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O potencial da compensação de Reserva Legal no município de Querência/MT

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ECONOMIA

THAÍS BANNWART

O POTENCIAL DA COMPENSAÇÃO DE RESERVA LEGAL NO

MUNICÍPIO DE QUERÊNCIA/MT.

CAMPINAS 2018

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INSTITUTO DE ECONOMIA

THAÍS BANNWART

O POTENCIAL DA COMPENSAÇÃO DE RESERVA LEGAL NO

MUNICÍPIO DE QUERÊNCIA/MT.

Prof. Dr. Ademar Ribeiro Romeiro– orientador

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestra em Desenvolvimento Econômico, área de concentração Meio Ambiente.

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA THAIS BANNWART E ORIENTADA PELO PROF. DR. ADEMAR RIBEIRO ROMEIRO.

CAMPINAS 2018

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DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

THAÍS BANNWART

O POTENCIAL DA COMPENSAÇÃO DE RESERVA LEGAL NO

MUNICÍPIO DE QUERÊNCIA/MT.

Defendida em 17/12/2018

COMISSÃO EXAMINADORA

Prof. Dr. Ademar Ribeiro Romeiro - Presidente Instituto de Economia, UNICAMP

Prof. Dr. Bastiaan Philip Reydon Instituto de Economia, UNICAMP

Pesquisador Dr. Marcelo de Castro Chaves Stabile Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM)

Ata de Defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica da aluna.

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de muitas pessoas. Por isso, eu agradeço,

Primeiramente ao meu orientador, Professor Ademar Romeiro, que sempre foi solicito, paciente com meu processo de aprendizagem e sempre incentivou e contribuiu para as minhas decisões com relação à pesquisa.

À Paula Bernasconi, que abriu os caminhos com sua pesquisa de mestrado e me incentivou a seguir nessa temática tão complexa e relevante.

Ao Professor Bastiaan Reydon, por acompanhar de perto minha trajetória acadêmica e pela oportunidade de me aproximar à temática fundiária e suas inter-relações com o meio ambiente.

À Cecilia Simões, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, por acreditar junto comigo de que seria possível mudar para Mato Grosso, trabalhar e realizar minha pesquisa no município de Querência. Agradeço tanto pela oportunidade, compreensão e amizade.

Ao Marcelo Stabile, pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, por se disponibilizar a me supervisionar na minha pesquisa de forma tão solícita, atenciosa e criteriosa.

Às minhas amigas e amigos que participaram da minha caminhada na pós-graduação e estiveram comigo nos altos e baixos do processo de dissertar. Sou abençoada demais por tantas pessoas magníficas em minha vida e sem vocês teria sido impossível.

À minha família, por todas as oportunidades confiadas a mim. Eu tenho muita sorte em ser privilegiada. Gratidão.

Ao Instituto de Economia, ao NEA, ao Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, agradeço pela oportunidade de aprendizado com excelência,

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em propriedades rurais. Apesar da redução de diversas exigências e a consolidação de áreas desmatadas até julho de 2008, a alteração na legislação também introduziu alguns mecanismos importantes para a conservação ambiental. Sendo o mecanismo de compensação de Reserva Legal via Cota de Reserva Ambiental (CRA) uma das principais inovações do novo Código Florestal.

Trata-se de um instrumento econômico que visa reduzir o custo de oportunidade da conservação. Por outro lado, passados seis anos da regulamentação do novo Código Florestal, o mecanismo de compensação de Reserva Legal não foi regulamentado o que contribui para que seu desenho e funcionamento seja impreciso e pouco utilizado até o presente momento.

De forma a contribuir para a literatura e para o processo de regulamentação da CRA, essa pesquisa analisou a nível municipal a viabilidade da compensação da RL por propriedades rurais com passivo e ativo de vegetação nativa. Foram realizadas entrevistas no município de Querência em Mato Grosso com proprietários rurais e atores-chave para verificar quais os fatores determinantes para que o esquema funcione. Os resultados da pesquisa indicam que é importante levar em consideração as diferentes expectativas ou perfis de produtores rurais quanto ao esquema de compensação, sobretudo em relação ao preço da CRA e ao tempo de duração dos contratos, de forma a equilibrar os preços ofertados e demandados.

Além disso, é importante que o Estado de Mato Grosso defina critérios que estimulem a compensação em áreas prioritárias para a conservação, como áreas com elevado custo de oportunidade e que estão sob pressão para desmatamento. Esses critérios serão fundamentais para garantir que o mecanismo de compensação contribua para áreas sensíveis para a preservação e que contribua para a conservação de áreas de RL passíveis de desmatamento legal.

Os resultados dessa pesquisa indicam que a compensação da RL é um mecanismo de adequação ambiental viável para propriedades rurais com passivo de vegetação nativa, sendo a compensação em Unidades de Conservação a opção prioritária. Por outro lado, as áreas com excedente de vegetação nativa, possivelmente serão destinadas ao uso produtivo caso não haja incentivos econômicos para que sejam preservadas. Nesse

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para a redução do desmatamento por meio de incentivos econômicos.

PALAVRAS-CHAVE: novo Código Florestal, compensação de Reserva Legal, , custo de oportunidade, adicionalidade ambiental.

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conservation in rural properties. Despite the reduction of various requirements and the consolidation of deforested areas until July 2008, the modifications produced in the legislation also introduced some important mechanisms for environmental conservation.

The mechanism of compensation of Legal Reserve via Environmental Reserve Quota (CRA) is one of the main innovations of the new Forest Code. It is an economic instrument that aims to reduce the opportunity cost of conservation. On the other hand, after six years of the regulation of the new Forest Code, the Legal Reserve compensation mechanism still isn’t regulated, which contributes to its design and operation being inaccurate and not adopted until the present moment.

In order to contribute to the literature and to the regulatory process of the CRA, this research analyzed at the municipal level the viability of the compensation of the RL for rural properties. This work released interviews in the municipality of Querência in Mato Grosso with rural owners and key actors to verify what are the main factors for the scheme to work.

The results of the research indicate that it is important to take into account the different expectations or profiles of rural producers regarding the compensation scheme, especially in relation to the CRA price and the duration of contracts, in order to balance the prices offered and demanded.

In addition, it is important for the State of Mato Grosso to define criteria that encourage compensation in priority areas for conservation, such as areas with high opportunity costs and that are under pressure for deforestation. These criteria will be instrumental in ensuring that the compensation mechanism contributes to preservation of sensitive areas and to the conservation of RL areas prone to legal deforestation.

The results of this research indicate that RL compensation is a viable environmental compliance mechanism for rural properties with native vegetation liabilities and the compensation inside Conservation Units is the priority option. On the other hand, areas with surplus native vegetation may be suppressed if there are no economic incentives to preserve them. In this sense, it will be important for that the

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through economic incentives.

KEY WORDS: Brazilian new Forest Code, Legal Reserve compensation, opportunity cost, environmental additionality.

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Tabela 1 – Percentuais propostos para a RL segundo diversas legislações ... 25

Tabela 2 – Regularização de RL com passivo até 22 de julho de 2008 ... 26

Tabela 3 – Valores ofertados para a CRA na Plataforma BVRio ... 39

Tabela 4 – Principais tipos de potenciais vendedores e compradores de CRA ... 42

Tabela 5 – Tipos de Cotas de Reserva Ambiental que podem ser ofertadas em Mato Grosso ... 55

Tabela 6 – Número e tamanho de propriedades por classe fundiária em Querência... 57

Tabela 7 - Tipologia de propriedades em Querência... 58

Tabela 8 – Ranking dos maiores produtores de soja em Mato Grosso ... 62

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Figura 2 – Mudanças resultantes da Lei de Proteção da Vegetação Nativa . ... 22 Figura 3 – Localização do município de Querência/MT ... 50 Figura 4 – Distribuição do uso do solo segundo as principais classes fundiárias de Querência/MT . ... 51 Figura 5 - Evolução da produção agropecuária no município aliado a redução do desmatamento de 2000 a 2015 (Dados: IBGE PPM e PAM, PRODES/INPE) ... 52 Figura 6 – Distribuição de passivos e ativos de RL em Querência ... 54 Figura 7 – Fluxo da produção de soja do município de Querência para o ano de 2015. ... 63

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Introdução ... 15

Objetivo geral ... 19

Objetivos específicos ... 19

1 O Código Florestal Brasileiro ... 19

Histórico e alterações na legislação ... 19

Principais retrocessos da legislação ... 23

Principais avanços da legislação... 24

As alterações das regras para a Reserva Legal ... 25

A compensação de Reserva Legal e a Cota de Reserva Ambiental (CRA) ... 27

Políticas de controle ambiental e de colonização em Mato Grosso ... 30

2 O potencial da CRA para a regularização e conservação ambiental em propriedades rurais ... 33

Adicionalidade ambiental ... 35

Desenho do mecanismo: abrangência geográfica e competências de gestão ... 36

Precificação da CRA... 38

Tempo de duração dos contratos ... 40

Percepções dos proprietários rurais ... 41

Outros fatores relevantes ... 44

3 O potencial de compensação de Reserva Legal no município de Querência... 47

Metodologia ... 47

Caracterização socioeconômica e ambiental de Querência ... 49

Estimativa de ativo e passivo de Reserva Legal ... 53

Tipologia prévia dos produtores rurais do município ... 57

Sistemas de produção agropecuários e custos de oportunidade ... 61

Questionários e roteiro de entrevista ... 64

Resultado das entrevistas ... 64

4 Discussão ... 68

5 Considerações finais ... 75

Referências Bibliográficas ... 79

ANEXO 1. Questionário utilizado nas entrevistas com os produtores rurais ... 83

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Introdução

O Código Florestal é o principal instrumento de comando-e-controle que regula a conservação ambiental em áreas privadas no Brasil, considerando que os recursos naturais nessas áreas são de interesse público1. Estimativas apontam que 57% da vegetação nativa remanescente de todo o Brasil encontra-se em áreas privadas2. Entretanto, a não conformidade com a legislação é muito significativa. Dados estimam que dos 20 milhões de hectares de passivos no Brasil, 16 milhões de hectares sejam se Reserva Legal, aproximadamente3.

Nesse contexto, setores do agronegócio no Congresso Nacional, pressionados pelo aumento da capacidade de fiscalização da adequação ao Código Florestal e da demanda dos mercados internacionais pelo cumprimento da legislação ambiental4, alegavam que o Código Florestal de 1965 impunha severas limitações ao desenvolvimento agropecuário e colocava em situação de ilegalidade 90% dos proprietários rurais5. Sendo o custo de adequação um dos principais argumentos utilizados para justificar a não regularidade com a lei, à medida que esses custos devem ser suportados exclusivamente pelos proprietários rurais, ao passo que o benefício ambiental possui características públicas.

No ano de 2012 aprovou-se a Lei n° 12.651, que instituiu o popularmente conhecido novo Código Florestal (NCF). A nova versão traz uma série de reduções de exigências, como a consolidação dos passivos ambientais produzidos até 22 de julho de 2008 em áreas de Reserva Legal (RL) e as alterações nas metragens das Áreas de Preservação Permanente (APP).

Por outro lado, a nova legislação introduziu algumas exigências importantes para a conservação ambiental. Dentre elas, instituiu o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que tem por finalidade integrar as informações ambientais das propriedades rurais para controle, monitoramento e planejamento ambiental e econômico da propriedade rural. O CAR passa a ser requisito para a supressão da vegetação nativa, aprovação da localização da Reserva Legal, autorização para o manejo florestal, para emissão de cota

1 Soares-Filho et al., 2014.

2 Segundo Boletim Informativo do SICAR de 29/maio/2018.

3 Soares-Filho et al., 2014.

4 Nepstad et al., 2014

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de reserva ambiental (CRA), adesão ao programa de regularização ambiental (PRA), além de previsto como condicionante para o acesso ao crédito rural. Apesar da evidente importância do CAR, o prazo para a inscrição das propriedades rurais no sistema de cadastros foi prorrogado para dezembro de 20186.

Outra inovação da legislação é a possibilidade de compensação de Reserva Legal para proprietários rurais que possuem percentual inferior ao exigido por lei7, desde que não tenham efetuado o desmatamento após 22 de julho de 2008. Partindo-se do pressuposto de que os custos de oportunidade8 da compensação são inferiores ao da restauração9, o mecanismo favorece a adequação ambiental das propriedades rurais. Trata-se, dessa forma, de um instrumento econômico que visa reduzir o custo de oportunidade da conservação ambiental10.

Assim, as propriedades rurais com áreas de Reserva Legal que ultrapassem o mínimo exigido por lei poderão emitir títulos de Cota de Reserva Ambiental (CRA)11 para aqueles que tem interesse em compensar a Reserva Legal, constituindo um estímulo econômico para quem vende e compra as CRAs. Entretanto, apesar do mecanismo no novo Código Florestal, até o presente momento as CRAs não possuem regulamentação federal específica, dificultando a sua utilização pelos proprietários rurais que tem interesse em participar do mercado de compensação de Reserva Legal.

Apesar disso, diversos estudos vem corroborando para o potencial biofísico e econômico de aplicação das CRAs, tanto em nível nacional quanto regional12. Estimativas apontam um potencial de transação de 4,2 milhões de hectares com valor bruto de US$ 9.2±2.4 bilhões, onde os principais mercados estariam concentrados em Mato Grosso e São Paulo13. Tais levantamentos indicam um grande potencial do mecanismo de compensação de Reserva Legal, contribuindo para a tomada de decisão pelos policy

makers e os próprios produtores rurais.

6 Até a conclusão dessa pesquisa.

7 Os percentuais mínimos de RL não foram alterados na nova legislação.

8 O custo de oportunidade é o resultado da comparação entre alternativas econômicas, vide página 35. 9 Rajão, R. (2015).

10 Bernasconi et al, 2013.

11 Trata-se de um título nominativo representativo de área com vegetação nativa, existente ou em

processo de recuperação. Ver mais em Art 44, Lei n° 12.651/12.

12 Ver Cai et al.,2016; Rajão, 2015; Soares-filho et al., 2014; Bernasconi et al, 2013. 13 Soares-Filho et al., 2016.

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A fim de contribuir com as discussões sobre o potencial de compensação de RL e para o processo de regulação das CRAs, o presente projeto visa analisar a nível local (municipal) o potencial da compensação de Reserva Legal e seu possível benefício ambiental. Para isso, propõe-se realizar entrevistas com produtores rurais e atores-chave no município, de forma a coletar a percepção esses agentes quanto à adoção da compensação de Reserva Legal como uma forma de se adequar à legislação ambiental. Essa abordagem é uma forma de contribuir com a literatura sobre o assunto, uma vez que a maior parte dos estudos utiliza modelos baseados em dados secundários e em sensoriamento remoto.

O Estado de Mato Grosso é um dos maiores agroexportadores do país, com colheita recorde de grãos estimada em 61,8 milhões de toneladas para a Safra 2016/201714. No ano de 2005 o estado liderava a lista dos maiores desmatadores da Amazônia, com taxa anual de 12.000 km215. Por outro lado, o estado vem se destacando na criação de mecanismos de controle do desmatamento dentre os estados da Amazônia Legal, como o Sistema de Licenciamento Ambiental em Propriedades Rurais (SLAPR) e o Programa MT Legal que inspiraram a criação do CAR federal. No ano de 2015, o Estado decidiu criar o seu próprio sistema de cadastro ambiental rural – SIMCAR – que está em fase de análise e correção dos cadastros migrados do SICAR. Além disso, o Estado se comprometeu a zerar o desmatamento ilegal até 2020 durante a 21ª Conferência Global do Clima (COP 21) realizada em Paris no ano de 2015 e lançou para alcançar esse objetivo a Estratégia Produzir, Conservar e Incluir (PCI).

Alguns municípios mato-grossenses vem correspondendo ativamente aos mecanismos de controle e incentivos criados, como o município de Querência, que foi o primeiro do Estado a sair da lista dos maiores desmatadores da Amazônia no ano de 2011. Para isso, o município cumpriu com uma série de condicionantes, como o cadastramento de mais de 80% do seu território no cadastro ambiental rural da Sema (Secretaria de Meio Ambiente de Mato Grosso) o que reduziu sua taxa média de desmatamento significativamente.

Tais condicionantes contribuíram para que o município fortalecesse sua governança ambiental para realizar a regularização ambiental. Além disso, Querência

14 IMEA, 2018

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representa a complexidade socioeconômica também presente em Mato Grosso: 40% de seu território constitui Terra Indígena do Xingu, 27% constitui produção agropecuária, com expressiva produção de grãos, e o município conta com cinco Projetos de Assentamento (PA) da Reforma Agrária, que totalizam 1.265 lotes. Ainda, segundo mapeamento16 do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e do Instituo Socioambiental (ISA), em 2017 o município possuía passivos de APP em torno de 2.900 hectares e 220.731 hectares de Reserva Legal passíveis de compensação.

Frente ao protagonismo de Querência em relação à adequação ambiental e sua complexidade socioambiental e econômico-produtiva, aponta-se o município como uma região representativa do Estado de Mato Grosso, sendo significativa para um estudo in

loco sobre o potencial econômico e ambiental da compensação de Reserva Legal. Nesse

sentido, o mecanismo de compensação de Reserva Legal via CRA é uma possibilidade viável de adequação ambiental para os produtores rurais?

Essa pesquisa está organizada da seguinte forma, o Capítulo 1 traz uma contextualização sobre o histórico de criação e alterações realizadas na lei popularmente conhecida como Código Florestal, apresenta as novas regras válidas para a Reserva Legal, como a possibilidade de compensar a RL, e contextualiza a aplicação de políticas de monitoramento e controle ambiental no Estado de Mato Grosso. O Capítulo 2 dessa pesquisa discute fatores específicos importantes para a regulamentação da Cota de Reserva Ambiental que determinarão em que medida esse mecanismo será exclusivamente um instrumento para a regularização ambiental de propriedades rurais e/ou contribuirá para a conservação ambiental em áreas passíveis de desmatamento legal.

Finalmente, o Capítulo 3 traz a caracterização socioeconômica, produtiva e ambiental de Querência e demais passos metodológicos necessários para analisar o potencial da compensação de Reserva Legal no município. Sobretudo, essa pesquisa busca contribuir com as discussões sobre o NCF e o mecanismo de compensação de RL via CRA por meio de entrevistas com produtores rurais de Querência, buscando compreender a visão do setor produtivo do acerca de fatores específicos17 como

16 Mapeamento realizado pelo Projeto Querência +: Paisagens Sustentáveis, desenvolvido pelo IPAM em

cooperação com o Instituto Socioambiental (ISA).

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efetividade ecológica, tempo de duração do contrato, preço, motivação a participar do esquema, entre outros.

Objetivo geral

O objetivo dessa pesquisa é analisar, por meio de entrevistas com produtores rurais e atores-chave, o potencial do mecanismo de compensação de Reserva Legal e seu potencial econômico e ambiental18.

Objetivos específicos

Os objetivos específicos dessa pesquisa são:

 Verificar os custos de oportunidade de produtores rurais do município de Querência por meio de dados secundários;

 Levantar informações que influenciam os proprietários rurais na escolha de valores para compensar ou para receber a compensação de Reserva Legal;

 Analisar a viabilidade econômica e o potencial ambiental da compensação de Reserva Legal no município de Querência;

 Fornecer subsídios para o município de Querência e os proprietários rurais para se engajem em uma agenda para regularizar a RL via compensação;

 Fornecer subsídios, por meio de dados primários obtidos nas entrevistas, para os tomadores de decisão na discussão sobre a regulamentação do mecanismo de compensação de Reserva Legal.

1 O Código Florestal Brasileiro

Histórico e alterações na legislação

A primeira versão do Código Florestal brasileiro corresponde ao Decreto 23.793 publicado em 1934, período onde diversas legislações foram criadas para garantir um controle mínimo sobre a manutenção da qualidade e quantidade dos recursos naturais, como o Código das Águas (Decreto 24.643). A versão de 1934 foi editada por meio da Lei n° 4.771 de 1965, reconhecendo que os recursos ambientais são bens de natureza pública19, restringindo a sua utilização pelo interesse privado. Dessa forma, o Código

18 Entende-se como potencial econômico a possibilidade de transação econômica por meio de CRA entre

produtores rurais no município, e por potencial ambiental a geração de benefício ambiental local. 19 Milaré, 2014.

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Florestal torna-se o principal instrumento que regula a conservação ambiental em áreas privadas.

De maneira geral, a versão de 1965 criou duas obrigações legais em propriedades rurais: as Áreas de Preservação Permanente (APP) e a Reserva Florestal, atualmente reconhecida como Reserva Legal (RL)20. As APPs possuem função prioritária de preservação dos recursos hídricos e áreas de recarga, constituindo faixas de vegetação ao longo das margens dos rios, no entorno das nascentes, lagos e reservatórios. As faixas de vegetação que constituem as APPs são variáveis dependendo da largura do rio e sua definição independe do tamanho da propriedade, sendo fixada para todo o país.

A RL constitui percentuais relativos ao tamanho da propriedade e da fitofisionomia de sua localização que devem ser mantidos com vegetação natural com o propósito geral de preservação da diversidade e do valor ecológico da vegetação, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas. Mas também são áreas que permitem uso econômico de baixo impacto, como exploração em sistemas agroflorestais ou silvipastoris, por exemplo.

A década de 1990 representou um período onde diversas alterações foram realizadas na versão de 1965, sendo produzidas 67 alterações por Medidas Provisórias entre 1996 e 2001 relacionadas à Reserva Legal.

Dentre os motivos para tantas alterações na versão de 1965 se destaca o aumento do desmatamento da Amazônia e da preocupação por parte do governo da repercussão internacional21, sobretudo após a Eco 92 que ocorreu no Rio de Janeiro onde governos de diversos países se comprometeram em uma agenda ambiental comum. A partir desse período, o governo brasileiro ampliou sobremaneira a capacidade de controle sobre as áreas de floresta, sobretudo, a partir de 1988 com o monitoramento anual do desmatamento da Amazônia Legal pelo projeto PRODES.

20 Definida pela Lei Federal n° 7.803 de 1989, que estabeleceu a obrigação da averbação dessas áreas em

cartório (Hercowitz, 2009).

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A partir dos anos 2000, mais especificamente, um conjunto de políticas e iniciativas direcionadas ao combate e controle do desmatamento na Amazônia são inauguradas. Dentre elas, o Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento da Amazônia Legal (PPCDam), criado em 2004 e existente até o presente, é uma das principais iniciativas dos governos federal e estaduais. Outra importante iniciativa que trouxe impactos significativos foi a criação22 no ano de 2007 da Lista dos municípios prioritários para combate ao desmatamento, estabelecendo uma série de medidas de controle e monitoramento pelos órgãos federais (Figura 1).

Figura 1 - Lista dos municípios prioritários para combate ao desmatamento Fonte: Ministério do Meio Ambiente, s.d.

Em 2007, 36 municípios eram responsáveis por 45% do desmatamento na Amazônia Legal motivando então a criação da lista com foco no controle do desmatamento nesses municípios23. A partir da divulgação da lista, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) passou a fiscalizar esses municípios, aplicando autuações e embargando propriedades rurais. Também, a partir

22 Decreto 6.321 de 21 de setembro de 2007 23 Assunção, J., Rocha, R., 2014.

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Conjunto de alterações do NCF

Disposições gerais Obrigatórias para todos os imóveis rurais Disposições transitórias Introduzem as concessões

para adequação dos imóveis rurais

Sistemas de controle e incentivo

Criam mecanismos e políticas para apoiar implementação da lei

desse período o próprio mercado passou a ser mais exigente em relação ao cumprimento da legislação ambiental, à exemplo da Moratória da Soja24.

Frente a isso, em 200925 iniciou-se uma forte articulação dos setores capitaneados pelo agronegócio no Congresso Nacional, alegando que o Código Florestal de 1965 impunha limitações ao desenvolvimento do setor agropecuário26 e colocava em situação de ilegalidade 90% dos proprietários rurais27. O custo da adequação era um dos principais argumentos utilizados, à medida que esses devem ser suportados exclusivamente pelos proprietários, ao passo que o benefício ambiental beneficia toda a sociedade.

Dessa forma, no ano de 2012 após um longo período de discussão no Congresso Nacional e no Senado, aprovou-se a Lei de Proteção da Vegetação Nativa n° 12.651, que instituiu o novo Código Florestal (NCF). A nova versão traz uma série de reduções de exigências, sobretudo para as Áreas de Proteção Permanente, bem como reduz a proteção de áreas frágeis e de matas ciliares, enfraquecendo a lógica da conservação da versão anterior da lei28.

De maneira geral, as mudanças realizadas no NCF podem ser agrupadas em três grupos, conforme a Figura 2.

Figura 2 – Mudanças resultantes da Lei de Proteção da Vegetação Nativa Fonte: Adaptado de Brancalion et al., 2016.

24 Acordo resultante de campanha do Greenpeace onde os maiores compradores de soja da Amazônia se comprometeram publicamente a não comprar soja de áreas desmatadas após 2006, sendo reajustada para 2008 após a mudança no Código Florestal de 2012.

25 Constituição da Comissão Especial na Câmara dos Deputados, onde o então deputado Aldo Rebelo foi

designado como relator para elaborar um parecer ao Projeto de Lei 1.876/1999de autoria do então deputado Sérgio Carvalho.

26 Nepstad et al.; 2014

27 FAEP, 2012. Parecer do relator deputado federal Aldo Rebelo ao Projeto de Lei n° 1876/99. 28 Bernasconi et al., 2013

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No grupo das disposições gerais o que se destaca é a introdução do conceito de área rural consolidada no inciso III do art. 3° que diz: área de imóvel rural com ocupação

antrópica preexistente a 22 de julho de 2008, com edificações, benfeitorias ou atividades agrossilvipastoris, admitida, neste último caso, a adoção de regime de pousio. Este

conceito é o cerne do que se considera a anistia aos crimes ambientais29, cabendo ressaltar que a data da anistia coincide com a data de promulgação da Lei de Crimes Ambientais (Decreto 6.514 de 2008).

Principais retrocessos da legislação

São nas disposições transitórias que se encontram as alterações mais polêmicas, como os artigos 61 – A a 68 que dispõem sobre as áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008 em áreas de APP e de RL, permitem a redução das áreas de APP para 05 metros em imóveis rurais de até 04 módulos fiscais, escalonando-se tamanhos maiores para outros imóveis rurais, dispensando a recuperação de Reserva Legal em tais propriedades. Bem como dispensam para aqueles que desmataram de acordo com a legislação em vigor à época de regenerar, recompor ou compensar o passivo de acordo com a lei atual. Aqui o que se questiona é que não se conhece as bases científicas que sustentam a legitimidade e eficácia das disposições legais produzidas por esses artigos do NCF30.

As alterações na legislação ampliaram sobremaneira a complexidade das regras sobre as áreas de conservação em propriedades privadas, o que dificulta a participação da sociedade civil e organizada na verificação do cumprimento da legislação e sobrecarrega a fiscalização por parte dos órgãos ambientais competentes. Para que a legislação se cumpra, é necessário maior investimento em recursos humanos e tecnológicos para tal função, onerando os estados e, principalmente, os municípios, que muitas vezes não contam com a infraestrutura necessária para o desempenho de suas atribuições. Somado a isso, com a instabilidade política e econômica do país, não se tem previsão de maior repasse de recursos aos entes federativos para desempenharem sua função no que tange aos aspectos ambientais.

Ainda, tais alterações vieram a atender as solicitações de redução das exigências ambientais por parte do setor agropecuário, sendo fortemente criticadas pelo

29 Oliveira et al., 2015

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movimento socioambiental. Por outro lado, como exposto anteriormente, devido a não conformidade da maioria das propriedades rurais, espera-se que com estas alterações, sobretudo referentes ao tamanho de APP e Reserva Legal, a legislação venha a ser cumprida.

Principais avanços da legislação

No grupo de Sistemas de controle e incentivos se encontram os principais avanços da lei para a conservação ambiental. Dentre elas, o Cadastro Ambiental Rural (CAR), o Programa de Regularização Ambiental (PRA), o Projeto de Recuperação de Áreas Degradadas e Alteradas (PRADA) e a Cota de Reserva Ambiental (CRA).

O Cadastro Ambiental Rural (CAR), regulamentado pela Instrução Normativa do MMA n° 2 de 05 de maio de 2014, consiste no levantamento de informações georreferenciadas do imóvel rural com delimitação das APP, RL, remanescentes de vegetação nativa, área rural consolidada, áreas de interesse social e de utilidade pública, com o objetivo de traçar um mapa digital a partir do qual são calculados os valores das áreas para diagnóstico ambiental.

O CAR constitui o principal mecanismo de controle e monitoramento da situação ambiental dos imóveis rurais, uma vez que passa a ser requisito para a supressão da vegetação nativa, aprovação da Reserva Legal, autorização para manejo florestal, adesão ao Programa de Recuperação Ambiental (PRA) e ao mecanismo de compensação de RL, emissão de CRA, além de ser condicionante de acesso ao crédito rural.

Entretanto, passados mais de quatro anos da regulamentação do CAR, a análise e validação dos cadastros são incipientes, resultando em uma série de atrasos na adequação ambiental das propriedades rurais, uma vez que os demais mecanismos de apoio e incentivo à regularização dependem do funcionamento efetivo do CAR31. Além disso, o prazo de inscrição no CAR foi novamente prorrogado por meio do Decreto32 estendendo o prazo para 31 de dezembro de 2018, sendo a quarta prorrogação desde sua instituição em 2014.

Até o presente momento, não foram divulgados os motivos concretos para essa nova prorrogação. Por outro lado, considerando o CAR como o principal instrumento

31 OCF, 2016

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para efetivação do Código florestal, a nova prorrogação para a inscrição das propriedades rurais gera dúvidas quanto à prioridade da pauta para o governo federal.

As alterações das regras para a Reserva Legal

Em relação à Reserva Legal, o art. 12 do NCF mantém os percentuais da Medida Provisória 2.166-67 de 2001: 80% para áreas de floresta na Amazônia Legal, 35% para áreas de Cerrado na Amazônia Legal, 20% nos campos gerais localizados na Amazônia Legal e 20% para imóveis localizados nas demais regiões do país. Por outro lado, o percentual da RL em áreas de Amazônia Legal já foi alterado algumas vezes, como se apresenta na Tabela 1.

Tabela 1 – Percentuais propostos para a RL segundo diversas legislações

Legislação Percentual de RL Descrição

Código Florestal de 1934

(Decreto 23.793) 25% da propriedade.

Válido para todas as propriedades, havendo regras para o uso racional nas áreas de floresta Amazônica. Código Florestal de 1965 (Lei

4.771)

50% para áreas de floresta na Amazônia Legal e

20% para o restante do país. Medida Provisória 1.511-1

de 1996

80% para áreas de floresta na Amazônia Legal e

20% para o restante do país.

Medida Provisória 2.166-67 de 2000

Permite redução para 50% da RL em áreas indicadas pelo Zoneamento Econômico Ecológico (ZEE) estadual.

Os Estados que possuírem ZEE pode indicar áreas para redução de RL em áreas de floresta na Amazônia Legal para fins de recomposição.

Código Florestal de 2012 (Lei 12.651)

Mantém 80% para áreas de floresta na Amazônia Legal e 20% para o restante do país. Prevê redução para 50% em ZEE estadual

(24)

Também, o art. 12 faz algumas ressalvas quanto à necessidade de se cumprir com o percentual de 80% de RL em áreas de Amazônia Legal para os municípios que possuem mais de 50% de sua área ocupada por Terra Indígena (TI) ou Unidade de Conservação (UC), bem como nos estados que possuírem Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE) e mais de 65% do seu território ocupado por UC e TI. Nesses casos, a RL pode ser reduzida para 50% do imóvel rural.

Ainda, o art. 68 permite a consolidação do uso de grandes propriedades onde se produziu desmatamento de acordo com os percentuais previstos pela legislação em vigor à época e desobriga as pequenas propriedades rurais de recuperar o passivo produzido em desacordo com a legislação vigente no período. Dessa forma, para os proprietários que desmataram até 22 de julho de 2008, a Tabela 2 apresenta algumas situações quanto à regularidade da RL.

Tabela 2 – Regularização de RL com passivo até 22 de julho de 2008 Desmatamento realizado até 22 de julho de 2008

Desmatou de acordo com a

legislação vigente à época Desmatou em desacordo com a legislação vigente à época Imóvel acima

de 4 MF

RL será determinada pela legislação vigente à época

do desmatamento

Deverá recompor, regenerar ou compensar RL de acordo com os percentuais do NCF Imóvel de até 4

MF

Independente da legislação em vigor à época, a RL será constituída a área de vegetação nativa até 22 de julho de

2008, mesmo sendo inferior ao percentual exigido pelo NCF

Fonte: Adaptado IPAM, 2015.

Para os imóveis onde a supressão da vegetação ocorreu após o marco de 22 de julho de 2008, a única opção de adequação é via restauração florestal. Na prática, a regularização da RL não é tarefa trivial visto as diversas alterações sofridas na legislação e o NCF não facilitou essa tarefa.

Segundo o art. 66 o imóvel rural que detinha até 22 de julho de 2008, área de RL em extensão inferior ao estabelecido no art. 12, poderá regularizar sua situação por meio das seguintes alternativas: recompor a RL, permitir a regeneração natural da vegetação ou compensar a RL. Outra modificação incluída no NCF trata da possibilidade de recomposição da área de RL com até 50% da área com espécies exóticas, possibilitando o plantio intercalado de espécies nativas com exóticas ou frutíferas em

(25)

sistema agroflorestal. Este dispositivo tem por objetivo a redução dos custos de recomposição, através da exploração econômica posterior da área, desde que configure uma atividade de baixo impacto e que seja aprovada pelo órgão ambiental competente.

A compensação de Reserva Legal e a Cota de Reserva Ambiental (CRA)

A compensação já era uma opção por meio da Cota de Reserva Florestal (CRF) na versão de 1965, mas as regras reduziam substancialmente a oferta de áreas e repercutiam em elevados custos de transação33. Por isso, as transações não alcançaram larga escala ou interesses de mercado significativos.

Em relação ao mecanismo de compensação de RL, o § 5° do Art. 66 preceitua as possibilidades para aplicação do instrumento, desde que o imóvel esteja inscrito no CAR, a compensação poderá ser feita mediante:

I. Aquisição de Cota de Reserva Ambiental – CRA,

II. Arrendamento de área sob regime de servidão ambiental ou Reserva Legal,

III. Doação ao poder público de área localizada no interior de Unidade de Conservação de domínio público pendente de regularização fundiária, IV. Cadastramento de outra área equivalente e excedente à Reserva Legal,

em imóvel de mesma titularidade ou adquirida em imóvel de terceiro, com vegetação nativa estabelecida, em regeneração ou recomposição, desde que localizada no mesmo bioma.

Em seguida, o § 6° estabelece as áreas que poderão ser utilizadas para a compensação:

i. Equivalência em extensão à área da Reserva Legal a ser compensada, ii. Estar localizadas no mesmo Bioma,

iii. Se fora do Estado, estarem localizadas em áreas identificadas como prioritárias pela União ou pelos Estados.

Dessa forma, além de constituir um incentivo à adequação ambiental do proprietário de imóvel rural, esse mecanismo flexibiliza a alocação das Reservas Legais. Ou seja, se uma propriedade desempenha alguma atividade produtiva, inclusive na área de RL, pode ser mais interessante economicamente compensar em uma área de

(26)

vegetação adicional de RL, por exemplo, do que restaurar na própria propriedade. A possibilidade de compensar a RL prevista pelo NCF é uma forma de reduzir o custo de oportunidade da adequação ambiental ou, dito de outra forma, de reduzir o custo da conservação para o produtor rural34.

O art. 44 institui a Cota de Reserva Ambiental (CRA) como um título nominal que representa uma área com vegetação nativa existente ou em processo de recuperação nas seguintes possibilidades:

a) Sob regime de servidão ambiental, instituída na forma do art. 9°- A da Lei n° 6.938 (Política Nacional de Meio Ambiente);

b) Correspondente à área de Reserva Legal instituída voluntariamente sobre a vegetação excedente dos percentuais exigidos pela lei atual;

c) Protegida na forma de Reserva Particular do Patrimônio – RPPN, nos termos do art. 21 da Lei n° 9.985 (Sistema Nacional de Unidades de Conservação);

d) Existente em propriedade rural no interior de Unidade de Conservação ainda não desapropriada.

A CRA substitui a Cota de Reserva Florestal (CRF) prevista pela versão do Código de 1965 e é considerada um instrumento inovador introduzido no NCF35. Isso se deve ao fato de que o mecanismo de compensação de RL via CRA ser um instrumento econômico que visa à criação de um mercado onde pode ser transacionada entre agentes econômicos.

Os instrumentos econômicos se caracterizam por mecanismos de mercado que influenciam o cálculo de custos e benefícios do agente econômico em relação ao ambiente, influenciando suas decisões36. Os instrumentos econômicos procuram internalizar os custos ambientais37 nas atividades econômicas como forma de incentivar os agentes responsáveis pelo dano ambiental a modificarem o padrão de uso dos recursos naturais, corrigindo falhas de mercado e contribuindo para a melhoria na qualidade ambiental.

34 Bernasconi et al., 2013

35 Soares-Filho et al, 2014, FEBRABAN, 2015, Soares-Filho, 2016 36 Serôa da Motta, 2005.

37 Uma externalidade negativa pode ser entendida como o dano ambiental resultante de uma atividade

produtiva que não tenha sido contabilizado nos custos de produção do agente econômico (Farley & Daly, 2011).

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Para isso, os instrumentos econômicos constituem um conjunto de ferramentas para que a política ambiental atinja seus objetivos, sendo assim considerados complementares a ela. Como a política ambiental está inevitavelmente relacionada à questão da escala do uso de recursos naturais, pode-se considerar quatro tipos de instrumentos econômicos que afetam essa escala: regulação direta, taxação, subsídios e direitos negociáveis (cap-and-trade)38.

O mecanismo de compensação de RL vem sendo considerado um instrumento econômico do tipo “direitos negociáveis” ou cap-and-trade, ou seja, onde mecanismo aloca direitos de uso da Reserva Legal entre os agentes econômicos permitindo que transacionem entre si esses direitos de uso39.

Por outro lado, o mecanismo de compensação de RL possui algumas indefinições que resultam em incertezas para os agentes que precisam se adequar a legislação. Até o presente momento a CRA não foi regulamentada, apesar dos esforços de organizações da sociedade civil para acelerar o processo de sua regulamentação40. Isso implica que o mecanismo ainda não possui definição específica sobre sua operacionalização e as atribuições do mercado de compensação.

Frente ao exposto, diversos estudos vem buscando discutir a viabilidade econômica e ambiental da compensação de RL e do mercado de CRA, inclusive como forma de fornecer subsídios para a tomada de decisão pelos policy markers. Por outro lado, estimar os passivos e ativos de RL não é uma tarefa trivial dada a dificuldade de acesso a dados atualizados e públicos, tanto em nível nacional quanto local, bem como pela dificuldade em si de valorar bens ambientais. Além disso, estimar os valores financeiros a serem transacionados entre os agentes econômicos constitui outra dificuldade, uma vez que depende da metodologia selecionada para tal e dos dados utilizados.

De qualquer forma, considera-se que o potencial da CRA será afetado por dois conjuntos de fatores41:

38 Farley, J. & Daly, H. (2011) 39 Serôa da Motta, 2014.

40 O Observatório do Código Florestal é um dos maiores exemplos de um conjunto de organizações não

governamentais reunidas em prol da implementação do NCF. Saiba mais em

http://www.observatorioflorestal.org.br/; veja a cartilha

http://ipam.org.br/wp-content/uploads/2015/06/publicacao_CRA_web.pdf 41 FEBRABAN, 2015

(28)

a) Estimativa da demanda e oferta potencial das CRAs: devido à carência de dados confiáveis para tal, uma vez que os dados do CAR ainda não estão consolidados e o PRA ainda não está plenamente implantado;

b) Elementos que influenciarão o preço das CRAs:

i. Custo de oportunidade da terra e valor de mercado da terra;

ii. Custo das demais opções previstas no NCF para compensar as áreas de RL;

iii. Custo incorrido pelo ofertante de CRA para manter protegida a área excedente de RL que deu origem ao título;

iv. Custos de transação;

v. Horizonte temporal de vigência dos contratos.

Dada a extensão do assunto, o Capítulo 2 dedica-se a explorar esse conjunto de fatores que influenciarão a efetividade da compensação de RL via CRA. Além disso, busca aprofundar nas metodologias utilizadas para estimar o potencial do mercado tanto em termos biofísicos quanto econômicos. Antes, porém, o próximo item traz o histórico do monitoramento e controle ambiental em Mato Grosso, dado a sua referência para as alterações incorporadas ao NCF e sua relevância para essa pesquisa.

Políticas de controle ambiental e de colonização em Mato Grosso

O Estado de Mato Grosso foi o pioneiro no país a instituir um sistema de licenciamento, controle e monitoramento ambiental de imóveis rurais, o Sistema de Licenciamento Ambiental em Propriedades Rurais (SLAPR), operacionalizado em 2000 e amparado pela Lei Complementar n° 38/199542. Esse sistema tinha por objetivo licenciar as atividades agropecuárias e, também, reduzir os desmatamentos irregulares, articulando as ações de fiscalização, monitoramento e licenciamento ambiental nas propriedades rurais.

No SLAPR, o licenciamento das atividades agropecuárias, de desmatamento ou exploração madeireira era realizado por meio da Licença Ambiental Única (LAU) onde os imóveis eram cadastrados de forma voluntária ou por meio de notificação da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA)43. Uma vez efetuado o licenciamento, as informações inseridas no sistema consistiam no georreferenciamento do perímetro do

42 Lei Complementar n°38/1995 que estabelece o Código Ambiental do Estado de Mato Grosso. 43 Instituto Socioambiental – ISA, Instituto Centro de Vida – ICV (2006).

(29)

imóvel, na delimitação de áreas de APP e de RL e, assim, o proprietário rural passava a cumprir com as obrigações do Código Florestal (versão de 1965).

No ano de 2000, quando o SLAPR passou a ser operacionalizado, houve uma redução no desmatamento de Mato Grosso, enquanto nos demais estados da Amazônia Legal o desmatamento foi superior. Por outro lado, a partir desse ano as taxas de desmatamento no Estado tornaram a aumentar, apesar do desmatamento em áreas não cadastradas no SLAPR ser maior do que em áreas cadastradas44.

Embora o SLAPR tenha sido um instrumento inovador e pioneiro no monitoramento e controle do desmatamento em propriedades rurais no país, o mesmo não atingiu o impacto proposto no controle dos altos índices de desmatamento em Mato Grosso. O processo de licenciamento era, com frequência, moroso devido à ausência de documentação requerida e ao tempo de análise da documentação e informações apresentadas pelos proprietários rurais.

No ano de 2008, por sua vez, o Estado de Mato Grosso criou o Programa Mato-grossense de Legalização Ambiental Rural – MT Legal – por meio da Lei Complementar n° 343/2008 e Decreto n°2.238/2009. O objetivo do MT Legal também era de disciplinar o processo de Licenciamento Ambiental das propriedades rurais. A inovação desse sistema foi criar o Cadastro Ambiental Rural (CAR) como uma etapa anterior à da emissão da LAU.

Uma vez que a maior parte dos produtores rurais possuíam pendências fundiárias e ambientais, muitos haviam sido autuados e multados na época do SLAPR. Nesse sentido, o MT Legal buscou no CAR desburocratizar a etapa de declaração de APP e RL, criando incentivos para a regularização para o produtor rural45. Para contornar possíveis receios quanto a penalizações na adesão, a estratégia do programa foi estabelecer um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta com o proprietário possuidor de passivo que, também, não seria autuado e em caso de multa anterior, seria beneficiado com redução de até 90% de seu valor.

O CAR era declaratório e o proprietário deveria fornecer todas as informações de sua propriedade para fins de controle e monitoramento, incluindo áreas de APPs, RL, imagem digital georreferenciada, memorial descritivo, etc. Após o cadastramento e

44 Serôa da Motta, 2005. 45 Hercowitz, 2009.

(30)

solicitação da LAU, o proprietário rural teria um prazo para regularizar suas pendências e em caso de não cumprimento do prazo haveria suspensão do CAR e aplicação de multas e sanções.

Outra inovação do MT Legal foi a possibilidade de regularizar a Reserva Legal por meio da Cota de Reserva Florestal, um título transacionável entre produtores rurais que estabeleceriam um contrato de servidão ambiental ou por meio de compra e doação em área passível de regularização dentro de Unidades de Conservação. O Programa visava criar um banco de dados de áreas passíveis de compensação fornecendo informações para os produtores que careciam de regularização de forma a facilitar a tomada de decisão e contribuir para melhor gestão da informação pelo próprio órgão ambiental46.

Com as alterações do NCF e a criação do CAR nacional inspirado no próprio cadastro de Mato Grosso, o Estado optou por migrar sua base estadual do CAR para o Sistema de Cadastro Ambiental Rural (SICAR) no ano de 2014. Para isso, foi necessário realizar uma diferenciação entre Licenciamento Ambiental e Regularização Ambiental, como processos distintos.

Na prática, para os produtores rurais que possuíam CAR e LAU, as informações seriam migradas, mas ainda necessitariam de retificação no SICAR. Para aqueles que não estavam inscritos no sistema estadual, deveriam realizar a inscrição no SICAR. A morosidade para a implantação do CAR nacional, ou seja, para a análise, retificação e aprovação dos cadastros no SICAR resultou na ausência de regularização ambiental das propriedades rurais em Mato Grosso.

Diante disso, no ano de 2016 o Estado de Mato Grosso optou por desenvolver seu próprio Sistema Estadual de Cadastro Ambiental, o SIMCAR. Por outro lado, o SIMCAR somente passou a ser operacionalizado no início de 2017 e, até o presente momento, oito47 Programas de Regularização Ambiental (PRA) foram realizados visando adequar as propriedades rurais com pendências ambientais.

O Estado de Mato Grosso foi pioneiro na elaboração e implantação de sistemas de controle e monitoramento ambiental em propriedades rurais no Brasil e serviu de inspiração para muitos mecanismos incorporados ao NCF. Naturalmente, gargalos

46 SEPLAN, Entrevista I, 2018. (Informação verbal) 47 SEMA, Entrevista II, 2018. (Informação verbal).

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operacionais e de gestão foram inerentes ao funcionamento desses sistemas, porém, deveriam servir como pontos a serem contornados na elaboração e execução do SICAR.

Após a compreensão sobre o histórico da elaboração e alteração da legislação que regulamenta os aspectos ambientais em propriedades rurais privadas e o exemplo do Estado de Mato Grosso, o próximo capítulo analisará a Cota de Reserva Ambiental. Buscou-se analisar a CRA à luz das principais e recentes pesquisas que se dedicam a compreender a natureza da CRA e os fatores inerentes a ela que podem ser determinantes para garantir que o instrumento contribua para a regularização e conservação ambiental no Brasil.

2 O potencial da CRA para a regularização e conservação ambiental

em propriedades rurais

Este capítulo busca aprofundar a discussão sobre a Cota de Reserva Ambiental como instrumento para a compensação de Reserva Legal. O capítulo anterior apresentou as principais alterações realizadas no NCF ao longo do tempo e a incorporação de novos mecanismos complementares aos mecanismos de comando-e-controle, como é o caso da própria CRA.

A partir disso, a discussão sobre como a CRA pode ser efetivamente um instrumento para a regularização e conservação ambiental é relevante para fornecer subsídios que favoreçam o desenho do mecanismo e sua regulamentação. Esse capítulo visa fazer uma síntese sobre o que vem sendo discutido em estudos de referência sobre o tema até o presente momento, bem como as metodologias utilizadas nesses trabalhos.

A partir desse panorama, a presente pesquisa apresentará sua contribuição para a discussão sobre a efetividade da CRA, que consiste em uma abordagem local e qualitativa baseada na percepção de produtores rurais sobre os fatores citados acima e qual seria o melhor desenho do mecanismo para que participem do esquema de compensação.

Basicamente, a literatura sobre as CRA pode ser dividida em duas linhas de análise. Uma que analisa a viabilidade da implantação de um mercado de CRA tanto em cada estado brasileiro como em escala nacional, outra que analisa o desenho do mecanismo e seu potencial de gerar adicionalidade ambiental.

(32)

O primeiro grupo de análise do potencial das CRA48 deu maior destaque para o potencial do ponto de vista biofísico, ou seja, do excedente e déficit de vegetação nativa disponível para alocar a compensação da RL. E, com base nessa oferta e demanda, indicam os preços médios, a quantidade e a localização possível para as trocas.

De maneira geral, esses estudos se apoiam em análises de geoprocessamento para estimar os excedentes e déficits de vegetação nativa, utilizando modelagem de cenários de regulamentação das CRA que afetará a oferta e demanda. E, com base no equilíbrio entre oferta e demanda, estimam o valor das CRA. Basicamente, o levantamento quanto à oferta e demanda potencial por CRA variam devido à base de dados e metodologia utilizada, mas os resultados são congruentes quanto ao excedente de oferta e aos indicativos de preços.

Em estudo mais recente49 levantou-se uma oferta potencial de 154 Mha CRA para uma demanda potencial de 11 Mha de CRA, indicando uma oferta significativamente superior à demanda. Em consequência a esse excesso de oferta, o preço das CRA pode ser muito baixo e determinado pela demanda, tornando o mercado pouco atrativo para proprietários com excedente de vegetação nativa. Outro estudo50 aponta que o preço de equilíbrio entre oferta e demanda das CRA deve ser próximo ao preço das áreas de vegetação nativa, enquanto a oferta de vegetação nativa for suficiente para atender a demanda por CRA.

De qualquer forma, o mercado de CRA vem sendo apontado como viável e a compensação provavelmente será a opção mais econômica de regularização para a maior parte dos proprietários rurais, considerando os elevados custos de oportunidade51 das terras produtivas, o substancial aumento do preço da terra após desmatamento ou conversão de qualquer tipo de vegetação para uma terra produtiva, bem como os elevados custos para a restauração florestal52. Por outro lado, do ponto de vista ambiental a compensação pode não ser a melhor alternativa, como será discutido a seguir.

48 Soares-Filho et al. (2014), Rajão, R. (2015), Soares-Filho et al. (2016), Freitas et al. (2017). 49 Freitas et al. (2017).

50 Vilela et al.(2017).

51 Vide página 35 sobre custo de oportunidade. 52 Freitas et al. (2017).

(33)

Nesse sentido, a outra abordagem que vem sendo considerada em diversos estudos, trata sobre os possíveis desenhos para que o mecanismo de compensação de RL seja efetivo não apenas para a regularização ambiental de propriedades rurais, mas também para que resulte em adicionalidade ambiental.

Adicionalidade ambiental

Segundo o NCF, a compensação da RL poderá ocorrer de duas formas: adquirindo CRA em áreas de vegetação nativa que já estão protegidas por lei, como é o caso de compra e venda de áreas passíveis de regularização no interior de Unidades de Conservação (UCs), ou protegendo áreas de vegetação nativa que podem ser legalmente convertidas em áreas produtivas. Por outro lado, apenas a última alternativa aumenta o total de vegetação nativa protegida. A primeira opção somente contribuirá para a regularização ambiental do produtor rural com passivo, mas não aumentará a área de vegetação nativa sob proteção uma vez que a área a ser compensada já está legalmente protegida em Unidade de Conservação.

A adicionalidade ambiental pode ser compreendida como um resultado positivo em relação a um cenário base, ou seja, um benefício adicional gerado em comparação a um cenário sem o mecanismo53. Nesse sentido, existem abordagens diferentes quanto à questão da adicionalidade do mecanismo de compensação de RL. Estudos54 apontam que o objetivo da CRA não é, em último caso, evitar o desmatamento legalmente permitido, mas sim o de flexibilizar a alocação da Reserva Legal para as propriedades rurais com elevado custo de oportunidade que desmatarem além do permitido pré-2008. Por outro lado, outros estudos55 tem ampliado o escopo da CRA como uma forma de evitar o desmatamento de áreas excedentes de vegetação nativa passíveis de desmatamento legal.

Ainda, o trabalho de Brito, B. (2017) considera que a CRA, por essência, se encaixa na definição de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA), sendo uma transação voluntária onde o serviço associado com ecossistemas florestais será comprado por um comprador de um vendedor, se o vendedor do serviço garantir a

53 Gasparinetti e Vilela (2018).

54 Bernasconi et al. (2013) ,Gasparinetti e Vilela (2018). 55 Freitas et al.(2017), Brito, B. (2017),

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provisão do mesmo, ou seja, onde o proprietário vendedor concorda em conservar a área ao longo da duração do contrato.

Além da adicionalidade, outro aspecto que vem sendo discutido56 em relação ao mecanismo de compensação de RL é o da substitutibilidade. O NCF ao definir a extensão da área como único critério para aquisição de área para realizar a compensação de RL, restringe a compensação em termos de área e não em termos de equivalência ecológica, por exemplo. Também, o fato de a compensação ser possível em locais distantes de onde o desmatamento foi realizado é outro fator que interfere na substitutibilidade, ou seja, do ponto de vista ecológico seria interessante que o dano fosse reparado em uma área próxima e de equivalência ecológica. Por isso, alguns estudos apontam que o ideal seria restringir a compensação dentro da bacia hidrográfica ou da micro bacia hidrográfica, por exemplo.

Considerando o exposto acima, além dos aspectos biofísicos outros fatores podem ser determinantes para o funcionamento do mecanismo de compensação em termos econômicos e ambientais. Tais fatores, como abrangência geográfica e governança são aspectos importantes para o desenho do mecanismo e serão discutidos a seguir.

Desenho do mecanismo: abrangência geográfica e competências de gestão

O NCF possibilitou a descentralização para os estados da elaboração de seus sistemas de monitoramento e dos Programas de Regularização Ambiental (PRAs). Frente a isso, a discussão sobre as competências quanto à regulamentação e emissão das CRA é relevante.

O art. 45 § 4° da Lei 12.651 diz que a CRA será emitida pelo órgão competente do Sisnama em favor do proprietário do imóvel incluído no CAR que mantenha área nas condições previstas pelo art. 44. Sempre que o órgão federal for o órgão competente do Sisnama, poderá delegar suas competências para a emissão das CRA e, sendo assim, todos os Estados podem emitir as CRA. Essa interpretação está embasada nos Incisos III, IV e IV, art. 23 da Constituição Federal, que dispõe sobre a regulamentação por Lei

(35)

Complementar e determina que não cabe a Lei Ordinária – caso do NCF - tratar da competência dos entes federativos57.

De qualquer maneira, apesar dos Estados poderem emitir CRA, muitos Estados estão aguardando a regulamentação federal com definições gerais sobre as CRA para iniciar a elaboração da regulamentação estadual58. Somente o Estado do Mato Grosso do Sul está avançando na emissão de CRA. Como as diretrizes federais estabelecidas no NCF não estão detalhadas existe uma incerteza por parte dos Estados quanto ao funcionamento e operacionalização do mecanismo59.

Por outro lado, cabe aos Estados determinar a amplitude da compensação, limitando a compensação dentro do Estado ou entre Estados desde que no mesmo Bioma, e definir áreas prioritárias para a compensação. Essa definição é importante para balancear a oferta e demanda de CRA, contribuir para que o mercado de CRA efetivamente proteja a vegetação nativa e serviços ecossistêmicos, evitando a conversão em larga escala de terras produtivas nas áreas de vegetação remanescente60.

Em Mato Grosso, por exemplo, o principal gargalo quanto ao funcionamento do mecanismo de compensação via CRA é a ausência da normatização do governo federal que constitua um instrumento jurídico para que os demais entes federativos possam seguir as diretrizes. Como Mato Grosso migrou os cadastros ambientais do SICAR para seu sistema próprio SIMCAR, o Estado ainda está em fase de retificação dos cadastros os adequando ao novo sistema. Até o momento, dos 180.504 imóveis no Estado, 44 mil imóveis foram retificados no novo sistema, aproximadamente 40% dos imóveis rurais estão devidamente inscritos no SIMCAR. Até meados de junho, a SEMA havia firmado oito termos de adesão ao PRA.

Em termos de sistema, o módulo operacional de compensação de RL do SIMCAR ainda não foi desenvolvido. Apesar disso, segundo a Superintendência de Regularização e Monitoramento Ambiental (SRMA)61 da SEMA a compensação deverá ser realizada dentro do Estado e as áreas prioritárias para a compensação constituirão as áreas passíveis de regularização fundiária dentro das Unidades de Conservação de Mato

57 Gasparinetti e Vilela (2018). 58 Gasparinetti e Vilela (2018).

59 SEPLAM, Entrevista I, 2018. (Informação verbal) 60 Freitas et al. (2017), Brito, B. (2017).

(36)

Grosso. Esse critério foi definido como prioritário como uma alternativa para viabilizar a resolução de pendências fundiárias do órgão ambiental.

Por outro lado, outros critérios como áreas prioritárias para a conservação ou equivalência ecológica não foram apontados como requisitos que deverão ser considerados para a compensação. Ainda, a SMRA informou que não há uma base de dados atualizada sobre áreas prioritárias para a compensação e conservação oriunda dos programas de monitoramento ambiental anteriores ao CAR, como o SLAPR, MT Legal e Zoneamento Ecológico Econômico62.

No geral, os PRAs nacional e estaduais não consideram a adicionalidade na proteção ambiental e os aspectos socioeconômicos na definição dos critérios para a alocação de RL. Segundo Freitas et al. (2017) não considerar o aspecto da adicionalidade pode se constituir em uma oportunidade perdida, comprometendo a credibilidade ambiental e social do mercado de compensação via CRA.

Além disso, a ausência de um banco de dados com as áreas passíveis para a compensação dificulta a tomada de decisão por parte do produtor rural que, muitas vezes, necessitará contratar mão-de-obra especializada para intermediar a compra e venda de áreas. A SEMA informou que em relação aos preços da compensação, a negociação se dá entre os agentes econômicos sem interferência do órgão ambiental, favorecendo a precificação dos ativos ambientais pelo mercado.

Precificação da CRA

Em relação aos possíveis valores da CRA, a literatura vem utilizando o custo de oportunidade como uma proxy dos valores que podem afetar na tomada de decisão do produtor em relação ao quanto estaria disposto a pagar ou receber pela compensação de Reserva Legal. Por outro lado, observa-se que não há um método único de estimativa do custo de oportunidade, como se apresenta a seguir.

Segundo Rajão (2015), o custo de oportunidade é o resultado da comparação entre alternativas econômicas e, por isso, uma das formas mais diretas de se estimar o valor de um recurso ambiental. Dessa forma, a estimativa avalia a diferença entre uma opção mais rentável e a renda obtida a partir do uso sustentável de um recurso

62 Para maiores informações sobre esses sistemas, ver item Políticas de controle ambiental e de colonização

(37)

ambiental. Entretanto, o autor aponta que as estimas de custo de oportunidade tendem a subestimar o valor do recurso ambiental em relação a outras formas de valoração, uma vez que utilizam apenas o valor monetário associado à utilização direta do recurso, ignorando outros benefícios do mesmo.

Já o trabalho de Bernasconi et al. (2013) considerou o custo de oportunidade como os resultados potenciais dos retornos agrícolas e não considerou os valores potenciais oriundos do uso econômico de um recurso ambiental (no caso, o uso da Reserva Legal) que poderiam ser obtidos dentro de propriedades rurais. Para tal valoração, utilizou o Valor da Terra Nua (VTN) disponibilizado para o ano de 2012 pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA) do governo do estado de São Paulo.

De forma semelhante, Naidoo e Iwamura (2007) estimaram o custo de oportunidade da conservação ambiental a partir do fluxo de benefícios econômicos derivados de culturas agrícolas e produção de gado. Para isso, utilizaram o valor de arrendamento de terras agrícolas como proxy do custo da conservação ambiental, uma vez que representa o valor da renda “perdida” quando a área é preservada ao invés de destinada para a produção agrícola.

Para Hercowitz (2009), o custo de oportunidade não seria propriamente o desembolso que o proprietário faria para se regularizar, mas sim um custo associado ao lucro que se encerra. De outra forma, o custo de oportunidade seria a receita que o proprietário deixará de receber em determinada área quando escolhe outro tipo de uso para a mesma.

A plataforma BVRio, como apresentado anteriormente, vem operando um mercado incipiente de CRA, buscando dar eficiência e liquidez ao mercado. Ou seja, vem operando como um meio para que os interessados em comprar e vender CRA possam se encontrar e fechar contrato. A Tabela 3 apresenta os valores (R$/ha.ano) para os biomas em Mato Grosso, os valores apresentados são determinados pelos próprios compradores e vendedores.

Tabela 3 – Valores ofertados para a CRA na Plataforma BVRio

Bioma Mínimo Máximo

Pantanal R$ 52,50 R$ 77,00 Cerrado R$ 767,77 R$ 1.126,00 Amazônia R$ 292,22 R$ 428,59

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