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PARTE II MATO GROSSO NO CONTEXTO DO PATRIMÔNIO

CAPÍTULO 2 O PATRIMÔNIO HISTÓRICO, A AGENDA DA GESTÃO

2.3 A AGENDA DA GESTÃO LOCAL E A CRIAÇÃO DAS ESTRUTURAS

Os eventos sobre o patrimônio histórico, ocorridos nacionalmente, e as iniciativas no estado de Mato Grosso na década de 70 motivaram a administração pública municipal em Cáceres a investir na criação de espaços de fomento a cultura. Foi assim que surgiu a criação do Museu Histórico, da Biblioteca Municipal e do Arquivo Público Municipal, através da Lei nº 695, de 09 de maio de 1978. A criação desses espaços também antecedeu, no município de

47 Ver cartilha que trata de gestão integrada e compartilhada. Iphan (2009) - Planos de Ação para Cidades

Históricas, Patrimônio Cultural e Desenvolvimento Social: Construindo o Sistema Nacional de Patrimônio Cultural.

Cáceres, a criação de normas de tombamento e de regulação do patrimônio histórico (MENDES, 2009).

Ainda no ano de 1978 Cáceres ganhou também o primeiro tombamento no município, com o reconhecimento do Marco do Jauru, “localizado na praça Barão do Rio Branco, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional”, como monumento histórico e cultural, sendo este o primeiro tombamento realizado no município de Cáceres. A criação de espaços culturais e o tombamento federal em 1978 confirmam que a década de 70 foi de intensa movimentação para o patrimônio histórico, não somente nacional, mas para Mato Grosso e especialmente em Cáceres (MENDES, 2009, p. 154).

Em Cáceres, a partir da década de 80 começaram a aparecer as primeiras ações mais efetivas em defesa da “preservação do patrimônio urbano”, como ação empenhada pela administração pública (ARRUDA, 2014, p. 81). A primeira administração pública a assumir esse compromisso foi do Prefeito Ivo Scaff, que governou o município no período entre 1980- 198348. Na sua gestão foram criados os primeiros espaços e estruturas, assim como a primeira lei municipal do patrimônio (MENDES, 2009). O primeiro e um dos mais importantes espaços criados neste período, e que teve um forte protagonismo na defesa do patrimônio histórico, foi a FCC - Fundação Cultural de Cáceres49, através da Lei nº 897, de 14/03/1983, encarregada, nos últimos anos da década de 80, de cuidar do inventário e dos assuntos referentes ao patrimônio. A FCC foi criada com personalidade jurídica própria e foi uma iniciativa dos poderes públicos municipal, executivo e legislativo que, juntos, a criaram “vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Social, com objetivos de planejar, executar e supervisionar os programas culturais, inclusive relacionadas ao turismo” (ARRUDA, 2014, p. 83).

Ainda nesta gestão foram tomadas algumas medidas para proteção do patrimônio, com a realização de “diploma legal impedindo demolição e reformas que descaracterizem os imóveis de inegável significação histórica, iniciando a preservação pelo prédio da esquina das ruas Cel. Jose Dulce e General Osorio”. Outra medida foi a criação do Projeto “Memória Cáceres” que tinha como objetivo “reunir e catalogar peças históricas, registrar vivencias e experiências, bem

48 Ver Obra História de Cáceres. História da Administração Municipal, 2009. Nesta obra Natalino Ferreira Mendes

apresenta um relato da administração pública municipal desde a Primeira República (1889-1937), o Estado Novo (1937-1946), a Segunda República (1946-1964), passando pela ditadura militar, período em que o Prefeito era nomeado pelo governador do Estado com anuência do Governo Federal, destacando a mudança partir de 1986, quando os prefeitos passaram a ser eleitos. Observo que a última gestão administrativa registrada por Mendes foi a de Tulio Fontes no ano de 2008.

49 Segundo Arruda (2014, p. 83), “ao invés de um órgão da administração direta, foi criado uma entidade com

personalidade jurídica própria [...] à semelhança da Fundação Cultural do Estado de Mato Grosso, criada em 1975 e da Pró-Memória, criada em 1979. Ambas as instituições com personalidade jurídica de direito privado eram amparadas pelos art. 26º do Decreto-lei Federal nº 200 de 25 de fevereiro de 1967 e no art. 3º do Decreto-lei federal nº 900, de setembro de 1969”.

como demonstrar o reconhecimento do poder público aos principais troncos familiares da bicentenária cidade” (MENDES, 2009, p. 157). Este projeto, em certa medida, deu subsídios para o inventário cadastral que ocorreu na cidade e contribuiu para o direcionamento do olhar do corpo técnico para os casarões da elite cacerense que, por serem mais imponentes e por seu valor estético, chamavam a atenção.

Essa gestão administrativa foi, sem sombra de dúvidas, uma das mais atuantes no que se refere aos interesses de preservação do patrimônio histórico e, mesmo que não tenha realizado tombamentos, instrumentalizou o município, criando espaços e normatização do patrimônio. Ainda que de forma incipiente no que se refere ao modelo de legislação e normas técnicas já existentes no momento, em nível nacional e estadual, mas foi o pontapé inicial para que nos anos seguintes o patrimônio pudesse compor as agendas da gestão pública municipal com ações mais propositivas de tombamento e preservação.

Os Prefeitos que sucederam o Prefeito Ivo Scaff seguiram, uns com maior atenção ao patrimônio e outros com outro foco de gestão, que não incluíam a preservação do patrimônio. Exemplo disso foi a administração municipal seguinte, a cargo da Prefeita Ana Maria da Costa Faria que governou entre os períodos de 18/03/1983 – 31/12/1985. Sobre a sua administração, não identifiquei documentos ou registros que comprovassem a sua atuação sobre o patrimônio histórico do município, tudo indica que não teve em sua agenda de prioridades o patrimônio histórico da cidade. Importante ressaltar, ainda, que Ana Maria da Costa Faria foi a primeira e única mulher a governar o município de Cáceres, e a última prefeita a ser nomeada pelo Governador do Estado. O que chama a atenção, em seu governo, é que foi uma das administrações públicas municipais, registradas por Mendes (2009), com poucas ações realizadas no município, e nenhuma ação que direta ou indiretamente tivesse o patrimônio cultural como foco.

A administração seguinte foi do “primeiro Prefeito Municipal de Cáceres eleito pelo voto direto, após a descaracterização do Município como área de segurança nacional” (MENDES, 2009, p. 164). A administração de Antônio Carlos Souto Fontes teve início com a sua posse em 01/01/1986 e governou até 31/12/1988. Nesta gestão, as ações de preservação do Patrimônio Histórico voltaram a tomar corpo. O Prefeito Antônio Fontes também realizou importantes contribuições para o município, com especial atenção ao patrimônio cultural. Construiu o “prédio do Centro Cultural de Cáceres”, no centro histórico da cidade, e realizou, entre os anos de 1987 e 1988, o primeiro “cadastramento de parte do sítio histórico da cidade, em convênio com a Fundação Cultural do Estado” (MENDES, 2009, p. 165). O movimento

empenhado por essa gestão fechou, o ciclo de ações sobre o patrimônio histórico, realizadas na década de 80, no município.

Na gestão seguinte, quem assumiu o poder municipal em Cáceres foi o Prefeito Walter Fernandes Fidélis que governou o município no período de 01.01.1989 a 31.12.1992. Nesta gestão aconteceu o primeiro tombamento no Centro Histórico, realizado pela Fundação Cultura de Mato Grosso no ano de 1991, porém, é importante ressaltar que, embora o tombamento tenha sido realizado nesta gestão, evidentemente foi resultante de movimentos e ações já em andamento, encaminhadas na gestão anterior. A gestão administrativa de Walter Fidélis, no início dos anos 90, foi, segundo Mendes (2009) de muitas ações importantes para o município, e dentre as mais marcantes estão: o estreitamento das relações internacionais de navegação e comércio com países que são banhados pelo Rio Paraguai, com a realização do “encontro no Centro Municipal de Cultura para definição da metodologia operacional de transporte e normas fronteiriças sobre o processo comercial entre Brasil e Bolívia”; e a “reativação da hidrovia do Paraguai com carregamento de soja, num esforço de transformar Cáceres em cidade de maior importância portuária do Estado” (MENDES, 2009, p. 167). Uma das principais atividades, que Mendes tratou como amplo empenho de Walter Fidélis, foram os esforços para “implantação da ZPE - Zona de Processamento de Exportação, em Cáceres, e pela consequente industrialização do Município”. Trata-se de uma proposta que desde a sua divulgação inicial ganhou amplitude nos espaços e nos discursos políticos (MENDES, 2009, p. 167).

Convém salientar, ainda, que a proposta da ZPE, que retoma o cenário das promessas de campanha a cada ano eleitoral, também foi motivo de observação no processo de tombamento realizado pelo IPHAN. A referência à ZPE ocorreu em função das consequências sociais e culturais que dela resultariam caso fosse implementada; razão pela qual foi motivo de alerta pela equipe técnica do IPHAN, quando visitaram Cáceres no ano de 1993.

Alertamos ainda sobre a questão da implantação da Zona de Processamento de Exportação - ZPE de Cáceres. Sendo um empreendimento que trará impactos negativos para o Patrimônio cultural presente em Cáceres, a ZPE deve oferecer alguma contrapartida para minimizar esses impactos e consolidar a proteção do patrimônio histórico, paisagístico e natural de Cáceres. (IPHAN-PROCESSO DE TOMBAMENTO DE CÁCERES/MT, 2007, fl. 105).

Embora não tenham mencionado de forma clara quais impactos a implantação da ZPE traria, acredita-se que afetaria a dinâmica interna da cidade, com o aumento e a movimentação de veículos circulando pela área urbana e, especialmente, de pessoas vindas de outros lugares em busca de trabalho. Ou seja, a implementação da ZPE traria impactos tanto na paisagem da

cidade quanto na cultura local, e isso, certamente, demandaria cuidados na preservação do patrimônio cultural, fazendo sentido o alerta. Ainda que a ZPE nunca tenha sido consolidada, ela jamais saiu do imaginário da população cacerense que, há décadas, esperou por sua concretização e pelas promessas de que geraria empregos e renda para o município. É importante ressaltar ainda que, por mais que Walter Fidelis tenha iniciado a movimentação da ZPE como um legado de sua administração, que jamais saiu do papel, sobre o patrimônio histórico, não há evidências de que tenha sido prioridade na agenda desta administração.

As preocupações com o patrimônio histórico retornaram com força total na agenda da administração municipal a partir de 1993, na segunda gestão do Prefeito Antônio Carlos Souto Fontes, que governou o município entre os anos de 01.01.1993 a 15.03.1996. Entre os seus feitos, que contemplaram o patrimônio histórico do município e que marcaram esta gestão, estão inicialmente o encaminhamento do processo de solicitação de tombamento ao órgão federal no ano de 1993. Na ocasião, Antônio Fontes solicitou o tombamento de 42 monumentos, que haviam sido inventariados no ano de 1988 no Centro Histórico. Outra ação marcante foi a criação do 2º instrumento de preservação do patrimônio, através do Decreto nº 185, de 19 de abril de 1994, por meio do qual também criou a CEPT – Comissão Especial de Preservação e Tombamento. A CEPT, de acordo com o decreto de criação, ficaria alocada na FCC - Fundação Cultural de Cáceres e seria um órgão de caráter deliberativo e de assessoria técnica ao município:

Art. 7º - Fica instituído, na Fundação Cultural de Cáceres, a Comissão Especial de Preservação e Tombamento – CEPT do Patrimônio Histórico e Cultural e Artístico, órgão deliberativo de consultoria técnica e assessoramento nos processos de tombamento histórico e manifestações culturais de conformidade com a Lei nº 8 91 de 16/11/82, Art. 2º § único. Art. 8º - A comissão, terá por finalidade deliberar e assessorar tecnicamente a Divisão do Patrimônio Histórico e Cultural - DPHC e exercer a proteção no Município de Cáceres, ao bem cultural artístico, paisagístico, arquitetônico, de propriedade pública ou privada, de que trata a Lei Municipal nº 891 de 16/11/82. (MUNICÍPIO CÁCERES, 1994).

A criação da Fundação Cultural em Cáceres coincidiu com as mudanças que ocorriam para a preservação do patrimônio histórico, em nível nacional, o que, consequentemente alterou a estrutura do órgão federal em Mato Grosso, precisamente no ano de 1994.

Em Cáceres, evidentemente que, se comparadas a outras gestões administrativas, as duas gestões do Prefeito Antônio Fontes foram as mais significativas para o patrimônio histórico da cidade: a primeira, por ter realizado o inventário cadastral no centro histórico entre os anos de 1987 e 1988; e a segunda, porque atualizou o instrumento de preservação do

patrimônio no ano de 1994 e, promoveu o tombamento municipal no centro histórico no ano de 1996. Convém salientar que o empenho desta gestão para a preservação do patrimônio histórico local, não foi igualmente visto na administração pública que o sucedeu.

A gestão seguinte foi do Prefeito Aloísio Coelho de Barros, entre os anos de 1997 a 2000. Embora tenha realizado várias obras na área da educação e na área da saúde no município, no que se refere ao patrimônio histórico realizou ações pontuais de preservação; foi uma gestão marcada por conflitos provocados pela destruição de um monumento no centro histórico. O que podemos afirmar como positivo foi a “revitalização do casario antigo do centro histórico de Cáceres, em parceria com os proprietários”, observando que apenas “dezoito casas foram revitalizadas dentre quarenta e sete50 que fazem parte do conjunto de imóveis tombados pela Fundação Cultural do Estado” (MENDES, 2009, p. 178). Como disse, mesmo que tenha fomentado a revitalização de parte dos casarões no centro histórico, sua administração ficou conhecida pela demolição da ponte branca.

A ponte foi construída em 1910 e ligava o centro histórico com o bairro Cavalhada, era “um monumento histórico importante para a cidade de Cáceres”, que “mesmo diante da mobilização popular articulada por diversos setores da sociedade civil” não conseguiu evitar que fosse demolida. A ação teve como justificativa a necessidade de canalização do Córrego Sangradouro e foi seguida de revolta da sociedade, que se mobilizou em defesa da manutenção da ponte. A pressão não teve o efeito esperado, e a demolição aconteceu do dia para a noite “mais precisamente no dia 19 de maio de 1998” (ARRUDA, 2014, p. 17). O episódio, que causou indignação da população, resultou em novas demandas judiciais que, somadas as que já tramitavam na justiça, teve a decisão publicada em 11 de agosto de 1998, no mesmo ano em que a ponte foi demolida, obrigando o município à construção de uma réplica, que na prática também nunca foi concretizada, e a decisão judicial se arrasta até a atualidade.

Um desenho do que isso significou para a sociedade cacerense foi narrado por um jornal da capital:

[...] Apesar dos esforços da comunidade pela preservação daquele patrimônio, na madrugada do dia 19 de maio de 1998, a velha ponte foi demolida pela Prefeitura Municipal, e Cáceres perdeu uma de suas referências históricas. A Curadoria do Meio Ambiente à época havia instaurado inquérito civil, após comprovar que a obra (canalização do Sangradouro) foi iniciada sem a competente Licença Ambiental e sem qualquer Estudo de Impacto Ambiental.

50 Esclareço que as divergências entre os números dos imóveis tombados são identificadas em vários documentos

Apesar da demolição, uma ação civil pública contra a prefeitura e a empresa construtora teve continuidade, resultando no Termo de Ajustamento de Conduta – TAC, firmado entre a Curadoria do Meio Ambiente e o Município de Cáceres-MT, constando medidas referentes ao Córrego Sangradouro e à reconstrução da Ponte Branca, entre outras.

A decisão judicial datada de 11/08/98, grafada nos autos de “Ação Civil Pública Reparatória de Danos ao Meio Ambiente nº. 158/98”, que entre outros termos, consta um com o título “Da Ponte Branca”, obriga a Prefeitura a construir réplica da mesma, com a mesma técnica utilizada originalmente e institui uma “Comissão Pró-Reconstrução da Ponte Branca”, encabeçada pelo Professor Natalino Ferreira Mendes e pelo engenheiro Adilson Domingos dos Reis, com o objetivo de fazer respeitar as características históricas, inclusive concernentes à sua localização, conforme anexos do processo, e arquitetônicas da Ponte Branca, e a mobilização da sociedade civil para subsidiar a reconstrução.

Os trabalhos para tal reconstrução deveriam ser iniciados a partir de 30.9.98, com comunicação à Curadoria do Meio Ambiente de Cáceres-MT, e o término não poderia exceder a três meses. Rememorando, nove (9) anos já se foram, uma gestão passou incólume e uma outra (outra?) está para se findar e a nossa Ponte Branca continua somente na memória popular. Mãos à obra? Ou vai ficar para uma nova GESTÃO com todas as letras maiúsculas? (JORNAL ON LINE RDNEWS, 2007).

Convém ressaltar que, ainda que a ponte tenha sido identificada entre os monumentos históricos existentes na cidade, ela não entrou no inventário final e “não foi tombada por nenhuma das esferas governamentais” o que facilitou a sua demolição (ARRUDA, 2014, p. 106). Foi um episódio trágico para o patrimônio histórico da cidade, mas isso não impediu que ela ficasse na lembrança de quem a conheceu, como um símbolo cultural, que hoje faz parte da memória lida e contada51.

Uma observação pertinente é que neste período a CEPT – Comissão Especial de Preservação e Tombamento já não tinha mais uma atuação comprometida com as causas do patrimônio e, considerando que ela tinha o poder de deliberar e fiscalizar, o seu papel era importante no tocante à preservação, mas, em função da ausência de reuniões, que desde 1996 já não ocorriam mais com frequência, o movimento de preservação ficou comprometido e foi dando espaço para a criação de outros instrumentos que, inclusive, entravam em conflito com as atribuições da CEPT, a exemplo do Conselho Municipal de Cultura, criado pela Lei nº 1539, de 14 outubro de 1999 (ARRUDA, 2014):

No decorrer da gestão da preservação pelo poder executivo municipal, em 04 de dezembro de 1999, foi criado o Conselho Municipal de Cultura de Cáceres (CMC). Esse causou certo embaraço na estrutura de gestão da preservação em

51 Lida, porque há vários estudos, que tratam do assunto e possibilita a leitura. E contada em forma de história ou

poesia, porque ainda é muito presente nas narrativas de quem vive no centro histórico, ou mesmo de quem não vive lá, mas a conheceu. Sugiro ver Mendes (1998), Arruda (2014) e Odair Jose, Poesias Cacerense (2016).

âmbito municipal por ser de caráter deliberativo, fiscalizador e propositivo que, ao mesmo tempo, assumiu competências similares da CEPT. No entanto, ambos pouco se envolveram nas deliberações a respeito do patrimônio cultural, haja vista que enfrentaram problemas no tocante à composição e nomeação dos integrantes, chegando a ficar anos sem ter todo os seus membros nomeados. Assim como a CEPT, as ações do CMC voltadas para a preservação dos bens culturais ocorreram de maneira pontual, irregular e compreendendo a conservação dos bens de maneira isolada. (ARRUDA, 2014, p. 104).

A leitura de Arruda leva ao entendimento de que, nesta gestão, mesmo que tenha havido uma tentativa de aprimorar os instrumentos de preservação do patrimônio histórico, em decorrência da ineficiência, naquele momento, dos já existentes, na prática não teve avanço. Isso evidencia que a cada mudança de gestão pública a sociedade fica refém dos grupos políticos que assumem o poder, que tentam impor seus interesses e sua forma de pensar a gestão pública, em detrimento das normas já estabelecidas. Suas atitudes, configuram, “atos de Estados” e como tal devem ser aceitos pela comunidade. Como bem ilustra Bourdieu (2014), são “ações feitas por agentes dotados de uma autoridade simbólica e seguidas de efeitos”. Caso não sejam questionados, esses atos tendem a ter o consentimento da sociedade e “ainda que se revoltem, sua revolta supõe o consentimento” (BOURDIEU, 2014, p. 48).

Ao final desta gestão, no ano de 2000, mesmo que alguns casarões tenham sido revitalizados, vê-se que foi uma ação pontual e seletiva. Pode-se afirmar que o saldo negativo para a população, que já vinha perdendo parte do patrimônio na área central (demolição de coreto na praça central, casarões em estado de abandono e demolição da ponte branca) foi muito maior do que os feitos positivos desta administração, em se tratando do patrimônio histórico.

No ano seguinte deu início a primeira gestão pública municipal do século XXI, com a posse de Tulio Fontes, que governou o município entre os anos de 2001 a 2004. Tulio Fontes é filho do ex-prefeito Antônio Fontes, que teve dois mandatos no município. Como já visto, Antônio Fontes deixou como legado, para o patrimônio histórico da cidade, o inventário dos casarões em 1988, que culminou com o tombamento estadual provisório em 1991, a criação do Decreto nº 185/1994, o tombamento municipal em 1996 de 48 casas e, ainda que na sua gestão não tenha sido realizado o tombamento federal no centro histórico da cidade, foi o responsável pela solicitação no ano de 1993. Entre as ações desenvolvidas na gestão de Tulio Fontes estão, além da reforma do Centro Cultural e do Museu Municipal de Cáceres, as mudanças na estrutura e no espaço de gerenciamento do patrimônio histórico, com a criação da Secretaria de Esporte, Cultura e Lazer, através da Lei nº 1.845, de 26 de agosto de 2003. A nova Secretaria foi criada logo após o tombamento definitivo realizado pela SEC - Secretaria de Estado de Cultura em

Cáceres. À nova Secretaria municipal, foram atribuídas as responsabilidades com o patrimônio