Capítulo 2 Revisão Bibliográfica
2.5 O lean nos Serviços e nos serviços ligados à saúde
2.5.2 A aplicação do lean healthcare: alguns casos
O Virginia Mason Medical Center (VMMC), em Seattle, é um sistema integrado de assistência médica que inclui um hospital constituído por 9 unidades. Usufrui de 336 camas, 400 médicos e 5.000 colaboradores. Em 2000, após um período de grande stress económico e organizacional, o Conselho de Administração decidiu implementar mudanças no hospital atra- vés do desenvolvimento de um novo plano estratégico que impunha que a organização se fo- casse mais nos negócios (Womack et al., 2005). Este plano estratégico, o Virginia Mason Pro-
duction System (VMPS), foi representado graficamente em forma de um triângulo (figura 3)
dividido em secções, sendo que no topo estava o paciente apoiado por quatro pilares: pessoas (recrutar e manter uma boa equipa), qualidade (foco na obtenção dos melhores resultados), ser- viço (para todos os stakeholders) e inovação (apoiados pela promoção da cultura da inovação).
Segundo (Mason, 2002), o Virginia Mason Production System (VMPS) é um método de gestão que procura melhorar continuamente a forma como o trabalho é realizado, para que o produto/serviço final não tenho defeitos. Através deste método, o Virginia Mason identifica e elimina desperdícios e ineficiências nos diversos processos que fazem parte da assistência mé-
dica, permitindo desta forma fornecer ao paciente um atendimento com mais qualidade e segu- rança.
O VMPS foca-se em seis áreas diferentes (Womack et al., 2005): a) O paciente está sempre em primeiro lugar;
b) A criação de um ambiente no qual colaboradores se sintam seguros incentivados à melhoria contínua e adoção de uma política de não despedimento;
c) Implementação de um sistema de alerta de erros com o nome “The Patient Safety
Alert System”;
d) Incentivo à inovação e ao “trystorming” (além do brainstorming, o “trystor-
ming” incentiva ao teste das novas ideias);
e) Criação de uma organização com uma economia próspera e sem desperdícios; f) Liderança responsável.
A implementação deste novo modelo originou os seguintes resultados (Mason, 2002): a) Redução de 85% do tempo necessário para a emissão de resultados por parte do
laboratório;
b) Poupança de 2 milhões de dólares no serviço de fornecimento através da redução de stocks e da utilização da ferramenta 5S;
c) Redução da distância percorrida diariamente pelos enfermeiros, disponibili- zando de mais de 250 horas de trabalho por dia para dedicarem aos cuidados de saúde dos utentes;
d) Redução de 500.000 dólares nas despesas de mão-de-obra em horas extras e tra- balho temporário em apenas um ano;
e) Aumento da produtividade em cerca de 93% em algumas áreas, criando kits com os suprimentos mais utilizados e movendo-os para um ponto comum;
f) Redução de 56% dos prémios de seguro de responsabilidade civil dos colabora- dores.
Para além destes resultados, observou-se ainda a ocorrência de pneumonia diminuiu, com 34 casos com uma morte em 2002 e 4 casos e 1 morte em 2004, através da utilização da ventilação mecânica, o que por sua vez levou a uma diminuição das despesas em quase 500.000 dólares. Além disso, observou-se também um melhor aproveitamento da utilização do espaço do centro oncológico permitiu um aumento de 57% de pacientes atendidos no mesmo espaço (Womack et al., 2005).
2.5.2.2 Bolton Improving Care System
O Bolton Hospital fica localizado em Manchester, Inglaterra. Possui pouco menos de 800 camas e mais de 3.000 colaboradores. Em 2004, o hospital encontrava-se numa situação de crescente défice financeiro e problemas relacionados com as longas filas de espera para diag- nósticos e tratamentos (Bowerman e Fillingham, 2007). Em 2005, com a ajuda de uma consul- tora externa especializada em transformações lean das organizações, o hospital começou a dar os primeiros passos para se tonar um hospital lean. Daqui nasceu a abordagem sistematizada
Bolton Improving Care System (BICS) (figura 4) (Bowerman e Fillingham, 2007).
O Bolton Improving Care System é considerado uma abordagem específica de melhoria de serviços que utiliza metodologias lean para fornecer o melhor atendimento possível. O BICS tem como objetivo melhorar a saúde, prestar o melhor atendimento aos pacientes, melhorar a relação custo/benefício dos contribuintes e pacientes (Smith, 2009). Esta abordagem trata da identificação e remoção das etapas sem valor agregado aumentando a qualidade do atendi- mento, a eficiência e a produtividade para reduzir atrasos e melhorar os resultados clínicos.
Um dos primeiros serviços a ser intervencionados foi o de Traumatologia, que teve como resultados uma redução de 36% de mortalidade, redução de 33% no tempo de permanên- cia neste serviço, redução de 42% de documentação. O serviço de Patologia obteve resultados
Figura 3 - Plano estratégico VMPS (Womack et al., 2005)
igualmente satisfatórios, tais como, a redução dos tempos de resposta, aumento de 300.000 libras (10%) das receitas, e um aproveitamento na ordem dos 40% do espaço do serviço (Fillingham, 2007).
Figura 4 -
Aborda- gem sis-
tematizada Bolton Improving Care System (BICS) (Bowerman e Fillingham, 2007)
2.5.3.1 Implementação lean nos hospitais portugueses
Em Portugal, são cada vez mais os hospitais a implementar a filosofia lean nos seus serviços, com vista na sua melhoria, aumento da eficiência e redução de desperdícios. A imple- mentação lean resulta ainda no aumento de tempo centrado nos pacientes, melhorando assim o serviço prestado aos mesmos. Seguem alguns exemplos da implementação lean healthcare nos hospitais portugueses.
Centro Hospitalar do Porto – Hospital de Santo António
O Centro Hospitalar do Porto teve implementado no Bloco Operatório o Projeto Lean
Operation Room que, através de recursos lean como 5S, gestão visual, eliminação de muda,
Kanbans e SMED, registou melhorias a vários níveis: melhoria na gestão de stocks dos arma- zéns, redução do material exposto em espaços de armazenagem em cerca de 20 a 50%, melhoria
da organização das áreas do bloco operatório, eliminação do equipamento e material cirúrgico em desuso, melhoria da gestão de equipamentos, afixação de indicadores de produtividade no bloco operatório para melhorar o controlo visual, redução dos tempos operacionais e formação dos colaboradores para uma atitude e pensamento lean. O hospital sofreu ainda melhorias nos processos e gestão de recursos, formando uma cultura orientada para a otimização, redução dos desperdícios e qualidade do ambiente de trabalho. Ou seja, uma cultura orientada para a satis- fação do serviço prestado aos clientes que acedem ao Serviço Nacional de Saúde (Matos, 2011).
Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro (CHTMAD)
A aplicação de métodos lean no CHTMAD, EPE, já não é nova. Em 2013, Pinto propôs um modelo de gestão de stocks avançados de material de consumo do CHTMAD, mais efici- ente. Através da utilização de ferramentas com o Kanban e o Value Stream Mapping conseguiu provar que o modelo de gestão de stocks avançados proposto, proporciona diversos ganhos de eficiência, tais como: redução do valor em stock, redução da diversidade de artigos, redução do tempo total, redução do tempo de atividade e da distância percorrida pelos colaboradores no processo da encomenda, abastecimento e armazenamento, redução do número de armazéns avançados e consequente diminuição da área reservada aos stocks que, por sua vez, leva ao aumento do nível do serviço (Pinto, 2013).