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CONTATO FREQUENTE COM IDOSOS FORA DO AMBIENTE DE TRABALHO

4.7 O PROCESSO ETNOGRÁFICO

4.7.2 A aproximação com as participantes

Três meses se passaram após o exame de qualificação para que houvesse aprovação do CEP e mantivesse contato e liberação da coordenação do hospital para o início da coleta de dados propriamente dita. Somente após a primeira semana de janeiro de 2013 tive o primeiro contato com as participantes.

No projeto inicial tinha planejado apresentar a pesquisa numa reunião ordinária da equipe de enfermagem, mas logo percebi que ia demorar algum tempo até que ocorresse e resolvi então utilizar outra estratégia de aproximação o contato pessoal, individual. Escolhi um dia de domingo para encontrá-las, pois a rotina do domingo é diferente, um pouco mais tranquila, restringindo-se aos cuidados básicos de higiene, curativos e medicamentos. Neste dia somente são realizados exames e avaliações de urgência. Já havia consultado anteriormente a escala e a enfermeira de plantão era conhecida, egressa da UESB.

Entrei no hospital novamente pela portaria, com crachá de identificação, calça jeans e blusa branca. Dirigi-me a CM pela escadaria principal. Em nosso encontro a enfermeira demonstrou alegria e surpresa por estar ali em pleno domingo. Ela orientava os acompanhantes de pacientes e tentava apaziguar conflitos entre pessoas da mesma família. Sua roupa era diferente das demais. Calça lilás, blusa estampada de pequenas flores coloridas, um gorro descartável. As auxiliares estavam nas enfermarias, esporadicamente apareciam no posto para comunicar alguma alteração no estado clínico do paciente ou para fazer registro no prontuário de algum procedimento realizado.

O meu diálogo com a enfermeira foi rápido, pois era solicitada a todo tempo por todos: chamadas de telefone, laboratório, médicos, acompanhantes, demais funcionários. Desde a senha do computador, ao papel para prescrição, a de realização de curativos complexos, a solicitação de soro na farmácia... Enfim, sobre o seu papel, a enfermeira de plantão descreveu assim: A gente só não é Bombril, mas tem mil e uma utilidades, é um pouco de nutricionista, psicóloga, é tudo.

Conversei ali mesmo, no posto de enfermagem sobre a pesquisa, seus objetivos, técnica de coleta de dados, riscos e prováveis benefícios e entreguei a carta-convite. Evitei falar em observação participante. Substituí pelo termo “conviver com a equipe”. Percebi que a receptividade foi maior e não soou como se fosse uma “fiscalização”. Afirmei que tinha a intenção de retratar o cotidiano, o que muito agradou a enfermeira. Ela leu o documento e na sequência assinou o TCLE, entregou a minha cópia e guardou a dela.

Como as técnicas de enfermagem estavam quase todo o tempo nas enfermarias, optei por abordá-las no final do período, quando o setor estivesse mais tranquilo. Enquanto isso, pedi autorização à enfermeira e passei a consultar documentos como relatório de enfermagem e prontuários dos idosos.

Por volta das nove horas, a filha de um idoso indagou: - Quem é a enfermeira do curativo? A enfermeira respondeu: - Sou eu, mas aguarde um pouco, que estou fazendo anotações no prontuário. A acompanhante continuou: - Onde posso encontrar um lençol para ao menos cobrir ele, enquanto não faz o curativo? A enfermeira respondeu: - Olha, às vezes não tem lençol para trocar o de baixo e o de cima, mas pergunte às meninas (técnicas de enfermagem) lá dentro, para ver se ainda sobrou. Senão, só mais tarde!

Somente às 11horas e10 minutos, a enfermeira conseguiu dirigir-se ao leito e realizar o curativo do idoso. Outro acompanhante de uma paciente idosa veio reclamar para a enfermeira que após o banho foi deixada uma seringa e todas as extensões do soro por baixo do corpo da idosa. Pediu que alertasse as funcionárias para que tivessem mais atenção. A enfermeira ouviu, disse que ia conversar com as funcionárias e comentou comigo: - Onde estava a acompanhante que também poderia ter visto? Teria corrigido o problema precocemente!

Das quatro técnicas de enfermagem que estavam trabalhando no plantão de doze horas, três foram encontradas, no final do período matutino, sentadas no posto de enfermagem da CMF onde é preparada a medicação. Chamou-me a atenção de que as técnicas tiveram seu momento de uma rápida pausa para um lanche e breve descanso, mas não vi a enfermeira

parar um só minuto. Apresentei-me, falei do meu trabalho, dos resultados esperados, fiz o convite, entreguei a carta-convite acompanhada de TCLE para assinatura.

Uma delas indagou se era obrigatório, respondi que não, mas que contava com a participação delas, pois era de muita importância. Percebi que a solicitação de assinatura do termo as deixou preocupadas. Expliquei que é um procedimento obrigatório em pesquisas com seres humanos, porém me relataram que nunca participaram de pesquisa antes. Deixei a carta-convite e os termos para assinatura, para que pudessem ler com calma no período vespertino. Dispus-me a esclarecer dúvidas na próxima reunião com a equipe e informei que no dia seguinte recolheria os TCLEs que deveriam ser assinados e deixados em local combinado no posto de enfermagem. Tentei ser o mais cordial possível, mas fiquei um pouco apreensiva. Caso não assinassem teria que fazer uma nova abordagem. Naquele momento optei por não insistir na assinatura para não se sentirem constrangidas e para terem a oportunidade de ler com calma o termo e compreender que não havia nada que pudesse prejudicá-las futuramente.

Na segunda-feira pela manhã, voltei ao hospital e, como previsto, estava mais agitado que no domingo. Havia várias pessoas na portaria, próximas ao ambulatório. Entrei pela portaria, com crachá de identificação da UESB, calça jeans e blusa colorida. Fui interpelada pela primeira vez pelo recepcionista que só me deixou entrar quando conferiu a foto no meu crachá. Dirigi-me pela escadaria principal até a CM. Naquele dia trabalhavam três enfermeiras e cinco técnicas de enfermagem.

Coloquei um jaleco branco e me dirigi para uma visita rápida nas enfermarias, sem aproximar-me muito dos idosos porque estava resfriada. Chamou atenção o alto grau de dependência em que os idosos se encontravam. Muitos estavam dispnéicos, em uso de oxigenoterapia, limitados ao leito. Um deles solicitou que ligasse o oxigênio da Máscara de Venturi, pois estava muito desconfortável com a dificuldade para respirar (intensamente dispnéico). Atendi a solicitação e comuniquei o fato a uma das técnicas de enfermagem. Retornei em seguida para o posto onde encontrei assinado, no local combinado, dois TCLEs entregues no dia anterior.

Em momento oportuno, geralmente no local onde lanchavam ou descansavam um pouco, fazia abordagem às profissionais de plantão. Uma delas perguntou se eu iria levar um lanche, um agrado. Respondi que não era intenção, mas que podia pensar em algo para ocasiões especiais. Outras fizeram indagações do tipo: - Você vem aqui todos os dias de manhã?- Teremos acesso aos resultados da pesquisa? – Em que essa pesquisa vai contribuir para o serviço? Quando respondi os questionamentos e esclareci as dúvidas, elas assinaram o

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Assim, após visitar as enfermarias em vários turnos, consegui abordar toda a equipe diurna e de cada uma das profissionais consegui a anuência para participar da pesquisa. Por questões de ordem pessoal só pude comparecer a quatro plantões noturnos e permanecer até a meia-noite.

Estabelecer uma relação de confiança com as participantes foi um dos maiores desafios, pois embora o ambiente fosse conhecido, a maioria das profissionais não era conhecida e não estava acostumada com a presença de pesquisadora na unidade acompanhando o seu trabalho diário. Por isso, essa foi uma conquista cotidiana. Decidi não opinar, não criticar quando era solicitada, mas trazer alguns pontos de reflexão que ajudassem a formar uma opinião sobre o tema em discussão.

As elevadas temperaturas também foram uma barreira difícil de transpor. Em alguns dias tive síncope, pois o ambiente não era climatizado e o vento soprava aquecido. Cada dia era mais ou menos agitado de acordo com as demandas dos clientes e também do perfil dos profissionais de plantão.

A minha presença que inicialmente parecia intimidar as participantes foi com o tempo tornando-se rotineira, comum. Eu passei a fazer parte do cenário e outros profissionais como nutricionistas e fisioterapeutas também se interessaram pelo meu trabalho.