed., Rio

(22)

categórica, sua relevância: “O voto não é, como pretendem muitos, um direito político, é mais que isso, é uma fracção da soberania nacional; é o cidadão.”29

Portanto, não obstante a representação política contemporânea tenha por princípio a irresponsabilidade do eleito em relação aos eleitores, o voto corresponde a importante ferramenta democrática para que não mais sejam eleitos os políticos que deixaram de atender à vontade popular.

Cabe ainda ressaltar que, conforme o modelo representativo de democracia, o eleito tomará decisões em nome do povo, que lhe confiou as funções de governo, motivo pelo qual deve agir de forma proba, reta, digna, conduta inerente à representação política, conforme será analisado oportunamente.

1.3 Democracia e direito eleitoral

Conforme sustenta Antônio Carlos Mendes, “a possibilidade da realização dos postulados democráticos repousa na eficácia dos instrumentos de Direito Eleitoral”, sendo o Direito Eleitoral a fonte de legitimação da Constituição e, portanto, das instituições jurídicas de uma nação.30

Djalma Pinto conceitua o Direito Eleitoral como “o ramo do Direito Público que disciplina a criação dos partidos, o ingresso do cidadão no corpo eleitoral para fruição dos direitos políticos, o registro de candidatura, a propaganda eleitoral, o processo e a investidura no mandato eletivo”.31

Afirma ainda que o Direito Eleitoral tem papel fundamental para a sobrevivência da democracia, pois delimita o caminho de acesso ao poder político, onde todas as decisões são tomadas, atingindo a vida dos cidadãos e, desta forma, conclui que “Somente pela via do Direito Eleitoral alguém chega, legitimamente, ao exercício do poder político”.32

29 ALENCAR, José de. Op. cit., p. 76.

30 MENDES, Antônio Carlos. Op. cit., p. 18-19. 31 PINTO, Djalma. Op. cit., p. 29.

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Conforme definição de Fávila Ribeiro, o Direito Eleitoral dedica-se ao estudo das normas e procedimentos que organizam e disciplinam o funcionamento do poder de sufrágio popular, de modo a que se estabeleça a precisa adequação entre a vontade do povo e a atividade governamental”.33

Conforme destaca Adilson Abreu Dallari, ao tratar de moralidade e elegibilidade,

“para que se tenha um país verdadeiramente democrático, voltado para a realização da justiça

social e para a igualdade concreta de todos os brasileiros é absolutamente necessário o aperfeiçoar o sistema eleitoral e partidário”.34

Portanto, conforme se observa, o desenvolvimento do regime democrático dependerá, diretamente, das normas de Direito Eleitoral consagradas no Texto Constitucional. Por essa razão, trataremos no capítulo seguinte da disciplina concernente ao Direito Eleitoral contida na Constituição Federal de 1988, especialmente no que diz respeito às regras que regulamentam a capacidade eleitoral passiva.

33 RIBEIRO, Fávila. Direito Eleitoral. 2. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 12.

34 DALLARI, Adilson Abreu. Inelegibilidade, moralidade e legitimidade dos pleitos. Cadernos de Direito

(24)

2 O DIREITO ELEITORAL NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

2.1 Estrutura da Justiça Eleitoral

Marco da redemocratização nacional, a Constituição Federal hoje vigente, promulgada em 5 de outubro de 1988, fundou-se na dignidade da pessoa humana e na busca de uma sociedade justa e solidária. A Carta, conforme destaca Luís Roberto Barroso, “foi capaz de promover, de maneira bem-sucedida, a travessia de um regime autoritário, intolerante e, por vezes, violento para um Estado democrático de direito”.35

Nesse sentido, passamos de um regime autoritário, que restringia fortemente as liberdades individuais e promovia indiscriminadamente a cassação dos direitos políticos dos seus opositores, para um regime democrático, garantidor dos direitos individuais, que indica a cidadania, o pluralismo politico e a democracia como princípios fundamentais do Estado de Direito.

Antes de analisarmos os direitos políticos, cabe verificarmos como a Constituição Federal de 1988 organiza a Justiça Eleitoral, órgão especializado do Poder Judiciário que exerce atividade jurisdicional, administrativa e regulamentar,36 conforme competências definidas tanto no Texto Constitucional quanto no Código Eleitoral, Lei nº 4.737/1965.

Conforme o artigo 118 da Constituição Federal são órgãos da Justiça Eleitoral o Tribunal Superior Eleitoral, os Tribunais Regionais Eleitorais, os Juízes Eleitorais e as Juntas Eleitorais.

De acordo com o disposto nos artigos 119 e 120 do Texto Constitucional, que tratam, respectivamente, da composição do Tribunal Superior Eleitoral e dos Tribunais Regionais Eleitorais, podemos observar que a Justiça Eleitoral não é organizada em carreira, formando-se mediante a reunião de magistrados e advogados para exercício de mandatos de dois anos e

35 BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a

construção do novo modelo. 2. ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p. 246.

36“A Justiça Eleitoral brasileira é um ramo especializado do Poder Judiciário, com atuação em três esferas:

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por, no máximo, dois biênios consecutivos, conforme disposto no artigo 121, § 2º, da CF/88,

in verbis:

Art. 119. O Tribunal Superior Eleitoral compor-se-á, no mínimo, de sete membros, escolhidos:

I - mediante eleição, pelo voto secreto:

a) três juízes dentre os Ministros do Supremo Tribunal Federal; b) dois juízes dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça;

II - por nomeação do Presidente da República, dois juízes dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Supremo Tribunal Federal.

Art. 120. Haverá um Tribunal Regional Eleitoral na Capital de cada Estado e no Distrito Federal.

§ 1º - Os Tribunais Regionais Eleitorais compor-se-ão: I - mediante eleição, pelo voto secreto:

a) de dois juízes dentre os desembargadores do Tribunal de Justiça;

b) de dois juízes, dentre juízes de direito, escolhidos pelo Tribunal de Justiça;

II - de um juiz do Tribunal Regional Federal com sede na Capital do Estado ou no Distrito Federal, ou, não havendo, de juiz federal, escolhido, em qualquer caso, pelo Tribunal Regional Federal respectivo;

III - por nomeação, pelo Presidente da República, de dois juízes dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Tribunal de Justiça.

Art. 121 [...]

§ 2º. Os juízes dos tribunais eleitorais, salvo motivo justificado, servirão por dois anos, no mínimo, e nunca por mais de dois biênios consecutivos, sendo os substitutos escolhidos na mesma ocasião e pelo mesmo processo, em número igual para cada categoria.

O Ministro Carlos Ayres Britto, em voto proferido no Recurso Extraordinário nº 633.703, salientou a peculiaridade da Justiça Eleitoral, destacando as características que a diferem da Justiça Comum e o exercício da atividade administrativa como atividade-fim:

Entendo o seguinte: no Direito Eleitoral, tudo é peculiar; até a Justiça Eleitoral é peculiaríssima; é uma Justiça composta por juízes que não têm vitaliciedade, têm mandato; que não tem vencimentos, têm jeton; juízes que respondem à consultas; juízes que fazem função administrativa, notadamente aquela de realização material da eleição, uma atividade ombreada com a função jurisdicional, atividade administrativa no âmbito da Justiça Eleitoral, porque o processo eleitoral é assim, binariamente administrativo e jurisdicional. A justiça Eleitoral faz da atividade administrativa, não uma atividade-meio, mas uma atividade-fim; não uma atividade “interna corporis”, endógena, portanto, mas uma atividade exógena, “externa corporis”. Tudo é peculiar.37

37 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 633.703. Repercussão Geral: mérito. Rel.

(26)

Para Djalma Pinto, a sua composição híbrida entre magistrados e advogados, sem que possua membros próprios, permite que o Direito Eleitoral seja sempre renovado: “A jurisprudência é frequentemente atualizada graças às novas composições dos Tribunais, respondendo assim às expectativas da sociedade em permanente mutação”.38

Contudo, entendemos que o fato de inexistir uma Justiça Eleitoral organizada em carreira mais prejudica do que favorece o seu bom funcionamento. Explicaremos o motivo de tal afirmação.

De fato, a ausência de juízes e promotores que atuem exclusivamente perante a Justiça Eleitoral implica a falta de especialização na área, tendo em vista que o Direito Eleitoral é disciplinado por legislação específica; bem como o acúmulo de serviço, uma vez que os juízes e os promotores desenvolvem suas atividades ordinárias juntamente com aquelas relativas à Justiça Eleitoral.

Ou seja, acumulam funções, tendo, portanto, seu tempo reduzido para dedicarem-se, de forma satisfatória, às questões de Direito Eleitoral. A jornada prevista para o exercício das atividades concernentes à Justiça Comum deverá abranger também as atividades próprias da Justiça Eleitoral, o que não se mostra produtivo.

Entendemos que seria mais eficaz que houvesse uma magistratura de carreira, atuando exclusivamente perante a Justiça Eleitoral para combater a corrupção eleitoral e controlar a moralidade e a lisura dos pleitos. O mesmo se aplica ao Ministério Público.

A inexistência de juízes e promotores especializados na área constitui fator que não auxilia no controle e na fiscalização das campanhas eleitorais. Pelo contrário. Por vezes, verifica-se até mesmo o despreparo de alguns profissionais designados para atuarem perante a Justiça Eleitoral, que determinam a adoção de procedimentos inadequados aos processos eleitorais, fato que acaba por tumultuar o regular andamento dos feitos, resultando em maior morosidade na apuração das representações e investigações judiciais.

(27)

Nesse sentido, Fabio Medina salienta a necessidade de se aperfeiçoar a estrutura da Justiça Eleitoral, mediante agentes especializados, fato que auxiliaria no monitoramento das campanhas eleitorais, inclusive no período pós-eleitoral:

A estruturação dos órgãos especializados para o monitoramento das campanhas eleitorais é uma das necessidades que se observa nos regimes democráticos. No Brasil, por razões administrativas, há um permanente rodízio na ocupação de vagas do Ministério Público e da Justiça Eleitorais. Raramente se encontram agentes especializados ativamente envolvidos no processo fiscalizatório. De outra banda, há que reconhecer que também faltam estruturas estáveis, especializadas, para rápidas investigações e apurações de ilícitos, inclusive no período pós-eleitoral, abarcando a visualização do patrimônio dos candidatos, além de sua movimentação na campanha, v.g., uso de aviões, propaganda maciça e irregular, investimentos pesados etc.39

Joel Candido também corrobora a necessidade de um quadro pessoal próprio para atuar perante à Justiça Eleitoral, seja através do sistema de magistratura especializada, seja mediante a dedicação exclusiva dos magistrados nos anos de eleição:

Entre as diversas teses existentes sobre a organização da Justiça Eleitoral, destacamos a que prega a criação de sistema com magistratura própria, especializada, nos moldes da Justiça do Trabalho, para todas as instâncias. Outra sustenta que a dedicação exclusiva da magistratura às funções eleitorais, nos anos de eleição, mesmo com a permanência do atual sistema, já seria modificação — menos dispendiosa e de nenhuma complexidade na adoção — absolutamente satisfatória. Ambas, porém, convergem ao advogar a necessidade de quadro pessoal próprio, organizado em carreira, com regime jurídico definido, invertendo a realidade atual e só fazendo das cedências de funcionários de outros poderes episódio esporádico, como reforço, especial e transitório, para fortalecimento da força de trabalho, em períodos pré-determinados.40

Interessante notar, tal como ressaltado por Paulo Henrique dos Santos Lucon e José Marcelo Menezes Vigliar, que o dispêndio financeiro não pode consistir óbice para a implementação de composição própria à Justiça Eleitoral, uma vez que os promotores e magistrados já recebem para o exercício dessa atividade:

Obviamente, quando se considera, por exemplo, o princípio do “juiz natural” essa tese ganha reforço, ficando também amparada pela natural especialização requerida. Naturalmente, nesse caso, também ao Ministério Público da União caberia a instituição de carreira autônoma para tal

39 OSÓRIO, Fabio Medina. Teoria da improbidade administrativa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p.

62.

(28)

finalidade. Quando se consideram os recursos necessários para a implementação dessa tese — como se fosse um óbice —, geralmente se esquece que os membros do Ministério Público e os Magistrados que atuam no exercício da competência da “Justiça Eleitoral” já recebem para o exercício dessa atividade.41

Portanto, conforme exposto, acreditamos que a modificação na organização da Justiça Eleitoral, privilegiando a especialização, consistiria em importante instrumento para a melhor aplicação do princípio da moralidade, favorecendo o combate à corrupção.

2.2 Cidadania, pluralismo politico e participação popular

Para compreensão do problema concernente à proteção da moralidade e da probidade administrativas para fins de elegibilidade, necessário verificarmos brevemente alguns conceitos de Direito Eleitoral, de acordo com a disciplina traçada pela Constituição Federal de 1988.

A importância do Direito Eleitoral, um dos pilares do Estado Democrático de Direito, é proclamada logo no primeiro artigo da Constituição Federal de 1988, conforme seus incisos II e V e seu parágrafo único, in verbis:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania; II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

O artigo 1º do Texto Constitucional, contido no seu Título I, “Dos Princípios

Fundamentais”, traz os fundamentos da República Federativa do Brasil, que constituem os

elementos que caracterizam a essência e os valores do Estado, estruturando, dessa forma, a sua organização política.

41 LUCON, Paulo Henrique dos Santos; VIGLIAR, José Marcelo Menezes. Código Eleitoral interpretado. 2.

(29)

Verificaremos, portanto, os fundamentos do Estado de Direito relacionados ao Direito Eleitoral, quais sejam, a cidadania, o pluralismo político e o princípio democrático, conforme artigo 1º, incisos II e V e parágrafo único, da CF/88.

A cidadania, de acordo com Celso Lafer, em obra que tratou do pensamento de Hannah Arendt, constitui o primeiro direito do indivíduo, uma vez que corresponde ao

“direito a ter direitos”:

[...] a cidadania é o direito a ter direitos, pois a igualdade em dignidade e direitos dos seres humanos não é um dado. É um construído da convivência coletiva, que requer o acesso ao espaço público. É este acesso ao espaço público que permite a construção de um mundo comum através do processo de asserção dos direitos humanos.42

Meirelles Teixeiradenota a relação entre cidadania e direitos políticos afirmando que “a cidadania consiste na prerrogativa que se concede a brasileiros, mediante preenchimento de certos requisitos, de poderem exercer direitos políticos e cumprirem deveres cívicos”.43

Para Jorge Miranda, são os cidadãos “os sujeitos e os súbditos do poder”, destinatários da ordem jurídica estatal, definindo a cidadania como “a participação do Estado

democrático”:

Cidadania significa ainda, mais vincadamente, a participação do Estado democrático. Foi nesta perspectiva que o conceito foi elaborado e se difundiu após a Revolução francesa. E se, por vezes, parece reservar-se o termo para a cidadania activa, correspondente à capacidade eleitoral, a restrição acaba por radicar ainda na mesma ideia.44

Assim, a cidadania ou a capacidade eleitoral é atribuída ao nacional que se encontra no gozo de seus direitos políticos, tratando-se de direito intimamente ligado ao exercício da democracia.

De acordo com a Constituição Federal de 1988, será cidadão o nacional que esteja na fruição de seus direitos cívicos. A condição de brasileiro será verificada de acordo com o disposto no artigo 12 da CF/88, que define o brasileiro nato e o naturalizado. No que tange à

42 LAFER, Celso. Hannah Arendt: pensamento, persuasão e poder. 2. ed., São Paulo: Paz e Terra, 2003, p. 114. 43 TEIXEIRA, José Horácio Meirelles. Op. cit., p. 565.

(30)

fruição dos direitos cívicos, a disciplina se encontra delimitada tanto pela Constituição Federal quanto pela legislação eleitoral.

Cabe acrescentar que o direito à cidadania será alcançado apenas mediante o alistamento eleitoral.

Paulo dos Santos Lucon e José Marcelo Menezes Vigliar salientam que o “status” jurídico de cidadão é adquirido com o alistamento eleitoral: “Somente de posse do título de eleitor a pessoa adquire o ‘status’ jurídico de cidadão, o que significa dizer que é com o alistamento eleitoral que se adquirem os direitos de cidadania.”45

O alistamento eleitoral é regulamentado pelo Código Eleitoral, Lei nº 4.737/65, conforme seus artigos 42 e seguintes, sendo que o artigo 44 dispõe acerca dos documentos a serem apresentados perante a Justiça Eleitoral, in verbis:

Art. 44. O requerimento, acompanhado de 3 (três) retratos, será instruído com um dos seguintes documentos, que não poderão ser supridos mediante justificação:

I - carteira de identidade expedida pelo órgão competente do Distrito Federal ou dos Estados;

II - certificado de quitação do serviço militar; III - certidão de idade extraída do Registro Civil;

IV - instrumento público do qual se infirá, por direito ter o requerente idade superior a dezoito anos e do qual conste, também, os demais elementos necessários à sua qualificação;

V - documento do qual se infira a nacionalidade brasileira, originária ou adquirida, do requerente.

O alistamento se realizará perante a Justiça Eleitoral, cabendo ao Juiz Eleitoral fiscalizar o cadastro do eleitor.

Conforme esclarece Antônio Carlos Mendes, a Justiça Eleitoral é competente para promover o alistamento eleitoral, realizando função administrativa, que tem a seguinte finalidade: “(a) organizar o eleitorado, (b) conhecer, declarar o direito ao sufrágio e (c) qualificar e inscrever o cidadão (art. 42, “caput”, do Código Eleitoral).”46

(31)

Além da cidadania, o artigo 1º, V, da CF/88 traz como fundamento da República Federativa do Brasil o pluralismo político.

O pluralismo político deve ser interpretado de forma ampla, tratando-se de uma extensão ao direito à liberdade, afirmando a Constituição Federal de 1988 o respeito à diversidade e à possibilidade de escolha.

Para J. J. Gomes Canotilho, “pluralismo político é um elemento constitutivo do princípio democrático e da própria ordem constitucional”, inadmitindo-se a marginalização jurídico-constitucional de quaisquer forças partidárias.

Consigna o autor que a garantia ao pluralismo político sofrerá desdobramentos, seja no próprio Texto Constitucional, seja na legislação que discipline a matéria, medida que servirá de reforço ao direito das minorias.47

Conforme Gilmar Mendes Ferreira, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco, a expressão contida no inciso V do artigo 1º da CF/88 tem um alcance mais abrangente do que aparenta, sendo que pluralismo significa “um direto fundamental à diferença em todos os âmbitos e expressões da convivência humana — tanto as escolhas de natureza política quanto nas de caráter religioso, econômico, social e cultural, entre outras, um valor fundamental”.48

Celso Bastos conceitua o pluralismo como “a possibilidade de oposição e controle do

Estado”, salientando que a democracia impõe formas plurais de organização da sociedade.49

Para Alexis Galiás de Souza Vargas, o princípio do pluralismo político, para cumprir o seu papel, precisará ter três aspectos distintos: a liberdade ideológica, relacionada à liberdade de pensamento, expressão, reunião e associação; a garantia de espaço no debate público, relativa à ampla possibilidade jurídica de apresentação de candidaturas e à participação no horário eleitoral gratuito; e a neutralidade estatal, concernente à vedação de apoio oficial do

47 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. cit., p. 313-314.

48 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de

Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 146.

(32)

Estado a um candidato ou partido, devendo ser promovido o livre debate para a formação da vontade coletiva.50

José Afonso da Silva, ao tratar dos partidos políticos, consignou que os homens podem ser divididos em contentes e descontentes e em favoráveis ou hostis à transformação da ordem estabelecida. Nesse sentido, se mostra importante o pluralismo político, pois confere aos cidadãos mais opções de escolha para fins de representação política e condução do poder, de acordo com a ideologia partidária que mais lhes agrade, medida que fomenta a democracia.51

De fato, tal como consignamos no início, o pluralismo deve ser visto de forma ampla, pois respeita o direito de escolha dos cidadãos, garantindo o direito das minorias, fato que reforça o princípio democrático.

A pluralidade de opções e de ideias, seja na esfera política ou não, enriquece o debate democrático, devendo ser assegurada aos cidadãos a liberdade de escolha, lembrando-se o exposto por Hans Kelsen no sentido de que a liberdade constitui o princípio fundamental da democracia.

Por fim, o parágrafo único do artigo 1º da CF/88 dispõe que o povo é o titular do poder e que poderá exercê-lo diretamente ou por meio de seus representantes, consagrando, portanto, o princípio democrático.

Remetemo-nos às definições de democracia trazidas capítulo anterior,52 que não serão aqui repetidas.

Cabe, porém, salientar que há em nosso ordenamento jurídico a previsão de instrumentos que permitam aos cidadãos participar diretamente das decisões políticas, sendo eles o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular (artigo 14, I, II e III, CF/88), o que nos conduz à uma democracia semidireta.

50 VARGAS, Alexis Galiás de Souza Vargas. Princípios constitucionais de Direito Eleitoral. Tese (Doutorado

em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2009, p. 77-78.

51 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 30. ed., São Paulo: Malheiros, 2007, p.

398.

(33)

Sobre a questão, Antônio Carlos Mendes esclarece que “a democracia representativa não exclui mecanismos próprios da democracia direta”, lembrando que ambas decorrem do princípio da soberania popular.53

De fato, podemos concluir que a regra insculpida no parágrafo único do artigo 1º da CF/88, associada às garantais fundamentais, à participação dos cidadãos na política e às medidas protetivas previstas pelo Estado, retratam o caráter democrático de nossa ordem jurídica, ao menos quanto ao aspecto formal.

A concretização da democracia, porém, dependerá da forma com que tais normas serão aplicadas e dos mecanismos disponibilizados pelo Estado para sua efetivação, de forma plena.

Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988 prevê que os candidatos a cargos públicos deverão apresentar conduta proba e ilibada, de acordo com o princípio da moralidade administrativa.

A efetivação de tal ordem, porém, mediante o afastamento dos maus governantes do poder político, deve ser promovida pelo Estado, ou corresponderá a letra morta.

Por fim, destacamos o exposto por Celso Bastos no sentido de que a democracia “é algo dinâmico, em constante aperfeiçoamento, sendo válido dizer que nunca foi plenamente alcançada”.54

Aprimorar a democracia corresponde, portanto, a um constante desafio a ser enfrentado pelo povo e por seus dirigentes e, nesse sentido, a proteção à moralidade e à probidade administrativas, para fins de elegibilidade, constitui, sem dúvida, medida que auxilia no aperfeiçoamento da democracia.

(34)

2.3 Direitos políticos e partidos políticos

A Constituição Federal de 1988, em seu Título II, trata “Dos Direitos e Garantias

Fundamentais”, dedicando dois capítulos ao Direito Eleitoral, quais sejam, Capítulo IV, “Dos

Direitos Políticos” e Capítulo V, “Dos Partidos Políticos”, destacando-se que o Capítulo III, “Da Nacionalidade”, trata de pressuposto para exercício dos direitos políticos.

Os artigos 14 a 16 da CF/88 tratam da soberania popular, do sufrágio, da elegibilidade e da inelegibilidade, da suspensão e perda dos direitos políticos, da ação de impugnação de mandato eletivo e, ainda, do princípio da anualidade ou anterioridade eleitoral, matérias que têm por fundamento último o princípio democrático, previsto no artigo 1º, parágrafo único, do texto constitucional.

No que tange aos direitos políticos, José Afonso da Silva os define como a “disciplina dos meios necessários ao exercício da soberania popular”.55

José Antônio Pimenta Bueno afirma que “os direitos políticos são prerrogativas, atributos, faculdades ou poderes de intervenção dos cidadãos no governo de seu país, intervenção essa mais ou menos ampla, direta ou indireta, segundo a intensidade do gozo desses direitos”,56 ou seja, são os direitos cívicos que se referem ao poder público, autorizam o cidadão a participar da formação da autoridade nacional, a exercer o direito de eleitor, os direitos de deputado ou senador, a ocupar cargos políticos e a manifestar suas opiniões sobre o governo.

No mesmo sentido de José Afonso da Silva, Paulo dos Santos Lucon e José Marcelo Vigliar definem os direitos políticos como o “conjunto de normas que disciplinam a atuação da soberania popular, em outras palavras, são aqueles direitos que regulam a intervenção popular no governo”.57

A relevância dos direitos políticos demandou a elaboração de codificação própria, o Código Eleitoral, Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 — editado antes da Constituição

55 SILVA, José Afonso da. Curso... Op. cit., 2007, p. 345.

56 BUENO, José Antônio Pimenta. Direito público brasileiro e análise da Constituição do Império. Rio de

Janeiro: Ministério da Justiça e Negócios Interiores, 1958, p. 458.

(35)

Federal de 1988, prevê, em seu artigo 1º, que seu objetivo é assegurar e organizar o exercício dos direitos políticos, contando ainda com Resoluções do Tribunal Superior Eleitoral, in

verbis: “Art. 1º Este Código contém normas destinadas a assegurar a organização e o

exercício de direitos políticos precipuamente os de votar e ser votado. Parágrafo único. O Tribunal Superior Eleitoral expedirá Instruções para sua fiel execução.”

Partindo do Texto Constitucional, fundamento de validade do ordenamento jurídico, podemos observar que o seu Capítulo IV, “Dos Direitos Políticos”, determina quem poderá participar da votação para a escolha dos representantes do povo (“ius sufragii”), quais as

características do sufrágio e, ainda, quem poderá ser eleito para exercer o mandato político (“ius honorum”).

O artigo 14, “caput”, da CF/88 consigna que “a soberania popular será exercida pelo

sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos”. Nesse sentido, não haverá restrição censitária ou capacitatória para o exercício do sufrágio, tendo o voto igual valor para todos, nos termos do princípio “one man, one vote”, sendo ainda pessoal,

característica implícita ao voto, conforme observa Antônio Carlos Mendes.58

Tais características do sufrágio, previstas na Carta de 1988, não admitem qualquer restrição, tratando-se de cláusula pétrea, nos termos do artigo 60, § 4º, II, da CF/88, que consigna que não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir “o voto direto, secreto, universal e periódico”.

A relevância do disposto no artigo 14, “caput”, da CF/88 para um Estado Democrático

de Direito é ressaltada por Luís Roberto Barroso, que afirma ser o inciso II do artigo 60, § 4º, “o menos suscetível de figurar como paradigma para fins de controle de constitucionalidade

de emendas”.59

De fato, as garantias atinentes ao direito de voto têm por escopo tanto evitar as discriminações já verificadas no passado, tais como aquelas relacionadas à renda ou ao sexo, quanto coibir a fraude e a corrupção no processo eleitoral, permitindo ao cidadão que exerça seu direito de forma livre.

(36)

Quanto menores as restrições à capacidade eleitoral ativa, mais próximo se estará do significado de democracia, respeitando-se a vontade do povo (este em sentido amplo), representada pela maioria havida nas urnas. Exemplo disso está na admissão dos analfabetos como eleitores facultativos, conforme disposto no artigo 14, § 1º, II, “a”, da CF/88, fato que implica relevante aumento de eleitores. A participação dos analfabetos havia sido trazida pela Emenda Constitucional nº 25/85, mantida pela Constituição Federal de 1988.

Concordamos com tal ampliação do rol de eleitores e entendemos que as exigências constitucionais contidas no artigo 14, §§ 1º e 2º, para o exercício da capacidade eleitoral ativa, são bastante razoáveis, restringindo o mínimo possível o direito do povo de se manifestar nas urnas, o que corresponde à tradução de democracia, conforme se verifica a seguir, in verbis:

Art. 4, § 1º - O alistamento eleitoral e o voto são: I - obrigatórios para os maiores de dezoito anos; II - facultativos para:

a) os analfabetos;

b) os maiores de setenta anos;

c) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos.

§ 2º - Não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros e, durante o período do serviço militar obrigatório, os conscritos.

De fato, não há como negar o avanço democrático verificado com a Constituição Federal de 1988 em comparação com as Constituições brasileiras anteriores, especialmente no que diz respeito à proteção aos direitos fundamentais e, neste particular, aos direitos políticos.

Cabe observar que o artigo 14 da CF/88 trata ainda das formas de participação democrática, sendo elas as eleições majoritárias, as eleições proporcionais, o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. Tais conceitos não serão analisados por se desvirtuarem do escopo do presente trabalho.

(37)

Por fim, o Capítulo V da Constituição Federal de 1988 trata dos partidos políticos, disciplinados pelo artigo 17, in verbis:

Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos:

I - caráter nacional;

II - proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou de subordinação a estes;

III - prestação de contas à Justiça Eleitoral;

IV - funcionamento parlamentar de acordo com a lei.

No Brasil, não se admite candidaturas avulsas. Para que um cidadão possa se candidatar deve, necessariamente, filiar-se a um partido político, compartilhando de sua ideologia partidária, consoante dispõe o artigo 14, § 3º, V, da CF/88, que elenca como condição de elegibilidade “a filiação partidária”.

Conforme ressalta Antônio Carlos Mendes, os partidos políticos realizam a mediação entre eleitores e eleitos.60 Através dos partidos é que se dá a representação política, fato que denota sua importância no cenário politico nacional.

Hans Kelsen afirma que a democracia contemporânea se funda inteiramente nos partidos políticos, como condição da própria democracia, exercendo grande influência na gestão dos negócios públicos, constituindo parte essencial na formação da vontade geral.61

Os partidos políticos são pessoas jurídicas de direito privado, de livre criação, fusão, incorporação e extinção. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 17, § 1º, lhes outorgou autonomia para elaborar seus estatutos, que deverão ser registrados perante o Tribunal Superior Eleitoral.

José Afonso da Silva classifica o partido político como um grupo social, de ideologia ou interesse comum, que se propõe a “organizar, coordenar e instrumentar a vontade popular com o fim de assumir o poder para realizar seu programa de governo”.62 No que se refere à liberdade partidária, sustenta o jurista não ser absoluta, pois “fica ela condicionada a vários

Referências

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