• Nenhum resultado encontrado

Capítulo 2 – Óxidos condutores transparentes e díodos orgânicos emissores de luz

2.1.2. Óxidos simples (óxido de índio e óxido de zinco)

O In2O3 e o ZnO são dois dos óxidos simples mais utilizados na indústria da optoelectrónica, especialmente em aplicações de valor acrescentado, como por exemplo, os mostradores planos. Nesta secção serão apresentadas as propriedades mais significativas destes dois materiais.

2.1.2.1. Óxido de índio

O In2O3 apresenta uma estrutura cristalina cúbica do tipo bixbyite pertencente ao grupo espacial Ia3 com um parâmetro de rede de 10,12 Å. Cada célula unitária apresenta 80 átomos, dos quais 32 são de índio e 48 de oxigénio.[40] A estrutura bixbyite pode ser derivada da estrutura cúbica de faces centradas do CaF2 removendo um quarto dos aniões. A principal diferença entre estas duas estruturas está na coordenação dos átomos metálicos, que no caso do CaF2 é MO8, um átomo de Ca está coordenado por 8 de F, enquanto na bixbyite é MO6.

[41]

Desta forma, no caso do In2O3 os átomos de In encontram-se coordenados apenas com 6 átomos de O resultando em diferentes distâncias In- O de 2,13, 2,19 e 2,23 Å. (Figura 2.4) [41]

Figura 2.4 Estrutura cristalina cúbica (bixbyite) do In2O3.

O In2O3 é um semicondutor tipo-n com uma elevada concentração de portadores (>1019 cm-3). Os portadores resultam, no caso dos filmes intrínsecos, da formação de lacunas de oxigénio que fornecem electrões livres de acordo com as seguintes equações de equilíbrio (notação de Kröger– Vink)1: [42]

2 3 ⇔ 2 3  6 ´ 3

2 (2.9)

⇔12  2 ´ (2.10)

Tendo em consideração estas equações, verifica-se que o oxigénio influencia directamente a concentração de portadores e subsequentemente a resistividade dos filmes de In2O3 e dos TCOs em geral, pelo que o seu controlo durante a deposição dos filmes se torna essencial.[40, 43] Outra forma de melhorar as propriedades eléctricas dos filmes de In2O3 consiste em dopá-los com impurezas extrínsecas de valência superior, como por exemplo o estanho (Sn).[44] O óxido de índio dopado com estanho (ITO) é um dos TCOs mais utilizados na indústria da optoelectrónica pois apresenta excelentes propriedades, nomeadamente uma baixa resistividade (ρ=1-2x10-4Ω cm) e em simultâneo uma elevada transmitância (> 85 %).[44-48] Quando o estanho é adicionado em pequenas quantidades (<10 at%) ao In2O3 os catiões Sn

4+

substituem na rede cristalina os In3+ fornecendo assim mais um electrão livre. Desta forma, no caso do ITO, coexistem dois mecanismos de geração de portadores livres: o primeiro, resultante da formação das lacunas de oxigénio no In2O3; o segundo proveniente da substituição do In3+ por Sn4+, permitindo que sejam obtidas concentrações de portadores na ordem dos 1021 cm-3.[44, 47-49] Na Figura 2.5 encontra-se representado o diagrama de bandas para o ITO dopado. O limite inferior da banda de condução (MBC) é formado pelas orbitais 5s do In enquanto o limite superior da banda de valência (MBV), que se encontra aproximadamente 3,5 eV abaixo da MBC, é formado por orbitais 2p do O. O aumento da concentração de portadores livres, como

1

Notação de Kröger–Vink:

InxIn – átomo de índio que permaneceu na mesma posição onde o x significa que não houve alteração no estado de oxidação;

resultado da elevada dopagem, resulta numa deslocação do nível de Fermi para o interior da banda de condução. Assim, o hiato energético é aumentado para 3,7 eV como resultado dos portadores gerados pelas lacunas de O e pelos iões de Sn.[40, 50]

Figura 2.5 Diagrama de bandas para o ITO com diferentes níveis de dopagem. (Adaptado de [50].)

2.1.2.2. Óxido de zinco

O ZnO cristaliza numa estrutura hexagonal do tipo wurtzite pertencendo ao grupo espacial P63mc com parâmetros de rede a=3,24 Å e c=5,19 Å. Cada célula hexagonal contém duas moléculas de ZnO onde os átomos de Zn se encontram tetraedricamente rodeados por átomos de O (Figura 2.6). Perpendicularmente ao eixo-c, a célula unitária consiste em planos alternados de Zn e O. A coordenação quase tetraédrica ao longo do eixo hexagonal provoca uma simetria polar que permite ao ZnO apresentar propriedades piezoeléctricas, entre outras.[4, 40]

Figura 2.6 Estrutura cristalina hexagonal do tipo wurtzite do ZnO.

O ZnO intrínseco é um semicondutor tipo-n com um hiato directo de 3,2-3,4 eV.[51-53] A estrutura de bandas é a análoga à do In2O3 sendo, neste caso, a MBC constituída por orbitais 3s do Zn e a MBV por orbitais 2p do O.[4, 54] Os portadores livres são formados por lacunas de O2 ou maioritariamente por átomos de Zn intersticiais sendo obtidas concentrações de portadores na ordem 1017-1019 cm-3.[55, 56] Contudo, com estes valores de concentração de portadores apenas são obtidas resistividades na ordem dos 10-2 -10-3  cm, o que se revela insuficiente para utilização do ZnO como

contacto transparente em aplicações optoelectrónicas.[4, 40, 52] Tal como no caso do In2O3, as propriedades eléctricas do ZnO podem ser consideravelmente melhoradas através da substituição de átomos de Zn por átomos do grupo III como o B, Al, Ga ou In. Com esta dopagem extrínseca, torna- se possível a obtenção de filmes de ZnO com resistividades na ordem dos 10-4  cm e concentrações de portadores de ≈1020 cm-3.[57, 58] Nos últimos anos têm sido intensamente investigados novos métodos para a obtenção de ZnO tipo-p sendo, em alguns destes, utilizados dopantes do grupo V como o N, o P ou o As. Apesar disso, até ao momento esta tarefa tem-se mostrado bastante complexa, não sendo possível a obtenção de filmes com propriedades estáveis. A principal razão para este facto encontra-se relacionada com vários mecanismos de compensação do ZnO que aniquilam o efeito introduzido pelos dopantes.[56, 59, 60]

Os filmes finos de ZnO, tal como os de In2O3 e outros TCOs, podem ser obtidos por diversas técnicas. Industrialmente, a pulverização catódica tem sido a técnica de eleição, pois permite a obtenção de filmes com boas propriedades em grandes áreas.[38] Contudo, estão disponíveis outras técnicas de deposição como a evaporação térmica,[44] a deposição química de vapores organometálicos (MOCVD – Metal Oxide Chemical Vapour Deposition)[61] a deposição por laser pulsado (PLD – Pulsed Laser Deposition),[62] a spray pirólise,[63] o spin coating[64], ou mais recentemente a impressão por jacto de tinta (ink jet).[65] As propriedades dos filmes finos dependem não só da técnica de deposição, mas também dos parâmetros de processamento utilizados em cada uma delas.[38] Por exemplo, no caso do In2O3 é possível a obtenção de filmes amorfos depositados por pulverização catódica a baixas temperaturas, ou de filmes policristalinos quando é utilizada uma temperatura de deposição superior a 150 ºC.[6, 66] Por sua vez, no caso do ZnO é sempre obtida uma estrutura policristalina, independentemente da temperatura de processamento utilizada.[38] É importante referir que a maioria dos TCOs com aplicação na indústria, entre os quais o ITO, é processada a elevadas temperaturas (>200 ºC) com vista a optimizar as propriedades dos filmes, nomeadamente a redução da resistividade.[67] Contudo, a utilização destas altas temperaturas limita o tipo de substratos a utilizar.[47, 48, 57]