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CAPÍTULO II CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS

2.6 ÉTICA NA PESQUISA

O presente item visa apresentar direcionamentos tomados pela pesquisadora para caracterizar a presente pesquisa como sendo ética. Antes me mais nada, é necessário pensarmos sobre a pesquisa científica de maneira geral. Conforme pontua Spink (2012, p. 38):

A tarefa primária da pesquisa científica é a produção do conhecimento. Seja ele de inspiração teórica, metodológica ou prática, o conhecimento produzido pela ciência não é o único que utilizamos. Vivemos sob uma vasta ecologia de produzir e fazer circular fazeres, incluindo o óbvio (que não é óbvio) senso comum, os saberes tradicionais de múltiplas fontes e culturas, e os saberes práticos, com sua extensa biblioteca. Entretanto, quando pensamos sobre nosso cotidiano de equipamentos eletrônicos, redes sem fio, leite pasteurizado, remédios, motores de combustão interna, fibras artificiais e sacolinhas plásticas, temos que aceitar que o conhecimento científico, produto da pesquisa empírica, é, certamente, o mais barulhento.

Portanto, antes de realizar uma pesquisa científica, é preciso ter em mente que haverá um longo processo a ser realizado, com certos cuidados, em especial quando a pesquisa envolve seres humanos. Ademais, compreendemos que para uma pesquisa ser ética não basta simplesmente seguir preceitos burocráticos impostos pela academia, como por exemplo, submeter um projeto de pesquisa na Plataforma Brasil. É necessário mais que isso: precisamos assumir a ética como uma prática social, ou seja, precisamos nos preocupar com o outro. Sendo assim, filiamos com o que pontua Mateus (2011):

Definir ética como prática social implica [...] viver ética e recriar seus sentidos continuamente na medida em que são recriadas as relações com o outro. Não se limita, desse modo, à ética na pesquisa com seres humanos, mas à ética na convivência humana. Isso quer dizer que o encontro com o outro exige responsabilidade mútua. Encontrar-se com o outro significa com-viver, com- partilhar, com-laborar, com-unidade, com-paixão (ibid., n.p.).

Nossa pesquisa possui uma característica muito específica, que é fato de a pesquisadora conhecer alguns participantes de longa data, bem como ter sido colega de outros durante as disciplinas da pós-graduação. Portanto, o contato com eles não se deu somente no dia de realização do minicurso, e nem parou por aí, tendo em vista que eventualmente é possível encontrá-los pessoalmente, trocar algumas palavras (seja sobre a pesquisa ou qualquer outro assunto). Daí uma preocupação maior no momento da escrita das análises, pois, de maneira alguma, a pesquisadora pretende interpretar erroneamente os fatos descritos nos textos autobiográficos dos participantes da pesquisa.

Compreendemos que a relação entre a pesquisadora e os partícipes pode ser considerada uma relação de não-indiferença, que, segundo Bakhtin (apud Mateus, 2011), é o que caracteriza o pensamento ético. No trecho a seguir, Mateus (2011) especifica (a partir de Amorim, 2003) como deve se dar a não-indiferença:

Ao discutir sobre a articulação ética, estética e epistemológica em Bakhtin, Amorim (2003) argumenta que ser não-indiferente é dar ao outro um acabamento que somente alguém, de seu lugar único, é capaz de dar. É assinar as relações que se vivem. Assim, ao produzir um texto em que falo do outro, por exemplo, produzo, necessariamente, tensão porque entre aquilo que vejo do outro e aquilo que ele mesmo vê há diferenças fundamentais de lugar, de posição e de valores. No entanto, a ética da criação reside em “tentar captar algo do modo como ele se vê, para depois assumir meu lugar exterior e dali configurar o que vejo do que ele vê” (Amorim 2003, p.14). É, portanto, reconhecer a cultura do outro e buscar esse acabamento a partir daquilo que é seu, que é próprio de seu universo, sem perder aquilo que somente do meu lugar posso dar.

Por isso, no capítulo destinado às análises, buscamos desenvolver um texto que englobe a conceituação acima descrita. Compreendemos que tais conceitos podem se equiparar ao trabalho de um fotógrafo, que, a partir das lentes de seu equipamento, visa retratar a essência do sujeito ou objeto que está fotografando. Portanto, esperamos que essa pesquisa, ao final, simbolize uma fotografia que revela os traços identitários de todos os seus envolvidos: tanto os participantes da pesquisa, quanto a própria pesquisadora.

Com relação aos procedimentos éticos burocráticos, o primeiro passo foi dado no mês de setembro de 2018, quando a pesquisadora submeteu um projeto de pesquisa ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UTFPR, via Plataforma Brasil – mesmo não sendo tal plataforma pensada para abarcar pesquisas na área de humanidades e contar com uma enorme burocratização ao exigir tantos formulários. A aprovação de tal projeto deu- se no dia 04 de outubro do mesmo ano, sob parecer número 2.941.894 (ANEXO A). A partir disso foi possível a preparação para a coleta de dados, que ficou programada para o mês de março do ano seguinte.

O recrutamento dos participantes fez-se por convite via e-mail (APÊNDICE A). Após o aceite do convite, a pesquisadora marcou a data de realização do minicurso a partir da disponibilidade da maioria dos participantes, visto que no e-mail de convite foram propostas diferentes datas e horários para execução da proposta. No dia em que o minicurso foi realizado, antes de iniciar as atividades, a pesquisadora falou sobre a pesquisa, leu e esclareceu o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e Termo de Consentimento de Uso de Imagem e Voz (TCUIV) (APÊNDICE C), documentos que foram, na sequência, assinados por todos os participantes da pesquisa. A partir disso,

algumas garantias foram dadas aos participantes da pesquisa, como o fato de não serem expostos a riscos, bem como o direito de se retirar da pesquisa a qualquer momento.

Tendo em vista a proximidade da pesquisadora com os participantes da pesquisa e o caráter dos dados gerados (em especial os textos autobiográficos, em que são revelados fatos da vida pessoal de seu autor), a maior preocupação está em conduzir as análises de forma a não apresentar juízo de valores, mas sim, identificar marcas identitárias de acordo com os pressupostos teóricos que utilizamos na pesquisa. Portanto, tomando como exemplo os trabalhos de D’Almas (2016) e Francescon (2014), buscamos propiciar o retorno das análises da pesquisa por parte dos participantes.

É válido destacar que, no dia em que ocorreu o minicurso, todos os participantes foram convidados a ter acesso aos resultados da pesquisa. Findado o capítulo de análises, o mesmo foi enviado aos participantes para que pudessem ler e, se achassem necessário, sugerir correções ou mudanças naquilo que foi escrito pela pesquisadora. Vemos isso como uma maneira de tornar mais efetiva a participação, bem como engajar mais os participantes com a pesquisa, demonstrando que eles são elementos chave para a pesquisa toda, e não apenas para o momento da geração dos dados.

2.7 RESUMO DO CAPÍTULO

Neste capítulo foi apresentada a natureza da pesquisa, descrevendo como se dá uma pesquisa qualitativa (MINAYO, 1994), com características interpretativa (CRESWELL, 2007). Ainda, foi exposto brevemente o quadro teórico-metodológico do ISD (BRONCKART, 2012). Apresentamos os participantes da pesquisa, bem como a pesquisadora. Ainda, foi relatado como se deu o procedimento de geração dos dados.

No que tange aos objetivos e perguntas de pesquisa apresentados neste capítulo, é importante esclarecer que esta pesquisa possui como objetivo principal investigar as representações identitárias dos seis professores de LI participantes da pesquisa, e os textos autobiográficos, bem como os textos orais, são apenas os instrumentos utilizadas para se chegar a tais representações.

Dando sequência, tecemos algumas considerações acerca da transcrição de áudios e especificamos a metodologia utilizada tal (MARCUSCHI, 2010), tendo em vista que fazem parte do corpus para análise os textos orais produzidos pelos participantes da pesquisa. No item 2.5.1, abordamos quais serão as categorias de análise, a partir do método de análise de textos desenvolvido pelo ISD (BRONCKART, 2012). Findamos com

um importante tópico, que diz respeito à ética na pesquisa (MATEUS, 2011), e quais os posicionamentos tomados pela pesquisadora para que tal ética seja efetivada.

No próximo capítulo, trazemos as análises dos textos autobiográficos escritos e orais produzidos pelos participantes da pesquisa.