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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.3 Transtornos Invasivos do Desenvolvimento

2.3.3 Áreas de prejuízo do desenvolvimento

2.3.3.1 Interação social

Na área Interação Social, o CID-10 (OMS,1993) e DSM-IV-Tr (APA,

2002) consideram importante para o diagnóstico do AI e SA a criança que apresenta ausência de contato visual, falta de interesse pelas pessoas, ausência de expressão facial, de posturas e de gestos corporais. Também demonstra fracasso para desenvolver relacionamentos pessoais, os mais jovens podem demonstrar pouco ou nenhum interesse por amizades e os mais velhos se interessam por amizades, mas não entendem as regras para o relacionamento. As crianças podem ter dificuldade para entender o que os

outros pensam e sentem, não necessitando de contatos físicos e respostas afetivas dos seus cuidadores.

Muitas vezes, o início da vida é normal, o bebê estabelece contato visual, agarra um dedo, olha na direção de onde vem uma voz e até sorri. Para crianças pequenas com desenvolvimento típico, a voz humana parece ser um dos primeiros e mais efetivos estímulos que conduzem ao engajamento social. Esta orientação espontânea não é observada em crianças pequenas com Autismo Infantil (Klin, 2006). Outras crianças apresentam já no nascimento a falta de contato de olho, pouca resposta ao ser chamado pelo nome, pobre repertório de imitação motora, atraso na intenção de brincar, entre tantas outras falhas que acabam citadas pelos familiares após o diagnóstico de Autismo Infantil (Baron-Cohen et al., 1996). Segundo Eaves e Ho (2004), esses comportamentos sociais são precursores das manifestações do AI e SA e depende dos cuidadores conseguirem observar as sutilezas do comportamento do recém-nascido.

A mais simples troca de afeto é muito difícil como, por exemplo, o próprio olhar nos olhos, que é uma das primeiras formas de estabelecimento de contato afetivo. Toda manifestação de afeto é ignorada, os abraços são simplesmente permitidos, mas não correspondidos. Não há demonstrações de desagrado quando os pais saem ou alegria quando voltam para casa. Os problemas de relacionamento com outras pessoas são mais graves antes dos 5 anos de idade, envolvendo, principalmente, problemas na fixação do olhar, nas ligações sociais e na atividade de brincar.

Em estudo retrospectivo, Osterling et al. (2002) mostraram que as crianças na idade de 1 ano com AI e SA olham para o outro e respondem aos seus nomes com menos freqüência do que crianças com retardo mental; e fixam mais o olhar no corpo do que no olho da outra pessoa, o que acarreta menos respostas e envolvimentos dessas crianças em situações sociais (Scambler et al., 2006; Speer et al., 2007).

Algumas crianças com AI e SA podem apresentar comportamentos de apego seguro em relação aos pais ou cuidadores (Yirmiya, Sigman, 2001), e demonstram uma preferência em tê-las próximas ou, pelo menos, no seu

campo de visão. Rutgers et al. (2004) observaram que 53% das crianças com Autismo Infantil apresentam apego seguro, mas, como têm dificuldade em entender o que os outros pensam e sentem, não demonstram respostas afetivas a seus cuidadores e, com isso, limitam o entendimento interpessoal para o acolhimento. A maneira de a criança com AI e SA demonstrar o apego seguro é muito mais variada que a da criança típica, pois está relacionada à severidade do quadro, ou seja, quanto mais grave o quadro da criança, há mais apego inseguro, com possibilidade de apego desorganizado (Naber et al., 2006).

Nos relacionamentos com os seus pares, as crianças com AI e SA apresentam dificuldade para responder quando chamadas pelo nome, dificuldade para se engajar em situações que exigem atenção e dificuldade para imitar brincadeiras de outras crianças (Carpenter et al., 1998; Baraneck, 1999; Baird et al., 2000; Werner et al., 2000).

Muitos autores consideram o prejuízo da interação social no AI e SA o seu prejuízo primário. Hobson (1993) considera que a característica principal destas crianças é a dificuldade em entender o significado afetivo de estar junto com o outro e de experimentar os sentimentos que vêm dessa relação. Por outro lado, Baron-Cohen et al. (1996) referem que a falha social está na limitação em compreender, de forma cognitiva, os estados mentais das outras pessoas, ou seja, a criança raramente compartilha a atenção do parceiro ou mesmo do adulto sobre algum objeto ou evento particular. A criança com AI e SA é incapaz de focar a atenção visual de forma espontânea em um adulto e atrair a atenção dele para realizarem juntos alguma tarefa; em geral, apresenta pouca ou nenhuma estratégia para compartilhar a atenção com os outros (Jordan, Powell, 1995; Sigman, Capps, 2000; Bosa, 2000; Klin et al., 2006).

2.3.3.2 Comunicação

Na área Comunicação, o CID-10 (OMS,1993) e o DSM-IV-Tr (APA, 2002) consideram importante para o diagnóstico do AI e SA limitações e prejuízos na comunicação não-verbal, como ausência de trocas gestuais, corporais, falta de trocas coloquiais, com falas não ajustadas ao contexto, repetitivas e ecolálicas, inversão pronominal e dificuldade no uso de abreviação predicativa e na compreensão de metáforas ou simbolismos. Os comportamentos atípicos mais comuns estão relacionados a problemas de fala, de linguagem e prejuízos sociais (Frith, Soares, 1993; De Giacomo, Fombonne, 1998). Pessoas com AI e SA, portanto, comunicam-se e utilizam a linguagem de forma peculiar, não somente com relação à sua sintaxe e gramática, mas com relação à semântica e pragmática da comunicação, o que dificulta os seus relacionamentos (Passerino, 2005; Scheuer et al., 2007).

A criança autista pode desenvolver fala, especialmente se a inteligência estiver preservada, porém as dificuldades para estar com o outro e prestar atenção às pistas sociais fazem com que ela não a desenvolva normalmente, apresentando prejuízo no desenvolvimento das comunicações gestual e visual, que antecedem a manifestação da fala (Perissinoto, 2003).

Na área Comunicação, 50% das crianças não desenvolvem a linguagem falada. Quando apresentam fala, muitas vezes conversam com diferentes tipos de pessoas da mesma maneira ou apresentam inabilidade para conversar e iniciar uma conversação (DSMIVTR, 2002; Young et al., 2003).

As alterações na comunicação verbal e não-verbal, na compreensão e expressão estão presentes em todas as crianças com AI e SA. A linguagem aparece prejudicada a partir do segundo ano de vida. Até esse momento, os pais dificilmente percebem alguma anormalidade (Young et al.., 2003). Por isso, a avaliação por meio da análise do desempenho de linguagem e do comportamento comunicativo da criança é necessária, uma vez que nessas áreas os sintomas aparecem com mais clareza (Perissinoto, Chiari, 2003, Perissinoto, 2003, Perissinoto, 2004).

As dificuldades com a linguagem vão além do que se espera para o nível de desenvolvimento, especificamente no manejo do discurso e na produção aumentada de palavras sem significados (jargão), com importantes atrasos sintáticos (Eigsti et al., 2007).

2.3.3.3 Atividades restritas e movimentos estereotipados

Na área relacionada às atividades restritas e interesses, observa-se que as crianças se engajam em poucas atividades; apresentam movimentos repetitivos como girar objetos, girar em torno de si mesmos, flaps de mãos e de braços; demonstram interesse em sons autoproduzidos ou em olhar fixamente suas mãos e dedos. Para algumas, as mudanças no ambiente provocam raiva e mau humor e, para outras, os comportamentos como cuidar de uma boneca, brincar de falar no telefone ou brincar de fazer comidinha não fazem parte de suas atividades imaginativas e simbólicas (American Psychiatric Association, 2002).

Segundo a American Psychiatric Association (APA, 2002), o Transtorno de Tiques tem como característica vocalizações recorrentes e/ou movimentos motores com uma determinada duração e freqüência, e o Transtorno do Movimento Estereotipado apresenta um comportamento motor repetitivo, não funcional e muitas vezes aparentemente impulsivo. Estudos recentes descreveram as características clínicas relacionadas aos tiques e estereotipias de indivíduos com AI e SA (Mazur, Marteleto, Pedromônico, 2005; Canitano, Vivanti, 2007) e observaram associação entre retardo mental e severidade dos tiques.

Os sistemas de classificação internacionais associam a imaginação aos prejuízos da comunicação, mas, considerando a tríade de prejuízos, em resultados de pesquisas recentes a imaginação também aparece relacionada ao comportamento repetitivo (Honey et al., 2006; Bruckner, Yoder, 2007). Em um estudo realizado por Rutherford et al. (2007), com a finalidade de verificar mudanças preditoras no desempenho da intenção do jogo em crianças com AI,

no curso do desenvolvimento, 28 crianças com AI (idade cronológica média de 57,6 meses), 18 crianças com outras desordens de desenvolvimento (idade cronológica média de 59 meses) e 27 crianças típicas (idade cronológica média de 30,1 meses) foram observadas em brincadeiras. As crianças com Autismo Infantil estavam severamente atrasadas no desempenho para a intenção do jogo e para a atividade simbólica, sendo a atenção compartilhada a única e forte preditora do desenvolvimento da intenção do jogo.

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